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30 anos na Infinita Highway
MENTOR DE UMA DAS BANDAS MAIS EMBLEMÁTICAS DO ROCK NACIONAL, HUMBERTO GESSINGER FALA DOS ENGENHEIROS DO HAWAII E DA CARREIRA SOLO: “NUNCA GOSTEI TANTO DE FAZER MÚSICA”
Por Claudia Kovaski, de Porto Alegre
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Eles eram garotos que (realmente) amavam os Beatles e os Rolling Stones e, para espantar o tédio, decidiram montar uma banda que deveria durar apenas uma noite - mas acabou se tornando uma das mais importantes do rock brasileiro. Desde a escolha do nome, os Engenheiros do Hawaii, 30 anos nas ondas sonoras de diferentes gerações, já transbordavam humor e senso crítico. A alusão era aos alunos de Engenharia que azaravam as gurias no bar da faculdade de Arquitetura da Universidade Federal do Rio Grande do Sul fazendo pose de surfistas. Era lá onde Humberto Gessinger (guitarra), Carlos Maltz (bateria), Marcelo Pitz (baixo) e Carlos Stein (futuro Nenhum de Nós, guitarra) estudavam.
O quarteto que tocou naquele de 11 de janeiro de 1985, no palco da faculdade de Arquitetura, durou apenas dois shows. Stein decidiu abandonar o grupo. O trio restante seguiu na estrada musical, e, entre idas e vindas e várias mudanças na formação original, incluindo o guitarrista Augusto Licks, que sucedeu a Pitz, foram 18 discos lançados e mais de 3 milhões de álbuns vendidos. “Fico muito contente por sobreviver na memória afetiva de tanta gente bacana e generosa! Muita felicidade por ter tocado com músicos incríveis em seis formações”, afirma Humberto Gessinger, o líder dos Engenheiros na época e atualmente em carreira solo.
Apesar das boas lembranças, Gessinger não tem planos de um revival. “Neste momento não penso a respeito. Estou focado nos shows do disco 'inSULar ao vivo'.” A ideia já anunciada do músico gaúcho de regravar o primeiro álbum da banda, “Longe Demais das Capitais”, lançado em 1986, também deve ser adiada para depois da turnê atual.
NO CARINHO DE ARTISTAS DE TODO O PAÍS, UM TRIBUTO À DATA
Em 2008, 23 anos depois daquela apresentação histórica, foi anunciada uma pausa por tempo indeterminando nos Engenheiros do Hawaii. Humberto Gessinger foi para a estrada com o projeto Pouca Vogal, um duo em parceria com Duca Leindecker. “Nunca gostei tanto quanto agora de fazer música. Gostaria muito de ter tido as ferramentas que a web oferece quando eu comecei. Hoje, a gente pode ser mais ágil. A informação viaja mais rápida e livre.”
Sem nostalgia, mas com carinho quando se refere ao passado, Gessinger comenta o disco-tributo que o grupo recebeu pelos 30 anos. “Espelho Retrovisor” tem 21 canções de todas as fases, entre sucessos e lados B. “Fiquei bastante emocionado. Mais do que algum arranjo especial, meu destaque vai para a diversidade geográfica e estilística das releituras." Ele se refere ao fato de a homenagem ter reunido músicos e bandas das cinco regiões do Brasil, entre nomes da nova geração do rock/pop nacional e artistas independentes, como A Banda Mais Bonita da Cidade (SP), Lula Queiroga (PE) e Forfun (RJ), entre muitos outros.
Repertório, aliás, nunca foi um problema para os Engenheiros. Com uma talentosa veia de compositor, ao longo da carreira Gessinger produziu sucessos inscritos na memória dos fãs. “Longe Demais das Capitais”, “O Papa é Pop”, “Toda Forma de Poder”, “Terra de Gigantes”, “Infinita Highway” e “Somos Quem Podemos Ser” são exemplos de hits cantados em coro nos shows. “Meu ofício de músico, com sua rotina sem rotina, me coloca numa posição privilegiada para ver as coisas de um modo diferente da maioria das pessoas. Basta um pouco de atenção ao que acontece em minha volta”, avalia.
SOLO E NA CONTRAMÃO DO SENSO COMUM
Atualmente, o músico gaúcho está em turnê do álbum solo “inSULar ao Vivo”, primeiro trabalho de músicas inéditas em dez anos. No set list, além das faixas do novo disco, sucessos de todas as fases da carreira. “Meu último disco só com inéditas, ‘Dançando no Campo Minado’, tinha sido lançado em 2003. Desde então lancei várias músicas novas, mas sempre em projetos ‘ao vivo’, ao lado de clássicos. Tive bastante tempo e fui rigoroso na escolha do material para o ‘inSULar’. Esperei que as músicas se impusessem, que pedissem para ser gravadas. Além de boas canções, elas tinham que se encaixar na vibe do disco e chegar ao arranjo certo.”
Enquanto compunha as canções do disco, Humberto não pensava sob que formato as gravaria, mas, com o tempo, percebeu que elas pediam ambientes diferentes, várias formações, muitos convidados. “Por isso lancei como disco solo: porque não há uma banda fixa me acompanhando. Na real, o formato para mim é só um detalhe. A música é o que importa.”
Esse comprometimento com a essência musical muitas vezes trilhou um caminho na contramão do mercado. "Quando a onda era rock, me achavam muito MPB. Quando a onda virou pop eletrônico, passaram a me achar muito rock. Quando era pra ser nacional, eu era muito gaúcho, e, quando inventaram o rótulo rock gaúcho, eu não estava mais no estado. Agora que a onda é revival, dei um tempo nos Engenheiros do Hawaii e saí solo, com músicas novas", brinca Humberto, descrevendo como vem trilhando sua própria highway.
Sem medo de nadar contra a corrente, ele evoca o espírito libertário do início da banda. “Na minha carreira, músicas em que ninguém levava fé (ou por serem muito longas ou por não terem bateria ou por não rolar refrão...) viraram hits”, afirma o artista, que ainda se surpreende com o poder que uma boa criação tem de encantar tantas pessoas, às vezes décadas (e mais) depois de lançadas. “Definitivamente, continua a ser mistério para mim o que acontece com uma canção depois que a gente a lança”, finaliza.