Revista Sino - novembro/2012

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N°5 | novembro | 2012

Revista dos antigos alunos do Santo Inácio

Uma história centenária

Livro vai contar um século de história da Igreja de Santo Inácio


Feliz Natal

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e um 2013 cheio de conquistas e solidariedade. É o desejo da Revista Sino a todos os antigos, atuais e futuros alunos.

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Índice

N°5 | novembro | 2012

Comemoração de fim de ano dos alunos dos projetos educacionais da ASIA é realizada com direito a apresentações e distribuição de cestas básicas. página 6

Os 100 anos da Igreja de Santo Inácio serão comemorados com lançamento de livro que está sendo feito por professor de história do colégio. página 8 Membro da Academia Brasileira de Letras, Luiz Paulo Horta (61) escreve sobre as lembranças culturais proporcionadas pelo colégio. página 13

Ensaio fotográfico do antigo aluno André Teixeira (86) nos mostra através de belas imagens cidades que ficam à margem do Rio São Francisco. página 14

Revista dos antigos alunos do Santo Inácio Conselho Editorial Pe. Luiz Antonio de Araújo Monnerat, SJ; Vera Porto; Izabela Fischer; Olga de Moura Mello e Maria José Bezerra

Com 60 anos de serviços prestados ao colégio, o inspetor Zezinho conta sua história e diz que não pensa em parar de trabalhar. página 18

Jornalista Responsável Pedro Motta Lima (JP21570RJ)

Revisão André Motta Lima Contato Publicitário 21 2421 0123 Produção ML+ (Motta Lima Produções e Comunicação) Tiragem 5 mil exemplares Gráfica Walprint

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Fale com professores e alunos do Colégio Santo Inácio, seus familiares e mais de 2 mil antigos alunos que recebem a revista em casa, pelo correio

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Diagramação Daniel Tiriba (dtiriba@gmail.com)

Antigo aluno parte da recordação do cheeseburger, que sempre comia no recreio, para falar sobre as saudades que sente dos tempos de estudante. página 22

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Projeto Gráfico Ana Mansur (anamansur@gmail.com)

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(editor@revistasino.com)

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editorial

Com a participação de antigos alunos Na última edição deste primeiro ano de vida da SINO, comemoramos os 100 anos da Igreja de Santo Inácio. Entrevistamos o professor Cesar Tovar, que está preparando um livro contando a história do templo - desde antes de sua construção, pois peças e inspiração vieram da igreja que os jesuítas tinham no Morro do Castelo - até as visitas de expresidentes da República. Neste sentido, falamos sobre altares, vitrais, doações...

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Ainda em clima de efemérides, temos o perfil do funcionário mais antigo do colégio, o inspetor Zezinho, que tem 60 anos de casa e não pensa em parar de trabalhar - aposentado ele já está, desde 1996. Também teremos textos de antigos alunos. O membro da Academia Brasileira de Letras, Luiz Paulo Horta, escreve sobre suas recordações culturais. E esperamos que seja apenas o primeiro a falar sobre a relação entre o colégio e a cultura, pois não faltam expoentes na área formados no CSI. Falando nisso, temos também um ensaio fotográfico do Rio São Francisco feito pelo antigo aluno André Teixeira, que trabalha no jornal O Globo, no Rio. O outro texto nos foi enviado por Alejandro Gómez Gil, que através de uma homenagem ao cheeseburger que comia nos recreios falou sobre as saudades dos tempos de colégio. O Natal, evidentemente, não poderia ser esquecido. Para celebrar esta data tão importante, resolvemos mostrar um pouco da festa de fim de ano das crianças atendidas pelos projetos educacionais da ASIA, que se apresentaram e ganharam cestas básicas. Um feliz Natal e um próspero Ano Novo para todos.

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Agradeço muitíssimo o excelente exemplar da REVISTA SINO, nº 4 Setembro / 2012, recém-recebido. A publicação funde conteúdos éticos e padagógicos, com serviços de utilidade comunitárias e informações nostálgicas e atuais, gerando um produto inteligente, sensível e, sobretudo, legitimamente inaciano. Grande abraço em todos e parabéns! Nilson Galhanone de Calasans Rego (77)

Caro editor, fiquei feliz em ler a matéria sobre os professores Miguel Jorge e Thales na última edição de SINO (nº 4 - Setembro / 2012)! Mesmo morando longe do Brasil, assuntos relacionados ao Colégio interessam-me muito e é emocionante saber que ainda há professores da minha geração (92) por lá. Parabéns pela iniciativa com a revista. Um abraço desde os EUA, Gustavo Sassi (92)

Olá pessoal da Sino,

Seleção da minha sala e fomos sorteados para jogar com a camisa do Flamengo.

Seleção do Colegio Santo Inácio do meu ano.

abraço, Ricardo Hosannah

minhasino@revistasino.com.br

Pedro Motta Lima (94) editor@revistasino.com.br

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Espaço do leitor

facebook.com/RevistaSino


CSI arrecada R$ 100 mil para o Haiti

Encontro mundial de jovens jesuítas Os jesuítas Mike Rogers (ao centro), coordenador da delegação dos EUA para o encontro dos jovens jesuítas, que antecede à Jornada Mundial da Juventude (MAGIS 2013), e Hubert Hirrien, coordenador da delegação da França e da Bélgica, estiveram no CSI em setembro conversando com a equipe organizadora local sobre os detalhes da vinda de suas delegações. O grupo americano será composto por cerca de 350 jovens e o franco-belga por aproximadamente 260 integrantes. Acompanhados por Pedro Risaffi (à esquerda), antigo aluno do CSI da turma de 2006 e membro da equipe organizadora central, Izabela Fischer (à direita), da turma de 77 e representante do CSI no MAGIS, e pelo Pe. Francis Silvestre Adão, os jesuítas conheceram os espaços do Colégio, que receberá os jovens e também será local de algumas atividades do encontro. Mais informações sobre como participar e ajudar o MAGIS em www.magis2013.com ou pelo e-mail info@magis2013.com.

A Comunidade Inaciana desenvolveu uma série de atividades em setembro e outubro com o intuito de reforçar as doações para a campanha “Ignacianos por Haiti”, que reúne fundos para a construção de três escolas no país, devastado por um terremoto em 2010. O esforço resultou em cerca de R$ 50 mil doados por alunos, famílias e colaboradores, valor que foi dobrado pelo Colégio. Veja carta de agradecimento do reitor em http://bit.ly/cartahaiti Aponte o leitor de QR Code de seu celular e acesse o conteúdo de onde você estiver

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boas festas

Um Natal de

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A Asia e o Colégio Santo Inácio realizaram mais uma edição do Natal Mais Feliz e Solidário, no dia 1 de dezembro. As famílias atendidas pelos projetos sociais da assocciação dos antigos alunos foram convidadas para apresentações das crianças e receberam cestas básicas com material que foi arrecadado juntos às famílias de alunos do CSI. Todos foram recebidos por estudantes voluntários do colégio, que usavam gorros de Papai Noel. “O Natal do menino Jesus é isso: solidariedade. O milagre é a capacidade que temos de ajudar uns aos outros e este é um momento de partilha”, disse o reitor do colégio e presidente da Asia, padre Luiz Antonio Monnerat.

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Em seguida alunos do Centro de Complementação Escolar (CCE) se apresentaram com suas flautas doces e mostraram uma série de canções, algumas com o auxílio do Grupo Musical Inaciano do CSI, que também fez apresentação solo. Crianças que fazem aulas de circo mostraram suas habilidades com o tecido. Logo depois, todos se dirigiram ao Centro Esportivo Santo Inácio (Cesi), onde houve a distribuição das 400 cestas básicas para as famílias atendidas pela Asia e para os funcionários dos projetos, tanto os educacionais, com base no Santa Marta, como o Imagem Solidária.


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solidariedade

CSI abre as portas para as famĂ­lias atendidas pela Asia

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memória

Altar lateral representa os 40 mártires jesuítas do Brasil, através de um painel todo feito em mosaico

Colégio lançará livro para comemorar centenário da igreja

Os vitrais da porta principal fazem referência aos maiores altares laterais

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100 anos de 8

O trabalho realizado em mosaico é um dos destaques artísticos

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este mês de dezembro faz 100 anos que a Igreja de Santo Inácio foi consagrada pela primeira vez, pelo cardeal Arcoverde, no dia 3 de dezembro. A comemoração do centenário, no entanto, ficou para o ano que vem. Isso porque os primeiros altares foram concluídos em 1913, quando começaram a se realizar missas. Estas e muitas outras histórias estarão em um livro que está sendo produzido pelo colégio e será lançado em 2013. E para escrevê-lo foi convidado o professor de História do CSI Cesar Tovar, um especialista em história da arte (veja box). Apesar de ainda estar em processo de pesquisa, já é possível apresentar algumas curiosidades para o leitor da SINO. Talvez a principal seja a constatação de que, fugindo dos padrões, a igreja não foi construída a partir de sua capela mor, em homenagem a Santo Inácio de Loyola. Os altares laterais, dedicados à Nossa Senhora das Vitórias e ao Sagrado Coração de Jesus, foram os primeiros a ficar prontos. “Mas o principal era o da santa, o que faz


relata o professor, lembrando que a área construída para abrigar a igreja chegou a sediar o Observatório Nacional - o morro, no entanto, foi derrubado e com eles todas as construções ali existentes. A construção que não chegou a sair do papel iria se chamar Igreja de Santa Cruz. E, para ela, os jesuítas chegaram a encomendar um conjunto escultório de três peças. As obras foram para a pequena igreja no Morro do Castelo e depois ocuparam o primeiro altar lateral (da esquerda de quem entra) da Igreja de Santo Inácio. Na década de 60, as peças foram substituídas por uma escultura mais simples e transferidas para o hall de entrada do CSI, onde estão até hoje. (box 2) A igreja começou a ser construída junto com o colégio, em 1909, quando foi colocada sua pedra fundamental. A escola, no entanto, já funcionava na Rua São Clemente desde 1903, em uma casa de chácara que existia no terreno. “Eles construíram a igreja como parte integrante do colégio, mas é importante destacar que ela está voltada para a rua, com

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o professor. “E há relato da realização de cerimônias da benção das espadas na igreja, e era sempre no altar da santa”, complementa. Segundo Tovar, antes de continuar falando da igreja é inevitável voltarmos aos tempos em que os jesuítas estavam no Morro do Castelo com um colégio e um templo, no período do Brasil colonial. Segundo Tovar é possível perceber na Igreja de Santo Inácio inspiração em elementos da edificação anterior, que, por sua vez, fazia referências à história da Companhia de Jesus, tanto no mundo quanto especificamente no Brasil. “Ao chegar por estas terras, a Companhia de Jesus fez sua primeira igreja, de pau a pique, na base do Morro Cara de Cão, no Pão de Açúcar. Depois foram para o Morro do Castelo, onde pretendiam construir uma igreja maior. Chegaram a pedir, a obter autorização e a iniciar a construção. Mas a expulsão dos jesuítas do Brasil fez com que as obras ficassem inconclusas e fossem incorporadas pelo Estado, que, inclusive, se apossou da escola”,

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sentido, pois há muitos registros referindo-se ao templo como Igreja de Nossa Senhora das Vitórias. O altar mor é de 1931, quando o nome de Igreja de Santo Inácio passa a ganhar força”, esclarece Tovar. “Este detalhe explica também as fotos antigas em que os bancos estão voltados para o lado, e não para a frente”, complementa. A pesquisa nas atas da Congregação Mariana e na biblioteca do colégio, além das cartas dos padres Nóbrega e Anchieta e dos textos do padre Serafim Leite (“principal historiador jesuíta que escreveu sobre a Companhia nos tempos do Brasil colonial”, acredita Tovar), levaram o pesquisador ao livro de doações para a conclusão da obra da igreja. Entre 1926 e 1930 foram 982 listas de donativos em dinheiro ou produtos. “Vendo este material é possível concluir a forte ligação entre os militares e a igreja. Muitos donativos foram feitos por oficiais. E isto pode ter relação com Nossa Senhora das Vitórias, que passou a ter muitos fiéis no período da 1ª Guerra Mundial”, contou

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Foto de 1920 mostra a igreja lotada e frequentada pela elite que habitava os casarões de Botafogo

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Nesta foto recente é possível ver o altar mor, com a imagem de Santo Inácio, e os desenhos da cúpula

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uma entrada totalmente independente. Fica claro que a intenção não era fazer apenas um espaço religioso do colégio. Era uma obra para a toda a sociedade, assim como já havia sido feito no Morro do Castelo”, explica. “E vale lembrar que a Botafogo da época não tinha prédios. A igreja era uma das edificações mais altas e, não por acaso, foi construída em uma curva. Acredito que podia ser vista desde a Praia de Botafogo. Era uma referência dentro do bairro”. O pesquisador lembra que uma das formas de afirmação das ordens religiosas era através da visibilidade. Não à toa várias igrejas e conventos ficam no alto de morros - “São Bento, convento de Santo Antônio e a própria igreja jesuíta no Morro do Castelo”, enumera o professor. “Vale ressaltar que ainda não tínhamos o Cristo Redentor. A fachada alta e voltada para os fiéis, era uma forma criar conforto para as pessoas e formar uma devoção para o santo em questão”, alerta Tovar.

Segundo o historiador, a estrutura arquitetônica do altar faz referência à expansão áurea dos jesuítas, no século XVII, com forte inspiração na igreja sede da Companhia de Jesus, em Roma, a Igreja de Gesu. “Há influência do maneirismo. A imagem do altar mor, de Santo Inácio, é cópia da que existe em Roma”, afirma o pesquisador. (boxinho de maneirismo) Tovar destaca o valor artístico de dois mosaicos de altares laterais. “Um é sobre os 40 mártires do Brasil e outros são os ‘Lírios da Companhia’, que são santos ligados à proteção dos estudantes, deixando clara a ligação entre a igreja e o colégio”, explica. os (foto dos mosaicos) Outro destaque são os três portais da igreja, feitos de Pedra Lioz portuguesa (uma espécie de mármore), que formam um conjunto e que também vieram do Morro do Castelo. Eles seriam usados na igreja que teve as obras paralisadas com a saída dos jesuítas do Brasil. “São obras

do século XVIII e representam a ligação da igreja da Rua São Clemente com a do Morro do Castelo. Por terem sido pintadas, é mais difícil de identificar, mas já falei com a direção da escola e a ideia é voltar ao original”, disse Tovar, sem esquecer de uma das peças mais representativas da escola, que também fez a viagem Centro da cidade / Botafogo: o Sino que fica no pátio central do colégio e que dá nome a esta revista. Quando a igreja fica pronta, há registros de que a mesma era frequentada pela elite de Botafogo, até então um bairro nobre de mansões e que anteriormente chegou a abrigar chácaras e até mesmo plantações de café. “Na pesquisa, nos deparamos com documentos que citam as presenças de Getúlio Vargas, mais de uma vez, e de Marechal Hermes. Costa e Silva também passou pelos bancos da igreja”, enumera Tovar, alertando para a importância de se receber um presidente da república.


Antônio Sartori: irmão jesuíta que foi mestre de obras e responsável pela construção da igreja. “Estou atrás de mais dados sobre ele”. Francisco Vidal Gomez: era o engenheiro responsável. “Ainda estamos atrás do arquiteto que projetou a igreja”.

Cesar Tovar e o altar para Nossa Senhora das Vitórias ao fundo

“Logo após a publicação deste livro, recebi o convite do colégio. Montamos um projeto e a direção da escola aprovou. Estamos na fase de pesquisas, construindo esta história em migalhas. Para mim também é um desafio, pois estou saindo da fase do Brasil colonial, que é minha especialidade”, explica o professor, que está preparando o material sozinho. “Não comecei a escrever ainda. Pesquiso desde o fim de julho e ainda estou descobrindo algumas coisas”, complementa.

Maneirismo: um estilo jesuítico A palavra deriva do termo italiano maniera, “maneira”, indicando o estilo pessoal de determinado autor. Historicamente, o Maneirismo vinha sendo considerado como a fase final e decadente do grande ciclo renascentista, mas hoje é reconhecido como um estilo autônomo e com valor próprio, e que já aponta para a arte moderna. Desenvolvido na Europa, aproximadamente entre 1515 e1600, o maneirismo é mais estudado em suas manifestações na pintura, escultura e arquitetura da Itália, onde se originou, mas teve impacto também sobre as outras artes e influenciou a cultura de praticamente todas as nações europeias, deixando traços até nas

suas colônias da América e do Oriente. O maneirismo também ficou conhecido como estilo jesuítico. A Companhia de Jesus adotou esse estilo (prático e elegante) e o empregou na construção de muitas de suas igrejas durante o período de expansão para as colônias nos séculos XVI e XVII. Tem um perfil de difícil definição, mas em linhas gerais caracterizou-se pela deliberada sofisticação intelectual, pela valorização da originalidade e das interpretações individuais, pelo dinamismo e complexidade de suas formas e pelo artificialismo no tratamento dos seus temas, a fim de se conseguir maior emoção, elegância, poder ou tensão.

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Anna de Chermont Rodrigues: secretária do “Apostolado de oração da Igreja de Santo Inácio”, era responsável pelas atas. “Quando o material é redigido por ela a pesquisa avança muito. Ela era muito organizada. Volta e meia ficava doente e não fazia as atas. Eu me pegava torcendo pela recuperação dela”, conta Tovar.

O convite feito para o professor Cesar Tovar não veio por acaso: aconteceu após a publicação de seu livro sobre o convento de Santo Antônio, “Memória da arte franciscana na cidade do Rio de Janeiro”, em 2011. “Fiz este trabalho com outros dois professores da PUC, onde também dou aulas. Mas a pesquisa vem desde de 2004”, conta. Antes de se aprofundar no trabalho dos franciscanos, o professor já estudava o Brasil colonial e o papel das ordens religiosas, além da arte na mesma época. “Igreja e a arte estão muito ligadas”. Em 2004 fiz uma especialização e entrei para um grupo de pesquisa focado nos franciscanos. Fiz a minha monografia nesta área e fui convidado para fazer uma pesquisa para o Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) sobre os conventos do Nordeste na época do Brasil colonial. A intenção seria apresentar o material para a Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura). Foi quando parti para o mestrado neste tema, que ajudou no livro lançado em 2011”, relata Tovar.

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Maria José de Amarante: responsável por quase metade das listas de doações. Parece circular bem entre os militares. “Só descobri que ela é autora do hino da ‘Pia união das filhas de Maria’. Pelo menos os nomes são os mesmos”, diz Tovar.

Autor do livro é professor do CSI

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Pessoas que estão na história da construção da igreja:

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Esculturas recuperadas

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Obras de arte ficam no hall da escola

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Após um ano de trabalhos, a equipe de especialistas do Ateliê Marylka Mendes deu por concluída a restauração do Conjunto Escultório do Calvário, instalado no saguão de entrada do Colégio Santo Inácio. As três imagens barrocas, em madeira dourada e policromada, representando Jesus crucificado, Nossa Senhora das Dores e São João Evangelista, foram criadas entre fins do século XVII e início do século XVIII, por autores desconhecidos. Segundo a restauradora Marylka Mendes, foram encontradas diferentes camadas de tinta e materiais diversos sobre a pintura original. “Quem buscou melhorar o aspecto das imagens, desgastadas pela ação natural do tempo, não

tinha ideia do material adequado a ser empregado, nem do valor artístico dessas figuras”, disse Marylka. Os especialistas se surpreenderam com o realismo dos ferimentos do corpo de Cristo. “A dramaticidade das figuras e seu aspecto trágico são típicos do período barroco, quando se fazia a representação agressiva do sofrimento de Cristo”, explicou Marylka Mendes. A restauração, que custou R$ 150 mil, exigiu a importação de materiais da Itália, a fim de manter a maior semelhança possível com o que se utilizou originalmente na composição das estátuas. Todas as etapas da recuperação foram acompanhadas e registradas por uma especialista da Universidade Federal do Rio de Janeiro. (fonte: CSI)


Bons tempos do Colégio Santo Inácio, onde eu entrei em 1956 para o segundo ano do que se chamava então ginásio... Meninos que nós éramos, não sabíamos como era (ou é) alta a proposta pedagógica dos jesuítas. Muitos anos depois é que eu fui ler sobre o que eles fizeram em educação. Fernando de Azevedo, que não era católico, no seu livro clássico “A cultura brasileira”, faz um retrato soberbo do projeto de educação jesuítica, posto em prática com uma energia e uma coragem sobrehumanas... Não sabíamos, mas a cultura estava um pouco no ar, no grande prédio da rua Sâo Clemente. Havia aulas de latim, além do francês, claro. Alguns professores eram verdadeiros eruditos. Mas a sorte que eu tive é que, naqueles tempos, ainda havia clássico e científico. E assim, entrando no segundo grau, pude cuidar mais de História e Português do que de Física e Química - para não falar na Matemática. Nada contra; mas não era a minha praia. E assim, encerrando o Clássico, pudemos encenar, com muito sucesso, uma peça de Gil Vicente – o “Auto da barca do inferno”. Outra aventura “humanística” era a Academia de Letras Santo Inácio, que foi alvo de muita gozação (as iniciais faziam ALSI), mas também oportunidade para conversar sobre leituras, para concursos literários. Chegamos a convidar um acadêmico de verdade – Múcio Leão –, que foi generoso com os nossos arroubos juvenís (a mim me coube o discurso de saudação). Importantes foram as aulas de filosofia

beneditinos e a tradição secular do canto gregoriano. A liturgia perde um pouco com isso, tudo ficava bastante aleatório. Os prêmios escolares eram um estímulo à excelência. Isso depois se perdeu. Fomos ficando democráticos demais, como se uma distinção acadêmica fosse uma humilhação para quem não ganhou. Mas não é a tradição da Companhia de Jesus. Quando a gente estuda um pouco essas histórias, vê as coisas incríveis feitas pelos filhos de Santo Inácio. Aqui no Brasil, tivemos o fabuloso Anchieta, verdadeiro mártir da educação e da evangelização. Dessas coisas não se falava muito, no meu tempo. Mas é evidente que elas estavam no ar. Era uma influência fina, que de algum modo penetrava. Marca para toda a vida. * é jornalista e membro da Academia Brasileira de Letras

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Por Luiz Paulo Horta (61)*

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Acervo ABL

– que uma parte da turma (as primeiras carteiras) acompanhava, a outra metade ficando naqueles cochichos de fundo de sala. Assim eu encontrei a primeira pessoa que me deu o gosto verdadeiro do conhecimento: Fernando Marinho Nunes, padre jesuíta que depois deixou a batina. Ele falava sem nenhuma pressa, num tom de voz macio, e tinha intuições que eu achava maravilhosas. Outros pensavam diferente. Num dia em que ele falava sobre filosofia grega, alguém se levantou lá do fundo e perguntou: “Professor, é verdade que Platão era viado?” Música não havia muito. A única vez em que se tentou uma palestra “pedagógica” sobre música clássica, foi um show de gozações. Mal sabia eu que da minha turma do clássico fazia parte um garoto chamado Edu Lobo. Repetindo um pouco o que eu já disse: acho que a cultura, ali, estava no ar, não era uma coisa muito explícita. As aulas às vezes eram medíocres. Inquietação de adolescente não é o melhor clima para pensamentos tranquilos. E, apesar disso, ali havia um “algo mais” – traduzido, por exemplo, no magnífico pátio central, estilo claustro. Só caminhar por ali já arrumava um pouco as idéias. E nos pátios do fundo, onde se jogava muito futebol, também havia espaço para outras atividades. Eu, por exemplo, caí sob o fascínio do xadrez; e vendo que eu não era o único, o colégio chegou a instalar uma salinha com peças e tabuleiros, que era possível frequentar depois da missa de domingo. Em matéria de música, havia o heróico padre Cerrutti (bom teólogo), que, pulsando a sua veia italiana, organizou um coro para cantar o “Va Pensiero”, de Verdi, e outras peças. Mas, nesse terreno, os jesuítas não podem concorrer com os

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artigo

Cultura no ar

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Um rio de imagens

Um ensaio sobre o projeto que leva cinema a cidades à margem do Rio São Francisco e sua população

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Textos e fotos André Teixeira (86) andremteixeira@gmail.com

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alco de inúmeras lendas e histórias, orgulho das Minas Gerais, onde nasce e tem seu maior trecho, fonte de renda e sobrevivência para milhares de brasileiros, motivo de discórdias sobre sua transposição, o Rio São Francisco estava, para mim, no campo dos “projetos fotográficos a realizar”. Sem prazo definido, apenas uma ideia ali, hibernando, à espera de uma oportunidade ou da decisão de partir, por conta própria, para o desconhecido. A oportunidade, que parecia cada vez mais improvável, surgiu em forma de convite para acompanhar a turma do Cinema no Rio São Francisco na sua sétima caravana. A idéia do projeto é levar o cinema nacional a populações que, em sua maioria, nunca botaram os olhos numa tela grande, numa região praticamente parada no tempo e, apesar de sua importância histórica, esquecida pelas

autoridades. “Levamos o cinema a locais desprovidos de espaços de exibição, oferecendo cultura, arte e entretenimento à população com acesso restrito a esses bens. Nossa ideia é valorizar e resgatar a cultura local“, explica Inácio Neves, diretor da CineAr Produções e responsável pela execução do projeto, que conta com patrocínio da Oi e apoio da Usiminas e Cemig, além do incentivo da Lei Estadual de Incentivo à Cultura do Governo de Minas Gerais. Seriam nove dias descendo o rio, com exibição de filmes em oito locais. Nelas, além de dois longa-metragens, são exibidos curtas e um pequeno documentário sobre a própria cidade, abordando seu folclore e cultura, numa forma de estimular sua preservação. O grupo também promove uma oficina de fotografia para estudantes entre 12 e 16 anos, cujas fotos também são exibidas no telão, num


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dos momentos mais divertidos das sessões. Uma chance imperdível de conhecer e fotografar, sem pauta pré-definida, uma região que me fascinava desde a infância. E de ver de perto a concretização de uma idéia que, quando apresentada pela primeira vez, parecia impossível. Para um fotógrafo, o primeiro cartão de visitas da região é o sol. Forte, impiedoso, lançando uma luz dura, realçada pela rala vegetação. Por questões logísticas - o barco só pode navegar durante o dia -, chegávamos às cidades ribeirinhas no começo da tarde. No seco inverno local, as poucas nuvens parecem servir apenas como contraponto ao inacreditável azul do céu. Nesse panorama, os mora-

dores sabiamente se escondem durante a tarde, deixando as cidades – pequenos vilarejos aparentemente parados no tempo - desertas. Os elementos clássicos para um ensaio propriamente dito – pessoas, trabalhos, diversões -, portanto, não estavam presentes, ou pelo menos eram escassos. Restava, assim, explorar ruas quase sempre vazias, a relação dos moradores com o rio e, principalmente, as projeções. Para pessoas que têm na televisão a maior fonte de diversão, a chegada da caravana, em si, já é um acontecimento: gente nova pelas ruas, um telão inflável sendo montado, cadeiras espalhadas pela rua, teste do projetor, novidades demais para

quem parece condenado a uma rotina interminavelmente igual. Essa interação dos moradores com o projeto foi o foco principal de meu trabalho. Impossível não prestar atenção, também, em outros aspectos do local. Praças multicoloridas, pequenos cemitérios em que os que já partiram parecem presentes, a passagem do tempo representada pelo menino na bicicleta e o senhor na cadeira de rodas...e a integração entre o ribeirinho e seu amado Velho Chico, que, ao entardecer, tornam-se um ser só. Uma viagem, enfim, que rende uma profusão de imagens, num projeto que, depois desse pontapé inicial, certamente terá outros capítulos.


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perfil

Uma vida dedicada ao Colégio Santo Inácio Com 60 anos de casa, Zezinho só tem boas lembranças e não pensa em parar

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em mesmo os cabelos brancos são capazes de denunciar a idade do mais antigo funcionário do Colégio Santo Inácio - até porque ele já os ostenta desde a década de 70. Com 60 anos de serviços prestados à instituição, Zezinho é a história viva do colégio - pelo menos de mais da metade dela, já que o colégio é de 1903. Para a maioria dos antigos alunos, sequer precisamos explicar que José Gonçalves da Rocha (sim, este é o nome completo dele) é inspetor de série e, mais importante para o público masculino, responsável pelos tradicionais campeonatos de futebol que acontecem durante os recreios. Mais do que isso. Zezinho é aquele cara que chama atenção com educação, pode até ser duro, mas sem perder a ternura jamais, e que, aos 76 anos de idade, ainda entra no colégio com a mesma felicidade que tinha aos 15 anos, quando entrou no prédio da São Clemente trazido por seu tio, que era funcionário da escola. Com uma simples operação matemática, alguns já podem estar reclamando: “estão tirando um ano de trabalho do Zezinho”. Realmente estamos. É que durante o serviço militar ele esteve afastado do colégio, mas voltou logo que pode. “Cheguei a pensar na carreira militar. Sempre gostei de ordem e disciplina e me dei muito bem no exército. Montei muita

guarda para o presidente Getúlio Vargas, no Catete”, lembra. Mas a relação com o colégio já era forte o bastante para que a volta fosse inevitável. “Quando comecei aqui, fui colocado para trabalhar na igreja. Fazia limpeza, vendia velas, enfim, ajudava o sacristão. Além disso, na Asia operava o mimeógrafo, às terças e quintas. Fui recebido de braços abertos por todos e fui ficando querido pelos funcionários e padres. Quando completei um ano de Exército, o irmão Laurindo falou com meu tio que a vaga ainda era minha. Expliquei a situação para o meu tenente, que queria que eu seguisse carreira militar, e ele entendeu”, contou. Zezinho estava então começando a seguir os passos de seu tio, que trabalhou por muitos anos no CSI até se aposentar e era conhecido na escola como vovô “os cabelos brancos são uma característica familiar”. Ao voltar do serviço militar as funções continuaram as mesmas, até que irmão Laurindo - ele novamente - o chamou para ser seu ajudante de ordens. “O irmão jesuíta não é sacerdote, mas é religioso”, explica Zezinho, mostrando o conhecimento adquirido nos anos de convivência com a Companhia de Jesus. “Irmão Laurindo cuidava dos funcionários. Quando ele me chamou para ser seu ajudante de ordens cheguei a argumentar que era muito jovem, mas ele insistiu. Acabei me dando bem na função. O mais

importante é se manter a mesma pessoa, mesmo quando se é promovido. Promoções nunca me subiram a cabeça”. Ficou nesta função por aproximadamente 10 anos. “Neste período iniciei um curso de química industrial por correspondência, mas um professor me disse que o diploma não valeria nada e acabei parando, mas aprendi algumas coisas que me ajudaram no trabalho, como trabalhar com verniz”, recorda-se. Em 1964 surgiu o convite que mudaria sua trajetória dentro do colégio. “O padre Moacir Conrado Mesquita era mestre, uma espécie de coordenador. A hierarquia era bem diferente naqueles tempos. Existia o prefeito de disciplina e de divisão. Ele, então, me chamou para ser vice-prefeito de divisão. O prefeito seria o Renato, que trabalhou aqui no


bravo vice-prefeito de disciplina teve de lidar, entre elas os namoros. “É claro que começaram a haver casos de beijos exagerados, que acontecem até hoje. Mas isso nós resolvemos na conversa. Eu já começava dizendo que adorava namorar e que era muito saudável, mas era importante saber a hora certa e ter a exata noção do local onde estávamos. O pessoal sempre entendeu numa boa”. Mas na trajetória de Zezinho também passaram turmas mais difíceis. “Engraçado, enquanto os professores disseram que com o tempo os alunos ficaram menos estudiosos, mais bagunceiros ou até mesmo menos respeitosos, eu tenho outra percepção. Antigamente, havia muita repressão. Os alunos não podiam falar, tinham que levantar quando o professor entrava em sala, enfim, havia

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dos jogos, fui conversar com a garotada sobre a importância do esporte e que o mais importante era a convivência, não a vitória a qualquer custo... enfim, fui ganhando a confiança deles pelo futebol. E este passou a ser um grande aliado no meu trabalho. Em vez de suspender um aluno, que poderia aproveitar o dia como folga, na praia, eu proibia de jogar bola. Tinha muito mais efeito”. A entrada das meninas foi outro fator que ajudou Zezinho em sua tarefa diária. “Além das meninas serem mais tranquilas, o comportamento dos meninos muda na frente delas. A rapaziada deu uma acalmada. Além disso, acredito que Deus fez o mundo com homens e mulheres para que todos convivessem. O ambiente ficou mais leve”. Mas surgiram outras questões, com as quais o nosso

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colégio por muitos anos, inclusive com orientação vocacional para os alunos que iriam fazer vestibular. Já o conhecia, pois ele fazia engenharia na PUC, que ficava no prédio aqui ao lado, em frente ao estacionamento. Ele seria o primeiro leigo a ocupar o cargo e eu teria o meu primeiro contato com os alunos”. E nesta função ele se encontrou, pois a exerce até hoje. Segundo Zezinho, o ano no Exército o ajudou bastante. “Eu sempre fui muito disciplinado e isto não é sinônimo de ditadura, pois passei por duas e sei a diferença. A primeira coisa que fiz foi organizar o futebol do recreio”, diz, antes de lembrar que o colégio ainda era exclusivamente para meninos. “Cada série tinha o seu material, não é como hoje que temos um departamento de esportes. Organizei uniforme, fiz a tabela

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Os corredores da escola são o local de trabalho do inspetor: “Os problemas eu sempre resolvi no papo”

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Apesar de ter entrado na escola em 1951, Zezinho aparece pela primeira vez em um quadro de formatura em 1975

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muitas regras. Acredito que isto gerava uma revolta e, quando eles tinham a chance, aprontavam como forma de extravasar. Hoje em dia os corredores são mais barulhentos, há menos cerimônia, mas também há mais afeto. Os alunos estão mais próximos e isso é bom”, acredita Zezinho. Mas quando pedimos para ele citar uma turma difícil, sem perder muito tempo pensando, ele lembra da que se formou em 1989. “Foi a que fez a piscina ficar roxa. Não que a série toda fosse complicada, mas alguns alunos eram mais agitados. Mas mesmo assim, ficamos muito amigos, tanto que fui patrono deles. O que sempre fiz questão de marcar, não só com eles, mas com todos os alunos, é a importância de se assumir o erro, a responsabilidade, e arcar com as consequências. Ninguém espera que crianças e jovens fiquem parados e só obedeçam, mas tem que assumir. Tive este papo com eles e foi tudo resolvido”, lembra-se, sem esquecer que também foi

Sem medo de errar, afirmo que estou entre os homens mais felizes da terra“

patrono das turmas de 75 e 93. As mudanças implementadas com o passar dos anos, na visão de Zezinho, contribuíram com o seu trabalho. Hoje em dia, os alunos não têm salas fixas. A cada tempo eles se movimentam, indo até a sala dos professores, estes sim com seus espaços cativos. “Achei esta mudança positiva. Muitos podem achar que é uma complicação, pois aumenta o

movimento e a possibilidade de bagunça. Eu acho que é mais uma forma deles extravassarem a energia e se concentrarem nas aulas”, acredita. Mas esta afinidade com a modernidade parece parar por aí. Zezinho é o único dos inspetores a não usar rádio transmissor - “eu usei um tempo, mas vivia deixando em cima de alguma mesa, não deu certo para mim” - e admite que, apesar de ter três celulares, não anda com nenhum dos telefones. “Minha mulher volta e meia me dá umas broncas. Eu sempre digo para ela ficar tranquila, pois vou chegar em casa”, diverte-se. A bronca da esposa deve ser fruto da preocupação com o marido, que diariamente faz o trajeto Nilópolis/Botafogo/ Nilópolis. “Logo que vim trabalhar no colégio, passei a morar numa espécie de república de funcionários, que tinha aqui dentro mesmo. Isto foi de 1951 até 1965, quando me casei. Mas a minha casa sempre foi em Nilópolis. Eu vinha


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novembro março 20122012

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um empecilho para Zezinho. Já aposentado, desde 1996, mas sem abandonar o trabalho - “nem penso nisso, enquanto puder contribuir vou ficando” -, o inspetor continua a dar suas corridas diárias, que muitos alunos se acostumaram a acompanhar na área externa da escola. “Antes da construção do novo complexo eu corria no colégio, mas agora teria que dar muitas voltas no campo para correr os meus três quilômetros diários. Resolvi, então, correr perto de casa, antes de sair para o trabalho”, conta, antes de se corrigir. “Não corro todos os dias, pois sempre descanso aos domingos”. O futebol ele resolveu abandonar para evitar contusões, mas as peladas no colégios ainda estão na lembrança. “Tínhamos um timaço de professores. Jogamos por uns 12 anos, sempre aos sábados. Era bem difícil ganhar da gente”. Toda esta história fez com que Zezinho tivesse uma relação especial com os antigos alunos. “Volta e meia ouço um grito na rua: ‘Oi Zezinho, você não mudou nada’. Sempre participo dos churrascos das turmas de 75 e 78 e é aquela festa quando nos encontramos. Quando minha mulher esteve no Inca, foi tratada por um antigo aluno, que nos deu uma atenção especial. E é isso que fica mesmo, o amor fraterno, a camaradagem e o respeito”. O mesmo vale para seus colegas de trabalho. “Do pessoal mais antigo ficaram o Thales e o Miguel Jorge, com mais de 30 anos de casa. Mas tem muita gente com 20 anos de Santo Inácio, entre eles alguns que foram meus alunos. E sou muito amigo de vários que já saíram”. Atualmente Zezinho tem quatro filhos de antigos alunos na série em que trabalha. “Isso é muito bacana. Sem medo de errar, afirmo que estou entre os homens mais felizes da terra. Sempre tive uma família boa e grande, tive dois bons casamentos, nunca fiquei desempregado, trabalho em um lugar em que me sinto em casa e tenho muitas amizades conquistadas ao longo de minha vida”. E pelo ânimo, muitas outras ainda virão.

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para o colégio na segunda, ficava até quarta, quando ia para casa ver a família, e voltava para trabalhar na quinta cedo. Gostava muito deste esquema. Tínhamos uma área de convivência, onde jogávamos um carteado. Era bom”, recorda-se. Desde 1965, no entanto, Zezinho enfrenta o trânsito da Avenida Brasil. “Os engarrafamentos estão cada vez piores. Por muitos anos chequei a acordar às 4h para estar no colégio às 7h, sem falar nos sábados. Hoje em dia está mais tranquilo. Não trabalho nos finais de semana e chego às 10h”, conta. Do primeiro casamento, Zezinho tem uma filha, hoje com 42 anos, que lhe deu um neto, já com 16. “Fiquei casado por 28 anos com uma mulher que era tudo para mim. Minha amiga, companheira, namorada. Infelizmente ela teve câncer e morreu. Chorei a morte dela por dois anos, foi muito duro para mim. Nesta época o esporte me ajudou muito. O pessoal sempre me chamava para jogar bola e eu ia tentando me distrair”. Quando conheceu sua atual esposa, nem pensava em namorar. “Fomos conversando, nos conhecendo... e comecei a olhar para ela de uma outra forma. Resolvemos, então morar juntos. Dei minha casa para minha filha, pois as recordações dali eram dolorosas e fui recomeçar. Após seis meses sentei para conversar com minha atual mulher e decidimos que era para valer. Na mesma hora resolvemos nos casar. Estou com ela há 17 anos”. E com a nova companheira Zezinho ganhou mais duas filhas. A primeira veio com a esposa, que já havia sido casada - “conheci ela com 12 anos e terminei de criá-la, é minha filha como as outras” - a outra veio depois de sete anos de casado. “Engraçado que levamos um tempão para resolvermos ter outra criança. Mas começamos a conversar sobre o assunto e ela queria bastante. Eu também me animei e veio a Manuela, que vai fazer 10 anos, e é apenas um mês mais velha que a minha neta, da minha filha do meio”. A idade, definitivamente, não tem sido

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antigos alunos

Uma lembrança crocante

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Por Alejandro Gómes Gil*

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Quando lembro da minha infância é impossível dissociar de uma lembrança ímpar, o momento do recreio, quando saía correndo para pegar a fila e escolher o hambúrguer com aquele queijo queimado na beira (quanto mais queijo torrado melhor!). Minha mãe comprava semanalmente (talvez mensalmente) vários tíquetes para que eu comesse o meu hambúrguer favorito. Diariamente ela me entregava um tíquete de comida, antes que eu entrasse no ônibus 14, que passava pela frente da minha casa, na Rua Anita Garibaldi, em Copacabana. Lembro de entrar no ônibus feliz, com aqueles degraus enormes, com o motor do lado do motorista que esquentava a tampa; eu ficava no fundo esperando passar por uma lombada para pular junto numa velocidade que me parecia que ia voar (devia estar no máximo a 50 km/h). Passava a manhã na aula, mas a fome aumentava quando ia chegando perto do recreio. Eu saía como um raio direto para a fila do hambúrguer. Tinha vezes que minha mãe me entregava o dinheiro para comprar, pois ela não tinha comprado os tíquetes e eu tinha que ir primeiro no caixa. Lembro das vezes que a fila era enorrrme: sem dúvida minha fome aumentava essa fila em 300 pessoas. Mas quando eu tinha o ticket na minha mão eu era O CARA. Aquele pedaço de papel, muitas vezes quase apagado, era um tesouro para aquela criança de 6,7,8... anos. Pronto, lá estava eu frente a frente com a pessoa que pegaria meu papel de ouro e trocaria por um delicioso hambúrguer COM A BEIRA CHEIA DE QUEIJO

QUEIMADO, TORRADO hummmmm... Estava por fim com ele, suculento, quente e cheiroso na minha mão. Logicamente a primeira mordida, a primeira experiência quase transcendental, era comer aquele queijo crocante da beira do burguer. Existia sim algo que poderia chegar a concorrer com esse lanche: O FUTEBOL! Tenho gravadas as vezes que saíamos pelo corredor do prédio novo que dava no campo de futebol, para pegar as faixas do Flávio, aquele homem magro, o mestre que sabia tudo de futebol. A gente arrancava as faixas dele. Tinha algumas que eram um fio com um nó mal feito e outras que eram novinhas, não importava. Quem conseguia ter uma faixa no recreio era a criança mais feliz do mundo, pelo menos durante 20 minutos. Muitas outras lembranças marcam a minha infância no CSI... Minha turma inaugurou o CA. Lembro-me perfeitamente quando foi construído o prédio novo, tinha uma gaiola com um tucano,

que eu ficava cutucando para ver se ele me mordia (curiosidade de criança). O Carlos, que organizava os jogos de queimado nas quadras de cimento no fundo; o saudoso Pe. Araújo, que fez a minha primeira comunhão; os motores dos ônibus ligados prestes a sair da garagem, parando otrânsito da São Clemente por vários minutos; as ações sociais no morro Dona Marta, quando subíamos com mães de alunos para levar leite para as mães solteiras na creche. Meus amigos Gustavo Calasans, Gustavo Carvalho, João Pedro Paiva, Eduardo, Leonardo, Otávio ... e tantas coisas legais que me fez ter uma infância inesquecível. * Alejandro Gómez Gil estudou no colégio do CA (foi da primeira turma de alfabetização do CSI) à quinta-série, quando foi morar na Espanha, por conta de uma transferência de seu pai, em 1984. Sua turma se formou em 1990 e ele jamais esqueceu dos anos que passou no Santo Inácio - por isso resolveu dividir algumas de suas memórias afetivas com os leitores. Atualmente, Alejandro mora em São Paulo (desde 2000) e ocupa o cargo de Diretor da Wolters Kluwer do Brasil.

Faça como Alejandro, compartilhe conosco suas histórias Envie textos, fotos, e comentários para minhasino@revistasino.com.br e facebook.com/revistaSino


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Associação dos Antigos Alunos dos Padres Jesuítas - RJ Rua São Clemente, 216 - Botafogo Rio de Janeiro - RJ Tel: (21) 2527-3502 contato@asiarj.org.br

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