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TEATRO E LITERATURA – LUIZA PONTESA
HORA DA ESTRELA DE CLARICE LISPECTOR – UM MERGULHO CÊNICO, EM
Forma De Musical Nos Palcos Cearenses Comemorando 40 Anos
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Texto de Luiza Pontes
Foto: Reprodução
Falar no romance A Hora da Estrela é, sem dúvida, compreender a maravilhosa autora Clarice Lispector (1920-1977), de origem judia. Formada em Direito, casada com um diplomata, foi jornalista, romancista, contista e autora de livros infantis, feitos inicialmente para os filhos. Para os críticos, esta obra traz reflexos do período em que a autora morou em Recife e, mais tarde, quando fixou residência no Rio de Janeiro. A autora criou uma forma específica de escrever com descrições psicológicas profundas, direcionada pela epifania – momento de revelação de seus personagens, com uma literatura intimista, proporcionando uma visão sensível da existência humana, num romance psicológico. Foi uma das mais importantes escritoras da segunda metade do século XX, pertencente à Terceira Geração Modernista Brasileira.
Em novembro de 2017, a Caixa Cultural de Fortaleza (CE) teve o prazer de apresentar um musical adaptado em comemoração aos quarenta anos da obra A hora da Estrela, de Clarice Lispector – tornou-se um cartão de visitas literário e um dos livros mais lidos da escritora – e que foi lançado pouco antes dela morrer, em dezembro de 1977. Esta montagem apresentou um toque sutil de melancolia e solidão, fundamentando a proposta cênica. Havia uma mistura de gêneros culturais como Teatro, Música e Literatura.
A montagem da obra, em forma de musical, contou com músicas originais, direção musical de Liliane Seco e letras de Allan Deberton. Uma adaptação de André Araújo e Allan Deberton, com quatro talentosos atores: a paulista Tuane Toledo, interpretando Macabéa; os cearenses Germana Guilherme, interpretando Glória e a Madame Carlota; Vinicius Cafer interpretando Rodrigo S.M. e Olímpico de Jesus; Larissa Goes interpretando a Garota do Rádio juntamente com a banda de músicos ao vivo. A direção foi feita pelo talentoso André Gress. A preparação de atores foi da fantástica atriz Marcélia Cartaxo, que em 1985, fez a protagonista Macabéa no cinema, direção de Suzana Amaral. Uma encantadora produção de Deberton Entretenimento.
A plateia foi convidada a mergulhar no mundo fantástico de Macabéa – uma jovem nordestina alagoana, virgem, vinda do interior, órfão de pai e de mãe, criada por uma tia rígida e que chega no
Rio de Janeiro, em busca de sua própria sobrevivência. Tornou-se uma datilógrafa, adorava comer cachorro quente e Coca-Cola, e vivendo assim, um mundo paralelo, refletindo seus sonhos, desejos e conflitos interior com seu namorado Olímpico de Jesus. O musical utilizou em muitos momentos narrativas musicais, prevalecendo a linguagem do absurdo. O teatro musical é uma arte para poucos e exigiu uma pesquisa direcionada para que o processo de adaptação fosse preciso. Nos deparamos com uma história com uma temática social, provinda de uma obra literária instigante, de cunho autobiográfica.
Um Processo Epif Nico De Clarice Lispector
Como de costume, organizou a mesa de estudos com os rascunhos de trechos lidos do processo de Letramento Literário e também, de Letramento Digital. Relacionou as folhas num escaninho e, rapidamente, revisou os escritos de mais um artigo científico que estava prestes a publicar. Esta tinha sido a rotina deste final de semana, pois as madrugadas de sábado para domingo eram decisivas para os estudos.
De repente, encontrou uma folha solta, meio que perdida e aceleradamente leu este escrito. Ficou com um sorriso nos lábios pois lembrou que havia feito o conto de forma frenética e decisiva, lembrou das várias tentativas que tinha feito em concentrar os esforços, em fazer uma crônica ou conto com uma temática infanto-juvenil
Lembrou com alegria que tinha em linhas estratégicas contado de forma precisa a história da cachorra Bia e suas descobertas pela casa, mais especificamente pelo quintal, onde ela foi adotada, já que tinha surgido na escola que trabalho, e aos poucos, foi me conquistando, sendo levada pra minha casa, tornando-se o xodó também de meus pais. Logo, envolveu-se com o cachorro Beethoven, num passeio pelo quintal, convivendo de forma equilibrada com os poucos patos que transitavam pelo espaço. Tudo era muito novo
Um belo dia, Bia, curiosamente, pulou para o quintal do vizinho, como um processo epifânico de Clarice Lispector, subindo em cima de umas telhas e tijolos colocados ao pé do muro do quintal da minha casa. Rapidamente, minha mãe liga para que eu possa resgatá-la. O mais interessante é que tentei chamá-la pelo muro e, como não logrei êxito, decidi pedir licença, indo ao vizinho que tinha uma empresa comercial, resgatá-la. Bia estava assustada, mas feliz por esta nova peripécia canina, ou melhor, seu momento epifânico, de descobertas, lembrando os escritos de Clarice Lispector.
E os dias transcorreram leves e tranquilos. Bia era uma cachorra branca, com olhos castanhos, um pelo um pouco grotesco, mas com cachos que rodeavam seu pescoço. Era um pet amável e que, aos poucos, foi adaptada à rotina da minha casa. O xodó com o Beethoven lhe trouxe uma gravidez delicada, mas chegou a ter sua ninhada de lindos cachorrinhos, a mistura das raças. Beethoven era um poodle cinza e Bia sem raça definida, geraram então filhotes lindos, que foram prontamente, após o período de três meses, adotados.
Lembro de Bia e de Beethoven e os tenho registrados em fotografias que marcaram minha vida. Hoje, tenho um cachorro de nome Phídias, fruto desta união que encontra-se com uma idade bastante avançada e com um sorriso que me conquistou desde pequeno. Ele tem quatorze anos e, apesar de suas limitações de cachorro idoso, se apresenta de uma forma amável, lembrando o sorriso de sua mãe, Bia, e retratando o pelo cinza de seu pai, Beethoven.
Luiza Pontes é professora, contista, poetisa, pesquisadora, atriz e diretora teatral. Graduada em Letras e Especialista em Pesquisa Científica pela UECE. Mestre em Educação, pela ACU.