Estudos de Direito Processual Civil

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RAPHAEL FUNCHAL CARNEIRO Advogado Pós-graduado em direito tributário

Estudos de Direito Processual Civil 2ª edição

Rio de Janeiro - RJ 2017 1


AO LEITOR O objetivo do presente trabalho é o de reunir num documento único alguns estudos sobre o direito processual civil elaborados pelo autor, principalmente as inovações trazidas pela Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 – Código de Processo Civil. Os artigos versam sobre temas diversos do processo civil, como as normas fundamentais do processo, a tutela provisória, a intervenção de terceiros, a cooperação jurídica internacional, a competência internacional e outros. São abordadas as alterações promovidas pelo Código de Processo Civil de 2015, comparando os seus artigos com o Código de Processo Civil de 1973 e de 1939. Os textos são eminentemente práticos, para a sua utilização por todos os operadores do direito. O autor

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ÍNDICE

1. A tutela provisória no novo Código de Processo Civil ....................................................................... 4 2. A ação de dissolução parcial de sociedade no novo Código de Processo Civil ........................... 22 3. A intervenção de terceiros no novo Código de Processo Civil ..................................................... 41 4. As normas fundamentais do processo: comentários aos artigos 1º a 12 da Lei nº 13.105/2015 – Código de Processo Civil ........... 68 5. Da competência internacional no novo Código de Processo Civil ............................................... 112 6. Apontamentos acerca do direito intertemporal e o novo Código de Processo Civil ...................….. 129 7. A súmula de jurisprudência nº 409 do Superior Tribunal de Justiça e o novo Código de Processo Civil ................................................................... 134 8. O foro contratual e a súmula de jurisprudência nº 335 do Supremo Tribunal Federal .................... 145 9. Reflexões sobre a cooperação jurídica internacional ...................................................... 155 10. Impossibilidade de aplicação de multa por descumprimento de ordem judicial aos advogados públicos ............................................................ 194

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11. A penhora das quotas e das ações das sociedades personificadas ................................. 212 12. O descompasso do procedimento dos embargos à execução na lei de execução fiscal e no Código de Processo Civil ................................................... 226 13. A jurisprudência na jurisdição civil .........… 237 14. O agravo de instrumento no Código de Processo Civil de 2015 ...................................... 271 15. Da ação de regulação de avaria grossa ........ 303 16. Breves considerações sobre a súmula nº 568 do Superior Tribunal de Justiça ............................. 326 17. Aplicação subsidiária do Código de Processo Civil de 2015 as ações de mandado de segurança, mandado de injunção, ação popular e ação civil pública ............................................................... 338 18. Os honorários advocatícios no Código de Processo Civil de 2015 ...................................... 369

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A TUTELA PROVISÓRIA NO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL Sumário: 1. Introdução. 2. A tutela provisória. 3. Tutela provisória de urgência. 4. Tutela provisória de evidência. 5. Conclusão. 6. Bibliografia.

1 – Introdução A lei nº 13.105, de 16 de março de 2015, instituiu o Novo Código de Processo Civil, revogando a lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973, que disciplinava o Código de Processo Civil anterior. Com a edição da referida lei 13.105/2015, que entra em vigor no prazo de 1 (um) ano a partir da data de sua publicação, inovações foram introduzidas no processo civil dentre elas a tutela provisória. Cabe

analisar

a

tutela

provisória

disciplinada nos artigos 294 a 311 da lei 13.105/2015, novo Código de Processo Civil, que se divide em tutela provisória de urgência e tutela provisória de evidência, comparando-a com a tutela

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antecipada e a tutela cautelar do Código de Processo Civil de 73. Analisa-se, também, os requisitos da tutela provisória, o fumus boni iuris e o periculum in mora para a tutela provisória de urgência e a prova inequívoca, o abuso do direito de defesa, o propósito protelatório do réu para a tutela provisória de evidência, o seu procedimento e os recursos cabíveis das decisões de deferimento e indeferimento. 2 – A tutela provisória O Novo Código de Processo Civil, lei n° 13.105/2015, trata da tutela provisória no seu Livro V, artigos 294 a 311, que é constituído em três títulos: título I que trata das disposições gerais aplicáveis à tutela de urgência e de evidência; título II que trata da tutela de urgência e é dividido em três capítulos: capítulo I - disposições gerais; capítulo II do procedimento da tutela antecipada requerida em caráter antecedente e capítulo III do procedimento da tutela cautelar requerida em 6


caráter antecedente e por fim o título III que trata da tutela de evidência. Entende-se por provisório o provimento que não reveste caráter definitivo, tendo duração temporal limitada ao período de seu deferimento e a

superveniência

do

provimento

principal

definitivo. A tutela provisória pode ser cautelar com caráter instrumental e acessório a tutela definitiva, ou pode ser antecipatória do próprio mérito da tutela definitiva. A lei 5.689/73 dispunha acerca da tutela cautelar no seu livro III, artigos 796 a 889, especificando os pressupostos próprios para cada provimento cautelar e no artigo 798 dispondo sobre o poder geral de cautela, diferentemente do Código de Processo Civil de 1939, Decreto-lei 1.608, de 18 de setembro de 1939, que apenas estipulava os requisitos gerais dos provimentos cautelares no seu artigo 675. As cautelares típicas ou nominadas no Código de Processo Civil de 73 eram o arresto, 7


artigo 813 a 821, o seqüestro, artigo 822 a 825, a caução, artigo 826 a 838, a busca e apreensão, artigo 839 a 843, a exibição, artigo 844 e 845, a produção antecipada de prova, artigo 846 a 851, os alimentos provisionais, artigo 852 a 854, o arrolamento de bens, artigo 855 a 860, a justificação, artigo 861 a 866, os protestos, notificações e interpelações, artigos 867 a 873, a homologação do penhor legal, artigos 874 a 876, a posse em nome do nascituro, artigo 877 e 878, o atentado, artigos 879 a 881, o protesto e a apreensão de títulos, artigos 882 a 887, e outras medidas provisionais nos artigos 888 e 889. A tutela cautelar caracterizava-se pela sua provisoriedade, instrumentalidade e autonomia, sendo o seu objetivo primordial assegurar a efetividade do processo principal. Muito embora fosse

constante

a

existência

de

cautelares

satisfativas, motivo pelo qual posteriormente se criou a tutela antecipatória do mérito. Os seus requisitos eram a demonstração do fumus boni iuris e do periculum in mora, 8


caracterizando-se o primeiro como a ocorrência da possibilidade de tornar-se ineficaz o processo principal diante da ameaça de um fato, e o segundo é o fundado receio de dano provável e não meramente eventual ao direito da parte enquanto aguarda a solução da tutela definitiva. Posteriormente foi introduzida a tutela antecipada com a modificação da redação do artigo 273 do Código de Processo Civil de 73 pela lei n° 8.952/94,

podendo

ser

aplicada

a

diversos

procedimentos e diferenciando-se do rito das cautelares. A partir deste momento passa o código a prever uma providência de mérito provisória e urgente mais ampla que a tutela cautelar. Nos termos do artigo 273 do Código de Processo Civil de 73 pode-se antecipar total ou parcialmente uma decisão de mérito diante da comprovação

dos

pressupostos

da

prova

inequívoca, da verossimilhança da alegação, do fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação ou abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu. 9


Exige-se mais do que a aparência do direito, fumus boni iuris, requisito das cautelares. Exige que os fundamentos sejam relevantes e amparados em prova idônea que permita chegar a uma alta probabilidade de veracidade dos fatos narrados pela parte. O receio fundado que é a grande probabilidade da ocorrência de prejuízo grave e o abuso do direito de defesa quando o réu apresenta resistência totalmente infundada ao direito do autor, empregando meios ilícitos na sua defesa. O Novo Código de Processo Civil não possui um título ou capítulo próprio para a tutela cautelar e para a tutela antecipada, mas institui um livro próprio destinado a tutela provisória que engloba a tutela provisória de urgência, antecipada e cautelar, e de evidência. No artigo 301 apenas especifica que a tutela de urgência de natureza cautelar pode ser efetivada mediante arresto, seqüestro, arrolamento de bens, registro de protesto contra alienação de

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bem e qualquer outra medida idônea para asseguração do direito. Nesta parte se assemelha ao Código de Processo Civil de 39 ao fixar apenas os requisitos gerais da tutela de urgência cautelar, sem criar cautelares típicas com requisitos próprios. Por sua vez dispõe no inciso I do parágrafo único do artigo 9º que a tutela provisória não prescinde da ouvida da parte contrária e que a tutela de evidência pode ser deferida inaudita altera pars apenas nos casos dos incisos II e III do artigo 311. O recurso cabível da decisão liminar que concede ou denega a tutela provisória é o agravo de instrumento nos termos do artigo 1.015 do novo Código de Processo Civil. Da sentença que confirma ou revoga a tutela é cabível a apelação, artigo 1009 do Código. 3 – A tutela provisória de urgência A tutela provisória de urgência é regulada nos artigos 300 a 310 do novo Código de Processo 11


Civil, nos artigos 300 a 302 estão contidas as disposições gerais, nos artigos 303 e 304 trata do procedimento da tutela antecipada requerida em caráter antecedente e nos artigos 305 a 310 trata do procedimento da tutela cautelar requerida em caráter antecedente. Nos termos do artigo 300 a tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo e para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la. Os

requisitos

gerais

para

o

seu

deferimento são a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, que se entende pela provável existência de um direito a ser tutelado e um provável perigo em face do dano ao possível direito pedido. Os 12


referidos requisitos são o fumus boni iuris e o periculum in mora dos provimentos cautelares. A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia e a tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida

quando

houver

perigo

de

irreversibilidade dos efeitos da decisão. Por sua vez a tutela de urgência de natureza cautelar pode ser efetivada mediante arresto, seqüestro, arrolamento de bens, registro de protesto contra alienação de bem e qualquer outra medida idônea para asseguração do direito. Nota-se que além da tutela cautelar destinada a assegurar o resultado final do provimento definitivo, existe a tutela antecipada do próprio mérito do processo principal. De modo que se pode falar em medidas provisórias de natureza cautelar

e

medidas

provisórias

de

natureza

antecipatória, estas de cunho satisfativo e aquelas de cunho preventivo. Tanto a medida cautelar como a medida antecipatória representam provimentos de cunho 13


emergencial

adotadas

em

caráter

provisório,

distinguindo-se na sua substância, enquanto a primeiro assegura a pretensão a segunda a realiza de pronto. Aproxima-se do direito europeu a regulamentação da tutela provisória no novo Código de Processo Civil. Os

artigos

303

e

304

tratam

do

procedimento da tutela antecipada requerida em caráter antecedente, dispondo que nos casos em que a urgência for contemporânea à propositura da ação,

a

petição

inicial

pode

limitar-se

ao

requerimento da tutela antecipada e à indicação do pedido de tutela final, com a exposição da lide, do direito que se busca realizar e do perigo de dano ou do risco ao resultado útil do processo. Deferida à tutela antecipada deve o autor aditar a petição inicial no prazo de 15 dias, e caso seja indeferida o juiz determinará que o autor emende a petição inicial no prazo de 5 (cinco) dias sob pena de extinção do processo sem resolução do mérito.

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Da decisão que defere ou indefere a tutela antecipada cabe agravo de instrumento conforme dispõe o artigo 1015. Se a decisão for de deferimento e a parte não recorrer, a decisão tornase estável e o processo será extinto, se a decisão for de indeferimento o autor terá que emendar a inicial no prazo de 5 (cinco) dias podendo interpor agravo de instrumento. Interessante que a decisão que concede a tutela não fará coisa julgada, mas a estabilidade dos respectivos efeitos só será afastada por decisão que a revir, reformar ou invalidar, proferida em ação ajuizada por uma das partes no prazo de 2 (dois) anos, conforme preceitua o § 6º do artigo 304. Desta segunda decisão é cabível a apelação nos termos do artigo 1009 do Código. Deste modo, mesmo que a parte não recorra da decisão que defere a tutela antecipada ainda poderá demandar a outra com o intuito de rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada estabilizada, desde que dentro do prazo de 2 (dois) anos. 15


O

procedimento

da

tutela

cautelar

requerida em caráter antecedente está regulado nos artigos 305 a 310, consignando que a petição inicial da ação que visa à prestação de tutela cautelar em caráter

antecedente

indicará

a

lide

e

seu

fundamento, a exposição sumária do direito que se objetiva assegurar e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo e que caso o juiz entenda que o pedido a que se refere o caput tem natureza antecipada aplica-se o disposto no artigo 303. Deste modo fica resolvida a questão da fungibilidade da tutela de urgência antecipada e da tutela de urgência cautelar, podendo-se adequar o procedimento conforme a presença dos requisitos exigidos para a tutela cautelar e para a tutela antecipada, nos mesmos moldes do que previa o § 7º do artigo 273 do Código de Processo Civil de 73. Efetivada a tutela cautelar o pedido principal terá de ser formulado pelo autor no prazo de 30 (trinta) dias e será apresentado nos mesmos autos em que deduzido o pedido de tutela cautelar.

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Entretanto o pedido principal pode ser formulado conjuntamente com o pedido cautelar. Deste modo a cautelar não é mais uma ação autônoma dependente da ação principal, mas sim

uma

tutela

preventiva

formulada

antecipadamente ou incidentalmente dentro do próprio processo principal, a exemplo da tutela antecipada do Código de 73. Nos termos do artigo 310 o indeferimento da tutela cautelar não obsta a que a parte formule o pedido principal, nem influi no julgamento deste, salvo se o motivo do indeferimento for o reconhecimento de decadência ou de prescrição que são questões de mérito. Do deferimento ou indeferimento liminar da tutela de urgência cautelar caberá agravo de instrumento, artigo 1015 do novo Código, e da decisão definitiva de deferimento ou indeferimento caberá o recurso de apelação, artigo 1009 do novo Código.

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4 – A tutela de evidência Dispõe o artigo 311 do novo Código de Processo Civil que a tutela de evidência será concedida, independentemente da demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, quando: I - ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte; II - as alegações de fato puderem

ser

comprovadas

apenas

documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante; III - se tratar de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de depósito, caso em que será decretada a ordem de entrega do objeto custodiado, sob pena de aplicação de multa; IV - a petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável. Nas hipóteses dos incisos II e III, o juiz poderá decidir liminarmente.

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O inciso I do artigo 311 do novo Código de Processo Civil corresponde ao antigo inciso II do artigo 273 do Código de Processo Civil de 73, que trata da tutela antecipada nos casos de abuso do direito

de

defesa

ou

manifesto

propósito

protelatório do réu. O inciso II do artigo 311 do novo Código de Processo Civil se assemelha ao § 6º do artigo 273 do Código de Processo Civil de 73, hipótese em que os pedidos se mostrem incontroversos. Essa controvérsia refere-se ao objeto do processo e pode se dar no plano do direito ou dos fatos. O inciso IV do artigo 311 do novo Código de Processo Civil se assemelha ao direito líquido e certo, que diz respeito à desnecessidade de dilação probatória para o deslinde dos fatos em que se fundamenta o pedido, podendo ser demonstrado mediante prova pré-constituída fundamentalmente documental. O inciso III do artigo 311 do novo Código de Processo Civil trata da ação reipersecutória cujo objetivo é possibilitar que o autor retome ao seu 19


patrimônio o que lhe pertence, mas se encontra em poder de terceiro ou na esfera patrimonial do réu que não cumpriu uma obrigação contratual, no caso o depósito. Entretanto deve o pedido de tutela de evidência estar embasado em prova documental. Percebe-se que a tutela de evidência não exige a demonstração do fumus boni iuris e do periculum in mora, mas exige os requisitos de verossimilhança das alegações e da existência de prova inequívoca semelhante à tutela antecipada tratada no artigo 273 do Código de Processo Civil de 73, além dos pressupostos do abuso do direito de defesa e do propósito protelatório do réu. Nas hipóteses dos inciso II e III o juiz pode decidir liminarmente sem ouvir a parte contrária, nos demais casos a tutela pode ser deferida antecipadamente após ser ouvida a parte contrária, cabendo agravo de instrumento da decisão

interlocutória

de

deferimento

ou

indeferimento da tutela de evidência e apelação quando deferida ou indeferida na sentença.

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5 – Conclusão Com a edição do novo Código de Processo Civil ocorre uma unificação das tutelas provisórias, antes divididas em antecipada e cautelar ambas com rito próprio. De acordo com os artigos 294 a 311 do novo Código são criadas disposições gerais para as tutelas provisórias que agora são de urgência, cautelar e antecipada, e de evidência. O pedido de tutela de urgência, cautelar ou antecipada, é feito dentro do próprio processo principal de forma incidente ou antecipada, não existindo mais artigos específicos com requisitos das cautelares típicas. O

procedimento

foi

simplificado

principalmente para as tutelas cautelares que não são mais autônomas e dependentes do processo principal. Os recursos cabíveis continuam sendo o agravo de instrumento e a apelação. As inovações trazidas pelo novo Código de Processo Civil, no que diz respeito à tutela provisória, atendem aos princípios da economia

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processual, da instrumentalidade das formas e da celeridade. 6 - Bibliografia DIDIER Jr, Fredie. Curso de direito processual civil, volume 2. 5ª ed. Bahia: Editora Juspodivm, 2010. FUX, Luiz. Mandado de Segurança. 1ª ed. Rio de Janeiro; Forense, 2010. MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de processo civil, volume 2: processo de conhecimento. 6ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. MOREIRA, José Carlos Barbosa. O novo processo civil brasileiro. 22ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. THEODORO Júnior, Humberto. Processo cautelar. 20ª ed. São Paulo: Livraria e editora universitária de direito, 2002.

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DA AÇÃO DE DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE NO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL Sumário: 1. Introdução. 2. A dissolução parcial de sociedade. 3. A ação de dissolução parcial de sociedade. 4. Conclusão. 5. Bibliografia.

1 - Introdução O Novo Código de Processo Civil, lei nº 13.105/2015, cria no título III, que trata dos procedimentos especiais, a ação de dissolução parcial de sociedade, artigo 599 a 609. O Código de Processo Civil de 73 não dispunha sobre o assunto e o Código de Processo Civil de 39 disciplinava a ação de dissolução e liquidação das sociedades nos artigos 655 a 674. Diferentemente do Código de Processo Civil de 39 o Novo Código de Processo Civil trata da dissolução parcial e não da dissolução total da sociedade, isto porque até a entrada em vigor do Código Civil, em 2002, existia apenas a hipótese da dissolução

total

da

sociedade

com

a

sua

conseqüente liquidação e extinção, nos termos dos 23


artigos 335 e 336 do Código Comercial e artigo 1.399 do Código Civil de 1917. O Código Civil atual no livro II passou a regular o direito de empresa, e nos artigos 1.028 a 1.032 tratou da resolução da sociedade em relação a um sócio, revogando o Código Civil de 17 e os dispositivos do Código Comercial que tratavam das sociedades comerciais. A jurisprudência anterior ao Código Civil já permitia a dissolução parcial, no intuito de preservar a continuidade das atividades econômicas desenvolvidas,

com

base

no

princípio

da

preservação da empresa e da função social. Tendo em conta que o Código de Processo Civil de 73 não previa a ação de dissolução de sociedade, os dispositivos do Código de Processo Civil de 39, artigos 655 a 674, continuaram com aplicabilidade por força da ressalva contida no inciso VII do artigo 1.218 do CPC de 73. O rito adotado era o ordinário.

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2 – A dissolução parcial da sociedade A dissolução parcial é criação doutrinária e jurisprudencial, que não tinha regramento processual próprio. Neste caso, um ou alguns sócios se retiram da sociedade desfazendo-se os vínculos societários apenas em relação a estes. Na vigência do Código Comercial de 1850 e do Código Civil de 17 prevalecia a teoria contratualista, que privilegiava a vontade dos sócios sobre o interesse institucional da atividade econômica

desenvolvida

pela

sociedade.

Posteriormente foi ganhando terreno o princípio da preservação da empresa, que trata a sociedade não como um mero contrato regulador de capitais, mas como um instrumento jurídico que viabiliza a própria atividade econômica. Deste modo, os tribunais passaram a entender que um ou alguns sócios ou acionistas não podem impor sua vontade de dissolver a sociedade sobre a vontade contrária dos demais sócios ou acionistas. Conseqüentemente ao invés de ocorrer à

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dissolução procede-se a retirada do sócio postulante com apuração dos seus haveres. A dissolução parcial da sociedade tem amparo no princípio da preservação da empresa e de sua função social, e visa evitar a dissolução e liquidação da sociedade quando ocorre a quebra da affectio societatis. Neste caso, ocorre a resolução da sociedade em relação a um ou alguns sócios, desfazendo-se os respectivos vínculos. Inicialmente a dissolução parcial da sociedade era aplicada somente nas sociedades pessoais,

por

quebra

da

affectio

societatis,

posteriormente passou-se a admitir a dissolução da sociedade anônima fechada intuitu personae, conforme julgado no EREsp nº 111.294/PR: EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. QUESTÕES PRELIMINARES. SUBSTABELECIMENTO. RENÚNCIA DO ADVOGADO SUBSTABELECENTE. CAPACIDADE POSTULATÓRIA DO SUBSTABELECIDO. LITISCONSÓRCIO PASSIVO. MORTE DE UM DOS RÉUS. AUSÊNCIA DE HABILITAÇÃO DOS SUCESSORES. NULIDADE DOS ATOS PRATICADOS APÓS O ÓBITO. DESCABIMENTO. OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA.

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MÉRITO. DIREITO COMERCIAL. SOCIEDADE ANÔNIMA. GRUPO FAMILIAR. INEXISTÊNCIA DE LUCROS E DISTRIBUIÇÃO DE DIVIDENDOS HÁ VÁRIOS ANOS. QUEBRA DA AFFECTIO SOCIETATIS. DISSOLUÇÃO PARCIAL. POSSIBILIDADE. I - Ocorrida a renúncia por parte dos advogados substabelecentes ocorrido em data posterior à interposição do recurso pelos advogados substabelecidos, não se há falar em ausência de capacidade postulatória decorrente do substabelecimento. II - A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que a morte de uma das partes suspende o processo no exato momento em que se deu, ainda que o fato não seja comunicado ao juiz da causa, invalidando os atos judiciais, acaso praticados depois disso. Em situações excepcionais, porém, e visando preservar outros valores igualmente relevantes, justifica-se uma mitigação dos regramentos processuais, uma vez que nem mesmo o sistema de nulidades é absoluto. É o que deve ser aplicado ao caso dos autos, em que o espólio de um dos recorrentes, alegando haver tomado conhecimento da existência do feito apenas em 2002comunicara o seu falecimento em 05/02/1993, requerendo a nulidade dos atos processuais praticados após o noticiado óbito. Há, todavia, que ser afastada a alegada nulidade processual, por não ter havido qualquer prejuízo às partes, haja vista que o interesse dos seus sucessores foi defendido em todos os momentos do processo, já que as petições apresentadas em juízo foram subscritas pelo mesmo advogado e em nome de todos os litisconsortes passivos da demanda, desde a contestação até a interposição do recurso especial. É de se ter presente que este processo tramita desde 1991, envolvendo questão altamente controvertida, cuja decisão de mérito, favorável à apuração de haveres dos sócios dissidentes já se

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encontra em fase de execução, não sendo razoável, portanto, a essa altura, declarar-se a nulidade dos atos processuais praticados após o óbito, sob pena de afronta ao princípio da segurança jurídica. III É inquestionável que as sociedades anônimas são sociedades de capital (intuito pecuniae), próprio às grandes empresas, em que a pessoa dos sócios não tem papel preponderante. Contudo, a realidade da economia brasileira revela a existência, em sua grande maioria, de sociedades anônimas de médio e pequeno porte, em regra, de capital fechado, que concentram na pessoa de seus sócios um de seus elementos preponderantes, como sói acontecer com as sociedades ditas familiares, cujas ações circulam entre os seus membros, e que são, por isso, constituídas intuito personae. Nelas, o fator dominante em sua formação é a afinidade e identificação pessoal entre os acionistas, marcadas pela confiança mútua. Em tais circunstâncias, muitas vezes, o que se tem, na prática, é uma sociedade limitada travestida de sociedade anônima, sendo, por conseguinte, equivocado querer generalizar as sociedades anônimas em um único grupo, com características rígidas e bem definidas. Em casos que tais, porquanto reconhecida a existência da affectio societatis como fator preponderante na constituição da empresa, não pode tal circunstância ser desconsiderada por ocasião de sua dissolução. Do contrário, e de que é exemplo a hipótese em tela, a ruptura da affectio societatis representa verdadeiro impedimento a que a companhia continue a realizar o seu fim, com a obtenção de lucros e distribuição de dividendos, em consonância com o artigo 206, II, "b", da Lei nº 6.404/76, já que dificilmente pode prosperar uma sociedade em que a confiança, a harmonia, a fidelidade e o respeito mútuo entre os seus sócios tenham sido rompidos. A regra da dissolução total, nessas hipóteses, em nada

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aproveitaria aos valores sociais envolvidos, no que diz respeito à preservação de empregos, arrecadação de tributos e desenvolvimento econômico do país. À luz de tais razões, o rigorismo legislativo deve ceder lugar ao princípio da preservação da empresa, preocupação, inclusive, da nova Lei de Falências - Lei nº 11.101/05, que substituiu o Decreto-lei nº 7.661/45, então vigente, devendo-se permitir, pois, a dissolução parcial, com a retirada dos sócios dissidentes, após a apuração de seus haveres em função do valor real do ativo e passivo. A solução é a que melhor concilia o interesse individual dos acionistas retirantes com o princípio da preservação da sociedade e sua utilidade social, para evitar a descontinuidade da empresa, que poderá prosseguir com os sócios remanescentes. Embargos de divergência improvidos, depois de rejeitadas as preliminares.

A

dissolução

parcial

da

sociedade,

portanto, nada mais é do que a resolução ou resilição do contrato de sociedade em relação a um ou mais sócios, mediante a existência de motivos capazes de provocar a extinção do contrato societário. A dissolução por si só não extingue a sociedade, apenas inicia a fase de liquidação ao fim da qual esta se encerra. Portanto, para a extinção da sociedade são necessárias três etapas: dissolução, liquidação e extinção. 29


Isto porque a dissolução é um ato declaratório que inicia o processo de liquidação, que por sua vez conduz ao ato declaratório de encerramento da sociedade, que representa a confirmação do ato de dissolução e aprovação da liquidação. O Código Civil de 2002 não utiliza o termo dissolução parcial, em razão da sua falta de precisão, como ressaltado anteriormente, mas resolução da sociedade em relação a um sócio. As causas da dissolução parcial são elencadas nos artigos 1.028, 1.029 e 1.030 do Código Civil, e são a morte do sócio, o direito de retirada em razão de justa causa e a exclusão do sócio por motivos de falta grave no cumprimento de

suas

obrigações

ou

por

incapacidade

superveniente. O artigo 1.035 dispõe que o contrato social pode estipular outras causas de dissolução, a serem verificadas

judicialmente

quando

contestadas.

Deste modo, as causas da dissolução não são taxativas. 30


Para as sociedades anônimas a dissolução da sociedade é regulada no artigo 206 da lei 6.404/76, e pode ser de pleno direito, por decisão judicial e por decisão administrativa. No caso da morte do sócio só ocorre à dissolução da sociedade quando os sucessores e os demais sócios não tenham interesse em manter o vínculo societário. A retirada do sócio pode ser motivada nos termos do artigo 1.077 do Código civil, ou imotivada nos termos do artigo 1.029 do Código Civil. A exclusão do sócio pode ser extrajudicial nos casos do artigo 1.085 do Código Civil, e judicial mediante iniciativa da maioria dos demais sócios, por falta grave no cumprimento de suas obrigações, ou, ainda, por incapacidade superveniente. Na

dissolução

parcial

efetua-se

a

liquidação da quota do sócio retirante, excluído ou dos sucessores, que se tornam credores da sociedade. Nestes casos em que a sociedade se resolve em relação a um sócio, o valor da sua quota, considerada pelo montante efetivamente 31


realizado, liquidar-se-á, salvo disposição contratual em contrário, com base na situação patrimonial da sociedade, à data da resolução, verificada em balanço especialmente levantado. O capital social sofrerá a correspondente redução, salvo se os demais sócios suprirem o valor da quota e a quota liquidada será paga em dinheiro, no prazo de noventa dias, a partir da liquidação, salvo acordo, ou estipulação contratual em contrário. 3 – A ação de dissolução parcial de sociedade O novo Código de Processo Civil, lei 13.015/2015, trata da ação de dissolução parcial de sociedade nos procedimentos especiais, artigos 599 a 609. Como dito anteriormente o Código de Processo Civil de 73 não tinha dispositivo tratando do

assunto

e,

portanto,

continuaram

sendo

aplicados os artigos 655 a 674 do Código de Processo Civil de 39, por força do inciso VII do artigo 1.218 do CPC de 73, seguindo o rito ordinário por construção jurisprudencial.

32


A ação de dissolução parcial de sociedade pode ter por objeto: a) a resolução da sociedade empresária contratual ou simples em relação ao sócio falecido, excluído ou que exerceu o direito de retirada ou recesso; b) a apuração dos haveres do sócio falecido, excluído ou que exerceu o direito de retirada ou recesso ou c) somente a resolução ou a apuração de haveres. A petição inicial será necessariamente instruída com o contrato social consolidado. A ação de dissolução parcial de sociedade pode ter também por objeto a sociedade anônima de capital fechado quando demonstrado que não pode preencher o seu fim. As hipóteses dos incisos I, II e III do artigo 599 do novo Código de Processo Civil são aquelas arroladas nos artigos 1.028 a 1.030 do Código Civil, sócio falecido, excluído ou que exerceu o direito de retirada ou recesso. O § 2º do artigo 599 corresponde à alínea b do inciso II do artigo 206 da lei 6.404/76. As sociedades abrangidas pelo artigo 599 são as sociedades limitadas, simples, anônimas 33


fechadas, em nome coletivo e em comandita simples. O termo “fim” utilizado no final do § 2º do artigo 599 do novo Código de Processo Civil significa a incapacidade de realizar os objetivos estabelecidos no contrato social ou estatuto e de produzir lucros aos sócios ou acionistas. Os legitimados para a ação de dissolução parcial são: a) o espólio do sócio falecido, quando a totalidade

dos

sucessores

não

ingressar

na

sociedade; b) os sucessores, após a partilha do sócio falecido; c) a sociedade, se os sócios sobreviventes não admitirem o ingresso do espólio ou dos sucessores do falecido na sociedade, quando esse direito decorrer do contrato social; d) o sócio que exerceu o direito de retirada ou recesso, se não tiver sido providenciada, pelos demais sócios, a alteração contratual consensual formalizando o desligamento, depois de transcorridos 10 (dez) dias do exercício do direito; e) a sociedade, nos casos em que a lei não autoriza a exclusão extrajudicial; f) o sócio excluído; g) o cônjuge ou companheiro 34


do sócio cujo casamento, união estável ou convivência terminou para requerer a apuração de seus haveres na sociedade, que serão pagos à conta da quota social titulada por este sócio. A competência é territorial sendo o foro para o ajuizamento da ação de dissolução parcial o da sede da sociedade, nos termos dos artigos 46 e 53, inciso III, alíneas a e b do novo Código de Processo Civil. O valor da causa é o valor da quota dos sócios ou acionistas excluídos, falecidos ou retirantes, conforme determina o inciso II do artigo 292 do novo Código. No artigo 601 o Código estabelece um litisconsórcio necessário entre a sociedade e os sócios, dispondo no parágrafo único que sendo todos os sócios citados a sociedade se sujeitará aos efeitos da decisão e à coisa julgada. Feita a citação os réus tem 15 dias para concordar com o pedido ou contestar a ação, no primeiro caso não haverá condenação em honorários advocatícios. Havendo contestação segue-se o procedimento comum. 35


A sentença proferida na ação de dissolução parcial de sociedade é constitutiva negativa, pois extingue a relação jurídica existente entre o sócio falecido, o excluído e aquele que exerceu o direito de retirada e os demais sócios e a sociedade. Por sua vez a sentença proferida na ação de apuração de haveres é condenatória ao pagamento do valor das quotas do sócio falecido, excluído ou o que exerceu o direito de retirada. Na sentença o juiz fixará: a) a data da resolução da sociedade que poderá ser a data do óbito no caso de falecimento do sócio, na retirada imotivada o sexagésimo dia seguinte ao do recebimento pela sociedade da notificação, no recesso o dia do recebimento pela sociedade da notificação do sócio dissidente, na retirada por justa causa de sociedade por prazo indeterminado e na exclusão judicial de sócio a do trânsito em julgado da decisão que dissolver a sociedade e na exclusão extrajudicial a data da assembléia ou da reunião de sócios que a tiver deliberado; b) o critério de apuração dos haveres que pode ser o do contrato 36


social ou o valor patrimonial apurado em balanço de determinação no caso de omissão do contrato e c) o depósito judicial da parte incontroversa. O

critério

de

apuração

está

em

consonância com o disposto no artigo 1.031 do Código Civil, que determina que nos casos em que a sociedade se resolver em relação a um sócio, o valor da sua quota, considerada pelo montante efetivamente

realizado,

liquidar-se-á,

salvo

disposição contratual em contrário, com base na situação patrimonial da sociedade, à data da resolução, verificada em balanço especialmente levantado. O Código Civil fala em balanço especial, mas o correto seria falar em balanço de determinação, como o faz o novo Código de Processo

Civil.

determinação

Pode-se

como

um

definir balanço

balanço

de

patrimonial

especial, elaborado para fins judiciais por perito contábil a partir do balanço oficial da empresa, que não afeta a contabilidade da mesma e é utilizado

37


para determinar o montante dos haveres que cabe ao sócio dissidente, excluído ou falecido. Nos termos do artigo 607 do novo Código a parte pode pedir a qualquer tempo, desde que antes da perícia, a revisão da data da resolução e do critério de apuração de haveres. É cabível a tutela provisória de urgência no procedimento especial da ação de dissolução, conforme § 2º do artigo 603 do Código. A apuração de haveres para recebimento do valor correspondente a quota social segue o rito especial, mesmo quando não há pedido de dissolução. Neste caso o objeto é a liquidação de débito reconhecido pelas partes, mas controverso em seu valor. O Superior Tribunal de Justiça decidiu, no julgamento do Recurso Especial nº 1.139.593/SC, que o prazo prescricional para a apuração de haveres, no caso de sócio excluído de sociedade limitada, é o de 10 anos do artigo 205 do Código Civil de 2002.

38


Nos termos do artigo 599 do novo Código de Processo Civil o autor pode cumular os pedidos de dissolução parcial de sociedade e de apuração de haveres, ou pode formular apenas um deles de forma simples, e em ambos os casos aplica-se o rito especial. 4 - Conclusão O procedimento especial da ação de dissolução parcial de sociedade, introduzido pelo novo Código de Processo Civil, preenche uma lacuna existente no ordenamento jurídico brasileiro, tendo em conta que o Código de Processo Civil de 73 não trata do assunto. O Código de Processo Civil de 39 tratava da dissolução, liquidação e extinção da sociedade não prevendo a resolução em relação a um ou alguns sócios, que passou a ser aplicada pelos Tribunais para preservar a empresa e a função social desta. Posteriormente o Código Civil de 2002 passou a prever as hipóteses de resolução da 39


sociedade em relação a um ou alguns sócios, entretanto a ação de dissolução parcial continuou sem rito processual próprio. Importante, também, a unificação sob o rito especial da ação de dissolução parcial de sociedade com a ação de apuração de haveres, que podem

ser

propostas

em

conjunto

ou

separadamente. Diante do exposto pode–se concluir que os artigos do novo Código de Processo Civil, que tratam da ação de dissolução parcial de sociedade, estão em consonância com as disposições do Código Civil de 2002 e positivam os entendimentos jurisprudenciais sobre o tema. 5 - Bibliografia BORBA, José Edwaldo Tavares. Direito Societário. 8ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. CARVALHOSA, Modesto. Comentários à lei de sociedades anônimas: lei n. 6.404, de 15 de dezembro de 1976, com as modificações da lei n. 11.638, de 28 de dezembro de 2007. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

40


MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de processo civil, volume 2: processo de conhecimento. 6ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. MOREIRA, José Carlos Barbosa. O novo processo civil brasileiro: exposição sistemática do procedimento. 22ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002.

41


A INTERVENÇÃO DE TERCEIROS NO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL Sumário: 1. Introdução. 2. A intervenção de terceiros no novo Código de Processo Civil. 3. O procedimento especial da ação de oposição. 4. Conclusão. 5. Bibliografia.

1 – Introdução O novo Código de Processo Civil, lei nº 13.105/2015, traz inovações na intervenção de terceiros, regulada nos artigos 119 a 138 do título III do livro III da parte geral. Dentre elas destaca-se o

tratamento

da

ação

de

oposição

nos

procedimentos especiais e não mais em conjunto com as outras formas de intervenção, a criação do incidente de desconsideração da personalidade jurídica, a previsão da participação do amicus curiae. A ação de oposição passa a ser regulada nos artigos 682 a 686 do novo Código de Processo Civil, dentro do título III do livro I da parte especial. As formas de intervenção de terceiro, tratadas nos artigos 119 a 138 são: a assistência, 42


simples e litisconsorcial; a denunciação da lide; o chamamento

ao

processo;

o

incidente

de

desconsideração da personalidade jurídica e o amicus curiae. Tendo em conta a necessidade de se resguardar o terceiro, assim entendido aquele que não é parte no processo, de decisões que possam afetar a sua relação jurídica com uma das partes, o Código de Processo Civil admite a sua intervenção na relação processual fazendo-se parte. A seguir passa-se a análise do referido instituto,

descrevendo

os

tipos

atuais

de

intervenção e as inovações trazidas pelo novo Código de Processo Civil. 2 – A intervenção de terceiros no novo Código de Processo Civil Em regra, ninguém pode ver alterada a sua situação jurídica, mediante decisão judicial de cujo processo não foi parte. Contudo, as relações jurídicas não subsistem isoladas e estanques, havendo inúmeras vezes interdependência de 43


relações, de modo que a decisão proferida quanto a uma delas atinge a outra em parte ou no seu todo. [1] Pela intervenção o terceiro torna-se parte ou coadjuvante no processo pendente, devendo sua existência à necessidade de evitar resultados contraditórios e diminuir o número de processos. [2] O Código de Processo Civil de 73 arrola como formas de intervenção de terceiros a oposição, artigos 56 a 61; a nomeação à autoria, artigos 62 a 69; a denunciação da lide, artigos 70 a 76; o chamamento ao processo, artigos 77 a 80 e a assistência nos artigos 50 a 55. A assistência, embora tratada no mesmo capítulo

que

o

litisconsórcio

é

forma

de

intervenção, e não se dá por meio de ação própria e sim por incidente no processo pendente. Neste caso, o assistente atua como um auxiliar de um das partes no intuito de que o resultado final do processo seja favorável á parte a quem assiste. Para a intervenção do terceiro é necessário que se observe o limite temporal referente ao processo pendente, assim entendido o momento em 44


que se inicia com a petição inicial e se extingue quando a sentença torna-se irrecorrível. [3] A assistência

pode

ser

simples

ou

litisconsorcial, dependendo da intensidade do interesse do terceiro no resultado do processo. Qualquer que seja a modalidade o assistente terá faculdades, ônus, poderes e deveres relativos à relação processual. A assistência tem lugar em qualquer dos tipos de procedimento e em todos os graus de jurisdição, inclusive nos Tribunais Superiores, recebendo o processo no estado em que se encontre, conforme parágrafo único do artigo 50 do CPC de 73. É cabível, portanto, em todos os ritos do processo de conhecimento; no processo cautelar; nos embargos do devedor e na liquidação de sentença. A assistência no novo Código de Processo Civil é tratada nos artigos 119 a 124, em capítulo separado do litisconsórcio, que é regulado nos artigos 113 a 118. Continua sendo caracterizada

45


como assistência simples, nos artigos 121 a 123, e litisconsorcial, no artigo 124. Diferentemente do CPC/73 (revogado) o parágrafo único do artigo 121 determina que na assistência simples sendo revel ou omisso o assistido, o assistente será considerado seu substituto processual e não gestor de negócios. Na verdade o assistente defende o direito do assistido e não o seu direito, atuando como parte coadjuvante para o êxito da pretensão formulada pelo assistido. Nas hipóteses de revelia ou de omissão do assistido, o Código admite a atuação do assistente como substituto processual do assistido visto que atuará em nome próprio para defender direito alheio (art. 18 supra), não mais na condição de auxiliar ante a ausência ou omissão da parte assistida. Trata-se de um caso de substituição processual autorizado pelo ordenamento jurídico. O prazo para a impugnação passa a ser de 15 dias, nos termos do artigo 120 do novo Código de Processo Civil, e a assistência simples não obsta que a parte principal reconheça a procedência do 46


pedido, desista da ação, renuncie ao direito sobre o que se funda a ação ou transija sobre direitos controvertidos, porque o bem e o interesse em litígio pertencem ao assistido. A nomeação à autoria regulada nos artigos 62 a 69 do Código de Processo Civil de 73, não encontra correspondente no novo Código de Processo Civil. Isto porque a nomeação à autoria corresponde a uma alegação de ilegitimidade para a causa por parte do réu CÂNDIDO

RANGEL

DINAMARCO

destaca que “a utilidade da nomeação à autoria consiste em antecipar soluções para a questão da legitimidade

passiva

mediante

um

incidente

razoavelmente simples em que o autor, alertado, tem oportunidade de retificar a mira da demanda proposta.” [4] Deste modo, preceituam os artigos 338 e 339 do novo Código de Processo Civil, que incumbe ao réu, quando alegar sua ilegitimidade na contestação, indicar o sujeito passivo da relação jurídica discutida, sempre que tiver conhecimento, 47


podendo arcar com as despesas processuais e indenizar o autor pelos prejuízos decorrentes da falta de indicação. Se o autor aceitar a indicação, procederá à alteração da petição inicial para a substituição do réu. O autor pode, ainda, optar por alterar a petição inicial para incluir, como litisconsorte passivo, o sujeito indicado pelo réu. A denunciação da lide é tratada nos artigos 70 a 76 do Código de Processo Civil de 73, encontrando correspondente no novo Código de Processo Civil, nos artigos 125 a 129. Apresenta-se como uma ação regressiva, no mesmo processo, que pode ser proposta pelo autor e pelo réu no âmbito exclusivo do processo de conhecimento. O artigo 125 do novo Código de Processo Civil arrola as hipóteses em que a denunciação da lide é admissível, ao contrário do artigo 70 do Código de Processo Civil de 73, que arrola as hipóteses em que a denunciação da lide é obrigatória. A parte tem o ônus de denunciar a lide, podendo exercer o direito regressivo em ação autônoma quando a denunciação da lide for 48


indeferida, deixar de ser promovida ou não for permitida. A hipótese do inciso II, do artigo 70 do CPC de 73, foi excluída das hipóteses de denunciação da lide previstas no novo Código de Processo Civil, pois como ensina CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO: A hipótese descrita no inc. II do art. 70, de raríssima incidência na prática, deve ser entendida em consonância com o instituto da nomeação à autoria. Aquele que exerça posse direta sobre o bem é admitido a denunciar a lide ao proprietário ou ao possuidor indireto; mas o mero detentor, que possuidor não é, apenas cabe nomear tais pessoas à autoria (art. 62) (supra, n. 599). O possuidor direito que denuncia faz como todo litisdenunciante: convoca o terceiro a oficiar como seu assistente litisconsorcial e ao mesmo tempo pede sua condenação a ressarcir em caso de sucumbir perante adversário comum; não é como o mero detentor, que, ao nomear a autoria o possuidor ou proprietário, pede sua própria exclusão do processo. [5]

No parágrafo 2º do artigo 125, admite-se apenas

uma

única

denunciação

sucessiva,

promovida pelo denunciado, contra seu antecessor imediato na cadeia dominial ou quem seja responsável por indenizá-lo, não podendo o 49


denunciado sucessivo promover nova denunciação, hipótese em que eventual direito de regresso será exercido por ação autônoma. Isto porque, cada sujeito do processo pode denunciar a lide ao seu próprio garante e jamais aos garantes de seu garante. No Recurso Especial nº 9876/SP o Superior Tribunal de Justiça admite o indeferimento de denunciações sucessivas da lide, quando

ocasionarem

demora

excessiva

ao

processo: DENUNCIAÇÃO DA LIDE. ARTIGO 70, III, DO CODIGO DE PROCESSO CIVIL. DENUNCIAÇÕES SUCESSIVAS, POSSIBILIDADE DE INDEFERI-LAS. Ação indenizatória, promovida por paciente contra estabelecimento hospitalar, com posterior intervenção do banco de sangue, que denunciou a lide aos laboratórios encarregados da analise do sangue utilizada em transfusões. Embora admitida exegese ampla ao disposto no artigo 70, III, do CPC, não esta obrigado a magistrado a admitir sucessivas denunciações da lide, devendo indeferi-las (certamente que com resguardo de posterior 'Ação Direta'), naqueles casos em que possa ocorrer demasiada demora no andamento do feito, com manifesto prejuízo a parte autora.

50


Recurso Especial não conhecido.

O chamamento ao processo distingue-se da denunciação da lide, por não se tratar de um exercício de direito de regresso, mas da instauração de um litisconsórcio sucessivo facultativo. No chamamento o réu pede a integração do terceiro ao processo, como parte, para que a sentença tenha força executiva também em relação a ele. Os artigos 130 a 132 do novo Código de Processo Civil tratam do chamamento ao processo, e correspondem aos artigos 77 a 80 do Código de Processo Civil de 73. Foram alterados, apenas, os prazos para citação dos litisconsortes que passaram a ser de 30 (trinta) dias do deferimento do chamamento, e de 2 (dois) meses se o chamado residir em outra comarca, seção ou subseção judiciárias, ou em lugar incerto. Os referidos prazos contidos no artigo 131 do novo Código são aplicáveis à denunciação da lide, conforme determina o artigo 126. No Código de 73 ocorria o inverso, os dispositivos relativos aos prazos de citação na denunciação da lide, 51


artigos 72 e 74, é que eram aplicáveis ao chamamento ao processo. O chamamento ao processo continua sendo procedimento exclusivo do processo de conhecimento, incompatível com o processo de execução, pois tem como objeto a condenação do terceiro a reembolsar o réu pelo que vier a pagar em razão da sentença. Em todas as hipóteses do artigo 125 do novo Código, os terceiros já eram legitimados passivos para a causa, mas não foram incluídos na petição inicial. Deste modo, o chamamento é instituído em favor do réu e não do autor da demanda. Foram introduzidas duas novas formas de intervenção de terceiro pelo novo Código, que são o incidente de desconsideração da personalidade jurídica e o amicus curiae, nos artigos 133 a 137 e no artigo 138. O Código Civil, no artigo 44, confere às pessoas jurídicas personalidade distinta da dos seus sócios. Ao constituírem a sociedade os sócios 52


transferem-lhe bens que passam a integrar o seu patrimônio. A manifestação de vontade da pessoa jurídica se dá por meio de seus órgãos deliberativos e administrativos. Ocorre que a autonomia patrimonial da pessoa jurídica não pode servir para acobertar situações antijurídicas prejudiciais a terceiros. Em razão

disto

foi

desconsideração

construída da

a

teoria

personalidade

da

jurídica,

possibilitando a responsabilização dos sócios quando caracterizada a utilização abusiva da forma societária. [6] A

teoria

da

desconsideração

da

personalidade jurídica, difundida na doutrina brasileira após a década de 60, por Rubens Requião, encontra nos dias atuais suporte no ordenamento jurídico (artigo 28 do Código de Defesa do Consumidor, artigo 4º da Lei nº 9.605/98, artigo 50 do Código Civil), devendo ser aplicada

quando

presentes

os

pressupostos

específicos, relacionados com a fraude ou abuso de direito em prejuízo de terceiros. 53


A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça trata da desconsideração da pessoa jurídica como um incidente processual, e não como um processo incidente, razão pela qual pode ser deferida nos próprios autos, em desfavor de quem foi superada a pessoa jurídica (Recurso Especial nº 1.096.604/DF). Seguindo o mesmo entendimento, o novo Código de Processo Civil disciplina o incidente de desconsideração da personalidade jurídica, nos artigos 133 a 137, 674, §2º, III, 790, VIII, 792, § 3º, 795, § 4º, 932, VI, 1.015, IV, que será instaurado pela parte ou pelo Ministério Público com a comprovação

dos

pressupostos

específicos

previstos em lei, fraude ou abuso da personalidade jurídica e confusão patrimonial. A existência dos referidos pressupostos deve ser demonstrada sob o crivo do contraditório, exigindo-se a citação do sócio ou da pessoa jurídica (no caso de desconsideração inversa), para manifestar-se sobre o incidente, no prazo de 15 (quinze)

dias.

Neste

caso,

forma-se

um 54


litisconsórcio eventual entre a sociedade e o sócio para permitir a excussão dos bens do sócio quando o patrimônio da pessoa jurídica não for suficiente para a satisfação da obrigação. O incidente de desconsideração é cabível em todas as fases do processo de conhecimento, no cumprimento de sentença e na execução fundada em título executivo extrajudicial, podendo a desconsideração ser requerida na petição inicial, hipótese em que se dispensa a instauração do incidente (art. 134 do novo CPC). Deve se ressaltar que a mera inexistência ou insuficiência de patrimônio

para

o

pagamento

dos

débitos

contraídos pela pessoa jurídica não autoriza a desconsideração da personalidade jurídica quando ausentes os seus pressupostos legais. Quando for instaurado originariamente no tribunal compete ao relator decidir sobre o incidente (art. 932, inc. VI, do CPC/2015). Da decisão proferida pelo relator caberá agravo interno (art. 1.021 do CPC/2015). Este dispositivo deve ser interpretado em conjunto com o artigo 932, inciso 55


VI do CPC, que dispõe caber ao relator decidir o incidente de desconsideração da personalidade jurídica, quando este for instaurado originariamente perante o Tribunal. É o caso da desconsideração formulada em ação rescisória, que contem pedido de novo julgamento, cuja competência é originária do tribunal (art. 966 e 968, I, do CPC). O incidente, também, é cabível na ação de execução fiscal por força do disposto no artigo 1º da lei nº 6.830/80, que determina a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil. Neste caso, deve-se observar o entendimento do Superior Tribunal de Justiça que determina que a citação do sócio deva ocorrer dentro do prazo prescricional de 5 (cinco) anos [7]. Do mesmo modo, é cabível no processo do trabalho por decorrência expressa do artigo 769 da Consolidação das Leis do Trabalho, decreto-lei 5.452/43, que prevê a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil nos casos omissos. A decisão que resolve o incidente é interlocutória, cabendo agravo de instrumento (art. 56


1.015, inc. IV do CPC/2015). No caso de acolhimento do pedido de desconsideração, a alienação ou a oneração de bens, havida em fraude de

execução,

será

ineficaz

em

relação

ao

desconsideração

da

requerente. Nos

casos

de

personalidade jurídica, a fraude à execução se verifica a partir da citação da parte cuja personalidade se pretende desconsiderar, ou seja, é a citação na ação de execução proposta contra a sociedade e não a citação no incidente de desconsideração da personalidade jurídica, para responsabilizar os sócios ou administradores. O mesmo raciocínio se aplica na desconsideração inversa, é a citação do sócio na ação de execução promovida por credor particular, e não a citação no incidente para responsabilizar a sociedade pelas obrigações pessoais do sócio (art. 792, § 3º). O artigo 790, inciso VII do CPC/2015, dispõe que os bens do responsável, nos casos de desconsideração da personalidade jurídica, são sujeitos a execução. Isto porque, sendo instaurado o 57


incidente no processo de execução os sócios ou a sociedade (no caso da desconsideração inversa) passam a integrar o processo em litisconsórcio com o devedor principal. No artigo 674, § 2º do Código de Processo Civil

está

prevista

a

legitimidade

para

o

ajuizamento dos embargos de terceiro de quem sofre constrição judicial de seus bens por força de desconsideração da personalidade jurídica, de cujo incidente não fez parte. Atualmente, o amicus curiae atua como um terceiro que participa do processo para defender os interesses do grupo por ele representado, perseverando no objetivo de fazer prevalecer as suas alegações. [8] A intervenção de terceiro como amicus curiae passou a ter previsão legal com a lei n° 6.835/76, que no artigo 31 permite a intervenção da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) em demandas individuais, nas quais devessem ser analisadas questões de direito societário, sujeitas,

58


no plano administrativo à competência da referida autarquia. [9] Posteriormente, a lei n° 9.868/99 no § 2º do artigo 7º, passou a admitir a manifestação do amicus curiae no processo objetivo de controle de constitucionalidade, como instrumento de abertura do

processo

e

de

pluralização

do

debate

constitucional. Na ação direta de inconstitucionalidade não se admite a intervenção de terceiros, mas o relator

poderá

admitir

mediante

decisão

irrecorrível, e considerada a relevância da matéria e a

representatividade

dos

postulantes,

a

manifestação de outros órgãos ou entidades. Seguindo a mesma sistemática o novo Código de Processo Civil trata da participação do amicus curiae, no artigo 138, dispondo que “o juiz ou o relator, considerando a relevância da matéria, a especificidade do tema objeto da demanda ou a repercussão social da controvérsia, poderá, por decisão irrecorrível, de ofício ou a requerimento das partes ou de quem pretenda manifestar-se, 59


solicitar ou admitir a participação de pessoa natural ou jurídica, órgão ou entidade especializada, com representatividade adequada, no prazo de 15 (quinze) dias de sua intimação.” Na decisão do juiz ou relator que admitir a participação de pessoa natural ou jurídica, será definido o poder do amicus curiae. A referida intervenção não

acarreta

a

modificação

de

competência nem autoriza a interposição de recursos, salvo a oposição de embargos de declaração e de recurso da decisão que julgar o incidente de resolução de demandas repetitivas. Conforme disposto no caput do artigo 138, a participação do amicus curiae pode ocorrer em primeiro e segundo grau de jurisdição, no âmbito do processo de conhecimento. No tocante a representatividade e a pertinência temática destaca-se o acórdão proferido no Agravo de Instrumento nº 201400001023563, do Tribunal Regional Federal da 2ª Região: AGRAVO DE PROCESSUAL

INSTRUMENTO. DIREITO CIVIL. PROPRIEDADE

60


INDUSTRIAL. PATENTE MAIL BOX. ADMISSÃO DA ABIFINA COMO AMICUS CURIAE. PRELIMINARES DE NÃO CABIMENTO DO AGRAVO E AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSO REJEITADAS. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS DE ADMISSÃO DA ABIFINA EM DEMANDAS SEMELHANTES. IRRELEVANTE O INTERESSE DO AMICUS CURIAE. REPRESENTATIVIDADE E PERTINÊNCIA TEMÁTICA VERIFICADOS. PROVIMENTO NEGADO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO I Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo ativo, interposto contra decisão que deferiu o ingresso como amicus curiae de ABIFINA -Associação Brasileira das Indústrias de Química Fina, Biotecnologia e suas Especialidades. II - Rejeitadas as preliminares de não cabimento do agravo e ausência de interesse recursal. III - A jurisprudência deste Tribunal Regional Federal passou a admitir o ingresso de amicus curiae sempre que a matéria debatida ultrapassar a esfera patrimonial das partes e afetar o interesse de toda coletividade. IV - O papel do amicus curiae é trazer ao processo informações que auxiliem o magistrado, sendo irrelevante eventual interesse que tenha na demanda. V - Requisito da representatividade satisfeito. A ABIFINA é “associação classista de âmbito nacional, fundada há cerca de trinta anos, que congloba laboratórios públicos (FARMANGUINHOS, LAFEPE, IQUEGO) e privados (EMS, ACHE, LIBBS, CRISTÁLIA, EUROFARMA etc.)”. VI - Requisito da pertinência temática também satisfeito. A demanda principal versa sobre prazo de patente relacionado ao medicamento TAMIFLU, utilizado para tratamento do vírus influenza (H1N1). VII Provimento negado ao agravo de instrumento.

61


Deste modo, a representatividade deve relacionar-se diretamente à identidade funcional, natureza ou finalidade estatutária da pessoa física ou jurídica que a qualifique para atender ao interesse

público

de

contribuir

para

o

aprimoramento do julgamento da causa, não sendo suficiente o interesse em defender a solução da lide em favor de uma das partes. Sendo necessário, ainda, que a matéria debatida transcenda a esfera patrimonial

das

partes,

possuindo

relevância

econômica e social. O amicus curiae, agora com previsão expressa no Código de Processo Civil, representa uma nova forma de intervenção de terceiros, que se diferencia da assistência. A

intervenção

de

terceiros

não

é

autorizada nos juizados especiais estaduais e federais, por força do disposto no artigo 10 da lei nº 9.099/95, em razão de se orientar pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade.

62


Do mesmo modo, entende o Superior Tribunal de Justiça que o rito do mandado de segurança é incompatível com a intervenção de terceiros, ainda que na modalidade de assistência litisconsorcial. [10] O recurso previsto no novo Código de Processo Civil para as decisões interlocutórias de admissão ou inadmissão de intervenção de terceiros é o agravo de instrumento, inciso IX do artigo 1.015. 3 – O procedimento especial da ação de oposição no novo Código de Processo Civil Diferente do Código de Processo Civil de 73, o novo Código trata a ação de oposição como um procedimento especial, no capítulo VIII do título III do livro I da parte especial, e não em conjunto com as demais formas de intervenção de terceiros. Isto porque, a oposição é realmente uma ação na qual terceiro deduz em juízo pretensão incompatível com os interesses conflitantes do 63


autor e do réu de um processo cognitivo pendente. O que caracteriza a pretensão do terceiro é o fato do pedido ser relativo ao mesmo bem que as partes originárias disputam. [11] Conforme

ATHOS

GUSMÃO

CARNEIRO: “trata-se de instituto de origem germânica, ligado ao princípio da universalidade do juízo,

que

se

contrapõe

ao

princípio

da

singularidade, que caracterizou o direito romano.” [12]

No Código de Processo Civil de 73 quando a oposição é oferecida antes da audiência, ela será apensada aos autos principais e correrá simultaneamente com a ação, sendo ambas julgadas pela mesma sentença, conforme dispõe o artigo 59. Neste caso, trata-se de verdadeira intervenção de terceiro. Diferentemente,

se

a

oposição

for

oferecida após a audiência seguirá o procedimento ordinário, sendo julgada sem prejuízo da causa principal, conforme artigo 60 do Código de Processo Civil de 73. Neste caso, a oposição não 64


tem natureza de intervenção, mas de ação autônoma por formar um processo incidente. A oposição interventiva não encontra correspondente no novo Código de Processo Civil, apenas a oposição autônoma é prevista nos artigos 682 a 686. A oposição deve ser oferecida até o momento de ser proferida a sentença, não havendo mais distinção se oferecida antes ou após a audiência. O oferecimento da oposição após a audiência acarreta apenas a suspensão do processo principal. Esta é basicamente a única diferença da oposição no Código de Processo Civil de 73 e no novo Código de Processo Civil. Os artigos 57, 58 e 61 do CPC de 73 correspondem aos artigos 682, 683, 684 e 686 do novo CPC. A ação de oposição deverá observar os requisitos para propositura da ação, artigos 319 e 320 do novo Código, devendo ser distribuída por dependência ao processo principal. Ambas as ações serão julgadas na mesma sentença, sendo a ação de oposição prejudicial à ação principal. 65


4 – Conclusão Diante do exposto, pode-se notar que houve uma adequação nas formas de intervenção de terceiros no novo Código de Processo Civil. A nomeação à autoria não encontra previsão, a oposição é somente a autônoma tratada nos procedimentos especiais, à denunciação da lide e o chamamento ao processo sofreram alguns ajustes e foram criados o incidente de desconsideração da personalidade jurídica e a participação do amicus curiae. As referidas alterações atendem aos reclamos da celeridade, da economia processual, da efetividade e da razoável duração do processo, sem se descuidar da necessidade do contraditório. 5 – Bibliografia BORBA, José Edwaldo Tavares. Direito societário. 8ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. BUENO, Cassio Scarpinella. Partes e terceiros no processo civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2003.

66


CARNEIRO, Athos Gusmão. Intervenção de terceiros. 14ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003. DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil II. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 2002. FUX, Luiz. Mandado de Segurança. 1ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010. GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007. MEDINA, Damares. Amicus Curiae: amigo da corte ou amigo da parte? São Paulo: Saraiva, 2010. Notas: [1] Luiz Fux, Mandado de Segurança, p. 33. [2] Athos Gusmão Carneiro, Intervenção de Terceiros, p. 53. [3] Candido Rangel Dinamarco, Instituições de direito processual civil II, p. 372. [4] Instituições de direito processual civil II, p. 397. [5] Instituições de direito processual civil II, p.401/402. [6] José Edwaldo Tavares Borba, Direito societário, p. 23. [7] “(...) O redirecionamento da execução contra o sócio deve dar-se no prazo de cinco anos da citação da pessoa jurídica, sendo inaplicável o disposto no art. 40 da Lei n.º 6.830/80 que, além de referir-se ao devedor, e não ao responsável tributário, deve harmonizar-se com as hipóteses previstas no art. 174 do CTN, de modo a não tornar imprescritível a dívida fiscal. Precedentes: REsp 205887, Rel. DJ 01.08.2005; REsp 736030, DJ 67


20.06.2005; AgRg no REsp 445658, DJ 16.05.2005; AgRg no Ag 541255, DJ 11.04.2005” (STJ – 1ª Turma, AgRg no REsp 1202195/PR, Rel. Min. Luiz Fux, DJe 22.02.2011) [8] Damares Medina, Amicus Curiae: amigo da corte ou amigo da parte?, p. 42. [9] Athos Gusmão Carneiro, Intervenção de Terceiros, p. 163/164. [10] Superior Tribunal de Justiça – 2ª Turma, AgRg na Pet no RMS 45505, Rel. Ministro Humberto Martins, DJe 13.03.2015 [11] Candido Rangel Dinamarco, Instituições de direito processual civil II, p. 381/382. [12] Intervenção de Terceiros, p. 72.

68


AS NORMAS FUNDAMENTAIS DO PROCESSO: Comentários aos artigos 1º a 12 da Lei nº 13.105/2015 – Código de Processo Civil O Código de Processo Civil de 2015 destinou um capítulo próprio para as normas fundamentais do processo, elencando seus os princípios norteadores. A seguir serão comentados os artigos 1º a 12 que compõem o título único do Código destinado as normas fundamentais do processo e a aplicação das normas do processo civil. Art. 1o O processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código.

1. Processo Civil – Entende-se por processo civil o instrumento pelo qual se obtém a solução

imperativa

de

conflitos

envolvendo

indivíduos ou grupos de indivíduos acerca de determinados bens da vida (coisas materiais e imateriais que servem de objeto a uma relação

69


jurídica)

ou

situações

jurídicas

que

gerem,

modifiquem ou extingam direitos. Assim determinada pessoa que tenha seus direitos lesados ou ameaçados de lesão por outrem poderá demandar o Poder Estatal para dar uma solução ao conflito existente, sendo o processo o instrumento utilizado. PONTES DE MIRANDA (Comentários ao Código de Processo Civil, Tomo I, prólogo p. 10) diz que “o processo é a atividade para a estrutura temporal e a eficácia da relação jurídica processual: vai da petição inicial ao último ato que diz respeito à relação jurídica processual”. Também diz que o “procedimento é a forma do processo, o seu rito, a sua estruturação exterior”. No processo civil as pretensões envolvidas são reguladas pelas normas de direito privado (civil, comercial ou empresarial) e de direito público

(administrativo,

ambiental,

tributário,

previdenciário, constitucional), não abrangendo os litígios relativos à matéria penal, eleitoral e

70


trabalhista, embora tenha aplicação subsidiária na esfera eleitoral e do trabalho (CLT, artigo 769). É por meio do processo que o Estado realiza o direito subjetivo com atuação dos agentes específicos que são os juízes e seus auxiliares, detendo o monopólio do exercício do poder jurisdicional, vedando a Constituição da República Federativa do Brasil, no inciso XXXV do artigo 5º, que seja afastada do Poder Judiciário qualquer lesão ou ameaça a direito. Apesar do referido monopólio Estatal são permitidas as soluções alternativas de conflito como a arbitragem, a conciliação e a mediação, arroladas no artigo 3º deste Código e pela lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996 que trata da arbitragem. O processo civil é objeto do direito processual civil que pode ser conceituado como o “conjunto de princípios e normas destinados a reger a solução de conflitos mediante o exercício do poder

estatal”

(CÂNDIDO

RANGEL

71


DINAMARCO, Instituições de direito processual civil, volume I, p.37). 2. Princípios fundamentais do processo – A Constituição da República Federativa do Brasil de 88 trata dos direitos fundamentais relativos ao processo, que se expressam pelas normas de garantia elencadas nos incisos XXXV, XXXVI, XXXVII, LIII, LIV, LV, LVI, LX, LXXIV, LXXV e LXXVIII do artigo 5º; trata da estrutura do Poder Judiciário nos artigos 92 a 126; das funções essenciais à justiça nos artigos 127 a 135. Dentre os princípios do processo que encontram expressão nos direitos fundamentais da Constituição, pode se destacar: a) o do devido processo legal (inciso LIV do artigo 5º); b) do contraditório e da ampla defesa (inciso LV, do artigo 5º); c) do juiz natural (inciso XXXVII e LIII do artigo 5º); d) do acesso à justiça (inciso XXXV do artigo 5º); e) da publicidade dos atos processuais (inciso LX do artigo 5º e inciso IX e X do artigo 93); f) da proibição da prova ilícita (inciso LVI do artigo 5º); g) da razoável duração do processo (§ 1º 72


do artigo 5º); h) da motivação das decisões judiciais, (inciso LX do artigo 5º e inciso IX do artigo 93). O princípio do devido processo legal é considerado a base sobre a qual todos os demais princípios

encontram

sustentação,

sendo

abrangidos por este o princípio da publicidade, da motivação das decisões proferidas no processo, da impossibilidade da utilização da prova obtida por meios ilícitos, da duração razoável do processo, do contraditório e da ampla defesa, do juiz natural, do acesso à justiça, do tratamento isonômico das partes. Isto porque o devido processo legal, adotado na sua origem como uma garantia apenas processual para assegurar a regularidade do processo, é considerado uma cláusula geral que engloba garantias explícitas e implícitas. 3. Lei Processual – A lei processual estabelece os pressupostos para que se possa estabelecer a relação jurídica processual e diz o que devem fazer, de forma lógica em sua estrutura, as 73


partes, juízes, serventuários e o Ministério Público, com a finalidade de se obter a prestação jurisdicional por parte do Estado para a tutela jurídica pretendida. Deste modo, as leis processuais são portadoras de normas gerais e abstratas (regra de conduta que exprime um juízo de valor) que disciplinam a relação jurídica processual. São leis processuais o Código de Processo Civil e as leis processuais especiais. 4. Interpretação e integração da lei processual

Como

dito

anteriormente

a

Constituição da República Federativa do Brasil de 88 também contém normas processuais que devem ser interpretadas e aplicadas em conjunto com as normas contidas no Código de Processo Civil e com a legislação processual extravagante. “As normas são genéricas e impessoais e contêm um comando abstrato, não se referindo especificamente a casos concretos”. (CARLOS ROBERTO

GONÇALVES,

Direito

Civil

Brasileiro, volume I: parte geral, p.55). 74


Diante disto surge à necessidade de interpretação para se desvendar o sentido e o alcance das normas, sendo diversos os seus métodos que vão desde o critério literal ao teleológico, passando pelo critério sistemático e histórico, devendo atuar em conjunto de forma a inter-relacionarem. Os preceitos da Constituição da República Federativa de 88 devem ser observados na interpretação da lei processual, e como normas constitucionais precedem em hierarquia em relação às normas ordinárias e codificadas, sendo inválida a norma que contrarie um princípio constitucional. Com a integração da norma processual são supridas as lacunas da lei mediante a utilização da analogia, dos costumes, dos princípios gerais do direito e da equidade, conforme determina o artigo 4º e o artigo 5º da Lei de Introdução ao Código Civil (decreto-lei n° 4.657, de 4 de setembro de 1942). Ao dispor que o processo civil deve observar as disposições do CPC de 2015, determina 75


a aplicação desta lei processual para as demandas com pretensões reguladas por normas civis, comerciais,

administrativas,

tributárias,

constitucionais e outras, sendo excluídas as pretensões

que

tenham

processo

específico

regulado em lei como as pretensões penais, as eleitorais e as trabalhistas. O Código de Processo Civil de 39 (decreto-lei nº 1.608, de 18 de setembro de 1939), continha regra semelhante no artigo 1º não mencionando

a

observância

das

normas

fundamentais contidas na Constituição Federal, que na época era a de 34. Art. 2o O processo começa por iniciativa da parte e se desenvolve por impulso oficial, salvo as exceções previstas em lei.

1. Princípio da inércia inicial – O processo deve ser iniciado pelas partes interessadas mediante a propositura da ação judicial e posteriormente se desenvolve por impulso oficial, cabendo aos órgãos judiciais competentes conduzilo ao seu desfecho final. Norma semelhante era a do artigo 262 do Código de Processo Civil de 73. 76


Ao vedar a autotutela o Estado assume o poder de dizer aquele que tem razão no conflito instaurado, tendo o direito de acesso à justiça a parte para a realização da sua pretensão na medida em que não pode realizar por conta própria. Deste modo a atividade jurisdicional deve ser provocada pela parte com a propositura da ação judicial,

aperfeiçoando-se

a

relação

jurídica

processual com a citação do réu. A partir do momento em que a parte interessada efetua o protocolo da petição inicial da ação judicial para registro e distribuição no juízo competente para recebimento da demanda, a pretensão

está

concretizada.

A partir

deste

momento o juiz proferirá o seu primeiro ato que será o despacho de recebimento ou não da inicial nos termos dos artigos 319 e 332 do CPC de 2015. Com o ingresso da parte ré a relação jurídica processual está formada. O princípio da inércia inicial atua como garantia de um julgamento imparcial na medida em que veda ao juiz iniciar o processo de ofício, 77


conforme dispunha claramente o artigo 2º do Código de Processo Civil de 73 ao dizer que “nenhum juiz prestará a tutela jurisdicional senão quando a parte ou o interessado a requerer, nos casos e formas legais”. 2. Exceções ao princípio da inércia inicial – O artigo 2º alude às exceções ao princípio da inércia inicial, em que é facultado ao juiz agir de ofício para iniciar o processo. Como exemplos de exceção a necessidade de iniciativa do processo pela parte e de vedação ao juiz de iniciar o processo de ofício, pode se destacar o artigo 536 que trata do cumprimento de sentença que reconhece obrigação de fazer ou não fazer; o artigo 712 que autoriza ao juiz iniciar de ofício a restauração de autos; o artigo 730 que trata da alienação judicial de bem; o artigo 738 que trata da herança jacente; o artigo 744 que trata dos bens dos ausentes e o artigo 746 que trata da coisa vaga. Os artigos 730 a 744 referem-se à jurisdição voluntária em que o juiz não é chamado a dirimir um conflito como o é na jurisdição contenciosa. 78


Nestes casos o juiz atua mais como órgão do Estado do que como julgador, administrando interesses, por esta razão as hipóteses de exceção na

jurisdição

contenciosa

são

praticamente

inexistentes. Art. 3o Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito. §1o É permitida a arbitragem, na forma da lei. §2o O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos. §3o A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial.

1.

Inafastabilidade

do

controle

jurisdicional – Com redação semelhante ao inciso XXXV do artigo 5º da Constituição da República Federativa do Brasil de 88, o caput do artigo 3º contém um direito fundamental expressado por uma norma que garante o direito de ação, de acesso à justiça para ingresso em juízo pedindo que o Estado

proporcione

a

tutela

jurisdicional

pretendida. Entretanto, para que se possa obter a tutela jurisdicional por meio da decisão final de mérito 79


deve ser demonstrada a existência das condições da ação (CPC, art. 485, VI) e dos pressupostos processuais (CPC, art. 485, IV). Inicialmente o acesso à justiça era entendido como o direito de propor e responder as ações judiciais, podendo exigir do Estado que este direito não fosse infringido. Era o acesso meramente formal. Neste sentido, entendeu o Supremo Tribunal Federal que “viola a garantia constitucional de acesso à jurisdição a taxa judiciária calculada sem limite sobre o valor da causa” (súmula nº667) e que “é inconstitucional a exigência de depósito prévio como requisito de admissibilidade de ação judicial na qual se pretenda discutir a exigibilidade de crédito tributário” (súmula vinculante nº 28). Na ADIN 1.074-3/DF, precedente da súmula vinculante nº 28, ficou consignado na ementa do acórdão que o artigo 19 da Lei nº 8.870/94 impõe condição à propositura das ações cujo objeto seja a discussão de créditos tributários e consubstancia barreira ao acesso ao Poder Judiciário. 80


Posteriormente, verificando que o acesso formal não era suficiente para garantir uma efetiva prestação jurisdicional, novos direitos

foram

criados para que o acesso à justiça pudesse realizar uma prestação jurisdicional justa, igualitária e efetiva. Deste modo, mecanismos de acesso ao judiciário como a gratuidade de justiça aos que comprovem não ter meios para arcar com os custos do processo, a assistência dos pobres pela Defensoria Pública, as ações coletivas em que se busca a satisfação dos interesses difusos e coletivos, a criação dos juizados especiais cíveis, os métodos alternativos de solução de conflitos como a arbitragem, a conciliação e a mediação. A Constituição Federal, no inciso LXXIV do artigo 5º, determina que o Estado promova a assistência integral e gratuita aos necessitados englobando a representação judicial e extrajudicial. Incumbe a Defensoria Pública a orientação jurídica e a defesa dos direitos individuais e coletivos, de forma

integral

e

gratuita,

aos

necessitados 81


conforme dispõe o artigo 134 da Constituição Federal. Os artigos 98 a 102 do CPC/2015 tratam da gratuidade

de

justiça,

considerando

como

beneficiário da gratuidade a pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, cuja situação econômica não lhe permita pagar as custas do processo, as despesas processuais e os honorários de advogado. Ao juiz é facultado exigir que a parte comprove a insuficiência de recursos para obter o benefício da gratuidade. A Lei nº 1.060, de 5 de fevereiro de 1950, aplica-se no que não for incompatível com as disposições deste Código. No inciso LXXVII dispõe que são gratuitas as ações de habeas corpus e habeas data. Isto porque não havendo igualdade na disputa judicial não se pode chegar a uma prestação jurisdicional efetiva ou até mesmo inviabilizá-la em decorrência dos ônus financeiros decorrentes do processo. O artigo 98, inciso I, da Constituição Federal trata dos juizados especiais competentes 82


para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e das infrações penais de menor potencial ofensivo. Posteriormente a lei nº 9.099/95 criou os juizados especiais estaduais e a lei nº 10.251/2001 criou os juizados especiais federais, permitindo o acesso à justiça para as causas de menor complexidade de valores pequenos. Nestes casos as despesas processuais somente são devidas em grau recursal. A proibição de liminares e a exigência de caução nos casos em que haja o risco de irreversibilidade do provimento, não infringe o direito ao acesso a justiça. O que se veda é a proibição genérica de concessão de medidas de urgência,

pois

afetaria

a

própria

proteção

jurisdicional

nos

casos

que

demandem

um

provimento

antecipado

ou

cautelar

para

conservação do direito pleiteado na demanda. Neste sentido, decidiu o Supremo Tribunal Federal

na

Constitucionalidade

Ação nº

Declaratória 4,

ao

declarar

de a

constitucionalidade do artigo 1º da Lei nº 9.494/97. 83


A Lei nº 12.016, de 07 de agosto de 2009, que disciplina o mandado de segurança, no § 2º do artigo 7º contém regra limitadora da concessão da liminar de concessão de segurança ao dispor que não será concedida medida liminar que tenha por objeto a compensação de créditos tributários, a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior,

bem

reclassificação

como

liminar

que

ou equiparação

de

enseje

a

servidores

públicos e a concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza. A arbitragem constitucional

de

não

ação

infringe porque

o

direito

os

direitos

disponíveis é que podem ser objeto de convenção para escolha do juízo arbitral, e neste caso as partes optam por este juízo, não havendo negação ao acesso jurisdicional. No julgamento da SE nº 5.206 o

Supremo

incidentemente

Tribunal a

Federal

declarou

constitucionalidade

dos

dispositivos da lei de arbitragem nº 9.307/96. 2. Métodos alternativos para solução de conflitos – Os equivalentes jurisdicionais como a 84


arbitragem, a conciliação e a mediação são mecanismos de solução de conflitos fora dos tribunais, que buscam uma composição do litígio de forma mais rápida e menos onerosa. Tanto a mediação como a conciliação são formas de autocomposição de conflitos em que as próprias partes unilateralmente ou bilateralmente encontram solução para o litígio, utilizando-se de uma terceira pessoa, o mediador e o conciliador. Os artigos 165 a 175 do CPC de 2015 tratam dos conciliadores e dos mediadores que são considerados auxiliares da justiça, e o artigo 334 trata da audiência de conciliação ou mediação. O artigo 165 acima referido trata da criação dos centros judiciários de solução consensual de conflitos,

para

realização

de

audiências

de

conciliação e mediação e para o desenvolvimento de programas destinados a auxiliar, orientar e estimular os métodos de autocomposição. Conciliação consiste na intervenção do conciliador para estimular as partes a chegarem a uma solução consensual para encerrar o conflito. 85


Ela pode ser realizada no próprio processo judicial a qualquer tempo desde a audiência de conciliação até o cumprimento de sentença, bem como na ação de execução, ou extrajudicialmente. A conciliação põe termo ao processo tendo eficácia de título executivo, conforme artigos 334, § 11 e artigo 515, inciso II e III do CPC/2015. A arbitragem consiste no julgamento do litígio por um árbitro escolhido de comum acordo entre as partes, mediante convenção neste sentido representada por uma cláusula compromissória constante do contrato celebrado entre as partes, ou por um compromisso arbitral firmado nos autos do processo judicial, ou firmado extrajudicialmente por instrumento público ou particular (artigo 3º, 4º e 9º da Lei nº 9.307/96). A convenção de arbitragem deve ser firmada por pessoas com capacidade para contratar e sobre direitos disponíveis aos quais podem as partes transigir, produzindo a sentença arbitral os mesmos efeitos da sentença judicial inclusive com

86


eficácia de título executivo se condenatória (artigo 1º e 31 da Lei nº 9.307/96). Na contestação o réu deve alegar a convenção de arbitragem antes de discutir o mérito da lide, não podendo o juiz de ofício conhecer da convenção nos termos do artigo 337, inciso X e § 5º deste Código. O processo será extinto sem análise do mérito se for acolhida a alegação de convenção de arbitragem, conforme dispõe o inciso VII do artigo 485 deste CPC. A Mediação judicial e extrajudicial está tratada na Lei nº 13.140/2015, que a conceitua (art. 1º) como “atividade técnica exercida por terceiro imparcial sem poder decisório, que, escolhido ou aceito pelas partes, as auxilia e estimula a identificar ou desenvolver soluções consensuais para a controvérsia”. Com a solução consensual de conflitos busca-se a pacificação das partes mediante a eliminação dos litígios que os envolvem, reduzindo as despesas com o processo e o tempo da prestação jurisdicional. 87


Art. 4o As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa.

1. Razoável duração do processo – O tempo é fator relevante para a manutenção da igualdade das partes no processo, na medida em que um processo longo e custoso pode acarretar a paralisação do feito sem solução definitiva, ou até mesmo a celebração de acordos desvantajosos para a parte mais fraca. Deste modo, a parte que pode suportar os efeitos do tempo acaba por se prevalecer da demora na prestação jurisdicional. A Constituição Federal no inciso LXXVIII do artigo 5º assegura a razoável duração do processo, no âmbito administrativo e judicial, e os meios que garantam a sua tramitação. Para que a tutela jurisdicional seja efetiva ela deve ser prestada tempestivamente para proveito daquele que a demandou. Instrumentos como a tutela de urgência tratada no CPC de 2015 nos artigos 300 a 311, da improcedência liminar do pedido do artigo 332, da 88


solução consensual de conflitos tratada no artigo 3º, do julgamento antecipado do mérito total ou parcial do artigo 355 e 356, do incidente de demandas repetitivas do artigo 976 a 987, são criados no intuito de dar maior celeridade ao processo sem desprestigiar o contraditório e a ampla defesa. No mesmo sentido o rito abreviado dos juizados especiais cíveis e as ações coletivas. Na realidade a razoável duração do processo tem como escopo assegurar o próprio acesso à justiça, garantindo às partes a solução dos seus conflitos num prazo adequado as suas pretensões. O artigo 139 do CPC de 2015 dispõe que o juiz deve velar para que o processo tenha uma duração razoável, podendo indeferir postulações meramente procrastinatórias e promover a qualquer tempo a autocomposição das partes para por termo ao litígio. Art. 5o Aquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de acordo com a boafé.

89


1. A boa-fé – Comportar-se com a boa-fé significa agir de acordo com regras morais, éticas, com

honestidade,

probidade,

sinceridade,

fidelidade, lealdade, vedando-se o abuso de poderes processuais e a criação de situações de má-fé que impeçam a atuação da parte contrária no processo, como as demoras injustificáveis, os formalismos inúteis e as protelações maliciosas. Exemplo

de

abuso

processual

é

a

interposição de embargos de declaração meramente procrastinatórios que visam unicamente retardar o andamento do processo (§ 2º do artigo 1.026). O

artigo

contém

preceito

correspondente ao inciso II do artigo 14 do Código de Processo Civil de 73, que tratava dos deveres das partes. No CPC de 2015 os deveres das partes estão arrolados no artigo 77 e a litigância de má-fé no artigo 80. O escopo do princípio da boa-fé é garantir uma decisão justa num tempo razoável, na medida em que determina que as partes atuem no sentido 90


de se obter uma tutela efetiva sem abusar das suas faculdades processuais. É considerada uma cláusula geral aplicada a todos que de qualquer forma participem do processo, incluídas as partes e seus procuradores, os terceiros intervenientes, os juízes e seus auxiliares, o Ministério Público, a Advocacia Pública e a Defensoria Pública. Isto porque a relação jurídica processual é triangular, formada pelas partes e pelo Estado que exerce a jurisdição por meio do Poder Judiciário, demandando a observância de todos que atuem no processo para que se possa chegar a uma decisão final justa. Deste modo, as condutas abusivas que tendem unicamente a retardar o regular andamento do processo e a criar expedientes desnecessários como o ingresso de documentos já conhecidos pela parte fora do momento oportuno, o uso abusivo de incidentes e recursos com finalidade meramente procrastinatória,

a

omissão

de

elementos

91


necessários para o desfecho da lide podem ser consideradas violadoras da boa-fé processual. Art. 6o Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva.

1. Cooperação entre as partes – O processo tem um fim a ser atingido que é a prestação jurisdicional efetiva para aquele que a demanda. Para que se chegue a uma decisão final justa é necessário que as partes atuem com lealdade e boa-fé na prática dos atos processuais e o juiz conduza o processo de forma que fique assegurada a igualdade substancial entre os litigantes. O dever de cooperação é corolário do contraditório e do devido processo legal, sendo o resultado do processo proveniente da atividade das partes e do juiz para a justa aplicação do direito ao caso concreto. Deste modo, o juiz tem uma participação ativa para garantir a efetiva participação das partes eliminando as desigualdades e as condutas que não estejam de acordo com a boa-fé.

92


As partes por sua vez devem ser ouvidas e ter assegurado o seu direito de oferecer suas alegações e provas, podendo influenciar de maneira efetiva na solução da demanda. Os deveres de cooperação podem ser classificados

dentre

outros:

em

deveres

de

esclarecimento, de consulta, de prevenção e de auxílio, que apesar de recíprocos devem ser implementados pelo juiz. O dever de esclarecimento significa que deve o juiz providenciar o esclarecimento da parte sobre

determinada

questão

que

não

esteja

suficientemente clara para formar a sua livre convicção. O dever de consulta em que o juiz deve ouvir previamente as partes sobre as questões de fato ou de direito que influenciarão no julgamento da causa. Exemplo é a determinação que a parte seja ouvida sobre matéria que o juiz pode conhecer de ofício. O dever de prevenção em que deve o juiz determinar que sejam supridas as deficiências 93


postulatórias, como a emenda da petição inicial do artigo 321. O dever de auxílio em o juiz auxilia uma das partes a superar as dificuldades que embaracem a sua efetiva participação do processo, como a distribuição inversa do ônus da prova do artigo 373, § 1º. Com o dever de cooperação entre todos os sujeitos do processo, partes e seus procuradores, juízes e seus auxiliares, membros do Ministério Público, Defensoria Pública e Advocacia Pública, o processo deve ser conduzido de forma cooperativa para se atingir a tutela jurisdicional efetiva e justa. A cooperação, portanto, abarca o dever de boa-fé

na

prática

dos

atos

processuais,

a

necessidade de igualdade substancial das partes, do efetivo contraditório, da publicidade e motivação das decisões do juiz, da oportunidade das partes de oferecerem suas manifestações, da função mais ativa do juiz ao conduzir o processo velando pela efetividade do processo.

94


Art. 7o É assegurada às partes paridade de tratamento em relação ao exercício de direitos e faculdades processuais, aos meios de defesa, aos ônus, aos deveres e à aplicação de sanções processuais, competindo ao juiz zelar pelo efetivo contraditório.

1. Igualdade de tratamento – Decorrente do próprio princípio da isonomia expresso no caput artigo 5º da Constituição Federal, a igualdade das partes no processo significa que o juiz deve atuar para neutralizar as desigualdades existentes como a inferioridade econômica, de informação, sociais e outras. Deste

modo,

devem

ser

oferecidas

oportunidades iguais para a prática dos atos processuais, dando meios de participação efetiva no processo. Entretanto, incumbe ao juiz manter a relação processual equilibrada. “Mas, quanto à paridade das partes no processo, deve-se buscá-la no seu sentido efetivo, de fato, escopo maior do direito processual civil, e não

somente

a

igualdade

jurídica,

formal”

(NELSON NERY JUNIOR, Princípios do processo civil na Constituição Federal, p.49). 95


Forma substancial

é

de

proporcionar

a

assistência

a

igualdade

judiciária

aos

necessitados pela Defensoria Pública, à gratuidade de justiça aos que comprovem não terem meios suficientes para arcar com as despesas do processo e a distribuição inversa do ônus da prova prevista no § 1º e 2º do artigo 373 do CPC de 2015, em que o juiz pode atribuir o ônus a parte que tenha maiores condições de fornecê-la. Art. 8o Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência.

1. Princípios Constitucionais – Conteúdo similar ao contido no artigo 5º do Decreto-lei nº 4.657/42, Lei de Introdução ao Código Civil, em que o juiz na aplicação da lei atenderá aos fins sociais e ao bem comum. O julgador não deve ficar adstrito à letra fria da lei, sendo necessário considerar o direito não apenas como sistema normativo, mas também como sistema fático e valorativo. 96


Como

ensina

RUBENS

LIMONGI

FRANÇA (Hermenêutica Jurídica, p.54) ao tratar do artigo 4º e 5º da LICC: “Em suma, nesses preceitos, como se viu, está estabelecida a obrigatoriedade de julgar, por parte do magistrado, mesmo em face da omissão ou defeito da lei, e, ao mesmo tempo, a faculdade de, dentro de certos limites, adequar a lei às novas exigências, oriundas das transmudações sociais das instituições.” A equidade encontra fundamento nas regras gerais contidas nos artigo 4º e 5º da Lei de Introdução ao Código Civil, bem como no artigo 140 do CPC de 2015. No Código de Processo Civil de 73 estava consignada no artigo 127. A

dignidade

da

pessoa

humana

é

fundamento da República Federativa do Brasil, conforme inciso III do artigo 1º da Constituição Federal. É um valor supremo que abarca o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem. A

proporcionalidade,

razoabilidade,

legalidade, publicidade e a eficiência são corolários 97


do princípio do devido processo legal. O princípio da legalidade encontra base normativa no inciso II do artigo 5º da Constituição Federal, o da publicidade no inciso LX do referido artigo 5º e o do devido processo legal no inciso LIV também do artigo 5º da CF. Sem a pretensão de esgotar o assunto quanto à identificação ou não do princípio da proporcionalidade

com

o

da

razoabilidade,

destacamos os ensinamentos de Carlos Roberto Siqueira Castro (O devido processo legal e os princípios

da

razoabilidade

e

da

proporcionalidade, p. 199 e 200) que dispõe que a “Proporcionalidade encerra, assim, a orientação deontológica de se buscar o meio mais idôneo, mais equitativo e menos excessivo nas variadas formulações do Direito, seja na via da legislação ou positivação das normas jurídicas, da administração pública dos interesses sociais, da aplicação judicial dos comandos normativos e, ainda, no campo das relações privadas, a fim de que o reconhecimento ou o sacrifício de um bem da vida não vá além do 98


necessário ou, ao menos, do justo e aceitável em face de outro bem da vida ou de interesses contrapostos.

A

idéia

(ou

ideário)

da

proporcionalidade persegue, assim, a justa e equânime distribuição de ônus e encargos, e também de bônus e vantagens, nos incontáveis contextos de disputas, litígios e concorrências intersubjetivas”. Em suma, para se chegar ao processo civil de resultado deve se realizar uma interpretação sistemática e evolutiva das normas constitucionais processuais.

Nenhum

princípio

é

analisado

isoladamente, mas em conjunto para se chegar à tutela jurisdicional justa efetiva. Art. 9o Não se proferirá decisão contra uma das partes sem que ela seja previamente ouvida. Parágrafo único. O disposto no caput não se aplica: I – à tutela provisória de urgência; II – às hipóteses de tutela da evidência previstas no art. 311, incisos II e III; III – à decisão prevista no art. 701.

1. Contraditório – O inciso LV do artigo 5º da Constituição Federal assegura as partes envolvidas no processo o direito ao contraditório, 99


que representa o direito de ser ouvido e de participar efetivamente para a resolução da demanda, possibilitando a reação aos atos que lhe seja desfavorável. Deste modo, o juiz deve franquear as partes os meios necessários para a efetiva participação na demanda dando-lhes oportunidade de oferecer suas alegações e provas dos fatos que pretende ver analisados. Este é o sentido do caput do artigo 9º ao dispor que o juiz deverá ouvir as partes antes de proferir as suas decisões, dando-lhes oportunidade para oferecer as alegações e provas que entender suficientes para o esclarecimento da lide. As partes devem ter conhecimento dos atos do processo por meio da comunicação dos atos processuais para que possa levar ao juiz as informações necessárias ao reconhecimento do seu direito. O contraditório é um princípio decorrente do devido processo legal que deve ser observado no processo de conhecimento, de cumprimento de 100


sentença, de execução em todos os graus de jurisdição. 2. Provimentos liminares inaudita altera pars – Como dito nos comentários ao artigo 4º o tempo é um fator importante na manutenção da igualdade de condições no processo, na medida em que dá azo a modificações de direitos, ao perecimento de pretensões, risco de danos ao objeto da lide e aos custos com a demanda. Diante dos riscos causados pelo decurso do tempo foram criadas as medidas de urgência para evitar o perecimento do direito pretendido com o processo. A tutela provisória pode ser cautelar com caráter instrumental e acessório a tutela definitiva, ou pode ser antecipatória do próprio mérito da tutela definitiva. Entende-se por provisório o provimento que não reveste caráter definitivo, tendo duração temporal limitada ao período de seu deferimento e a superveniência do provimento principal definitivo.

101


A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia e a tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida

quando

houver

perigo

de

irreversibilidade dos efeitos da decisão. Nos casos em que fique evidenciado que a audiência da parte contrária possa inviabilizar a tutela

preventiva

contraditório

para

pretendida o

momento

posterga-se

o

posterior

ao

cumprimento da medida preventiva. Contudo o direito da parte ao contraditório fica assegurado com a possibilidade de reforma do provimento liminar mediante interposição de recurso ou simples manifestação nos autos. O princípio do contraditório também é mitigado nos casos de direito líquido que diz respeito à desnecessidade de dilação probatória para o deslinde dos fatos em que se fundamenta o pedido, podendo ser demonstrado mediante prova pré-constituída fundamentalmente documental. Art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito

102


do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício.

1. Contraditório – É assegurado às partes o direito de serem ouvidas e de participarem efetivamente do processo, sendo-lhes facultado apresentar suas petições, alegações e provas para demonstração do direito pretendido. Este é o conteúdo do princípio do contraditório. Conforme disposto no artigo anterior é vedado ao juiz proferir decisão contra uma das partes sem que ela seja ouvida. O artigo 10 complementa o artigo anterior dispondo que é vedado ao juiz decidir em qualquer grau de jurisdição com base em fundamento ao qual não tenha sido dada oportunidade a parte de se manifestar. Para que se possa chegar a uma prestação jurisdicional efetiva o juiz deve facultar as partes oferecer as suas alegações e provas a respeito dos fatos e fundamentos que possam modificar, impedir ou extinguir o seu direito. Somente desta forma o

103


juiz terá elementos suficientes para formar a sua convicção. Mesmo para as matérias que podem ser analisadas de ofício deve o juiz ofertar as partes oportunidade para se manifestarem, evitando-se alegações de nulidade por violação ao princípio do contraditório e da ampla defesa. No Código de Processo Civil de 73 o juiz podia pronunciar de ofício a prescrição, com a redação que foi dada ao § 5º do artigo 219 pela lei 11.280/2006, nada dispondo sobre a necessidade de ser ouvida a parte. Surgiram então as alegações de que o reconhecimento da prescrição sem antes possibilitar a parte oferecer suas alegações violaria o princípio do contraditório e da ampla defesa. O artigo 337 do CPC de 2015 arrola as matérias que podem ser analisadas de ofício pelo juiz mesmo quando não alegadas na contestação, excetuando-se a convenção de arbitragem e a incompetência relativa. A necessidade de ser ouvida a parte mesmo para as matérias que podem ser analisadas 104


de ofício pelo juiz é reforçada pelo comando do § 1º do artigo 332 c/c artigo 487 parágrafo único, que dispõem que o juiz pode julgar liminarmente improcedente a demanda se verificar a ocorrência da prescrição e da decadência desde que ouvida antes à parte contrária. Isto porque a parte pode trazer aos autos elementos ainda não conhecidos pelo juiz que demonstrem a ocorrência de fatos impeditivos, modificativos

ou

extintivos

das

matérias

apreciáveis de ofício. Art. 11. Todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade. Parágrafo único. Nos casos de segredo de justiça, pode ser autorizada a presença somente das partes, de seus advogados, de defensores públicos ou do Ministério Público.

1. Princípio da publicidade e da motivação das decisões – Garantia processual de efetividade ao contraditório é a necessidade de publicidade dos atos processuais, franqueando as

105


partes o conhecimento das informações constantes do processo para poder oferecer suas alegações. A publicidade dos atos processuais possui status constitucional uma vez que é expresso no inciso LX do artigo 5º e no inciso IX do artigo 93 da Constituição Federal. No Código de Processo Civil de 73 estava consagrado no artigo 155 e no Código de Processo Civil de 39 estava expresso no artigo 5º. A publicidade geral dos atos processuais pode ser restringida nos casos em que o interesse público assim o exigir, passando o processo a correr em segredo de justiça com autorização de participação

somente

das

partes

e

seus

procuradores, e do Ministério Público. O princípio da publicidade atua no controle da conduta dos envolvidos na relação jurídica

processual,

procuradores,

juiz

como e

as

auxiliares,

partes,

seus

Advogados

Públicos, Defensoria Pública e Ministério Público, garantindo a efetividade do processo para uma tutela jurisdicional justa. 106


Do mesmo modo as decisões dos juízes devem conter a fundamentação necessária para possibilitar as partes o seu direito de defesa, mediante

o

conhecimento

das

razões

que

conduziram o juiz a formar o seu convencimento. A fundamentação deve ser coerente, plena e adequada sem conter omissões ou contradições, sendo um elemento essencial da sentença, nos termos do artigo 489, inciso II, do CPC de 2015. O § 1º do referido artigo enumera algumas situações em que se considera insuficiente a fundamentação: a) quando se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida; b) empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso; c) invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão; d) não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo, capazes de infirmar a conclusão adotada pelo julgador; e) se limitar a invocar precedente ou enunciado

de

súmula,

sem

identificar

seus 107


fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos; e f) deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento. . Em

alguns

casos

é

admitida

a

fundamentação concisa em que basta a indicação dos elementos de convicção do juiz, como nos Juizados Especiais por força do artigo 38 da lei nº 9.099/95. Entretanto, fundamentação concisa não significa dispensar a motivação. O § 3º do artigo 1.021 do CPC de 2015 dispõe que não serve como fundamentação a reprodução da decisão agravada para negar provimento ao agravo interno, devendo motivar o seu convencimento. Também não basta a simples menção aos próprios fundamentos jurídicos da decisão recorrida para negar provimento ao recurso. A falta de publicidade e de motivação das decisões judiciais gera a nulidade dos referidos 108


atos,

pois

impede

que

as

partes

tenham

conhecimento das razões que levaram o juiz a formar o seu convencimento impossibilitando o contraditório e a ampla defesa. Art. 12. Os juízes e os tribunais deverão obedecer à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão. § 1o A lista de processos aptos a julgamento deverá estar permanentemente à disposição para consulta pública em cartório e na rede mundial de computadores. § 2o Estão excluídos da regra do caput: I – as sentenças proferidas em audiência, homologatórias de acordo ou de improcedência liminar do pedido; II – o julgamento de processos em bloco para aplicação de tese jurídica firmada em julgamento de casos repetitivos; III – o julgamento de recursos repetitivos ou de incidente de resolução de demandas repetitivas; IV – as decisões proferidas com base nos arts. 485 e 932; V – o julgamento de embargos de declaração; VI – o julgamento de agravo interno; VII – as preferências legais e as metas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça; VIII – os processos criminais, nos órgãos jurisdicionais que tenham competência penal; IX – a causa que exija urgência no julgamento, assim reconhecida por decisão fundamentada. § 3o Após elaboração de lista própria, respeitarse-á a ordem cronológica das conclusões entre as preferências legais. § 4o Após a inclusão do processo na lista de que trata o § 1o, o requerimento formulado pela parte não altera a ordem cronológica para a decisão,

109


exceto quando implicar a reabertura da instrução ou a conversão do julgamento em diligência. § 5o Decidido o requerimento previsto no § 4 o, o processo retornará à mesma posição em que anteriormente se encontrava na lista. § 6o Ocupará o primeiro lugar na lista prevista no § 1o ou, conforme o caso, no § 3o, o processo que: I – tiver sua sentença ou acórdão anulado, salvo quando houver necessidade de realização de diligência ou de complementação da instrução; II – se enquadrar na hipótese do art. 1.040, inciso II.

1. Julgamento em ordem cronológica – Os processos devem ser julgados por ordem de chegada ao magistrado por meio da conclusão, que é o ato processual que prepara o processo para a posterior prolação da decisão judicial. Na ordem de chegada somente são admitidas as preferências legalmente previstas. O próprio artigo prevê algumas exceções que são: as sentenças proferidas em audiência, homologatórias de acordo ou de improcedência liminar do pedido; julgamentos de tese jurídica firmada em incidente de resolução de demandas repetitivas ou em recurso repetitivo; apreciação de pedido de tutela de urgência e de evidência e de efeito suspensivo ou antecipação da tutela recursal; 110


julgamento de recursos repetitivos ou de incidente de

resolução

de

demandas

repetitivas;

as

preferências legais como a dos idosos e deficientes do artigo 1.048do CPC de 2015, habeas corpus, mandado de segurança (artigo 20 da Lei nº 12.016/2009), tutelas envolvendo menor (artigo 152 do Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei nº 8.069/90), entre outros. A lista elaborada é para dar publicidade à ordem de chegada dos processos para julgamento, possibilitando um controle sobre as preferências e sobre os próprios processos conclusos para decisão judicial. Na elaboração da lista o magistrado e seus auxiliares devem observar o grau de complexidade da demanda e a sua repercussão social e econômica para que possa seguir a ordem cronológica. O objetivo é privilegiar a razoável duração do processo, o devido processo legal e a efetividade da tutela jurisdicional evitando-se tratamentos diferenciados e injustificáveis.

111


DA COMPETÊNCIA INTERNACIONAL NO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL O capítulo I do título II do livro I da parte geral do Código de Processo Civil de 2015 trata nos artigos 21 a 25 da competência internacional. A seguir serão comentados os referidos artigos. Art. 21. Compete à autoridade judiciária brasileira processar e julgar as ações em que: I – o réu, qualquer que seja a sua nacionalidade, estiver domiciliado no Brasil; II – no Brasil tiver de ser cumprida a obrigação; III – o fundamento seja fato ocorrido ou ato praticado no Brasil.

112


Parágrafo único. Para o fim do disposto no inciso I, considera-se domiciliada no Brasil a pessoa jurídica estrangeira que nele tiver agência, filial ou sucursal.

1. Competência Internacional – Com redação similar ao artigo 88 da Lei nº 5.689/73 (Código de Processo Civil) o Código trata das hipóteses em que a Justiça Brasileira é competente para

julgar

uma

demanda,

sem

excluir

a

possibilidade da referida causa ser julgada pela Justiça Estrangeira. São casos de competência concorrente. Estabelece a competência do magistrado nacional em relação aos bens e valores inerentes ao Estado Brasileiro como o território, a população e as instituições. São casos em que há o interesse na solução destes conflitos. Trata-se de regra limitativa da jurisdição em razão da necessidade do convívio entre os Estados Soberanos. 2. Domicílio do réu – A Justiça Brasileira é competente para julgar as demandas em que o

113


réu, nacional ou estrangeiro, pessoa física ou jurídica, for domiciliado no Brasil. Dispõe o Código Civil (arts. 70 e 75) que se considera domicilio o local onde a pessoa natural exerce a sua residência com ânimo definitivo e para a pessoa jurídica o lugar onde funcionarem as respectivas diretorias e administrações, ou onde elegerem domicílio especial no seu estatuto ou atos constitutivos. Considera-se domiciliada no Brasil a pessoa jurídica estrangeira que nele tiver agência, filial ou sucursal. A súmula de jurisprudência do Supremo Tribunal Federal nº 363 dispõe que “a pessoa jurídica de direito privado pode ser demandada no domicílio da agência, ou estabelecimento, em que praticou o ato”. “Agências, lojas, fábricas, escritórios, sucursais, filiais são palavras que integram a vasta nomenclatura

com

que

se

designa

o

estabelecimento. A matriz ou sede é o principal” (JOSÉ EDWALDO TAVARES BORBA, Direito Societário, p. 45). 114


O incapaz, o servidor público, o militar, o marítimo e o preso têm domicilio necessário. O do incapaz é o do seu representante ou assistente; o do servidor

público,

o

lugar

em

que

exercer

permanentemente suas funções; o do militar, onde servir, e, sendo da Marinha ou da Aeronáutica, a sede do comando a que se encontrar imediatamente subordinado; o do marítimo, onde o navio estiver matriculado; e o do preso, o local onde cumpre a sentença (art. 76 do Código Civil). “O agente diplomático do Brasil, que, citado no estrangeiro, alegar extraterritorialidade sem designar onde tem, no país, o seu domicílio, poderá ser demandado no Distrito Federal ou no último ponto do território brasileiro onde o teve” (art. 77 do Código Civil). No caso de pluralidade de domicílios, sendo um deles no Brasil, aplica-se a jurisdição nacional. Para as pessoas jurídicas que possuem diversos estabelecimentos, cada um deles é considerado domicílio para os atos nele praticados.

115


Sendo um deles no Brasil aplica-se o disposto no inciso I. Isto porque os estabelecimentos são unidades

da

empresa

que

funcionam

como

instrumentos de sua atuação, tendo natureza jurídica de uma universalidade de fato. 3. Lugar de cumprimento da obrigação –

Independentemente

do

domicílio

e

da

nacionalidade é competente a Justiça Brasileira quando o local de cumprimento das obrigações seja o Brasil. Os negócios podem especificar os locais onde devem ser cumpridas as obrigações. O Judiciário brasileiro é competente quando a obrigação principal tiver de ser cumprida no Brasil, mesmo para os casos de existência das cláusulas de eleição de foro em negócio jurídico, visto que é vedado às partes dispor sobre a competência internacional concorrente por força das normas fundadas na soberania nacional, não suscetíveis à vontade dos interessados (REsp nº

116


251.438-RJ, DJ 2/10/2000, e REsp nº 498.835-SP, DJ 9/5/2005). 4.

Fato

ocorrido

no

Brasil

É

competente a Justiça Brasileira para os fatos ou atos jurídicos ocorridos no Brasil, como a responsabilidade decorrente de ato ilícito praticado no território nacional e os negócios jurídicos em geral. Art. 22. Compete, ainda, à autoridade judiciária brasileira processar e julgar as ações: I – de alimentos, quando: a) o credor tiver domicílio ou residência no Brasil; b) o réu mantiver vínculos no Brasil, tais como posse ou propriedade de bens, recebimento de renda ou obtenção de benefícios econômicos; II – decorrentes de relações de consumo, quando o consumidor tiver domicílio ou residência no Brasil; III – em que as partes, expressa ou tacitamente, se submeterem à jurisdição nacional.

1. Novas hipóteses de competência internacional concorrente – O Código introduziu novas hipóteses de competência internacional concorrente, para as ações de alimentos, quando o credor tiver domicílio ou residência no país ou quando o devedor tiver bens ou renda no Brasil; 117


para as ações que tenham como objeto relações de consumo; para as causas em que as partes, expressa ou tacitamente, submeterem à jurisdição nacional. O Código adota a competência da justiça brasileira para o julgamento das ações de alimentos quando o credor tiver domicílio no Brasil e o devedor for domiciliado em outro país, facilitando o acesso à justiça do alimentando. O Superior Tribunal de Justiça já vinha entendendo que era da competência da Justiça Comum do Estado processar e julgar a ação de alimentos pertinente ao artigo 26 da Lei nº 5.478/68, ao Decreto Legislativo 10 de 1958 e ao Decreto nº 56.826/65, que promulgou a Convenção sobre Prestação de Alimentos no Estrangeiro, quando o devedor esteja domiciliado no exterior (CC nº 20175/SP, LEXSTJ, vol. 117, p.55). A competência internacional concorrente em relação aos defeitos dos produtos e dos ilícitos praticados nas relações de consumo visa o acesso à justiça do consumidor brasileiro. No entanto, caso o consumidor realize contrato que contenha 118


cláusula

de

eleição

de

foro

estrangeiro

a

competência da justiça nacional será afastada para julgar a demanda, nos termos do art. 25 infra. A jurisprudência considerava nula a cláusula de eleição de foro diverso do domicílio do consumidor, por dificultar a defesa da parte hipossuficiente (CC 41728/PR, 2ª Seção, Min. Fernando Gonçalves, DJ 18/05/2005). O inciso III trata da cláusula da eleição de foro nacional para o julgamento dos conflitos surgidos nas relações negociais decorrentes de contrato internacional. Art. 23. Compete à autoridade judiciária brasileira, com exclusão de qualquer outra: I – conhecer de ações relativas a imóveis situados no Brasil; II – em matéria de sucessão hereditária, proceder à confirmação de testamento particular e ao inventário e à partilha de bens situados no Brasil, ainda que o autor da herança seja de nacionalidade estrangeira ou tenha domicílio fora do território nacional; III – em divórcio, separação judicial ou dissolução de união estável, proceder à partilha de bens situados no Brasil, ainda que o titular seja de nacionalidade estrangeira ou tenha domicílio fora do território nacional.

119


1. Competência exclusiva da Justiça Brasileira – Com redação similar ao do artigo 89 do Código de Processo Civil de 73 (Lei nº 5.689/73)

o

Código

tratou

da

competência

exclusiva da Justiça Brasileira para as demandas relativas a imóveis situados no Brasil, as que envolvem a partilha de bens situados no Brasil nos casos

de

sucessão

hereditária,

de

divórcio,

separação judicial ou dissolução de união estável. 2. Bens imóveis situados no Brasil – O Código fixou a competência exclusiva da Justiça Brasileira para julgar as ações, qualquer que seja o seu fundamento, relativas a imóveis situados no Brasil independentemente da nacionalidade das partes, não tendo validade no Brasil qualquer decisão proferida pela Justiça Estrangeira. Com isto afasta-se qualquer ingerência da Justiça Estrangeira no tocante aos bens situados em território

nacional,

independentemente

da

nacionalidade do seu titular. 3.

Confirmação

de

testamento

particular, inventário e partilha – Somente o 120


magistrado brasileiro poderá confirmar testamento particular, julgar inventário e partilha de bens móveis ou imóveis situados no Brasil, mesmo que o autor da herança seja estrangeiro e tenha domicílio fora do território nacional, bem como tenha falecido no exterior. Trata-se da regra forum rei sitae. O artigo 89 do Código de Processo Civil de 73 não fazia menção à confirmação de testamento particular, que é um procedimento de jurisdição voluntária previsto no artigo 737 deste Código. Neste caso, o juiz faz uma análise formal do ato de última vontade do autor da herança. Como o Código antigo não fazia menção à confirmação de testamento particular, tanto o Supremo Tribunal Federal quanto o Superior Tribunal de Justiça se manifestaram pela ausência de ofensa à soberania nacional e à ordem pública na sentença estrangeira que dispõe acerca de bem localizado no território brasileiro, sobre o qual tenha havido acordo entre as partes, e que tão

121


somente ratifica o que restou pactuado, incluindo a disposição de última vontade do testador. Com a nova regra a competência passa a ser exclusiva da Justiça Brasileira, não podendo ser homologada sentença estrangeira que ratifique a partilha de bens localizados no território brasileiro. 4.

Divórcio,

separação

judicial

ou

dissolução de união estável – A partilha de bens situados no território nacional é de competência exclusiva da Justiça brasileira, nos processos de divórcio, separação judicial e de dissolução de união estável. Do mesmo modo que no item anterior, o Código de Processo Civil de 73 não previa a competência exclusiva da Justiça brasileira para processar e julgar as ações de divórcio, separação judicial e dissolução de união estável em que se dispunha acerca da partilha de bens situados no território nacional. Diante

disto,

a

possibilidade

de

homologação de sentença estrangeira proferida em ação de divórcio e separação judicial, que haja 122


procedido à partilha de bens móveis e imóveis situados no Brasil, gerou controvérsia, existindo julgados que deferem a homologação e outros que indeferem a homologação por entender haver ofensa soberania nacional. Com a Emenda Constitucional nº 45/04 a competência para a homologação de sentença estrangeira passou a ser do Superior Tribunal de Justiça e não mais do Supremo Tribunal Federal, mediante alteração no texto constitucional que suprimiu a alínea h do inciso I do artigo 102 e com a inclusão da alínea i ao inciso I do artigo 105. O Superior Tribunal de Justiça vinha adotando o entendimento de que a exclusividade da jurisdição brasileira para dispor sobre a partilha de bens situados no território nacional afasta a possibilidade

de

homologação

de

sentença

estrangeira que trate do assunto (precedentes: SEC 5302, Corte Especial, Min. Nancy Andrighi, Dje 07/06/2011; SEC 5270, Corte Especial, Min. Félix Fischer, Dje 14/06/2011 – RSTJ vol. 223, p.84).

123


Com a nova regra cabe exclusivamente a Justiça Brasileira dispor acerca da partilha de bens nas ações de divórcio, separação judicial e dissolução de união estável, não podendo ser homologada sentença estrangeira que disponha sobre a referida partilha por representar ofensa à soberania nacional. Art. 24. A ação proposta perante tribunal estrangeiro não induz litispendência e não obsta a que a autoridade judiciária brasileira conheça da mesma causa e das que lhe são conexas, ressalvadas as disposições em contrário de tratados internacionais e acordos bilaterais em vigor no Brasil. Parágrafo único. A pendência de causa perante a jurisdição brasileira não impede a homologação de sentença judicial estrangeira quando exigida para produzir efeitos no Brasil.

1.

Litispendência

com

Justiça

Estrangeira – Com redação similar ao do artigo 90 do CPC de 73 o Código trata da litispendência para os casos de competência internacional concorrente. O fato de existir processo no exterior não impede a propositura de demanda igual no Brasil (identidade de partes, de causa de pedir e de pedido), tendo em conta que a sentença proferida 124


em outro país tem ser homologada pelo Superior Tribunal de Justiça (art. 105, I, i da CF) para ter eficácia no território nacional. Deste modo, mesmo existindo processo pendente com identidade de partes, de causa de pedir e de pedido não é afastada a jurisdição nacional. Do mesmo modo, as causa conexas (objeto da demanda idêntico ou mesma causa de pedir) também não afasta a jurisdição nacional. Diferentemente do Código de Processo Civil

de

73,

que

não

fazia

ressalvas,

a

litispendência e a conexão internacional podem ser previstas em tratado internacional e acordo bilateral, e neste caso a propositura de ação no estrangeiro induz litispendência e conexão por expressa previsão no caput do artigo 24. Trata-se de matéria afeta a cooperação internacional, permitindo que a litispendência e a conexão sejam alegáveis quando a sentença proferida num Estado possa ter eficácia de coisa julgada no outro, desde que prevista em tratado

125


internacional e acordo bilateral do qual o Brasil seja signatário. É o caso do Código de Bustamante (Decreto 18.871, de 13 de agosto de 1929), fruto da Convenção de Havana de 20/02/1928, que no artigo 394 trata da litispendência internacional. A

litispendência

estrangeira

somente

ocorre nos casos de competência internacional concorrente dos artigos 21 e 22, não se aplicando para a competência exclusiva da jurisdição nacional do artigo 23. Deste modo, para os casos de competência internacional concorrente prevalecerá a sentença que transitar em julgado no exterior quando argüida a litispendência, podendo a sentença estrangeira ser homologada para produzir efeitos no território nacional. Art. 25. Não compete à autoridade judiciária brasileira o processamento e o julgamento da ação quando houver cláusula de eleição de foro exclusivo estrangeiro em contrato internacional, argüida pelo réu na contestação. § 1o Não se aplica o disposto no caput às hipóteses de competência internacional exclusiva previstas neste Capítulo.

126


§ 2o Aplica-se à hipótese do caput o art. 63, §§ 1o a 4o.

1.

Cláusula

de

eleição

de

foro

estrangeiro – Quando estipulado em contrato internacional a cláusula de eleição de foro exclusivo estrangeiro, este é o competente para o julgamento da demanda relativa às obrigações decorrentes do referido contrato, excluindo-se a jurisdição nacional. Evidentemente a cláusula de eleição de foro em contrato internacional não pode afastar a jurisdição brasileira nas hipóteses de competência exclusiva do artigo 23. Cláusula de eleição de foro consiste na escolha consensual do juízo para solucionar os conflitos decorrentes da relação contratual. O artigo 63 do Código de Processo Civil de 2015 prevê a possibilidade de modificação da competência (em razão do valor e do território) diante de convenção das partes na escolha do foro. Nos contratos internacionais, a eficácia da eleição de foro estrangeiro é controvertida quando 127


o Judiciário brasileiro também é competente para julgar a lide, nas hipóteses de competência internacional concorrente. O Superior Tribunal de Justiça vinha adotando o entendimento de que a cláusula de eleição de foro estrangeiro era válida exceto quando a lide envolvesse interesses públicos. Deste modo, a demanda podia ser proposta no Brasil mesmo quando o contrato internacional tivesse cláusula de eleição de foro estrangeiro, nas hipóteses de competência internacional concorrente (precedentes: Resp nº 1168547/RJ, 4ª Turma, Min. Luis Felipe Salomão, Dje 07/02/2011; Resp n 1177915/RJ, 3ª Turma, Min. Vasco Della Giustina, Dje 24/08/2010). O

Código

adotou

regra

conferindo

validade para a cláusula de eleição de foro estrangeiro afastando a jurisdição nacional nestes casos,

salvo

nas

hipóteses

de

competência

exclusiva dos magistrados brasileiros, no intuito de garantir

a

segurança

nas

negociações

internacionais, eis que a referida cláusula constitui 128


elemento integrante do contrato internacional firmado entre as partes. Entretanto, se a cláusula de eleição de foro estrangeiro for abusiva, poderá o juiz brasileiro torná-la ineficaz por se tratar de competência internacional concorrente.

APONTAMENTOS ACERCA DO DIREITO INTERTEMPORAL E O NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL O artigo 14 da Lei nº 13.105/2015, novo Código de Processo Civil, dispõe que: Art. 14. A norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada.

129


1. A Lei processual no tempo – “Quanto à eficácia da lei processual em relação aos processos pendentes, aplica-se a regra tempus regit actum, segundo a qual fatos ocorridos e situações já consumadas no passado não se regem pela lei nova que entra em vigor, mas continuam valorados segundo a lei do seu tempo. As leis dispõem para o futuro e não para o passado. As previsões gerais e abstratas que contêm são realmente pré-visões e constituem tipificações de fatos e condutas possíveis de ocorrer no futuro e a serem regidos pelos preceitos nela estabelecidos. Tal é, ao mesmo tempo, o fundamento e o significado da regra da aplicação imediata da lei processual, que não importa retroatividade e traz em si a preservação das situações jurídicas consumadas sob o império da

lei

revogada”.

(CÂNDIDO

RANGEL

DINAMARCO, Instituições de direito processual civil vol. I, p. 97). Conforme dispõe o inciso XXXVI do artigo 5º da Constituição Federal e artigo 6º da Lei de Introdução ao Código Civil (Decreto-Lei 130


4.657/42) a lei nova não pode atingir o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada. Deste modo, a lei processual não se aplica aos processos findos cujos atos regem-se pela lei anterior e aplica-se inteiramente aos processos iniciados em sua vigência. Quanto aos processos pendentes atingidos pela vigência da nova lei, a solução adequada é a de aplicá-la somente para os atos processuais em curso, respeitando os atos processuais praticados na vigência da lei antiga. Assim, não se aplica a lei nova aos atos já realizados e as situações consumadas no procedimento. No livro complementar das disposições finais e transitórias são estipuladas algumas regras de direito intertemporal, nos artigos 1.045 a 1.047, artigos 1.052 a 1.054, artigo 1.056, 1.057 e 1.063. Sem pretensão de esgotar o assunto, elencamos as seguintes situações jurídicas geradas pela incidência do novo Código de Processo Civil nos processos pendentes:

131


1 – Ao entrar em vigor a Lei nº 13.105/2015 suas disposições serão aplicáveis imediatamente

aos

processos

pendentes,

revogando-se a Lei nº 5.869/73 (art. 1.046). 2 – As normas do CPC de 73 referentes ao procedimento

sumário

e

aos

procedimentos

especiais revogadas serão aplicadas as ações propostas em que não tenha sido proferida sentença até o início da vigência deste Código (§ 1º do art. 1.046). 3 – As condições da ação são regidas pela lei vigente na data de sua propositura. 4 – A revelia e os seus efeitos regulam-se pela lei vigente na data do decurso do prazo para resposta. 5 – A defesa do réu rege-se pela lei vigente na data da citação 6 – O princípio da perpetuatio jurisditionis não é absoluto na aplicação de normas de processo. Não julgada a ação, a lei nova se aplica em casos de modificação de competência do órgão julgador.

132


7 – Os processos mencionados no artigo 1.218 do Código de Processo Civil de 73, que faz referência

a

determinados

procedimentos

do

Código de Processo Civil de 39, não regulados em lei

específica

submetem-se

ao

procedimento

comum deste Código (§ 2º do art. 1.046). 8 – As provas já produzidas aplicam-se a lei anterior, e para aquelas cujo deferimento ou produção ocorra na vigência da lei nova a esta devem obedecer. 9 – Os efeitos da sentença regulam-se pela lei vigente na data em que é proferida. 10 – Os requisitos de admissibilidade dos recursos regulam-se pela lei vigente na data da decisão.

133


A SÚMULA DE JURISPRUDÊNCIA Nº 409 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E O NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL Dispõe a súmula de jurisprudência nº 409 do Superior Tribunal de Justiça que: “em execução fiscal, a prescrição ocorrida antes da propositura da ação pode ser decretada de ofício (art. 219, § 5º, do CPC)”. No Recurso Especial nº 1.100.156/RJ, precedente que fundamentou a súmula nº 409 do Superior

Tribunal

de

Justiça,

adotou-se

o

134


entendimento de que na ação de execução fiscal a prescrição ocorrida antes da propositura da ação pode ser decretada de ofício, com base no artigo 219, § 5º, do Código de Processo Civil (redação da Lei 11.051/04), independentemente da prévia ouvida da Fazenda Pública. Dispôs, ainda, que a norma do § 4º do artigo 40, da Lei nº 6.830/80, que exige essa providência prévia, somente se aplica às hipóteses

de

prescrição

intercorrente

nele

indicadas. A prescrição intercorrente é aquela que ocorre no transcurso do processo, em razão da paralisação deste por prazo superior ao exigido para o do exercício do direito de ação. A inércia tem que ser continuada e ininterrupta causada pela exeqüente ao não promover o regular andamento do processo. Dispõe a súmula de jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça nº 314 que: “em execução fiscal, não localizados bens penhoráveis, suspende-se o processo por um ano, findo o qual se

135


inicia

o

prazo

da

prescrição

qüinqüenal

intercorrente”. Por outro lado, a prescrição do direito de propor a ação de execução fiscal não ocorre quando a demora na citação decorreu do mecanismo judiciário (artigo 240, § 3º do novo Código de Processo Civil). “Proposta a ação no prazo fixado para o seu exercício, a demora na citação por motivos inerentes ao mecanismo da justiça, não justifica o acolhimento da argüição de prescrição ou decadência.” (súmula de jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça nº 106). Verifica-se que a inércia causadora da prescrição intercorrente ou da prescrição do exercício do direito de ação, tem que ser da parte exeqüente

ao

não

promover

as

diligências

necessárias para realizar a citação do executado, e conseqüentemente

a

interrupção

do

prazo

prescricional da ação de execução fiscal, bem como ao não realizar as diligências necessárias para localizar bens penhoráveis do executado, para satisfação do seu crédito. 136


No AgRg

no

Recurso

Especial

1002435/RS, outro precedente que serviu de diretriz para a súmula nº 409 do Superior Tribunal de Justiça, ficou decidido que a prescrição pode ser decretada de ofício pelo Juiz quando receber a petição inicial da ação de execução fiscal, sem a necessidade de proceder à ordenação para citação do executado, porquanto configurada causa de indeferimento liminar da peça inaugural, nos termos do art. 219, § 5º, do CPC de 73, bem como de ausência de condição específica para o exercício do direito da ação executiva fiscal, qual seja, a exigibilidade

da

obrigação

materializada

na

Certidão da Dívida Ativa. O § 5º, do artigo 219, do Código de Processo Civil de 73, trata da possibilidade de indeferimento da petição inicial mediante o reconhecimento

da

prescrição,

julgando

improcedente a demanda com resolução do mérito. Para tanto é necessário que o Juiz disponha de elementos suficientes para formar a sua convicção, sem a necessidade de produção de outras provas. 137


Caso haja dúvida quanto à ocorrência ou não da prescrição, deverá o magistrado ouvir as partes. O novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015) exige a manifestação da parte sobre a prescrição e a decadência antes do juiz pronunciála, conforme disposto no artigo 10 e no parágrafo único do artigo 487. Deste modo, o juiz pode conhecer de ofício da prescrição e da decadência, sem necessidade de requerimento das partes, entretanto deve ouvi-las antes de proferir sua decisão (art. 337, § 5º e art. 342, inc. II). O artigo 332, § 1º, do novo Código de Processo Civil, excepciona a regra ao determinar a improcedência

liminar

do

pedido,

independentemente da citação do réu, quando verificada a ocorrência da prescrição ou da decadência. Neste caso, havendo a extinção do processo com resolução do mérito (artigo 487, inciso II, do novo CPC) o exeqüente será intimado da sentença e o executado ingressará no processo para apresentar suas contrarrazões ao recurso de apelação. 138


Não havendo análise de ofício pelo Juiz, acerca da prescrição e da decadência, quando do recebimento da petição inicial da ação de execução fiscal, cumpre ao executado alegá-la em exceção de pré-executividade, em embargos a execução (art. 16 da LEF e art. 917, I, do novo CPC), ou por meio de petição simples nos autos da ação de execução fiscal (art. 342, II, do CPC/2015). Quando a matéria relativa à prescrição for suscitada de ofício ou a requerimento, após a citação do executado, é necessária a intimação pessoal da Fazenda Pública para se manifestar acerca da questão, sob pena de nulidade da decisão proferida

pelo

Juiz

sem

observância

do

contraditório. Como dito inicialmente, o § 5º, do artigo 219, do Código de Processo Civil de 73, foi o fundamento jurídico utilizado nos precedentes firmar o entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, quanto à possibilidade de ser decretada de ofício a prescrição ocorrida antes da

139


propositura da ação de execução fiscal, sem a necessidade de citação do executado. As questões decididas nos precedentes que serviram de diretriz para a edição da súmula de jurisprudência

têm

caráter

persuasivo

e

de

observância obrigatória pelos Juízes e Tribunais, nos termos do artigo 927 do Código de Processo Civil de 2015 Tal é a força atribuída aos precedentes que o artigo 489, § 1º, do CPC/2015, considera como não fundamentada a decisão que deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento. Por outro lado, também se considera como insuficiente de fundamentação a decisão judicial que se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula,

sem

identificar

seus

fundamentos

determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos, bem como se limitar à indicação, à reprodução ou à 140


paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida. Isto quer dizer as decisões judiciais, na sua motivação, não devem apenas se reportar a artigos de lei ou a conceitos abstratos. Elas devem apresentar os elementos fáticos e jurídicos que o magistrado

se

utilizou

para

decidir.

Na

fundamentação das decisões judiciais o juiz deve identificar exatamente as questões que reputou como essenciais ao desfecho da demanda. Deste modo, o precedente ou enunciado de súmula não afeta a tarefa do juiz de interpretar e aplicar a norma jurídica aos fatos aduzidos na demanda,

sendo

nula

por

ausência

de

fundamentação a decisão que não explicar a razão pela

qual

o

entendimento

jurisprudencial

persuasivo se aplica ou não ao litígio a ser julgado. Inclusive é permitido ao julgador afastar a aplicação do procedente ou enunciado de súmula quando não se ajusta ao caso concreto (distinção ou distinguishing), ou quando demonstrar que a jurisprudência que os embasaram está superada, 141


não condizendo mais com a justiça do momento (superação ou overrruling). O artigo 926 do CPC/2015, por sua vez dispõe que os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente, e que ao editar os enunciados de súmula, os tribunais devem ater-se às circunstâncias fáticas dos precedentes que motivaram sua criação. O que se consolidou no enunciado da súmula nº 409, foi à possibilidade de indeferimento liminar da petição inicial do executivo fiscal pelo magistrado ex officio, por aplicação subsidiária do Código de Processo Civil de 73, conforme autorização contida no artigo 1º, da Lei nº 6.830/80. Que a exigência de manifestação prévia da Fazenda Pública, disposta no § 4º, do artigo 40, da lei de execução fiscal, não impede que as disposições contidas no Código de Processo Civil referentes à improcedência liminar do pedido, em razão da verificação da prescrição, sejam aplicadas a ação de execução fiscal, por conter o referido

142


artigo 40 regra específica para o reconhecimento da prescrição intercorrente. Caso o novo Código não contivesse norma com igual comando ao do § 5º, do artigo 219, do Código de Processo Civil de 73, seria necessária a revisão ou o até mesmo o cancelamento da súmula em decorrência da modificação legislativa. Entretanto não foi o que aconteceu, pois o artigo 332, § 1º, do CPC/2015, possui comando igual ao do § 5º, do artigo 219, do Código de Processo Civil de 73, ao tratar da improcedência liminar do pedido diante da ocorrência da prescrição, que tem aplicação subsidiária nas execuções fiscais por força do artigo 1º, da Lei nº 6.830/80. Obviamente que as súmulas podem ser revistas ou canceladas pelo próprio Tribunal, em decorrência da modificação do texto legislativo que deu origem ao entendimento consolidado, ou até mesmo pela mudança na jurisprudência que originou a súmula. Isto porque, a súmula espelha a jurisprudência pacificada a respeito de um texto 143


legal, sendo dotada, normalmente, da vida que esse texto tenha. Modificado o texto, ipso facto, a súmula deve ser cancelada, salvo se a modificação em nada afetar o conteúdo da súmula, pois muitos dos enunciados das súmulas contêm um quid a mais além da interpretação do direito posto, transcendendo do texto legal (ARRUDA ALVIM, Arguição de relevância no recurso extraordinário, 1988, pág. 34/35). Deste modo, o fato dos precedentes que serviram de diretriz para a formação da súmula de jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça nº 409, terem como fundamento normativo o § 5°, do artigo 219, do Código de Processo Civil de 73, não tem o condão de afastar a aplicação da referida súmula quando o novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015) entrar em vigor, tendo em conta que o artigo 332, § 1º, do novo Código, mantém a possibilidade de indeferimento liminar da petição inicial em razão da verificação da prescrição, independentemente da citação do executado. 144


O FORO CONTRATUAL E A SÚMULA DE JURISPRUDÊNCIA Nº 335 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL O foro contratual ou foro de eleição é o convencionado pelas partes contratantes, que optam por submeter às ações relativas às obrigações e direitos estipulados no negócio jurídico escrito, a apreciação do foro escolhido. A cláusula de eleição de foro obriga os herdeiros e os sucessores. Isto porque, as obrigações

contratuais

transmitem-se

ativa

e

passivamente aos sucessores a título universal, salvo as personalíssimas. Os créditos e obrigações 145


passam-lhes, subsistindo o contrato a partir da abertura da sucessão (art. 1.784, do Código Civil). O artigo 63 do Código de Processo Civil de 2015 (Lei nº 13.105/2015) trata da possibilidade das partes modificarem a competência em razão do valor e a territorial, por meio de cláusula de eleição de foro em negócio jurídico. Do mesmo modo, o artigo 47, § 1º, do Código, autoriza o autor a optar pelo foro de eleição quando a ação não tiver por abjeto os direitos de propriedade, vizinhança, servidão, divisão e demarcação de terras e de nunciação de obra nova (hipóteses de competência absoluta que prevalece o forum rei sitae). Trataremos

do

foro

contratual

nas

hipóteses de competência interna e não do foro contratual

nas

hipóteses

de

competência

internacional, admitidas pelo novo Código de Processo Civil, nos artigos 22, III e 25. Na súmula de jurisprudência nº 335 o Supremo

Tribunal

Federal

consolidou

o

entendimento de que “é válida a cláusula de eleição do foro para os processos oriundos do contrato”. O 146


precedente que serviu de diretriz para a elaboração da referida súmula é o Recurso Extraordinário nº 34.791, em que se discute a validade de cláusula contratual de eleição de foro, formalizada em promessa de compra e venda de bem imóvel. O entendimento foi no sentido de que é válido o foro contratual para as obrigações e direitos decorrentes do contrato, embora o Código de Processo Civil de 1939 (Decreto-Lei nº 1.608/1939) não fizesse menção ao foro de eleição. O principal fundamento foi o artigo 42 do Código Civil de 1916 (Lei n 3.071/16), que tratava do domicílio de eleição para cumprimento das obrigações decorrentes dos contratos (atual artigo 78 do Código Civil de 2002). Deve-se observar que a súmula de jurisprudência nº 335 do STF, foi aprovada pelo seu Plenário em 13/12/1963, e o acórdão proferido no Recurso Extraordinário nº 34.791 data de 8 de agosto de 1957, portanto antes da vigência do Código de Processo Civil de 73, que no artigo 111 contém norma expressa autorizando o foro contratual. O novo Código de Processo Civil contém comando 147


similar ao do artigo 111 do CPC de 73, no artigo 63. O referido Recurso Extraordinário nº 34.791, foi interposto com fundamento na alínea a, do inciso III, do artigo 101, da Constituição Federal de 1946, que trata dos casos de recurso extraordinário interpostos das decisões contrárias a dispositivos da Constituição ou à letra de tratado ou lei federal. Foi alegada violação aos artigos 133, II e 136 do Código de Processo Civil de 1939, e ao artigo 42 do Código Civil. Somente com a Constituição Federal de 1988 é que o Superior Tribunal de Justiça passou a ser o órgão jurisdicional com competência para julgar em recurso especial as causas decididas, em única

ou

última

instância,

pelos

Tribunais

Regionais Federais ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão recorrida contrariar tratado ou lei federal, ou negarlhes vigência. Pode-se notar que os diplomas legais constantes do acórdão que serviu de precedente 148


para a súmula de jurisprudência nº 335 do Supremo Tribunal Federal, já não estão mais em vigor em razão de legislação posterior que regulamentou por completo os temas envolvidos na divergência jurisprudencial. O Código de Processo Civil de 39 foi revogado pelo Código de Processo Civil de 73 (em vigor até o ano de 2016), o Código Civil foi revogado pelo Código Civil de 2002 e o Decreto nº 4.857/39 foi revogado pela Lei nº 6.015/73, que trata dos registros públicos. Entretanto, a súmula continua em vigor principalmente pelo teor do enunciado que constitui comando válido ao dispor que é válida a cláusula de eleição do foro para os processos oriundos do contrato. Deste modo, apenas uma decisão que negue validade ao foro contratual é que pode se sujeitar a aplicação da referida súmula. De qualquer forma, haverá violação ao artigo 111 do Código de Processo Civil de 1973, e do artigo 63 do novo Código de Processo Civil, quando entrar em vigor. Deste modo, a princípio é lícita a cláusula de eleição de foro e prevalecerá, salvo se abusiva 149


ou causar dificuldade para a outra parte cumprir as obrigações pactuadas. Nestes casos, a cláusula abusiva será considerada nula de ofício pelo juiz que remeterá os autos do processo para o foro do domicílio do réu. A expressa menção do artigo 111, do CPC de 73, e do artigo 63, do novo Código de Processo Civil, a direitos e obrigações exclui a possibilidade da eleição de foro em relação a causas envolvendo direitos indisponíveis, como as relativas ao Estado (matéria estatutária, tributária etc.) e as que digam respeito ao direito de família e sejam relacionadas com o estado e capacidade das pessoas. Dispõe o artigo 63, § 3º, do novo Código de Processo Civil, que o magistrado pode considerar nula a cláusula de eleição de foro e declinar a competência antes do réu ser citado. Após a citação, cabe ao réu alegar a nulidade da cláusula de eleição de foro por ser abusiva, na preliminar da contestação, e em não o fazendo neste momento prorroga-se a competência, que no caso é relativa. Isto porque, a cláusula abusiva é 150


aquela portadora de dificuldade para o réu se defender, e se este pode oferecer sua defesa sem alegar a nulidade do foro contratual, não há razão para se declinar a competência. Diversamente do parágrafo único do artigo 112, do Código de Processo Civil de 73 (incluído pela Lei nº 11.280/2006), que dispõe que o magistrado pode declarar de ofício a nulidade da cláusula de eleição de foro, em contrato de adesão, o artigo 63 do novo Código de Processo Civil não faz restrição ao tipo de contrato, aplicando-se a todos. Apresentada a contestação com a alegação preliminar

de

incompetência,

cumpre

ao

magistrado decidir sobre a procedência ou não da alegação. A decisão que acolhe ou rejeita a preliminar de incompetência é interlocutória, pois não tem o condão de resolver o mérito da demanda. O recurso cabível neste caso é o agravo de instrumento. Acolhida

a

preliminar

deve

o

magistrado declinar a competência remetendo os autos do processo para o juízo competente. 151


Inovação importante é a do artigo 340 do novo Código de Processo Civil, que autoriza o réu a protocolizar a contestação no foro do seu domicílio,

quando

houver

preliminar

de

incompetência absoluta ou relativa. Neste caso, a contestação será distribuída livremente ou, se o réu houver sido citado por meio de carta precatória, juntada aos autos dessa carta, seguindo-se a sua imediata

remessa

para

o

juízo

da

causa.

Reconhecida a competência do foro indicado pelo réu, o juízo para o qual for distribuída a contestação ou a carta precatória será considerado prevento. A Alegação de incompetência realizada nos termos do artigo 340 importa na suspensão da realização da audiência de conciliação ou de mediação, se já tiver sido designada. Definida a competência, o juízo competente designará nova data para a audiência de conciliação ou de mediação. O referido artigo terá importante aplicação nas alegações preliminares de incompetência relativa, em decorrência da abusividade da cláusula 152


de eleição de foro em contrato escrito que crie dificuldade de defesa para o réu. A abusividade da cláusula de eleição de foro é recorrente nas relações de consumo, principalmente nos contratos de adesão. Segundo entendimento do Superior Tribunal de Justiça nas ações

propostas

contra

o

consumidor,

à

competência pode ser declinada de ofício para o seu domicílio, e se for o autor da demanda permitese a escolha do foro de eleição contratual, considerando que a normas de proteção do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90), erigidas em seu benefício, não o obriga quando puder deduzir sem prejuízo a defesa dos seus interesses fora do seu domicílio (STJ, CC nº 107441, DJe 01/08/2011). Do mesmo modo, “em se tratando de relação de consumo e tendo em vista o

princípio

da

facilitação

da

defesa

do

hipossuficiente, não prevalece o foro contratual de eleição quando estiver distante daquele em que reside o consumidor em razão da dificuldade que este terá para acompanhar o processo” (STJ, CC nº 153


41728, DJ 18/05/2005). No tocante aos contratos de adesão “não prevalece o foro contratual de eleição, se configurada que tal indicação, longe de constituir-se uma livre escolha, mas mera adesão a cláusula pré-estabelecida pela instituição mutuante, implica em dificultar a defesa da parte mais fraca, em face dos ônus que terá para acompanhar o processo em local distante daquele em que reside e, também, onde foi celebrado o mútuo” (STJ, CC nº 23968, DJ 16/11/1999). Em resumo, “firmou o Superior Tribunal de Justiça entendimento no sentido de que o foro contratual deve ser afastado quando implicar em dificuldades de acesso à justiça para a parte mais fraca, em relação consumerista” (STJ, REsp nº 722437, DJ 09/05/2005). Por expressa previsão legal, no artigo 63, § 2º e § 3º, do novo Código de Processo Civil, o entendimento passa a ser aplicável a todas as causas.

154


REFLEXÕES SOBRE A COOPERAÇÃO JURÍDICA INTERNACIONAL Sumário: 1. Introdução. 2. Disposições gerais sobre a cooperação jurídica internacional. 3. Auxílio direito. 4. Carta rogatória. 5. Trâmites do pedido de cooperação jurídica internacional. 6. Conclusão. 7. Referências.

1. Introdução A cooperação jurídica internacional tem um capítulo próprio no Código de Processo Civil de 2015, o capítulo II, do título II, do livro II, artigos 26 a 41, que tratam dos requisitos gerais da cooperação, do auxílio direito, e da carta rogatória. Além disto, a homologação de sentença estrangeira e a concessão de exequatur à carta rogatória têm

155


um capítulo próprio (II) no livro III, no título I, que abrange os artigos 960 a 965. A importância do tema se deve ao aumento das relações comerciais exercidas entre os países, que passam a necessitar de instrumentos ágeis de cooperação jurídica internacional para que o intercâmbio entre as justiças se torne menos morosa e onerosa para as partes. Antes internacionais

do já

CPC/2015,

dispunham

tratados

sobre

alguns

mecanismos de cooperação internacional, no intuito de agilizar o cumprimento de tutelas provisórias, o pagamento de prestações alimentícias, a restituição de crianças ao seu país de residência habitual, o benefício da gratuidade de justiça e outros. No requisitos

presente gerais

da

texto

trataremos

cooperação

dos

jurídica

internacional e de seus mecanismos como o auxílio direito e a carta rogatória. No tocante a homologação de sentença estrangeira e a concessão do exequatur a carta rogatória serão feitas apenas

156


referências sem uma análise mais profunda dos artigos que tratam dos institutos. 2. Disposições gerais sobre a cooperação jurídica internacional A cooperação jurídica internacional é o mecanismo por meio do qual um Estado solicita a outro

Estado

a

realização

de

medidas

administrativas ou judiciais para fins de instrução processual ou de execução de decisões proferidas em causas ajuizadas na Justiça requerente. Deste modo, para que a Justiça de um Estado possa atingir determinada pessoa ou seus bens quando localizados em território estrangeiro, deve ser realizada a cooperação jurídica internacional em respeito à soberania dos demais Estados. Nos termos do artigo 26 do novo CPC (Lei nº 13.105/2015) a cooperação jurídica internacional será regida por tratado internacional de que o Brasil seja parte signatária e observará: o respeito às garantias do devido processo legal no Estado requerente; a igualdade de tratamento entre 157


nacionais e estrangeiros, residentes ou não no Brasil, em relação ao acesso à justiça e à tramitação dos

processos,

judiciária

aos

assegurando-se necessitados;

a a

assistência publicidade

processual, exceto nas hipóteses de sigilo previstas na legislação brasileira ou na do Estado requerente; a existência de autoridade central para a recepção e a transmissão dos pedidos de cooperação, sendo o Ministério da Justiça o órgão que exercerá as referidas funções na ausência de designação específica; a espontaneidade na transmissão de informações ausência

de

a

autoridades

tratado,

a

estrangeiras.

cooperação

Na

jurídica

internacional poderá realizar-se com base em reciprocidade, manifestada por via diplomática. Não se exigirá a reciprocidade para a homologação de sentença estrangeira. Na cooperação jurídica internacional não será admitida a prática de atos que contrariem ou que produzam resultados incompatíveis com as normas

fundamentais

que

regem

o

Estado

158


brasileiro. Não se admite a ofensa a soberania nacional e a ordem pública. Serão recusados os pedidos de cooperação jurídica internacional, feitos ao Brasil, quando configurarem ofensa à ordem pública (art. 39 do CPC/2015). Os instrumentos para a efetivação da cooperação jurídica internacional na jurisdição civil são a homologação da sentença estrangeira, as cartas rogatórias e o auxílio direto. Quando o Estado brasileiro solicita a cooperação

de

outro

Estado

diz-se

que

a

cooperação é ativa. Caso contrário, quando um Estado solicita a cooperação do Brasil diz-se que a cooperação é passiva. Na existência de acordo formal, tratado, concluído entre pessoas jurídicas de direito internacional público para produzir efeitos entre as partes

relativamente

à

cooperação

jurídica

internacional, este deve ser observado quanto à admissibilidade, requisitos e procedimentos para dar cumprimento aos instrumentos de cooperação. 159


Na ausência de tratado, a cooperação jurídica internacional poderá se realizar com base na reciprocidade, manifestada por via diplomática, que gera um compromisso para o Estado por constituir uma promessa que não se sujeita a aprovação do Congresso Nacional. Como dito anteriormente, não se aplica a reciprocidade para a homologação de sentença estrangeira. O princípio da reciprocidade já tinha aplicação principalmente na cooperação jurídica internacional em matéria penal, como pode se notar da ementa do seguinte julgado proferido no Agravo Regimental na Carta Rogatória nº 6692: “Não sendo hipótese de ofensa à soberania nacional, à ordem pública ou de inobservância dos requisitos da Resolução n. 9/2005, cabe apenas a este e. Superior

Tribunal

de

Justiça

emitir

juízo

meramente delibatório acerca da concessão do exequatur nas cartas rogatórias, sendo competência da Justiça rogante a análise de eventuais alegações relacionadas ao mérito da causa. II - Além dos tratados e acordos bilaterais entre o Brasil e os 160


demais países, a garantia de aplicação do princípio da

reciprocidade

é

também

fundamento

da

cooperação jurídica internacional” (STJ, Corte Especial, Min. Félix Fischer, DJe 24/10/2012). Na

cooperação

jurídica

internacional

devem ser observados os princípios do devido processo legal, da publicidade, da igualdade entre as partes, do acesso à justiça com a assistência judiciária

aos

necessitados,

a

existência

de

autoridade central para a recepção e a transmissão dos pedidos de cooperação e a espontaneidade na transmissão

de

informações

a

autoridades

estrangeiras. Isto porque os procedimentos da carta rogatória e da ação de homologação de sentença estrangeira são de jurisdição contenciosa. No Brasil o Ministério da Justiça foi o órgão designado para exercer a função de autoridade central, concentrando neste as atividades de envio e recebimento dos pedidos de cooperação jurídica internacional, analise da efetividade, da celeridade e da lisura da cooperação.

161


O Brasil é signatário de tratados relativos à cooperação jurídica internacional e também coopera mediante promessa de reciprocidade. Por meio desses instrumentos internacionais, o Brasil não apenas adquire o direito de solicitar cooperação jurídica, mas também se compromete a dar cumprimento aos pedidos vindos desses países. Dentre os tratados multilaterais que o Brasil é signatário destaca-se a Convenção sobre a Prestação de Alimentos no Estrangeiro (Decreto nº 56.826, de 02 de setembro de 1965), a Convenção Interamericana sobre Cartas Rogatórias (Decreto 1.899, de 9 de maio de 1996), a Convenção Interamericana sobre Prova e Informação acerca do Direito Estrangeiro (Decreto nº 1.925, de 10 de junho de 1996), o Acordo de Cooperação e Assistência

Jurisdicional

em

Matéria

Civil,

Comercial, Trabalhista e Administrativa entre os Estados Partes do Mercosul, a República da Bolívia e do Chile (Decreto nº 6.891, de 2 de julho de 2009), o Protocolo de Medidas Cautelares (Decreto 2.626, de 15 de junho de 1998). Dentre os tratados 162


bilaterais destaca-se a Convenção entre Brasil e a Bélgica sobre Assistência Judiciária Gratuita (Decreto nº 41.908, de 29 de julho de 1957), o Convênio de Cooperação Judiciária em Matéria Civil, entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Reino da Espanha (Decreto nº 166 de 3 de julho de 1991), o Acordo de Cooperação em Matéria Civil entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República Francesa (Decreto no 3.598, de 12 de setembro de 2000), o Tratado Relativo à Cooperação Judiciária e ao Reconhecimento e Execução de Sentenças em Matéria Civil entre a República Federativa do Brasil e a Republica Italiana (Decreto nº 1.476, de 2 de maio de 1995), o Acordo sobre Cooperação Jurídica em Matéria Civil entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República Libanesa (Decreto nº 7.934, de 19 de fevereiro de 2013), a Convenção sobre Assistência Judiciária Gratuita entre o Brasil e o Reino dos Países Baixos (Decreto nº 53.923, de 20 de maio de 1964), a Convenção sobre Assistência Judiciária 163


Gratuita com a Argentina (Decreto nº 62.978, de 11 de julho de 1968), o Acordo de Cooperação Judiciária em Matéria Civil, Comercial, Trabalhista e Administrativa, entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República Argentina (Decreto nº 1.560, de 18 de julho de 1995), o Acordo de Cooperação Judiciária em Matéria

Civil,

Comercial,

Trabalhista

e

Administrativa, entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República Oriental do Uruguai (Decreto nº 1.850, de 10 de abril de 1996), o Tratado sobre Auxílio Judicial em Matéria Civil e Comercial entre a República Federativa do Brasil e a República Popular da China (Decreto nº 8.430, de 09 de Abril de 2015). Os demais acordos internacionais sobre cooperação

jurídica

internacional

podem

ser

obtidos no endereço eletrônico do Ministério da Justiça. A cooperação jurídica internacional se aplica aos pedidos vindos e feitos pelo Poder Judiciário e pelo Juízo Arbitral, conforme dispõe o 164


artigo 34 da Lei nº 9.307/96. Na ausência de tratado dispondo sobre a cooperação em matéria arbitral a sentença arbitral estrangeira, para ser reconhecida ou executada no Brasil, deve ser homologada pelo Superior Tribunal de Justiça (art. 35 da Lei nº 9.307/96), seguindo o procedimento do artigo 960 e seguintes do Código de Processo Civil de 2015. O CPC/2015 enumera os tipos de pedidos que podem ser formulados via cooperação jurídica internacional.

São

os

atos

de

comunicação

processual, como a citação, a intimação e a notificação judicial e extrajudicial; obtenção de provas

e

informações,

como

a

oitiva

de

testemunhas; homologação e cumprimento de decisão estrangeira; efetividade das tutelas de urgência; a assistência jurídica internacional, bem como

qualquer

outra

medida

judicial

ou

extrajudicial não vedada pelo ordenamento jurídico brasileiro (art. 27). Os

tratados

internacionais

podem

contemplar outros objetos para a cooperação jurídica internacional, como o pagamento de 165


prestações alimentícias e a restituição de crianças ao seu país de residência habitual. Os atos de comunicação processual e de produção de provas são solicitados via carta rogatória e a homologação de sentença estrangeira ocorre por meio de ação judicial (art. 960 do CPC). As decisões interlocutórias, como as concessivas de tutela de urgência podem ter efetividade no Brasil via carta rogatória, bem como o benefício da gratuidade de justiça. O artigo 27, no inciso VI, amplia o objeto da cooperação jurídica internacional ao dispor sobre

qualquer

outra

medida

judicial

ou

extrajudicial não proibida pela lei brasileira, deixando

a

matéria

afeta

aos

tratados

internacionais. De qualquer forma, os atos que representem ofensa a soberania nacional e à ordem pública não poderão ser objeto de pedido de cooperação (art. 39 do CPC). Deste modo, a enumeração do artigo 27 não é exaustiva visto que os Estados podem

166


estipular

outros

mecanismos

de

cooperação

internacional mediante a conclusão de tratados. 3. Auxílio direto Conforme dispõe o artigo 28 do CPC/2015 cabe o auxílio direto quando a medida não decorrer diretamente de decisão de autoridade jurisdicional estrangeira a ser submetida a juízo de delibação no Brasil. O auxílio direto consiste num pedido que, por sua natureza administrativa ou pelo fato de buscar uma decisão judicial brasileira relativa a litígio em curso em outro Estado, não necessita do juízo de delibação do Superior Tribunal de Justiça. Nesse último caso, não se trata de reconhecimento e execução de uma decisão estrangeira no Brasil, mas da obtenção de uma decisão judicial proferida por juiz brasileiro. É utilizado mediante previsão em tratado ou por compromisso de reciprocidade e usado apenas na cooperação

desenvolvida

entre

autoridades

centrais. 167


O auxílio direto se diferencia dos demais mecanismos de cooperação jurídica internacional porque nele as autoridades brasileiras não proferem exequatur

nem

estrangeiro.

É

homologam a

ato

cooperação

jurisdicional

efetuada

entre

autoridades centrais de países signatários de tratados internacionais com previsão para essa forma de cooperação jurídica internacional. Deste modo, uma solicitação revestida sob a denominação de carta rogatória que não pede providência que requeira o exequatur do Superior Tribunal de Justiça configura uma solicitação de auxílio direto. Nesses casos, cabe à autoridade central

identificar

a

natureza

do

pedido,

procedendo a seu devido encaminhamento como auxílio direto. O Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça dispõe que os pedidos de cooperação jurídica internacional que tiverem por objeto atos que não ensejem juízo deliberatório do Tribunal, ainda que denominados de carta rogatória, serão encaminhados ou devolvidos ao Ministério da 168


Justiça para as providências necessárias ao cumprimento por auxílio direto (art. 216-O, § 2º). Essa modalidade de cooperação por ser menos burocrática torna-se menos morosa para as partes do que os procedimentos de cooperação tradicional. A solicitação de auxílio direto será encaminhada pelo órgão estrangeiro interessado à autoridade central, cabendo ao Estado requerente assegurar a autenticidade e a clareza do pedido (art. 29 do CPC/2015). Ao receber o pedido de cooperação proveniente do Estado requerente, o Ministério da Justiça analisa a documentação para saber se todos os requisitos formais estão preenchidos. Caso não estejam, o Ministério da Justiça encaminha a informação a respeito da inadequação do pedido de cooperação

à

autoridade

central

do

Estado

requerente, para que instrua o pedido com a documentação necessária. Assim que cumprido o pedido de cooperação, o Ministério da Justiça envia

169


a resposta à autoridade central do Estado requerente. Pode ser objeto de pedido de auxílio direto uma ampla gama de medidas que varia desde a comunicação de atos processuais, a obtenção de provas, a prolação de decisões em tutela de urgência até a restituição de crianças ao seu país de residência. O artigo 30 do CPC/2015 dispõe que além dos casos previstos em tratados internacionais de que o Brasil seja parte signatária, o auxílio direto terá os seguintes objetos: a obtenção e a prestação de informações sobre o ordenamento jurídico e sobre processos administrativos ou jurisdicionais findos ou em curso; a colheita de provas, salvo se a medida for adotada em processo, em curso no estrangeiro,

de

competência

exclusiva

de

autoridade judiciária brasileira; e qualquer outra medida judicial ou extrajudicial não proibida pela lei brasileira. Como dito anteriormente o auxílio direto se

diferencia

dos

demais

mecanismos

de 170


cooperação jurídica internacional porque nele as autoridades brasileiras não proferem exequatur nem homologam ato jurisdicional estrangeiro. É a cooperação efetuada entre autoridades centrais de países signatários de tratados internacionais com previsão para essa modalidade de cooperação internacional. Deste modo, a autoridade central brasileira

comunica-se

diretamente

com

as

autoridades centrais estrangeiras, sem necessidade de passar pela via diplomática e pelo Poder Judiciário (art. 31 do CPC/2015). Se o pedido de auxílio direito tratar de cooperação de natureza administrativa, havendo um órgão

administrativo

competente

diverso

da

autoridade central para o atendimento do pedido de auxílio, o pedido é enviado a este pelo Ministério da Justiça, para cumprimento. Não havendo um órgão

administrativo

competente

diverso

da

autoridade central, esse é cumprido pela própria autoridade central. Em qualquer dessas hipóteses, assim que executado o pedido de cooperação, o

171


Ministério da Justiça envia sua resposta à autoridade central do Estado requerente. É o que dispõe o artigo 32 do CPC/2015: “no caso de auxílio direto para a prática de atos que, segundo a lei brasileira, não necessitem de prestação jurisdicional, a autoridade central adotará as providências necessárias para seu cumprimento”. Se o pedido de auxílio direto envolver cooperação judicial, o Ministério da Justiça fará o encaminhamento da documentação que instrui o pedido à Advocacia-Geral da União (AGU), a quem incumbe representar a União Federal em juízo, para buscar a obtenção da necessária decisão judicial junto a Justiça Federal do juízo em que deva ser executada a medida objeto do pedido de auxílio direto. Recebida a informação referente ao cumprimento

do

pedido

de

cooperação,

o

Ministério da Justiça encaminha a resposta à autoridade central do Estado requerente. Como o auxílio direito é uma forma de cooperação jurídica internacional efetuada entre autoridades

centrais

autorizada

em

tratado 172


internacional, a União Federal é parte interessada na obtenção da medida judicial objeto do pedido de auxílio direito, razão pela qual a pretensão deve ser ajuizada na Justiça Federal (art. 109, I, da CF). O foro escolhido pelo legislador foi o do local onde deve ser executada a medida pleiteada no auxílio direito (art. 34 do CPC/2015). 4. Carta Rogatória A carta rogatória é um dos instrumentos por meio do qual se formaliza a cooperação internacional, consistindo numa solicitação feita por um órgão jurisdicional de um Estado Soberano ao outro para a prática de determinado ato processual. A solicitação pode vir do Poder Judiciário Estrangeiro

ou do Juízo Arbitral

Estrangeiro. O artigo 36 do CPC/2015 trata das cartas rogatórias

enviadas

por

órgão

jurisdicional

estrangeiro a órgão jurisdicional nacional, dispondo que o procedimento da carta rogatória perante o Superior Tribunal de Justiça é de jurisdição 173


contenciosa e deve assegurar às partes as garantias do devido processo legal. A defesa na carta rogatória deve se restringir à discussão quanto ao atendimento dos requisitos para que o pronunciamento judicial estrangeiro produza efeitos no Brasil. Em qualquer hipótese, é vedada a revisão do mérito do pronunciamento

judicial

estrangeiro

pela

autoridade judiciária brasileira. A solicitação contida na carta rogatória deve ser referente à prática de atos de comunicação ou instrução processual, como a citação da parte domiciliada no Brasil e a produção de provas como, por exemplo, a oitiva de testemunhas. Quanto se tratar de resolução judicial deve-se proceder a sua homologação para que possa produzir efeitos no território nacional. Como tratado nos artigos 21 a 25 do CPC/2015

o

exercício

da

jurisdição

pelo

magistrado brasileiro é limitado ao território nacional, sendo vedado ao poder jurisdicional extrapolar as fronteiras do país. 174


Conforme ensina CÃNDIDO RANGEL DINAMARCO “a rogatória, que vai de um país a outro, é um rogo, ou pedido respeitoso, como convém no trato com soberanias estrangeiras. Todas elas contêm solicitações de cooperação jurisdicional mediante a realização dos atos que indicam, sempre segundo a lei e conforme permitam as relações nacionais ou internacionais” (Instituições de direito processual civil, volume II, 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 514). O Supremo Tribunal Federal (antes da EC nº 45/2004) havia consolidado o entendimento de que a prática de atos de caráter executório para a efetivação da decisão judicial estrangeira dependia da prévia homologação da sentença para que pudesse produzir efeitos no território nacional, salvo quando houvesse instrumento de cooperação internacional firmado pelo Brasil autorizando o cumprimento das rogatórias executórias. É o caso de efetivação das medidas cautelares deferidas pela justiça estrangeira. (Informativo do STF nº 109 Carta Rogatória 8.279 – República Argentina). 175


No mesmo sentido o Superior Tribunal de Justiça ao adotar o entendimento de que cabe a ele apenas emitir juízo meramente deliberatório acerca da concessão do exequatur nas cartas rogatórias, sendo competência da Justiça rogante a análise de questões relacionadas ao mérito da causa. A simples notificação acerca da prolação de sentença estrangeira não tem natureza executória, não ofendendo a ordem pública ou a soberania nacional (Corte Especial, AgRg na CR nº 7858 EX 2013/0074820-7, Ministro Félix Fischer, DJe 14/08/2014). Do mesmo modo, a simples citação não tem natureza executória nem ofende a ordem pública ou a soberania nacional, destinando-se a dar conhecimento da ação em curso e permitir a defesa das partes interessadas (Corte Especial, AgRg na CR 3560, Min. Presidente, DJe 12/08/2010 e Corte Especial, AgRg na CR 3720, Min. João Otávio de Noronha, DJe 17/12/2009). O artigo 40 do CPC/2015 inova ao dispor que “a cooperação jurídica internacional para execução de decisão estrangeira dar-se-á por meio 176


de carta rogatória ou de ação de homologação de sentença estrangeira, de acordo com o art. 960”. A sentença proferida por juiz estrangeiro precisa ser homologada pelo Superior Tribunal de Justiça (art. 105, I, i da CF e art. 961 do CPC) para que possa produzir os seus efeitos no território nacional. O procedimento da homologação da sentença estrangeira está previsto nos artigos 960 a 965 deste Código, e será requerida por ação de homologação

de

sentença

estrangeira,

salvo

disposição especial em sentido contrário prevista em tratado. A decisão interlocutória estrangeira (como a tutela liminar) poderá ser executada no Brasil por meio de carta rogatória, se houver previsão em tratado (art. 960, § 1º e art. 962, § 1º do CPC/2015). Haverá

homologação

de

decisão

estrangeira para fins de execução fiscal quando prevista

em

tratado

ou

em

promessa

de

reciprocidade apresentada à autoridade brasileira (art. 961, § 4º do CPC/2015). 177


O

Protocolo

de

Medidas

Cautelares

realizado pelo Conselho do Mercado Comum – MERCOSUL

(com

natureza

de

tratado

internacional), concluído em Ouro Preto/MG, com o objetivo de regulamentar o cumprimento de medidas

cautelares

destinadas

a

impedir

a

irreparabilidade de um dano em relação às pessoas, bens e obrigações de dar e de fazer ou não fazer, foi aprovado pelo Congresso Nacional por meio do Decreto Legislativo nº 192/95, ratificado por instrumento de ratificação depositado em 18/03/97 e promulgado por Decreto Presidencial de nº 2.626/98, sendo incorporado ao direito interno brasileiro. Deste modo, para os Países que o ratificaram, Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai, é cabível a concessão de exequatur para as cartas rogatórias de nítido caráter executório. A Emenda Constitucional nº 45/2004 introduziu a alínea i ao inciso I do artigo 105 da Constituição Federal de 88 para determinar a competência originária do Superior Tribunal de Justiça para processar e julgar a homologação de 178


sentença estrangeira e a concessão de exequatur às cartas rogatórias. Antes da alteração do texto constitucional a competência para conceder o exequatur às cartas rogatórias era do Supremo Tribunal Federal, conforme dispunha a revogada alínea h do inciso I do artigo 102 da Constituição Federal. A concessão do exequatur a carta rogatória está disciplinada nos artigos 960 a 965 do CPC/2015 e no regimento interno do Superior Tribunal de Justiça. Nos termos do regimento interno do Superior Tribunal de Justiça (art. 216-O) é atribuição do Presidente do Tribunal conceder o exequatur às cartas rogatórias. Inicialmente a Resolução nº 9, de 04 de maio de 2005, editada pelo STJ é que dispunha sobre a nova atribuição conferida pela EC nº 45/2004. Atualmente o Regimento Interno do STJ dispõe sobre o procedimento de concessão de exequatur às cartas rogatórias nos artigos 216-O a 216-X (incluídos pela Emenda Regimental nº 18/2014). A referida 179


norma interna dispõe que as cartas rogatórias podem ter por objeto atos decisórios ou não decisórios e os pedidos de cooperação jurídica internacional que tiverem por objeto atos que não ensejem juízo de delibação pelo Superior Tribunal de Justiça, ainda que denominados como carta rogatória, serão encaminhados ou devolvidos ao Ministério

da

Justiça

para

as

providências

necessárias ao cumprimento por auxílio direto. O procedimento da carta rogatória é de jurisdição contenciosa e deste modo está sujeito a todos os princípios norteadores do processo civil, principalmente o do devido processo legal. Entretanto, a defesa deve se restringir à discussão quanto ao atendimento dos requisitos para que o pronunciamento

judicial

estrangeiro

produza

efeitos no Brasil. Nos termos do artigo 216-Q a parte interessada será intimada para, no prazo de 15 (quinze) dias, impugnar a carta rogatória. A medida solicitada por carta rogatória poderá ser realizada sem ouvir a parte interessada quando sua intimação 180


prévia puder resultar na ineficácia da cooperação jurídica internacional. Na carta rogatória, a defesa somente poderá versar sobre autenticidade dos documentos, inteligência da decisão e observância dos requisitos procedimentais. Havendo impugnação às cartas rogatórias decisórias, o processo poderá, por determinação do Presidente, ser distribuído para julgamento pela Corte Especial. Das decisões do Presidente na homologação de sentença estrangeira e nas cartas rogatórias cabe agravo. O Superior Tribunal de Justiça no Agravo Regimental na Carta Rogatória nº 6529 decidiu que “não sendo hipótese de ofensa à soberania nacional, à ordem pública ou de inobservância dos requisitos da Resolução n. 9/2005, cabe apenas a este e. Superior

Tribunal

de

Justiça

emitir

juízo

meramente delibatório acerca da concessão do exequatur nas cartas rogatórias. A tramitação da comissão pela autoridade central brasileira assegura a autenticidade dos documentos e dispensa a

181


tradução juramentada no Brasil” (Corte Especial, Min. Félix Fischer, DJe 26/10/2012). Não será concedido exequatur à carta rogatória que ofender a soberania nacional, a dignidade da pessoa humana e/ou a ordem pública. Ordem pública é um conceito aberto que varia no tempo e no espaço, sendo tarefa do judiciário a sua aplicação aos casos concretos. Entretanto, o termo “ordem pública” abarca necessariamente o respeito aos fundamentos, objetivos e princípios da República Federativa do Brasil (arts. 1º, 2º, 3º e 4º da CF), aos direitos e garantias fundamentais, individuais e coletivos (art. 5º da CF), aos direitos sociais (arts. 6º a 12 da CF), e demais valores dominantes na ordem jurídica brasileira. O Superior Tribunal de Justiça tem jurisprudência consolidada no sentido de que não será concedido o exequatur as cartas rogatórias quando o pedido formulado configurar ofensa a soberania nacional e a ordem pública. O artigo 216P do regimento interno do STJ dispõe que não será 182


concedido exequatur à carta rogatória que ofender a soberania nacional, a dignidade da pessoa humana e/ou a ordem pública. Do mesmo modo, não será homologada a decisão estrangeira que configurar ofensa a ordem pública (inciso VI, do art. 963 do CPC). O artigo 216-F do regimento interno do STJ vai além e dispõe que não será homologada a sentença estrangeira que ofender a soberania nacional, a dignidade da pessoa humana e/ou a ordem pública. Após a concessão do exequatur, a carta rogatória será remetida ao Juízo competente para cumprimento. Das decisões proferidas pelo Juiz competente no cumprimento da carta rogatória caberão embargos, que poderão ser opostos pela parte interessada ou pelo Ministério Público Federal, no prazo de dez dias. Os embargos poderão versar sobre qualquer ato referente ao cumprimento da carta rogatória, exceto sobre a própria concessão da medida ou o seu mérito. Da decisão que julgar os embargos cabe agravo.

183


Cumprida a carta rogatória ou verificada a impossibilidade

de

seu

cumprimento,

será

devolvida ao Presidente do STJ, no prazo de 10 (dez) dias, e por este remetida, em igual prazo, por meio do Ministério da Justiça ou do Ministério das Relações Exteriores, à autoridade judiciária de origem (art. 216-X do Regimento Interno do STJ). 5. Trâmite do pedido de cooperação jurídica internacional A cooperação jurídica internacional se realiza

por

via

diplomática

ou Autoridades

Centrais, indicadas em acordos internacionais. A autoridade brasileira requerente deverá formular o pedido de cooperação e encaminhá-lo para o Ministério da Justiça, que, por sua vez, o transmitirá para a Autoridade Central do Estado requerido (art. 37 do CPC/2015). A autoridade central, no caso do Brasil o Ministério da Justiça, é o órgão responsável pela correta

condução

da

cooperação

jurídica

internacional, cabendo-lhe, o recebimento e a 184


transmissão dos pedidos de cooperação, bem como a análise e a adequação das solicitações no tocante aos requisitos da legislação estrangeira e aos tratados. As informações que devem constar no pedido de cooperação variam de acordo com as leis do Estado requerido, com o tratado que o fundamenta e com a medida solicitada. Contudo, deve ser fornecido o resumo da causa em que se baseia o pedido, com elementos que identifiquem o juízo perante o qual tramita o processo; a descrição da medida de cooperação solicitada; se a parte interessada é beneficiária de justiça gratuita (acompanhada da decisão que lhe concede o benefício) ou a indicação do responsável pelo pagamento de custas processuais no Estado Requerido e residente naquele outro país, salvo se tratado dispensar tal requisito. O artigo 260 do CPC/2015 dispõe sobre os requisitos da carta rogatória, como a indicação dos juízes de origem e de cumprimento do ato; o inteiro teor da petição, do despacho judicial e do instrumento do mandato 185


conferido ao advogado; a menção do ato processual que lhe constitui o objeto; o encerramento com a assinatura do juiz. O trâmite da carta rogatória será o seguinte: deverá ser remetida ao Ministério da Justiça (autoridade central brasileira), pelo juízo competente

ou

pela

parte.

Recebida

pelo

Ministério, este deverá proceder à análise da solicitação para verificar se estão preenchidos os requisitos necessários para o encaminhamento à autoridade central do Estado requerido, caso exista acordo internacional, ou ao Ministério das Relações Exteriores, para que a encaminhe, via diplomática, ao Estado destinatário. A carta rogatória que não preencher os requisitos necessários será devolvida ao juízo requerente, para que sejam preenchidas todas as formalidades indispensáveis ao seu cumprimento no Estado destinatário. O processo referente à carta rogatória instaurado no Ministério da Justiça fica no aguardo do retorno da carta, cumprida ou não, via autoridade central ou via diplomática. Em qualquer 186


hipótese procede-se a sua devolução ao juízo requerente. As cartas rogatórias oriundas das Justiças estrangeiras são recebidas pelo Ministério da Justiça que efetua a análise da documentação para verificar

se

todos

os

requisitos

formais

determinados pelo acordo internacional estão presentes, e posteriormente as encaminha ao Superior

Tribunal

de

Justiça,

ou

por

via

diplomática, no Ministério das Relações Exteriores, que as transmite ao Ministério da Justiça para posterior encaminhamento ao Superior Tribunal de Justiça, para a concessão ou denegação do exequatur. No auxílio direto o pedido de cooperação proveniente do Estado requerente é recebido pelo Ministério da Justiça que analisa a documentação para saber se todos os requisitos formais estão preenchidos. Os documentos que instruem os pedidos de

cooperação

jurídica

internacional

serão

redigidos no idioma do Estado requerente com 187


tradução para o idioma do Estado requerido, devidamente certificada por intérprete juramentado (art. 38 do CPC/2015). No Brasil o Decreto nº 13.609, de 21 de outubro de 1943, regulamenta o ofício de tradutor público e de intérprete comercial, dispondo no artigo 18 que nenhum livro, documento ou papel de qualquer natureza escrito em idioma estrangeiro, produzirá efeito em repartições da União, dos Estados e dos municípios, em qualquer instância, Juízo

ou

Tribunal

ou

entidades

mantidas,

fiscalizadas ou orientadas pelos poderes públicos, sem ser acompanhado da respectiva tradução, abarcando, também, os serventuários de notas e os cartórios de registro de títulos e documentos que não poderão efetuar registro, passar certidões ou públicas-formas de documento no todo ou em parte redigido em língua estrangeira (art. 130, 6º da Lei nº 6.015/73). A Instrução Normativa nº 17, de 05 de dezembro de 2012, do Departamento de Registro Empresarial

e

Integração

(DREI),

contem 188


dispositivos acerca dos tradutores públicos e do intérprete comercial. Cada estado brasileiro tem autonomia para definir, através da respectiva Junta Comercial Estadual, os aspectos práticos do ofício de Tradutor Público e Intérprete Comercial, tais como emolumentos, habilitação e fiscalização. Os livros de traduções são registrados na junta comercial onde o tradutor é matriculado. A legislação brasileira exige que os documentos redigidos em língua estrangeira sejam traduzidos (tradução juramentada) para o idioma nacional para que possam ter validade no território nacional. No caso da tradução juramentada do português para uma língua estrangeira, a aceitação de traduções juramentadas feitas por tradutores públicos e intérpretes comerciais brasileiros é determinada pela legislação do país de destino. A tradução juramentada é feita a partir de documentos originais, textos eletrônicos, como emails, imagens digitalizadas e fax, que devem ser anexados à tradução e o tradutor deve mencionar na tradução a natureza do texto em que se baseou para 189


fazer a tradução (documento original, cópia autenticada, cópia simples, arquivo eletrônico, fax etc.). Uma particularidade da tradução juramentada é que ela deve descrever fielmente o documento original,

inclusive

carimbos,

selos,

brasões,

escudos, assinaturas e outras marcas não textuais do documento. Partes do documento podem ser omitidas a pedido do solicitante, contudo, o tradutor deverá citar o motivo da omissão e declarar que a tradução é parcial e ainda citar e brevemente descrever as partes omitidas na tradução. O Brasil passou a ser signatário da Apostila da Convenção de Haia, por meio do Decreto Legislativo nº 148, de 06 de julho de 2015, que elimina a exigência de legalização diplomática ou consular de documentos públicos estrangeiros dos países signatários da Convenção de Haia de 61 no termo apostila. O artigo 41 do CPC/2015 considera como autênticos os documentos que tramitam pelas autoridades centrais ou pela via diplomática, 190


dispensando as legalizações e autenticações dos documentos

estrangeiros.

O

intuito

é

desburocratizar o procedimento de legalização de documentos no exterior, reduzindo o custo do processo para as partes e aumentando a celeridade no andamento processual. O Brasil passou a ser signatário da Apostila da Convenção de Haia, por meio do Decreto Legislativo nº 148, de 06 de julho de 2015, que adota um método simplificado de legalização de documentos para verificar sua autenticidade no âmbito internacional. A apostila é um certificado de que a assinatura/firma e selo/carimbo de um documento público foram emitidos pela autoridade competente. O certificado, amplamente utilizado pela comunidade

internacional,

visa

a

facilitar

transações comerciais e jurídicas, já que consolida num único ato toda a informação necessária para gerar validade a um documento público em outro país signatário da Convenção da Haia de 1961.

191


6. Conclusão Pode se verificar que os artigos do CPC/2015 que tratam da cooperação jurídica internacional têm por fim tornar menos burocrático o intercâmbio entre a justiça brasileira e a estrangeira, criando mecanismos de diálogo direito, desde que previstos em tratado internacional, suprimindo exigências custosas como a legalização dos

documentos

estrangeiros,

autorizando

a

execução das tutelas de urgência proferidas por juiz estrangeiro mediante carta rogatória, e outros. A observância dos princípios processuais é assegurada na cooperação jurídica internacional, privilegiando-se a razoável duração do processo, o acesso à justiça, o devido processo legal e a igualdade das partes. 7. Referências ARAUJO, Nadia de. In: Ministério da Justiça Secretaria Nacional de Justiça, DRCI. (Org.). Manual de Cooperação Jurídica Internacional e

192


Recuperação de Ativos - matéria penal. 4a ed., 2013, v. 1, pp. 39-50. BARBOSA JÚNIOR, Márcio Mateus. O novo Código de Processo Civil e o Auxílio Direto: Contexto do Direito Brasileiro Contemporâneo. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XIV, n. 90, jul 2011. Disponível em: < http://www.ambito‐ juridico.com.br/site/index.php? n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=9943>. Acesso em maio 2015. BRASIL. Secretaria Nacional de Justiça. Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional. Manual de cooperação jurídica internacional e recuperação de ativos: cooperação em matéria civil. 4ª ed. Brasília: Ministério da Justiça, 2014. DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil II. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 2002. MIRANDA, Pontes. Comentários ao Código de Processo Civil, tomo III: arts. 154 a 281. 4ª ed. Forense: Rio de Janeiro, 1997. MOREIRA, José Carlos Barbosa. O novo processo civil brasileiro. 22ª ed. Forense: Rio de Janeiro, 2002.

193


IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DE MULTA POR DESUMPRIMENTO DE ORDEM JUDICIAL AOS ADVOGADOS PÚBLICOS Tendo em conta que o processo instaura uma relação jurídica entre os seus participantes, inserindo-se neste conceito não só as partes, mas todos aqueles que de qualquer forma participem do processo, determinados deveres são estipulados pelo Código para que o processo possa atingir seu

194


objetivo

final,

que

é

a

efetiva

prestação

jurisdicional. Dentre o rol de deveres elencados no artigo 77 do Código de Processo Civil de 2015 estão os de expor os fatos conforme a verdade, não formular pretensão sem fundamento, não criar artifícios ao regular andamento do processo como a produção de provas inúteis ou desnecessárias, deixar de cumprir com exatidão as decisões jurisdicionais, inovar de forma ilegal o estado de fato de bem ou direito litigioso e deixar de informar o endereço para o recebimento das intimações. O rol de deveres contido no artigo 77 não é exaustivo, pois o próprio caput dispõe que “além de outros previstos neste Código” são deveres das partes, de seus procuradores e de todos aqueles que de qualquer forma participem do processo. No artigo 78 veda a utilização de expressões injuriosas, determinado que todos os participantes do processo se tratem com urbanidade (dever de urbanidade), no artigo 80 elenca as hipóteses de litigância de má-fé (dever de lealdade processual), no artigo 195


139, inciso VIII e artigo 772, inciso III, o dever de comparecimento em juízo quando determinado pelo magistrado e o dever de prestar informações sobre fatos da causa, no artigo 396 o dever de exibir documento ou coisa que se encontre em seu poder, no artigo 774 dispõe sobre os atos atentatórios à dignidade da justiça praticados no processo de execução e no artigo 1.026, § 2º e 3º sanciona

a

interposição

dos

embargos

de

declaração manifestamente protelatórios. Os deveres explicitados são corolários da lealdade e da boa-fé, no sentido de que quem de qualquer

forma

participa

do processo

deve

comportar-se de acordo com a boa-fé, cooperando entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva (art. 5º e 6º do CPC de 2015). As normas relativas aos deveres das partes e daqueles que participem do processo tem por escopo coibir o abuso de direito na relação jurídica processual, zelando pela paridade de tratamento

196


conferida as partes litigantes

e ao efetivo

contraditório (art. 7°). Neste sentido era expresso o CPC de 39, ao dispor no parágrafo único do artigo 3º que “o abuso de direito verificar-se-á, por igual, no exercício dos meios de defesa, quando o réu opuser, maliciosamente,

resistência

injustificada

ao

andamento do processo”. Os incisos I, II, III e IV do artigo 77 correspondem aos incisos I, III, IV e V do artigo 14 do CPC de 73, que trava dos deveres das partes e de todos que participam do processo. O inciso II do referido artigo 14 que tratava do dever de lealdade e boa-fé encontra correspondente no artigo 5º deste Código. Conforme disposto no inciso III, do artigo 139 do Código, incumbe ao juiz prevenir ou reprimir qualquer ato atentatório a dignidade da justiça

e

indeferir

postulações

meramente

protelatórias. No tocante ao dever de expor os fatos conforme a verdade, todos os que participem do 197


processo não devem proferir afirmações falsas, negações falsas, omitir propositalmente fato ou fatos de relevância no processo. Especificamente em relação às testemunhas o juiz advertirá que incorre em sanção penal quem faz afirmação falsa, cala ou oculta à verdade (art. 458, parágrafo único do CPC). A desobediência aos incisos I, II e III do artigo 77 pode acarretar a responsabilização das partes e dos intervenientes por litigância de má-fé, nos termos do artigo 80, incisos I, II, IV e VI. Verificada a litigância de má-fé o juiz condenará o litigante ao pagamento de multa no percentual de 1% a 10% do valor da causa, a indenizar a parte contrária pelos prejuízos sofridos e a arcar com as despesas e honorários advocatícios. As condutas descritas nos incisos IV e VI do artigo 77, são atentatórias a dignidade da justiça, devendo o juiz, sem prejuízo das sanções criminais, civis e processuais cabíveis, aplicar ao responsável multa de até 20% do valor da causa, conforme a gravidade da conduta (§ 2º do art. 77). Quando o 198


valor da causa for irrisório ou inestimável, a multa poderá ser fixada em até 10 (dez) vezes o valor do salário-mínimo (§ 5º do art. 77). A resistência injustificada ao cumprimento das ordens judiciais mediante atos maliciosos é sancionada com a pena de multa de caráter repressivo por desrespeito à autoridade judiciária e por acarretar um obstáculo ao exercício da jurisdição. Conforme

explicitado

por

SERGIO

SAHIONE FADEL: “realmente, é pouco adequada à expressão “dignidade da justiça” para traduzir esses atos atentatórios, porquanto o que estes atos constituem, na verdade, é um obstáculo ao exercício da jurisdição, pelo que é mais propícia a linguagem utilizada pelo inciso V do art.14 do CPC” (Código de Processo Civil Comentado, 2004, pág. 37). O referido inciso V do artigo 14 do CPC de 73 fala em ato atentatório ao exercício da jurisdição ao invés de ato atentatório a dignidade da justiça.

199


As condutas que acarretem inovação ilegal do estado de fato de bem ou direito litigioso, além da aplicação da multa de até 20% do valor da causa, estarão sujeitas ao disposto no § 7º que determina ao juiz o restabelecimento do estado anterior, podendo, ainda, proibir a parte de falar nos autos até a purgação do atentado. O § 1º do artigo 77 dispõe que o juiz deverá advertir as pessoas mencionadas no caput, que as hipóteses dos incisos IV e VI, poderão ser sancionadas como atos atentatórios a dignidade da justiça. A multa do § 2º tem natureza de pena pecuniária

civil

de

caráter

repressivo

por

desrespeito a autoridade da justiça e ao exercício da jurisdição, beneficiando o Estado, quando aplicada na justiça estadual, ou a União Federal, quando aplicada na justiça federal. Os

valores

das

sanções

pecuniárias

processuais destinadas à União e aos Estados serão revertidos aos fundos de modernização do Poder Judiciário (art. 97 do CPC de 2015), e a sua 200


cobrança será realizada por meio do processo de execução fiscal da Lei nº 6.830/80, quando não pagas espontaneamente no prazo estipulado pelo juiz. Conforme dispõe o § 4º a multa do § 2º será

aplicada

previstas

no

independentemente cumprimento

de

das

multas

sentença

por

obrigação de pagar quantia certa (art. 523, § 1º), e no cumprimento de sentença por obrigação de fazer, não fazer e de entregar coisa (art. 536, § 1º). Deste

modo,

não

ocorrendo

o

pagamento

voluntário no prazo de 15 dias, ou o cumprimento da obrigação de fazer, deixar de fazer e entregar a coisa, além da multa de 10% caberá a multa por ato atentatório ao exercício da jurisdição se o executado violar os incisos IV e VI do artigo 77. Isto porque, a multa aplicada no cumprimento de sentença beneficia a parte adversária (o exeqüente) enquanto a multa do artigo 77 é revertida em favor do Estado ou da União Federal. As disposições dos parágrafos 2º a 5º não se aplicam aos advogados, públicos ou privados, e 201


aos membros da Defensoria Pública e do Ministério Público,

devendo

eventual

responsabilidade

disciplinar ser apurada pelo respectivo órgão de classe ou corregedoria, ao qual o juiz encaminhará ofício. O CPC de 39 no § 3º do artigo 63 dispunha que se a temeridade ou malícia fosse imputável ao procurador o juiz deveria levar o caso ao conhecimento do Conselho local da Ordem dos Advogados do Brasil, sem prejuízo da condenação da parte a pagar o décuplo das custas. O comando contido no § 6º do artigo 77 significa exatamente isto, que se os atos forem praticados pelos representantes judiciais, estes responderão junto ao seu órgão de classe ou corregedoria, sem prejuízo da condenação da parte na pena de multa. O parágrafo único do artigo 14 do CPC de 73 dispõe que “ressalvados os advogados que se sujeitam exclusivamente aos estatutos da OAB”, a violação do disposto no inciso V do referido artigo, o dever de cumprir com exatidão os provimentos mandamentais e não criar embaraços à efetivação 202


de provimentos judiciais, de natureza antecipatória ou final, constitui ato atentatório ao exercício da jurisdição, podendo o juiz, sem prejuízo das sanções criminais, civis e processuais cabíveis, aplicar ao responsável multa em montante a ser fixado de acordo com a gravidade da conduta e não superior a 20% do valor da causa. A ressalva foi objeto de ação direita de inconstitucionalidade de nº 2652-6/DF, proposta pela Associação Nacional dos Procuradores de Estado – ANAPE, julgada procedente pelo Supremo Tribunal Federal para dar interpretação conforme a constituição, sem redução de texto, ao parágrafo único do artigo 14 do Código de Processo Civil de 73, para abranger advogados do setor público e privado. O § 6º do artigo 77 já abarca os advogados públicos, a defensoria pública e o ministério público, além dos advogados privados. Deste modo, pode-se dizer que a disciplina moralizadora do artigo 77 se aplica a todos aqueles que de qualquer forma participam do processo, excluindose apenas os advogados, públicos e privados, a 203


defensoria pública e o ministério público. Estão abrangidos no artigo as partes, autor e réu, os intervenientes, o juiz e seus auxiliares, as testemunhas e outros. O

valor

das

sanções

impostas

aos

serventuários pertencerá ao Estado ou à União (art. 96). O § 8º do artigo 77 do CPC de 2015 tem especial aplicação nas demandas em que figuram como parte as pessoas jurídicas de direito público, federal, estadual e municipal, representadas em juízo por seus procuradores. Isto porque, ainda é recorrente a aplicação de multa pessoal aos representantes judiciais das pessoas jurídicas de direito público nos casos de descumprimento de decisão judicial por parte destas. As disposições do artigo 75 do Código de Processo Civil de 2015 são correspondentes ao do artigo 12 do Código de Processo Civil de 1973. O Código Civil diz que as pessoas jurídicas são de direito público, interno e externo, e de direito privado (art. 40). As pessoas jurídicas de 204


direito público interno são a União Federal, os Estados e o Distrito Federal, os Municípios e as respectivas autarquias e fundações públicas (art. 41). A administração pública para se organizar pode se descentralizar criando outros entes públicos para a prestação do serviço público. Deste modo, são criadas as autarquias, fundações públicas e as empresas públicas. As autarquias são as pessoas jurídicas de direito público criadas por lei para auxiliar a administração direta, que está regulada na Lei nº 10.683/2003. Equiparadas às autarquias são as fundações

públicas,

cuja

criação

deve

ser

autorizada por lei, assim como para as empresas públicas e sociedades de economia mista, que são pessoas jurídicas de direito privado criadas para exploração de determinada atividade econômica ou prestação de serviço público. As empresas públicas e sociedades de economia

mista,

embora

integrantes

da

administração pública indireta, tem natureza de 205


pessoa jurídica de direito privado e deste modo não se enquadra no conceito de Fazenda Pública para ser parte legítima na ação de execução fiscal. Surgem, também, as entidades paraestatais como o SESI, SESC, SENAC, conhecidas como serviços sociais autônomos, de natureza privada que atuam ao lado do Estado como colaboradores, desempenhando suas atribuições em comparação com os órgãos afins da administração pública em razão de autorização legal. Os conselhos profissionais, por terem natureza de autarquias especiais, enquadram-se no conceito de Fazenda Pública, tendo legitimidade para propor a ação de execução fiscal para a cobrança das suas anuidades (ADI 1.717/DF). Conforme dispõe a Constituição Federal de 88, no artigo 131, cabe a Advocacia-Geral da União a representação judicial e extrajudicial da União Federal, e a consultoria e o assessoramento do Poder Executivo Federal. A lei complementar nº 73/93

dispõe

sobre

a

organização

e

o

funcionamento da AGU, como determina a CF. 206


O § 3º do artigo 131 da Constituição Federal, dispõe que cabe a Procuradoria da Fazenda Nacional, órgão integrante da Advocacia-Geral da União (art. 2º, I, b da LC 73/93) e subordinado administrativamente ao Ministério da Fazenda, a representação judicial e extrajudicial da União Federal na cobrança da sua dívida ativa de natureza tributária. Portanto, possui a PGFN atribuição constitucional específica de representação da União na cobrança da dívida ativa de natureza tributária, embora seja integrante da Advocacia-Geral da União. Os artigos 12 e 13 da LC nº 73/93, dispõem sobre as atribuições da Procuradoria da Fazenda Nacional. A Procuradoria-Geral Federal é o órgão da Advocacia-Geral

da

União

responsável

pela

representação judicial e extrajudicial das autarquias e fundações públicas federais, bem como pelas respectivas

atividades

de

consultoria

e

assessoramento jurídicos, nos termos do artigo 10 da lei nº 10.480/2002 (STJ, AgRg no REsp nº 1101231/SC). 207


Do mesmo modo, os Estados e o Distrito Federal

são

representados

extrajudicialmente

por

judicialmente

seus

e

procuradores,

organizados em carreira, na qual o ingresso dependerá de concurso público de provas e títulos, conforme determina o artigo 132 da Constituição Federal e o inciso II do artigo 75 do CPC. A

Procuradoria-Geral

do

Estado

é

instituída pelo respectivo ente federado, sendo disciplinada nas Constituições Estaduais e na legislação estadual de cada Estado e do Distrito Federal. No Estado do Rio de Janeiro a Procuradoria-Geral é disciplinada nos artigos 176 e 177 da Constituição do Estado, e na Lei Complementar nº 15/80 que é a Lei Orgânica da Procuradoria-Geral do Estado do Rio de Janeiro. Os

Municípios

são

representados

judicialmente por seus procuradores ou por advogados particulares contratados para a sua representação, tendo em conta que não há na Constituição Federal dispositivo semelhante ao artigo 132 para determinar a representação dos 208


Municípios por procuradores, organizados em carreira e com ingresso mediante concurso público. Como os Municípios são entes públicos autônomos (art. 18 da CF) regidos por suas Leis Orgânicas (art. 29 da CF), e que tem competência para criar e organizar o seu quadro de servidores, podendo criar o cargo de procurador do município para a sua representação judicial e consultoria jurídica. A Procuradoria-Geral do Município pode ser disciplinada na Lei Orgânica do respectivo ente. Os Municípios que não tem quadro próprio de procuradores devem constituir seus advogados particulares por meio de procuração individual ao patrono para sua representação em juízo (STJ, AgRg no Ag nº 1252853). Quando o Código fala da representação judicial do Município por prefeito, é no sentido de que o chefe do Poder Executivo possa receber as citações nas ações propostas contra o ente público, constituindo advogado particular para realizar a defesa cabível, bem como para constituir advogado para propor as ações de interesse do Município. A 209


disposição contida no inciso III, do artigo 12 do Código de Processo Civil é decorrente da inexistência

de

obrigatoriedade

legal

dos

Municípios criarem as suas procuradorias. Nestes casos, a representação judicial do Município é exercida por advogados particulares contratados por meio de processo licitatório. Deve-se ressaltar que o Prefeito não tem capacidade postulatória. A Advocacia Pública é função essencial à justiça a qual incumbe, na forma da lei, defender e promover os interesses públicos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, por meio da representação judicial, em todos os âmbitos federativos, das pessoas jurídicas de direito público que integram a administração direta e indireta, nos termos da Constituição Federal e do artigo 182 deste Código. Inovação introduzida com o § 4º do artigo 75 do Código é a possibilidade dos Estados e do Distrito Federal de firmar compromisso recíproco para a prática de ato processual por seus procuradores, em favor de outro ente federado, 210


mediante convênio firmado pelas respectivas procuradorias. A referida prática de firmar convênios entre as procuradorias estaduais, para a prática de atos processuais, já era realizada ante a necessidade de representação dos Estados em juízos localizados em outras Unidades Federadas. É o caso da representação do Estado nas cartas precatórias. Nestes casos, a procuradoria de um Estado representa o outro por expressa autorização firmada em convênio. Como, por exemplo, uma ação distribuída no Rio de Janeiro em que seja parte o Estado, mas que tenha sido expedida carta precatória para a prática de atos processuais em São Paulo. Havendo convênio firmado entre as procuradorias estaduais, a Procuradoria-Geral de São Paulo poderá representar o Estado do Rio de Janeiro na referida carta precatória. Desde modo, o representante judicial da parte não pode ser compelido a cumprir a decisão em seu lugar, conforme determina o § 8º do artigo 77 do CPC de 2015 e o parágrafo único do artigo 211


14 do CPC de 1973 (em vigor até março de 2016), não podendo ser sancionado pelo descumprimento de decisão judicial pela parte. Apenas o destinatário das decisões judiciais tem o dever de cumpri-las, sob pena de incidirem nas sanções do § 2º. O descumprimento de ordem judicial por parte da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, ensejará aplicação da pena de multa apenas a pessoa jurídica de direito público e não ao seu procurador, que poderá responder por eventual infração disciplinar junto ao órgão administrativo de controle. A PENHORA DAS QUOTAS E DAS AÇÕES DAS SOCIEDADES PERSONIFICADAS O devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para o cumprimento de suas obrigações, salvo as restrições legais (art. 789 do CPC/2015). Tanto os bens do devedor existentes a época da obrigação como os bens adquiridos depois respondem pelo cumprimento da obrigação de pagar. 212


Deste modo, a penhora deverá atingir tantos bens do executado quantos bastem para o pagamento do total da dívida, principal e acessórios, não estando sujeitos a execução os bens que a lei considera impenhoráveis ou inalienáveis (arts. 831 e 832 do CPC/2015). A quota social é uma parte do capital social que assegura ao sócio direitos e deveres em relação à sociedade, tendo a natureza de bem móvel incorpóreo (art. 1.055 do CC). As ações são frações unitárias do capital social das companhias abertas e fechadas, que atribuem ao titular a condição de acionista, e tem natureza de bem móvel corpóreo (art. 11 da Lei nº 6.404/76). No enunciado nº 389 da IV Jornada de Direito Civil, realizada pelo Conselho da Justiça Federal, fica consignado que as quotas do sócio de serviço, na sociedade simples (art. 997, inc. V, art. 1006 e 1007 do CC), serão impenhoráveis quando tiver caráter alimentar (art. 833, inc. IV do CPC/2015).

213


O pró-labore assegurado ao sócio quotista pelo direito que lhe confere a titularidade das quotas

tem

natureza

salarial,

e,

portanto,

impenhorável em razão do seu caráter alimentar (art. 833, inc. IV e § 2º do CPC/2015). Deste modo, não só o pró-labore é impenhorável como as próprias quotas que asseguram o direito a remuneração ao sócio. Em qualquer tipo societário a participação do sócio será impenhorável, quando for a sua única fonte de subsistência. No enunciado nº 387 da IV Jornada de Direito Civil, realizada pelo Conselho da Justiça Federal, a opção entre fazer a execução recair sobre o que ao sócio couber no lucro da sociedade, ou na parte que lhe tocar em dissolução, orienta-se pelos princípios da menor onerosidade e da função social da empresa. Com a penhora inicia-se a transmissão forçada de bens do devedor para a satisfação do direito do credor, tendo a natureza de ato executório e a finalidade de individualizar e apreender os bens do executado para satisfação do 214


direito do credor (art. 839 do CPC/2015), de conservar os referidos bens para evitar que sejam alienados, deteriorados ou escondidos pelo devedor (ENRICO TULLIO LIEBMAN. Processo de Execução, 2003, pág. 149). A penhora se diferencia do arresto por ser um ato de execução enquanto o arresto é um ato de natureza cautelar, provisório e excepcional, que se converte em penhora após a citação do executado e transcorrido

o

prazo

para

pagamento

ou

oferecimento de bens (§ 3º do art. 830 do CPC/2015). A penhora das quotas das sociedades simples e empresárias e das ações das companhias aparece em nono lugar na ordem legal da penhora instituída pelo artigo 835 do Código de Processo Civil de 2015. No Código de Processo Civil de 1973 (Lei nº 5.869/73) a penhora das quotas e ações das sociedades personificadas aparecia em sexto lugar na ordem legal fixada pelo artigo 655, e o artigo 685-A, § 4º, assegurava a preferência dos sócios na 215


aquisição das quotas quando o exeqüente (não sócio) pretendesse a adjudicação das quotas, regra que encontra correspondente no § 7º do artigo 876 do Código de Processo Civil de 2015. Nos termos do artigo 1.150 do Código Civil o empresário e a sociedade empresária vinculam-se ao Registro Público de Empresas Mercantis (Lei nº 8.934/94) a cargo das Juntas Comerciais, e a sociedade simples ao Registro Civil das Pessoas Jurídicas (art. 114 a 126 da Lei nº 6.015/76). Tratando-se de penhora, seqüestro ou arresto de quotas ou de ações compete a Junta Comercial proceder à anotação correspondente para conhecimento de terceiros, nos termos do artigo 47 do Decreto nº 1.800/96, que regulamenta a Lei nº 8.934/94, que dispõe sobre o registro público de empresas. A penhora sobre ações de sociedade anônima será registrada no livro de Registro de Ações Nominativas (art. 100, inc. I, alínea f, da Lei nº 6.404/76), com comunicação a bolsa de valores. 216


O importante é que a penhora seja inscrita no registro competente para gerar a presunção absoluta de conhecimento por terceiros, devendo-se destacar que a súmula de jurisprudência nº 375 do Superior Tribunal de Justiça não se aplica as execuções fiscais para cobrança de créditos tributários inscritos em dívida ativa (STJ, REsp nº 1.341.624/SC,

Min.

Arnaldo

Esteves

Lima,

Primeira Turma, DJe 14/11/2012). Deste modo, após a Lei Complementar nº 118/2005, presume-se a ocorrência de fraude a execução quando os atos de alienação ou oneração das quotas ou ações forem feitos posteriormente a inscrição do crédito tributário em dívida ativa. Para os demais créditos é o registro da penhora ou a averbação da propositura da ação de execução que irá gerar a presunção de fraude a execução, quando os atos de alienação ou oneração das quotas e ações forem feitos em data posterior ao registro. (arts. 792, 799, inciso IX e 828 do CPC).

217


Havendo a implementação de sistema eletrônico (art. 193 do CPC/2015) é possível a penhora,

com

a

sua

inscrição

no

registro

competente por meio eletrônico. O artigo 861 do Código de Processo Civil de 2015 trata da penhora das quotas e das ações dos sócios, dispondo que o juiz assinará prazo razoável, não superior a três (3) meses, para que a sociedade apresente balanço especial, na forma da lei; ofereça as quotas ou as ações aos demais sócios, observado o direito de preferência legal ou contratual; e não havendo interesse dos sócios na aquisição das ações, proceda à liquidação das quotas ou das ações, depositando em juízo o valor apurado, em dinheiro. O prazo de três (3) meses poderá ser ampliado pelo magistrado, a requerimento ou de ofício, quando o pagamento das quotas ou ações superarem o valor do saldo de lucros ou reservas, exceto a legal, ou colocar em risco a estabilidade financeira da sociedade simples ou empresária (§ 4º do art. 861 do CPC/2015). O CPC dispõe que o 218


prazo poderá ser ampliado não fixando a sua limitação. O saldo de lucros e as reservas, inclusive a legal, estão disciplinados nos artigos 189 a 200 da Lei nº 6.404/76. O balanço especial é o do artigo 1.031 do Código Civil que determina que o valor da quota, considerada pelo montante efetivamente realizado, liquidar-se-á, salvo disposição contratual em contrário, com base na situação patrimonial da sociedade, à data da resolução, verificada em balanço especialmente levantado. O capital social sofrerá a correspondente redução, salvo se os demais sócios suprirem o valor da quota. O pagamento da à quota deverá ser em dinheiro. O Código Civil fala em balanço especial, mas o correto seria falar em balanço de determinação, como faz o artigo 606 do Código de Processo Civil de 2015. Pode-se definir balanço de determinação

como

um

balanço

patrimonial

especial, elaborado para fins judiciais por perito contábil a partir do balanço oficial da empresa, que 219


não afeta a contabilidade da mesma e é utilizado para determinar o montante dos haveres que cabe ao sócio dissidente, excluído ou falecido. Em todos os casos em que seja necessária a realização de perícia, a nomeação do perito recairá preferencialmente sobre especialista em avaliação de sociedades (art. 606, parágrafo único do CPC/2015). O

juiz

poderá,

a

requerimento

do

exeqüente ou da sociedade personificada, nomear administrador, que deverá submeter à aprovação judicial a forma de liquidação. A nomeação deverá ser averbada no registro próprio (art. 1.102 do CC). Para evitar a liquidação das quotas ou das ações, a sociedade poderá adquiri-las sem redução do capital social e com utilização de reservas, para manutenção em tesouraria. Esta regra não se aplica à sociedade anônima de capital aberto, cujas ações serão adjudicadas ou alienadas em bolsa de valores. Deste modo, para evitar a liquidação o CPC passa a prever a possibilidade das sociedades personificadas negociarem com as próprias quotas 220


ou ações, conforme o disposto no artigo 30 da Lei nº 6.404/76 c/c artigo 983 e artigo 1.053 do Código Civil. No enunciado nº 391 da IV Jornada de Direito Civil, realizada pelo Conselho da Justiça Federal, ficou decidido que a sociedade limitada pode adquirir suas próprias quotas, devendo observar as condições estabelecidas na Lei das S/A. As condições estabelecidas na alínea b do § 1º do artigo 30 da Lei nº 6.404/76 para a aquisição das quotas e ações pela sociedade para permanência em tesouraria, são a de que o capital social não seja diminuído e a sociedade não poderá despender além do valor do saldo de lucros ou reservas, exceto a legal. Assim, para evitar a liquidação das quotas e ações, a sociedade pode adquiri-las para permanência em tesouraria, ficando como quotista ou acionista de si mesma. O Superior Tribunal de Justiça já vinha autorizando a sociedade personificada a remir a execução na qualidade de terceira interessada, o 221


que na prática equivale à negociação com as quotas ou ações próprias (REsp n° 221625, Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJ 07/05/2001). O artigo 861 prevê uma forma de dissolução parcial das sociedades personificadas quando os demais sócios não exerçam o direito de preferência na aquisição das quotas penhoradas e a sociedade não exerça o direito de adquiri-las para manutenção em tesouraria. Neste caso, efetua-se a liquidação das quotas penhoradas resolvendo-se a sociedade em relação ao sócio excluído. Da mesma forma, o artigo 1.026 do Código Civil autoriza o credor a requerer a liquidação da quota do devedor, cujo valor deverá ser apurado na forma do artigo 1.031, mediante balanço especial, depositando-se em dinheiro a disposição do juízo da execução, no prazo de noventa dias a contar da liquidação. Neste caso, o sócio cuja quota tenha sido liquidada será excluído de pleno direito (art. 1.030, parágrafo único do CC/2015).

222


Caso não haja interesse dos demais sócios no exercício do direito de preferência; não ocorra a aquisição das quotas ou das ações pela sociedade e a liquidação seja excessivamente onerosa para a sociedade, o juiz poderá determinar o leilão judicial das quotas ou das ações (§ 5º do art. 861 do CPC/2015). Pode ocorrer que a resolução da sociedade em relação ao sócio que teve suas quotas ou ações penhoradas,

se

torne

tão

onerosa

para

a

continuidade da atividade civil ou empresarial que a solução será a adjudicação ou a alienação da participação societária com o ingresso de novo sócio quotista ou acionista. Ressalvados os casos de alienação a cargo de corretores de bolsa de valores, todos os demais bens serão alienados em leilão público. Portanto, as ações das companhias abertas são alienadas em bolsa de valores e as quotas e as ações das companhias fechadas são alienadas em leilão público.

223


A regra do referido artigo 861 do Código de Processo Civil é inovadora, visto que o CPC de 73 não tinha norma semelhante, e supre uma lacuna no tocante a penhora de quotas das sociedades simples e empresárias e das ações das sociedades anônimas fechadas, em que era recorrente a alegação de que a penhora das quotas sociais violariam a affectio societatis (STJ, AGARESP nº 231266, Min. Sidnei Beneti, Terceira Turma, DJe 10/06/2013, AGA nº 347829, Min. Ari Pargendler, Terceira Turma, DJ 01/10/2001, e REsp nº 16540, Min. Waldemar Zveiter, Terceira Turma, DJ 08/03/1993), . Na nova sistemática do CPC os direitos de preferência dos sócios são preservados, na hipótese de penhora das quotas de algum sócio quotista, e a eventual cláusula contratual de proibição de livre alienação das quotas é resguardada, na medida em que primeiro as quotas ou ações serão oferecidas aos demais sócios e somente quando não houver interesse destes na aquisição das quotas ou ações penhoradas é que se procede a resolução da 224


sociedade em relação ao sócio que teve suas quotas ou ações penhoradas, com a respectiva liquidação e depósito do valor em juízo. Pode, ainda, a sociedade adquirir as quotas e ações do sócio executado para manutenção em tesouraria ao invés de proceder à liquidação das mesmas. As quotas e ações somente vão a leilão judicial se os sócios não exercerem o direito de preferência, a sociedade não adquiri-las e também não resolver a sociedade em relação ao sócio executado. O intuito é o de preservar a continuidade das atividades econômicas desenvolvidas pelas sociedades e companhias, com base no princípio da preservação da empresa e da sua função social.

225


O DESCOMPASSO DO PROCEDIMENTO DOS EMBARGOS À EXECUÇÃO NA LEI DE EXECUÇÃO FISCAL E NO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL A lei nº 6.830, de 22 de setembro de 1980, é oriunda do projeto de lei do Congresso Nacional nº 14 de 1980, contendo normas de natureza processual para especialização procedimental da execução dos créditos fazendários. Deste modo, o objetivo da LEF é regular o processo de execução para a cobrança da dívida 226


ativa dos entes públicos legitimados, com aplicação subsidiária do Código de Processo Civil. A dívida ativa regularmente inscrita goza da presunção de certeza e liquidez, que somente pode ser elidida mediante prova do executado, constituindo título executivo hábil a instruir a ação de execução fiscal (art. 585, inc. VII do CPC/73, art. 784, inc. IX do CPC/2015 e artigo 3º da LEF). “Em linhas gerais a sistemática da execução fiscal introduzida pela Lei nº 6.830 é a mesma do Código de Processo Civil, ou seja, a execução por quantia certa contra devedor da Fazenda Pública é processo de pura atividade de realização do direito do credor”. (HUMBERTO THEODRO JÚNIOR, Processo de execução, p. 517). Tanto isto é verdade que se não houvesse a lei nº 6.830/80, a Fazenda Pública teria que se valer da execução por quantia certa, disciplinada no Código de Processo Civil, para a cobrança da dívida ativa, pois a execução forçada pode ser promovida pelo credor a quem a lei confere título 227


executivo (art. 566, inc. I do CPC/73 e art. 778 do CPC/2015). O artigo 646 do Código de Processo Civil de 1973 dispõe que a execução por quantia certa tem por objeto expropriar bens do devedor, a fim de satisfazer o direito do credor. O Código de Processo Civil de 2015, no artigo 824, dispõe que a execução por quantia certa se realiza pela expropriação de bens do executado. Isto porque, “a atividade desenvolvida pelos órgãos judiciários para dar atuação à sanção recebe o nome de execução; em especial, execução civil é aquela que tem por finalidade conseguir por meio do processo, e sem o concurso da vontade do obrigado, o resultado prático a que tendia a regra jurídica que não foi obedecida” (ÉNRICO TÚLIO LIEBMAN. Processo de execução, p. 18). A ação de execução fiscal se destina a satisfação do crédito da Fazenda Pública por meio dos atos expropriatórios do processo de execução, não se discutindo o acertamento da relação creditícia nem a definição de responsabilidades. 228


Eventual discussão acerca do título da Fazenda Pública será objeto dos embargos à execução. O parágrafo 1º do artigo 16 da lei nº 6.830/80 dispõe expressamente que não são admissíveis os embargos à execução quando a execução fiscal não estiver garantida. De fato a lei de execução fiscal seguiu o disposto no artigo 747 do Código de Processo Civil de 1973 (lei nº 5.869/73), vigente à época da elaboração do projeto de lei do Congresso Nacional nº 14 de 1980 (transformado na lei nº 6.830/80), que na sua redação original não admitia os embargos à execução sem que a ação de execução por quantia certa estivesse garantida por penhora. O prazo para a propositura dos embargos tinha início com a intimação da penhora, nos termos do inciso I do artigo 748, na sua redação original. Posteriormente, com as reformas do CPC/73, a parte do processo de execução sofreu mudanças, dentre elas a possibilidade do executado opor-se à execução por meio dos embargos independentemente de penhora, depósito ou caução 229


(art.

736

com

redação

dada

pela

lei

11.382/2006). A ausência de efeito suspensivo dos embargos à execução, salvo se deferido pelo juiz quando, sendo relevantes seus fundamentos, o prosseguimento da execução manifestamente possa causar ao executado grave dano de difícil ou incerta reparação, e desde que a execução já esteja garantida por penhora, depósito ou caução, nos termos do artigo 739-A do CPC/73 (redação dada pela lei nº 11.382/2006). Deste modo, “a segurança do juízo não foi, propriamente, eliminada da disciplina dos embargos à execução. Mudou, porém, de papel. Em lugar de condição de procedibilidade passou a ser requisito do efeito suspensivo, quando pleiteado pelo embargante (art. 739-A, § 1º)” (HUMBERTO THEODORO

JUNIOR.

Curso

de

Direito

Processual Civil vol. II – Processo de Execução e Cumprimento da Sentença, Processo Cautelar e Tutela de Urgência, 2007, pág. 435). Ocorre que o legislador não promoveu as mesmas alterações no artigo 16 da LEF, para 230


possibilitar a propositura dos embargos à execução independentemente de segurança do juízo, a contar da citação. Com isso criou-se o descompasso do procedimento dos embargos à execução na lei de execução fiscal e no Código de Processo Civil. A alteração do artigo 16 da LEF para possibilitar que o executado pudesse se opor a execução fiscal por meio dos embargos à execução, não afetaria as garantias e privilégios da Fazenda Pública, pois os embargos não teriam o condão de suspender a execução fiscal que prosseguiria na busca de bens penhoráveis do devedor, nem autorizaria a expedição de certidão positiva com efeitos de negativa (art. 206 do CTN) sem que houvesse a prestação de garantia suficiente. A reforma legislativa do artigo 16 da LEF para compatibilizá-lo com o procedimento dos embargos à execução do Código de Processo Civil, somente traria benefícios as partes possibilitando o acesso à justiça, a ampla defesa, a razoável duração do

processo

e

a

sua

efetividade.

Traria

231


uniformidade para o prazo de oposição dos embargos, uma vez que independeria de garantia. Na ação de execução fiscal é corriqueira a apresentação de exceção de pré-executividade, quando citado o executado, justamente em razão da obrigatoriedade de garantia de juízo para o ajuizamento dos embargos, e posteriormente quando efetivada a penhora e rejeitada a exceção, os

mesmos

argumentos

são

reiterados

nos

embargos. Isto seria evitado com a dispensa de garantia do juízo para a oposição dos embargos, nos moldes do CPC, pois o executado poderia apresentar todas as suas alegações logo no início do processo de execução fiscal. No Recurso Especial nº 1.272.827/PE o Superior Tribunal de Justiça decidiu que em atenção ao princípio da especialidade da lei execução fiscal, a dispensa da garantia como condicionante dos embargos à execução do artigo 736 do CPC, com redação dada pela Lei nº 11.382/2006, não se aplica às execuções fiscais em razão da existência de dispositivo específico (artigo 232


16,

§1º

da

Lei

6.830/80),

que

exige

expressamente a garantia para a apresentação dos embargos à execução fiscal (Recurso Repetitivo, Min. Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, DJe 31/05/2013 – Informativo de Jurisprudência do STJ nº 0526 de 25 de setembro de 2013). Como assentado no Recurso Especial nº 1.178.883/MG (STJ, Min. Teori Albino Zavascki, Primeira Turma,

DJe

25/10/2011),

o

efeito

suspensivo dos embargos à execução (art. 739-A do CPC de 73) esta associado à exigência de garantia prévia de juízo (art. 739, § 1º e art. 736 do CPC de 73). Deste modo, o entendimento que prevaleceu foi o de que ao contrário do que ocorre no CPC, no regime da execução fiscal, persiste a norma segundo a qual não são admissíveis embargos do executado antes de garantida a execução por depósito, fiança ou penhora (art. 16, § 1º da Lei 6.830/80). O Código de Processo Civil de 2015, no artigo 914, mantém a regra da desnecessidade da garantia da execução para que o executado possa 233


opor-se mediante embargos à execução, e da ausência de efeito suspensivo dos embargos, ressalvada a possibilidade de deferimento pelo juiz de efeito suspensivo quando verificados os requisitos para a concessão da tutela provisória (art. 294 a 311) e desde que a execução já esteja garantida

por

penhora,

depósito

ou

caução

suficiente, nos termos do artigo 919. Portanto, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que é necessária a garantia

do

juízo,

como

condição

de

procedibilidade, para que o executado possa oporse à ação de execução fiscal por meio dos embargos à execução, continuará sendo aplicável. Nem mesmo ao devedor beneficiário da gratuidade de justiça (lei 1.060/50) é facultado opor-se a ação de execução fiscal sem a prévia garantia do juízo (STJ, REsp. nº 1.437.078/RS, Min. Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 31/03/2014 – Informativo de Jurisprudência do STJ nº 0538 de 30 de abril de 2014). O entendimento é no sentido de que a isenção das despesas de 234


natureza processual ao beneficiário da gratuidade justiça não alcança a isenção de garantia do juízo para propor os embargos à execução. Efetivada a penhora e dela sendo intimado o devedor, atendido estará o requisito de garantia para a oposição de embargos à execução. A eventual insuficiência da penhora será suprida por posterior reforço, que pode ocorrer em qualquer fase do processo, nos termos do inciso II do artigo 15 desta lei, sem prejuízo do regular processamento dos embargos (STJ, REsp nº 1115414/SP, Min. Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, DJe 26/05/2011). O curador especial (Súmula n.º 196 do STJ) é dispensado de oferecer garantia ao juízo para opor embargos à execução. Com efeito, seria um contra-senso admitir a legitimidade do curador especial para a oposição de embargos, mas exigir que, por iniciativa própria, garantisse o juízo em nome do réu revel, mormente em se tratando de defensoria

pública,

na

medida

em

que

consubstanciaria desproporcional embaraço ao 235


exercício do que se constitui um munus público, com nítido propósito de se garantir o direito ao contraditório e à ampla defesa (STJ, REsp nº 1.110.548/PB, Min. Laurita Vaz, Corte Especial, DJe 26/04/2010 – Recurso Repetitivo). De fato a decisão do Superior Tribunal de Justiça no Recurso Especial nº 1.272.827/PE, é acertada, visto que a LEF possui dispositivo específico que trata do procedimento dos embargos à execução fiscal, e como o CPC somente se aplica subsidiariamente, não há como se dispensar a necessidade

de

garantia

do

juízo

para

o

oferecimento dos embargos. Portanto, fica este descompasso entre o procedimento dos embargos à execução na lei nº 6.830/80 e no Código de Processo Civil, com evidente atraso na sistemática do artigo 16 da LEF que não foi alterado para acompanhar a evolução do processo de execução.

236


A JURISPRUDÊNCIA NA JURISDIÇÃO CIVIL Nos termos da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (art. 5º, inc. XXXV) cabe ao Poder Judiciário o monopólio da função jurisdicional, na medida em que a lei não pode excluir da sua apreciação lesão ou ameaça a direito. Portanto, a solução dos conflitos entre as partes é submetida ao judiciário para a efetiva prestação jurisdicional pelo Estado, ressalvados os casos 237


legais de solução alternativa de conflitos, como a arbitragem (Lei nº 9.307/96). O juiz cumpre a função jurisdicional com a prolação da decisão que põe termo ao litígio, podendo resolver ou não o mérito da demanda. No segundo caso opera-se a coisa julgada que torna imutável os efeitos da decisão (art. 502 do CPC). A sentença e o acórdão (art. 204 do CPC) devem conter o relatório, os fundamentos e o dispositivo, sendo que somente a parte dispositiva faz coisa julgada. Os motivos, ainda que importantes para determinar o alcance da parte dispositiva da sentença e a verdade dos fatos estabelecida como fundamento da sentença, não fazem coisa julgada (art. 504 do CPC). Por parte dispositiva da decisão deve se entender tudo quanto o julgador haja considerado e decidido acerca do pedido formulado na demanda e não apenas a frase final da decisão. Os motivos não fazem coisa julgada, mas são importantes para se compreender o significado e alcance do dispositivo da decisão. 238


Como a função jurisdicional é prestada pelos juízes em todo o território nacional, surgem os diversos entendimentos sobre os assuntos colocados para decisão na justiça, podendo ser de forma uniforme ou divergente. Com o crescente acesso ao judiciário o volume de serviço prestado é aumentado,

exigindo

uniformização

dos

dos

julgadores

entendimentos

a

proferidos,

principalmente nas demandas que contém a mesma matéria de direito. Trata-se do dever de coerência na aplicação das normas jurídicas como garantia aos jurisdicionados da realização da justiça. Portanto, a divergência jurisprudencial é normal num sistema em que há pluralidade de órgãos judicantes que tem que decidir iguais questões de direito, podendo ocorrer que num mesmo contexto histórico e cultural, a mesma regra jurídica seja aplicada de forma diferente pelos tribunais.

Ocorre

que

a

divergência

de

entendimentos acerca da mesma regra pode comprometer a unidade e a certeza do direito, o que gera

a

necessidade

de

uniformização 239


jurisprudencial. Aliás, o dissídio jurisprudencial é uma das hipóteses de cabimento do recurso especial para o Superior Tribunal de Justiça, que ocorre quando a decisão recorrida proferida pelos Tribunais Regionais Federais e Tribunais de Justiça dos Estados, em causas decididas em única ou última instância, der a Lei Federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro Tribunal (art. 105, inc. III, al. c da CF e art. 1.029, § 1º e 2º do CPC). Além

do

Recurso

Especial,

são

instrumentos de uniformização da jurisprudência: I) os

embargos

de

divergência

em

recurso

extraordinário ou especial e nos processos de competência originária do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça (arts. 1.043 e 1.044 do CPC); II) o incidente de resolução de demandas repetitivas para os casos de repetição de processos que contenham controvérsia sobre a questão de direito e representem risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica (arts. 976 a 987 do CPC);

III)

a

reclamação

para

preservar

a

240


competência do Tribunal, para garantir a autoridade das decisões do Tribunal, do Supremo Tribunal Federal

em

controle

concentrado

de

constitucionalidade, a observância de súmulas com efeito vinculante e de precedente proferido em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção de competência (arts. 988 a 993 do CPC); IV) o incidente de assunção de competência para os casos em que o julgamento de recurso, remessa necessária ou processos de competência originária do Tribunal envolver relevante questão de direito com repercussão social (art. 947 do CPC); V) o recurso especial e extraordinário repetitivos para julgamento de casos repetitivos que tem como objeto questão de direito material ou processual (art. 928, inc. II, 1.036 a 1.041 do CPC); VI) as súmulas de jurisprudência para efeito persuasivo e preventivo

geral

em

face

de

divergências

verificadas (art. 926, § 2º, 927, inc. II, III e V, 932, inc. IV, al. a, inc. V, al. a, 1.035, § 3º, inc. I do CPC); VII) as súmulas vinculantes do STF (art. 103-A da CF) e as decisões proferidas em ação 241


direta

de

inconstitucionalidade

e

na

ação

declaratória de constitucionalidade (art. 102, § 2º da CF). O Código de Processo Civil de 73, no artigo 476 a 479, tratava do incidente de uniformização da jurisprudência nos casos de dissídio jurisprudencial verificável nos julgamentos dos Tribunais. O referido incidente veio em substituição ao recurso de revista do Código de Processo Civil de 39. Como visto no parágrafo anterior, o Código atual instituiu outros sistemas para

uniformizar

a

jurisprudência,

não

contemplando o incidente de uniformização da jurisprudência. O incidente de deslocamento de competência do § 1º do artigo 555 do CPC/73 encontra

correspondente

na

assunção

de

competência do artigo 947 do CPC/2015. No Código de Processo Civil existe norma dispondo

sobre

o

dever

dos

Tribunais

de

uniformizar a sua jurisprudência, de modo a mantêla estável, íntegra e coerente (art. 926 caput), dando publicidade

aos

seus

precedentes, 242


preferencialmente por meio digital (internet), organizados por questão jurídica decidida (§ 5º do art. 927 do CPC). O objetivo é o de identificar quais julgados devem ter força de precedentes obrigatórios, qual a parte do julgado que possui a função

persuasiva

ou

vinculativa

(súmulas

vinculantes e decisões em Adin e Adcon do STF), e quais as hipóteses de mitigação ou superação do precedente. Na

lição

de

ORLANDO

GOMES,

jurisprudência é o conjunto de decisões dos tribunais sobre as matérias de sua competência ou uma série de julgados similares sobre a mesma matéria (Introdução ao direito civil. 18ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, pág. 46). É necessário que o conjunto de decisões expresse a posição dominante nos tribunais, de forma reiterada e constante. O precedente para dar origem à jurisprudência deve ser uniforme e constante, não podendo ser representado por um grupo de decisões isoladas.

243


A jurisprudência que se torna firme, pacífica e uniforme pode dar origem a súmula que é editada pelos Tribunais para estabilizar a aplicação de determinada norma jurídica, em decorrência do crescente volume de serviços. Como ensina ARRUDA ALVIM, “a súmula se constitui num método e num instrumento de trabalho acentuadamente incorporados ao sistema brasileiro, já há mais de duas décadas” (A arguição de relevância no recurso extraordinário. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1988, pág. 34). Para MANCUSO,

RODOLFO e

emissão

DE das

CAMARGO súmulas

pelos

Tribunais visam a consecução de três utilidades básicas: a) a outorga de tratamento judicial isonômico a casos substancialmente semelhantes, com isso se alcançando uma justiça de boa qualidade; b) melhor gerenciamento da excessiva carga de processos nos Tribunais, possibilitando o agrupamento das ações pela afinidade da questão jurídica debatida, de sorte que todas possam 244


receber análoga solução, de acordo com o enunciado da súmula; c) redução do tempo de duração dos processos, na medida em que a existência de súmula sobre a matéria litigiosa torna razoavelmente previsível o resultado da demanda (Divergência jurisprudencial e súmula vinculante. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1999, pág. 320). Na forma estabelecida e segundo os pressupostos fixados no regimento interno, os tribunais

editarão

enunciados

de

súmula

correspondentes a sua jurisprudência dominante. Ao editar enunciados de súmula, os tribunais devem ater-se às

circunstâncias

fáticas

dos

precedentes que motivaram sua criação (§ 1º e 2º do art. 926 do CPC). Conforme

ensina

HUMBERTO

THEODORO JÚNIOR, “a Súmula não tem força de lei para os casos futuros, mas funciona, de acordo com o Regimento Interno do Tribunal, como instrumento de dinamização dos julgamentos e valioso veículo de uniformização jurisprudencial, 245


como tem evidenciado a prática do Supremo Tribunal Federal” (Curso de direito processual civil. 39ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003, pág. 558). Obviamente que as súmulas podem ser revistas ou canceladas pelo próprio Tribunal, em decorrência da modificação do texto legislativo que deu origem ao entendimento consolidado, ou até mesmo pela mudança na jurisprudência que originou a súmula. Isto porque, a súmula espelha a jurisprudência pacificada a respeito de um texto legal, sendo dotada, normalmente, da vida que esse texto tenha. Modificado o texto, ipso facto, a súmula deve ser cancelada, salvo se a modificação em nada afetar o conteúdo da súmula, pois muitos dos enunciados das súmulas contêm um quid a mais além da interpretação do direito posto, transcendendo do texto legal (ARRUDA ALVIM, Arguição de relevância no recurso extraordinário, 1988, pág. 34/35). Neste sentido, dispõe o § 2º, 3º e 4º, do artigo 927 do Código de Processo Civil que a 246


alteração de tese jurídica adotada em enunciado de súmula ou em julgamento de casos repetitivos poderá ser precedida de audiências públicas e da participação de pessoas, órgãos ou entidades que possam contribuir para a rediscussão da tese, que na

hipótese

de

alteração

de

jurisprudência

dominante do Supremo Tribunal Federal e dos demais Tribunais ou daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos, pode haver modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da segurança jurídica, e que a modificação de enunciado de súmula, de jurisprudência pacificada ou de tese adotada em julgamento de casos repetitivos

observará

fundamentação

a

adequada

necessidade e

de

específica,

considerando os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia. As súmulas tem, em regra, efeito apenas persuasivo, como as alterações promovidas pela Lei nº 9.756/98, que modificou a redação do artigo 557 do Código de Processo Civil de 73 para autorizar o relator a negar seguimento a recurso 247


interposto de decisão fundamentada em súmula do respectivo Tribunal, do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, bem como para dar provimento a recurso interposto de decisão proferida em desrespeito a entendimento sumulado pelo respectivo Tribunal, pelo STF e pelo STJ. A regra do caput do artigo 557 do CPC/73 é mantida na alínea a, do inciso IV, do artigo 932 do Código de Processo Civil. O artigo 927 do Código de Processo Civil é explicito sobre a necessidade de observância pelos juízes das decisões do Supremo Tribunal Federal

em

controle

concentrado

de

constitucionalidade, dos enunciados de súmula vinculante; dos acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas

e

extraordinário

em e

julgamento especial

de

recursos

repetitivos,

dos

enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional,

248


da orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados. Nas causas que dispensem a fase de instrução, o juiz, independentemente da citação do réu, julgará liminarmente improcedente o pedido que contrariar enunciado de súmula do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça; acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos; entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência; enunciado de súmula de tribunal de justiça sobre direito local (art. 332 do CPC/2015). A súmula não vincula, tanto que se uma decisão tiver dado à norma jurídica interpretação divergente da consubstanciada na súmula, haverá apenas divergência jurisprudencial a ser corrigida em sede recursal. Prova disto é que o § 3º, do inciso I, do artigo 1.035 do Código de Processo Civil, dispõe que haverá repercussão geral sempre que o recurso

extraordinário

impugne

decisão

que 249


contrarie súmula ou jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal. Entretanto, com as alterações promovidas pela Emenda Constitucional nº 45/2004, foi criada a súmula com efeito vinculante a ser editada pelo Supremo Tribunal Federal (art. 103-A da CF), e as decisões definitivas de mérito proferidas pelo STF em

sede

de

controle

concreto

de

constitucionalidade (Adin e Adcon), passaram a ter efeito vinculante. O regimento interno do Supremo Tribunal Federal trata da súmula vinculante nos artigos 354-A a 354-G. Com a Emenda Constitucional nº 45/2004, foi introduzido o artigo 103-A na Constituição da República Federativa de 1988, para autorizar o Supremo Tribunal Federal a editar súmula com efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal. A súmula vinculante terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre 250


órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica. O ato administrativo ou a decisão judicial que contrariar a súmula vinculante aplicável ou que indevidamente a aplicar, ensejará a propositura de reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem a aplicação da súmula, conforme o caso. Também com a Emenda Constitucional nº 45/2004,

as

decisões

definitivas

de

mérito,

proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações diretas de inconstitucionalidade e nas ações declaratórias de constitucionalidade passaram a ter eficácia

contra

relativamente

todos

aos

e

efeito

vinculante,

demais

órgãos

do

Poder

Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal (art. 102, § 2º da CF). 251


Para garantir a observância de decisão do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de

constitucionalidade

e

a

observância

de

enunciado de súmula vinculante caberá reclamação pela parte interessada ou pelo Ministério Público (art. 988, inc. III e IV do CPC). Trata-se de hipótese de aplicação indevida da tese jurídica ou sua não aplicação nos casos em que seja cabível, quando não demonstrada a distinção ou a superação do precedente. É cabível até o trânsito em julgado da decisão impugnada na reclamação. Sendo julgada procedente, a decisão exorbitante será cassada ou será adotada medida adequada para a solução da controvérsia. Além da jurisprudência consolidada nas súmulas, também passam a ter efeito persuasivo o acórdão proferido em sede de recurso especial repetitivo e recurso extraordinário repetitivo (art. 932, inciso V, alíneas a, b e c, e 1.036 do CPC/2015), e o entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas (art. 976, 985 e 986 do CPC/2015). Para os fins do Código de 252


Processo Civil, considera-se julgamento de casos repetitivos a decisão proferida em incidente de demandas repetitivas, em Recurso Especial e Extraordinário repetitivos, que tem por objeto questão de direito material ou processual (art. 982 do CPC). O procedimento do recurso especial repetitivo e do recurso extraordinário repetitivo está previsto nos artigos 1.036 a 1.041 do Código de Processo Civil, e é cabível quando houver multiplicidade

de

recursos

especiais

e

extraordinários com fundamento em idêntica questão de direito. São selecionados 2 (dois) ou mais recursos representativos da controvérsia, pelo presidente ou vice-presidente do Tribunal de Justiça ou

Tribunal

Regional

Federal,

para

encaminhamento ao Superior Tribunal de Justiça ou para o Supremo Tribunal Federal, suspendendo-se todos os processos individuais ou coletivos que tenham como fundamento a mesma questão de direito a ser resolvida pelos Tribunais Superiores. A escolha dos recursos não obsta que o relator no 253


Superior Tribunal de Justiça ou no Supremo Tribunal

Federal

selecione

outros

recursos

representativos da controvérsia. É incabível o incidente de resolução de demandas repetitivas quando um dos tribunais superiores,

no

âmbito

de

sua

respectiva

competência, já tiver afetado recurso para definição de tese sobre questão de direito material ou processual repetitiva (§ 4º do art. 976 do CPC). A parte que teve o curso do seu processo suspenso em decisão proferida em recursos representativos de controvérsia encaminhados para julgamento no Superior Tribunal de Justiça ou no Supremo Tribunal Federal poderá demonstrar que são distintas as questões a serem decididas no seu processo daquelas a serem resolvidas no recurso especial repetitivo ou extraordinário repetitivo (§ 9º do art. 1.037 do CPC). Conforme

ensina

LEONARDO

CARNEIRO DA CUNHA “o tema dos recursos repetitivos imiscui-se com a técnica de aplicação dos precedentes. Firmado um precedente, este há 254


de ser seguido nos casos similares ou que se identifiquem com a mesma tese estabelecida. Na verdade, o que deve ser seguido por decisões posteriores é exatamente a ratiodecidendi da decisão, de sorte que se pode dizer que o conceito de ratiodecidendi constitui a chave da doutrina do precedente. Se o caso posterior for diverso daquele retratado no precedente, estará descerrado o caminho para que o órgão jurisdicional afirme não haver precedente, pois se trata de novo caso, ainda não examinado. Haveria, então, um distinguishing, a afastar a aplicação do precedente. O precedente pode, enfim, ser afastado, se o novo caso que se apresenta contém uma particularidade que merece novo tratamento ou solução diversa. Eis o distinguishing. Por outro lado, se a ratiodecidendi estabelece uma norma que, com o tempo, torna-se superada ou obsoleta, impõe-se deixar de seguir o precedente e alterar o conteúdo da ratiodecidendi, caracterizando o chamado overruled. O poder 255


reconhecido a uma Corte de se afastar de um precedente, não distinguível, é chamado de overruling” (recursos repetitivos. Disponível em: www.leonardocarneirodacunha.com.br/artigos/recu rsos-repetitivos, acesso em: 07/03/2016). A ratiodecidendi do acórdão paradigma publicado pelo Superior Tribunal de Justiça ou pelo Supremo Tribunal Federal em sede de recurso especial

repetitivo

ou

recurso

extraordinário

repetitivo, é a interpretação e a aplicação da lei federal ou da Constituição Federal dada pelos tribunais superiores, tendo em conta que o âmbito de discussão no recurso especial e no recurso extraordinário se limita ao controle, aplicação e interpretação de lei federal e de dispositivo da Constituição Federal. Não se discute, portanto, matéria de fato ou apreciação de prova realizada pelo tribunal de origem. Esses dois recursos “são chamados de recursos de fundamentação vinculada. É que só permitem a discussão de certas situações, e, assim, possuem âmbito restrito. O cabimento dessas 256


espécies recursais exige a presença, na decisão recorrida, de alguma controvérsia a respeito da aplicação ou da interpretação de lei federal ou de dispositivo da Constituição Federal. Sem que se tenha presente uma dessas questões, fica o interessado impedido de socorrer-se da via destes recursos” (LUIZ GUILHERME MARINONI E SÉRGIO CRUZ ARENHART, Curso de processo civil, volume 2: processo de conhecimento. 6ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, pág. 560). O relator do recurso especial repetitivo e extraordinário repetitivo poderá solicitar ou admitir manifestação de pessoas, órgãos ou entidades com interesse na controvérsia, considerando a relevância da matéria e consoante dispuser o regimento interno; fixar data para, em audiência pública, ouvir depoimentos de pessoas com experiência e conhecimento na matéria, com a finalidade de instruir o procedimento; e requisitar informações aos tribunais inferiores a respeito da controvérsia e, cumprida a diligência, intimará o Ministério Público para manifestar-se (art. 1.038 do CPC). 257


Decididos os recursos encaminhados ao tribunal superior, os órgãos colegiados declararão prejudicados os demais recursos versando sobre idêntica controvérsia ou os decidirão aplicando a tese firmada. Negada a existência de repercussão geral no recurso extraordinário repetitivo, serão considerados

automaticamente

inadmitidos

os

recursos extraordinários cujo processamento tenha sido sobrestado (art. 1.039 do CPC). Publicado o acórdão paradigma pelo Superior Tribunal de Justiça ou pelo Supremo Tribunal Federal: I - o presidente ou o vicepresidente do tribunal de origem negará seguimento aos

recursos

especiais

ou

extraordinários

sobrestados na origem, se o acórdão recorrido coincidir com a orientação do tribunal superior; II o órgão que proferiu o acórdão recorrido, na origem, reexaminará o processo de competência originária, a remessa necessária ou o recurso anteriormente julgado, se o acórdão recorrido contrariar a orientação do tribunal superior; III - os processos suspensos em primeiro e segundo graus 258


de jurisdição retomarão o curso para julgamento e aplicação da tese firmada pelo tribunal superior; IV - se os recursos versarem sobre questão relativa a prestação de serviço público objeto de concessão, permissão

ou

autorização,

o

resultado

do

julgamento será comunicado ao órgão, ao ente ou à agência reguladora competente para fiscalização da efetiva aplicação, por parte dos entes sujeitos a regulação, da tese adotada (art. 1.040 do CPC). Caso o tribunal de origem não adote o precedente firmado pelos tribunais superiores em sede

de

recurso

especial

ou

extraordinário

repetitivos, mantendo o acórdão divergente, o recurso especial ou extraordinário, anteriormente suspensos, deverão ser remetidos ao Superior Tribunal de Justiça ou ao Supremo Tribunal Federal (art. 1.041 caput do CPC). Não havendo afetação de recurso especial ou extraordinário representativos de controvérsia para o Superior Tribunal de Justiça ou Supremo Tribunal Federal, para decidir idêntica questão de direito, será cabível a instauração do incidente de 259


resolução de demandas repetitivas, para os casos em que se verifique a existência de efetiva repetição de processos que versem sobre a mesma questão de direito e represente risco de ofensa à isonomia e a segurança jurídica, nos termos dos inciso I e II do artigo 976 do Código de Processo Civil.

Estes

são

os

pressupostos

para

a

admissibilidade do incidente (§ 3º e 4º do art. 976 do CPC), que deve ser dirigido ao presidente do tribunal pelo juiz ou relator mediante ofício, pelas partes e pelo Ministério Público ou Defensoria Pública mediante petição, com os documentos que demonstrem a existência dos pressupostos do incidente de resolução de demandas repetitivas (art. 977 do CPC). O regimento interno dos tribunais é que disporá sobre o órgão competente para julgar o incidente e de fixar a tese jurídica, bem como julgar o recurso, a remessa necessária ou o processo de competência

originária

que

deu

origem

ao

incidente.

260


Admitido o incidente o relator determinará a suspensão dos processos pendentes, individuais ou coletivos, que versem sobre a mesma questão de direito; poderá requisitar informações aos órgãos em cujo juízo tramita o processo que originou o incidente e determinará a intimação do Ministério Público para se manifestar (art. 982 do CPC). Durante a suspensão o pedido de tutela de urgência deverá ser requerido no juízo do processo suspenso e não no juízo do incidente. O § 3º do artigo 982 do Código de Processo Civil prevê a possibilidade das partes e do Ministério Público ou da Defensoria Pública requerer ao tribunal competente para conhecer do recurso especial ou extraordinário, a suspensão de todos os processos individuais ou coletivos em curso no território nacional que versem sobre idêntica questão de direito. No artigo 983 do Código

de

Processo

Civil

está

prevista

a

possibilidade de manifestação de pessoas, órgãos e entidades interessadas na resolução da controvérsia.

261


O acórdão proferido no incidente deverá abranger a análise de todos os fundamentos suscitados concernentes a tese jurídica discutida (§ 2º do art. 984 do CPC). Julgado o incidente a tese jurídica adotada será aplicada a todos os processos individuais e coletivos que versem sobre idêntica questão de direito e que tramitem na área de jurisdição do respectivo tribunal e aos casos futuros que versem idêntica questão de direito e que venham a tramitar na jurisdição do tribunal (art. 985 do CPC). A inobservância da tese jurídica firmada no incidente enseja a possibilidade de propositura de reclamação (art. 985, § 1º e art. 988, inc. IV). O § 2º do artigo 985 do Código de Processo Civil, dispõe que se o incidente tiver por objeto questão relativa a prestação de serviço público

fornecido

permissionárias

ou

por mediante

concessionárias, autorização,

o

resultado do julgamento deverá ser comunicado ao órgão, ao ente ou a agência reguladora competente para fiscalização da aplicação do precedente 262


formado no incidente de resolução de demandas repetitivas. A razão de ser do referido parágrafo é que o maior volume de demandas repetidas envolve justamente a prestação de serviços públicos prestados por pessoas jurídicas de direito privado que mediante contrato administrativo tiveram a delegação por parte do poder público para a prestação de determinado serviço. Incumbe as agências o poder de regular e fiscalizar a forma como está sendo prestado o serviço público, motivo pelo qual é comunicada da tese jurídica adotada no incidente de resolução de demanda repetitiva que terá aplicação na jurisdição do tribunal que a editou. Caberá recurso especial e extraordinário do julgamento do mérito do incidente, devendo a tese decidida pelo Superior Tribunal de Justiça ou pelo Supremo Tribunal Federal ser aplicada no território nacional a todos os processos individuais ou coletivos que versem sobre idêntica questão de direito (art. 987 do CPC).

263


Como visto, tanto o incidente de resolução de demandas repetitivas como o recurso especial repetitivo e o recurso extraordinário repetitivo guardam semelhanças entre si, como o fato de se destinarem a resolução de idênticas questões de direito, ao prazo de 1 (um) ano para o julgamento com preferência sobre os demais feitos, ressalvados os que envolvam réu preso e os pedidos de habeas corpus (art. 980 e art. 1.037 § 4º do CPC), a suspensão dos processos pendentes, e a elaboração do precedente que deverá ser observado no julgamento das demandas que versem sobre a mesma questão de direito. Diferentemente, o incidente de assunção de competência do artigo 947 do Código de Processo Civil, é admissível quando o julgamento de recurso, de remessa necessária ou de processo de competência originária envolver relevante questão de direito, com grande repercussão social, sem repetição de múltiplos processos. Será proposto pelo relator, pela parte, pelo Ministério Público ou pela Defensoria Pública, que o recurso, 264


a remessa necessária ou o processo de competência originária seja julgado pelo órgão colegiado que o regimento interno do tribunal indicar. O acórdão proferido no incidente de assunção de competência vinculará todos os juízes e órgãos fracionários do tribunal, sendo cabível a propositura

de

reclamação

para

garantir

a

observância de precedente formulado em incidente de assunção de competência (art. 988, inc. IV). Os pressupostos para a admissibilidade do incidente de assunção de competência são a existência de recurso, remessa necessária ou processo de competência originária a ser julgado, e a demonstração de que envolve relevante questão de direito com ampla repercussão social, que são conceitos abertos que demandam análise no caso concreto pelo tribunal. Os legitimados são o relator do recurso, da remessa necessária ou do processo de competência originária, qualquer das partes e o Ministério Público e a Defensoria Pública. O

incidente

tem

como

objetivo

uniformizar o entendimento sobre questão de 265


direito, solucionando e prevenindo divergências na interpretação e na aplicação da mesma norma ou princípio jurídico entre as Câmaras ou as Turmas do tribunal. O parágrafo 1º do artigo 489 do Código de Processo Civil dispõe que não se considera fundamentada

a

decisão

judicial,

seja

ela

interlocutória, sentença ou acórdão, que se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida; que empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso; que invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão; que não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador; que limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula,

sem

identificar

seus

fundamentos

determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos; que deixar

de

seguir

enunciado

de

súmula, 266


jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento. Deste modo, o precedente ou enunciado de súmula não afeta a tarefa do juiz de interpretar e aplicar a norma jurídica aos fatos aduzidos na demanda,

sendo

nula

por

ausência

de

fundamentação a decisão que não explicar a razão pela

qual

o

entendimento

jurisprudencial

persuasivo se aplica ou não ao litígio a ser julgado. Inclusive é permitido ao julgador afastar a aplicação do procedente ou enunciado de súmula quando não se ajusta ao caso concreto (distinção ou distinguishing), ou quando demonstrar que a jurisprudência que os embasaram está superada, não condizendo mais com a justiça do momento (superação ou overrruling). Nota-se que os dispositivos legais do Código de Processo Civil introduzem técnicas da aplicação, superação e mitigação dos precedentes semelhantes ao do Common law, em razão da crescente força persuasiva da jurisprudência dos 267


Tribunais acarretada pela sobrecarga judiciária. Nos casos de demandas repetitivas e reiteradas a tarefa do juiz consiste essencialmente em enquadrar ao caso concreto determinado precedente, de modo fundamentado. JOSÉ CARLOS BARBOSA MOREIRA destaca o “notável crescimento, nos últimos tempos, entre os juristas da chamada família “romano-germânica”,

o

interesse

pelos

ordenamentos anglo-saxônicos. O fenômeno, em si, merece irrestritos louvores, independentemente do fato de que suas razões, em boa parte, guardam evidentíssima relação com a conjuntura políticoeconômica de hoje. Como é natural, ele vem-se estendendo ao campo do processo, onde não raro se exterioriza em sugestões de reforma” (Notas sobre alguns aspectos do processo (civil e penal) nos países anglo-saxônicos in Temas de direito processual: sétima série. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 155). Portanto, deve o juiz analisar se as questões fáticas do litígio colocado para seu 268


julgamento são as mesmas da decisão que gerou o precedente, e, em caso negativo demonstrar a real distinção

entre

os

dois,

decidindo

pela

inaplicabilidade do precedente; se não for este o caso, mas se o tribunal estiver convencido sem qualquer dúvida razoável de que a decisão contida no precedente está superada, deve retirar-lhe a qualidade de precedente (JORGE AMAURI MAIA NUNES, Segurança jurídica e súmula vinculante. São Paulo: Saraiva, 2010, pág. 127). Para melhor aplicação dos precedentes e enunciados de súmula deve se voltar ao que foi dito anteriormente sobre a coisa julgada, para entender que os pronunciamentos e opiniões do juiz, contidos na motivação da decisão que gerou o precedente, não tem força vinculante. Apenas a parte dispositiva da decisão, que contém as questões decididas (art. 503 do CPC), é que terá a força vinculante. A

obrigatoriedade

fundamentação

na

decisão

da judicial

adequada para

a

aplicabilidade ou inaplicabilidade do precedente ou 269


enunciado de súmula, se justifica inclusive para assegurar o direito de recorrer do jurisdicionado, que deve conhecer as razões que levaram o julgador a embasar a sua decisão no precedente ou a afastar a sua aplicação. Diante do exposto, a jurisprudência tem exercido fundamental papel para a prestação jurisdicional dentro de um prazo razoável, com eficiência na aplicação da justiça, garantindo a certeza e a segurança na aplicação do direito. Na aplicação dos precedentes os julgadores devem analisar de modo fundamentado a existência ou não de

distinção

ou

superação,

bem

como

a

ratiodecidendi do precedente que tem a força persuasiva para os demais julgados que versem sobre idênticas questões. De modo algum a força persuasiva dos precedentes afasta a tarefa do magistrado de interpretar e aplicar o direito ao caso concreto, servindo apenas como um instrumento para a solução mais rápida de litígios repetidos, aliviando a carga judiciária sem afetar a eficiência da prestação jurisdicional. 270


O AGRAVO DE INSTRUMENTO NO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015 Na atualidade há uma exigência de brevidade do rito processual para que se possa alcançar a prestação jurisdicional efetiva, sem se descurar do devido processo legal que assegure as partes o equilíbrio na relação processual com o direito ao contraditório e a ampla defesa. Tal fato foi observado pelo poder constituinte ao inserir na Constituição Federal, por meio da EC nº 45/2004, o inciso LXXVIII ao artigo 5º, que garante a todos, no âmbito judicial e administrativo, a razoável duração do processo e os meios que garantam a 271


celeridade de sua tramitação. O Código de Processo Civil de 2015, no seu artigo 4º, dispõe que as partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito. Isto porque, a anormal duração do processo importa numa verdadeira denegação de justiça. As reformas processuais contemporâneas têm buscado a abreviação dos trâmites processuais para se chegar à decisão final no processo de conhecimento e a satisfação do crédito do credor no processo de execução. Dentre as maneiras de conseguir a almejada celeridade do processo está a redução do número de recursos ou a simplificação do seu procedimento. Para o processo de conhecimento tem especial importância a questão da recorribilidade das decisões interlocutórias. Os pronunciamentos do juiz consistem em sentenças ou acórdãos, decisões interlocutórias e despachos (art. 203 e 204 do CPC/2015). A sentença é o pronunciamento do juiz que põe termo a relação processual, julgando ou não o mérito da causa (art. 485 e 487 do 272


CPC/2015). As decisões interlocutórias são os pronunciamentos do juiz de cunho decisório que não se enquadrem no conceito de sentença (§ 2º do art. 203 do CPC/2015). Os despachos são todos os demais pronunciamentos do juiz praticados no processo, de ofício ou a requerimento das partes (§ 3º do art. 203 do CPC/2015), sem natureza decisória e que não são passíveis de recurso (art. 1.001 do CPC/2015). Portanto, o que diferencia os pronunciamentos do juiz é o conteúdo do ato praticado. HUMBERTO

THEODORO

JUNIOR

explica que “para qualificar-se como interlocutória, não importa a natureza da matéria enfrentada pela decisão. Tanto questões processuais como materiais podem exigir solução durante a evolução da marcha processual. Ao enfrentá-las, sem pôr fim ao processo, o juiz as solucionará sempre por meio de decisões interlocutórias. O ato de exclusão de um litisconsorte em favor do qual se reconhece a prescrição ou a decadência, por exemplo, é decisão de mérito, mas se o processo prossegue contra 273


outros litisconsortes, o juiz não terá proferido sentença e sim decisão interlocutória. Por outro lado, se a decisão declara extinto o processo por carência de ação ou falta de algum pressuposto processual, o caso será de sentença, pouco importando não tenha sido solucionado o mérito da causa”

(O

interlocutórias

problema no

da

recorribilidade

processo

civil

das

brasileiro.

Disponível em: www.abdpc.org.br, acesso em: 29/03/2016). Diferentemente do Código de Processo Civil de 1973, o Código de Processo Civil de 2015 estabelece que apenas as decisões interlocutórias enumeradas no artigo 1.015 são passíveis de impugnação por meio do agravo de instrumento, sendo

as

demais

decisões

interlocutórias

impugnáveis em preliminar no recurso de apelação ou nas contrarrazões ao recurso de apelação (art. 1.009, § 1º do CPC/2015). Portanto, a regra atual é a da recorribilidade das sentenças e das decisões interlocutórias enumeradas no Código ou em

274


legislação especial, não existindo mais a figura do agravo retido do artigo 522 do CPC/73. A sistemática da incidência limitada do agravo

de

instrumento

para

as

decisões

interlocutórias elencadas no Código e na legislação extravagante era a adotada no Código de Processo Civil de 1939, que no artigo 842 enumerava as decisões que se sujeitavam a impugnação via agravo

de

instrumento,

além

dos

casos

expressamente previstos em lei. Como muitas decisões interlocutórias não eram sujeitas ao agravo de instrumento e sim ao agravo nos autos do processo (art. 851 e 852 do CPC/39), as partes passaram a se utilizar de outros meios de impugnação como o mandado de segurança contra ato

judicial

para

tentar

reverter

a

decisão

interlocutória antes da sentença. Diante desta situação o Código de Processo Civil de 1973 passou a autorizar a interposição do agravo de instrumento para todas as decisões proferidas no curso do processo, ressalvando-se apenas as sentenças e os despachos (art. 522 do CPC/73). 275


Posteriormente

verificou-se

que

a

sistemática adotada pelo CPC/73 não cumpriu o seu objetivo de evitar o ajuizamento dos mandados de segurança, acarretando ainda um aumento na quantidade de agravos de instrumento em prejuízo da celeridade processual. Em razão deste quadro foram realizadas reformas no Código para dispor que as decisões interlocutórias deveriam ser impugnadas por agravo retido, nos autos do processo, admitindo-se o agravo de instrumento nos casos de decisão interlocutória suscetível de causar à parte lesão grave e de difícil reparação, bem como nos casos de inadmissão da apelação pelo juízo originário e nos efeitos em que a apelação foi recebida. O agravo de instrumento que era

o

recurso

cabível

contra

as

decisões

interlocutórias passou, com a lei nº 11.187/2005, a ser

admitido

apenas

quando

presentes

os

pressupostos de grave lesão de difícil reparação, contra a decisão judicial que não recebe o recurso de apelação e da decisão judicial que dispõe sobre os efeitos em que é recebida. A regra passou a ser o 276


agravo retido para as decisões interlocutórias, que era analisado preliminarmente no julgamento do recurso de apelação (art. 523 do CPC/73). Com o Código de Processo Civil de 2015 o agravo de instrumento fica restrito aos casos expressamente previstos no próprio Código ou na legislação extravagante, e que demandem a apreciação imediata pelo Tribunal da questão decidida, ficando as demais questões submetidas à análise pelo Tribunal quando do julgamento do recurso de apelação, como matéria preliminar ao mérito recursal. O rol taxativo de decisões interlocutórias que comportam o recurso de agravo de instrumento está elencado no artigo 1.015 do CPC/2015, que além das hipóteses expressamente previstas em lei, arrola as seguintes decisões: A) Decisão que defere, indefere, modifica ou revoga o pedido de tutela provisória (art. 1.015, inc. I), abrangendo as tutelas provisórias de urgência, cautelar e antecipada, e a tutela de evidência, bem como os provimentos liminares 277


previstos nos procedimentos especiais, como a liminar concedida ou denegada em mandado de segurança (art. 7º, § 1º da lei nº 12.016/2009), a medida liminar na ação civil pública (art. 12 da lei nº 7.347/85), a medida liminar proferida nas ações possessórias (art. 562 e 567 do CPC/2015), a decisão de manutenção ou reintegração provisória de posse proferida nos embargos de terceiro (art. 678 do CPC/2015), a tutela provisória nas ações sucessórias (art. 668 do CPC/2015) e nas ações de família (art. 695 do CPC/2015). Justifica-se a interposição do agravo de instrumento nestes casos em razão do caráter urgente da providência liminar requerida de forma cautelar ou antecipada, do risco ao resultado efetivo do processo e da existência dos pressupostos do artigo 311 do CPC. Para se assegurar a efetividade das tutelas provisórias é necessário que as questões a elas pertinentes sejam decididas no transcurso do processo, devendo comportar recurso de forma imediata ao Tribunal para análise da matéria.

278


B) Decisão sobre o mérito do processo (art. 1.015, inc. II do CPC/2015), como a que se refere o artigo 487, inciso II e III, do Código, quando disser respeito a apenas parcela do processo (art. 354, parágrafo único do CPC/2015), e a que contem julgamento parcial de mérito do processo quando um ou mais pedidos formulados ou parcela deles se mostrarem incontroversos e estiver em condições de julgamento antecipado (art. 355 e art. 356, § 5º do CPC/2015). Justifica-se a interposição do agravo de instrumento em razão de apenas parte do processo ter sido resolvida no seu mérito, com possibilidade de liquidação e execução, desde logo, da obrigação reconhecida na decisão que julgar parcialmente o mérito, independentemente de caução, ainda que haja recurso interposto. C) Decisão que rejeita a alegação de convenção de arbitragem (art. 1.015, inc. III do CPC/2015), formulada como matéria preliminar na contestação (art. 337, inc. X do CPC/2015) e que se reconhecida a competência do juízo arbitral causa a extinção processo sem resolução do mérito (art. 279


485, inc. VII do CPC/2015). Como forma de solução consensual de conflitos admitida pelo ordenamento jurídico brasileiro (art. 3º, § 1º do CPC/2015 e lei nº 9.307/96), as partes de forma consensual submetem a resolução dos seus litígios ao juízo arbitral, mediante cláusula compromissória ou compromisso arbitral. Justifica-se a interposição do agravo de instrumento para se analisar de imediato a competência do juízo arbitral para solucionar o litígio, de modo a respeitar e estimular a arbitragem, devendo a alegação preliminar de convenção de arbitragem ser decidida no início do processo, com o intuito de se evitar que sejam praticados

atos

processuais

inúteis

com

o

reconhecimento da competência do juízo arbitral apenas quando da prolação da sentença. D) A decisão que resolve o incidente de desconsideração da personalidade jurídica (art. 1.015, inc. IV), tratado nos artigos 133 a 137 do Código de Processo Civil dentro do título III, do livro III, da parte geral, que dispõe sobre as modalidades de intervenção de terceiros. Conforme 280


dispõe o artigo 136 do CPC/2015 a decisão que resolve o incidente é interlocutória, sujeitando-se a impugnação por agravo de instrumento. A admissão ou não do sócio ou da pessoa jurídica para integrar o processo exige pronta análise a semelhança do que ocorre com a exclusão de litisconsorte e com a admissão ou não de intervenção de terceiros (art. 1.015, inc. VII e IX do CPC/2015). Justifica-se a interposição do agravo de instrumento nestes casos em razão do incidente de desconsideração da personalidade jurídica ter como objetivo tornar parte no processo o sócio ou a pessoa jurídica, evitando decisões contraditórias e a multiplicação de processos, resolvendo num mesmo processo as diversas relações jurídicas relacionadas com a pessoa jurídica. E) Decisão que rejeita o pedido de gratuidade de justiça ou o acolhimento do pedido de sua revogação (art. 1.015, inc. V do CPC/2015), isto porque a gratuidade é uma das formas de se propiciar o acesso à justiça e de assegurar a paridade entre as partes no processo, sendo que o 281


juiz somente pode indeferir o pedido de gratuidade se houver nos autos do processo elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a sua concessão (art. 99, § 2º do CPC/2015), e no caso de revogação do benefício a parte deverá arcar com as despesas que tiver deixado de adiantar (art. 100, parágrafo único do CPC/2015). O artigo 101 do Código de Processo Civil de 2015 dispõe que contra a decisão que indeferir a gratuidade de justiça ou acolher o pedido de sua revogação cabe agravo de instrumento. Justifica-se a interposição do agravo de instrumento para possibilitar a resolução no curso do processo acerca da procedência ou improcedência do pedido de gratuidade de justiça formulado pela parte, decidindo se esta deve ou não arcar com as despesas arroladas no § 1º do artigo 98 do Código. F) Decisão que resolve o incidente de exibição ou posse de documento ou coisa (art. 1.015, inc. VI do CPC/2015), tratado nos artigos 396 a 404 do Código. O fundamento do incidente é a necessidade de instruir a demanda com elementos 282


de convicção que justificariam a figura da exibição (LUIZ

GUILHERME

MARINONI,

SÉRGIO

CRUZ ARENHAT. Curso de Processo Civil, volume 2: processo de conhecimento. 6ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007, pág. 328). Nestas hipóteses a justificativa para o agravo de instrumento é a necessidade de apresentação dos elementos de prova para que o juiz possa formar o seu convencimento. G) Decisão de exclusão de litisconsorte (art. 1.015, inc. VII do CPC/2015). Quando ocorre a redução ou a extinção do litisconsórcio há a alteração da quantidade de sujeitos em um dos pólos do processo, não sendo causa de extinção do processo que continua com os demais litisconsortes (redução) ou com apenas um sujeito processual (extinção). A exclusão de litisconsorte ocorre quando ausentes os requisitos elencados no artigo 113 do Código de Processo Civil de 2015, ou quando a parte não tiver legitimidade para a causa. Justifica-se o agravo de instrumento nestas hipóteses

em

razão

da

necessidade

de 283


aperfeiçoamento da relação processual que se completa com a integração das partes no processo, por meio do ato da citação. H) Decisão que rejeita pedido de limitação do litisconsórcio (art. 1.015, inc. VIII), formulado nos termos do § 1º do artigo 113 do Código de Processo Civil de 2015, que faculta ao juiz limitar o litisconsórcio facultativo, mediante requerimento, quanto ao número de litigantes na fase de conhecimento, na liquidação de sentença ou na execução, quando este comprometer a rápida solução do litígio ou dificultar a defesa ou o cumprimento

da

sentença.

Facultativo

é

o

litisconsórcio que embora admissível por razões de economia processual não é indispensável para o julgamento do mérito do processo, ao contrário do litisconsórcio necessário por disposição de lei ou quando,

pela

natureza

da

relação

jurídica

controvertida, a eficácia da sentença depender da citação de todos que devam ser litisconsortes (art. 113, § 2º do CPC/2015).

284


I)

Decisão

que

admite

ou

não

a

intervenção de terceiros (art. 1.015, inc. IX do CPC/2015), nas modalidades elencadas nos artigos 119 a 137 do Código. Por meio da intervenção o terceiro torna-se parte ou coadjuvante no processo pendente, alterando a relação processual com o aumento de sujeitos em um dos pólos do processo, a ampliação subjetiva da lide. O artigo 138 do Código ao disciplinar a figura do amicus curiae, dispõe que a decisão que admite ou não a sua participação no processo é irrecorrível. Justifica-se a interposição do agravo de instrumento nestes casos em razão da necessidade de aperfeiçoamento da relação processual com a admissão ou não de terceiros no processo. J) Decisão que concede, modifica ou revoga o efeito suspensivo dos embargos à execução (art. 1.015, inc. X do CPC/2015). Segundo o artigo 914 do Código o executado poderá opor-se à ação de execução por meio de embargos à execução, independentemente de penhora, depósito ou caução. Os embargos à 285


execução não tem efeito suspensivo, podendo o embargante requerer ao juiz que seja atribuído efeito suspensivo aos embargos quando verificados os requisitos para a concessão da tutela provisória e desde que a execução já esteja garantida por penhora, depósito ou caução suficiente (art. 919 do CPC/2015). Nestes casos a justificativa para a interposição imediata do agravo de instrumento é semelhante a da decisão sobre tutela provisória do inciso I do artigo 1.015 do Código. L) Decisão que redistribui o ônus da prova (art. 1.105, inc. XI do CPC/2015), conforme autorização contida no § 1º do artigo 373 do Código que dispõe que nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos do caput do artigo 373 ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário, poderá o juiz atribuir o ônus da prova de modo diverso, desde que o faça por decisão fundamentada, caso em que deverá dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus que 286


lhe foi atribuído. A regra geral de distribuição do ônus da prova é a de que incumbe ao autor a prova quanto ao fato constitutivo do seu direito, e ao réu a prova quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor (art. 373, inc. I e II do CPC/2015). Justifica-se o agravo de

instrumento

nestes

casos

em

razão

da

distribuição diversa do ônus da prova acarretar para a parte o risco de um resultado desfavorável, tanto que o § 2º do artigo 373 do Código veda a redistribuição do ônus da prova quando gere um encargo impossível ou excessivamente difícil de ser cumprido pela parte. M) Outros casos previstos em lei (art. 1.015, inc. XIII do CPC/2015), como a previsão expressa no § 1º do artigo 19 da lei nº 4.717/65, que trata da ação popular, a previsão no § 3º do artigo 15 da lei nº 12.016/2009, que trata do mandado de segurança, o agravo do artigo 100 da lei n 11.101/2005, que trata da recuperação judicial, extrajudicial e da falência e outros que contenham previsão expressa acerca do cabimento do agravo. 287


N) Decisões interlocutórias proferidas na fase de liquidação de sentença (art. 509 a 512 do CPC/2015) ou no cumprimento de sentença (art. 513 a 538 do CPC/2015), no processo de execução (art. 771 a 925 do CPC/2015) e no processo de inventário (art. 610 a 673 do CPC/2015), conforme determina o parágrafo único do artigo 1.015 do Código. A justificativa para a recorribilidade ampla das decisões interlocutórias nos autos dos processos de liquidação, cumprimento de sentença, execução e inventário, é a de que a fase de conhecimento já foi superada em razão da prolação da sentença, ou ela inexiste, como no processo de execução que se desenvolve para a satisfação do direito do credor. Portanto, não há razão para a restrição do agravo de instrumento em decorrência da celeridade na prestação jurisdicional, bem como as decisões interlocutórias

nos

processos

mencionados

poderiam causar prejuízos graves de difícil reparação caso não fossem de recorribilidade imediata.

288


Como explica EDUARDO TALAMINI “havendo situação geradora do risco de graves danos derivada de decisão interlocutória para a qual a lei não preveja o cabimento do agravo de instrumento, poderá a parte ajuizar mandado de segurança.

Ainda

absolutamente

que

esses

excepcionais,

o

casos

sejam

emprego

do

mandado de segurança nada de tem de “anômalo”. Não tem como ser negado, dada a natureza constitucional

dessa

garantia.

A

simples

consideração da norma constitucional consagradora do mandado de segurança já daria respaldo para essa conclusão (CF, art. 5.º, LXIX). Mas não bastasse isso, a regulamentação infraconstitucional dessa garantia (que jamais poderia reduzi-la), confirma tal orientação. Nos termos do art. 5º, II, da Lei 12.016/09, apenas não cabe o mandado de segurança contra ato judicial quando esse for passível de recurso dotado de efeito suspensivo. Nessa hipótese, o emprego do recurso é algo mais simples e eficaz – e implica a falta de interesse processual para o mandado de segurança. Nos 289


casos em exame, a interlocutória é irrecorrível. Nem cabe dizer que ela é “recorrível”, mas de modo

postergado.

Quando

se

fala

em

“irrecorribilidade” ou “recorribilidade” de uma decisão

interlocutória,

tem-se

em

vista

a

(im)possibilidade de recurso imediato (esse é o sentido do clássico “princípio da irrecorribilidade das interlocutórias”, extraído do “princípio da oralidade” em sua plenitude). Poder “recorrer” de uma decisão dali a alguns meses ou anos, por óbvio, não é a mesma coisa que poder recorrer imediatamente dela. E pior, não permitirá obter-se a pronta suspensão dos efeitos dessa decisão. Em suma, não fica afastado, por falta de interesse processual, o mandado de segurança” (Agravo de instrumento: hipóteses de cabimento no CPC/15. Disponível em: www.migalhas.com.br, acesso em: 30/03/2015). Como o Código de Processo Civil de 2015 dispõe que a remessa do recuso de apelação independe de juízo de admissibilidade pelo juiz que proferiu a sentença, não há que se cogitar de agravo 290


de instrumento de decisão que denega o recurso de apelação,

pois

após

a

apresentação

das

contrarrazões ou o decurso do prazo para sua apresentação, os autos serão remetidos ao Tribunal pelo juiz (art. 1.010, § 3º). A apelação tem efeito suspensivo, podendo produzir efeitos imediatos a sentença que homologa divisão ou demarcação de terras, condena a pagar alimentos, extingue sem resolução do mérito ou julga improcedentes os embargos do executado, julga procedente o pedido de instituição de arbitragem, confirma, concede ou revoga tutela provisória, decreta a interdição, e nos demais casos previstos em lei (art. 1.012, § 1º do CPC/2015). O pedido de efeito suspensivo é formulado diretamente ao Tribunal (§ 3º e 4º do art. 1.012 do CPC/2015), motivo pelo qual não há que se falar em agravo de instrumento no tocante aos efeitos em que a apelação é recebida como ocorria no artigo 522 do CPC/73. Do mesmo modo, não é mais cabível o agravo de instrumento das decisões que não admitem o recurso extraordinário e o recurso 291


especial, como dispunha o artigo 544 do CPC/73, pois o Código de Processo Civil de 2015 criou um novo recurso para tal finalidade que é o agravo do artigo 1.042, distinto do agravo de instrumento, pois como pode se observar pela leitura do artigo 994 do Código os recursos aparecem em incisos diferentes, o agravo de instrumento no inciso II do artigo 994, e o agravo em recurso especial e extraordinário no inciso VIII do artigo 994. Tendo em conta os princípios da taxatividade e da unirrecorribilidade, a lei é que disciplina quais recursos são cabíveis para determinado ato judicial. O agravo de instrumento e o agravo em recurso especial e extraordinário são disciplinados em artigos específicos que arrolam as decisões que podem ser objeto dos referidos recursos. Verificado o cabimento do agravo de instrumento contra alguma das decisões elencadas nos incisos do artigo 1.015 do Código de Processo Civil de 2015, a parte tem o prazo de 15 (quinze) dias, contados da intimação da decisão, para interpor o recurso (art. 1.003 do CPC/2015). O 292


agravo de instrumento é dirigido diretamente para o Tribunal competente, por meio de petição que deve conter o nome das partes, a exposição do fato e do direito, as razões do pedido de reforma ou de invalidação da decisão e o próprio pedido, o nome e o endereço completo dos advogados constantes do processo (art. 1.016 do CPC/2015). Os requisitos da petição do agravo de instrumento elencados no artigo 1.016 do CPC/2015 são semelhantes aos do artigo 524 do CPC/73, devendo conter o nome ou a qualificação das partes, o endereço dos advogados para que possam receber os atos de comunicação processual visto que o recurso é dirigido diretamente para o Tribunal, a exposição da lide envolvida no processo cuja decisão se recorre, as razões recursais para a reforma da decisão interlocutória e o pedido de reforma da decisão. A petição de agravo de instrumento deve ser instruída com: a) cópias da petição inicial, da contestação, da petição que ensejou a decisão agravada, da própria decisão agravada, da certidão 293


da respectiva intimação ou outro documento oficial que comprove a tempestividade e das procurações outorgadas aos advogados do agravante e do agravado (obrigatoriamente); b) declaração de inexistência de qualquer dos documentos referidos no item anterior, feita pelo advogado do agravante, sob pena de sua responsabilidade pessoal; c) facultativamente, com outras peças que o agravante reputar úteis. A petição deve conter o comprovante do pagamento das respectivas custas e do porte de retorno,

quando

devidos,

conforme

tabela

publicada pelos tribunais. O agravo será interposto por: a) protocolo realizado diretamente no tribunal competente para julgá-lo; b) protocolo realizado na própria comarca, seção ou subseção judiciárias; d) postagem, sob registro, com aviso de recebimento; e) transmissão de dados tipo fac-símile, nos termos da lei; f) outra forma prevista em lei (art. 1.017 do CPC/2015). Na falta da cópia de qualquer peça ou no caso de algum outro vício que comprometa a admissibilidade do agravo de instrumento, deve o 294


relator aplicar o disposto no art. 932, parágrafo único, ou seja, antes de considerar inadmissível o recurso, o relator concederá o prazo de 5 (cinco) dias ao agravante para que seja sanado vício ou complementada a documentação exigível. Se o recurso for interposto por sistema de transmissão de dados tipo fac-símile ou similar, as peças devem ser juntadas no momento de protocolo da petição original. Sendo eletrônicos os autos do processo, dispensam-se as peças referidas nos incisos I e II do caput do artigo 1.017 do CPC/2015, facultandose ao agravante anexar outros documentos que entender úteis para a compreensão da controvérsia. No tocante a obrigatoriedade da juntada da certidão de intimação ou outro documento oficial que comprove a tempestividade do agravo de instrumento, deve-se destacar o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no Recurso Especial nº 1383500/SP (repetitivo), determinando que “a prerrogativa que possui a Fazenda Nacional de ser intimada das decisões, por meio da concessão de vista pessoal e, em atenção ao princípio da 295


instrumentalidade das formas, pode a certidão de concessão de vistas dos autos ser considerada elemento

suficiente

tempestividade

do

à agravo

demonstração de

da

instrumento,

substituindo a certidão de intimação legalmente prevista”

(Corte

Especial,

Min.

BENEDITO

GONÇALVES, DJe 26/02/2016). Do mesmo modo, no Recurso Especial nº 1409357/SC (repetitivo), ficou decidido que a tempestividade do agravo de instrumento pode ser comprovada com a cópia da publicação efetivada no próprio Diário da Justiça Eletrônico (Segunda Seção, Min. SIDNEI BENETI, DJe 22/05/2014). O agravante poderá requerer a juntada, aos autos do processo, de cópia da petição do agravo de instrumento, do comprovante de sua interposição e da relação dos documentos que instruíram o recurso, para que o juiz fique ciente de que sua decisão foi impugnada podendo efetuar o juízo de retratação (art. 1.018 do CPC/2015). Se o juiz reformar inteiramente a decisão e comunicar ao Tribunal que a reformou, o relator considerará 296


prejudicado o agravo de instrumento. Não sendo eletrônicos os autos, o agravante tomará a providência prevista no caput do artigo 1.018 do Código de Processo Civil de 2015, no prazo de 3 (três) dias, a contar da interposição do agravo de instrumento. O descumprimento desta exigência, desde que alegado e provado pelo agravado, importa em inadmissibilidade do agravo de instrumento. Portanto, a juntada aos autos do processo da cópia da petição do agravo de instrumento, do comprovante de sua interposição e da relação dos documentos

que instruíram o recurso, pelo

agravante é um requisito de admissibilidade do próprio agravo de instrumento. Recebido o agravo de instrumento no tribunal e distribuído imediatamente, o relator poderá não conhecer de recurso inadmissível, prejudicado

ou

especificamente

que os

não

tenha

fundamentos

impugnado da

decisão

recorrida (art. 932, inc. III do CPC/2015), bem como negar provimento a recurso que for contrário 297


a: a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal; b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos; c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência (art. 932, inc. IV do CPC/2015). Não incidindo nas hipóteses anteriores o relator, no prazo de 5 (cinco) dias, poderá atribuir efeito suspensivo ao agravo ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, comunicando ao juiz sua decisão; ordenar a intimação do agravado pessoalmente, por carta com aviso de recebimento, quando não tiver procurador constituído, ou pelo Diário da Justiça ou por carta com aviso de recebimento dirigida ao seu advogado, para que responda no prazo de 15 (quinze) dias, facultandolhe juntar a documentação que entender necessária ao julgamento do recurso, e determinar a intimação do Ministério Público, preferencialmente por meio eletrônico, quando for o caso de sua intervenção, 298


para que se manifeste no prazo de 15 (quinze) dias. Diferentemente do artigo 524, inciso II, do CPC/73, que

autorizava a conversão

do agravo de

instrumento em retido, o Código atual não prevê a figura do agravo nos autos ou agravo retido, motivo pelo qual o agravo de instrumento deve ser analisado pelo Tribunal com ou sem julgamento do mérito recursal. Quanto ao efeito suspensivo do agravo de instrumento, deve-se destacar que em regra os recursos não impedem a eficácia da decisão, salvo disposição legal ou decisão judicial em sentido diverso, que poderá suspender a decisão recorrida por decisão do relator, se da imediata produção de seus efeitos houver risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, e ficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso (art. 995 do CPC/2015). Das decisões monocráticas proferidas pelo relator no agravo de instrumento caberá agravo interno

para

o

respectivo

órgão

colegiado,

observadas, quanto ao processamento, as regras do 299


regimento interno do respectivo tribunal. Na petição de agravo interno, o recorrente impugnará especificadamente os fundamentos da decisão agravada. O agravo interno será dirigido ao relator, que intimará o agravado para manifestar-se sobre o recurso no prazo de 15 (quinze) dias, ao final do qual, não havendo retratação, o relator levá-lo-á a julgamento pelo órgão colegiado, com inclusão em pauta. É vedado ao relator limitar-se à reprodução dos fundamentos da decisão agravada para julgar improcedente o agravo interno. Quando o agravo interno for declarado manifestamente inadmissível ou improcedente em votação unânime, o órgão colegiado, em decisão fundamentada, condenará o agravante a pagar ao agravado multa fixada entre um e cinco por cento do valor atualizado da causa. A interposição de qualquer outro recurso fica condicionada ao depósito prévio do valor da multa, com exceção da Fazenda Pública e do beneficiário de gratuidade da justiça, que farão o pagamento ao final (art. 1.021 do CPC/2015).

300


Embora o artigo 1.019 do Código não faça referência ao inciso V, do artigo 932, também do CPC, pode o relator, depois de oferecida a defesa pelo agravado, dar provimento ao agravo de instrumento se a decisão recorrida for contrária a súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal; a acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos; e a entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência. O relator solicitará dia para julgamento em prazo não superior a 1 (um) mês da intimação do agravado (art. 1.020 do CPC/2015). O agravo de instrumento será julgado antes da apelação interposta no mesmo processo, se ambos os recursos tiverem que ser julgados na mesma sessão, terá precedência o agravo de instrumento (art. 946 do CPC/2015). Na sessão de julgamento, depois da exposição da matéria pelo relator, o presidente dará 301


a palavra, sucessivamente, ao recorrente, ao recorrido e, nos casos de sua intervenção, ao membro

do

Ministério

Público,

pelo

prazo

improrrogável de 15 (quinze) minutos para cada um, a fim de sustentarem suas razões, no agravo de instrumento

interposto

contra

decisões

interlocutórias que versem sobre tutelas provisórias de urgência ou de evidência (art. 937, inc. VII do CPC/2015). É aplicável ao recurso de agravo de instrumento a norma do inciso V do artigo 80 do Código que considera litigante de má-fé aquele que interpõe recurso com intuito manifestamente protelatório. São aqueles recursos interpostos sem nenhum embasamento legal, com fim único de protelar a marcha do processo. É importante ressaltar que o recurso deve ser manifestamente infundado para que se possa aplicar a pena pecuniária de litigância de má-fé. Ainda que as chances do recorrente sejam mínimas o fato de interpor

recurso

da

decisão

que

lhe

foi

desfavorável, por si só não configura a litigância de 302


má-fé (STJ, REsp 600.713-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 13/9/2005 – Informativo STJ nº 0260, período de 12 a 16 de setembro de 2005). A sistemática do agravo de instrumento no Código de Processo Civil de 2015 obedece a necessidade de simplificar o rito do recurso para que se possa chegar a uma decisão final num decurso de tempo razoável, sem se descurar do devido processo legal, concentrando a discussão das questões decididas no curso do processo no momento do recurso de apelação. DA AÇÃO DE REGULAÇÃO DE AVARIA GROSSA O Código de Processo Civil de 2015, nos artigos 707 a 711, do Capítulo XIII, do Título III, que trata dos procedimentos especiais, regula o procedimento da ação de regulação de avaria grossa, que embora não prevista no Código de Processo Civil de 1973 era disciplinada nos artigos 765 a 768 do Código de Processo Civil de 1939 e 303


continuava sendo aplicada por expressa previsão contida no artigo 1.218, inciso XIV, do CPC/73, até a entrada em vigor do Código atual (CPC/2015). Justifica-se a manutenção do referido procedimento especial em razão da importância que tem o comércio marítimo para a economia brasileira, pois como bem ressalta CARLOS EDUARDO BULHÕES PEDREIRA “o comércio marítimo entre os povos, desenvolvido através dos séculos, e a navegação marítima e interior não poderiam deixar de ser regulados por leis devido aos aspectos econômicos, sociais e jurídicos que lhes são concernentes. Essa regulação tornou-se mais relevante em razão da globalização das economias nacionais, cujas trocas (importação e exportação)

de

mercadorias

são

efetuadas

principalmente através de navios de bandeiras nacionais e estrangeiras. O comércio internacional e a navegação marítima e interior no mar territorial e vias navegáveis (como os rios) de uma nação envolvem aspectos que não podem ficar sem normatização, tais como: espécies de navegação; 304


registro de propriedade e gravame de navios; direito e deveres da tripulação; contratos de transporte

e

fretamento;

acidentes

com

responsabilidade

seguros

embarcação civil

e

penal;

em

e

geral;

salvados; e

serviços

portuários” (Comércio marítimo e navegação. Disponível em: www.iabnacional.org.br, acesso em: 04/04/2016). Dispõe o artigo 707 do Código de Processo Civil de 2015 que quando inexistir consenso acerca da nomeação de um regulador de avarias, o juiz de direito da comarca do primeiro porto onde o navio houver chegado, provocado por qualquer parte interessada, nomeará um de notório conhecimento. Inicialmente deve-se compreender o conceito de avaria, que está disciplinado nos artigos 761 a 771, na parte segunda do Código Comercial (lei nº 556/50), não revogado pelo Código Civil de 2002, que dispõe sobre as normas do comércio marítimo. São consideradas avarias todas as despesas extraordinárias feitas a bem do navio ou da carga, 305


conjunta ou separadamente, e todos os danos acontecidos àquele ou a esta, desde o embarque e partida até a sua volta e desembarque (art. 761 do Código Comercial). As avarias são classificadas em duas espécies: avarias grossas ou comuns, e avarias simples

ou

particulares. A importância

das

primeiras é repartida proporcionalmente entre o navio, seu frete e a carga; e a das segundas é suportada, ou só pelo navio, ou só pela coisa que sofreu o dano ou deu causa à despesa (art. 763 do CCom). Não havendo convenção especial entre as partes,

exarada

na

carta

partida

ou

no

conhecimento, as avarias hão de qualificar-se, e regular-se pelas disposições do Código Comercial (art. 762 do CCom). Deste modo, a legislação aplicável as avarias grossas é a indicada na cláusula de avaria grossa estipulada na carta partida ou no conhecimento, que pode ser norma internacional, e no caso de omissão são aplicáveis as normas do Código Comercial. Antes de falar sobre as espécies de avarias, mencionaremos

o

conceito

do

contrato

de 306


fretamento marítimo, trazido pelo artigo 566 do Código Comercial: Art. 566 - O contrato de fretamento de qualquer embarcação, quer seja na sua totalidade ou em parte, para uma ou mais viagens, quer seja à carga, colheita ou prancha. O que tem lugar quando o capitão recebe carga de quanto se apresentam, deve provar-se por escrito. No primeiro caso o instrumento, que se chama carta-partida ou carta de fretamento, deve ser assinado pelo fretador e afretador, e por quaisquer outras pessoas que intervenham no contrato, do qual se dará a cada uma das partes um exemplar; e no segundo, o instrumento chama-se conhecimento, e basta ser assinado pelo capitão e o carregador. Entende-se por fretador o que dá, e por afretador o que toma a embarcação a frete.

O artigo 2º da lei nº 9.432/97, traz algumas definições que merecem ser transcritas para o bom entendimento do assunto: Art. 2º Para os efeitos desta Lei, são estabelecidas as seguintes definições: I - afretamento a casco nu: contrato em virtude do qual o afretador tem a posse, o uso e o controle da embarcação, por tempo determinado, incluindo o direito de designar o comandante e a tripulação;

307


II - afretamento por tempo: contrato em virtude do qual o afretador recebe a embarcação armada e tripulada, ou parte dela, para operá-la por tempo determinado; III - afretamento por viagem: contrato em virtude do qual o fretador se obriga a colocar o todo ou parte de uma embarcação, com tripulação, à disposição do afretador para efetuar transporte em uma ou mais viagens; IV - armador brasileiro: pessoa física residente e domiciliada no Brasil que, em seu nome ou sob sua responsabilidade, apresta a embarcação para sua exploração comercial; V - empresa brasileira de navegação: pessoa jurídica constituída segundo as leis brasileiras, com sede no País, que tenha por objeto o transporte aquaviário, autorizada a operar pelo órgão competente;

O contrato de frete ou transporte marítimo é um acordo escrito mediante o qual o armador se compromete a transportar mercadorias por água, recebendo em troca uma quantia em dinheiro denominada frete, que é o preço do serviço prestado pelo armador no transporte da mercadoria de um porto de origem a um porto de destino, recebendo a carga no cais ao costado do navio,

308


providenciando a estivagem da mesma no navio e entregando a carga, ao costado do navio no porto de destino. Em todo contrato de transporte marítimo, o proprietário do navio ou transportador, que é o fretador, cede a praça do navio no todo ou em parte mediante o pagamento do aluguel ou frete, à pessoa que vai utilizá-lo. Se o contrato se refere ao fretamento de todo um navio, o documento se denomina carta-partida ou carta de fretamento; se o fretamento é parcial, para lotes determinados de mercadorias, o instrumento de contrato denomina-se conhecimento de embarque (MIGUEL JORGE ELIAS ZOGAHIB. Comércio marítimo. Apostila elaborada para a Fundação de Estudos do Mar – FEMAR – para servir de livro texto do Curso Comércio Marítimo. Rio de Janeiro: FEMAR, 2007). Pode ser proprietário de embarcação todo cidadão

brasileiro,

devendo

figurar

como

proprietário ostensivo ou armador aquele que tenha capacidade para ser empresário (art. 460 e 484 do CCom). O capitão é o comandante da embarcação 309


(art. 497 do CCom). A responsabilidade do navio ou embarcação transportadora começa com o recebimento da mercadoria a bordo, e cessa com a sua entrega à entidade portuária, no porto de destino, ao costado do navio. Considera-se como de efetiva entrega a bordo, as mercadorias operadas com os aparelhos da embarcação, desde o início da operação, ao costado do navio. As mercadorias a serem descarregadas do navio por aparelhos da entidade portuária ou trapiche municipal ou sob sua conta, consideram-se efetivamente entregues a essa última, desde o início da lingada do içamento, dentro da embarcação (art. 3º do DL nº 116/67). As mercadorias

serão

entregues

ao

navio

ou

embarcação transportadora, contra recibo passado pelo armador ou seu preposto (art. 4º, caput, do DL nº 116/67). O artigo 8º do DL nº 116/67 dispõe que prescrevem ao fim de um ano, contado da data do término da descarga do navio transportador, as ações por extravio de carga, bem como as ações por falta de conteúdo, diminuição, perdas e avarias ou 310


danos à carga. O prazo prescricional de um ano somente poderá ser interrompido mediante protesto judicial (art. 796, § 2º) e pelo despacho do juiz que ordena a citação (art. 240, § 1º do CPC/2015 e art. 202, inc. I do Código Civil). A carta partida deve conter (art. 567 do CCom): 1 - o nome do capitão e o do navio, o porte deste, a nação a que pertence, e o porto do seu registro (art. 460 do CCom); 2 - o nome do fretador e o do afretador, e seus respectivos domicílios; se o fretamento for por conta de terceiro deverá também declarar-se o seu nome e domicílio; 3 - a designação da viagem, se é redonda ou ao mês, para uma ou mais viagens, e se estas são de ida e volta ou somente para ida ou volta, e finalmente se a embarcação se freta no todo ou em parte; 4 - o gênero e quantidade da carga que o navio deve receber, designada por toneladas, nºs, peso ou volume, e por conta de quem a mesma será conduzida para bordo, e deste para terra; 5 - o tempo da carga e descarga, portos de escala quando a haja, as estadias e sobre estadias ou demoras, e a 311


forma por que estas se hão de vencer e contar; 6 - o preço do frete, quanto há de pagar-se de primagem ou gratificação, e de estadias e sobre estadias, e a forma, tempo e lugar do pagamento; 7 - se há lugares reservados no navio, além dos necessários para uso e acomodação do pessoal e material do serviço da embarcação; 8 - todas as mais estipulações em que as partes se acordarem. O conhecimento deve ser datado, e declarar (art. 575 do CCom): 1 - o nome do capitão, e o do carregador e consignatário (podendo omitir-se o nome deste se for à ordem), e o nome e porte do navio; 2 - a qualidade e a quantidade dos objetos da carga, suas marcas e números, anotados à margem; 3 - o lugar da partida e o do destino, com declaração das escalas, havendo-as; 4 - o preço do frete e primagem, se esta for estipulada, e o lugar e forma do pagamento; 5 - a assinatura do capitão (art. 577 do CCom), e a do carregador. O artigo 764 do Código Comercial elenca 21 hipóteses de avarias grossas, dispondo que em geral, são os danos causados deliberadamente em 312


caso de perigo ou desastre imprevisto, e sofridos como conseqüência imediata destes eventos, bem como as despesas feitas em iguais circunstâncias, depois de deliberações motivadas (art. 509 do CCom), em bem e salvamento comum do navio e mercadorias, desde a sua carga e partida até o seu retorno e descarga. O artigo 765 do Código Comercial, por sua vez, dispõe que não serão consideradas como avarias grossas, posto que feitas voluntariamente e por deliberações motivadas para o bem do navio e da carga, as despesas causadas por vício interno do navio, ou por falta ou negligência do capitão ou da gente da tripulação. Todas estas despesas são a cargo do capitão ou do navio (art. 565 do CCom). O artigo 766 do Código Comercial elenca 5 hipótese de avarias simples e particulares, dispondo que em geral são as despesas realizadas e o dano sofrido só pelo navio, ou só pela carga, durante o tempo dos riscos. Diferentemente das avarias grossas, originárias da vontade humana visando à salvaguarda de interesses maiores e em 313


defesa do bem comum, nas avarias simples a vontade humana não intervém para resguardar o navio ou a carga, recaindo sobre a coisa que a sofre e só afeta ao dono da coisa avariada. Decorre de casos fortuitos ou de força maior, imprudência, negligência ou imperícia, dolo do comandante, equipagem ou empregados do armador, ou de terceiros. São distintas das avarias grossas, porque, enquanto estas ocorrem durante a navegação, as grossas podem ocorrer mesmo estando o navio parado, durante o embarque e desembarque e até mesmo em terra (DANIEL GOMES. Acidentes e fatos da navegação marítima. O ciclo Circadiano. Disponível em: www.abdir.com.br, acesso em: 04/04/2016). Portanto, avaria é o gênero do qual são espécies as avarias grossas ou comuns e as avarias simples ou particulares. Na avaria grossa as despesas apuradas, oriundas do estrago/dano, são repartidas

proporcionalmente

entre

o

transportador/consignatários que tiveram carga a bordo; na avaria simples, as despesas oriundas do 314


estrago/dano, são suportadas apenas por quem sofreu ou dano, ou seja, ou somente o transportador ou somente o consignatário. Como explica ALEXANDRO ALVES FERREIRA, na ocorrência de um fortuito, que remeta danos e perdas, os armadores acionam os peritos reguladores, para apurar os fatos, e de acordo com suas análises, declarar ou não avaria grossa.

Tais

profissionais

peritos/árbitros formados

por

reguladores

são

cooperativas

de

armadores internacionais. Em caracterizando a avaria grossa, estes reguladores fazem o cálculo do dano, incluindo todas as despesas para reintegração plena do dano apurado, com o objetivo de ratear tais valores entre os consignatários embarcados. Declarada

avaria

grossa

os

reguladores

demonstram para os armadores os valores a serem rateados. Os armadores por sua vez, comunicam os consignatários e enviam a estes os documentos (BOND e AVERAGE GUARANTEE), bem como as devidas instruções para cargas seguradas e cargas não seguradas. Os consignatários devem 315


apresentar tais documentos preenchidos por eles e por sua seguradora, nos casos de cargas seguradas. Nestes casos é a seguradora que irá responder pela parcela de contribuição da avaria grossa. Para os consignatários que não possuam cobertura de seguro, além da documentação solicitada pelo armador,

devem

apresentar

depósito-garantia

relativa a parcela contributiva referente a avaria grossa

(Avaria

grossa.

Disponível

em:

www.asgroup.net/assets/pdf/avaria-grossa.pdf. Acesso em: 02/04/2016). Se o armador não promover a regulação da avaria, como dito no parágrafo anterior, ou se não houver consenso acerca da nomeação de um regulador, qualquer parte interessada poderá fazê-lo mediante o ajuizamento da ação de regulação de avaria grossa, tendo legitimidade ativa (RE nº 57591/SP, Min. AMARAL SANTOS, Primeira Turma, DJ 09/05/1969). Recebida a ação o juiz ordenará a citação dos demais interessados e nomeará um regulador de avarias de notório conhecimento, que como visto é um técnico que 316


exerce uma função similar ao do perito (art. 711 do CPC/2015). O foro competente é o da seção judiciária (art. 109 da CF e súmula nº 504 do STF) ou da comarca do primeiro porto onde o navio houver chegado, pois em se tratando de reparação de danos é aplicável a regra do lugar onde se puder apurar os fatos. Trata-se de competência territorial. O objeto da ação de regulação de avaria grossa é a determinação do montante das avarias grossas e a fixação da contribuição das partes interessadas. Quanto a competência para o julgamento da ação de regulação de avaria grossa, deve-se destacar que o comércio marítimo se desenvolve em

nível

internacional,

podendo

as

partes

contratantes estipular em convenção especial, exarada na carta partida ou no conhecimento, que as

avarias

serão

reguladas

por

normas

internacionais (art. 762 do CCom). Neste caso, poderá haver cláusula de eleição de foro exclusivo estrangeiro em contrato internacional, afastando a competência internacional concorrente (art. 21, inc. III, e 25 do CPC/2015) do foro da comarca do 317


primeiro porto onde a embarcação tiver chegado (art. 707 do CPC/2015). De qualquer forma, o Superior Tribunal de Justiça tem entendimento de que a cláusula de eleição de foro estrangeiro é válida exceto quando a lide envolver interesses públicos. Nestes casos, a demanda pode ser proposta no Brasil mesmo quando o contrato internacional contiver cláusula de eleição de foro estrangeiro,

nas

hipóteses

de

competência

internacional concorrente (precedentes: REsp nº 1168547/RJ, 4ª Turma, Min. Luis Felipe Salomão, DJe 07/02/2011; REsp n 1177915/RJ, 3ª Turma, Min. Vasco Della Giustina, DJe 24/08/2010). Como o Código de Processo Civil dispõe que se aplicam aos procedimentos especiais as normas do procedimento comum (art. 318 do CPC/318), a petição inicial da ação de regulação de avaria grossa deve conter os requisitos elencados no artigo 319 do Código, como: A) a indicação da seção judiciária, no caso de competência da justiça federal em razão de interesse da União (art. 109 da CF), ou o foro da 318


comarca do primeiro porto onde navio houver chegado, pois o Código Comercial determina que as diligências, exames e vistorias sobre o casco do navio e seus pertences devem ser praticadas antes de dar-se início ao seu concerto, nos casos em que este possa ter lugar (art. 772); B) a qualificação das partes legitimadas, que são as partes interessadas na regulação das avarias grossas, como as pessoas que fazem parte do contrato de fretamento marítimo, o proprietário e armador da embarcação, o dono da carga, o capitão da embarcação. Deve ser demonstrado o interesse e a legitimidade para a causa, em razão da necessidade do processo para a resolução da regulação de avarias (art. 17 do CPC/2015); C) o fato e os fundamentos jurídicos do pedido, que são os danos ocasionados por casos fortuitos ou atos voluntários praticados pelas partes integrantes do contrato de transporte marítimo, com a conseqüente responsabilidade pelo ressarcimento dos danos;

319


D) o pedido de apuração das avarias grossas com a sua regular liquidação e a condenação do responsável pelo pagamento dos danos acarretados a carga ou a embarcação; E) o valor da causa que é o valor das avarias; F) as provas suficientes para demonstrar a existência das avarias; G) ser instruída com os documentos indispensáveis para a propositura da ação (art. 320 do CPC/2015), como os que comprovem o contrato de fretamento marítimo, a carta-partida e o conhecimento de embarque, o recibo de entrega da mercadoria (art. 1º do DL nº 116/67); Quando houver decisão do Tribunal Marítimo quanto à matéria tratada na ação de regulação de avaria grossa, esta tem valor probatório e deve ser juntada aos autos da ação judicial.

Isto

porque,

compete

ao

Tribunal

Marítimo, órgão auxiliar do Poder Judiciário (art. 1º da lei nº 2.180/54), julgar os acidentes da navegação, nele incluídos as avarias (art. 13, inc. I 320


e art. 14, al. b da lei nº 2.180/54), definindo-lhes a natureza

e

determinando-lhes

circunstâncias

e

responsáveis

cujas

extensão condutas

e

as

causas,

indicando foram

os

apuradas

mediante investigação em inquérito (art. 17 da lei nº 2.180/54). Evidentemente que a decisão do Tribunal Marítimo não vincula o juiz, mas serve de elemento de prova para a formação do seu convencimento. O

regulador

nomeado

judicialmente

deverá declarar justificadamente se os danos são passíveis de rateio na forma de avaria grossa e exigirá das partes envolvidas a apresentação de garantias idôneas para que possam ser liberadas as cargas aos donos/consignatários. A parte que não concordar com o regulador quanto à declaração de abertura da avaria grossa deverá justificar suas razões ao juiz, que decidirá no prazo de 10 (dez) dias. Se o dono/consignatário da carga não apresentar garantia idônea a critério do regulador, este fixará o valor da contribuição provisória com base nos fatos narrados e nos documentos que 321


instruírem a petição inicial, que deverá ser caucionado sob a forma de depósito judicial ou de garantia bancária. Recusando-se o consignatário a prestar caução, o regulador requererá ao juiz a alienação judicial de sua carga na forma dos artigos 879 a 903 do CPC. É permitido o levantamento, por alvará, das quantias necessárias ao pagamento das despesas da alienação a serem arcadas pelo consignatário, mantendo-se o saldo remanescente em depósito judicial até o encerramento da regulação (art. 708 do CPC/2015). Nos termos do artigo 7º do DL nº 116/67 o armador tem o direito de retenção sobre as mercadorias nos armazéns, até ver liquidado o frete devido ou o pagamento da contribuição por avaria grossa declarada. Ou seja, não sendo efetuado o pagamento da contribuição por avaria grossa declarada, a carga poderá ser retida pelo armador. Conforme determina o Código Comercial (art. 772) para que o dano sofrido possa ser considerado avaria é necessário que o regulador declare o que causou o dano, a parte da carga que 322


se acha avariada com indicação da marca, número e volume, e o valor dos objetos avariados e quanto custará o conserto ou reposição do navio ou seus pertences. A estimativa do preço para o cálculo da avaria será feita sobre a diferença entre o valor das mercadorias não avariadas e o das avariadas, no tempo da entrega (art. 773 do CCom). O regulador tem o prazo de até 12 (doze) meses para apresentar o regulamento da avaria grossa, contado da data da entrega dos documentos necessários à regulação pelas partes (art. 709 do CPC/2015), podendo este prazo ser estendido a critério

do

juiz

(art.

710

do

CPC/2015).

Apresentado o regulamento da avaria grossa, o juiz concederá vista dele as partes pelo prazo comum de 15 (quinze) dias, e, não havendo impugnação, o regulamento

será

homologado

por

sentença.

Havendo impugnação ao regulamento, o juiz decidirá no prazo de 10 (dez) dias, após a oitiva do regulador. O regulador tem o dever de cumprir o encargo no prazo que lhe assinalar o juiz, 323


empregando toda sua diligência, podendo escusarse do encargo alegando motivo legítimo (art. 157 do CPC/2015). A escusa será apresentada no prazo de 15 (quinze) dias, contado da intimação, da suspeição ou do impedimento supervenientes, sob pena de renúncia ao direito a alegá-la. O regulador que, por dolo ou culpa, prestar informações inverídicas responderá pelos prejuízos que causar às partes, independentemente das demais sanções previstas em lei (art. 158 do CPC/2015). O regulamento deve conter a regulação, a repartição e o rateio das avarias grossas, apuradas mediante

diligências,

exames

e

vistorias,

e

obedecendo as normas do Código Comercial ou as normas internacionais aplicáveis por força de convenção especial firmada pelas partes na carta partida ou no conhecimento de embarque (art. 762 do CCom). Deste modo, o regulamento contém a classificação das avarias, o montante delas e a fixação do valor de contribuição dos interessados. A sentença que homologa o regulamento, também condena cada um dos interessados ao 324


pagamento

do

respectivo

valor

contribuinte,

começando a produzir efeitos imediatamente após a sua publicação, não estando sujeita ao efeito suspensivo do recurso de apelação (art. 793 do CCom c/c art. 1.012, § 1º do CPC/2015). Neste sentido era expresso o artigo 768 do Código de Processo Civil de 1939. Foram

traçados

neste

trabalho

os

principais aspectos da ação de regulação de avaria grossa, disciplinada nos artigos 707 a 711 do Código de Processo Civil de 2015, fazendo um paralelo com a ação de regulação de avarias do Código de Processo Civil de 1939, vigente até a entrada em vigor do CPC/2015, por expressa previsão contida no artigo 1.218, inciso XIV, do Código de Processo Civil de 1973, abordando-se as normas correlatas no Código Comercial (arts. 761 a 796), sem a pretensão de esgotar o assunto.

325


BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE A SÚMULA Nº 568 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA A recente súmula de jurisprudência nº 568 do Superior Tribunal de Justiça consolida o entendimento do respectivo tribunal no sentido de que “o relator, monocraticamente e no Superior Tribunal

de

Justiça,

poderá

dar

ou

negar 326


provimento

ao

recurso

quando

houver

entendimento dominante acerca do tema” (Corte Especial – CE, DJe 17/03/2016). Os precedentes que geraram a edição da súmula são o Recurso Especial nº 503.701/RS, Segunda Turma, Min. FRANCIULLI NETTO, DJ 18/10/2004; Recurso Especial nº 732.939/RS, Quinta Turma, Min. ARNALDO ESTEVES LIMA, DJe 02/06/2008; Recurso Especial nº 1.084.943/MG, Quinta Turma, Min.

ARNALDO

ESTEVES

LIMA,

DJe

15/03/2010; Recurso Especial nº 1.107.977/RS, Quarta Turma, Min. RAUL ARAÚJO, DJe 04/08/2014; Recurso Especial nº 1.290.933/SP, Terceira Turma,

Min. JOÃO

OTÁVIO

DE

NORONHA, DJe 24/04/2015; Recurso Especial nº 1.346.836/BA, Terceira Turma, Min. NANCY ANDRIGHI, DJe 16/10/2012; Recurso Especial nº 1.501.205/RS, Segunda Turma, Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 30/06/2015; Recurso Especial nº 1.563.610/PI, Segunda Turma, Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 04/02/2016.

327


Portanto, apesar do enunciado da súmula nº 568 do STJ não se referir expressamente ao recurso especial, é a ele que se dirige o mandamento contido no entendimento sumular do STJ, em decorrência do que foi decidido nos precedentes que a originaram. Todos os precedentes embasaram a possibilidade do relator dar ou negar provimento ao recurso especial, quando houver entendimento dominante acerca do tema, com base na súmula de jurisprudência nº 83 do Superior Tribunal de Justiça (Corte Especial – CE, DJ 02/07/1993) que determina o não conhecimento do recurso especial pela divergência (art. 105, inc. III, al. c, da CF), quando a orientação do tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida. De acordo com o AgRg no Ag nº 6511/DF (precedente da súmula nº 83), Segunda Turma, Min. AMÉRICO LUZ, DJ 04/03/1991, superada a divergência apontada nos fundamentos recursais não se pode admitir o recurso especial por ausência do seu pressuposto recursal de admissibilidade, conforme estabelece a aliena c, do inciso III, do artigo 105 da 328


Constituição Federal e o artigo 1.029, inciso II e § 1º do Código de Processo Civil de 2015 (art. 541, inciso II e § 1º do CPC/73). As hipóteses de cabimento do recurso especial estão delineadas no inciso III, do artigo 105 da Constituição Federal, que dispõe ser de competência do Superior Tribunal de Justiça julgar, via recurso especial, as causas decididas, em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos Tribunais de Justiça dos Estados, quando a decisão recorrida: a) contrariar ou negar vigência a tratado ou a lei federal; b) julgar válido ato de governo local contestado em face de lei federal e; c) der a lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal. Portanto, compete ao Superior Tribunal de Justiça, em

sede

de

aplicabilidade

recurso e

a

especial,

correta

assegurar

interpretação

a da

legislação federal em todo território nacional, cumprindo

a

missão

de

uniformizar

a

jurisprudência nacional no tocante a legislação federal. 329


Conforme dispõe o artigo 1.029 do Código de Processo Civil de 2015, o recurso especial deve conter: a) a exposição do fato e do direito; b) a demonstração do cabimento do recurso interposto e; c) as razões do pedido de reforma ou de invalidação da decisão recorrida. Quando o recurso tiver como fundamento divergência jurisprudencial, o recorrente fará a prova da divergência com a certidão, cópia ou citação do repositório de jurisprudência, oficial ou credenciado, inclusive em mídia eletrônica, em que houver sido publicado o acórdão divergente, ou ainda com a reprodução de julgado

disponível

na

rede

mundial

de

computadores, com indicação da respectiva fonte, devendo-se, em qualquer caso, mencionar as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os casos confrontados. Deste modo, o recorrente deverá expor na petição recursal os fatos e o direito, com a indicação da lide e os delineamentos da

decisão

recorrida;

a

demonstração

da

contrariedade ou negativa de vigência a tratado ou lei federal na decisão recorrida, o julgamento de 330


validade do ato (inclusive normativo) de governo local, estadual ou municipal, contestado em face de lei federal, e a interpretação da lei federal divergente da que lhe foi dada por outro Tribunal Regional Federal, Tribunal de Justiça ou pelo próprio Superior Tribunal de Justiça; e o pedido de reforma ou de invalidade da decisão recorrida. Na hipótese da alínea c, do inciso III, do artigo 105 da Constituição Federal, a divergência apontada nas razões recursais deve ser atual e específica, revelando a existência de teses diversas na interpretação de um mesmo dispositivo legal federal, não se admitindo a interposição do recurso especial quando a divergência estiver superada por iterativa, notória e atual jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, como as decisões proferidas em sede de recurso especial repetitivo. Do mesmo modo, não pode se admitir o recurso especial quando o tribunal indicado no acórdão paradigma, uniformizar a sua jurisprudência no mesmo sentido da decisão recorrida (súmula nº 83 do STJ), mediante a edição de súmula, de decisão em 331


incidente de assunção de competência (art. 947 do CPC/2015), e em incidente de resolução de demandas repetitivas (art. 976 a 987 do CPC/2015). A regra do artigo 557 do CPC/73 é mantida com modificações nos incisos III, IV e V, do artigo 932 do Código de Processo Civil de 2015, para autorizar o relator a não conhecer de recurso inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os fundamentos da decisão recorrida; negar seguimento a recurso interposto de decisão fundamentada em súmula do respectivo Tribunal, do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, em acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos, em entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência; bem como para dar provimento a recurso interposto de decisão proferida em desrespeito a entendimento sumulado pelo respectivo Tribunal, pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Superior Tribunal de Justiça, a 332


acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos, a entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência. Como pode se notar o artigo 932 do CPC/2015 não contempla a hipótese de negativa de seguimento

de

recurso

que

contrarie

a

jurisprudência dominante do respectivo Tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior, nem a hipótese de provimento do recurso quando a decisão recorrida estiver de acordo com jurisprudência dominante do respectivo Tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior, como autorizava o artigo 557 do CPC/73, motivo pelo qual somente ao colegiado caberá decidir acerca da superação ou não da tese jurídica firmada na decisão recorrida. O entendimento jurisprudencial contido no enunciado da súmula nº 568 do Superior Tribunal de Justiça deve ser lido com a devida cautela, pois como já dizia JOSÉ CARLOS BARBOSA 333


MOREIRA “pode causar graves injustiças a eventual afoiteza do relator em negar seguimento ao recurso: nem sempre constitui sinal seguro de inconsistência a mera discrepância entre a tese defendida pelo recorrente e a de proposição constante de súmula; a fortiori, o simples dissenso entre aquela tese e a jurisprudência predominante no tribunal, mas não incluída em súmula” (Comentários ao Código de Processo Civil, Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973, vol. V: arts. 476 a 565. Rio de Janeiro: Forense, 2003, pág. 663). Na hipótese de existência de decisão proferida em sede de recurso especial repetitivo (art. 1.040 do CPC/2015), que tenha decidido a mesma tese jurídica objeto do recurso especial interposto, pode o relator negar ou dar provimento ao recurso especial com base no artigo 932, inciso IV, b, e inciso V, b, do Código de Processo Civil de 2015. Foi o que ocorreu no Recurso Especial nº 1.501.205/RS e nº 1.563.610/PI, ambos precedentes da súmula nº 568 do STJ, sendo que o precedente do Piauí estendeu a aplicação da súmula nº 83 do 334


STJ para as hipóteses da alínea a, do inciso III, do artigo 105 da Constituição Federal. Nos demais precedentes não houve decisão em sede de recurso especial

repetitivo,

foram

embasados

em

jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça. Deste

modo,

deve-se

entender

que

ressalvadas as hipótese dos incisos IV e V do artigo 932 do Código de Processo Civil de 2015, o relator do recurso especial somente pode dar ou negar provimento ao recurso quando a divergência apontada nas razões recursais estiver superada por notória, iterativa e atual jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, ou do tribunal indicado no acórdão paradigma. Ressalvados estes casos, cabe às Turmas do Superior Tribunal de Justiça dar ou negar provimento ao recurso especial, conforme dispõe o artigo 13, inciso IV do regimento interno do STJ. O artigo 34, inciso XVIII do regimento interno do STJ dispõe expressamente que é atribuição do Ministro Relator negar seguimento a 335


pedido ou recurso manifestamente intempestivo, incabível, improcedente, contrário a súmula do Tribunal, ou quando for evidente a incompetência deste. O referido artigo se compatibiliza com o artigo 932 do Código de Processo Civil de 2015. Neste ponto, cumpre distinguir o não conhecimento do recurso especial em razão da não demonstração da

divergência

nas

razões

recursais

do

desprovimento do recurso em decorrência da superação da divergência. De qualquer forma, o recorrente poderá se socorrer do agravo interno do artigo 1.021 do Código de Processo Civil de 2015, quando verificar que o entendimento que fundamentou o provimento ou desprovimento do seu recurso especial pelo Ministro Relator, monocraticamente, é distinto da matéria tratada nas razões recursais ou não é notório, reiterado e atual, representando apenas um grupo de decisões isoladas. Por entendimento

fim,

deve

se

jurisprudencial

registrar

que

consolidado

o na

súmula nº 568 do Superior Tribunal de Justiça é 336


aplicável a todas as hipóteses de cabimento do recurso especial, elencadas no inciso III, do artigo 105, da Constituição Federal, diferentemente do entendimento

jurisprudencial

consolidado

na

súmula nº 83 do mesmo tribunal, que somente se aplica para a hipótese da aliena c, do inciso III, do artigo 105 da Constituição Federal. Evidentemente que o propósito da recente súmula nº 568 é o de propiciar um julgamento mais célere dos recursos, atendendo ao princípio da razoável duração do processo estampado no inciso LXXVIII, do artigo 5º da Constituição Federal e no artigo 4º do Código de Processo Civil de 2015. Entretanto não deve se descurar da devida análise da existência de jurisprudência reiterada, uniforme e constante aplicável ao caso concreto, sob pena de violação ao princípio do devido processo legal, também estampado na Constituição Federal (art. 5º, inc. LIV).

337


APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015 AS AÇÕES DE MANDADO DE SEGURANÇA, MANDADO DE INJUNÇÃO, AÇÃO POPULAR E AÇÃO CIVIL PÚBLICA A Constituição da República Federativa do Brasil de 88 arrolou no seu artigo 5º, incisos LXIX, 338


LXX, LXXI e LXXIII determinadas ações judiciais para a realização e garantia dos direitos individuais e coletivos, bem como atribuiu como função institucional do Ministério Público promover a ação civil pública para proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos, sem prejuízo da legitimidade de terceiros para propositura da referida ação (art. 129, inc. III e § 1º). A estas ações judiciais com previsão na Constituição, costuma-se dar o nome de ações constitucionais ou remédios constitucionais, sendo elas o mandado de segurança individual (art. 5º, inc. LXIX) e o coletivo (art. 5º, inc. LXX), o mandado de injunção individual e coletivo (art. 5º, inc. LXXI) e a ação popular (art. 5º, inc. LXXIII). Nada obstante seja assegurado o direito de acesso à justiça a todos (art. 5°, inc. XXXV da CRFB/88), mediante o ajuizamento de ações judiciais regidas pela legislação processual, optou o constituinte por incluir as ações acima enumeradas na Constituição, prevendo para cada uma delas um 339


objeto específico: a) o mandado de segurança para a proteção de direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, em razão da prática de atos ilegais ou com abuso de poder por autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público; b) o mando de injunção para assegurar o exercício dos direitos

e

liberdades

constitucionais

e

das

prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania quando houver o seu impedimento por falta de norma regulamentadora que vise dar aplicabilidade a norma constitucional; c) a ação popular para anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural; e d) a ação civil pública para proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos. Portanto, cada uma delas tem um fim específico que deve ser observado pelo legislador que regulamentar o seu processo.

340


Atualmente

todas

as

quatro

ações

constitucionais possuem regulamentação legal: a) o mandado de segurança pela Lei nº 12.016, de 07 de agosto de 2009; b) o mandado de injunção pela Lei nº 13.300, de 23 de junho de 2016; c) a ação popular pela Lei nº 4.717, de 29 de junho de 1965; e d) a ação civil pública pela Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985. Importante ressaltar que as leis que regem a ação civil pública e a ação popular foram elaboradas antes da Constituição de 1988, mas recepcionadas por esta. Como o Código de Processo Civil é a lei que rege o processo na jurisdição civil (art. 13 do CPC/2015), todas as leis reguladoras das ações constitucionais prevêem a sua aplicação subsidiária naquilo que não contrariem as disposições das referidas leis, nem a natureza específica das ações. Os dispositivos legais são o artigo 24 da Lei nº 12.016/2009, que trata do mandado de segurança, o artigo 14 da Lei nº 13.300/2016, que trata do mandado de injunção, o artigo 22 da Lei nº 4.717/65 e o artigo 19 da Lei nº 7.347/85. As leis 341


do mandado de segurança e da ação civil pública fazem referência expressa ao Código de Processo Civil de 1973 (Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973), entretanto como este foi revogado pelo Código de Processo Civil de 2015 (Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015) é este que deve ser aplicado subsidiariamente, conforme determina a regra de transição inscrita no artigo 1.046, § 2º e § 4º do CPC/2015. A

lei

processual

estabelece

os

pressupostos para que se possa estabelecer a relação jurídica processual e diz o que devem fazer, de forma lógica em sua estrutura, as partes, juízes, serventuários e o Ministério Público, com a finalidade de se obter a prestação jurisdicional por parte do Estado para a tutela jurídica pretendida. Deste modo, as leis processuais são portadoras de normas gerais e abstratas (regra de conduta que exprime um juízo de valor) que disciplinam a relação jurídica processual. São leis processuais o Código de Processo Civil e as leis processuais especiais. 342


A aplicação subsidiária do Código de Processo Civil para as ações constitucionais é necessária, pois estas não tratam de todo o processo e

sim

de

especificidades

em

relação

ao

procedimento de cada uma. Ora, como são ações judiciais o arcabouço geral está delineado no CPC devendo apenas se respeitar as regras específicas nas normas legais de cada uma delas. Igualmente devem ser observadas as regras constitucionais que tratam da competência originária (art. 102, inc. I, al. d e q e art. 105, inc. I, al. b e h da CRFB/88) e recursal ( art. 105, inc. II, al. b e art. 102, inc. II, al. a da CRFB/88) do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, no tocante ao julgamento

dos

processos

de

mandado

de

segurança e do mandado de injunção. Estão insertas na Constituição Federal as regras de competência da justiça federal, como a competência originária do Tribunal Regional Federal para julgar os processos de mandado de segurança contra atos do próprio tribunal ou de juiz federal (art. 108, inc. I, al. c), a competência da 343


justiça federal para julgar os processos de mandado de segurança contra ato de autoridade federal, excetuados os casos de competência dos tribunais federais (art. 109, inc. VIII) e as causas de interesse da União (art. 109, inc. I). No tocante as normas da parte geral do Código de Processo Civil, destacamos que são aplicáveis

subsidiariamente

ao

mandado

de

segurança (Lei nº 12.016/2009), ao mandado de injunção (Lei nº 13.300/2016), a ação popular (Lei nº 4.717/65) e a ação civil pública (Lei nº 7.347/85): 1) as normas fundamentais do processo civil arroladas nos artigos 1º a 12, até porque muitas delas encontram correspondência com normas insertas na Constituição Federal que tratam do acesso à justiça, a razoável duração do processo, a publicidade do julgamento proferido pelos juízes e tribunais e o dever de fundamentação das decisões judiciais; 2) as regras concernentes as condições da ação (art. 17 a 20 do CPC/2015), como a 344


legitimidade ad causam, ativa e passiva (art. 6º da Lei nº 4.717/65 e súmula nº 365 do STF, art. 5º da Lei nº 7.347/85, art. 1º, 6º, § 3º e 21 da Lei nº 12.016/2009 e art. 3º e 12 da Lei nº 13.300/2016); o interesse de agir (art. 5º, inc. LXIX da CRFB/88, art. 1º, § 2º e art. 5º da Lei nº 12.016/2009 e art. 11 da Lei nº 13.300/2016, art. 1º, parágrafo único da Lei nº 7.347/85); e a possibilidade jurídica do pedido (arts. 322 a 329 do CPC/2015), sendo a ausência de qualquer delas causa de extinção do processo sem resolução do mérito, conforme dispõe o artigo 485, inciso I e VII, e artigo 330, incisos II e III e no § 1º, inciso I, artigo 10 da Lei nº 12.016/2009, artigo 6º da Lei nº 13.300/2016 e artigo 19 da Lei nº 4.717/65; 3) A legitimidade extraordinária (art. 18 do CPC) na ação popular (art. 5º, inc. LXXIII da CRFB/88), no mandado de segurança coletivo (art. 5º, inc. LXX, alínea b, da CRFB/88 e art. 21 da Lei nº 12.016/2009) e no mandado de segurança individual (art. 3º da Lei nº 12.106/2009); na ação civil pública proposta pelo Ministério Público, pela 345


Defensoria Pública e pelas associações (art. 5º da Lei nº 7.347/85); e no mandado de injunção coletivo (art. 12 da Lei nº 13.300/2016). A substituição processual não se confunde com a representação, pois o substituto age em nome próprio para defender direito alheio. Também não se confunde com a sucessão processual que ocorre quando um sujeito sucede outro no processo, assumindo a posição deste; 4) Os pressupostos de desenvolvimento válido

e

regular

do

processo,

como

o

preenchimento dos requisitos da petição inicial (art. 319, 320, 330 e 331 do CPC, art. 6º e 10 da Lei nº 12.016/2009 e art. 4º e 6º da Lei nº 13.300/2016), a capacidade de ser parte e de estar no processo (art. 70 a 76 e arts. 103 a 112 do CPC/2015) e o juízo competente (art. 16 do CPC, art. 2º da Lei nº 7.347/85, art. 5º da Lei nº 4.717/65, arts. 42 a 48, arts. 51 e 52 e art. 53, inc. III, al. a, b e c, e art. 54 a 66 do CPC/2015), além do prazo de 120 para o ajuizamento do mandado de segurança (art. 23 da Lei nº 12.016/2009). O mandado de segurança 346


coletivo e o mandado de injunção coletivo não geram

litispendência

com

os

mandados

de

segurança individuais e os mandados de injunção individuais (art. 22, § 2º da Lei nº 12.016/2009 e art. 13, parágrafo único da Lei nº 13.300/2016); 5) As normas sobre cooperação jurídica internacional e nacional, disciplinadas nos artigos 26 a 41 e 67 a 69 do CPC/2015; 6) As normas concernentes aos deveres das partes e de seus procuradores, como o dever de lealdade e boa-fé e a responsabilidade pela prática de litigância de má-fé (arts. 77 a 81 do CPC/2015, art. 25 da Lei nº 12.016/2009, art. 17 da Lei nº 7.347/85 e art. 13 da Lei nº 4.717/65); 7) As normas referentes as despesas, honorários e multas e a gratuidade de justiça previstas nos artigos 82 a 102 do CPC/2015, ressalvado o mandado de segurança ao qual não cabe a condenação ao pagamento de honorários advocatícios (art. 25 da Lei nº 12.016/2009 e súmula nº 105 do STJ e nº 512 do STF), do mesmo modo para o mandado de injunção que prevê a 347


aplicação das normas da Lei nº 12.016/2009 que é especial em relação ao CPC/2015, dentre elas o não cabimento

da

condenação

em

honorários

advocatícios. No tocante a ação popular as custas devem ser pagas ao final da ação (art. 10 e 12 da Lei nº 4.717/65), e para a ação civil pública não há adiantamento de despesas processuais salvo no caso de má-fé da associação autora (art. 17 e 18 da Lei nº 7.347/85). Quanto ao mandado de segurança e ao mandado de injunção as custas e despesas processuais devem ser adiantadas, salvo na hipótese do artigo 91 do CPC/2015. 8) As normas do CPC/2015 referentes ao litisconsórcio (arts. 113 a 118 c/c art. 1.046, § 4º) são aplicáveis aos mandado de segurança e ao mandado de injunção por expressa autorização contida no artigo 24 da Lei nº 12.016/2009, bem como a ação popular (art. 6º, § 5º da Lei nº 4.717/65) e a ação civil pública (art. 5º, § 2º e § 5º da Lei nº 7.347/85), destacando-se que o § 2º do artigo 10 da Lei nº 12.016/2009 veda o ingresso do litisconsorte após o despacho da petição inicial; as 348


formas de intervenção de terceiros estão previstas nos artigos 119 a 138 do CPC/2015, sendo elas a assistência, a denunciação da lide, o chamamento ao processo, o incidente de desconsideração da personalidade jurídica e o amicus curiae. A Lei nº 4.717/65 autoriza expressamente a intervenção do assistente na ação popular (art. 6º, § 5º), podendo ser na forma simples ou litisconsorcial, cabendo também a denunciação da lide (art. 125, II, do CPC/2015) como nas hipóteses do artigo 11 da Lei nº 4.717/65, o incidente de desconsideração da personalidade jurídica quando o legitimado passivo na ação popular for pessoa jurídica de direito privado e o amicus curiae quando a ação popular tratar de matéria relevante com repercussão social; a

Lei

7.347/85

autoriza

a

assistência

litisconsorcial (art. 5º, § 2º) na ação civil pública, sendo cabível a assistência simples, a denunciação da lide (art. 125, II do CPC/2015), o incidente de desconsideração da personalidade jurídica e a participação

do

amicus

curiae.

A

Lei

12.016/2009 não trata das formas de intervenção de 349


terceiros, sendo admitida a assistência, vez que não persiste mais a vedação contida no antigo artigo 19 da Lei nº 1.533/51, e a participação do amicus curiae quando se tratar de matéria relevante com repercussão social principalmente quando o mando de segurança for coletivo, o mesmo se aplica ao mandado de injunção 9) As normas do Código de Processo Civil de 2015 referentes aos poderes, deveres e responsabilidade do juiz bem como o impedimento e a suspeição (arts. 139 a 148 do CPC/2015), bem como as normas referentes aos auxiliares da justiça (arts. 149 a 175 do CPC/2015). A Lei nº 4.717/65 dispõe que cabe ao juiz determinar ex-officio a cópia

de

documentos

para

as

autoridades

competentes quando houver prova de crime ou responsabilidade funcional de servidor público (art. 15). A Lei nº 7.347/85 dispõe que os juízes podem remeter cópias de documentos ao Ministério Público quando comprovada a existência de fatos sujeitos a responsabilização mediante ação civil pública. A Lei nº 12.016/2009 ressalva que feitas as 350


notificações, o serventuário em cujo cartório corra o feito juntará aos autos cópia autêntica dos ofícios endereçados ao coator e ao órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada, bem como a prova da entrega a estes ou da sua recusa em aceitálos ou dar recibo e, no caso do art. 4º, a comprovação da remessa (art. 11); 10) As normas referentes aos atos do processo (art. 188 a 294 do CPC/2015) e as normas que tratam da formação (art. 312 do CPC/2015) , suspensão (art. 313 e 315 do CPC/2015) e extinção do processo (art. 316 e 317 do CPC/2015), observadas as peculiaridades previstas nas leis que regem

cada

uma

das

ações

constitucionais

principalmente no que tange ao ato de citação, que no mandado de segurança, por exemplo, é substituído pela notificação da autoridade coatora com ciência ao órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada (art. 7º, inc. I e II do CPC/2015), o mesmo pode se dizer em relação ao mandado de injunção que contêm norma similar no artigo 5º da Lei nº 13.300/2016. Para a ação 351


popular e a ação civil pública aplicam-se integralmente as disposições do Código de Processo Civil, em razão das leis que regem as referidas ações não tratarem especificamente da forma de citação do legitimado passivo; 11) Os

provimentos

provisórios

são

atualmente tratados no CPC/2015 sob o rótulo genérico de tutela provisória (art. 294 a 311), que se divide em tutela de urgência (art. 300 a 310), de natureza antecipada e cautelar, e tutela de evidência (art. 311), contendo disposições gerais aplicáveis a ambos os tipos de provimentos provisórios (art. 294 a 299). Portanto, no Livro V da parte geral do Código atinentes

foram aos

condensados

os

provimentos

dispositivos provisórios,

diferentemente do Código de Processo Civil de 1973 que tratava em livros e títulos distintos a tutela antecipada (art. 273) e a tutela cautelar (art. 706 a 880). O artigo 1.059 do CPC/2015 dispõe que é aplicável a tutela provisória requerida contra a Fazenda Pública o disposto no artigo 1º a 4º da Lei nº 8.437/92 e no artigo 7º, § 2º da Lei nº 352


12.016/2009. A Lei nº 4.717/65 dispõe no § 4º do artigo 5º que cabe a suspensão liminar do ato lesivo ao patrimônio público, sendo plenamente aplicáveis ao rito da ação popular os dispositivos do CPC/2015 que tratam da tutela provisória. A Lei nº 7.347/85 prevê expressamente a possibilidade de ajuizamento da ação cautelar para evitar dano ao patrimônio público e social, ao meio ambiente, ao consumidor, à honra e a dignidade de grupos raciais, étnicos ou religiosos, à ordem urbanística ou de bens e direitos de valor artístico, estético, histórico,

turístico

e

paisagístico

(art.

4º),

aplicando-se, portanto, os dispositivos referentes a tutela de urgência de natureza cautelar previstos no CPC/2015. Evidentemente será cabível a tutela de urgência de natureza antecipada e a tutela de evidência (art. 311, inc. I, II e IV do CPC/2015), sem prejuízo do provimento de natureza liminar previsto no artigo 12 da lei que regula a ação civil pública. No tocante ao mandado de segurança o artigo 7º, inc. III, § 1º a 5º e o artigo 22, § 2º da Lei nº 12.016/2009 dispõem sobre a possibilidade de 353


provimento de natureza liminar para suspender o ato emanado da autoridade coatora com vício de legalidade ou com abuso de poder, sem prejuízo da aplicação da tutela de urgência antecipada e cautelar e da tutela de evidência (art. 311, inc. I e II do CPC/2015). No tocante ao mandado de injunção o Supremo Tribunal Federal tem jurisprudência no sentido de que é incabível a concessão de medidas liminares

e

provisórias

(RTJ

133/11,

Rel.

MOREIRA ALVES), entretanto adotando-se o entendimento esposado pelo STF no MI nº 670/ES e MI nº 712/PA sobre a possibilidade de uma regulação

provisória

pelo

judiciário

torna-se

plenamente cabível a tutela provisória de urgência de natureza antecipada ou cautelar para que seja dada uma solução normativa concretizadora dos direitos e liberdades que a parte está sendo impedida de exercer até que sobrevenha a norma legal

pelo

legislador

(GILMAR

FERREIRA

MENDES, INOCÊNCIO MÁRTIRES COELHO e PAULO GUSTAVO GONET BRANCO. Curso de

354


direito constitucional. 4º ed. São Paulo: Saraiva, 2009, pág. 1266); Quanto ao processo de conhecimento (arts. 318 a 512 do CPC/2015) da parte especial do Código de Processo Civil de 2015, destacamos que são aplicáveis a ação de mandado de segurança, mandado de injunção, ação popular e ação civil pública, as seguintes: 1) as normas do procedimento comum para a ação popular conforme expressa disposição contida no caput do artigo 7º da Lei nº 4.717/65, ressalvando-se que o prazo de contestação é de 20 dias (art. 7º, IV) prorrogável por igual período; que não cabe reconvenção na ação popular em razão do pedido reconvencional pressupor que as partes estejam litigando sobre situações jurídicas que lhes são próprias, e na ação popular o autor não ostenta posição jurídica própria, nem titulariza o direito discutido na ação, que é de natureza indisponível, defendendo-se, em verdade, interesses pertencentes a toda sociedade (STJ, REsp nº 72065/RS, Min. CASTRO MEIRA, 2ª Turma, DJ 06.09.2004); que 355


ocorrerá o julgamento antecipado do mérito com vista às partes pelo prazo de 10 (dez) dias para alegações (art. 7º, inc. V, da Lei nº 4.717/65) quando não houver necessidade de produção de provas em audiência; que a desistência da ação popular não gera automaticamente a extinção do processo sem resolução do mérito (art. 485, inc. VIII, § 5º do CPC/2015) mas pode acarretar a sucessão da parte com o prosseguimento da ação por qualquer cidadão ou pelo Ministério Público (art. 9º da Lei nº 4.717/65); que a sentença faz coisa julgada erga omnes (art. 18 da Lei nº 4.717/65), afetando direito de terceiros; que a sentença quando não proferida em audiência de instrução e julgamento deve ser proferida no prazo de 15 dias do recebimento dos autos pelo juiz; que a sentença que concluir pela carência de ação ou de improcedência está sujeita a remessa necessária (art. 19 da Lei nº 4.717/65); a necessidade de liquidação de sentença pelas regras do CPC/2015 nas hipóteses descritas no artigo 14 da Lei nº 4.717/65; 356


2) as normas do procedimento comum para a ação civil pública nos termos do parágrafo único do artigo 18 do CPC/2015, ressalvando-se que não é cabível a reconvenção (art. 343 do CPC/2015) por não veicular pretensão própria do legitimado da ACP e por tratar de interesses relativos a coletividade; que a desistência da ação não acarreta necessariamente a extinção do processo sem resolução do mérito (art. 485, inc. VIII, § 5º do CPC/2015), podendo prosseguir com outro legitimado (art. 5º, § 3º da Lei nº 7.347/85); que a sentença possui efeito erga omnes nos limites da competência territorial do órgão prolator, afetando o direito de terceiros; O mandado de segurança e o mandado de injunção possuem ritos próprios aplicando-se a eles os requisitos da petição inicial previstos no artigo 319 a 331 do Código de Processo Civil de 2015, por expressa autorização contida no artigo 6º e 10 da Lei nº 12.016/2009 e artigo 5º e 6º da Lei nº 13.300/2016; as causas de improcedência liminar do pedido arroladas no artigo 332 do CPC/2015 em 357


razão da inexistência da fase probatória no rito do MS e do MI; as normas referentes a força probante dos documentos (art. 405 a 429 do CPC/2015) e dos documentos eletrônicos (art. 439 a 441 do CPC/2015); as causas de extinção do processo sem resolução do mérito, arroladas no artigo 485 do CPC/2015 (art. 267 do CPC/73); os elementos e efeitos da sentença e a coisa julgada previstos nos artigos 489 a 495 e 502 a 508 do CPC/2015, ressalvando-se que no mandado de injunção poderá ser conferida eficácia ultra partes ou erga omnes a decisão, quando isso for inerente ou indispensável ao exercício do direito, da liberdade ou da prerrogativa objeto da impetração (art. 9º, § 1º da Lei nº 13.300/2016); as normas relativas a tutela específica das obrigações de fazer previstas nos artigos 497 a 501 do CPC/2015; as normas atinentes a coisa julgada (art. 502 a 508 do CPC/2015) com a ressalva dos efeitos produzidos pela sentença proferida no mandado de segurança coletivo (art. 22 da Lei nº 12.016/2009) e no

358


mandado de injunção coletivo (art. 9º, § 1º e § 2º e art. 13 da Lei nº 13.300/2016). As normas relativas ao cumprimento de sentença (arts. 513 a 538), da parte especial do Código de Processo Civil de 2015, são aplicáveis: 1) a ação popular para obtenção do pagamento das perdas e danos pelos responsáveis (art. 11 da Lei nº 4.717/65) e das custas e demais despesas processuais (art. 12 da Lei nº 4.717/65), bem como o cumprimento de sentença que estipule obrigação de fazer ou de não fazer; 2) a ação civil pública para o cumprimento da prestação devida ou a cessação da atividade nociva conforme determinado na decisão judicial (art. 11 da Lei nº 7.347/85), e para o pagamento da condenação em dinheiro fixada na sentença (art. 13 da Lei nº 7.437/85). No caso do mandado de segurança a autoridade coatora é comunicada pelo juiz para dar cumprimento ao comando contido na sentença sob pena de incorrer no crime de desobediência (art. 13 c/c art. 26 da Lei nº 12.016/2009), e no mandado de 359


injunção em que se reconhece a mora legislativa a decisão judicial é comunicada ao poder ou órgão responsável pela edição da norma para que supra a omissão no prazo fixado (art. 8º da Lei nº 13.300/2016), não sendo aplicáveis as normas referentes a execução forçada do Código de Processo Civil de 2015. No

que

diz

respeito

aos

recursos

disciplinados nos artigos 994 a 1.043 do Código de Processo Civil de 2015, destacamos o seguinte: 1) a Lei nº 4.717/65 diz que a sentença é o ato do juiz que deverá por termo ao processo da ação popular (art. 11, 12, 13, 16, 18 e 19), nada mencionando acerca do recurso cabível, motivo pelo qual as disposições do CPC/2015 sobre o recurso de apelação (arts. 1.009 a 1.014) são aplicáveis

subsidiariamente;

o

agravo

de

instrumento é expressamente previsto no § 1º do artigo 19 da Lei nº 4.717/65, razão pela qual devem ser aplicados os artigos 1.015 a 1.020 do CPC/2015. Afora estas especificidades da Lei da ação popular não há a regulamentação sobre os 360


recursos cabíveis, razão pela qual o Código de Processo Civil de 2015 deve suprir esta lacuna, principalmente pela aplicação subsidiária dos artigos 994 a 1.008, com a ressalva da possibilidade de interposição de recurso, por qualquer cidadão e pelo Ministério Público, das sentenças e decisões contrárias ao autor da ação. Deste modo, além da apelação e do agravo de instrumento são cabíveis na ação popular os embargos de declaração (art. 1.022 a 1.026 do CPC/2015), o agravo interno contra a decisão monocrática do relator (art. 1.021 do CPC/2015), o recurso especial e o recurso extraordinário (art. 102, inc. III e art. 105, inc. III da CRFB/88 e art. 1.029 a 1.035 do CPC/2015), o agravo em recurso especial e extraordinário (art. 1.042 do CPC/2015) e os embargos de divergência (art. 1.043 e 1.044 do CPC/2015). Isto porque a ação popular segue o procedimento comum do CPC/2015 e não há impedimentos na lei que a regula; 2) do mesmo modo que na ação popular na ação civil pública o juiz põe termo ao processo 361


mediante sentença (art. 16 da Lei nº 7.347/85), cabendo a interposição do recurso de apelação (arts. 1.009 a 1.014 do CPC/2015). Há previsão do recurso de agravo de instrumento (1.015 a 1.020) para as decisões que concederem mandado liminar (art. 12 da Lei nº 7.347/85), aplicando-se também para as demais hipóteses arroladas no artigo 1.015, inc. I, II, IV, V, VI, VII, VIII, IX e XI. Além da apelação e do agravo de instrumento são cabíveis na ação civil pública os embargos de declaração (art. 1.022 a 1.026 do CPC/2015), o agravo interno contra a decisão monocrática do relator (art. 1.021 do CPC/2015), o recurso especial e o recurso extraordinário (art. 102, inc. III e art. 105, inc. III da CRFB/88 e art. 1.029 a 1.035 do CPC/2015), o agravo em recurso especial e extraordinário (art. 1.042 do CPC/2015) e os embargos de divergência (art. 1.043 e 1.044 do CPC/2015). Isto porque a ação civil pública segue o procedimento comum do CPC/2015 e não há impedimentos na lei que a regula;

362


3)

a

Lei

12.016/2009

dispõe

expressamente que da sentença que concede ou denega o mandado de segurança e da sentença que indefere a petição inicial cabe apelação (art. 14 e art. 10, § 1º) que é regulada nos artigos 1.009 a 1.014 do CPC/2015, sendo assegurado o direito de recorrer a autoridade coatora (art. 14, § 2º); sobre o cabimento do recurso especial e extraordinário das decisões proferidas em única ou última instância (art. 102, inc. III e art. 105, inc. III da CRFB/88 e art. 1.029 a 1.035 do CPC/2015), nos casos legalmente previstos, e o recurso ordinário (art. 102, inc. II, al. a e art. 105, inc. II, al. b da CRFB/88 e art. 1.027 e 1.028 do CPC/2015) quando a ordem for denegada (art. 18), bem como do agravo de instrumento da decisão do juiz que conceder ou denegar liminar (art. 7º, § 1º). São cabíveis, também, o agravo de instrumento nas hipóteses do artigo 1.015, inc. I, II, V, VII, VIII, e IX, o agravo interno contra decisão monocrática do relator (art. 1.021 do CPC/2015), o agravo interno em recurso especial e extraordinário (art. 1.042 do 363


CPC/2015), os embargos de divergência (art. 1.043 e 1.044 do CPC/2015) e os embargos de declaração (art. 1.022 a 1.026 do CPC/2015); 4) a lei nº 13.300/2016 dispõe que a decisão final no mandado de injunção é a sentença (art. 6º, caput e art. 13) ou acórdão quando se tratar de competência originária ou recursal dos tribunais (art. 102, inc. I, al. q e art. 105, inc. I, al. h da CRFB/88), cabendo a interposição do recurso de apelação (art. 1.009 a 1.014 do CPC/2015), do recurso ordinário (art. 102, inc. II, al. a da CRFB/88 e art. 1.027 e 1.028 do CPC/2015), do recurso especial e extraordinário (art. 105, inc. III e art. 102, inc. III da CRFB/88 e art. 1.029 a 1.025 do CPC/2015), do agravo interno contra decisão monocrática do relator (art. 1.021 do CPC/2015), do

agravo

interno

em

recurso

especial

e

extraordinário (art. 1.042 do CPC/2015), do agravo de instrumento nas hipóteses do artigo 1.015, inc. I, II, V, VII, VIII e IX, dos embargos de divergência (art. 1.043 e 1.044 do CPC/2015) e dos embargos de declaração (art. 1.022 a 1.026 do CPC/2015). 364


São aplicáveis ao mandado de segurança, mandado de injunção, ação popular e ação civil pública o dever de observância pelos juízes e tribunais das decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade; dos enunciados de súmula vinculante; dos acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos; dos enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional e da orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados (art. 927 c/c art. 489, § 1º do CPC/2015), bem como os artigos 929 a 946 do Código de Processo Civil de 2015 que dispõem sobre a ordem dos

processos

no tribunal,

observando-se as disposições do artigo 15 da Lei nº 12.016/2009 sobre a suspensão dos efeitos da liminar e da sentença no mandado de segurança pelo presidente do tribunal, e do artigo 12 da Lei nº

365


7.347/85 sobre a suspensão dos efeitos da liminar pelo presidente do tribunal na ação civil pública. Também são aplicáveis subsidiariamente ao mandado de segurança, mandado de injunção, ação popular e ação civil pública, os dispositivos do Código de Processo Civil de 2015 que tratam do conflito de competência (arts. 951 a 959), pois pode ocorrer que dois ou mais juízes se declarem competentes ou incompetentes para julgar qualquer das ações constitucionais, bem como pode surgir controvérsia sobre a necessidade de reunião de processos (conexão e continência) para julgamento conjunto (art. 66 do CPC/2015); da ação rescisória (arts. 966 a 975), tendo em conta que as decisões de mérito proferidas nas ações constitucionais fazem coisa julgada (art. 502 do CPC/2015, art. 22 da Lei nº 12.016/2009, art. 13 da Lei nº 13.300/2016, art. 16 da Lei nº 7.437/85 e art. 18 da Lei nº 4.717/65); do incidente de argüição de inconstitucionalidade (arts. 948 a 950), quando houver discussão incidente sobre a inconstitucionalidade de lei ou de ato normativo nas ações constitucionais de 366


competência originária dos tribunais ou quando em grau recursal; do incidente de resolução de demandas CPC/2015),

repetitivas pois

(arts.

pode

976

ocorrer

a

987

nas

do

ações

constitucionais a efetiva repetição de processos que contenham controvérsia sobre a mesma questão de direito e que representem risco de ofensa à isonomia e a segurança jurídica, sendo que a tese jurídica adotada no incidente será aplicada a todos os processos individuais e coletivos que versem sobre idêntica questão de direito e que tramitem na área de jurisdição do respectivo tribunal, inclusive àqueles que tramitem nos juizados especiais do respectivo Estado ou região (art. 985, inc. I, do CPC/2015); e do incidente de assunção de competência (art. 947) quando no julgamento de recurso, remessa necessária ou de processo de competência originária do tribunal, o objeto do mandado de segurança, mandado de injunção, ação popular ou da ação civil pública envolver relevante questão de direito, com repercussão social, sem que haja a repetição de processos sobre a mesma 367


matéria (requisito do incidente de resolução de demandas repetitivas), sendo um mecanismo de uniformização da jurisprudência dos tribunais visto que o acórdão proferido no incidente vinculará os respectivos juízes e órgãos fracionários. Por fim, é aplicável a prioridade de tramitação do artigo 1.048 do CPC/2015 para às ações de mandado de segurança, mandado de injunção e ação popular, em qualquer juízo ou tribunal, em que figure como parte ou interessado pessoa com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos, ou portadora de doença grave, assim compreendida qualquer das enumeradas no artigo 6º, inciso XIV, da Lei no 7.713, de 22 de dezembro de 1988, sem prejuízo da prioridade estipulada no artigo 20 da Lei nº 12.016/2009.

368


OS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS NO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015 Sumário: 1. Introdução. 2. Honorários advocatícios. 2.1. Critérios para a determinação dos honorários advocatícios. 2.1.1. Critérios para a determinação dos honorários advocatícios nas causas em que a Fazenda Pública for parte. 2.1.2. Fixação equitativa. 2.2. Direito aos honorários. 3. Caução para pagamento dos honorários advocatícios pelos residentes no exterior. 4. Honorários advocatícios no cúmulo subjetivo de 369


demandas. 5. Propositura de nova ação e a obrigatoriedade do pagamento dos honorários fixados na ação anteriormente ajuizada. 6. Direito intertemporal. 7. Conclusão.

1. Introdução O Código de Processo Civil de 2015 trata nos artigos 83, 85, 86, 87, 90 e 92 das regras gerais dos honorários advocatícios devidos em razão da sucumbência,

contendo

inovações

como

a

sistemática de fixação dos honorários devidos nas causas em que a Fazenda Pública figurar como parte; a alteração da base de cálculo sobre a qual incidirá o percentual fixado pelo juiz, que poderá ser o valor da condenação, o valor do proveito econômico obtido ou o valor da causa; o direito dos advogados públicos aos honorários advocatícios; a possibilidade de majoração dos honorários em grau recursal em razão do trabalho adicional do advogado

nesta

compensação

dos

instância; honorários

a

vedação em

caso

de de

sucumbência recíproca; a redução dos honorários pela metade quando houver o reconhecimento da

370


procedência do pedido seguido do cumprimento espontâneo da prestação reconhecida, dentre outros. Neste texto abordaremos as inovações trazidas pelo novo CPC, bem como as regras do CPC/73 (revogado) que encontram correspondência na nova lei processual. As análises são pertinentes aos artigos da Seção III, do Capítulo II, do Título I, do Livro III do Código, que dispõem sobre os honorários advocatícios. 2. Honorários advocatícios A semelhança do que dispunha o artigo 20 do revogado CPC/73 e o artigo 64 do CPC/39, o artigo 85 do CPC atual determina que na decisão final do processo deverá constar a condenação da parte vencida na obrigação de pagar os honorários ao advogado da parte vencedora, sendo um elemento necessário da sentença ao lado dos demais elencados no artigo 489 do CPC/2015, não se podendo falar em julgamento em quantidade superior a pedida (art. 492 do CPC/2015) caso não 371


haja na petição inicial o pedido de condenação em honorários advocatícios (art. 319, inc. IV, do CPC/2015). Este é o entendimento firmado pelo Supremo

Tribunal

Federal

na

súmula

de

jurisprudência nº 256. Por outro lado, caso a decisão transitada em julgado seja omissa quanto ao direito aos honorários advocatícios ou ao seu valor é cabível a propositura de ação autônoma para sua definição e cobrança, nos termos do § 18 do artigo 85 do Código, contrariando o entendimento do Superior Tribunal de Justiça consolidado na súmula de jurisprudência nº 453, que vedava a cobrança dos honorários advocatícios em execução ou em ação própria quando omitidos em decisão transitada em julgado. A inovação trazida pelo Código se justifica tendo em conta que a condenação da parte vencida ao pagamento dos honorários ao advogado da parte vencedora é elemento que deve constar da sentença, e a sua omissão embasa o ajuizamento de ação própria apenas para a definição e cobrança de um direito obtido em razão da sucumbência da 372


parte adversa. Por sua vez, a omissão da condenação em honorários na decisão transitada em julgado impede a sua cobrança em execução ante a falta de título executivo. A regra inscrita no artigo 85 é de que a parte vencida deve arcar com o custo do processo, que inclui o pagamento dos honorários da parte vencedora para o fim de recompor integralmente o direito da parte que não deu causa ao ajuizamento da demanda, consagrando a sucumbência como principal indicador do princípio da causalidade que atribui a responsabilidade pelo custo do processo aquele que por ação ou omissão der causa a instauração da relação processual (ORLÂNDO VENÂNCIO DOS SANTOS FILHO. O ônus do pagamento dos honorários advocatícios e o princípio da causalidade, Revista de Informação Legislativa, a. 35, n. 137, jan/mar, Brasília, pág. 31). O

princípio

da

causalidade

é

expressamente previsto no próprio Código quando diz que nos casos de perda do objeto do processo, 373


os honorários são devidos por quem deu causa a instauração da relação processual (§ 10 do art. 85). Amparando-se na causalidade o Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que nos embargos de terceiro quem deu causa à constrição indevida deve arcar com os honorários advocatícios (súmula de jurisprudência nº 303). Evidentemente que há exceções a regra como o caso da ação de mandado de segurança em que não cabe a condenação ao pagamento dos honorários advocatícios, nos termos do artigo 25 da lei nº 12.016/2009, súmula de jurisprudência nº 512 do Supremo Tribunal Federal e súmula de jurisprudência nº 105 do Superior Tribunal de Justiça; o caso firmado na súmula de jurisprudência nº 421 do Superior Tribunal de Justiça em que não são devidos honorários advocatícios para a Defensoria Pública quando ela atua contra a pessoa jurídica de direito público da qual ela é parte integrante; a hipótese de não cabimento de condenação em honorários advocatícios na decisão que rejeita a impugnação ao cumprimento de 374


sentença (art. 525 do CPC/2015) por ter natureza de

mero

entendimento

incidente

processual,

consolidado

na

conforme súmula

de

jurisprudência nº 519 do Superior Tribunal de Justiça; no cumprimento de sentença contra a Fazenda

Pública

que

enseje

expedição

de

precatório quando não houver impugnação (§ 7º do art. 85), não serão devidos honorários; nos juizados especiais em que a sentença de primeiro grau não condenará o vencido em honorários de advogado, ressalvados os casos de litigância de má-fé (art. 55 da lei nº 9.099/90 e art. 1º da lei nº 10.259/2001) e a

dispensa

do

pagamento

das

verbas

de

sucumbência prevista no parágrafo único do artigo 129 da lei nº 8.213/91, concedida ao segurados nas ações relativas a acidentes do trabalho (súmula nº 110 do STJ), que não exclui o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) da obrigação de pagar as verbas de sucumbência nas ações acidentárias (súmula nº 111 do STJ e súmula nº 234 do STF). O § 1º do artigo 95 do CPC/2015, por sua vez, dispõe expressamente que são devidos os 375


honorários advocatícios na reconvenção proposta pelo réu para manifestar pretensão própria, que tem natureza de ação autônoma conexa com a ação principal ou com o fundamento da defesa (art. 343 do CPC/2015); no cumprimento de sentença (art. 523, § 1º, do CPC/2015) provisório ou definitivo, inclusive na decisão que acolher a impugnação extinguindo o cumprimento de sentença; na execução para cobrança de título extrajudicial (art. 827 do CPC/2015), resistida ou não, bem como na decisão que julga os embargos à execução que tem natureza de ação autônoma (§ 13 do art. 85) e na decisão que acolhe a exceção de pré-executividade para extinguir o processo de execução; e nos recursos interpostos, cumulativamente. Deste modo, a sucumbência se aplica a todos os tipos de processo em primeiro ou segundo grau

de

jurisdição

ou

em

ambos,

independentemente da natureza da sentença ou acórdão, se de mérito ou apenas terminativa. Por esta razão, que no final do § 1º consta a palavra cumulativamente

(que

significa

de

forma 376


acumulada, conjunta), pois a condenação ao pagamento em honorários do advogado da parte vencedora em um processo de determinada natureza se acumula com a condenação ao pagamento da verba honorária em processo de outra natureza, como é o caso dos honorários fixados no processo principal e os fixados na reconvenção, na ação de execução e nos embargos à execução a ela opostos, no processo de conhecimento e no posterior cumprimento de sentença. O que significa dizer que a soma dos percentuais

de

honorários

decorrente

da

condenação em mais de um processo não fica limitada ao percentual de 20% (vinte por cento), como bem destacado no AgRg no REsp nº 1285656/RJ. A interposição de recurso para instância superior possibilita o reexame da matéria decidida objeto do recurso, podendo haver a reforma da decisão recorrida, total ou parcial, a manutenção da decisão com o desprovimento do recurso e a anulação da decisão atacada. Como o julgamento 377


proferido

pelo

Tribunal

substitui

a

decisão

impugnada no que tiver sido objeto de recurso (art. 1.008 CPC/2015), deve o acórdão dispor sobre a sucumbência mantendo ou invertendo os encargos, ou ainda majorando ou diminuindo o valor da condenação a título de honorários advocatícios. Deste modo, se o Tribunal dá provimento ao recurso de apelação para reformar a decisão recorrida na sua totalidade a condenação em honorários se inverte recaindo sobre a parte antes vencedora, e se o provimento for parcial o valor da condenação em honorários deve ser alterado para se ajustar a nova decisão. No caso de omissão na decisão recorrida deve o acórdão dispor sobre as verbas de sucumbência, na medida em que estas devem

ser

independentemente

fixadas de

pelo pedido,

magistrado por

expressa

disposição legal. Inovação trazida pelo § 11 do artigo 85 é a possibilidade do tribunal, ao julgar recurso, de majorar os honorários fixados na decisão recorrida levando em conta o trabalho adicional realizado em 378


grau recursal, observando o disposto nos §§ 2º a 6º do artigo 85, sendo vedado ultrapassar o limite de 20% (vinte por cento) para a fase de conhecimento. Estes honorários são cumuláveis com multas e outras sanções processuais, inclusive as previstas no artigo 77 deste Código. Neste caso, o Tribunal não reforma a decisão para majorar os honorários por entender que estes não foram fixados no patamar adequado na decisão recorrida, mas sim se verificar que o advogado teve um trabalho adicional em grau recursal que justifique a majoração dos honorários, sendo, portanto, um fato posterior a sentença. Evidentemente que o acórdão deverá demonstrar a existência dos critérios elencados no § 2º do artigo 85. Deste modo, pode ocorrer o desprovimento do recurso com a majoração dos honorários fixados na decisão recorrida em razão do trabalho realizado pelo advogado da parte vencedora na instância recursal. Evidentemente que se a decisão recorrida já tiver estipulado

a

condenação

ao

pagamento

de

honorários advocatícios no percentual máximo de 379


20% (vinte por cento), não caberá a majoração em segundo grau de jurisdição (§ 2º c/c § 11 do art. 85). Nos termos da súmula de jurisprudência nº 517 do Superior Tribunal de Justiça “são devidos honorários

advocatícios

no

cumprimento

de

sentença, haja ou não impugnação, depois de escoado o prazo para pagamento voluntário, que se inicia após a intimação do advogado da parte”. O Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que nas execuções individuais procedentes de sentença genérica proferida em ações coletivas é cabível a condenação da Fazenda Pública ao pagamento de honorários advocatícios, ainda que não embargada a execução (súmula de jurisprudência nº 345). Também decidiu que “a remessa oficial devolve ao Tribunal o reexame de todas as parcelas da condenação suportadas pela Fazenda Pública, inclusive dos honorários de advogado” (súmula de jurisprudência nº 325 do STJ).

380


O Supremo Tribunal Federal consolidou o entendimento de que são devidos honorários de advogado sempre que for vencedora a parte beneficiária da gratuidade de justiça (súmula de jurisprudência nº 450). Por sua vez se a parte beneficiária for a parte vencida a concessão da gratuidade não afasta a responsabilidade do beneficiário pelas despesas processuais e pelos honorários

advocatícios

decorrentes

de

sua

sucumbência, ficando as obrigações decorrentes de sua sucumbência sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos 5 (cinco) anos subseqüentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se com o transcurso do prazo qüinqüenal (§ 2º e § 3º do art. 98 do CPC/2015 que possui regra semelhante ao do revogado art. 11 da lei nº 1.060/50), sendo aceita a condição suspensiva pelo Superior Tribunal de Justiça (AgRg no AREsp nº 271767/AP, Min. 381


NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, 1º Turma, DJe 08/05/2014). 2.1. Critérios para a honorários advocatícios

determinação

dos

O § 2º do artigo 85 do CPC/2015 possui redação mais completa que a do § 3º do artigo 20 do revogado CPC/73, pois determina que os honorários do advogado sejam fixados entre o mínimo de 10 (dez) e o máximo de 20 (vinte) por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido com o êxito da ação ou sobre o valor atualizado da causa quando não for possível mensurá-lo. Portanto, o Código estipula um limite mínimo e máximo do percentual a ser arbitrado pelos magistrados, na sentença ou no acórdão, a título de pagamento de verba honorária. A base sobre a qual deverá incidir os percentuais fixados é que dependerá do tipo de decisão que foi proferida pelo juiz, se de cunho condenatório, executivo ou apenas declaratório, se aprecia o mérito ou se é apenas terminativa do 382


processo. Portanto, se o valor da condenação é líquido os honorários evidentemente incidirão sobre ele mediante a aplicação do percentual fixado na decisão. Diferentemente ocorre quando não há condenação, como nas ações declaratórias, ou a condenação refere-se a obrigações de fazer ou não fazer ou de entregar coisa certa, nestes casos o percentual deverão incidir sobre o proveito econômico obtido ou sobre o valor da causa atualizado. Conforme determina o artigo 291 do CPC/2015 a toda causa será atribuído um valor certo,

ainda

que

não

tenha

conteúdo

economicamente aferível. Esse valor deve ser indicado pelo autor na petição inicial ou pelo réu na reconvenção (art. 292 do CPC/2015), ou ainda pelo juiz na decisão que julga a impugnação ao valor da causa (art. 293 do CPC/2015). Embora o CPC/73 tivesse determinado a aplicação do percentual da verba honorária sobre o valor da condenação, a jurisprudência já admitia a possibilidade de fixação

383


do percentual dos honorários sobre o valor da causa devidamente corrigido (súmula 14 do STJ). O

proveito

econômico

obtido

pode

corresponder ao valor da causa, como nos casos das ações enumeradas no artigo 292 do Código, ou não, pois será atribuído um valor a causa ainda que não tenha conteúdo econômico aferível. Neste segundo caso o proveito econômico será o estipulado na sentença ou acórdão em razão da expressão financeira do êxito ou insucesso da demanda, como, por exemplo, o proveito econômico obtido com a diferença do valor cobrado e aquele que se verificou efetivamente devido, e o proveito obtido com a improcedência de uma ação que pleiteava um direito de cunho patrimonial. Neste sentido é a súmula de jurisprudência nº 617 do Supremo Tribunal Federal ao dispor que “a base de cálculo dos honorários de advogado em desapropriação é a diferença entre a oferta e a indenização, corrigidas ambas

monetariamente”

e

a

súmula

de

jurisprudência nº 141 do Superior Tribunal de Justiça que tem praticamente o mesmo enunciado. 384


Fixada a base sobre a qual deve incidir o percentual, cumpre ao juiz estipular o percentual levando em conta o grau de zelo do profissional, o lugar de prestação do serviço, a natureza e a importância da causa e o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço, independentemente do conteúdo da decisão (§ 6º do art. 85 do CPC/2015). Esses critérios são subjetivos devendo o juiz apreciá-los e expor as razões pelas quais aplica cada um deles. Portanto, deve o juiz apreciar na fixação do percentual se o advogado atendeu em tempo razoável as determinações contidas nas intimações, se evitou o excesso de manifestações ou manifestações inúteis nos autos do processo contribuindo para a celeridade, se procurou fornecer ao juiz todos os elementos necessários para o julgamento da causa, se teve que se deslocar em distâncias consideráveis para comparecer em juízo, a complexidade da causa pois existem demandas repetidas, outras que não demandam produção de outras provas que não a

385


documental, e outras que o objeto é complexo e exige ampla instrução probatória, dentre outros. Ao arbitrar os honorários na sentença ou no acórdão o magistrado deve fazê-lo com moderação e de forma motivada, como dispunha expressamente o CPC/39 no § 1º do artigo 64, por ser decorrência do dever de fundamentação das decisões judiciais (art. 93, inc. IX da CRFB/88 e art. 11 do CPC/2015) e de observância do dever de aplicar o ordenamento jurídico com razoabilidade e proporcionalidade (art. 8º do CPC/2015). Nos casos de necessidade de liquidação de sentença (art. 509 do CPC/2015) a base de cálculo sobre a qual incidirá o percentual fixado a título de verba honorária será determinada na própria liquidação, e se depender apenas de cálculo matemático o valor dos honorários será apresentado no demonstrativo de débito para cumprimento de sentença (§ 2º do art. 509 do CPC/2015). O Código institui fórmula própria para a fixação da base de cálculo sobre a qual incidirá o percentual do § 2º do artigo 85, nas ações de 386


indenização (art. 927 do Código Civil) por ato ilícito (art. 186 a 188 do Código Civil), que é a soma das prestações vencidas acrescida de 12 (doze) prestações vincendas (§ 9º do art. 85 do CPC/2015). Evidentemente que esta regra somente se aplica para as indenizações consistentes em prestações de alimentos (art. 948, inc. II e 950 do Código Civil) e não para toda e qualquer indenização por ato ilícito que em regra é fixada de acordo com a extensão do dano em pagamento único. Quando os honorários forem fixados em quantia certa, os juros de mora incidirão a partir da data do trânsito em julgado da decisão em que forem arbitrados (§ 16 do art. 85 do CPC/2015). Trata-se de positivação da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que se firmou no sentido de que é legítima a inclusão de juros de mora na condenação em honorários, ainda que não solicitado na inicial ou não previsto na sentença, fixando o termo inicial da sua incidência a partir da mora que ocorre com o trânsito em julgado da 387


decisão (REsp nº 771029/MG, Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, DJe 09/11/2009). No procedência

caso do

de pedido

reconhecimento com

da

cumprimento

espontâneo da prestação devida, como o pagamento de quantia em dinheiro, a realização de obrigação de fazer, a entrega da coisa e outros, os honorários são reduzidos pela metade, pois evita-se a execução forçada (§ 4º do art. 90 do CPC/2015). Neste caso, o reconhecimento tem que ser total e não apenas parcial hipótese em que se aplica o artigo 86 do CPC/2015. É uma forma de estimular a solução da demanda reduzindo os encargos com honorários suportados pela parte que reconheceu o pedido e cumpriu

a

prestação

devida

evitando

o

prolongamento desnecessário do processo.

2.1.1. Critérios para a determinação dos honorários advocatícios nas causas em que a Fazenda Pública for parte Nas causas em que a Fazenda Pública for parte, como autora ou ré, os percentuais são fixados 388


nos incisos I a V do § 3º do artigo 85 do CPC/2015 e a base de cálculo é o valor da condenação ou o valor do proveito econômico obtido. Não havendo condenação

principal

e

não

sendo

possível

mensurar o proveito econômico, a condenação ao pagamento em honorários ao advogado da parte vencedora será um percentual sobre o valor atualizado da causa (§ 4º, inc. III, do art. 85 do CPC/2015). Portanto, o próprio Código estipula o percentual a ser aplicado nas condenações ao pagamento de honorários advocatícios, sendo de 10% a 20% sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido até 200 (duzentos) salários mínimos; de 8% a 10% sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 200 (duzentos) salários mínimos até 2.000 (dois mil) salários mínimos; de 5% a 8% sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 2.000 (dois mil) salários mínimos até 20.000 (vinte mil) salários mínimos; de 3% a 5% sobre o valor da condenação ou do proveito 389


econômico obtido acima de 20.000 (vinte mil) salários mínimos até 100.000 (cem mil) salários mínimos e de 1% a 3% sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 100.000 (cem mil) salários mínimos. O percentual sobre o valor atualizado da causa não é determinado no Código, de modo que o magistrado deverá fixá-lo nos moldes do § 2º e § 6º do artigo 85 do CPC/2015. Tanto na fixação dos percentuais sobre o valor da condenação como sobre o valor do proveito econômico obtido, deve o magistrado observar o disposto no § 2º e § 6º do artigo 85 do CPC/2015, para determinar o percentual que irá incidir sobre cada faixa de valores enumerados nos incisos I a V do § 3º do artigo 85 do CPC/2015, de forma motivada e moderada. A razão de ser do § 3º do artigo 85 do CPC/2015 é o de evitar as controvérsias que existiam na vigência do CPC/73 (art. 20, § 4º), em que os honorários devidos pela Fazenda Pública eram arbitrados por eqüidade gerando muitas discussões sobre os percentuais a serem aplicados, 390


devendo-se destacar que os valores em salário mínimo dos incisos I a V do § 3º do artigo 85 do CPC/2015 apenas servem como parâmetro para a fixação do percentual que será aplicado sobre o valor da condenação e do proveito econômico obtido, nada tendo que ver com a vedação da condenação em honorários advocatícios em salários mínimos. Portanto, os percentuais são escalonados de acordo com o valor da condenação e do proveito econômico obtido dentro de determinadas faixas de valores representados por salários mínimos. Nos casos de necessidade de liquidação de sentença (art. 509 do CPC/2015) a definição do percentual, nos termos previstos nos incisos I a V do § 3º do artigo 85 do CPC/2015, somente ocorrerá quando liquidado o julgado e apurada sua base de cálculo, e se depender apenas de cálculo matemático os percentuais são aplicados desde logo. Será considerado o salário mínimo vigente quando prolatada a sentença ou o que estiver em vigor na data da decisão de liquidação.

391


Dispõe o § 7º do artigo 85 do CPC/2015 que a Fazenda Pública fica dispensada do pagamento

de

honorários

advocatícios

no

cumprimento de sentença, sujeita a precatório, quando não opuser impugnação, desde que não tenha sido impugnada (art. 535, § 3º, inc. I do CPC/2015).

Estes

honorários

são

aqueles

acrescidos ao débito cobrado em razão da condenação em decisão judicial, quando não há o pagamento voluntário após a intimação para fazêlo. Como os pagamentos pela Fazenda Pública são feitos por meio de precatório (art. 100 da CRFB/88),

não

havendo

impugnação

ao

cumprimento de sentença passa-se de imediato ao pagamento mediante a expedição de precatório sem necessidade de realização de atos executivos como a penhora, por isso não são devidos os honorários. Deve se ressaltar que o termo Fazenda Pública compreende as pessoas jurídicas de direito público, União Federal, Estados, Distrito Federal, Municípios

e

suas

respectivas

autarquias

e

fundações (art. 41 do Código Civil), não abarcando 392


as empresas públicas e as sociedades de economia mista instituídas como pessoas jurídicas de direito privado (art. 173, inc. II, da CRFB/88 c/c art. 3º e 4º da lei nº 13.303/2016). Para estas últimas a forma de fixação dos honorários é a do § 2º do artigo 85 do CPC/2015. 2.1.2. Fixação equitativa Nas causas em que o proveito econômico for irrisório ou inestimável, ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo, o juiz fixará o valor dos honorários por apreciação eqüitativa, sempre observando os critérios estabelecidos nos incisos do § 2º do artigo 85 do CPC/2015. Nestes casos o magistrado não fica adstrito aos percentuais mínimos de 10% e máximos de 20%, podendo arbitrar um valor determinado, mas sempre com observância do dever de motivação e moderação. O Código confere ao juiz uma relativa liberdade na fixação dos honorários nos casos descritos no § 8º do artigo, para que se possa recompensar adequadamente o advogado pelo serviço prestado. 393


Importante salientar que é vedada a fixação dos honorários advocatícios em salários mínimos, por expressa previsão constitucional (art. 7º, inc. IV). Neste sentido é a súmula de jurisprudência nº 201 do Superior Tribunal de Justiça. 2.2. Direito aos honorários O Código dispõe expressamente que os honorários constituem direito do advogado e têm natureza alimentar, com os mesmos privilégios dos créditos oriundos da legislação do trabalho, vedando-se

a

compensação

em

caso

de

sucumbência parcial (§ 14 do art. 85 do CPC/2015), podendo, ainda, o advogado requerer que o pagamento dos honorários seja efetuado em favor da sociedade que integra na qualidade de sócio (§ 15 do art. 85 do CPC/2015). Assim, a lei processual reitera o que já dispunha o artigo 22, 23 e 24 da lei nº 8.906/94, que institui o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). 394


A súmula vinculante nº 47 do Supremo Tribunal Federal dispõe que: “Os honorários advocatícios

incluídos

na

condenação

ou

destacados do montante principal devido ao credor consubstanciam verba de natureza alimentar cuja satisfação ocorrerá com a expedição de precatório ou requisição de pequeno valor, observada ordem especial restrita aos créditos dessa natureza”. Destacou-se no voto do RE nº 564132/RS (precedente) que “a verba honorária consubstancia direito autônomo, podendo mesmo ser executada em separado. Não se confundindo com o crédito principal que cabe à parte, o advogado tem o direito de executar seu crédito nos termos do disposto nos artigos 86 e 87 do ADCT”. Os honorários serão devidos mesmo quando o advogado atuar em causa própria, pois nada obstante figure como parte também exerce a atividade de advogado que é indispensável à administração da justiça (art. 133 da CRFB/88), devendo ser recompensado pelo seu trabalho e pelo

395


tempo dedicado ao processo, em razão da aplicação do princípio da causalidade. O § 19 do artigo 85 do CPC/2015 atende a uma antiga reivindicação dos advogados públicos que é a de receber os honorários de sucumbência. Com esta disposição fica resolvido que os honorários advocatícios de sucumbência, quando vencedor o ente público, constitui direito autônomo do advogado público que o representa não devendo integrar o patrimônio público do ente representado. Esta regra vale para a advocacia pública de todas as pessoas jurídicas de direito público, União Federal, Estados, Distrito Federal e Municípios, que houverem instituído as suas procuradorias ou advocacias gerais. A Advocacia Geral da União é a instituição que, diretamente ou através de órgão vinculado,

representa

a

União,

judicial

e

extrajudicialmente (art. 131 da CRFB/88) e os Estados, Distrito Federal e Municípios serão representados judicialmente por suas Procuradorias Estaduais e Municipais (art. 132 da CRFB/88).

396


O Código diz que a forma de percepção dos honorários deverá ser regulamentada por lei editada pela respectiva pessoa de direito público a qual a advocacia pública faça parte integrante. No que se refere a advocacia pública no âmbito da União Federal a lei que regula a forma de percepção dos honorários é a de nº 13.327/16. No caso de omissão legislativa os advogados públicos estaduais

e

municipais

podem

pleitear

o

recebimento dos honorários de sucumbência, devidos a partir das decisões posteriores a data de início de vigência deste Código, nos moldes da lei federal nº 13.327/16, tendo em conta que o direito ao recebimento dos honorários já existe (§ 14 e § 19 do art. 85) e a ausência de norma legal que disponha sobre a sua forma de recebimento não pode ser obstáculo ao exercício deste direito do advogado público. O que o Supremo Tribunal Federal tem examinado e definido (RE nº 634576/SP), refere-se à submissão dos honorários de sucumbência ao teto remuneratório do artigo 37, inc. XI da CRFB/88, 397


do que se pode razoavelmente deduzir que a corte lhes atribui natureza remuneratória, passível de ser percebida pelos advogados públicos, desde que não ultrapasse o teto remuneratório. Alias o próprio Código (§ 14 do artigo 85 do CPC/2015) diz que os honorários

de

sucumbência

têm

natureza

remuneratória, portanto, alimentar. 3. Caução para pagamento dos honorários advocatícios pelos residentes no exterior No artigo 83 do CPC/2015 estão reunidas as regras contidas nos artigos 835 a 838 do revogado Código de Processo Civil de 1973, que dispunham sobre a obrigatoriedade de prestação de caução como garantia do pagamento das custas e dos honorários da parte contrária. Portanto, permanece a obrigatoriedade de prestação de caução pelo autor, brasileiro ou estrangeiro, residente fora do Brasil, desde que não tenha bens suficientes para assegurar as verbas de sucumbência. Estão dispensados do oferecimento de

caução

a

execução

fundada

em

título 398


extrajudicial e o cumprimento de sentença, a reconvenção e quando houver tratado internacional prevendo a dispensa. Atualmente,

existem

o

Acordo

de

Cooperação e Assistência Jurisdicional em Matéria Civil, Comercial, Trabalhista e Administrativa entre os Estados Partes do Mercosul e a República da Bolívia e a República do Chile, assinado em Buenos Aires em 5 de julho de 2002, aprovado pelo Congresso

Nacional

por

meio

do

Decreto

Legislativo n.º 1.021, de 24 de novembro de 2005 e promulgado com o Decreto n.º 6.891, de 2 de julho de 2009, o qual dispõe em seu artigo 4º que “nenhuma caução ou depósito, qualquer que seja sua denominação, poderá ser imposta em razão da qualidade de nacional, cidadão ou residente permanente ou habitual de outro Estado Parte”. Com igual efeito tem-se o Tratado Relativo à Cooperação Judiciária e ao Reconhecimento e Execução de Sentenças em Matéria Civil, subscrito pela República Federativa do Brasil e pela República Italiana, promulgado pelo Decreto n.º 399


1.476, de 2 de maio de 1995, cujo item 9.1 estipula a dispensa aos residentes ou domiciliados em quaisquer dos Estados signatários a prestação de caução. O Acordo de Cooperação em Matéria Civil entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República Francesa, celebrado em Paris, em 28 de maio de 1996, promulgado pelo Decreto n.º 3.958, de 12 de setembro de 2000, o qual preceitua em seu artigo 5º que “aos nacionais de cada um dos dois Estados não pode ser imposto, no território do outro, nem caução nem depósito sob qualquer denominação que seja, em razão da sua qualidade de estrangeiro, ou da ausência de domicílio ou residência no país”. A caução, real ou fidejussória, é condição de procedibilidade, de modo que se não for prestada nos casos obrigatórios, leva a extinção do processo sem resolução do mérito (art. 485, inc. IV do CPC/2015), por ausência de pressuposto de desenvolvimento válido e regular do processo. Se no decurso do processo a garantia deixar de ser suficiente para o pagamento das custas e dos 400


honorários advocatícios, poderá o interessado exigir o reforço da caução, justificando seu pedido com a indicação da depreciação do bem dado em garantia e a importância do reforço que pretende obter. O pedido de reforço deve ser feito por meio de petição simples dentro do próprio processo. Aceitando o juiz os argumentos para o reforço da caução, deve intimar o autor para fazê-lo dentro do prazo estipulado. 4. Honorários advocatícios no cúmulo subjetivo de demandas A semelhança do que dispunha o artigo 23 do Código de Processo Civil de 1973, o artigo 87 do CPC/2015 trata da distribuição proporcional das despesas e dos honorários advocatícios no cúmulo subjetivo

de

demandas,

inicial

ou

ulterior,

acrescentando que a sentença deverá fixar a quantia individualizada

de

responsabilidade

de

cada

litisconsorte. Não havendo a distribuição proporcional da

responsabilidade

pelas

despesas

e

pelos 401


honorários na sentença, a responsabilidade dos vencidos será solidária, podendo o vencedor, ou vencedores, exigir de um ou alguns dos vencidos a totalidade das despesas e honorários advocatícios. O motivo destas novas regras é de que nas obrigações indivisíveis (CC arts. 257 a 263) e nas obrigações solidárias (CC arts. 264 a 285), pode se justificar a condenação solidária pelo custo do processo. 5. Propositura de nova ação e a obrigatoriedade do pagamento dos honorários fixados na ação anteriormente ajuizada Com semelhança ao que dizia o artigo 28 do Código de Processo Civil de 1973, o artigo 92 do

CPC/2015

pagamento

das

trata

da

despesas

obrigatoriedade processuais

e

do dos

honorários nas ações extintas sem julgamento do mérito. Este artigo tem que ser lido em conjunto com o artigo 486 do CPC/2015, que dispõe sobre a possibilidade da propositura de nova demanda quando

o

pronunciamento

judicial

for

sem

resolução do mérito do processo. Na petição inicial 402


da ação renovada o autor deverá apresentar prova do pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios a que foi condenado na ação anterior. O autor ao iniciar a demanda provoca a prestação jurisdicional pelo Estado, devendo arcar com as despesas e os honorários da parte contrária se a sua pretensão foi obstada por qualquer uma das causas do artigo 485 do CPC/2015, que impedem o magistrado de apreciar o mérito do processo para solucionar a lide. Como a decisão judicial somente faz coisa julgada quando aprecia o mérito do processo, o autor que teve sua pretensão rejeitada por uma das razões do artigo 485 não fica impedido de ajuizar novamente a demanda, desde que corrija os defeitos que acarretaram a sua extinção e comprove o pagamento das despesas e honorários devidos na demanda anterior. 6. Direito intertemporal As regras do artigo 85 do CPC/2015 devem ser aplicadas aos processos pendentes, como 403


determina o artigo 1.046 do próprio Código, atingindo os feitos em que ainda não foram proferidas as decisões finais. Deste modo, a sentença ou acórdão posterior ao início da vigência deste Código deve observar as novas regras, inclusive as decisões proferidas pelo Tribunal em grau recursal (art. 1.008 do CPC/2015) que mantenham

as

decisões

recorridas,

com

possibilidade, inclusive, de aplicação da majoração do § 11 do artigo 85. 7. Conclusão Como visto, as inovações solucionam algumas questões antes debatidas pelos Tribunais, como a determinação dos critérios para a fixação dos honorários nas causas em que for parte a Fazenda Pública, que pelo CPC/73 era feita por equidade gerando discussões sobres os percentuais, a possibilidade expressa do percentual fixado a título de honorários incidir sobre o valor da causa e sobre o proveito econômico obtido, a incidência dos juros de mora a partir do trânsito em julgado da 404


sentença ou acórdão; e em alguns casos modifica a jurisprudência como no caso da possibilidade de ajuizamento de ação autônoma para a cobrança dos honorários omitidos em decisão transitada em julgado e a vedação de compensação de honorários advocatícios nos casos de sucumbência recíproca. Também são introduzidos os direitos dos advogados públicos ao recebimento dos honorários advocatícios em razão da sucumbência da parte adversa, constituindo direito autônomo, o direito ao recebimento de honorários advocatícios quando o advogado atuar em causa própria e a possibilidade de majoração dos honorários em grau recursal em razão do trabalho adicional do advogado nesta fase do processo. Deste modo, o novo Código trata de forma mais

abrangente

devidos

pela

os parte

honorários

advocatícios

vencida,

esclarecendo

controvérsias antes

existentes

e modificando

posicionamentos

jurisprudenciais

antes

consolidados, prestigiando o direito do advogado

405


de receber a devida remuneração pelos serviços empenhados no processo.

406


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