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Fazemos parte do Futuro

Fazemos parte do Futuro

Paulo Lopes Silva Vereador da Educação da Câmara Municipal de Guimarães

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O desafio para a escrita do presente artigo enquadra-se no objetivo, que saúdo, de Osmusiké contribuírem para uma reflexão sobre os 10 anos da CEC 2012, no âmbito dos Cadernos 4. Falar sobre esse legado, além de uma grande responsabilidade, tende a ser uma reflexão sobre o passado, que tentarei evitar. Pegando no legado, como elemento histórico prévio, partirei para uma reflexão sobre o Futuro e o caminho que se pretender construir.

“Considerando as nossas raízes históricas, a nossa tradição de intervenção cultural e os resultados obtidos em termos de requalificação urbana e realização de investimentos, estamos convictos da vocação e capacidade do Município para, com os seus cidadãos e as suas instituições, celebrar e sublinhar, em 2012, a riqueza e diversidade culturais europeias, a sua capacidade de diálogo secular com outras culturas e civilizações e os fundamentos da nossa tradição social e política comum, assente no respeito pelas diferenças e no direito dos povos à autodeterminação e à identidade cultural, num quadro de liberdade e democracia.”

(António Magalhães, Documento de Candidatura de Guimarães a Capital Europeia da Cultura 2012)

A citação do Presidente da Câmara à data da candidatura de Guimarães a Capital Europeia da Cultura reflete três ideias fundamentais que estão vertidas no processo que culminou com a escolha de Guimarães, em 2012.

A primeira é a da clarividência da centralidade do projeto cultural de Guimarães e as suas linhas de força para a candidatura: décadas de recuperação e requalificação urbana, a regeneração do Centro Histórico que nos valeu a classificação de Património da Humanidade e o investimento em infraestruturas e programação cultural que ajudou a criar públicos e hábitos de fruição artística no território. A segunda é uma ideia de Cidade que desejamos ser. Um território cosmopolita, europeu, diverso e com curiosidade pelo mundo para lá da muralha. A terceira, e absolutamente central e urgente nos dias que correm, é o mundo que gostaríamos de ajudar a construir. Uma sociedade mais tolerante, mais respeitadora, intransigente com a defesa do direito à diferença e defensora da diversidade das identidades culturais e do respeito à

autodeterminação, em liberdade. São três ideias fortes, visionárias e transformadoras, que ajudaram a enformar um projeto artístico e uma candidatura que culminou, durante mais de um ano, na celebração, em Guimarães, de todos esses valores. E fê-lo com recurso à Comunidade, virada dos seus para o mundo, transformando, a partir da nossa porta, todo o Mundo que idealizamos.

“Tu fazes parte!”, dissemos durante 2012. Da CEC 2012 partimos rumo ao futuro, o nosso presente. Virando a página das políticas públicas culturais para a densificação da dimensão da criação. Continuamos a ser consumidores da vanguarda artística e das expressões mais contemporâneas, mas fortalecendo as condições de sermos produtores e criadores, a partir deste território.

“Ficámos parte”, “Somos parte da memória”, são alguns dos slogans da comemoração, em 2022, dos 10 anos da efeméride. Somos conhecedores do caminho que percorremos, mas temos, hoje, novos instrumentos e infraestruturas para a criação. Sendo parte de um todo, criamos a partir de Guimarães para o mundo. Foi em 2022, 10 anos depois, que inaugurámos o Teatro Jordão e a Garagem Avenida, expoentes máximos dessa transformação e dessa segunda geração de políticas públicas. Mantendo um auditório e vendo ser acrescentado um espaço expositivo, estes edifícios albergam, hoje, a nova geração das artes. Duas escolas da Universidade do Minho – Artes Performativas e Artes Visuais – e o Conservatório de Música de Guimarães trabalham diariamente na formação dos artistas, produtores e criadores de amanhã. Ainda neste espaço, sete salas de ensaio para bandas de garagem testemunham coletivos e artistas que há muito deixaram o lado incógnito que a “garagem” parece indicar. Por este motivo, este foi o ano escolhido para pensar em Futuro. Em Fazer Parte desse Futuro. Daí que, em 2022, se tenha iniciado uma reflexão coletiva: onde desejamos estar em 2032? Qual a terceira geração de políticas públicas para a cultura que queremos, conjuntamente, desenhar? O Plano Estratégico Municipal para a Cultura – Guimarães 2032 - é uma ferramenta fundamental para este processo, especialmente pela forma como propõe um modelo participativo para a sua elaboração. Em Guimarães, sabemos há muitos anos, são verdadeiros fatores críticos de sucesso de qualquer projeto a participação e o envolvimento, o sentido de pertença e a cocriação. Tratando-se de Cultura, e tendo em conta o longo lastro associativo e cívico na construção deste projeto cultural vimaranense, é da mais elementar justiça que o passo seguinte, e a estruturação das políticas públicas para os próximos 10 anos, seja

dado através de uma auscultação e construção conjuntas. Deste documento esperamos encontrar uma linha comum orientadora do ponto de vista da estratégia, das ferramentas, da gestão dos espaços e da capacidade de dar sequência a um investimento em cultura diferenciador e transformador de Guimarães. A estas linhas estratégicas, soma-se a necessidade de fortalecer o pensamento artístico da programação do território, quer através das estruturas municipais, quer da sua coexistência e complementaridade com os circuitos independentes.

O estímulo ao conhecimento do “mundo lá fora” continuará a ser o adubo primordial do projeto de apoio à criação de Guimarães. Precisamos de tomar consciência do outro, das diferentes estéticas, da vanguarda artística, ao mesmo tempo que dotamos de condições financeiras, materiais e de ecossistema, a dinâmica criativa do território. Os passos seguintes só podem ser a profissionalização e a internacionalização. Passos que devem continuar a fortalecer-se, ao longo do tempo. Criadas as condições para a criação, abertas as portas à captação e fixação de talentos, formando e capacitando artistas e criadores, teremos mais profissionais das artes e da cultura, e as suas carreiras prosseguirão pelo país e além-fronteiras. Todo este projeto, bem como a citação que encabeça este artigo e toda a ideia de base do investimento neste projeto cultural, não se encerra em carreiras, mercados e profissionais. O investimento em cultura e na formação pelas artes abre portas ao desenvolvimento de uma sociedade mais justa, mais tolerante, mais respeitadora dos valores da democracia e da autodeterminação, e desperta-nos para a necessidade de procurarmos conceitos de vida mais felizes e mais respeitadores do planeta terra. Este respeito pela terra é especialmente decisivo, pois existindo ele está alinhado com as políticas que têm como objetivo o Desenvolvimento Sustentável e a Neutralidade Climática, desígnios com que Guimarães está tão comprometida. A arte pode constituir-se como veículo de transmissão destes conceitos, adequando a ação de todo o seu setor a estas preocupações. Depois de décadas de investimento na criação de hábitos de consumo cultural, na requalificação urbana e patrimonial, na criação de equipamentos culturais de excelência, depois de mais de dez anos investindo na elaboração de condições e instrumentos facilitadores e impulsionadores das dinâmicas criativas e de criação do território, queremos, como em 2012, “Fazer Parte”.

E “Fazer Parte” é projetar coletivamente o Futuro. O elemento decisivo do sucesso de todos os grandes projetos que Guimarães abraçou é a Comunidade. Será com Ela que, virados para 2032, e através da Cultura, continuaremos a construir um Mundo mais tolerante, mais humanizado e mais ecológico.

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