The Portuguese Tribune, November 15th 2010

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COLABORAÇÃO

Reflexos do Dia–a–Dia

Diniz Borges d.borges@comcast.net

O

s conservadores ganharam as eleições intercalares nos Estados Unidos, ficando com o controle da Câmara dos Representantes, mais 4 lugares no Senado, mais governadores e legisladores estaduais do que tinham antes do dia 3 de Novembro de 2010. Daí que os analistas digam que esta foi a terceira revolução do Partido Republicano. A terceira vez que entram no governo prometendo, precisamente o que falharam, cada vez que têm estado no poder. É que mais uma vez afiançaram que modificarão, profundamente, o relacionamento entre o soberania e o povo. Mas a história é inequívoca. Nunca o fizeram. Nem o farão desta vez! Mais dia menos dia o eleitorado americano vai descobrir esta farsa, ou talvez não. A primeira revolução foi a anunciada por Ronald Reagan. Recorde-se que durante a campanha de 1980, para além de assaltar Jimmy Carter, acusando-o de pessimista, o antigo governador da Califórnia, e o movimento conservador, anunciava, que ao entrarem no governo aboliriam todas as medidas sociais da administração de Lyndon Johnson, a denominada Great Society. Reagan prometeu menos impostos e menos governo. É do conhecimento geral que de facto modificou a carga fiscal dos americanos, particularmente dos mais endinheirados. Poderse-á dizer que foi uma remodelação histórica. Porém, a redução do governo nunca aconteceu.

Aliás, entre 1981 e 1985 o défice no orçamento geral do estado duplicou. No segundo mandato, porque finalmente aumentou um os impostos, o défice viu um ligeiro decréscimo. Aliás, nos bastidores, falava-se que o novo arquétipo seria: pedir empréstimos e gastar. É que apesar da retórica dos conservadores, toda a gente sabe que os gastos governamentais têm efeitos positivos na economia do país e beneficiam, directamente, o mítico mercado livre. A segunda revolução do Partido Republicano aconteceu na década de 1990, durante o chamado Contrato com a América de Newt Gingrich. Por irónico que pareça, o sucesso relativo dessa “revolução” deveu-se mais a Bill Clinton do que aos Republicanos. Aliás, uma leitura da história da presidência de Clinton, indica, claramente, que muitas das modificações significativas, em relação à redução do défice tinha começado antes das eleições intercalares de 1994, quando os Republicanos entraram no poder. O equilíbrio, e os sucessivos excessos no orçamento geral do estado americano, aconteceram, primordialmente, porque no primeiro ano de governação Clinton aumentou os impostos, particularmente dos mais ricos do país. Mais, se os Republicanos estivessem, verdadeiramente, interessados em reduzirem o défice, tinham-no feito em 2002, quando controlaram a Casa Branca e ambas as Câmaras do Congresso.

Memorandum João-Luís de Medeiros jlmedeiros@aol.com (*) explicação prévia:

C

omo se trata de um texto publicado há 28 anos, em órgãos de comunicação social da diáspora lusófona, designadamente, no “Correio dos Açores” de Ponta Delgada e no “Portuguese Times” de New Bedford, Massachusetts (Outubro/Novembro,1982) o signatário, antes de avançar com o convite à leitura comparativa dos seus dizeres, decidiu cumprir o elementar dever de alertar o eventual leitor para se defender da relativa antiguidade do “memorandum” ora transcrito. Obrigado. À medida que vamos procurando resistir às vicissitudes da classe laboral norte-americana, talvez valha a pena um ‘olhar’ (se não comovido, pelo menos rápido) à situação sócio-política do nosso “atrapalhado” Portugal. Em vésperas de eleições autárquicas (1982), conviria ter (ou procurar ter) uma ideia geral da “temperatura política” da enfermidade cívica portuguesa. Afinal, tanto lá como cá, existe uma dada similaridade: primeiro, a ameaça ciclópica do desemprego ou su-

bemprego; depois, o secreto pavor (nem sempre bem disfarçado) perante a (pre)visível perspectiva de um dia serem obrigados a trabalhar para viver... Ora vejamos: vamos procurar não resistir ao imperativo de socializar a alegria! Por exemplo, em vez de cuidarmos em saber se Balsemão continuará primeiroministro (graças à conveniência expressa dos seus adversários ou mercê da apatia táctica dos próprios correligionários), valeria melhor a pena que exultássemos de legítimo contentamento latino face ao Nobel recentemente atribuído a Gabriel García Marquez. Mais: em vez de estancar o passo face aos tais 12 milhões de dollars da dívida externa portuguesa (isto para não insistir na referência dos milhares de contos de mariscos importados que Lisboa consome mensalmente... o que, aliás, confirma a versão de que somos uns pobretões mui suis-generis e muito saudosistas dos nossos pergaminhos manuelinos), talvez fosse nossa obrigação fazer um “alto” nessa cega correria rumo ao 24 de Abril de 74... Entretanto, fechemos as orelhas à algazarra poluidora da “música” recaixotada; atentemos na men-

15 de Novembro de 2010

Viva a California! Porém o resultado desse poder foi a maior expansão do governo e o maior aumento do orçamento geral do estado em duas gerações. George W. Bush, com a bênção do Congresso Republicano, decidiu reduzir a carga fiscal, com benefícios especiais para os mais endinheirados, dar mais benefícios nos medicamentos dos mais idosos e orquestrar duas guerras. Tudo isto sem dinheiro nos cofres do estado, daí que tudo isto foi feito com dinheiro emprestado. Desta vez os conservadores dizem que tudo será diferente. Empurrados pela franja do Partido, mais concretamente pelos legisladores eleitos que se dizem do Tea Party, os chazeiros, os Republicanos dizem que vão mesmo reduzir, drasticamente, no orçamento geral do estado, mas quem quiser ter os pés no chão, sabe que é mera retórica eleitoralista. A verdade é que os conservadores não têm um plano concreto para reduzirem o défice. Nenhum elemento das chefias tem a vontade política para um programa que reduzirá, significativamente, o défice orçamental. Há apenas dias opções: ou reduz-se, drasticamente, os gastos nas forças armadas, a reforma nacional (Social Security) e o serviço de saúde pública dos reformados (Medicare) ou aumenta-se os impostos. Da nova liderança republicana, nem uma palavra sobre as reduções nos gastos militaristas, e apesar de muitos gostarem de abolir com as reformas nacionais e a saúde para os mais

idosos, porque nunca acreditaram em apoiar o cidadão comum, sabem, muito bem que isso seria suicídio político. Bush tentou e não conseguiu. Daí que a única política sensata para se reduzir no défice do orçamento geral do estado é voltar-se à percentagem da carga fiscal que tivemos durante a administração de Bill Clinton. E o Partido Republicano sabe que só assim voltaremos a ter alguma sanidade fiscal. Porém, preferem a demagogia, e estão convencidos que essa hipocrisia continuará a ganhar eleições. Estão capacitados que o eleitorado americano é de memória curta. E, infelizmente, até têm razão!

V

iva a Califórnia! Num ano em que os Republicanos conseguiram vitórias em todo o país, a Califórnia manteve-se fiel aos seus princípios. Não só reelegemos a Senadora Democrata Barbara Boxer, como um governador Democrata, Jerry Brown e a não ser que Jim Costa perca o seu lugar, manterão os mesmos Congressistas do Partido Democrático. Na verdade, num ano de eleições intercalares, em que os conservadores tiveram vitórias em muitos estados a Califórnia ficou imune, ao que muitos analistas cognominaram

de "um tsunami político." Aliás, a nível estadual o poder executivo será mais azul do que era, e na Assembleia Estadual os Democratas conseguiram mais um lugar ficando com 52 legisladores, uma grande maioria. A nível de executivo, ganharam praticamente todas os cargos de grande influência política. Esta nossa Califórnia continua a ser uma luz num túnel cada vez mais escuro. Esta Califórnia é a verdadeira América, um país multicultural, multiracial, multiétnico, que acredita numa soberania ao serviço do verdadeiro soberano, o povo. Ainda bem, que a Califórnia continua igual a si própria e é dos poucos estados que há muito compreendeu a duplicidade conservadora. Concordo com a minha amiga e colega cronista deste jornal, Margarida da Silva, cujos artigos políticos são sempre elucidativos: é mesmo bom viver na Califórnia.

Reflexões de um imigrante caloiro sagem libertadora trazida pela voz ímpar de Adriano Correia de Oliveira, cujo corpo (um pouco disperso por essa Europa, e que há semanas foi a enterrar) não conheceu os arrepios do medo nem as curvaturas da cobardia... Mas... não choremos os mortos que estão “vivos”. Lamentemos – isso sim – os vivos que fingem viver à base da ilegal aspirina dançarina... Ah! aquele nosso Portugal sempre tão meigo a importar tudo: desde o camarão às ideias; de futebolistas às subordinações ditadas pelos donos do mundo; o mesmo Portugal que corre, pressuroso, a exportar a juventude; ah! aquela classe política tão cansada do mesmo travestti, ideologicamente desbotado; aquele “viver partidário” tão consensual no seu feudalismo simpático... Oh! como é frustrante assistir, à distância, ao florescimento do fulanismo político, e ao interminável desfile das sumidades financeiras da cena portuguesa – aspirantes à tarefa de (des)governar Portugal e (simultâneamente) promovidas a “intérpretes/agentes” perfumados do F.M.I. (Fundo Monetário Internacional)... No meio dum tal vazio ministe-

rial lastimoso, os leigos (como é o nosso caso de operário fabril) continuam de olhos húmidos, vendo ministros mais ocupados com a redacção dos respectivos pedidos de demissão do que empenhados na restauração gradual da economia portuguesa... Resta-nos apenas uma réstea de ironia para dizer: bem bom... ao menos o veterano código comercial ‘Veiga Beirão’ vai ser actualizado, reformulado, quiçá adaptado ao século XX... Mas... cuidado: não desesperemos! Existe por aí (algures dispersa mas solidária) o que se convencionou chamar “Reserva da República”: politicos que o 25 de Abril veio apanhar ainda muitos novos e com fragilidades transitórias inerentes ao espontaneísmo da respectiva juventude. Claro que a veterania republicana teve de liderar o processo. Entretanto, haverá que construir as “pontesdoiradas” para a sua gradual e irreversível retirada: incensá-los, se preciso for, com tarefas representativas de prestígio protocolar. Em suma, sossegá-los! Depois – e porque não? – havemos de ver como Portugal irá reagir à fase pós-ideológica, no período posterior à demorada puberdade

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partidária dos seus utentes... Neste sentido, subscrevo aquilo que aprendi há dias dum articulista da imprensa lisboeta: “vejo uma linha de preferência, em política, pelo homem intelectualmente honesto em desfavor do homem apenas hábil; do homem do rigor de análise, ultrapassando o homem da palavra fácil; do homem de estudo, tomando a dianteira ao homem da propaganda; do homem das reuniões para o diálogo construtivo, com todos os grupos válidos de cidadãos, em vez do militante de voz sonante nos comícios, perito em agitar bandeiras e manipular emocões...”. Pois é. Há muito a fazer em prol do nosso Portugal distraído. Não esperemos seja ele a dar o primeiro passo na direcção da cruzada pós-salazarenha... (*) Fall River, Massachusetts Novembro, 1982


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