MatchPoint Portugal Janeiro/Fevereiro 2014

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MatchPoint n.º 9 | Janeiro/Fevereiro 2014 | € 4.95

Portugal

ESTE CIRCUITO NÃO É PARA NOVOS Top 100 em análise Entrevista Pedro Cordeiro 2013 O ano de João Sousa

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SUMÁRIO

MatchPoint

MatchPoint n.º 9 | Janeiro/Fevereiro 2014 | € 4.95

Portugal

Portugal

ESTE CIRCUITO NÃO É PARA NOVOS Top 100 em análise ENTREVISTA pedro Cordeiro

ARTIGOS   4 Bolas Curtas  14 Os Melhores de 2013  16 Este Circuito Não é Para Novos

2013 o ano de João sousa

fb.com/matchpointportugal www.matchpointportugal.com

n.º 9 Janeiro/ Fevereiro 2014

26 João Sousa  34 Entrevista: Pedro Cordeiro

Propriedade

OPINIÃO

Director

3 Editorial  10 Court & Costura  24 Formação

Pedro Keul Redactores e colaboradores Hugo Ribeiro, Vítor Cabral, Jorge Cardoso, João Carlos Silva e José Pedro Correia Fotografia

SECÇÕES  53 Equipamento

Cynthia Lum (excepto indicação em contrário) Projecto gráfico e paginação

56 Arbitragem

Henriqueta Ramos

57 Medical Timeout

Mobile / Webdesign

58 Bola na tela Contactos 96 3078672 info@matchpointportugal.com www.matchpointportugal.com matchpointportugal


EDITORIAL

Boa época de 2014

Pedro Keul

Um ano passou desde que iniciámos esta aventura de lançar uma revista de ténis. E se sabíamos que ia ser difícil, não imaginámos o quanto. Primeiro, porque ainda não conseguimos chegar á maioria dos amantes da modalidade; segundo, porque não temos tido a preciosa ajuda das marcas ligadas ao ténis, com as quais contávamos que nos ajudassem através de publicidade. Não vamos desistir. A MatchPoint Portugal foi recebida de forma muito positiva, o que confirma a lacuna que se fazia sentir no meio. A última coisa que queremos é encerrar um projecto que tem a intenção de se manter por muitos anos. Mas sem ajudas não haverá milagres e, modéstia à parte, será o ténis português que ficará a perder. É por isso que desejo uma boa época de 2014 a todos, incluindo a esta fantástica equipa que, a cada edição, tenta fazer uma revista de ténis melhor. Mas também aos dirigentes, treinadores e tenistas portugueses, dos mais jovens aos já credenciados, dos quais destaco João Sousa, capa da primeira edição da MatchPoint Portugal. O número um português terá a difícil missão de dar seguimento ao memorável ano de 2013, mas já confirmou pessoalmente que o trabalho dedicado dá sempre resultados. Que o João sirva de exemplo e seja uma inspiração para todos em 2014.

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BOLAS CURTAS Disseram adeus em 2013

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Foram vários os tenistas que abandonaram o circuito profissional, no ano passado. Alguns surpreenderam com a decisão como foi o caso de Marion Bartoli, que anunciou a retirada um mês depois de cumprir o sonho de ganhar em Wimbledon. “O meu corpo já não consegue mais. Tenho tido muitas lesões desde o início do ano, já ando no circuito há tanto tempo e forcei e dei tudo o que tinha durante Wimbledon”, explicou a francesa, que chegou a ocupar a 7.ª posição do ranking mundial, em Janeiro de 2012. Das jogadoras que abandonaram definitivamente o WTA Tour, destacam-se a húngara Agnes Szavay (13.ª), a russa Anna Chakvetadze (5.ª), as britânicas Melanie South (99.ª), Elena Baltacha (49.ª) e Anne Keothavong (48.ª), a francesa Séverine Beltrame (34.ª), as norte-americanas Jill Craybas (39.ª) e Rebecca Marino (38.ª) e a letã Anastasija Sevastova (36.ª) Também Nuria Llagostera se retirou após a sanção aplicada pela Federação Internacional de Ténis (ITF). A espanhola de 33 anos (35.ª no ranking de singulares, em 2005, e 5.ª em pares, em 2009) acusou metanfetamina num controlo anti-doping durante o torneio de

Stanford, no Verão, e foi suspensa por dois anos. Entre os homens, houve igualmente vários abandonos. Já anunciada anteriormente, David Nalbandian (3.º lugar foi o seu melhor ranking ATP) despediu-se oficialmente em Novembro, aproveitando os jogos de exibição entre Rafael Nadal e Novak Djokovic, em Córdoba (sua terra natal) e Buenos Aires. Aos 32 anos, Nalbandian colocou fim a uma carreira em que conquistou 11 títulos e teve como pontos altos o triunfo no Masters, em 2005, e a final de Wimbledon, em 2002. Agora, Nalbandian pode consagrar-se à sua outra paixão, os ralis. Da lista de reformados, fazem ainda parte o norte-americano James Blake (4.º),os russos Igor Andreev (18.º) e Igor Kunitsyn (35.º), o belga Xavier Malisse (19.º), o brasileiro Ricardo Mello (50.º), o espanhol Ivan Navarro (67.º), o belga Dick Norman (10.º em pares) e o chileno Nicolas Massu (9.º) – o único na história a conquistar as medalhas de ouro em singulares e pares na mesma edição dos Jogos Olímpicos, em Atenas.


Dança das cadeiras O período de defeso é também a melhor altura para alterações nas equipas técnicas. Este ano, a grande atracção é o regresso ao circuito de vários antigos campeões de torneios do Grand Slam, inclusive, exnúmeros um mundiais. O caso mais surpreendente é o de Boris Becker, que aparece ao lado de Novak Djokovic. Becker chegou ao topo do ranking em 1991 e conquistou seis títulos do Grand Slam. Roger Federer foi buscar o seu ídolo de infância, Stefan Edberg, número um em 1990 e detentor de seis “majors”. O japonês Kei Nishikori recorreu ao norteamericano de ascendência chinesa Michael Chang, vencedor em Roland Garros em 1989. Richard Gasquet contratou o bicampeão de Roland Garros, Sergi Bruguera que, com o seu pai, gere uma academia em Barcelona. Riccardo Piatti deixou Gasquet e está agora ao lado de Milos Raonic, juntado-se ao seu ex-pupilo Ivan Ljubicic. Bernard Tomic seguiu as suas origens e contratou o croata Velimir Zovko –

treinou Jelena Kostanic e Ivan Ljubicic quando era júnior – mantendo ainda o controverso pai, John. Do lado das senhoras, a eslovaca Daniela Hantuchova é agora acompanhada de Ricardo Sanchez, que já trabalhou com Caroline Wozniacki e Jelena Jankovic. Paul Annacone, que deixou Federer, foi aproveitado por Sloane Stephens e a top 10 Angelique Kerber apresentou um novo treinador, o germanoiraniano Benjamin Ebrahimzadeh. Depois de ter quebrado a ligação com Thomas Hogstedt, após a derrota frente a Michelle Brito em Wimbledon, Maria Sharapova contratou o conceituado Sven Groeneveld, que há cinco anos e meio dirigia o Programa de Desenvolvimento da Adidas, tendo aconselhado Ana Ivanovic, Caroline Wozniacki, Laura Robson, Sorana Cirstea, e Anastasia Pavlyuchenkova, bem como Andy Murray e Fernando Verdasco. Depois de separar-se de Eugenie Bouchard, a francesa Nathalie Tauziat,

finalista de Wimbledon, vai continuar a trabalhar com a federação canadiana, ocupando-se de Aleksandra Wozniak, actual 281.ª (21.ª em 2009). Bouchard é agora acompanhada por Nick Saviano, também a trabalhar com Laura Robson. Outra britânica, Heather Watson escolheu o argentino Diego Veronelli, que chegou a 165.º no ranking ATP.

Steffi de luto Peter Graf, pai da campeoníssima Steffi, morreu aos 75 anos, vítima de um cancro no pâncreas. Peter ensinou a sua filha Steffi a jogar ténis, ainda com uma raqueta de madeira, e viu-a conquistar 22 títulos de singulares em torneios do Grand Slam – o máximo na Era Open (desde 1968). A sua relação esfriou em 1997 quando Peter foi condenado a três anos e nove meses de prisão por evasão fiscal, que custou à sua filha 70 milhões de dólares e levou ao divórcio da mãe da jogadora, Feidi. Mas segundo a comunicação social alemã, pai e filha reataram o relacionamento.

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BOLAS CURTAS Técnica tem nova direcção

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O presidente da Federação Portuguesa de Ténis (FPT), Vasco Costa, nomeou André Lopes para coordenador da área técnica, assegurando a interligação entre as várias seleções nacionais e o CAR. O ainda selecionador da equipa portuguesa na Fed Cup onde é coadjuvado por Miguel Sousam, estará em ligação permanente com a equipa de selecionadores, constituída por Nuno Marques (seniores masculinos), Emanuel Couto (sub 18 masculinos e treinador da selecção da Taça Davis), Miguel Sousa (sub 18 femininos e treinador da selecção da Fed Cup), Vítor Ferreira (sub 16 masculinos), Joana Pangaio (sub 16 femininos), Gonçalo Neves (sub-14 masculinos), Manuel Costa Matos (sub 14 femininos), Paulo Santiago (sub 12 masculinos) e Joana Roda (sub 12 femininos). A coordenação das seleções juvenis é assegurada por Nuno Mota. André Lopes, que continua a ser o treinador de Rui Machado, disse que “a preocupação será ligar as coisas que estão mais desligadas e seguir os tenistas, desde a idade

juvenil até ao início do profissionalismo” de modo a potenciar o que já foi bem feito e desenvolver o ténis português. A grande novidade é a “contratação” de Carlos Costa, fisioterapeuta com percurso de anos nos circuitos ATP e WTA, que vai integrar as equipas técnicas da Taça Davis e Fed Cup. Carlos Costa acompanha atualmente o alemão Tommy Haas e já trabalhou com a ex-número um mundial Ana Ivanovic.

You know Watts? Para quem quiser recordar os melhores momentos da época de 2013 de uma forma divertida, não há melhor do que assistir aos vídeos do Eurosport Watts. Aliás, a página

WattsZapArchive deve estar na lista de Favoritos de qualquer adepto de ténis que se preze. http://www.youtube.com/ watch?v=wiZ-wGFuO-A

A inspiração de Mandela A morte de Nelson Mandela suscitou reacções por todo o planeta. O mundo do ténis não foi alheio ao desaparecimento do antigo presidente sul-africano, Nobel da Paz e principal rosto da luta contra o racismo e foram vários os tenistas que partilharam os seus sentimentos nas suas páginas das redes sociais, como Serena Williams, que teve mesmo o privilégio de o conhecer pessoalmente. “Conhecê-lo ajudou-me a entender que a vida é cheia


de altos e baixos. E como recuperar desses baixos e como ajudar as pessoas sem olhar a raça ou raízes através das nossas escolhas e decisões”, escreveu Serena. Outros testemunhos reforçaram a importância universal de Mandela entre os tenistas. Marion Bartoli: “Um símbolo para a humanidade. Perdemos uma das mais belas almas do nosso planeta.” Rafael Nadal: “Descansa em paz Nelson Mandela. Foi um modelo para o mundo.” Andre Agassi: “Quando o mundo deu a Nelson Mandela o seu pior, ele mostrou-nos o seu melhor. Daqui a mil anos, a humanidade ainda irá reverenciá-lo.”

Jogo de pés italiano

Sabe-se como é importante a movimentação e o jogo de pés no ténis. O que não se sabia é que os treinos de Flavia Pennetta e Francesca Schiavone também poderiam ser úteis às tenistas italianas quando foram convidadas para participarem no programa “Ballando con le Stelle” da estação do seu páis, RAI. Quanto à nota artística, cada um que dê a sua pontuação.

O novo CAR

No seguimento da prioridade do repsidente da Federação Portuguesa de Ténis (FPT), Vasco Costa, o novo projeto do Centro de Alto Rendimento (CAR) do Jamor para 2014 proporcionará mais competição aos tenistas e um acompanhamento efetivo nos torneios de categoria “Future” em Portugal e em Espanha. “Preocupa-nos a transição dos atletas de juniores para seniores. É a nossa grande prioridade. Dentro dessa política que a FPT tem vindo a desenvolver, este modelo cria mais competição e a ideia é fazer uma interligação entre as seleções juniores e as seniores”, referiu Vasco Costa. Ao contrário do anterior modelo, em que o seguimento dos tenistas era realizado apenas ao nível dos treinos, o CAR acolherá em 2014 somente tenistas ma-

sculinos, não só por serem “em maior número” como pelo facto de não terem “carreiras individuais tão estruturadas” como no caso das tenistas. O número de candidaturas excedeu as expetativas já que o número máximo de tenistas em acompanhamento será de 12, enquanto que o número de atletas residentes no CAR não ultrapassará os oito. “Estou bastante motivado. Existe bastante ambição da nossa parte para fazer a transição para o profissionalismo e é uma das vertentes que podemos melhorar”, disse André Lopes, coordenador técnico nacional. A equipa técnica do CAR é constituída por Gonçalo Nicau (treinador e responsável pela estrutura), Hugo Anão (treinador) e Paulo Figueiredo (preparador físico).

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BOLAS CURTAS Chris Kermode à frente da ATP Desde 1 de janeiro que a ATP tem um Presidente Executivo & Chairman para os próximos três anos. Tratase de Chris Kermode, até aqui director do torneio de Queen’s desde 2007 e do Masters de Londres (Barclays ATP World Tour Finals) desde 2008. Kermode está no ténis há 30 anos, primeiro como jogador (ocupou um modesto 742.º lugar no ranking), depois como organizador e gestor. Pelo meio, o britânico de 49 anos acumulou igualmente experiência nas indústrias cinematográfica e musical.

Vem aí a Liga Internacional de Ténis Mahesh Bhupathi é o criador, Boris Becker um dos sócios fundadores e Justin Gimelstob, co-fundador. São eles os organizadores da International Premier Tennis League, competição que deverá ter a sua primeira edição em Dezembro de 2014. Com maior ou menor participação, já estão garantidos os nomes de Novak Djokovic, Andy Murray, Rafael Nadal, JoWilfried Tsonga, Serena Williams, Victoria Azarenka, Li Na, Thomas Berdych, Janko Tipsarevic, Lleyton

Hewitt, John Isner, Caroline Wozniacki, Pete Sampras e Carlos Moya de uma lista que se espera chegue aos cem. Cada uma das seis equipas (entre seis a 10 jogadores) realizam cinco encontros, em seis cidades diferentes da Ásia. Cada encontro é composto por cinco sets: singulares masculinos, singulares femininos, pares masculinos, pares mistos e um singular de veteranos. Ganha a equipa que somar mais jogos e, em caso de empates, será disputado um tie-break.

Roland Garros em cartaz

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Fiel à sua tradição de convidar um artista para desenhar o cartaz do torneio, Roland Garros recorreu a Juan Uslé. O pintor espanhol, nascido em 1954 em Santander, tem uma obra vasta e espalhada pelas colecções de numerosos museus da Europa (Museu Nacional de Arte Moderna de Paris; Tate Modern, em Londres; Museu Reina Sofia, em Madrid, etc) e é conhecido pela utilização original de cor intensa

Academia de Ténis Senhora da Hora tem novo espaço Após a desativação dos campos de ténis no Parque Manuel Pinto de Azevedo, a Academia de Ténis Senhora da Hora (ATSH) viu a Câmara Municipal de Matosinhos aprovar o projeto para ocupar um novo espaço na Rua Magalhães Lima,


Caldas da Rainha conquista título nacional

O Clube de Ténis das Caldas da Rainha sagrou-se pela primeira vez Campeão Nacional de Seniores da 1.ª Divisão após derrotar o Clube de Ténis do Porto na final realizada em Guimarães. Na segunda e terceiras divisões, venceu a Associação Académica de Coimbra. Para a posteridade, fica a foto dos campeões nacionais. Em cima (da esquerda para a direita): Romain Barbosa, Filipe Rebelo, Dominik Varhanik e Ramiro Martins. Em baixo: Ricardo Gomes, Frederico Silva e Hugo Anão. nº 125. Sob a direcção de André Lancha, a ATSH, criada em Outubro de 2009, têm agora mais condições para promover o desporto no concelho de Matosinhos. O número de praticantes nos mais diversos escalões, tem vindo a crescer e a ATSH prepara-se para avançar com um espaço formativo eenquanto continua a angariar fundos para a reativação da piscina e do bar e a construção do campo de padel.

A primeira de Nuno Marques

João Sousa (50.º ATP), Gastão Elias (174.º), Rui Machado (276.º) e Frederico Silva (601.º) formam a equipa de Portugal que, de 31 de Janeiro a 2 de Fevereiro, estarão na Eslovénia a discutir a primeira eliminatória do Grupo I

da Zona Europa/África da Taça Davis. A Eslovénia apresenta Blaz Kavcic (99.º), Janez Semrajc (302.º), Mike Urbanija (588.º) e Tom Kocevar Desman (777.º). A eliminatória decorrerá no pavilhão Teniski Klub Triglav, em Kranj, num piso duro (Supersoft W.S) e terá como juiz árbitro, o italiano Roberto Ranieri. Esta eliminatória, que marca o regresso da selecção

portuguesa ao Grupo I, assinalará a estreia de Nuno Marques.

Líderes na Patagónia

Antes de entrarem verdadeiramente de férias, Rafael Nadal e Novak Djokovic disputaram algumas exibições na América do Sul. Do programa constou uma visita à Patagónia, no Sul da Argentina, onde ambos viveram a experiência de trocar umas bolas num court flutuante, tendo como cenário o glaciar Perito Moreno.

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Court & Costura

Eusébio também era um homem do ténis

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Hugo Ribeiro

Vi pela primeira vez o Eusébio, cara a cara, nos balneários do CIF, no Restelo. Estávamos em 1982 e o ténis estava na moda em Portugal. João Lagos tinha trazido a Cascais o Bjorn Borg, que no ano anterior vencera o 11º e último título do Grand Slam da sua carreira e era apelidado de “Rei”. Nuno Marques sagrara-se vicecampeão europeu de sub-12 e Pedro Cordeiro, de “boas famílias do Porto”, como se dizia na altura, conquistou então o primeiro dos seus quatro títulos de campeão nacional. Foi neste contexto de euforia tenística em 1982 que fiz-me sócio do CIF e, embora sportinguista, foi com orgulho, respeito e veneração que partilhei várias vezes o balneário com o “King”, sem jamais ousar dirigir-lhe a palavra. Eusébio integrava-se cordialmente, sem vedetismos, no grupo de amigos do “Manecas”, recente entrevistado pela Match Point Portugal, e creio que também via por lá, entre eles, o cantor Paco Bandeira. Ontem, no dia em que Eusébio faleceu, ouvi o “Toni” lembrar na televisão “o joelho destruído, aquilo já nem era um joelho” de Eusébio. Era, realmente, impressionante como conseguia deslocarse (mal) no court, com aquele “trambolho”, mas a competitividade estava sempre lá, mesmo manobrando a bola com a raqueta que segurava na mão em vez de chutá-la com os pés. “Jogámos algumas vezes ténis – recorda Manuel Sousa – e também futebol. Aliás, uma das histórias mais incríveis da minha vida foi quando fomos a uma aldeia jogar, eu jogava na equipa de antigas glórias do Benfica, contra a equipa local. Vendiam-se bilhetes mas todos só queriam ver jogar o Eusébio. Como de costume ele chegou tarde, mas desta vez atrasou-se imenso. Aquilo foi um pandemónio, com as pessoas nas bancadas a assobiarem-nos, a chamarem-nos ladrões. Tivemos de recolher aos balneários e o pessoal andava todo a exigir a devolução do dinheiro dos bilhetes. Entretanto, ele lá chegou, fomos jogar, o estádio encheu-se outra vez e foi uma festa”. “Manecas” é benfiquista dos sete costados, tal como o seu filho,


Court & Costura Pedro, actual membro da selecção nacional, e ainda tem em casa, “emoldurada, uma fotografia assinada pelo Eusébio, dele ao lado do Pedro, quando o Pedro tinha uns oito anos”. Pouco tempo depois disso o joelho forçou Eusébio a parar com o ténis mas ainda guardo memória de uma reportagem no Jornal do Ténis, antes de eu iniciar uma longa colaboração com essa revista, portanto, estaremos a falar em meados dos anos 80 do século XX. O João Lagos tinha uma rubrica mensal em que convidava uma figura pública a jogar ténis com ele e depois fazia-se a reportagem desse encontro. “Foi uma forma inteligente de mostrarmos às pessoas que toda a gente jogava ténis e resultou muito bem”, relembra o director do Jornal do Ténis. João Lagos é um conhecido sportinguista mas sempre teve “um amigo no Eusébio, com quem almoçava e jantava regularmente”, mas havia uma peregrinação anual ao Jamor imperdível: “Ele vinha todos os anos ao Estoril Open e é óbvio que todos nos lembramos dele a entregar a camisola do Benfica ao Novak Djokovic. Às vezes ele telefonava-me a perguntar-me se naquele ano não iria ser convidado, porque, entretanto, o torneio já tinha começado e ele ainda não tinha recebido o convite. Cheguei a dizer-lhe: ‘tu não precisas de convite. Estás sempre convidado. E já sabes que ninguém vai barrar-te à entrada. É só dizeres que vais ali ver o Lagos’. Ele adorava ver ténis”.

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Court & Costura Não foi só nas bancadas do Estoril Open/Portugal Open que deparei com o Eusébio. Tenho ainda bem viva a lembrança de vê-lo no camarote do jornal A Bola no Vale do Lobo Grand Champions, convidado do jornalista Vítor Serpa. A primeira vez aconteceu em 2002 e é claro que não poderia passar despercebido. No court central de Vale do Lobo jogava o Yannick Noah e, às tantas, o ex-campeão de Roland Garros percebeu que o Eusébio estava entre os espectadores. Parou de imediato o jogo, subiu as bancadas, deu um grande abraço ao “Pantera Negra” e só depois voltou ao court. Nesse ano, Eusébio privou ainda com John McEnroe em Vale do Lobo. Pedro Frazão, o promotor do torneio algarvio, conta como conheceu o maior ídolo do desporto português: “A nível pessoal, estive várias vezes com ele, mas isso não interessa. Mas tenho três boas histórias profissionais com o Eusébio. A primeira, quando eu ainda era jovem, joguei várias vezes ténis com ele, quando ele vinha de férias no Algarve. A segunda, nesse ano de 2002 do Vale do Lobo Grand Champions. E a terceira, em 2007, quando organizei um concerto do Plácido Domingo em Lisboa. Convidei-o e ele saiu directamente do hospital da Luz onde estava internado, para o concerto. Nessa mesma noite ele conheceu e conversou com o Plácido Domingo”. Há, seguramente, muito mais histórias de Eusébio da Silva Ferreira ligadas ao ténis, mas estas foram apenas aquelas que testemunhei na minha carreira. O “King” não era só uma figura do futebol, era um gigante em todo o lado por onde passava.

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OS MELHORES DE 2013

ATP 14

Jogador do Ano Melhor Dupla do Ano Regresso do Ano Revelação do Ano Futura Estrela ATP Jogador Preferido dos Fãs Dupla Preferida dos Fãs Prémio Desportivismo Stefan Edberg Prémio Humanitário Arthur Ashe

Rafael Nadal Bob Bryan e Mike Bryan Rafael Nadal Pablo Carreño Busta Jiri Vesely Roger Federer Bob Bryan e Mike Bryan Roger Federer Roger Federer


WTA Jogadora do Ano Melhor Dupla do Ano Regresso do Ano Maior Progressão Revelação do Ano Jogadora Preferida dos Fãs

Serena Williams Sara Errani e Roberta Vinci Alisa Kleybanova Simona Halep Eugenie Bouchard Agnieszka Radwanska

Campeões do Mundo ITF Homens Senhoras Juniores rapazes Juniores raparigas Cadeira de rodas Masculino Feminino

Novak Djokovic Serena Williams Alexander Zverev Scott Oudsema Shingo Kunieda Aniek van Koot

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ANÁLISE A 2013

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Este circuito não é para novos


Nunca a média etária dos melhores tenistas do mundo foi tão elevada como actualmente. Pedro Keul Os tempos em que Boris Becker, Michael Chang e Mats Wilander ganharam torneios do Grand Slam com 17 anos já lá vão. A cada ano que passa, é cada vez mais difícil aos mais jovens imporem-se no circuito profissional. E não só nos “majors”; a entrada no top 100, primeiro grande objectivo dos tenistas, vai sendo cada vez mais adiada. O elevado nível dos jogadores mais velhos está a criar grandes dificuldades aos mais jovens que querem entrar no top 100, o que adia o aparecimento de caras novas cada vez mais “Para poder competir com tarde. Os recordes deixaram de eles, os jogadores têm que ser ser de precocidade para serem fisicamente fortes e isso não de perseverança: ainda no acontece antes dos 25 anos” último Open dos EUA, Stanislas Wawrinka e Flavia Pennetta Michael Russell atingiram pela primeira vez as meias-finais de um Grand Slam “Tenho menos flexibilidade com, respectivamente, 28 e 31 do que quando tinha 25. Se anos. Em 2013, a média etária dos não tenho cuidado com o 64 oitavo-finalistas masculinos, que faço após um encontro, no total dos quatro torneios sinto-o logo no dia seguinte” do Grand Slam, foi de 28 anos. Jurgen Melzer Apenas seis desses lugares foram ocupados por jogadores com menos de 25 anos (Kei Nishikori “Penso que estamos todos um na Austrália e Roland Garros; pouco mais atentos em tomar Milos Raonic na Austrália e conta dos nossos corpos. A EUA; Jerzy Janowicz e Bernard saúde é muito mais relevante Tomic em Wimbledon). O último teenager presente na segunda do que há 15, 20 anos” semana de um torneio do Grand Tommy Haas Slam data de 2011, quando o australiano Tomic atingiu os quartos-de-final de Wimbledon, com 18 anos.

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ANÁLISE A 2013

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Quanto a jovens vencedores de “majors”, temos de recuar a 2005, para encontrar o então teenager Rafael Nadal a vencer Roland Garros com 19 anos e dois dias. O tenista espanhol foi o primeiro teenager a ganhar um título do Grand Slam – desde Pete Sampras em 1990 – e o último até à data. Desde então, os mais novos campeões do Grand Slam foram Novak Djokovic, que, em 2008, ganhou na Austrália com 20 anos, e Juan Martin del Potro, campeão nos EUA com a mesma idade, em 2009. A média etária dos vencedores masculinos no Grand Slam subiu de 22 para 26 anos desde 1993. Nesse ano, só três jogadores com 30 ou mais anos ganharam torneios no circuito ATP: Ivan Lendl (dois títulos), Andres Jarryd e Mikael Pernfors; em 2003, apenas dois: Andre Agassi (quatro títulos) e Wayne Ferreira (um); este ano, houve 16 torneios ganhos por 11 “trintões” diferentes – um recorde desde 1975: Tommy Haas, Mikhail Youzhny, Nicolas Mahut, David Ferrer e Tommy Robredo (dois títulos cada); Roger Federer, Ivo Karlovic, Albert Montañes, Feliciano Lopez, Carlos Berlocq e Jurgen Melzer (um cada). Do lado oposto da faixa etária, três teenagers conquistaram cinco torneios em 1993: Andrei Medvedev (três títulos), Thomas Enqvist e Greg Rusedski; em 2003, seis torneios foram ganhos por jogadores com 20 anos; em 2013, apenas um com menos de 21


anos triunfou no ATP World Tour: Bernard Tomic (em Sydney). No top 100, as dificuldades de afirmação dos mais novos é mais notória. Actualmente, a média etária é de 27 anos e não há nenhum tenista com menos de 20 anos. Aliás, apenas 19 jogadores têm menos de 25 anos. No top 50, esse número desce para seis: Milos Raonic, Kei Nishikori, Jerzy Janowicz, Benoit Paire, Grigor Dimitrov e Vasek Pospisil. Uma realidade bem diferente de há 20 anos, em que houve 17 estreantes no top 100, com uma média de 20,8 anos e nenhum com mais de 22 primaveras. Em 2003, registaram-se 20 entradas novas nos 100 melhores, com uma média de 20,75, incluindo cinco teenagers mas também cinco jogadores com pelo menos 25 anos. Este ano, o número de estreias no top 100 desceu para 14, com a média etária a cifrar-se em 23,2 anos. Além da subida da média, no ranking final de 2013, não há teenagers no top 100 do ranking ATP. O mais novo tem 20 anos: é o checo Jiri Vesely, 84.º, nascido a 10 de Julho de 1993 – o 20.º mais novo no ranking mundial é o português Gastão Elias (167.º), com 23 anos feitos em Novembro. Pelo contrário, existem 14 jogadores com pelo menos 32 anos e, no top 50, surgem 16 jogadores com pelo menos 30 anos. Tommy Haas, 35 anos e nove meses, é o mais velho no top 100 e está… no 12.º lugar. E este ano somou mais dois títulos aos 13 que já detinha, o que não lhe acontecia desde 2006. A partir dos 31 anos, apenas 30 por cento dos jogadores vêem o seu ranking subir, mas David Ferrer tem sido uma excepção. O espanhol é o segundo tenista a progredir, desde os 27 anos, em cinco épocas consecutivas: 17.º, 7.º, 5.º, 5.º, 3.º. O outro foi o australiano Wayne Arthurs que melhorou o seu ranking entre 1998 e 2002, até ao 52.º posto. “Penso que a maior diferença para os juniores e teenagers é que são muito mais bem preparados e fortes do que nós”, justifica o australiano Nick Kyrgios, 18 anos, o único teenager no top 200, figurando no 183.º posto. Não é por falta de qualidade das novas gerações, mas sim porque o jogo está mais físico e os mais novos demoram mais tempo para

Tommy Haas e Kimiko DateKrumm são os mais veteranos dos rankings mundiais

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ANÁLISE A 2013 alcançar o mesmo nível físico e a experiência necessárias para gerir as forças em encontros mais longos, em especial nos torneios do Grand Slam onde se joga à melhor de cinco sets. A tecnologia ajuda a prolongar as carreiras bem como o dinheiro, que serve de incentivo, mas também permite às principais estrelas apetrecharem-se de preparadores físicos, recuperadores, fisioterapeutas e ajuda médica sofisticada.

Elas também sabem envelhecer

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No circuito feminino, a média etária também tem vindo a subir, embora cerca de um ano por década, e no top 100 do ranking WTA situa-se dois anos abaixo das dos homens. Nos anos 90, 15 torneios femininos do Grand Slams foram ganhos por teenagers. Na década seguinte, apenas três – a última foi Maria Sharapova vencedora do Open dos EUA de 2006, com 19 anos. Actualmente, há somente sete teenagers no top 100, sendo a melhor classificada a canadiana Eugenie Bouchard, 32.ª – a mais nova é a croata Donna Vekic, 17 anos e 95.ª. No final de 2003, havia 11 “teens” entre as cem primeiras e há duas décadas, só no top “O nível físico dos jogadores 10, havia três. Por outro lado, surgem 12 jogadoras com 30 ou do top é tão alto que não mais anos no top 100, oito delas consegue atingir aos 19. no top 50. Há 10 anos, eram só Tem que se trabalhar para dez e apenas quatro entre as 50 atingir este nível durante melhores. anos e, nessa idade, não se A média das vencedoras de torneios do Grand Slam subiu consegue chegar a um Grand notoriamente na última década. Slam e vencer Ferrer nos Em 1993, cifrava-se em 22,5 quartos, Nadal nas meias anos e em 2013 elevou-se para e Djokovic no domingo. Só 28,5 anos, muito devido aos dois triunfos de Serena, ambos ganhar um desses encontros obtidos com 31 anos. é um esforço colossal” No último Open dos EUA, três Fabrice Santoro das quatro semifinalistas e cinco das oito quarto-finalistas tinham pelo menos 30 anos. A vencedora, Serena Williams, tornou-se a poucos dias de completar 32


Entradas no top 100 em 2013 ATP (média de 23,2 anos) Martin Alund (Arg) Federico Delbonis (Arg) Pablo Carreño Busta (Esp) Kenny De Schepper (Fra) Alejandro Gonzalez (Col) Jesse Huta Galung (Hol) Steve Johnson (EUA) Bradley Klahn (EUA) Denis Kudla (EUA) Oleksandr Nedovyesov (Caz) Tim Smyczek (EUA) Jack Sock (EUA) Jan-Lennard Struff (Ale) Jiri Vesely (Che)

27 anos 22 anos 22 anos 25 anos 24 anos 27 anos 23 anos 23 anos 20 anos 26 anos 25 anos 20 anos 23 anos 19 anos

WTA (média de 20,6 anos) Eugenie Bouchard (Can) Jana Cepelova (Esq) Caroline Garcia (Fra) Julia Glushko (Isr) Madison Keys (EUA) Garbine Muguruza (Esp) Kurumi Nara (Jap) Paula Ormaechea (Arg) Teliana Pereira (Bra) Dinah Pfizenmaier (Ale) Karolina Pliskova (Che) Monica Puig (Ptr) Alison Riske (EUA) Anna Schmiedlova (Esq) Elina Svitolina (Ucr) Ajla Tomljanovic (Cro) Lesia Tsurenko (Ucr) Donna Vekic (Cro)

anos, a mais velha campeã do torneio desde 1950! Ao contrário do que se passa no circuito masculino, a WTA implementou em 1995 uma regra que limita o número de torneios disputados por teenagers, com o objectivo de reduzir o número de abandonos prematuros do circuito profissional e prolongar a carreira das atletas. Talvez essa seja a razão por que a média de idades das estreantes no top 100 continue a rondar os 20 anos. Mas a dificuldade em entrar nesse ambicionado “clube” traduz-se no número de debutantes: em 1993 foram 27 e no ano passado apenas 18. “Todas se preocupam mais com os seus corpos de modo a jogar até mais tarde. Mulheres e homens têm tomado mais atenção à preparação física e à alimentação. É muito bom podermos ter carreiras mais longas”, afirmou Victoria Azarenka, finalista do Open dos EUA. Já o ex-número um mundial Jim Courier, que ganhou Roland Garros

19 anos 20 anos 20 anos 23 anos 18 anos 20 anos 21 anos 21 anos 25 anos 21 anos 21 anos 21 anos 23 anos 19 anos 19 anos 20 anos 24 anos 17 anos

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ANÁLISE A 2013 em 1991 com 20 anos é peremptório quanto ao reaparecimento de jovens campeões: “Não tenho dúvidas que irá acontecer outra vez, quando um jogador muito especial aparecer.” * Versão completa do artigo publicado no jornal Público, em 28 de Dezembro de 2013

Jogadores no top 100 do ranking ATP com mais de 32 anos  6.º Roger Federer 12.º Tommy Haas 27.º Jurgen Melzer 28.º Feliciano Lopez 39.º Jarkko Nieminen 44.º Radek Stepanek 53.º Nikolay Davydenko 61.º Lleyton Hewitt 64.º Albert Montanes 70.º Filippo Volandri 76.º Victor Hanescu 77.º Ivo Karlovic 78.º Benjamin Becker 92.º Michael Russell

(Sui) (Ale) (Aut) (Esp) (Fin) (Che) (Rus) (Aus) (Esp) (Ita) (Rom) (Cro) (Ale) (EUA)

08-08-1981 03-04-1978 05-22-1981 09-20-1981 07-23-1981 11-27-1978 06-02-1981 02-24-1981 11-26-1980 09-05-1981 07-21-1981 02-28-1979 06-16-1981 05-01-1978

Jogadoras no top 100 do ranking WTA com mais de 30 anos 22

1.ª Serena Williams  3.ª Li Na 14.ª Roberta Vinci 31.ª Flavia Pennetta 33.ª Daniela Hantuchova 35.ª Klara Zakopalova 39.ª Francesca Schiavone 49.ª Yvonne Meusburger 53.ª Jie Zheng 61.ª Kimiko Date-Krumm 98.ª Virginie Razzano 99.ª Anabel Medina Garrigues

(EUA) (Chi) (Ita) (Ita) (Esq) (Che) (Ita) (Aut) (Chi) (Jap) (Fra) (Esp)

26-09-1981  26-02-1982 18-02-1983 25-02-1982 23-04-1983 24-02-1982 23-06-1980 03-10-1983 05-07-1983 28-09-1970 12-05-1983 31-07-1982



FORMAÇÃO

Melhor Formação, melhores resultados!

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A subida global do ténis português (todos os anos, desde 2009, os jogadores portugueses têm batido recordes em praticamente todos os escalões), está Vítor Cabral Dir. Dep. intimamente ligada ao Desenvolvimento FPT projeto de Formação de treinadores da Federação Portuguesa de Ténis (FPT), que cumpriu em 2013 uma década de funcionamento. Com o foco no desenvolvimento de jogadores e na iniciação (identificada como uma das grandes falhas do ténis português 10 anos atrás) a área de Formação da FPT promoveu uma mobilização sem precedentes dos treinadores portugueses ao longo desta década e o aparecimento progressivo destes resultados evidenciam uma melhoria alargada e sistemática do nível destes técnicos. A FPT procurou estar sempre na linha da frente nesta área, sendo neste momento uma das 10 federações (num universo de 62) com validação definitiva do Instituto Português do Desporto e da Juventude (IPDJ) para os novos cursos de treinadores, lançados em 2012. O investimento dos seus recursos humanos neste novo paradigma de Formação garantiu que o ténis se mantivesse sempre na linha da frente. Determinante foi também o reconhecimento do sistema formativo da FPT pela Federação Internacional de Ténis (ITF) em 2013,

integrando Portugal num reduzido grupo de 14 nações reconhecidas com o Gold Standard. Este processo é fundamental para a mobilidade dos treinadores radicados no estrangeiro, um fenómeno que cresceu exponencialmente no ano transato. Central a este reconhecimento foi a implantação da metodologia Play+Stay (P+S) da ITF, que se revelou rápida e global ao ponto de colocar Portugal na linha da frente do programa, sendo reconhecidamente um dos países mais inovadores e dinâmicos. Em paralelo com a evolução na metodologia de ensino, foi neste contexto que se lançou o Smashtour, a face competitiva do P+S. O nível técnico dos jovens Sub-10 que participam neste programa que tem já mais de cinco anos é verdadeiramente impressionante. O impacto da formação de treinadores a nível mundial, atingiu também o seu maior expoente em 2013, com a nomeação de um português para a Comissão Mundial de Treinadores da ITF. É a primeira vez na história que Portugal ocupa este cargo, consolidando a perspetiva da ITF sobre o “ fenómeno” português.



NO CIRCUITO

O ano histórico de João Sousa 26

“Guimarães foi a semana mais marcante da vida”


Um ano depois de ter sido capa da primeira edição da MatchPoint Portugal, João Sousa recorda a memorável época de 2013 e conta-nos as suas sensações ao longo do ano. Hugo Ribeiro Há exactamente um ano, mesmo antes do Open da Austrália, João Sousa deu a sua primeira grande entrevista à MatchPoint Portugal, apadrinhando da melhor maneira o número de lançamento da nossa revista de ténis. Na altura poucos adivinhariam, mas a entrevista foi o prenúncio da melhor época de sempre de um tenista português e o ano terminou com o vimaranense omnipresente nos media portugueses. Foi exactamente por já ter dito quase tudo sobre a histórica vitória no Open da Malásia e a entrada no top 50 mundial que o “Conquistador” solicitou uma abordagem diferente à conversa que lhe solicitámos, primeiro para a edição do 149.º aniversário do Diário de Notícias (DN) e posteriormente para a MatchPoint Portugal. Como no DN foi publicada parte do longo diálogo com o n.º1 português, o testemunho que aqui deixamos acaba por conter excertos inéditos. O português residente em Barcelona preferiu contar-nos como viveu as várias fases que atravessou ao longo de 2013, dando a entender que sem os momentos maus que superou, provavelmente nunca se teria coroado como o primeiro português a arrebatar um título de singulares do ATP World Tour, a ascender ao 47.º posto do ranking mundial e a qualificar-se para a terceira ronda do Open dos Estados Unidos. “Tudo começou em Chennai. Eu tinha feito uma boa pré-temporada mas não entrei a jogar bem. Perdi com o Bedene (86.º ATP) que foi depois às meias-finais”. Na semana seguinte, em Sydney, venceu as três rondas do qualifying, batendo na primeira ronda um top 100, o francês Rufin (91.º). “Senti-me a jogar muito melhor em Sydney”. Perdeu na primeira eliminatória do quadro com o alemão Mayer (28.º). No Open da Austrália, entrou pela primeira vez directamente no quadro principal de um torneio do Grand Slam, um marco histórico. “Estava muito nervoso porque tinha um adversário que era um wild-card (o australiano John Patrick Smith), sabia ser acessível, tinha-o derrotado na semana anterior e quem tinha pressão era eu,

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NO CIRCUITO

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mas joguei bem e ganhei em três sets”. De seguida deparou, nada mais, nada menos, do que com Andy Murray, n.º3 do ranking e campeão do US Open. “Foi uma experiência óptima. Era o meu primeiro top 5 e permitiu-me perceber o que era preciso fazer para se jogar àquele nível”. Foi na Hisense Arena de Melbourne Park, “um court enorme, nunca tinha jogado num estádio tão grande”. Da Austrália passou para a terra batida sul-americana, o seu piso preferido e as grandes expectativas foram goradas, apesar de pelo meio ter ajudado Portugal a derrotar o Benim no CIF. “Não me senti muito bem, perdi várias rondas. Não creio que tenha sido por algum desgaste na Taça Davis porque o Benim foi fácil, mas talvez por muitas viagens me terem quebrado o ritmo competitivo, talvez por não me adaptar bem às condições de jogo”. Em Viña del Mar perdeu com o espanhol Gimeno Traver (64.º), em São Paulo com o colombiano Gonzalez (211.º) e em Buenos Aires com o argentino Delbonis (123.º). Foi preciso chegar a Acapulco, curiosamente o mais forte destes torneios, para averbar nova vitória e logo frente ao austríaco Melzer (49.º), antigo semifinalista de Roland Garros. “Foi no México que comecei a jogar melhor. Bati o Melzer no Central e na altura foi a melhor vitória da minha carreira, não só pelo ranking dele, mas pelo que ele já fez. Perdi de seguida com o Giraldo (66.º) mas saí confiante dessa semana”. Numa temporada de novidades, de descobertas, João Sousa tinha agora terreno virgem pela frente na famosa série norte-americana de torneios Masters 1000. “Admito que não foram nada fáceis essas quatro semanas em Indian Wells e Miami. Era a minha primeira vez nesses torneios e é complicado estar longe de casa, saber que em caso de derrota cedo não poderia voltar para casa e teria de esperar muito até ao próximo torneio”. Na Califórnia perdeu na primeira ronda do quadro com o ex-nº1 mundial Lleyton Hewitt (91.º) e na Florida logo de entrada no qualifying, de novo diante do colombiano Giraldo (81.º). “Não foi fácil de lidar com isso mas em Miami aproveitei para frequentar a Universidade ATP. Foi bom, valeu, aprendemos sobre a história, a organização e os investimentos do ATP World Tour,

“Em Miami, aproveitei para frequentar a Universidade ATP”


Em Guimarães, Sousa aprendeu muito a nível mental

deram-nos informações importantes sobre os programas de combate ao doping e às apostas ilícitas. O Gastão [Elias] também esteve lá, tornando a coisa mais agradável”. Saiu dos Estados Unidos “um pouco em baixo, decepcionado”. “Vim para Portugal, para a Taça Davis. Ainda por cima, lesioneime e estive várias semanas parado sem competir em terra batida, forçando-me a falhar os torneios de Monte Carlo, Barcelona, Estoril e Casablanca”. Dava-se o início à sua série negra de 2013. “Era um período em que começava a jogar bem e mentalmente foi muito difícil aceitar a lesão. Só damos valor à saúde quando nos vemos parados, mas teve aspectos positivos pelo que aprendi e também por verificar que conseguia fazer uma boa recuperação”. Nessa altura, João Sousa dedicou-se um pouco às redes sociais e tornou-se num fenómeno de popularidade, recebendo apoio de

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João Sousa foi um dos nomeados para o prémio de Atleta Masculino do Ano, pela Confederação do Desporto de Portugal

centenas de anónimos. “Senti aí que as pessoas estavam com boas expectativas em relação a mim, que acreditavam no meu valor e que me apoiavam, mesmo tendo saído do top 100 mundial e de ter perdido o n.º1 nacional. Senti o carinho das pessoas”. Esse apoio foi fundamental para superar também os dois problemas mais complicados que enfrentou em 2013: a polémica em redor do Portugal Open e a divergência com a Federação Portuguesa de Ténis (FPT). “Há aí um equívoco. Não fiquei chateado por o wild-card ter sido dado ao David Ferrer. Se eu fosse director de torneio faria o mesmo. Até falei disso com ele porque damo-nos bem. Fiquei chateado pela forma como foram dados os outros wild-cards. Há anos em que esperam até à última e este ano [2013] foi tudo muito cedo. Eu poderia ter aceitado, jogava, recebia o dinheiro e vinha-me embora, mas portei-me bem e telefonei todos os dias a informar da minha lesão. E o João Lagos nem falou comigo. Mandou outra pessoa. A Taça Davis é um tema mais complicado. Adoro jogar pela selecção e ajudar o meu país e a lesão [fractura do dedo do pé esquerdo a jogar futevólei] foi culpa minha e não da FPT, mas chateei-me por não quererem dar-me o dinheiro da eliminatória. Afinal, dispus daquela semana para a selecção. A FPT também deveria ter um seguro decente e não serem os jogadores a avançar o dinheiro e depois serem reembolsados. E se não tivermos dinheiro para os tratamentos? Mas isso está sanado, não dei relevância e na Moldávia joguei cinco horas e meia, mostrando que estou com a equipa”. Ao voltar à competição, como 123.º do mundo, parecia mentira, mas caiu-lhe em sorte de novo Santiago Giraldo (81.º) e, pela terceira vez em cinco meses, perdeu com o colombiano na qualificação do Masters 1000 de Madrid. Voltou aos Challengers em Bordéus, sem sucesso e no novo ATP 250 de Dusseldorf ainda ganhou dois encontros antes de ceder na ronda de qualificação. Foi nesse estado de forma crescente, mas cheio de dúvidas, que chegou a Paris. “Em Roland Garros senti-me a jogar melhor. A partir daí foi sempre a progredir”. Impôs-se ao japonês Soeda


(124.º) e deu muito que fazer ao espanhol Feliciano Lopez (43.º). Ao sair de Paris, não houve qualquer dilema em voltar aos Challengers. “Foi bom para ganhar ritmo, para somar pontos. Ganhei em Furth (pela segunda vez) mas na semana seguinte sentime cansado [segunda ronda em Kosice]. Em Wimbledon joguei bem, gostei de jogar em relva, poderei ter ali bons resultados, mesmo perdendo na última ronda do qualifying. Estava confiante e voltei aos Challengers, com quartos-de-final em Todi, final em San Benedetto, quartos em Poznan”. Estava na hora de voltar a casa, até porque o Village Sports Hotel & Spa Club acolheu em Guimarães um torneio feito à medida para o filho pródigo. “Foi inesquecível, com uma pressão enorme, aprendi muito a nível mental, foi a semana mais marcante da minha vida. Acreditei mais no meu valor e isso levou-me a um grande US Open, duas boas vitórias e à derrota com o Novak Djokovic num dos mais emblemáticos estádios do Mundo [Arthur Ashe]. E depois disso foi a vitória no Open da Malásia, num torneio cheio de bons jogadores e eu a jogar ao meu melhor nível”. Neste resumo, João Sousa deu alguns saltos temporais. Entre Guimarães e Nova Iorque ainda passou pelo Ohio, para derrotar mais um top 100 no qualifying do Masters 1000 de Cincinnati, o russo Bogomolov Jr. (70.º). Na semana seguinte, em Winston Salem, passou a qualificação e cedeu na segunda ronda do quadro frente ao mesmo Bogomolov Jr. Em Flushing Meadows obteve duas vitórias históricas sobre o búlgaro Dimitrov (29.º) e o finlandês Nieminen (41.º), antes da tão mediática derrota com o nº1 Novak Djokovic. Na Austrália medira forças com Murray, em Indian Wells com

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Hewitt e agora era Djokovic mas para ele não há termo de comparação. “O Djokovic foi extraordinário, nem me deixou jogar bem. Não tem nada a ver com o Murray que deixa jogar, mesmo o Hewitt e o Ferrer deixam. Com o Murray, por exemplo, sentia que podia fazer algo com o segundo serviço, mas com o Djokovic, nada! Senti-me impotente. Ele entrou com tudo para me vencer. Na entrevista antes de entrar no campo disse que sabia que eu era perigoso, que não poderia desleixar-se e não pude fazer nada”. João Sousa saiu da cidade que nunca dorme cheio de insónias, tantas as entrevistas concedidas aos media portugueses mas a sua concentração estava ao máximo quando duas semanas depois regressou à selecção nacional para contribuir para a difícil eliminatória na Moldávia que permitiu a Portugal subir ao Grupo 1 da Zona Euro-África: bateu Dubarenco em quatro sets e perdeu 11-9 no quinto set com Albot. Voltou aos torneios do ATP World Tour em S. Petersburgo e vergou três top 100: o italiano Lorenzi (83.º), o ucraniano Stakhovsky (92.º) e o russo Tursunov (34.º), antes de ser esmagado nas meias-finais pelo espanhol Garcia Lopez (74.º). Fala-se pouco desta semana, mas a antiga capital do império russo foi um trampolim para o retumbante sucesso no Open da Malásia, com triunfos sucessivos sobre o norte-americano Harrison (109.º), o uruguaio Cuevas (457.º), o espanhol Ferrer (4.º), o austríaco Melzer (26.º) e o francês Benneteau (33.º), salvando um match-point na final. O primeiro título de singulares de um português no ATP World Tour, a melhor vitória de sempre de um luso – David Ferrer, n.º4 – e a primeira vez que um português desfeiteou três top 40 em rondas sucessivas! “Às vezes, no Verão, os torneios não estão tão fortes, mas em Outubro é diferente, estavam grandes nomes em Kuala Lumpur como o David Ferrer, o Nikolay Davydenko, o Nicolas Almagro e o Stanislas Wawrinka e todos queriam pontos. Eu tive boas vitórias e senti-me a jogar bem. Nunca pensei para além de ronda a ronda, estava solto e a acreditar”. Vários factores contribuíram para esse ténis solto e inspirado que levou o comentador da Sky Sports a prognosticar que nascera uma estrela. Um desses factores foi perceber que a responsabilidade estava do outro lado da rede. A enorme pressão que sentira em Guimarães


situava-se agora em Ferrer, Melzer e Benneteau. Sem a vitória em Guimarães não teria havido a marcha triunfal em Kuala Lumpur. “Totalmente de acordo. Eu sabia que, em teoria, eles eram mais fortes do que eu. A pressão era toda deles e eu já tinha sentido isso na pele em Guimarães. Só tinha de jogar solto e foi o que fiz, não só em Kuala Lumpur mas em todo o final da época”. A capacidade de jogar solto radicou também na percepção, nas suas vindas a Portugal, das dificuldades dos seus compatriotas, mesmo residindo em Barcelona. “Na Malásia falei com o Frederico [Marques, o treinador] e disselhe: já viste, nós aqui a fazer o que gostamos e no nosso país há quem não tenha para dar aos filhos. É isto que penso quando as coisas não correm bem, quando não venço”. O João Sousa que há uns anos entrava numa espiral negativa, aprendeu a lidar com o erro, graças aos momentos menos bons que ultrapassou em 2013 e também por saber relativizar os seus problemas, ao solidarizar-se com as vítimas da crise. Após Kuala Lumpur, ganhou três encontros e perdeu dois, com derrotas em Moscovo e Paris e oitavos-de-final em Valência, vindo do qualifying, com uma desforra saborosa sobre Garcia Lopez (64.º) mas, em Portugal, João Sousa já se tinha transformado no novo herói nacional. O Conquistador de Guimarães tornara-se num autêntico Tigre da Malásia. * Versão completa do artigo publicado no jornal Diário de Notícias, em 29 de Dezembro de 2013

O número um português ajudou Portugal a vencer o Benim 33


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ENTREVISTA

PEDRO CORDEIRO 34

“Dificilmente serei candidato à FPT mas o meu irmão dá um bom presidente” Por Hugo Ribeiro (com Pedro Keul)


nove anos acumulou o cargo de seleccionador Pedro Cordeiro é um dos grandes da história nacional. do ténis português, quer como jogador, Mas por muito que tivesse gostado de quer como treinador. Chegou a ter uma recordar o jogador que vi ganhar quatro experiência esporádica como promotor de títulos nacionais, a entrevista tinha de eventos, aparece com alguma regularidade a versar, sobretudo, sobre a sua carreira de comentar ténis na televisão e, quem sabe, se seleccionador. um dia poderá interessar-se pela política da modalidade. PP:Não era suposto começarmos esta A decisão de entrevistá-lo veio no momento entrevista pelo livro que os jogadores certo, logo após a sua dispensa do cargo te ofereceram mas a realidade é que de super capitão das selecções nacionais foi uma surpresa para todos. feminina e masculina e foi um dia depois de ter sido homenageado pelas jogadoras e RR:Sim, foi uma surpresa. Agora começo a jogadores no Restelo que nos sentámos num juntar as peças. O Rui, há uns tempos, dissehotel em Lisboa para uma longa conversa. me que estavam a juntar tudo o que tinha a Gostaria que a entrevista tivesse recordado ver com a carreira dele, pediu-me algumas mais o jogador que foi, pois há muito de fotografias de eliminatórias da Taça Davis pioneiro em Pedro Cordeiro. Desde os seus que ele não tinha e eu fui-lhe mandando. No triunfos em torneios internacionais juvenis início da semana a minha mulher [Joana] que nos fizeram sonhar com um primeiro disse-me que havia uma colega com quem ídolo português a vingar lá fora; até à vitória, trabalhou que ia fazer um jantar em casa já em final de carreira, num Masters de pares de um circuito satélite ATP na Quinta da Marinha, o Pedro pisou terrenos novos. Apareceu Pedro Maria Oliveira Cordeiro no ranking mundial em posições dos Santos para altura impensáveis e até foi o primeiro tenista português Data de nascimento: 14 de Fevereiro de 1963 Naturalidade: Porto a tornar-se estrela da TV em Residência: Porto anúncios comerciais. Clubes: Clube de Ténis do Porto, Lawn Tennis Club da Depois, como treinador de Foz, e Boavista F.C. jogadores como Nuno Marques Títulos: 4 de campeão nacional de singulares (1982, 1983, 1984, 1985), 8 de campeão nacional de pares e João Cunha e Silva, mostrou (1979, 1980, 1982, 1983, 1984, 1986, 1988 e 1989) a importância de passar a Melhor ranking mundial de singulares: 517.º (1986) experiência adquirida no Melhor ranking mundial de pares: 334.º (1987) circuito e muitos outros tenistas Taça Davis, jogador: 10 vitórias-15 derrotas (5-8 em portugueses de renome passaram singulares), em 12 eliminatórias Taça Davis, capitão: 14 vitórias-8 derrotas por ele. Foi a Pedro Cordeiro que Fed Cup, capitão: 13 vitórias-11 derrotas João Lagos confiou várias das Profissão: Treinador de ténis suas academias e nos últimos

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ENTREVISTA com pessoas com que tinha lidado mais de perto. Há dois dias, o Diogo Rocha também me ligou a dizer que tinha umas raquetes e se eu ia a Lisboa para poder trazê-las para o Porto. Entretanto, também o Manecas ligou-me a dizer que tinha um material do Pedro [Sousa] e como ele já não vinha a Lisboa se eu me importava de levar-lhe. Cheguei ali (ao CIF), encontrei o Norberto [Santos], perguntei-lhe pelo Manecas e só quando cheguei ao restaurante vi que iria passar-se qualquer coisa. Foi uma surpresa espectacular. PP:Nunca tinha visto uma homenagem destas com anteriores capitães. RR:Nove anos marcam. Têm coisas boas, coisas más, a minha relação com os jogadores ficou demonstrada nesta homenagem. Certamente discordámos de coisas, mas a relação foi muito mais do que entre um seleccionador e jogadores. PP:Já tiveste oportunidade de dar uma vista de olhos, de ler as mensagens?

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RR:Já li todas as dedicatórias, revivi memórias, amizades que se criaram, claro que passei mais tempo com uns do que com outros, mas todas as mensagens me sensibilizaram muito. PP:A ideia de aproveitar o livro como fio condutor da entrevista foi do Pedro Keul e gostaríamos de, mesmo parecendo exaustivo, falasses um pouco de cada um deles. Seguimos a ordem do livro e começamos pela

Michelle Brito. Surpreendeu-te ela escrever em português? RR:Quando estávamos na selecção ou quando estávamos juntos eu fazia questão – ela sabia disso e fazia-o também – de falarmos em português. Às vezes ela começava a falar e depois perguntava-me: –não é assim que se diz, pois não?–, eu dava-lhe uma ajuda, mas desde o primeiro dia que notei que apesar de viver nos Estados Unidos desde os nove anos tinha muito orgulho em ser portuguesa e representar a selecção. Lembro-me de quando assumi o posto querer saber porque razão a Michelle não jogava por Portugal e ninguém soube dizer-me porquê. Nessa altura estávamos no Grupo 2 e eu pedi à FPT para ir a Miami, que me pagassem a viagem porque eu arranjava alojamento. O Frederico Gil também estava a jogar o qualifying. Falei com o pai dela e depois perguntei à Michelle porque nunca tinha jogado a Fed Cup e ela respondeu-me que nunca tinha sido convidada. Eu disse-lhe que estava a convidála e ela respondeu-me que podia contar com ela. Desde aí, apesar de só vê-la duas vezes por ano, quando há Fed Cup e quando vou a Miami ou ao US Open, também estive com ela em Roland Garros, criámos uma boa relação. As novas tecnologias permitem-no. A Michelle é uma miúda extraordinária, tem uma postura de estar no campo como até muitos homens deveriam ter, ela dá tudo à exaustão. Tem coisas a melhorar, mas ganhou muitos encontros por ser uma grande guerreira. PP:Falou-se que não estiveste muito longe de treiná-la porque chegaste mesmo a conversar com o pai dela sobre detalhes técnicos.


Fernando Correia/FPT

RR:Não estive propriamente perto. A dada altura, o António pediu-me algumas opiniões, eu também já a tinha visto jogar algumas vezes e gostaria de partilhar com ele algumas opiniões, disse-lhe o que ela deveria melhorar e depois perguntei-lhe se já tinham equacionado virem para Portugal porque hoje em dia já há boas condições e que tudo o que ele precisasse de mim, cá estaria. É verdade que disse ao pai o que achava do serviço dela, mas também dei conselhos a outros jogadores. No caso dela também falei da movimentação no campo. Para piso rápido ela tinha as coisas bem assimiladas, mas para terra batida tinha de fazer alterações se queria andar no circuito. Também falei sobre o trabalho físico que ela necessitaria de começar a fazer. PP:O José Morgado [jornalista] disseme que esteve a ver atentamente os resultados dela e que nos últimos

tempos, exceptuando a vitória sobre a [Maria] Sharapova em Wimbledon, os melhores resultados foram na Fed Cup. RR:Efectivamente foram. O mérito é dela, mas é claro que teve essa vantagem de podermos ajudá-la muitas vezes. Não são só as dicas que dás, é também o conforto que proporcionas quando as coisas não estão a correr bem, para depois entrarem melhor na fase seguinte. Quando estão sozinhos nem sempre conseguem parar para pensar quando vão ao banco. A minha experiência diz-me que nesses momentos não deveremos dar muita informação, porque isso complica ainda mais. São mais pequenos detalhes. No caso da Michelle era curioso que bastava mudar uma coisinha e ela interiorizava logo e fazia-o. As outras, normalmente, tinham melhor ranking do que ela e bloqueavam. Via-a fazer encontros na Fed Cup inacreditáveis, como este ano [2013] com a Heather Watson. Mesmo com a Judy Murray ao lado, ela não sabia o que fazer. PP:Passamos agora para a Maria João Koehler. Teve graça ela recordar na sua mensagem a coragem que tiveste em colocá-la a jogar pela primeira vez em singulares, sabendo que irias ser criticado por isso. RR:Foi em Lisboa e pu-la a jogar porque merecia. Há sempre o dilema entre escolher a experiência sem estar nas melhores condições e inexperiência mas a jogar bem. Nessa altura foi mais do que merecido porque a Neuza [Silva] estava numa das melhores fases da carreira em termos de ranking mas vinha

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ENTREVISTA

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de um problema físico e mentalmente não estava no seu melhor. Dei-lhe uma ou duas chances, achei que ela não correspondeu e eu apostei na Maria João. É uma miúda que apesar de ser extrovertida é muito lutadora, é como a Michelle, uma guerreira. E acho que esse momento foi importante para a carreira dela.

perfeitamente que mesmo que fosse n.º5 do Mundo na Fed Cup era igual às outras. Não a apanhei muito tempo na Fed Cup, tal como a Ana Catarina.

PP:A MJK refere que algumas das maiores carradas de nervos que teve, sentimento de pressão, foi ao serviço da selecção, ela que tem jogado em grandes palcos frente a grandes jogadoras.

RR:Apanhei a Magali numa fase em que ela vinha de uma desavença com o Paulo [Lucas] e a própria Neuza e como elas faziam parte do mesmo grupo eu tinha de gerir aquilo. É uma miúda de que gosto imenso porque é frontal, não tem rodeios. Tive de ajudá-la a perceber o seu espaço e a acreditar nas suas capacidades. Ela optou muito cedo pela carreira de treinadora.

RR:Isso acontece muito porque ali estás a jogar pelo país. Isso só demonstra o prazer que eles sempre tiveram em representar o país. A Maria João tem evoluído imenso, é uma jogadora conhecida no circuito, teve a sorte de jogar algumas vezes em grandes courts, foi televisionada e as outras viram-na. Hoje em dia tem mais a noção de como usar as suas capacidades, está a fazer um esforço enorme para perder peso, o que para ela é fundamental. Todas aquelas queixas físicas dela têm a ver com peso. Ela tem um nível de ténis que já exige mais rapidez, travagens, arranques, deslocações, potência. PP:Passamos à Neuza Silva, que, entretanto, deixou de jogar e passou a treinadora. RR:Apanhei a Neuza já numa fase final de carreira. Não era uma jogadora fácil. Não sei se fazia parte dela ou se lhe foi incutido mas tinha uma determinada posição. Tive de chamá-la à razão e ela percebeu

PP:A Magali De Lattre, que está no Dubai como treinadora mas veio a esta cerimónia.

PP:A Bárbara Luz, da nova vaga de jogadoras, mas de quem há muitos anos se fala. RR:Com a Bárbara foram os últimos três anos. Fruto da sua entrega tem vindo a melhorar. Embora ela esteja melhor neste aspecto, é outra que acho que tem de melhorar fisicamente. Tem um treinador muito experiente e com muita qualidade que é o João Cunha e Silva, os frutos estão aí, aos poucos ela está a subir no ranking. Para subir mais terá de jogar mais depressa mas acho que o Cunha sabe disso. É uma miúda muito dócil, brincalhona, mas muito séria ao mesmo tempo, sabe diferenciar muito bem quando é precisa a seriedade de treinar e jogar. É outra guerreira que ganha muitos encontros à base da luta.


RR:É outra que apanhei no final de carreira. Foi uma grande promessa quando era miúda, mas na fase em que a apanhei estava minada de lesões. Era uma jogadora com alguma habilidade, muita mão como dizemos no ténis, fisicamente não era muito forte mas conseguia jogar muito bem e estava sempre disponível para o que fosse preciso, treinar, jogar, muito respeitadora, e dava o litro. Gostei muito de tê-la como jogadora. PP:A Ana Nogueira é uma jogadora diferente de todas as outras porque tinha sido treinada por ti muito antes de a teres na selecção. RR:Repara como ela só esteve comigo em duas eliminatórias. Apanhei-a no final da carreira, uma carreira que terminou por falta de apoios. Foi uma miúda que comecei a treinar quando passou dos 16 para os 17 anos, ela começou a jogar apenas aos 13 anos, como diz na mensagem, com o Francisco Coelho, uma referência no Porto, e ele veio dizer-me que não tinha disponibilidade para treinar a Ana Catarina a partir daquele momento porque ela tinha uma certa qualidade e merecia-o. Eu disse que sim, peguei nela, vi logo que era uma miúda que tinha uma forma de jogar parecida com a dos homens, pela forma de estar no campo, pela agressividade, por gostar de atacar, pela muito boa movimentação. Foi a primeira jogadora portuguesa que eu vi como uma atleta, capaz de praticar todas as modalidades e não apenas ténis. Portanto,

“Nove anos marcam. Têm coisas boas,coisas más, a minha relação com os jogadores ficou demonstrada nesta homenagem” tinha algumas capacidades no plano físico, foi sempre muito trabalhadora, ao mesmo tempo que jogava estudava, tanto que agora é licenciada em Educação Física. Durante algum tempo foi a nossa melhor jogadora, mas nessas Fed Cup lembro-me de uma em que nem era suposto ela ir, mas como não tinha mais jogadoras chamei-a. Foi notório como ela foi melhorando o nível de ténis de dia para dia, mesmo estando já com bolhas nas mãos e acusando desgaste físico. Foi um enorme prazer para mim treiná-la. Quando a convidei para ser treinadora da Fed Cup fi-lo porque estou convencido que tem todas as condições de ser a futura capitã. Assim não entenderam, mas a Ana Catarina, não só como jogadora, mas neste último ano como treinadora, vi a importância dela em alguns encontros bem complicados que tivemos. Fernando Correia JLS

PP:A Frederica Piedade, que agora é treinadora nos Estados Unidos e esteve na tua homenagem.

PP:A Margarida Moura, que ficou tão agradecida e, de certa forma, surpresa por ser chamada à selecção principal.

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ENTREVISTA RR:Chegámos a uma altura em que, olhando para trás, víamos na selecção apenas a Maria João e a Michelle. Era preciso renovar. Ela fazia, sem dúvida, parte daquele grupo de jogadoras que vinha logo a seguir, tal como a Barbara. Com a lesão da Maria João a Margarida era quem vinha depois e fazia todo o sentido. Uma miúda muito interessante, apesar de pouco confiante nela – aliás, acho que radicou aí um pouco a razão do seu abandono precoce, talvez também falta de apoio. Não me surpreendeu que ela tenha parado a competição porque às vezes na Fed Cup e nos torneios o importante era conhecê-los melhor e tentar perceber o que tinham na cabeça. A Margarida sempre deixou no ar a ideia de que a qualquer momento poderia deixar. Penso que ela não terá ido para os Estados Unidos porque já não podia. PP:Passamos à Carlota Santos que, sinceramente, já nem me lembrava que tinha sido seleccionada tua. Aí está uma jogadora que, ao contrário da Margarida, ainda conseguiu ir estudar e competir nos Estados Unidos. 40

RR:A Carlota provocou alguma controvérsia na altura. As pessoas esquecem-se que às vezes, quando convocamos temos alguns limites. Eu na altura só podia levar quatro jogadoras. A Ana Catarina e a Neuza eram indiscutíveis e ela era uma miúda que estava mesmo ali, já estava no primeiro semestre nos Estados Unidos. Nas mulheres era muito importante ter uma jogadora que pudesse ser útil por jogar tanto singulares como pares. Ora a Magali, naquela altura, não tinha

a noção do par, e os pares podem decidir muitas eliminatórias. Alguns colegas vossos criticaram a convocatória, mas ela ganhou encontros e teve uma postura impecável. PP:A Joana Vale Costa é, ao contrário da Carlota, uma das convocações mais recentes. RR:A Joana foi convocada em 2013 com todo o mérito pelos resultados que tinha vindo a fazer. Pela falta de apoio optou agora pelo circuito universitário, é uma forma de se manter no ténis. É uma miúda com qualidade, um bocadinho nervosa, às vezes entra em pânico mas tem garra.


RR:Porque a conheço melhor do que as outras. A Michelle e a Maria João ainda são jogadoras jovens, mas poderíamos equacionar a Ana Catarina, a Frederica, a Magali, a Neuza, e não quero dizer quer as outras não tenham condições, mas a Ana Catarina, pela forma de estar, pela forma como pondera as situações, tem todas as vantagens, para além de que, como sabem, temos equipas técnicas curtas e ela pode abraçar a área do treino físico por formação universitária. PP:Os melhores resultados de sempre de Portugal na Fed Cup foram obtidos contigo como capitão. Isso é algo que fica. RR:Se calhar tive a sorte de apanhar um grupo de jogadoras mais forte. Nunca tínhamos tido duas jogadoras de topo. Tínhamos uma e depois as outras eram mais fracas. Mas espero que esses bons resultados continuem. Agora estamos no Grupo 1, as equipas são muito mais difíceis, há muito boas equipas no Grupo 1 porque o regulamento da Fed Cup é diferente do da Davis Cup e a Zona Euro-África é muito forte com Inglaterra, Bulgária, há três anos até a Sérvia da Ivanovic e Jankovic. Na Europa há 16 equipas e 10 são muito fortes. Há pressões grandes para mudar isso, Portugal não tem muito peso político, mas a ideia é elevar o número de equipas no Grupo Mundial ou então aumentar o número de países no Grupo

2 e passar para um confronto directo ente países. PP:Portugal tem alguma tradição em treinadores que se especializaram no sector feminino, mas não é o teu caso. Foi curioso que tenhas acumulado as duas selecções. Olhaste para a Fed Cup como uma tarefa menor quando compara à Davis Cup, como tantas vezes acontece? RR:Nunca! São duas realidades diferentes. Tive a felicidade de na minha carreira ter treinado quer jogadoras, quer jogadores, andei em ambos os circuitos. Para mim é igual. A Taça Davis tem mais notoriedade porque temos três eliminatórias por ano enquanto a Fed Cup é só uma vez por ano. Há mais notícias, há mais envolvimento mediático, mas a minha postura é a mesma.

DR

PP:Pretendia perguntar-te de todas as jogadoras que orientaste qual a que tem mais características de boa capitã da Fed Cup mas já respondeste a Ana Nogueira.

PP:Deve ser completamente diferente a acção no terreno como capitão de equipas femininas das masculinas. RR:Completamente. As mulheres, graças a Deus, são muito diferentes dos homens. Começa logo pela forma como se relacionam entre si. Os homens, quando há problemas, resolvem as discussões de forma muito mais rápida. Elas ficam a matutar e a remoer, mas isso também era mais antigamente. Esta nova geração já tem mais parecenças com o ténis masculino. Mas lembro-me de alguns amuos e vaidades e não há dúvida que construir um espírito de equipa fora do campo é muito diferente nos dois géneros. Hoje em dia temos o mesmo espírito de equipa, tanto numa selecção como na outra.

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ENTREVISTA Mas devo dizer que quando isso acontecia, chamava-as à razão e tudo se resolvia sem grandes problemas. PP:Já dentro do campo, aquela tua regra de não dar demasiada informação de uma vez é igual para ambos os géneros? RR:Sim, embora o tipo de informação e o modo como a comunicas seja diferente de jogador para jogador. Há jogadores que precisam que estejamos mais tempo a puxar por eles do que outros. Há outros com que tens de ser mais duro e outros que têm de ser acalmados porque se excitam facilmente. Foi por isso que quando entrei nas selecções lutei para estar mais tempo com eles para além da semana de competição. Muitas vezes fui a despesas próprias porque a FPT não podia.

não correram da melhor forma. Pela positiva foram estes dois últimos anos no Grupo 1. Realmente tivemos grandes vitórias, não só da Michelle mas também da Maria João e isso marca. Estamos no Grupo 1 por direito próprio e não só porque tivemos sorte num ano. Aquele ano que ficámos em 5.º, à frente da Inglaterra que já tinha a Laura Robson, é o que guardo com maior prazer. PP:É mais difícil dirigir uma selecção feminina por só estares em competição uma vez por ano com as jogadoras, enquanto na masculina há três eliminatórias ao longo do ano? RR:É um pouco mais difícil porque estás menos tempo com elas e é por isso que é fundamental estares com elas noutros torneios, conheceres as atletas na forma de estar, como preparam os jogos, cada um é diferente, quando estás com eles uma semana e aprendes algo sobre elas só podes usar essa informação no ano seguinte. Portanto, é importante vê-las em competição noutras alturas. Parece-me, por exemplo, que elas são mais vulneráveis a aspectos exteriores do que os homens.

A Michelle é uma miúda extraordinária

PP:E uma última questão sobre a Fed Cup, qual a eliminatória que mais te marcou? Talvez aquela disputada em Portugal? 42

RR:De forma não tão positiva mas foi a de Portugal. Tínhamos uma equipa equilibrada mas não tivemos sorte no sorteio. Foi talvez a primeira selecção já com algum estatuto, com a Michelle, a Maria João, a Neuza e a Frederica, a jogar em casa, em piso rápido, tínhamos acabado de subir ao Grupo 1 e baixámos ao Grupo 2, uma das razões porque Portugal quis organizar foi exactamente a subida ao Grupo-1, criaram-se aquelas novas instalações no Estádio Nacional, e as coisas

PP:Por outro lado tens menos campo de recrutamento porque há menos jogadoras. Também tens uma escola de ténis, sentes isso? RR:Há, mas, se calhar, entre as mães e os pais não é um desporto que esteja muito divulgado, escolhem outras actividades.


Há poucas a jogar ténis, gostam mais de desportos colectivos. Neste momento temos mais miúdas a jogar do que no passado e com melhor qualidade, fruto dos resultados da Michelle e da Maria João. Claro que precisamos de mais. O grande problema é quando chegam aos escalões etários em que começa a ser necessário o trabalho físico e elas não querem. Também não sei se não haverá algum medo dos pais que elas andem pelo mundo fora, mesmo que digam que não. Com os rapazes já não se sente isso. PP:O António van Grichen é reconhecido como um dos bons treinadores do ténis feminino. Alguma vez aconselhaste-te com ele sobre a especificidade deste meio? RR:Conversamos muitas vezes. Conheci-o como jogador, tinha qualidade, embora pouco estável nos seus resultados, optou muito cedo por ser treinador, entrou no ténis feminino via [Victoria] Azarenka e teve resultados, está muito dentro do ténis feminino. Falei com ele sobretudo sobre jogadoras que iríamos defrontar na Fed Cup e que ele conhecia melhor. PP:Bem Pedro, fechemos então o capítulo da Fed Cup e vamos para a Davis Cup, uma vez mais, conversaremos sobre os jogadores, um a um, seguindo a lógica do livro e começamos pelo Rui Machado, o cérebro desta tua homenagem. RR:O Rui, de todos os que estão aí no livro, é aquele com quem tenho maior ligação, não só porque foi aquele que teve mais selecções

comigo, mas também fora do campo porque temos feitios parecidos. Encontramo-nos muitas vezes. Ele vai ao Porto, eu venho a Lisboa, estamos juntos. Mérito dos dois, isso nunca transbordou para o seio da selecção, ele nunca foi beneficiado, mas é um amigo que vou ter para o resto da vida. O Rui é como eu quando jogava, no campo muito concentrado mas depois, fora dele, não é andar a sair à noite, mas sabe aproveitar a vida, conhece outras coisas para além do ténis. É alguém com ideias muito concretas do que quer fazer no futuro quando deixar o ténis. É uma pessoa muito frontal, aceita quando percebe que está errado. PP:Pela garra que o Rui tem, sempre pensei, desde que ele era miúdo, que iria ser um dos melhores jogadores portugueses de sempre na Taça Davis, mas a verdade é que demorou muito tempo a ter bons resultados, parecia sempre muito nervoso. Agora já é um dos teus esteios e até terminas a carreira de seleccionador com uma vitória importantíssima dele na Moldávia. RR:O Rui está muito melhor agora e não foi por acaso que o chamei no último dia para decidir a eliminatória. O Rui era daqueles jogadores em que se percebia que sentia uma enorme responsabilidade de representar o país e às vezes bloqueava e não conseguia mostrar tudo o que sabia. Pela sua forma de estar, sente dificuldades em jogar cinco sets, tem muitos altos e baixos, saía facilmente do jogo. Tinha pontos altos, queria excederse, perdia o controlo do encontro e era difícil regressar. Nos últimos anos aprendeu a

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ENTREVISTA controlar as suas emoções e teve grandes resultados na Taça Davis. Com o afastamento precoce do Frederico Gil, o Rui passou a ser aquele com mais experiência. PP:Falando do Frederico Gil, fica para a tua história como aquele que mais vitórias te deu na Taça Davis.

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RR:Todos nos habituámos a confiar nele. Mesmo no circuito, jogadores de um determinado nível, quando iam defrontálo, poderiam achar que não tinham tido um dos piores sorteios mas sabiam que iriam ter de trabalhar muito porque ele não dava um ponto. O Frederico não se importava nada de estar ali cinco horas no campo. Lembro-me da eliminatória com a Argélia em casa, nós tínhamos alguma obrigação de ganhar a eliminatória e no final do primeiro dia estávamos a perder 2-0. Foi uma eliminatória ganha na raça, no último dia, no último singular em que o Frederico esteve a perder por 2-0 em sets, depois de ter estado a ganhar ambos os sets por 5-3. Eu percebi que o argelino estava desgastado fisicamente e disse ao Gil: “ganhas este set e vais rebentar fisicamente com o tipo“. Ele fez aquilo rigorosamente, pim-pim-pim, a mover o tipo e rebentou-o todo. No quarto set já estava com cãibras e no quinto nem se conseguia mexer. O Frederico era aquele cão que não largava. Ele, ao contrário do Rui, era sempre ténis, tinha de estar sempre a falar de ténis, se descarrilasse um pouco poderia desconcentrar-se. Já o Rui precisava disso como um escape para se manter concentrado. Houve ali um período que não terá sido muito fácil. Aliás, ele diz aí no livro que “por vezes somos putos e não ouvimos os mais velhos.

Lembro-me de uma eliminatória em que eu só pensava no meu ranking e tive uma postura que tu notaste”. Tive uma conversa com ele porque, na altura, ele até era o que tinha mais dificuldade em abrir-se ao grupo, mas hoje em dia, já mesmo antes desta fase menos boa dele, é uma pessoa completamente diferente. PP:E o Frederico tinha aquela polivalência de que falavas há pouco, tanto jogava bem singulares como pares, ele fartou-se de jogar pares na Taça Davis com parceiros diferentes. RR:Não só polivalente como dava muita confiança aos outros. Ele acreditava sempre que poderia ganhar. Isso fazia ver aos outros que pensavam: “eu jogo ao nível do


Frederico, este gajo acredita e ganha e eu não acredito porquê?”. Ele era um pilar, era uma peça importante. Quanto ao par, havendo o Leonardo [Tavares] na equipa, a dupla era eles. O Leo era o melhor jogador de pares, sem dúvida. Tinha características para isso, jogava bem atrás, á frente, à esquerda, à direita, tinha um serviço acho que o Gil aprendeu muito a jogar pares com ele. E o Gil deu-me a minha primeira vitória como capitão. PP:Esta é a melhor transição possível para o Leonardo Tavares RR:… Um jogador sempre disponível para a equipa, muito bom para o espírito de equipa, respeitou sempre as minhas opções, infelizmente foi um atleta fustigado por lesões, mas lembro-me sempre como um amigo, sempre a dar aos outros, tantas vezes mais aos outros do que a ele próprio e foi uma peça fundamental na selecção. Lembrome dele miúdo e de todos pensarmos que iria mais longe do que os outros, mas o ténis é um desporto complicado, reúne uma série de dimensões, designadamente a psicológica que é muito importante e esse é o aspecto mais fraco do Leo porque facilmente está no auge e facilmente deixa de acreditar nele. PP:O João Sousa é um pouco o equivalente masculino da Ana Catarina porque tiveste uma relação profissional com ele fora da selecção. RR:É um jogador que acompanhei de perto na sua evolução, a dada altura, em 2010, o pai perguntou-me se eu poderia viajar algumas semanas com o João, isso aconteceu,

o João começou a gostar do trabalho que eu estava a fazer com ele, aliás ele escreve isso no livro. De 2010 para 2011 o pai pediume para fazer a pré-época com ele, com o consentimento do Francis Roig. Fui lá à BTT treinar com ele, depois passei muitas semanas com ele em competição, assisti à primeira vitória do João num Challenger, em Furth, nesse ano ele esteve para regressar a Portugal para treinarmos no Porto e em Guimarães, e ele abandonaria a academia. Lembro-me de numa quinta-feira ter tudo tratado até de quem iria trabalhar com ele na parte física, o pai foi com o João a Barcelona no sábado para deixar uma porta aberta de modo a podermos ir lá treinar, ia manter-se o apartamento que ele dividia com outro, mas a academia melhorou-lhe as condições, não creio estar a cometer nenhuma inconfidência, e o João manteve-se lá. É um miúdo com qualidade, é um guerreiro, não quero menosprezar o Frederico Marques porque ele tem a sua quota-parte no sucesso e neste ranking do João, mas o João começou a ter outra estabilidade a partir daquele momento, com um treinador sempre com ele. PP:O João foi daqueles jogadores que entrou bem na selecção, tem bons resultados na Taça Davis. RR:O João é daqueles que quer levar tudo à frente dele. Desde miúdo. Aliás, aquela situação da lesão na selecção, do futevólei, é exactamente porque ele não gosta de perder em nada! Seja desporto, cartas, apostas. É um jogador com uma condição física excepcional, ganhou muitos jogos na luta, uma direita fortíssima, melhorou muito o serviço, os resultados ajudaram-no a crescer a e a ter

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ENTREVISTA confiança nele próprio. Ele entrou muito bem no grupo, mas, sinceramente, ele entrou quando o grupo já estava moldado e qualquer pessoa iria facilmente perceber à primeira o que se passava ali, qual era o ambiente e isso ajudou-o. Por outro lado, por viver fora do país, andar muito no circuito, cresceu como homem e integrou-se facilmente, apesar de lembrar-me que na sua estreia foi uma complicação para lhe cortarem o cabelo. O cabelo sempre foi o orgulho dele e temos aquela praxe de rapar o cabelo (risos). PP:O grande amigo do João Sousa, o Gastão Elias, desde sempre apontado com um grande futuro, mas um jogador que recusou algumas convocações. Terá sido, talvez, o que te deu mais problemas, apesar de ser um bom rapaz.

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RR:O Gastão, a partir de determinada altura, tal como a Michelle, foi lá para fora e deu-se um certo afastamento do país. Ele também sofreu alguma pressão do empresário, dos treinadores que foi tendo, que não são portugueses e não percebem como é importante defender o país. Ele teve alguns problemas por achar que como não iria jogar na selecção, seria uma semana perdida no circuito. Acho que ele agora está diferente, acho que fiz-lhe ver que ou se está com a selecção ou não se está. Disse-lhe: “vocês são livres, mas se de alguma forma recebem do Estado, têm de representar o país”. As coisas mudaram quando ele percebeu que também poderia ser jogador de singulares da equipa. Se tive problemas com ele foi só nesse aspecto. Quanto à integração no grupo, é um miúdo espectacular, é muito divertido,

por vezes pensava um bocadinho só nele mas melhorou muito, tudo isso está sanado e será um valor da selecção no futuro. PP:Foi difícil tomares a decisão de não colocá-lo no encontro decisivo com a Moldávia, naquele que acabou por ser o teu último encontro como capitão, e escolheres o Rui? RR:Não foi porque, lá está, é fundamental conhecer as pessoas. Eu comecei a notar algum receio por parte do Gastão se tivesse de jogar o encontro decisivo. Em conversas que eles às vezes pensavam que era de brincadeira mas para mim não eram e estava ali a ver qual era o sentimento deles. O Gastão tinha estado parado muito tempo com uma lesão, acusava algum cansaço físico da mesma forma como o Rui, nesta eliminatória, vinha de uma paragem por causa de um joelho e disse-me: “temos de gerir muito bem esta situação porque se tiver de jogar dois dias em cinco sets não sei se recupero”. O que o Rui estava a dizer-me é que não sabia se deveria jogar logo no primeiro dia ou no último caso fosse preciso para decidir tudo. Como o Rui estava confiante, vinha de ganhar um Future, preparei-o para jogar o último encontro. PP:Vamos agora ao Pedro Sousa. O pai dele, na entrevista que nos concedeu, disse que o Pedro adora a Taça Davis, a selecção nacional, mais do que qualquer torneio. Sentiste isso? RR:Senti à medida que fui conhecendo melhor o Pedro. Era um miúdo muito fechado, mas acho que está muito melhor, e era difícil


saber como ele era como pessoa. Ele é mais fechado do que os outros e isso nota-se até na sua postura no campo. No dia em que ele acreditar na qualidade de ténis que tem será muito complicado para os outros. Ele tem muita qualidade, mas às vezes não acredita. Talvez isso faça com que goste ainda mais de estar no grupo da Taça Davis, porque isso dálhe mais auto-confiança. Do que me apercebo, apesar de ser um pouco mais fechado, ele gosta de estar em grupo e não gosta de estar sozinho. Ele sentiu muito o peso de jogar pela selecção, apesar de gostar. Veja-se como com o Benim ele entrou muito nervoso e já não era a primeira vez. Pode ter havido momentos em que ele achava que deveria jogar e não jogou mas nunca desrespeitou a minha decisão. Eu tinha por hábito só comunicar à quarta-feira quem iria jogar, nunca nenhum deles me questionou, eu senti que o Pedro uma ou outra vez pensou que poderia ser ele, mas eu, por não conhecer tanto o Pedro, por ele ser mais fechado, não saber como iria reagir, eu não arriscava, por vezes em situações em que em termos de nível de ténis ele até poderia estar um pouco superior.

tudo. Era super inteligente a jogar, e tinha de ser porque fisicamente não é por acaso que aos 14 anos o IMG quis levá-lo e, na altura, segundo me contou o pai, as pessoas não quiseram arriscar. Se calhar, se tivesse ido, sabe-se lá A determinada altura treinei o Diogo, ele tinha a fama de não treinar muito fisicamente, mas enquanto ele esteve comigo em Espinho não tive nada a dizer, sempre trabalhou, fez o que lhe pedimos, teve um excelente resultado num Future. Depois acabou por optar pelos estudos, é licenciado em psicologia, já estagiou no Futebol Clube do Porto, é um elemento que não tenho dúvidas, daria um excelente treinador. Aliás, quando vou para fora e necessito de alguém para me substituir a nível de treinos é com ele que falo.

“No meu tempo de jogador só se falava de ténis”

PP:Bem, do Diogo Rocha não podes dizer o mesmo. Conheces o Diogo quase desde que nasceu, conheces bem o pai RR:Bem o Diogo até tem uma dedicatória espectacular por isso mesmo. Já disse várias vezes que ele daria um excelente treinador. Não enveredou por essa carreira, mas tem

PP:O Gonçalo Nicau é que seguiu mesmo a carreira de treinador e já com bons resultados.

RR:O Gonçalo é outro jogador com quem tive uma excelente relação extra-ténis, talvez porque quando ele veio à Taça Davis já era o mais velho deles todos. É um bom treinador, só estive com ele em duas eliminatórias e foi naquele ano em que ele realmente disparou. PP:O João Domingues é um jogador do qual tens algum conhecimento e do qual se fala cada vez mais. RR:Treinei-o no ano passado (2012), separámo-nos por outras questões, às vezes os pais quando se metem nos assuntos complicam, mas é um miúdo que tem

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ENTREVISTA qualidade, da nova vaga, esperamos que venha a ter um futuro muito risonho. PP:O André Murta foi a tua aposta frente ao Benim, era então algo desconhecido do grande público e nós até publicámos um perfil dele aqui na revista para que o conhecessem melhor. RR:É outro dos valores da nova vaga e falta nesta lista o Frederico Silva, que nunca tive oportunidade de ter no grupo, quando o convoquei estava lesionado, aliás o André Murta veio porque o Frederico não podia vir, mas sabia bem quem era e ele já tinha feito bons resultados. O André é um miúdo extraordinário, abraçou bem o espírito da Taça Davis. Esta nova geração tem a vantagem que chegar a um grupo com um entrosamento excelente. PP:E o último jogador desta análise é o Hugo Anão.

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RR:O Hugo também trabalhou comigo em Espinho, naquela grande vaga de jogadores que o João Lagos ajudou. Apesar de ele ser das Caldas da Rainha foi para Espinho, lembro-me bem dele como atleta, e tirando aqueles que andavam no circuito internacional era dos melhores que tínhamos em Portugal, daí ter feito parte do grupo da Taça Davis. Foi cedo que seguiu a carreira de treinador e agora é um dos elementos do CAR. PP:Tal como te pedi para a Fed Cup, peço-te agora que olhes para estes jogadores que orientaste e diz-nos quem julgas que um dia poderá dar num bom capitão da Davis Cup?

RR:(Silêncio) O Rui Machado. Primeiro pela idade. Depois, pela experiência que ele adquiriu, embora tenha ideia de que não faz muito parte dos horizontes dele ser capitão da Taça Davis. PP:Eliminatórias da Taça Davis foram muitas, mas há alguma que te fique na memória para contares aos teus netos um dia? RR:Há duas. Uma, aquela da Argélia que já referenciei, porque começámos a perder por 2-0 inesperadamente. Lembro-me de chegarmos ao hotel e de no jantar eles estarem cabisbaixos e eu pensei que só havia uma postura possível, que era desdramatizar, retirar-lhes a pressão e tentar dar a volta. Comecei por dizer-lhes que o par era nosso porque éramos muito superiores, depois expliquei-lhes que já não podíamos ser surpreendidos porque já os conhecíamos. Ganhámos o par, eles começaram a acreditar mais. Depois no encontro dos n.º1, o Rui conhecia bem o adversário de Espanha e


disse logo que iria ganhar-lhe em três sets e depois foi aquele encontro épico do Gil com aquela postura dele de não dar um ponto. Foi uma reviravolta que uniu muito o grupo. Foi ali que realmente começou a criar-se esta família da Taça Davis. A outra (grande memória) é esta última eliminatória (Moldávia), não porque fosse um país muito forte, mas por tudo o que envolveu a eliminatória, as condições difíceis que nos criaram, aquilo que todos sabem a nível de arbitragem e que nunca tinha visto na minha vida, também vai marcar-me. Nunca esperei que fosse a última, mas foi a última eliminatória. PP:Um seleccionador não lida só com jogadores, uma parte muito importante é também o relacionamento institucional com a FPT. Fala-nos um pouco de como viveste esses anos com presidentes como o Manuel Valle Domingues, José Corrêa de Sampaio, José Maria Calheiros, Vasco Costa. RR:Sem querer ser muito polémico, vamos diferenciar. Os presidentes da FPT não trabalham ali a tempo inteiro. Todos eles tentam fazer o melhor mas têm as suas vidas profissionais. Depois, há os funcionários da FPT e ao contrário do que muita gente diz, são pessoas extraordinárias que dão tudo por tudo. Haverá coisas que se poderiam fazer melhor? Se calhar sim, mas é verdade que não há verbas e que todos eles dão o litro pela FPT. Agora, há pessoas que vão para um cargo que exige uma ideia estratégica para o desenvolvimento do ténis português e às vezes não vão preparadas para isso. Tirando

este último presidente, todos os outros com quem trabalhei foram cinco estrelas, pessoas educadas, que apesar de defenderem as suas ideias sempre tiveram uma postura correcta comigo, frontais, e sempre me ouviram. Em relação a este último presidente, não queria entrar muito por aqui em detalhes, mas a única coisa que queria dizer é que esta não foi a forma correcta de fazer a coisa, não havia razão para fazê-lo. Tenho a noção de que não iria ficar como capitão da Fed Cup e da Taça Davis para o resto da minha vida mas como as coisas foram feitas e a altura não foram as melhores. A verdade é que ele quis o Nuno (Marques) na selecção desde que chegou à FPT e o Nuno sempre recusou. Só não recusou esta última porque entretanto deixou a Maria João e o caminho ficou livre. Com os outros presidentes sempre tive uma boa relação, mesmo como, por exemplo, quando tive divergências com o Calheiros por causa do CAR. Mas tenho de referir a admiração que tenho pelo Corrêa de Sampaio, a amizade com o Valle Domingues. PP:Na Fed Cup tens os melhores resultados de sempre, mas na Davis Cup é verdade que não tens uma presença num playoff de acesso ao Grupo Mundial como já aconteceu. De qualquer modo, o jornalista Manuel Perez tem mostrado várias vezes no jornal O Jogo como és o capitão com mais eliminatórias e mais vitórias na Taça Davis. Também é algo significativo. RR:É verdade, são coisas que não nos podem tirar. Também é verdade que não jogámos nenhum play-off desses mas também não

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ENTREVISTA

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tivemos sorte no sorteio nas vezes em que estivemos no Grupo 1, fosse pelos adversários, fosse por podermos jogar em casa, de modo a irmos a um play-off. Espero que este ano eles consigam fazê-lo porque é o desejo de todos.

Quando conseguirmos este passo de termos mais torneios em Portugal não tenho dúvidas de que irão começar a aparecer ainda mais jovens e, quem sabe, estes recordes vierem a ser batidos.

PP:Foste capitão de jogadores que formam a geração de ouro do ténis português. Falou-se nestes termos nos anos 90 do século XX mas estes jogadores são superiores. Alguma vez imaginaste que jogadores como o Frederico, o Rui e o João chegassem tão longe?

PP:Muito antes de seres capitão, foste jogador da Taça Davis. O teu estilo como seleccionador deveu-se a ensinamentos que tenhas tido com os treinadores que foram teus capitães?

RR:Imaginava, por várias razões. Primeiro porque sempre tivemos qualidade nas camadas jovens. Havia qualquer coisa que faltava para termos também essa qualidade no circuito profissional, as referências para os mais jovens. Começou com o Frederico, passou para o Rui e agora o João. Quer o João, quer o Rui, provavelmente, quando viram o Gil, acharam que também poderia lá chegar. Entretanto, passou-se o mesmo com o Gastão, o Pedro, o Frederico Silva. Outra das razões é que hoje há muito melhores técnicos em Portugal, muito melhores condições de treino, os nossos jovens não são diferentes dos outros. Temos excelentes treinadores na área da formação e aperfeiçoamento, começamos a ter bons treinadores de competição, que andaram no circuito como eu, o Nuno Marques, Cunha e Silva, Gonçalo Nicau, Hugo Anão, eu não queria dizer nomes para não me esquecer mas o Pedro Bívar, o José Vilela. Ainda temos uma lacuna forte que é a competição interna. Estas 30 semanas de Futures que vês em Espanha, em França, nós não temos. Temos uns 9 ou 10 torneios.

“Temos excelentes treinadores na área da formação”

RR:Sem dúvida, com todos eles aprendi! João Lagos, Vaz Pinto, o Luís Sousa só numa

eliminatória, o Santos Costa, todos eles. Aprendi muito, ao longo do tempo, com a forma de estar fora do court. No meu tempo de jogador só se falava de ténis e muitas comparações entre uns e outros. Uma das coisas que disse a mim próprio quando fui capitão é que seria proibido falar de ténis extra-treino. Falámos muito de política, das vivências de cada um, exactamente para criar este ambiente de família. PP:É possível comparar a satisfação de jogar na Taça Davis e de capitanear na Taça Davis? RR:Ficam memórias das duas. São duas coisas completamente diferentes. Enquanto jogador sofres porque estás ali a jogar,


mas como capitão sofres de uma maneira diferente, porque estás de fora, tentas ajudar, mas não podes evitar o nervosismo que quando estás a jogar anulas ao correr de um lado para o outro. Ali estás sentado no banco, é um engolir, as emoções são forte, não é por acaso que o Vilela apanhou um susto [problema cardíaco], eu graças a Deus consegui gerir de forma diferente essas emoções. Muitas vezes em pontos importantes nem olhava para eles. Para quem gosta de competição, são situações únicas. PP:Como jogador, qual o encontro da Taça Davis de que irás lembrar-te sempre? RR:O primeiro. Fui só jogar pares na Jugoslávia e defrontei um jogador que eu via quando era miúdo em Roland Garros e depois foi vice-presidente da ATP, o [Zeljko] Franulovic. O capitão era o João Lagos, os singulares eram o Vilela e o meu irmão [José Manuel] e eu joguei o par com ele. Marcame porque ter ido jogar a Taça Davis foi o máximo. Tenho ainda outra eliminatória na Foz, com o Zimbabué, jogou um tipo que tinha sido de topo mas estava numa fase descendente [Haroon Ismail]. Estava 2-1 para nós e naquela altura o último dia também era sorteado. Lembro-me que o Cunha tinha obrigação de ganhar-lhe e perdeu e eu fui jogar o encontro decisivo com esse tipo. Foi uma adrenalina incrível. Tenho outra memória frente ao [Tarek-Shawki] El Sakka, do Egipto, ele estava no top 200 e eu fora do top 500, jogámos no Jamor e eu joguei quase cinco horas e ele venceu em cinco sets, foi uma “ joga”. Na Taça Davis, como grande

vitória tenho no Mónaco. Já tínhamos perdido várias vezes com eles e fomos lá ganhar por 3-2, foi uma eliminatória incrível. PP:Um jogador e uma jogadora que nunca tenhas tido nas tuas selecções como capitão e que gostarias de ter podido contar? RR:O José Vilela e a Sofia Prazeres. Do que me lembro, quando conheci a Peggy [Brixhe] já era muito velha, a Leonor Peralta também, portanto, do que me lembro, a Sofia. Do José Vilela lembro-me bem. Fui apanha-bolas e juiz-de-linha em encontros do Zé. Gostava de tê-lo pela garra, força, raça, era terrível. Fui apanha-bolas de um Portugal-França na Foz com o [François] Jauffret e o [Georges] Goven. O Vilela fez uma “ joga” com o Goven até se enfaixou nas bancadas, o pessoal pensou que tinha morrido. Ele apanhava tudo. PP:O teu pai (Manuel) foi considerado um dos melhores, senão mesmo o melhor, presidente de sempre da FPT. É para ti difícil avaliar o trabalho dele? RR:Não é, pode é ser mal compreendido por ser meu pai. Não tenho dúvida que se o meu pai hoje em dia, com as condições que existem, tivesse a idade que tinha na altura, e fosse agora presidente da FPT, isto estaria muito melhor. Não tenho dúvida absolutamente nenhuma. Pelo empenhamento e pela possibilidade que ele tinha na vida de se empenhar. Naquela altura, Porto-Lisboa levava cinco horas de carro e ele vinha três vezes por semana para tratar das coisas da FPT. A dinâmica e o empenho que eu tenho

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ENTREVISTA é um reflexo do que vi no meu pai. Na altura ele foi muito importante. O ténis esteve para acabar a seguir ao 25 de Abril porque era um desporto fascista e lembro-me de o meu pai dar a volta ao demonstrar que era um desporto fortíssimo nos países de Leste, designadamente na Checoslováquia, na URSS, com jogadores como o [Alex] Metreveli e o [Jan] Kodes. Queria-se, por exemplo, taxar enormemente as raquetes e todo o material de ténis. PP:Vês-te um dia seguir os passos dele e candidatares-te à presidência da FPT? RR:Dificilmente! Mas via o meu irmão como presidente. O que já esteve para acontecer ser candidato, mas acho que o meu irmão tinha o perfil. PP:O teu pai foi presidente, tu e o teu irmão foram jogadores, a dinastia vai continuar, há Cordeiros jovens no ténis português?

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RR:A minha irmã também jogou. Iria mentir se dissesse que não gostaria mas nunca impus isso. Todos eles [filhos] andaram o ténis. O mais velho estuda e tem uma banda e os outros dois estudam e jogam futebol. O meu irmão tem uma filha, a Francisca, que jogava muito bem nos tempos da Maria João [Koehler] que saiu como o meu irmão, com habilidade para o desporto, mas mudou-se para o golfe e foi logo campeã nacional de jovens.

PP:Fala-nos um pouco do teu futuro. RR: Vou colaborar com o Pedro Sousa a partir de meio de Janeiro, vou ser eu o treinador principal. Eu já treino outro atleta, o Henrique Sousa, com quem vou continuar, é um grupo onde entrará o Diogo Rocha como falei há pouco. Para já o que está falado com o Pedro Sousa é vermos como se irão passar as coisas durante meio ano e depois logo veremos. PP:CAR ou Centro Nacional de Treino – um tema sempre polémico. Qual a tua política em relação a esta questão. Deveremos ter, não devermos? RR:Deveremos ter e o molde mais correcto até é este que vai ser feito agora. Já deveria era ter sido feito antes. A época começa em Setembro, Outubro, estamos em Janeiro e não há nada de concreto. Vai haver sempre um problema que é os melhores atletas que estão bem com os seus treinadores nunca irão querer ir para o CAR. Agora, se envolvermos no CAR mais torneios em Portugal, encarando-os como formação em Espanha, a Federação dá 50 por cento das despesas nos Futures, isso faz parte da formação de atletas. O Estado é que poderá não aceitar isso. Mas estes são os melhores moldes: quem quiser candidata-se. A FPT não tem de convidar. As candidaturas aceites têm algum apoio financeiro e técnico e têm de retribuir com parte dos prémios monetários, também para responsabilizá-los, e outra política que é usufruir do apoio da deslocação dos treinadores ao estrangeiro, poder ter acompanhamento. Agora, há polémica porque há sempre, mas o importante é seguir um rumo e acreditar nele.


Equipamento

Uma raqueta única Já não são só os profissionais que podem ter uma raqueta a seu gosto. Graças à HEAD, qualquer tenista amador tem agora a possibilidade de possuir uma raqueta de acordo com as suas preferências. Bastam alguns cliques e saldo na conta bancária Quando vamos à loja comprar uma raqueta, geralmente procuramos a dos nossos ídolos. E se é verdade que o modelo é parecido, as raquetas não são bem iguais às que eles usam. Os melhores jogadores do mundo encomendam as suas raquetas com determinadas especificações, de acordo com os seus gostos e objectivos. Pois agora a HEAD oferece igualmente aos comuns mortais a possibilidade de terem uma raqueta exactamente como preferem. “A HEAD Custom Made abre a porta a um inédito nível de personalização a que, até agora, apenas jogadores de classe mundial como Novak Djokovic, Andy Murray ou Maria Sharapova tinham acesso. Estamos muito orgulhosos por poder oferecer este serviço exclusivo a todos os jogadores de ténis que querem ir mais longe”, afirmou Otmar Barbian, vicepresidente e Division Manager da HEAD Racquet Sport.

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A encomenda pode ser feita através do site http://custommade.head.com/ e tem como base a nova raqueta Graphene, BLACK ou SPEED. Percorrendo o menu, as preferências


Equipamento

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de cada jogador vão sendo registadas. Pode-se escolher o comprimento (entre 670 e 705 milímetros), peso (entre 283 e 357 gramas) e a sua distribuição (equilíbrio): quanto mais perto do grip estiver o centro de gravidade, mais manobrável é. Quanto ao grip, existem opções para o tamanho (entre 1 e 5), a forma (quadrado ou redondo) e o tipo (couro, HydroSorb Pro e HydroSorb Comfort). Pode-se ainda indicar qual o padrão de encordoamento (16x19 ou 18x20), um dos três tipos de corda – monofilamento (Hawk para mais potência ou Sonic Pro Edge para mais spin) ou multifilamento (Power Fusion para mais conforto) – e a tensão (entre 20 e 30 quilos). O último toque de personalização é a gravação do nome a laser. A acompanhar cada item, existem conselhos e explicações de alguns dos jogadores de top. A encomenda é entregue em casa, cerca de duas semanas depois, numa caixa especial, acompanhada de um certificado com as especificações requeridas. O pior é o preço, 350 euros, não acessível a todas as bolsas. O lançamento deste novo produto foi realizado no início de Dezembro, em

Kennelbach (Áustria), sede da Head, com a presença de vários jornalistas convidados – entre os quais um representante da MatchPoint Portugal – e do reputado Bob Brett, treinador de Boris Becker, Goran Ivanisevic e Mario Cilic, entre outros. Brett recordou um episódio com Becker, no início de 1991, em que, depois de perder na primeira eliminatória do torneio de Brisbane, o tenista alemão se queixou das raquetas. Brett levou-as ao técnico de equipamento que já se encontrava em Melbourne para o Open da Austrália e este confirmou: as raquetas pesavam mais 0,5 gramas! Feitas as devidas correcções, as raquetas foram devolvidas a Becker


Equipamento

e, passadas umas semanas, o alemão conquistou o seu primeiro título no Open da Austrália. Depois de sublinhada a sensibilidade e exigência dos jogadores de top em relação ao seu equipamento, foi registada a primeira encomenda online, sob os conselhos de Brett. De seguida, os convidados deslocaram-se à fábrica para ver aquela raqueta tornar-se realidade. Desde a colagem das camadas de fibra, ao enrolamento num tubo com o diâmetro desejado, introdução no molde do modelo desejado, passando pelo forno de cozedura a 360 graus, perfuração dos buracos das cordas numa máquina de precisão, pintura, teste de resistência (as raquetas têm de bater cem mil bolas, à média de 120/minuto, a mais de 100 km/h), colocação do grip, correcção do peso e centro de gravidade e… a raqueta ficou pronta para encordoar. É assim que decorre o processo de fabrico de uma raqueta personalizada, após passar pelas mãos de vários especialistas, que agora aguardam mais encomendas de todo o mundo. Novak Djokovic já o fez.

“A acompanhar cada item, existem conselhos e explicações de alguns dos jogadores de top”

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ARBITRAGEM

“Coaching”

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Uma das situações menos agradáveis e que causa mais conflitos, nomeadamente entre os árbitros e os jogadores/ treinadores, é o chamado JORGE CARDOSO Árbitro “Coaching”, ou seja, instruções recebidas durante um jogo por um determinado atleta. É sancionado pelo código de conduta, exatamente como as demais secções. Mas afinal como se processa e como se detetam as instruções (Coaching)? As instruções poderão ser dadas por palavras, (comunicação oral), ou através de gestos mais ou menos dissimulados. Sempre que o oficial de arbitragem entenda que existe uma comunicação de um elemento externo, que vise melhorar o rendimento do atleta, poderá e deverá intervir no sentido de as punir. Excluem-se aqui situações em que é permitido a intervenção técnica do treinador dentro do campo, (competições de equipas provas WTA, etc). De qualquer maneira mesmo nestes casos apenas nas mudanças de lado e períodos de descanso estas são permitidas. E se o “Coach” comunicar com o atleta numa língua que o árbitro não entenda? Bom, facilmente se percebe quando uma comunicação é de mero apoio ou vai para além disso. Uma comunicação de apoio é normalmente breve, resume-se a uma ou duas palavras. Se o árbitro não entender a linguagem deverá avisar o jogador que deverá parar a comunicação, caso contrário

da próxima vez será entendido como “coaching” e será sancionado como tal. Trabalhei já vários anos atrás com uma simpática Juiz Árbitro norueguesa, que entendia nestas questões do “Coaching”, que qualquer mera comunicação como por exemplo “vai beber água”, deveria ser punida, pois visava melhorar o rendimento do atleta, ainda que não tivesse a indicação em si qualquer componente técnica. Acredito que como em tudo na arbitragem, o equilíbrio, embora difícil de atingir, ainda é em si o melhor dos parâmetros nestas e em outras situações.

“Facilmente se percebe quando uma comunicação é de mero apoio ou vai para além disso”


MEDICAL TIMEOUT

A prática de ténis na infância Aproveitando a ocasião do regresso às aulas, ficam aqui alguns aspectos ligados à prática do ténis pelos mais novos: - As crianças apresentam, naturalmente, um menor nível de condicionamento físico e técnico. É por isso importante que tanto o equipamento usado (tamanho do grip, peso da raquete) como a introdução de gestos técnicos (como o topspin) sejam adequados ao estado de maturação da criança. - Juntamente com este menor condicionamento físico, verificase também frequentemente uma maior instabilidade articular (sobretudo nas raparigas). Esta instabilidade predispõe o jovem tenista a lesões ligamentares/articulares em zonas como o tornozelo e o punho. - A ausência de padrões motores completamente definidos altera a cadeia cinética das pancadas, podendo provocar incorrecções nos gestos que coloquem o jovem atleta num risco acrescido de lesão. Este factor acentua-se em picos de crescimento por duas razões: o atraso entre o crescimento ósseo e o correspondente acompanhamento muscular e a necessidade de acomodar um esquema corporal diferente. - O desenvolvimento ósseo incompleto apresenta também a possibilidade de lesões nos pelos microtraumas repetidos nos centros de ossificação. Exemplos deste tipo de patologias são a doença de Osgood-Schlatter no joelho e de Sever no calcanhar.

JOSÉ PEDRO CORREIA Fisioterapeuta

- Apesar destes riscos específicos, a melhor altura para aprender uma nova competência motora continua a ser nas idades mais jovens. Naturalmente, é desejável que esta ocorra da forma mais correcta possível para que o atleta continue a ter uma prática saudável e eficaz ao longo de todo o seu percurso na modalidade. É necessário, para isso, não ver simplesmente a criança como um adulto em miniatura.

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BOLA NA TELA

Wes Anderson João Carlos Silva

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The Royal Tenenbaums

Richie Tenenbaum é um menino prodígio do ténis, um dos três irmãos com infâncias de génio na comédia-drama de Wes Anderson que se reúnem muitos anos mais tarde, quando já não são génios e quando Royal, o patriarca, está supostamente a morrer com um cancro. Richie é Luke Wilson - cujo irmão, Owen, é co-autor do argumento - e parece andar uma boa parte do tempo vestido a rigor para ir disputar um jogo de ténis. A partida mais importante acaba por ser a daquele momento exacto em que ele deixa de ser um prodígio e passa a ser um loser. O duelo Tenenbaum vs. Gandhi é, como dizem os comentadores em voz off, qualquer coisa nunca vista. Richie nunca jogou tão mal, é impossível jogar tão mal. Na verdade, é possível: a irmã adoptada, Margot (Gwyneth Paltrow), por quem ele vivia apaixonado, casara-se na véspera, e Richie estava devastado. Gandhi arrasou-o sem compaixão. Ele até se descalça em campo e chora. Para Richie, é o fim da carreira no ténis. Quem olha para ele, com o cabelo comprido preso por uma fita e o pólo Fila, não consegue deixar de pensar no sueco Bjorn Borg. Há mais: afinal, Borg não teve um último jogo patético contra um Gandhi, mas a sua retirada foi algo supreendente, com apenas

The Royal Tenenbaums 2001 com Gene Hackman, Luke Wilson, Gwyneth Paltrow

26 anos, em 1983, depois de no ano anterior ter jogado apenas em Monte Carlo, perdendo para Yannick Noah nos quartos-de-final. Na sua carreira relativamente breve (a sério foi entre 1974 e 1981) ganhou 11 títulos do Grand Slam (cinco consecutivos em Wimbledon e seis em Roland Garros). Isto foi entre os 18 e os 25 anos. Um prodígio ao jeito de Richie Tenenbaum.



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