Revista Veracidade - Edição 1 - 2015

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FEVEREIRO 2015 - NÚMERO 1 - ANO 1

Moda Plus Size Fanáticos por carros e por bikes

Descubra mais sobre essa prática importada do Japão Jovens que venceram o câncer 1


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Bikes buscam espaços ............................... 5

Fascinados por carros ......... 112 Academias a céu aberto ....................10

Lugar de mulher também é no esporte ............... 16 Moda descobre modelos plus size .......... 48 3


Talk shows à moda brasileira .................. 74

O som do interior. ........................ 120

Universidade Presbiteriana Mackenzie Centro de Comunicação e Letras

A Revista VeraCidade é uma publicação experimental dos alunos do quarto semestre do Curso de Jornalismo Reitor: Prof. Dr. Benedito Guimarães Aguiar Neto Decanato Acadêmico: Prof. Dr. Cleverson Pereira de Almeida Decanato de Extensão: Prof. Dr. Sérgio Lex Decanato de Pesquisa e Pós-Graduação: Profa. Dra. Helena Bonito Couto Pereira Diretor do Centro de Comunicação e Letras: Alexandre Huady Guimarães Coordenadora do Curso de Jornalismo: Denise Paieiro Editor: José Alves Trigo 4


VIDA

SOB RODAS Beatriz Destefani e Camilla Queiroz

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número de ciclistas nas cidades aumenta a cada dia. O trânsito caótico desencoraja centenas de motoristas na hora de tirar o carro da garagem. Um dos problemas de quem troca o carro pela bicicleta é o perigo e a falta de estrutura na cidade, o que agora parece estar mudando, com as construções de ciclofaixas e ciclovias.

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Novo ritmo, novos hábitos Beatriz Destefani e Camilla Queiroz

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número de ciclistas nas cidades aumenta a cada dia. O trânsito caótico desencoraja centenas de motoristas na hora de tirar o carro da garagem. Um dos problemas de quem troca o carro pela bicicleta, é o perigo e a falta de estrutura na cidade, o que agora parece estar mudando, com as construções de ciclofaixas e ciclovias. Para aqueles que, como Gilberto Cruz, designer gráfico, não sabem a diferença entre ciclofaixa e ciclovia, aqui vai. As ciclofaixas são pintadas no asfalto, sinalizando onde os ciclistas devem circular. Geralmente ficam nas ruas e avenidas e dividem espaço com os carros, dando exclusividade ao ciclista em determinadas faixas da via. Já as ciclovias são exclusivas para a bicicleta, separadas fisicamente das vias dos veículos por calçadas, canteiros etc. Gilberto, que já não trabalha mais, mora próximo à Avenida Braz Leme e comprou sua bike há três anos e só começou a andar faz um. Isso por conta do medo que sente de ser assaltado e também pela falta de consciência e educação de motoristas e pedestres. “Estão introduzindo isso no Brasil agora, por isso, o pessoal ainda não respeita muito. Nos outros países já faz tempo que dá cer-

to. Acho que vai levar um tempo até todo mundo se acostumar” , comenta ele. O aposentado sempre gostou muito de esportes e acha a bicicleta uma boa maneira de se exercitar, além de cumprir os exercícios físicos, melhorando a sua saúde. Mesmo demorando para andar nas ruas de São Paulo, Gilberto já está se acostumando com os lugares reservados para ciclistas e aproveita cada vez mais o seu tempo livre. “Gosto muito de pedalar escutando música e fico muito feliz que nos tempos de hoje podemos fazer isso em pleno trânsito de uma cidade como São Paulo.”, completa Gilberto. Mesmo pra quem não usa a bicicleta como meio de transporte principal, as novidades podem ser agradáveis. A ciclofaixa, aos domingos, liga os principais parques da cidade passando por diversos bairros, atraindo centenas de pessoas de variadas idades. A estrutura é completa, com presença de patrulha, equipe médica, auxílio de funcionários e venda de produtos como água e “snacks”. O esquema montado é inteiramente pensado na segurança do cidadão e, por isso, é aberto até para crianças que estejam acompanhadas pelos pais. Para quem não mora pró6

ximo as áreas onde as ciclofaixas passam e não tem como levar a bicicleta até o local, é possível alugar o veículo em alguns pontos da cidade. Vale ressaltar que, aos domingos, é liberada a entrada de bikes no metrô. Com essa novidade, os parques deram uma boa esvaziada. Antes, a superlotação assustava alguns visitantes, agora, a tendência é ficar cada vez mais agradável. Segundo um funcionário da CET (Companhia de Engenharia de Trânsito), o aumento do número de ciclistas na cidade traz muitas melhorias no trânsito caótico. “Ainda é preciso muitas mudanças para se atingir um ideal seguro para os paulistanos. Com isso feito, acho que muitos moradores trocarão seu meio de transporte principal. O planeta e o trânsito agradecem”, afirma um guarda do DSV que não se identificou.. A cidade realmente precisava de mais atenção aos ciclistas. Com as novas ciclofaixas e ciclovias os ciclistas terão mais segurança e facilidade para se locomover, sem invadir o espaço dos pedestres e com muito menos chances de sofrer um acidente pedalando em meio aos carros. Era o estímulo que faltava para uma possível – e desejada - mudança no ritmo.


Gilberto Ribeiro em um de seus passeios noturnos 7


Entregas sob rodas Camila Queiroz e Beatriz Destefani

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osé Carlos, entregador e transportador de um açougue costuma utilizar a bicicleta como meio de transporte durante o trabalho. De segunda a sexta, José pedala quilômetros para cumprir seus horários e entregas requisitadas pelos clientes. Em meio ao trânsito caótico da grande São Paulo, José Carlos viu nas ciclofaixas e ciclovias um modo mais seguro de continuar seu trabalho. “Tem dez anos que trabalho de bicicleta, e sempre andei com muito medo porque os motoristas não respeitavam, na calçada era ruim porque atrapalhava os pedestres e o risco que eu corria era enorme. Hoje, eu me

sinto mais seguro e até faço os caminhos mais rápidos”, conta José Carlos. As ciclofaixas são largas, bem sinalizadas e arborizadas, o que diminui o calor que facilita a viagem dos ciclistas. Vale ressaltar que o número de acidentes vai reduzir, uma vez que com a devida sinalização, os ciclistas não estarão mais trafegando em meio aos carros. “Vejo sempre a molecada andando de bike na rua mesmo, com a ciclofaixa há poucos metros. Isso também deveria ser fiscalizado. Se cada um respeitar o seu espaço, todos sairemos vitoriosos”, explica José. A hidratação do corpo é muito importante, principalmen-

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te no calor. É necessário ingerir bastante água para que o corpo consiga acompanhar o ritmo sem sofrer nenhum tipo de danos. “Aqui dentro da minha cesta tem sempre uma garrafinha de água. Como eu transpiro muito, se eu não repor o líquido eu não duro nem meia hora”, comenta José Carlos. Além de tudo, substituir seu meio de transporte pela bicicleta trouxe muitos benefícios à saúde de José, segundo ele, sua resistência física é equivalente a de um rapaz de 25 anos, mesmo já estando na casa dos 40. Os problemas de saúde que aparecem nessa idade são controlados por conta da atividade física constante. Mesmo não mantendo uma dieta equilibrada, José compensa tudo o que come. “Prefiro pedalar durante quatro dias seguidos do que deixar de comer um doce depois do almoço. Mesmo não sendo magrinho, tenho uma saúde de touro. Sério, eu nem me daria 49 anos se não fosse esse barrigão”, brinca o açougueiro. José Carlos não faz entregas que estejam a uma distância muito grande,É uma boa ideia para as outras empresas que possuem clientes pela vizinhança. Além de economizar dinheiro, os entregadores vão economizar tempo, pois não tem trânsito de bicicleta nas ruas, e ainda vai ajudar o meio ambiente. Vale então repensar as criticas e opiniões em respeito ao tema, uma vez que é uma ótima solução para desafogar o trânsito de SP.


Além do asfalto Beatriz Destefani e Camilla Queiroz

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lém do uso da bicicleta no dia a dia ou como transporte, também podemos levar em consideração as trilhas. Um lugar muito comum que os ciclistas costumam frequentar para executarem a trilha é Brotas, localizada no Estado de São Paulo. Inicia-se na estrada municipal BRO-010 Brotas-S.Carlos. É um trecho com pouco movimento, facilitando o trajeto. As rampas não são muito acentuadas e o leito é firme, bem batido. Tem água potável no caminho que pode ser solicitada na Fazenda Mundo Novo (cerca de 17 km de Brotas). A partir daí não existem casas habitadas. Bruno Ziviani, desde criança, costuma ir passar as férias em Brotas com a sua família, onde conheceu sua turma e começou a usar a bike. A partir de então, nunca mais deixou de fazer as trilhas. “Esse tipo de uso com a bike, traz um contato com a natureza, sensação de liberdade de fazer exercício em um lugar tranquilo e respirando ar puro. Fora o desafio de explorar locais desconhecidos e pouco frequentados.”, diz Bruno Ziviani, que passa todas as férias no interior para fazer as suas trilhas. Apesar de Bruno achar a bicicleta prática e tranquila, diz que a cidade de São Paulo é muito perigosa e as ciclofaixas não são a melhor escolha para o paulistano. “Acharia se a cidade fosse bem planejada. Infelizmente a cidade não foi planejada para a interação entre ciclistas, pedestres e veículos motorizados, então qualquer intenção de melhorar a circulação para os ciclistas atrapalha o andamento de outros meios de transporte. Em uma cidade como São Paulo, usar a bike como meio de transporte é muito arriscado.”, completa Bruno. Já as ciclofaixas em parques são super apoiadas por Bruno, principalmente as do Parque Villa Lobos e Ibirapuera.

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fitness em outros ares Larissa Koloszuk e Willian Amaral

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iferente de nossos vizinhos fluminenses, com sua orla litorânea invejável, os moradores da cidade São Paulo escolheram os parques como seu ambiente de lazer, exercícios e socialização. Essas “praias paulistanas”, como o Parque do Ibirapuera, em Moema, e o Parque Villa-Lobos, na região do Alto de Pinheiros, são espaços amplamente propícios à prática de atividades físicas, além do lazer. Para a patinadora Amanda Carolina, 23, que costuma patinar semanalmente pelo Parque do Ibirapuera, “o ambiente é totalmente próprio para fazer esportes e não tem comparação [com a academia] por estar perto da natureza e de pessoas”. Nos últimos anos, a saúde e a estética passaram a ser preocupações recorrentes na vida dos brasileiros. Em 2013, a Vigitel (Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônica) divulgou que 33,8% dos brasileiros dedicam pelo menos 150 minutos semanais para suas atividades físicas. Em São Paulo, esse percentual é de 28%. E, ao que tudo indica, tal número só tende a aumentar, 10


visto que a busca por uma maior qualidade de vida através da atividade física é destaque, sobretudo, no cenário outdoor – em ambientes abertos. Para comprovar esses dados, basta passar em alguma de nossas “praias” aos finais de semana e observar. Pessoas correndo, caminhando, andando de skate e até praticando Slackline, o novo queridinho dos famosos, serão as protagonistas da cena. Guga Ribeiro, 40, há dois anos faz parte dos 28%. Ele não perde um sábado ou domingo sequer. Está sempre correndo no “Ibira” ou jogando bola com o filho no “Villa” e vice-versa. O conjunto oferecido pelo parque, “pessoas, sol, vento e liberdade”, segundo Guga, é o que faz o parque ser muito melhor do que uma academia, onde muitas vezes se vai “só para fazer um social”, completa. Os treinos outdoor passam a chamar mais a atenção do público porque os treinos indoor – praticados em ambientes fechados, como academias e clubes – possuem um custo muito elevado no país. Levando em consideração os planos mensais das unidades

no centro da capital paulista, o valor mensal das academias pode chegar a R$450. É um preço bastante acentuado comparado aos americanos que, de acordo com o site americano What It Costs, investem um valor entre U$25 a U$60 por mês pelo benefício. Ao contrário das salgadas mensalidades das academias, o baixo custo de se exercitar ao ar livre e o lazer oferecido pelo simples ato de ir ao parque levam muitas pessoas interessadas em ganhar qualidade de vida de forma prazerosa, mas que não querem gastar uma fortuna para tal, a buscar nossas “praias”. Aos domingos ensolarados, tênis de corrida, óculos de sol e fones de ouvido compõem o figurino de centenas de pessoas que se exercitam em meio às pistas de corrida dos parques Ibirapuera e Villa Lobos. O Ibirapuera recebe semanalmente cerca de 220 mil visitantes, conta com uma área de 1,5 milhão de metros quadrados e se localiza na Av. Pedro Álvares Cabral, no bairro de Moema. Já o Parque Villa-Lobos recebe cerca de 20 mil visitantes aos fins de semana e se localiza no bairro do Alto de Pinheiros, contando com uma extensão de 732 mil metros quadrados. 11


Camila Leite

“Na academia você fica preso. Tem muita gente que vai só para fazer um social”

“Treinar em parques é muito prazeroso. Tem a sociabilização, a variação. Fico dopada de paz. Pra mim, fazer atividade física é uma forma de escape”

Larissa Koloszuk

Guga Ribeiro, 40 anos

Carla Garcia, 28 anos 12


Indoor ou Outdoor ? A escolha dos parques como alternativa às academias é uma crescente na vida de quem se exercita regularmente e busca um pouco mais de lazer na atividade física. Os números não mentem: como mencionado anteriormente, segundo a Prefeitura de São Paulo, o Parque do Ibirapuera recebe em média cerca de 220 mil visitantes por semana. Basta dar uma passadinha no local em qualquer dia e horário e ver que pessoas se exercitando integraram a maior parte da paisagem com suas bicicletas, tênis de corrida e Slacklines. A educadora física Lígia Barone, 28, explica que essa demanda dos alunos por mais treinamento outdoor se deve à ‘ludicidade’ oferecida pelo contato com a natureza e ao prazer de se encontrar em um ambiente aberto, transformando a obrigação de ir à academia em lazer e entretenimento. “É gostoso pelas árvores, pela diversão. Me sinto muito bem”, confirma o ciclista Sérgio Silva, 54, que pedalava pelas ciclovias do Ibirapuera em pleno domingo à tarde. Para o também educador físico Rafael Battazza, 30, embora a academia proporcione um maior controle sobre o rendimento por meio dos indicadores eletrônicos. “O importante é praticar atividade física, e de preferência com orientação. O que vai diferir é a questão de estar bem orientado, independente de estar em um lugar fechado ou aberto”, explica.

Nesse sentido os dois educadores deixam bem claro que não é possível fornecer um modelo genérico de exercícios, isto é, uma série de atividades físicas que se apliquem a todos. Isso por que cada pessoa possui um biotipo, um ritmo, uma necessidade e um objetivo diferente das outras. Daí a necessidade de acompanhamento especializado. A montagem da rotina de exercícios vai depender muito do objetivo que o aluno persegue e também de seu nível de aptidão para a prática de exercícios, concordam os treinadores. Lígia também nos conta que essa ideia de séries de exercícios mágicos para ter um corpo perfeito, além de ser uma farsa, acaba prejudicando o trabalho dos profissionais de sua área. O Youtube e o Instagram, desabafa a treinadora, são os principais responsáveis por essa concepção equivocada. Pessoas que não são formadas ou possuem qualquer conhecimento especializado acabam orientando um público que sabe menos ainda, em busca de popularidade e autopromoção. A esse respeito, os educadores físicos Marco Neri, 22, e Leandro Alves, 23, acrescentam que não é possível seguir os modelos criados na internet devido principalmente às variáveis biológicas. Segundo os líderes do projeto de assessoria esportiva desenvolvida no Parque Villa-Lobos, o Parque Ativo, “um exercício que é bom para um, pode não fazer efeito no outro”, ou ainda causar algum dano.

OUTDOOR E INDOOR* AR PURO LAZER CONTATO COM A NATUREZA SOCIABILIZAÇÃO

AR CONDICIONADO COMODIDADE CONFORTO SEGURANÇA *os principais contrapontos segundo os entrevistados 13


os cinco países com o maior

n ú m ero de a c a de m i a s *

*Fonte: IHRSA LatinAmerica

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Para que proteína? Aquela garrafinha com suplementos alimentares, aliada às regatinhas, já se tornou praticamente uma extensão do braço de quem faz exercícios regularmente. Mas será que elas são sempre necessárias? A ingestão de suplementos protéicos, ou das proteínas simplesmente, dependerá da disponibilidade que o atleta tem de se alimentar de forma correta antes e depois do treino. Além disso, há de se considerar também a intensidade e velocidade que o aluno precisa para repor os nutrientes de seu corpo. “As proteínas são quebradas no organismo, originando os aminoácidos, que vão contribuir na manutenção do tecido muscular. Com uma quantidade certa de proteína, a pessoa pode ter um melhor desempenho e recuperação após a atividade”, explica a nutricionista Alessandra Paula Nunes. Mesmo assim, Alessandra ressalva que “qualquer conduta de suplementação só pode ser feita após rigorosos exames clínicos, para verificar, por exemplo, se existe algum fator limitante para o uso ou indicação de suplemento (como alguma alteração renal)”. Por outro lado, o educador físico Rafael insiste que “se ele (aluno/atleta) fizer uma alimentação adequada, não há a necessidade de suplementar com proteínas”. Tal necessidade, novamente, dependerá do objetivo do aluno e de seus fatores biológicos. O uso incorreto das substâncias pode implicar disfunções hepáticas e renais, dificultando a filtração de algumas substâncias como ureia, amônia e resíduos nitrogenados pelo rim e pode atrapalhar o metabolismo de proteínas para formar aminoácidos pelo fígado, esclarece a nutricionista. Proteínas consumidas em excesso, sem acompanhamento adequado de profissionais de nutrição e de educação física, vão de encontro aos objetivos primordiais da prática de exercícios, que são a saúde e o aumento na qualidade de vida.

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Infelizmente, o preconamigos, até a falta de centros de ceito ainda encontra-se treinamento – algo muito cobastante presente em nossa mum no futebol, por exemplo. sociedade. Em relação aos A população necessita de esportes, há uma clara diuma maior conscientizavisão entre aqueles que são ção, de quebra de tabus e “para homem”, como futeparadigmas no que diz resbol, handebol, basquete e lupeito à separação dos esportas em geral, e aqueles que são tes de acordo com o sexo, algo “para mulher”, como voleibol extremamente preconceituoso. e as diversas modalidades de Muito já está sendo feito quandanças, entre elas, o balé. do se refere a mudanças no esA maior parte daqueles porte. Palestras e reuniões para que praticam alguma discutir o futuro do futebol featividade que é conminino já ocorrem e ganham siderada inapropriacada vez mais participantes. da para o seu sexo Mulheres têm se arriscado enfrentam diariamais e iniciado seus treinamente muitas dimentos para lutar e já existem ficuldades, que aulas de dança específicas para vão desde a homens. Mas ainda há muito a falta de apoio ser mudado nessa questão. Os e discriminahomens e as mulheres ainda ção por parte têm muito espaço a ganhar em dos pais e todas os tipos de atividades. Fotos: Isabela Andrade

Danielle Martins e Isabela Andrade

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É inegável que a discriminação existe em qualquer parte do mundo. Entretanto no Brasil, um país conhecido por sua diversidade, essa situação já melhorou muito. Esportistas têm se empenhado para conseguir uma maior aceitação entre suas comunidades. Porém, o espaço que já foi conquistado ainda é muito pouco em vista da grande falta de oportunidades que deviam ser dadas àqueles que sonham em seguir uma carreira no esporte ou que o praticam por saúde e distração. Entre os esportes destacados pelo preconceito de gênero, tem-se o balé. Apesar de ter se iniciado como uma arte direcionada às mulheres, com o passar do tempo, abriu espaço também para os homens também. Mas, ainda assim, os julgamentos persistem e os bailarinos sofrem empecilhos, desde os olhares desconfiados até a dificuldade em conseguir a aprovação para participarem de espetáculos. O homem como bailarino tem suas limitações, sejam elas físicas ou psicológicas. “Quando você escolhe dan-

çar, você é levado a esconder, a fingir e ir contra a vontade da família e amigos”, lamenta o professor de dança Danilo Rodrigues. Dentre as principais barreiras que os dançarinos estão submetidos, estão os preconceitos dentro de casa, pelos pais, nas escolas, com os amigos e pais de alunos que enxergam com outros olhos o profissional de balé. De acordo

c o m Danilo, a limitação começa quando você é homem e vai dançar balé. Muitas pessoas se baseiam no julgamento de que dança não é para qualquer um, mas vale lembrar que para ser bailarino, é

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preciso muita força, disciplina e dedicação, independente do gênero. O mais importante é que se tenha atitude, primeiramente do homem em assumir que quer fazer balé. Deve-se também compreender que em qualquer lugar, eles serão vistos com outros olhos, pois a sociedade ainda enxerga que a dança é um esporte feminino. A verdade é que o balé ainda possui

uma série de restrições e os bailarinos ainda sofrem os efeitos de uma sociedade bastante machista. “A cada dia que você coloca sua sapatilha dentro da bolsa, o seu shortinho curto, suporte e regata, tem que saber que já está sendo limitado dali, as pessoas vão te olhar de uma forma diferente”, lembra Danilo. No entanto, o prazer que a dança proporciona é maior e isso tem encorajado muitos homens a praticarem essa modalidade.


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PARA AS CHUTEIRAS

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quelas que sonham em fazer carreira no futebol sofrem com a falta de apoio e, principalmente, de oportunidades. Mas um dos assuntos ainda bastante discutido é o forte preconceito que as jogadoras sofrem diariamente, seja ele dentro de campo ou fora dele. A jogadora de futebol feminino, Marília Cintra, indigna-se: “É um esporte como qualquer outro e devia ser encarado da mesma maneira entre homens e mulheres”. 19


Um problema considerável é a falta de centros de treinamento e escolinhas, o que colabora para que a maioria das atletas pense em desistir do sonho de ser jogadora de futebol. Segundo o comentarista dos canais ESPN Leonardo Bertozzi, as garotas acabam treinando por conta própria por não terem onde jogar. “A menina que quer jogar futebol hoje no Brasil, às vezes não sabe nem para onde ir ou o que procurar, se vai procurar uma escolinha ou então um time”, preocupa-se. Muitos pais não concordam em ver suas filhas em um esporte que é visto pela sociedade como “masculino”. A atleta e ex-jogadora

da Seleção Brasileira de Futebol Feminino, Aline Pellegrino, diz já ter vivenciado esse tipo de preconceito, mas na época, por ser muito jovem, não compreendia o porquê de não poder jogar. Já a jogadora do time América de São Manuel, Laísy Scardazzi, afirma ter sido incentivada por seus pais a fazer o que gosta, independente do esporte. A jogadora Marília conta que, apesar de não ter a aprovação por parte de seus parentes, sempre teve o apoio de seus pais, que também foram atletas no passado. “Eu cresci vivendo no mundo do futebol. Isso porque desde pequena ia aos estádios ver meu time do coração, o Corinthians”. Apesar dos preconceitos sofridos pelas atletas, muitas delas acabam tirando proveito disso, como a ex-jogadora da Seleção Brasileira de Futebol Feminino, Juliana Cabral, que viu os obstáculos como motivação para avançar na carreira. “O que eu acho é que hoje em dia a gente tem que esquecer um pouco a questão da discriminação e lutar mais pelos nossos direitos. Aproveitar as oportunidades e fazer dos preconceitos energias”, aconselha. Um dos problemas destacados pelo fato da mulher não ter atingido seu espaço no futebol é o não reconheci20

mento por parte do público. A mídia, muitas vezes, prioriza os jogos masculinos por darem mais audiência, devido a uma maior quantidade de times de camisa, como Corinthians, Palmeiras, São Paulo e Flamengo. A diferença é que no futebol feminino, os times de camisa não são, necessariamente, os melhores. O futebol feminino não é tão destacado quanto o masculino e muitas pessoas nem conhecem os nomes das principais jogadoras. De acordo com Laisy, “as jogadoras sofrem o pior dos julgamentos todos os dias, da própria mídia e entidades que menosprezam o futebol feminino por não acreditarem nele e, com isso, não ajudam na evolução dessa modalidade.” Diante de um país que é ovacionado pelo futebol e visto como um lugar onde predominam as diferenças, sabemos que o esporte ainda sofre os efeitos do preconceito de gênero e da exclusão. No entanto, as jogadoras estão lutando para mudar a situação do futebol feminino e mostrar que têm capacidade e força para atingirem o seu espaço no esporte. ”Acho que o futebol feminino pode e deve conquistar mais espaço, até pelo exemplo que já deu, de sem qualquer investimento, sem qualquer trabalho por trás, ter conseguido resultados expressivos”, declara Leonardo Bertozzi.


SEXO FEMININO É O SEXO FRÁGIL? De acordo com o professor e dono da academia de luta Inside, Hugo Gonçalves, as lutas são uma ótima possibilidade para as mulheres combaterem tanto o estresse do dia a dia, quanto os efeitos do sedentarismo. Um exemplo disso é a aluna de Muay Thai, Letícia Kawano, que começou a praticar o esporte com o objetivo de emagrecer e com o passar do tempo se interessou pela modalidade: “Além de ter evoluído muito com relação à coordenação, força, agilidade e flexibilidade, adorei a disciplina e respeito entre os parceiros de equipe.” Um dos assuntos que tem sido discutido atualmente é a mulher como um sexo frágil nas lutas. Mas vale lembrar que, mesmo diante de uma sociedade ainda bastante preconceituosa, existem aqueles que acreditam na força feminina em qualquer modalidade do esporte. Segundo a aluna de Muay Thai, Tatiana Venturacci: “A mulher não deve ser considerada como sexo frágil, pois ambos podem treinar pesado, mas deve-se ter equilíbrio e saber que eles são diferentes.” Já para a karateca Larissa Galli, as mulheres são realmente mais frágeis, mas com o treinamento buscam superar isso e ganhar ainda mais resistência. O professor Hugo Gon-

çalves acredita que ainda existe uma forte discriminação, mas acha que isso é passageiro, já que a mulher vem conquistando o seu espaço na modalidade. Ele também afirma que em sua academia a cobrança e os treinos são iguais para ambos os sexos, já que as mulheres têm se mostrado capazes de realizar as mesm a s atividades.

Fabiana Ferreira, lutadora de Muay Thai

Infelizmente, muitos ainda acreditam que lutar é um esporte que só deve ser praticado por homens, e aquelas que fogem do padrão são alvos de preconceito. “Uma vez fui dar aula e um dos alunos não me levou a sério por eu ser mulher. Mas no decorrer da aula, mostrei para ele quem estava no comando.”, conta Tatiana Venturacci. Em contrapartida, 21

a lutadora de Muay Thai, Fabiana Ferreira, afirma nunca ter sofrido preconceito. “Na minha casa minha mãe ficou um pouco assustada. Mas eu já fiz de tudo na academia e o que eu mais gostei foi isso”. Ela ainda reforça que o número de mulheres que praticam lutas nas academias tem aumentado cada vez mais e, em algumas aulas, acaba até superando o número de homens. O MMA vem tendo grande repercussão no mundo todo, mas apenas o masculino tem o verdadeiro reconhecimento do público. Acredita-se que um dos principais motivos pelo qual as pessoas ainda não acompanham o MMA feminino é o fato de já terem se acostumado com os atletas do sexo masculino. Além disso, um dos grandes problemas que os donos de academia vêm sofrendo é a falta de patrocínios nos campeonatos, que contribuiriam para uma maior divulgação e reconhecimento das mulheres. O futuro da mulher, seja em qualquer esporte, é algo que deve ser levado em consideração. O preconceito se mostra resistente, em muitos casos, mas algumas modalidades têm oferecido mais espaço e mostrado que elas são capazes de exercer as mesmas atividades que os homens com competência e dedicação.


de sapatilha

O homem vem mostrando seu espaço no balé e desfazendo preconceitos

Texto por Júlia Januzzi Fotos por Maria Luiza Samia

Couto começou a contar sobre a sua jornada na dança. Aos 20 anos de idade ele resci no meio de decidiu que queria ser bailarino. coxias, figurinos Mesmo sem o apoio da família, o pai achava estranho o seu filho extravagantes e arte desde peque- querer dançar. Ele foi atrás do seu nininho. Minhas primas trabalha- sonho. Assim como no filme Billie vam com teatro, mas, foi assistindo Elliot – um menino de 11 anos que se descobriu apaixonado por à televisão que eu descobri a mibalé clássico e não tinha o apoio nha vocação. A TV Globo exibia da família. espetáculos de Balé Clássico e eu Quando apareceu em um achava linda a leveza com a qual os espetáculo respeitado começou bailarinos dançavam. Comecei a enxergar a dança como um veículo a ganhar o orgulho e admiração do pai e do irmão. O caminho de de comunicação maior. Anderson não foi fácil e a aceiEu via no movimento uma disponibilidade de cone-xão com outras tação da família só veio quando ele começou a aparecer na mídia. energias”. Com essas palavras o Porém, não era nesses coreógrafo e professor Anderson

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palcos que o dançarino se sentia completo. A emoção de estar nos palcos dos teatros, de atingir o público de uma forma simples, era o que o movia. Começou sua carreira dançando Jazz e dança Contemporânea, mas quando entrou em uma companhia de dança profissional precisou se aprimorar com o balé clássico. Márcio Rongetti foi o professor que despertou nele um fascínio pelo balé clássico. Ficou admirado com a técnica, com as músicas clássicas e com a disciplina que a dança envolvia. O clássico envolve uma técnica construída em longo prazo. Seu corpo começa a se desenvolver para aquilo, a postura, os movimentos, o alongamento.


“Eu via no movimento uma disponibilidade de conexão com outras energias”

Anderson Couto, bailarino e dono da companhia Cirque Sensi

Os bailarinos que dançam na companhia Cinque Sensi, de Anderson, têm aulas de balé clássico duas vezes na semana para desenvolver um corpo mais saudável, já que o clássico é a base. Muitas vezes as pessoas que procuram a dança como forma de descontração ou como uma alternativa ao exercício físico não procuram o clássico porque sentem que não conseguirão acompanhar, mas o professor insiste que nunca é tarde para começar. Ele desenvolveu uma maneira mais descontraída de ensinar a técnica do balé. Utiliza do cotidiano para desenvolver a linguagem clássica no corpo de seus alunos. A questão do homem dançando ainda é um tema delicado. O coreógrafo constata que o público masculino ainda é pequeno. Os pais não trazem os filhos pequenos para terem essa experiência e muitos têm medo de sofrerem bulling ou de não serem aceitos socialmente por gostarem do balé. Então, ainda tem pouca procura por parte dos meninos nas aulas de balé. Anderson conquistou um espaço difícil no mundo da dança e conta que o caminho foi cheio de obstáculos, mas que ele aprendeu nesses quinze anos dançando que sua vocação era a dança e que ele queria transmitir os movimentos e os sentimentos para todas as pessoas, sem discriminar ninguém. O mercado de dança no Brasil vem crescendo, mas ainda não paga o quanto deveria por um trabalho que envolve horas de dedicação diária. Muitos dos bailarinos clássicos brasileiros acabam indo dançar no exterior, 23


já que a nossa cultura não valoriza a dança clássica como nos países da Europa e nos Estados Unidos. O homem é fundamental também para o treinamento da mulher no balé clássico. Os pais, infelizmente, não apoiam os filhos e a sociedade ainda julga como homossexuais os meninos que dançam. Com isso, a arte fica prejudicada e a felicidade desses meninos que se sentem discriminados, também. Para entender um pouco melhor a cabeça de quem inspirou Anderson a admirar o ballet, conversamos com seu professor, Marcio Rongetti. O bailarino começou a dançar há 40 anos e conta que era muito difícil ser um dançarino em São Paulo. Na sua época, pós-ditadura, não se ouvia falar em balé nacional, apenas nas companhias que vinham de fora do país. O preconceito era muito forte e presente, tanto que o jovem fazia aulas escondido. Além de um forte preconceito dos colegas, Marcio também se sentiu desprezado pela família. Quando seu pai descobriu que ele dançava balé e queria ser um bailarino profissional, o expulsou de casa. Porém, por ele ser menor de idade, voltou para casa. Foi tirado da escola particular na qual estudava e passou a estudar

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Marcio Rongetti, bailarino e professor de ballet


a noite em um colégio público. Seu pai o obrigou a trabalhar como office boy durante o dia. Só que nenhuma das tentativas de seu pai o impediram de seguir sua vocação. Os professores do colégio o apoiaram bastante e o incentivaram. O menino esperava o pai virar a esquina da rua da escola e então ia ter aulas de balé clássico. Depois de passar dois anos tendo aula escondido, Marcio foi para a Europa dançar e passou 13 anos lá se profissionalizando. “O balé na Europa tem tradição, é uma arte antiga. As pessoas veem a dança como algo normal. Não associam o balé com uma escolha sexual. Não faz a menor diferença se você é um bailarino ou um futebolista. Provavelmente você será mais respeitado se você for um bailarino, porque os europeus entendem que a arte é algo mais especial”, explicou o professor.

Foi possível captar a essência de Marcio quando ele falava sobre o balé. Para ele, a dança muda a cabeça, leva sensibilidade e questiona o mundo, já que os temas envolvem muitos questionamentos sobre os sentimentos e assuntos cotidianos. Um espetáculo é como um filme ou um livro, conta uma história. O mais interessante é que o balé tem uma sensibilidade, e cada pessoa capta o tema de uma maneira, de acordo com sua experiência de vida. Não existe uma maneira concreta de entender a obra, o movimento é a linguagem. O balé é uma das danças mais conhecidas no mundo e ainda assim não tão apreciada no Brasil. Se já é um caminho complicado para a mulher, os obstáculos se multiplicam para os homens. Acreditamos que com o tempo os homens começarão a entender que não é um esporte puramente feminino e entrarão de corpo e alma na dança.

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A Sociedade Masculina de Balé

Investigando um pouco mais sobre o tema, encotramos uma companhia com uma proposta um tanto quanto diferente. Era uma companhia formada apenas por homens, em sua maioria profissionais clássicos que tinham uma paixão em comum, a dança. Após acompanhar alguns ensaios dos homens conversamos com Jurandir Rodrigues e com Edgar Dias Nascimento para entender melhor a proposta da companhia e explorar duas novas visões sobre o papel do homem no balé. Jurandir queria ser jogador de futebol quando era pequeno. Ele só foi descobrir que

gostava de dançar aos 18 anos, na época ele trabalhava em uma loja de sapatos femininos em Minas Gerais e apenas acompanhava sua namorada nas aulas de jazz. Foi em uma dessas idas a escola de jazz que Jurandir teve seu primeiro contato com a dança. O professor da menina o chamou para dançar e ele adorou. O menino continuou dançando e convidou seus patrões para assistirem o primeiro espetáculo de dança dele. Na segunda-feira, seu patrão o chamou para conversar, Jurandir acreditou que seria para parabenizá-lo pelo espetáculo e pela sua dança, entretanto a conversa foi para um lado não esperado,

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Jurandir foi mandado embora. A explicação do patrão foi o pontapé inicial que o garoto precisava para se arriscar e realmente virar um dançarino. Afirmando que Jurandir tinha um brilho no palco, o patrão era um homem culto que assistia diversos espetáculos de dança, e que aquela era a vocação dele, o mandou para a casa. Jurandir não acreditava que tinha sido mandado embora. Porém, ele percebeu que foi a coisa certa e em questão de dois anos, ele já estava dançando profissionalmente em São Paulo. Começou dançando no Balé Estagium e depois foi dançar na Sociedade Masculina.


Os dois primeiros anos foram difíceis. A família não entendia que ele iria parar os estudos e o trabalho para dançar. Seu pai não queria que ele fosse dançarino e só aceitou quando ele foi chamado para dançar em São Paulo e saiu em um jornal de destaque. Todavia, o reconhecimento familiar só veio quando o rapaz apareceu dançando no programa Criança Esperança. Depois desse momento, seu pai começou a mostrar o jornal para todos os amigos e afirmava com orgulho que seu filho era um bailarino. Jurandir também sofreu preconceito por parte das pessoas com a qual convivia. Era um menino de classe média bem baixa e as pessoas não aceitavam muito bem. Se nos dias de hoje já não é fácil, há 20 anos a discriminação era ainda maior. Mas, não são apenas as pessoas de classes mais baixas que discriminam o bailarino. Ele comentou que tem vezes em que ele está conversando com algumas pessoas, seja em um evento, em um bar, e quando questionado sobre sua profissão, afastava a pessoa. O bailarino foi um dos idealizadores da Sociedade dos Homens. A ideia surgiu em uma noite enquanto ele e um colega jogavam videogame e tomavam cerveja. Seu amigo queria que Jurandir dançasse com ele e o homem só aceitaria se fosse em uma companhia nova e diferente, uma companhia só de homens. Quando questionado sobre o porquê de uma academia só de homens, Jurandir afirmou que essa companhia traria um diferencial a ser vendido como espetáculo, uma companhia formada apenas por homens é interessante. Mesmo sendo dono de sua própria escola de balé, a Central do Balé Jurandir Rodrigues, o pai de dois filhos continua trabalhando na Sociedade dos Homens.

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O outro bailarino da companhia, Edgar Dias, começou a dançar no Balé Estagium, assim como o colega Jurandir Rodrigues. Porém, ele começou a dançar mais cedo, com 16 anos entrou em uma escola de dança e desde então não parou mais. Edgar sofreu preconceito e é constantemente assediado por outros homens na rua. Ele conta sua história de maneira leve e divertida. O homem dançou muito tempo fora do país e disse que existe uma diferença de tratamento “absurda”. Nessa época ele era dançarino do Grupo Corpo, de Belo Horizonte. Dias comentou que lá é bem mais comum os pais levarem seus filhos para dançar. Eles gostam de ver o filho no palco, isso por causa da influência do grupo. Depois de passar oito anos viajando e dançando com o Grupo Corpo, Edgar resolveu aceitar o convite de um ex-colega de quarto e entrou na Sociedade dos Homens. Ele acreditou que poderia fazer algo a mais, se desenvolver melhor como dançarino e acima de tudo, podia ficar perto da filha. Acompanhando ensaios e conversando com diversos profissionais da área, reparamos que o caminho a ser percorrido ainda é grande, mas que a vez dos homens bailarinos está chegando. As companhias de balé estão valorizando mais o homem e as pessoas estão começando a aceitar que não são apenas homossexuais que dançam balé, mas pais de família também. 28


CampeĂľes em

OTIMISMO

Helena Fonseca Isabella Bisordi 29


R

eceber o diagnóstico de uma doença como o câncer nunca é fácil. Quando se é jovem, a notícia pode ser ainda mais avassaladora. De acordo com o INCA (Instituto Nacional de Câncer), órgão auxiliar do Ministério da Saúde no desenvolvimento e coordenação de ações preventivas e controle da doença no Brasil, os tumores mais frequentes na infância e na adolescência são a leucemia e os do sistema nervoso central e linfomas. Atualmente o câncer já representa a primeira causa de morte por doença entre crianças de 1 a 19 anos no país, mas cabe a cada um escolher como lidar com a situação e com as consequências que traz. Paula Duprat, de 19 anos, optou pelo otimismo desde o início e garante não existir remédio melhor: “A vida é uma coisa pesada, mas a gente pode deixá-la mais leve”. Paula descobriu a doença em 2008 com apenas 13 anos. Sentindo uma dor insistente nas pernas e uma febre que não cessava, foi ao médico, fez diversos exames e, no diagnóstico final, foi dada a notícia mais inesperada que uma garota de sua idade poderia receber: estava com leucemia, doença que afeta os glóbulos brancos e tem origem na medula óssea. A então adolescente teria de passar por quimioterapia durante dois anos, sendo o primeiro intensivo (diariamente) e o seguinte, segundo ela, “mais tranquilo”, já que poderia voltarà sua rotina e afrequentar o colégio. Foi quando em janeiro

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de 2010, pouco antes do fim do tratamento, já de volta as aulas e também ao teatro, Paula descobriu uma necrose em sua perna direita e teve de ficar um ano de cadeira de rodas. “Foi o mais difícil, porque eu estava começando a ficar bem e fiquei mal de novo. Eu tinha conseguido o papel principal de uma peça que eu amava e queria muito, e tive que abrir mão por causa da perna”, completa. Apesar das dificuldades, afirma que o apoio da família e amigos foi fundamental durante toda a recuperação. Seus amigos encabeçaram uma campanha que arrecadou cerca de R$ 30 mil para pagar a prótese que colocou em abril de 2012, o que considera um enorme presente e prova de amizade que mudou sua vida. Não é apenas no caso de Paula que o apoio de pessoas queridas foi essencial. Matheus Gonçalves, de 21 anos, tornou-se seu amigo durante o tratamento também contra a leucemia, que, da mesma forma, entrou em sua vida de repente. Aos 15 anos de idade o jovem descobriu o problema: “Naquela época eu praticava esportes, fazia academia, me alimentava bem, era super preocupado com minha saúde e aparência. Eis que comecei (depois de anos sem ter nem ao menos um resfriado) a ter uma dor de garganta que não passava”. Matheus conta que, além disso, começou a sentir muito cansaço e dormir toda a hora e, então, fez um exame de san-

gue. O resultado foi assustador. Apresentou níveis de leucócitos extremamente fora dos padrões: “São toleráveis até por volta de uns 12.000, eu tinha cerca de 240.000”, relembra. No dia seguinte, ligaram do hospital para que ele fosse para lá com muita urgência, onde foi preciso fazer exame de liquor e mais outros de sangue que acabaram por confirmar o diagnóstico. Seus pais ficaram estagnados com o baque. Afinal, quem espera que um menino saudável de apenas 15 anos, tenha câncer?

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Isso mesmo: ninguém. Desde o inicio Matheus já sabia das dificuldades que teria que enfrentar. Porém ele mesmo se define como uma pessoa muito otimista e com facilidade em lidar com problemas: “Após o momento do choque, a primeira coisa que perguntei ao médico foi: ‘Tem tratamento, certo? Então pode começar hoje’”. No início tudo foi mais intenso. Chegou a passar um mês inteiro dentro do hospital, sendo semanas internado em UTI. Matheus se lembra de alguns efeitos


colaterais como queda dos cabelos, estômago rejeitando alimentos e inchaço por causa da medicação: “Minha oscilação de peso foi de 65 kg a 95 kg durante o tratamento. Turbulência pura”. A outra parte do tratamento é chamada de manutenção. Nela não era mais preciso que o jovem ficasse internado. Ele tomava os medicamentos via oral diariamente por um ano e frequentava o hospital quatro dias ao mês para tomar injeções quimioterápicas e fazer exames de acompanhamento. Com essa rotina intensa por um ano e meio, o suporte daqueles que o cercavam se fez bastante necessário e presente. Matheus pôde contar com cartas, mensagens e visitas de todos que o amavam, mesmo tendo de ficar em casa na maior parte do tempo. “Duas coisas me marcaram muito: alguns amigos rasparam a cabeça em solidariedade a mim; e um amigo meu, do meu time de futebol, quando perguntei sobre o campeonato que jogávamos, me respondeu: ‘Estamos indo bem, agora nosso time está muito mais forte, temos 6 jogadores em campo, 5 em ação e um no coração’”. Além dos seus amigos de longa data, conheceu também pessoas durante o tratamento que tinham problemas parecidos com o seu: “Infelizmente, alguns não estão mais conosco, mas fizeram a parte deles aqui, me ensinaram e deram forças para eu superar isso tudo”.

APOIO QUE VEM DE FORA Além de toda a ajuda que esses jovens recebem da família e amigos, o apoio de voluntários dispostos a ajudar e de profissionais como psicólogos que trabalham na área também pode ser crucial para a recuperação. A Universidade Presbiteriana Mackenzie participa de diversos trabalhos desse tipo que estimulam os jovens a pensar no próximo. O Projeto Camacc é um deles que está em ação há mais de cinco anos e conta com a presença de cada vez mais alunos interessados. Trata-se de uma casa de apoio a crianças com câncer, na cidade de São Paulo, que desenvolve atividades lúdicas com as crianças da casa com a ajuda dos alunos da universidade. Alguns continuam indo por conta própria todo mês. O estudante Vitor Albertini, 20 anos, conta como foi a experiência do primeiro trabalho voluntário e o porquê de ter escolhido esse projeto: “ Tr a b a l h a r com criança é importante porque elas são o futuro da sociedade. Todos temos que dar um apoio para essa situação 32

complicada que elas se encontram, gostei muito e quero manter o contato com elas”, afirma. Nathália Leite, 20 anos, também nunca tinha participado de nenhum trabalho voluntário e acredita que um sorriso pode ajudar muito uma criança que precisa: “Acho muito legal a iniciativa dos jovens de serem voluntários e estarem se conscientizando cada vez mais com o passar dos anos”. A própria casa de apoio conta o ano todo com a ajuda de diversos voluntários, não só do Mackenzie, mas também de amigos e qualquer pessoa disponível a doar seu tempo. Cristiane Nicodemos, de 28 anos, conta que ela e toda sua família ajudam a instituição sempre que podem: “Escolhi esta casa porque eu percebo que eles são muito carentes, pagam aluguel e dependem 100% da gente para ajudarem essas pessoas. Não contribuindo só com roupas e brinquedos, mas sim com carinho e atenção, o ser humano precisa disso”.


Fernanda Almeida, 19 anos, é voluntária há um ano no ITACI (Instituto de Tratamento do Câncer Infantil) em São Paulo, junto com outros 50 voluntários que trabalham com crianças e jovens de até 25 anos no projeto chamado Criarte. Uma vez por semana, Fernanda faz plantão no hospital durante 3 horas variando entre a sala de recreação e o hospital dia (sala de quimioterapia), elaborando atividades manuais com as crianças. “O que mais gosto neste trabalho é o fato dele ser uma via de duas mãos. Afinal, muito além de se doar para as crianças como voluntário, você recebe amor e muito aprendizado delas”, afirma.

Parte de um dos mais importantes complexos da área de saúde do país, conta com um centro de pesquisas e assistência médica pediátrica especializada em mais de 20 áreas distintas. O atendimento é totalmente gratuito e hoje o Instituto é referência no atendimento à criança e ao adolescente com de câncer e outras doenças hematológicas ou raras. Há um diferencial importante: o ITACI atende pacientes fora de possibilidade terapêutica, ou seja, pacientes que não puderam ser tratados em outros hospitais devido ao estágio avançado da doença. Para alcançar seu objetivo o ITACI inaugurou o Projeto Criarte, desenvolvido por um grupo de voluntários pensando em promover bem estar às crianças/ adolescentes e a seus familiares e acompanhantes. A ideia é desenvolver atividades recreativas, de arte e artesanato junto aos pacientes que aguardam a realização dos exames clínicos ou laboratoriais. Esse trabalho é de extrema importância, pois possibilita que o foco do paciente e da família saia da doença em si e se desloque para o processo de cuidado. As atividades são desenvolvidas das 8h às 17h, de segunda a sexta-feira, divididas em períodos de 3 horas cada. O projeto conta com uma equipe bastante heterogenia em sua faixa etária. O Criarte é aberto a quem esteja disposto a empregar parte de seu tempo para fazer o bem, para que todos possam se engajar e desenvolver o serviço voluntário.

Durante esse um ano de voluntariado, a jovem conta que presencia cenas emocionantes todos os dias e que aprendeu muito com esse projeto: “Acho que posso dizer que aprendi a escutar uma recusa como algo positivo. No começo, quando eu oferecia para as crianças brincadeiras e elas recusavam, eu ficava muito chateada e levava isso como algo ruim. Mas depois eu me dei conta que naquele ambiente, falar ‘não’ expressa a liberdade de uma criança que em meio a tantos medicamentos e cuidados, não pode falar não para seus pais, para seus médicos, enfermeiros e cirurgiões”, explica emocionada.

O ITACI O ITACI (Instituto de Tratamento do Câncer Infantil) é um hospital público ligado ao Instituto da Criança do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP). As atividades foram iniciadas em 2002 com o objetivo de oferecer um espaço adequado para o tratamento das crianças e adolescentes que eram, antes, atendidos no Instituto da Criança por meio do Serviço de Onco-Hematologia.

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ARMA SECRETA Otimismo é o diferencial na recuperação desses jovens. A vontade de viver os impulsiona a seguir o tratamento, mesmo sabendo da longa duração e do impacto que causará em suas vidas. Daniela Pino, médica da UTI da Santa Casa de São Paulo, pode presenciar isso em seu cotidiano: “Esses pacientes vêm para a UTI na maioria das vezes por consequência de complicações da doença ou do tratamento. Chegam bastante assustados, porém otimistas”. Outros dados do INCA mostram que nas últimas quatro décadas, o progresso no tratamento da doença na infância e adolescência foi significativo e hoje em dia, cerca de 70% dessas pessoas podem ser curadas se diagnosticadas e tratadas precocemente e, felizmente, a tendência é que a maioria delas tenha boa qualidade de vida após o tratamento adequado. Daniela Aiach, psicóloga juvenil, explica que o jovem recebe a notícia de um jeito muito melhor que um adulto: “Ele sabe a gravidade da doença, mas leva a vida de uma maneira muito mais prática. Então ele encara o tratamento com muito mais praticidade, o que acaba ajudando muito. Talvez por ser justamente muito jovem, ele não leva em consideração muitas coisas como o seu o futuro, ele quer se curar”. No entanto, Daniela afirma que para aqueles que acompanham o jovem é mais complicado. Por isso, o psicólogo não tem um papel apenas com o paciente, mas também com a família. É preciso trabalhar a maneira como ela deve agir e em como pode ajudar: “É lógico que quem está por perto vai sofrer muito, mas é muito importante saber que ele não é o doente, mas que precisa ajudar o paciente a enfrentar isso”, completa. Segundo a psicóloga, o acompanhamento familiar tem a mesma importância que o acompanhamento ao jovem e, por esse motivo, é feito semanalmente. A família precisa saber lidar com uma eventual piora do quadro de saúde, mas mesmo assim não deve fantasiar ou achar que tudo acabou: “Tem que ir dia por dia, tanto o doente como a família. Sempre enaltecendo as conquistas que são obtidas durante o tratamento e o que está por vir”. 34


ENTREGAR OS PONTOS? NUNCA! Desistir não deve jamais ser uma opção, principalmente quando há possibilidade de cura, muito provável em casos como esses. A dica de Matheus para aqueles que, como ele, passam por este obstáculo tão cedo, é: “Vocês são jovens e sinônimo de energia e saúde é a juventude. Abrace seus valores, sua família, amigos, a solução que lhe foi apresentada, respire fundo e vá em frente, não tema o incerto. Faça sua parte, e nunca desista de lutar para alcançar seus sonhos”.

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Da esquerda para direita: Ancelmo (Zoro - One Piece), Aline (Yuno - Mirai Nikki) e Pedro Henrique (Rei Clow - Tsubasa). 36


V

ocê já viu umas pessoas vestidas com fantasias elaboradas no transporte público? Ou já foi sair num final de semana e, ao passar pela faculdade perto da sua casa, percebeu que ela estava rodeada de pessoas fantasiadas? Muito provavelmente o que você viu foi um cosplayer. Os cosplayer são as pessoas que fazem cosplay, mas o que é isso? Esse termo é de origem japonesa, entretanto surgiu da junção de duas palavras da língua inglesa: costume (fantasia) e play (brincar/jogar). A palavra nasceu entre o fim dos anos 80 e o início dos anos 90, para designar o ato de se vestir com de um personagem fora de uma peça teatral, independente de qualquer aspecto cultural. Os cosplayers começaram a surgir no Brasil tarde e sem nome. Em meados de 1980, os fãs se fantasiavam dos seus personagens favoritos, sem uma classificação definida para o que estavam fazendo, era apenas um hobbie

Texto por Jade Prioli Fotos por Beatriz Marques

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No fim da década de noventa, criaram-se os eventos de cultura pop para reunir os fãs. Com a chegada de Cavaleiros do Zodiaco, abria-se então também a porta do mundo dos animes, desenhos vindos do Japão com um traço muito particular em comparação com os desenhos ocidentais. O primeiro evento brasileiro aconteceu em 1996 e era, na verdade, a comemoração12º aniversario da Associação Brasileira de Mangá e Ilustrações. Naquele ano, foi feita uma festa. Além de bolo e salgadinhos, a associação também oferecia uma exposição de mangás e um enorme painel pintado a mão com desenhos dos personagens de anime exibidos na tv brasileira, até então.

Aline da Motta, cosplayer há 4 anos

Nesse primeiro evento, espontaneamente alguns participantes decidiram se fantasiar de seus personagens favoritos. O que também se repetiu nos eventos seguintes. Diferentemento do que leigos no assunto possam pensar, ser cosplayer não é algo simples, diversos cosplays exigem de muito tempo e dedicação para ficarem prontos. Alguns personagens possuem espadas, cajados, entre outros, os quais ou o cosplayer confecciona, ou compra prontos. Em ambos os casos, dependendo do acessório e dos materiais escolhidos, é necessária uma grande quantia de dinheiro. E se for executado pelo próprio cosplayers também é preciso bastante habilidade e tempo. Além dos acessórios, muitas vezes as roupas exigem que o cosplayer gaste muito tempo e dinheiro , caso ele a costure em casa. Desde roupas de colegial até armaduras, as vestimentas variam entre mais simples até mais complicadas. No entanto, as roupas e os acessórios não as únicas dificuldades enfrentadas para que o cosplay fique completo, há também o cabelo e a maquiagem que variam de acordo com o personagem. Existem casos, nos quais apenas coisas básicas como esconder as sobrancelhas precisam ser feitas, entretando em outros são necessárias coisas desde mudar a cor da pele até desenhar elaboradas tatuagens pelo corpo. Em 2003 nasceu o Anime Friends, um evento organizado pela Yamato. Hoje ele é considerado um dos maiores evento no Brasil, contando também com competições de cosplay, onde 38

os participantes disputam entre si, nas categorias grupo ou individual, apresentando cenas ou não e são julgados por figurino e interpretação. Renato Maineti Rosina, 19, é cosplayer desde 2009 e já participou de várias competições. Inclusive ele já faturou os prêmios de terceiro, segundo e primeiro lugar. O estudante não só se diverte fazendo cosplays, mas algumas vezes até ganha dinheiro com o hobbie. O ato de se vestir como um personagem pode sim garantir dinheiro para o cosplayer, desde que seja bem feito (nada de cospobres, como são chamados os cosplays improvisados). Mas calma, ganhar


Raissa Shizue, cosplayer há 2 anos.

dinheiro com cosplay, principalmente aqui no Brasil, não é assim tão fácil. Renato foi um dos poucos sortudos que conseguiu a proeza de ser pago para aparecer na TV aberta e ir a eventos. A maioria dos cosplayers, mesmo que muito bons, não ganha dinheiro para fazer o mesmo, como é o caso de Raissa Shizue. Apesar de estar há apenas dois anos fazendo cosplay, os personagens que Raissa faz são muito bem feitos e muito detalhados. Entretanto ela nunca ganhou dinheiro com isso. A cosplayer, que, muito simpática, concordou em dar uma entrevista seguida de uma sessão de fotos, nos disse que está

pensando em se tornar uma cosmaker (como são chamadas as pessoas que fazem roupas ou acessórios para cosplays) e ganhar um dinheiro com o cosplay, mas ainda não começou. Apesar de Renato e Raissa terem começado há pouco tempo, existem cosplayers como Pedro Henrique da Silva, de 35 anos, que os faz desde o primeiro Anime Friends, em 2003. O primeiro cosplay de Pedro Henrique foi Seta-San de Love Hina, e hoje, segundo sua conta, ele já fez cerca de 20 cosplays, entre eles estão personagens de filmes, séries, animes e mangás. Por já ter feitos muitos personagens, Pedro já fez cosplay de 39

diversas dificuldades e estimou “Dependendo do nível de detalhes (do cosplay), se tiver pouca coisa e for só tecido é coisa de um ano até ficar pronto, agora quando tem muitos detalhes pode demorar até 3 anos pra ficar pronto”. Pedro e seus amigos Alcelmo Soares, de 25 anos, e Aline da Motta, de 24, também concordaram em dar uma entrevista e fazer uma sessão de fotos. Aline e Ancelmo começam, respectivamente, com o cosplay em 2010 e 2012. Diferentemente de Pedro, que escolhe os personagens que têm um tipo físico parecido com o dele, Aline e Ancelmo escolhem pela personalidade.


Gallifrey Con Entre os muitos eventos de cultura pop, que contam com a presença de cosplayers, a Gallifrey Con é um exemplo deles. Apesar de não se comparar aos grandes eventos de anime, como o Anime Friends, a GalliCon reúne, todo ano, cada vez mais fãs da série de ficção científica da BBC, Doctor Who. Aline Delmonte é webmiss e designer do site Whovians, o organizador evento. Segundo ela, no primeiro ano do evento, 2012, cerca de 600 pessoas compareceram, já nesse ano o público total chegou a 900. Aline, de 27 anos, afirma

que a ideia de realizar um evento surgiu por causa da falta de produtos de Doctor Who aqui no Brasil. No início, a Gallifrey Con era organizada também organizada pelo site timelords, mas a partir desse ano apenas o whovians é o responsável pelo evento. Na Gallifrey Con acontece, como em quase todo evento do gênero, um concurso de cosplays. Os participantes são separados em quatro categorias: Doctors femininos, Doctors, Companions e criaturas e outros. A ganhadora do concurso no quesito Companions foi Maria 40

Beatriz Bevilaqua Fagá. A personagem que a rendeu a vitória foi uma versão da Idade Média de Clara Oswin Oswald, uma das personagens principais das sétima e oitava temporadas atuais da série. A estudante e fotografa que começou a fazer Cosplay aos 12 anos. Agora com 23, ela afirma ter uma ligação tão forte com seus cosplays que compara escolher um preferido como se eles fossem seus filhos. Para a Maria Beatriz, não houve uma razão específica para começar a fazer cosplay. Pensativa ela alegou, “Eu não sei o que exa-


tamente me encanta em fazer cosplay, mas gosto da ideia de viver uma personagem que admiro por um dia, gosto das pessoas me reconhecendo e querendo tirar foto comigo, mesmo que essas pessoas nunca mais me vejam na vida. É uma maneira, de certa forma, de se aproximar da personagem.” A cosplayer já fez cerca de oito personagens. Por ser detalhista ela afirma que escolhe os personagens que fará quando se identifica com ele. Ela não apenas dedica muito tempo para a realização das roupas e acessórios, mas também gosta de capturar e adotar os trejeitos dos personagens.

Além do concurso cosplay, também houve uma peça, realizada por Cosplayers do grupo Cosplay em Cena. Os integrantes se vestiram como alguns dos principais personagens de Doctor Who e criaram uma história paralela à série que contava com alguns dos personagens mais queridos do público. Jeffrey Haiduk, 37, é um escritor e ilustrador que faz parte do grupo. Jeffrey já fez 29 personagens em seus 13 anos como cosplayer, e em 2008 entrou para o Cosplay em Cena. O escritor descobriu o mundo dos cosplays através de uma matéria da revista “Animax”, em 1996, que tinha como personagem principal Petra Leão, que viria a ser sua companheira no grupo. “Como eu já brincava de me fantasiar desde a minha infância, não foi nem um pouco difícil me identificar com este universo”, disse Jeffrey que começou, oficialmente, com o hobby em 2001. A roteirista de quadrinhos, Petra Leão, em seus 34 anos de vida passou a metade fazendo cosplay. A roteirista é uma das criadoras do Cosplay em Cena e afirma que o grupo surgiu, porque, apesar de existirem alguns grupos de cosplay que apresentavam peças, muitas vezes elas eram desorganizadas ou os integrantes não se empenhavam em fazer um cosplay mais elaborado. As peças do grupo são dubladas devido ao barulho que há nos eventos onde se apresentam, e nem sempre é o próprio ator que faz a voz de um personagem. “Às vezes a gente chama outras 41

pessoas para dublar se a gente achar que a vós combina com o personagem”, explica. Além de dublarem os personagens, ela toma outro cuidado, ao fazer o roteiro tenta garantir que todas as pessoas possam entender a peça, mesmo que não assistam ao anime ou série. Petra completa, “Nos eventos de anime, hoje em dia, não vai só gente que é fã de anime, vai todo tipo de pessoa. No caso do Doctor Who a gente focou um pouco mais, porque era um evento só da série”. Petra conta que o gruo não ganha dinheiro com as peças, mas que eles tem o projeto de profissionalizar o diz que o empecilho que eles encontram é a questão dos direitos autorais.você não pode sair por ai montando Doctor Who, montando One Piece, ou montando o que quer que seja, e sair por ai montando e ganhando dinheiro em cima disso, sem autorização dos licenciantes” confessa.”É uma complicação, mas é possível.” Ela diz que não existe cosplayer profissional no Brasil e usa sua experiência própria como exemplo.“Se eu fosse depender do dinheiro que ganho como cosplayer eu ia morrer de fome. Porque só ganhei mil reais e todos esses anos em que faço cosplay”. Ela ainda cita que alguns cosplayers brasileiros são convidados para irem à eventos internacionais e recebem por isso, mas o mesmo só acontece nos eventos do Brasil com cosplayers internacionais.


Por Ana Beatriz e Jessica Anjos

No Hospital Emílio Ribas há diversos projetos para aqueles que querem se dispor a ajudar o próximo. Conheça um pouco mais sobre como esses programas podem contribuir para uma mudança positiva tanto na vida dos pacientes, quanto na vida dos voluntários.

ANA BEATRIZ ALVES

Vírus do AMOR

A

primeira turma de voluntários do Hospital Emílio Ribas foi formada em 2005 graças à iniciativa da médica infectologista Glória Brunetti que começou com o projeto no porta-malas do seu carro até convencer o hospital a ceder um espaço para desenvolver as ações humanitárias. Em 2006, o VER (voluntário Emílio Ribas) conseguiu ser oficializado juridicamente contando com, mais ou menos, 150 voluntários. Com a missão de valorizar a vida, a dignidade e a cidadania dos pacientes através de ações humanitárias, o projeto engloba 14 programas onde os voluntários são distribuídos de acordo com o seu perfil e sua disponibilidade, explica Helena Garbini, 63 anos, coordenadora de voluntários. Segundo Rosemire Milas, 53 anos, a ONG sobrevive com as doações financeiras dos próprios voluntários, eventos beneficentes e de apenas algumas

Voluntária na brinquedoteca do hospital

empresas autônomas através de parcerias ‘’que são mínimas’’ , enfatiza. Rosemire explica que a ONG não tem nenhuma utilidade pública e, sem nenhuma ajuda do governo, o VER existe, basicamente, por conta do hospital que cede a luz, o espaço e a água, porém são totalmente desvinculados um do outro e a ajuda financeira 42

vem de outros lugares. Além de algumas empresas, a maior ajuda financeira de onde o projeto consegue se sustentar é por meio dos eventos realizados pelos próprios voluntários. Todo ano é organizado um chá no Terraço Itália. Todo dinheiro arrecadado no evento é destinado para os projetos do Emílio Ribas.


Muitas pessoas não se disponibilizam a ajudar por conta de um preconceito ainda existente em relação ao vírus da Aids/ HIV. A engenheira eletricista, Nathalia Pereira da Costa, 39 anos, conta que sofreu preconceito dos amigos e familiares quando entrou para o projeto, ‘’eram pessoas cultas em conhecimento, com formação universitária e mesmo assim tinham esse tipo de preconceito’’. A chamavam de louca por acharem que ela poderia ser contaminada com o vírus pelo simples contato

com a pele. Nathalia, que desde seu primeiro contato com a iniciativa via internet quis trabalhar no hospital, faz parte do projeto ‘ombro amigo’, no qual sua principal função é escutar os pacientes que, muitas vezes, estão sozinhos por conta do abandono das famílias, ou porque moram longe ou por medo de estarem expostos ao vírus, pacientes isolados que não podem participar dos outros projetos por estarem muito vulneráveis. Ela dá o exemplo de uma paciente que havia visitado no dia, que sofre preconceito dos

A brinquedoteca disponibiliza entretenimento para os pacientes 43

vizinhos e da família. Nathalia mora em Itu, mas trabalha em São Paulo e toda quarta de manhã seu comprometimento é total com seus pacientes no hospital Emilio Ribas. Uma das iniciativas é o Poder Jovem, administrado por Sandra Santos, 46 anos, que cuida especificamente de adolescentes portadores de HIV/aids. São oferecidos cursos de teatro, música, dança, curso de inglês, passeios externos entre outros entretenimentos com o objetivo de restaurar a autoestima e integrar os jovens na


Voluntárias interagem com as crianças internadas

sociedade através de cultura e pedagogia. Para participar do programa, o voluntário passa por um processo de palestras de quatro meses de duração para esclarecer dúvidas e acabar com qualquer tipo de preconceito. ‘’Muitas pessoas acabam não procurando por medo de contaminação’’, diz Elvio Teixeira, 56 anos, fisioterapeuta, voluntário da leitura solidária que tem como objetivo levar companhia e histórias de esperança e paciência. Entre as diversas oficinas realizadas no hospital, a professora de educação física, Márcia Conceição Madureira, 51 anos, trabalha na brinquedoteca realizando diferentes atividades como pintura, leitura, brinquedos e ‘’os maiorzinhos vão para a internet, eles têm essa opção’’, explica. Além da pintura na brinquedoteca, há a oficina especia-

lizada nisso, onde o aposentado Valdir Ferreira, 62 anos, trabalha ‘’porque essa é uma maneira de doar alguma coisa pra quem necessita’’, relata. E, para quem diz que não tem tempo, Valdir expõe sua opinião de que todo mundo tem tempo e que os jovens deveriam ‘’abraçar’’ essa oportunidade. Antigamente, a Aids era uma doença que ameaçava a vida. Já se pode viver bem com o vírus e, ao contrário do medo de muitas pessoas, não é transmitida pelo contato, muito menos pelo ar. ‘’Às vezes é difícil você separar uma parte da sua vida e dedicar para o outro’’, comenta Fiema Aguiar, 21 anos, professora de educação infantil. Mas, a partir do momento em que você se entrega ‘’você traz o bem pra ele, mas quem vai embora muito melhor é você’’, completa. 44

O vírus HIV foi descoberto em 1982 pelo cientista americano Robert C. Gallo. Ele observou que a doença era transmitida por contaminação sanguínea, relações sexuais e de mãe para filho no momento do parto. AIDS (Acquired Immunodeficiency Syndrome) é a sigla em inglês para Síndrome de Imunodeficiência Adquirida (Sida). O vírus destrói a imunidade tornando a pessoa suscetível a outras doenças. Até 1982 a doença era conhecida como GRID, “Gay related immune defiency” (Deficiência imunológica relacionada aos gays). O nome foi alterado quando descobriram que a doença também afetava heterossexuais. HIV é o vírus e AIDS, a doença.


O PODER do projeto

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Poder Jovem é um projeto iniciado pela pedagoga, Sandra Santos, de 46 anos. Após anos trabalhando no hospital como auxiliar do desenvolvimento infantil na área da pediatria e também com os adolescentes que ficavam internados no Emílio Ribas, ela se questionou por que havia tantas internações dos jovens. Depois de investigar a causa soube que eles não queriam tomar os medicamentos, os jovens a questionavam, por que eu vou tomar esse remédio se não tenho perspectiva de vida? Sendo assim, Sandra identificou a necessidade de um incentivo na vida desses adolescentes. Efetivamente em 2007 o programa foi colocado em prática, com 40 adolescentes inscritos. Hoje o projeto Poder Jovem e o VER possuem cerca de 180 voluntários no hospital. Todos os que se candidatam ao voluntariado se inscrevem no período de julho e passam pelo curso preparatório de quatro meses no Emílio Ribas. Com atividades que procuram trazer a liberdade de expressão aos adolescentes do hospital, são oferecidas aulas de dança, inglês e teatro aos jovens, nas quais, pacientes e voluntários interagem. “Nós vemos a mudança na vida deles através das atividades do trabalho voluntário”, afirma Sandra Santos. O projeto cresceu tanto, em 2010, que houve a necessidade de torná-lo pessoa jurídica. “Os adolescentes cresceram e surgiram outras necessidades”, relembra Sandra, “como, por exemplo, profissionais para serem inseridos no mercado de trabalho”. Então, o PJ teve novas aquisições, se tornou pessoa jurídica, ganhou um terreno para que o trabalho com os jovens seja ampliado, e neste ano, de 2014, tornou-se a Fundação Poder Jovem. “Agora com a fundação nós teremos mais apoio, mais estrutura, queremos atender o adolescente de modo completo”, se orgulha Sandra Santos. Foto por ANA BEATRIZ ALVES

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ANA BEATRIZ ALVES

TABU

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vírus HIV foi descoberto em 1982 pelo cientista americano Dr. Robert C. Gallo. Ele observou que a doença era transmitida por contaminação sanguínea, relações sexuais e de mãe para filho no momento do parto.

A

té 1982 a doença era conhecida como GRID, “Gay related immune defiency” (Deficiência imunológica relacionada aos gays). O nome foi alterado quando descobriram que a doença também afetava heterossexuais.

D

iferença entre HIV e AIDS. Ser portador do vírus HIV não significa que a pessoa possa ter a doença (AIDS). Muitos passam anos com o vírus sem que a doença se manifeste. O vírus HIV ataca o sistema imunológico do infectado o que o torna suscetível às doenças chamadas de oportunistas, a tuberculose e pneumonia são exemplos delas. Cada organismo reage de um jeito e só quando é detectada uma das doenças oportunistas no indivíduo pode-se dizer que ele tenha Aids.

S

‘As pessoas ainda acham que apenas cumprimentar um soro positivo ou usar um copo na casa dessa pessoa, correm o risco de serem contaminadas’’, Nathália Pereira da Costa, 39 anos, engenheira eletricista.

ANA BEATRIZ ALVES

ANA BEATRIZ ALVES

Um pouco sobre os voluntários

Rosimire Lima, 53 anos. Começou como voluntária no hospital e hoje, aposentada, se dedica ao setor financeiro do programa, buscando profissionalizar a instituição e algumas parcerias com o governo. 46

ANA BEATRIZ ALVES

egundo a pedagoga Sandra Santos, 45, diferentemente do que muitas pessoas pensam o vírus não é transmitido pelo ar, ou pelo contato físico. Então nada impede uma pessoa de ajudar aqueles que necessitam, como é o caso dos pacientes do Emílio Ribas.

“Depois você percebe que, na verdade, o maior bem quem recebe é você mesmo.Quando vemos os problemas dos outros e o tamanho deles, perercbemos que os nossos não são nada!”, Fátima Alves, 43 anos.


Quer fazer parte da Família Emílio Ribas?

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o Hospital Emílio Ribas, não faltam oportunidades para entrar para o mundo que fascina todos que se dispõe a ajudar ao próximo. No projeto com os adolescentes, o PJ, você pode dançar, cantar, atuar ou aprender inglês com eles, mas o mais importante, se relacionar. É disso que eles precisam, amigos. Se você quiser fazer parte dessa família de voluntários, confira como acontece o processo seletivo do voluntariado Emílio Ribas. O voluntário se inscreve, no período de julho, e passa por três módulos. São três palestras com temas diferen-

fotos por ANA BEATRIZ ALVES

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tes ministradas a cada mês. A palestra inicial irá apresentá-lo ao hospital, a segunda palestra, no mês seguinte, tratará sobre o paciente. E a última palestra será sobre biossegurança. É passível ao voluntário ter apenas uma falta durante o curso, sendo que esta falta só poderá ser cometida nas duas primeiras palestras. Na mais importante, que é a de biossegurança, todos devem comparecer. Em janeiro, todos passam por uma entrevista individual e decidem em qual projeto do hospital vão exercer seu trabalho voluntário.


Texto: Gabriela Stockler Fotos: Júlia Ferreira

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O efeito plus size

moda plus size conquista cada vez mais espaço no mercado. A blogueira Juliana Romano, autora do blog “entre topetes e vinis” confirma isso: “Acho que a indústria vai crescer de acordo com a mentalidade da consumidora. A partir do momento que a mulher gorda se posicionar também como uma consumidora de moda ela deverá ser respeitada e a tendência é que esse mercado cresça.” Mesmo assim, ainda é uma parte da moda em ascensão, visto que em pesquisa, cerca de 48 % da população brasileira está acima do peso considerado ideal. Como comentou Juliana, existem muitas consumidoras para poucas marcas.

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lojista e produtora Cristina Calochorios, dona da marca By Cristian, acha importante em suas coleções estimar o corpo de suas clientes. “ Você tem que valorizar o que ela tem de bonito, o colo, se ela tem as pernas bem torneadas e esconder o que ela não quer que mostre”, afirma. Mesmo que esse mercado esteja crescendo, ainda encontram-se muitas marcas que não tem interesse em produzir essas roupas, principalmente por causa do preconceito. Juliana faz essa crítica “não sou inocente a ponto de achar que não existe preconceito, a diferença é que ninguém sai gritando aos quatro ventos ‘não quero ver minha marca em gordas’. Francamente, acho uma burrice. Perder quase metade do seu mercado porque você foi criado numa sociedade gordofóbica e aprendeu desde criança que ser gordo é crime, me parece muito infantil para alguém que dirige uma empresa”. Raquel Contenti, jornalista e gordinha assumida, fala sobre a grande dificuldade em achar roupas com tamanhos grandes, “A maioria das confecções não coloca as gordas em pauta, até por não querer suas marca vinculada a esse tipo de público”, afirma. Podemos perceber que esse é um ponto em comum com o comentário feito pela Blogueira Juliana Romano. Porém, a grande diferença entre elas esta na questão das tendências e do mercado plus size ter aumentado. Encontrar roupas em tamanhos grandes ficou mais fácil visto que as confecções descobriram que existe um nicho grande nessa área. A-s coisas estão melhorando aos poucos, como comenta Raquel. Porém, em relação às tendências ela critica “Tendências? Jura? Muito difícil rolar tendências para plus size da mesma forma que existe nas confecções de tamanhos regulares. As pe-

ças são sempre as mesmas”. Com os preços baixíssimos devido a matéria-prima vinda da China e Coreia, a indústria têxtil nacional está em crise. “Parte de malha compramos tudo nacional. Tem um preço competitivo e bom. O importado veio pra arrebentar, tem malha importada bem mais barato que a nacional, mas ficamos com receio da qualidade. No tecido plano a maioria é importada, a parte de aviamento, renda, também tudo importado. A indústria nacional perdeu muito”, diz Cristina. “A diferença no preço dos panos é bem alta, o que pagamos no Brasil R$ 30, a importada sai R$ 20, sendo que são exportadas toneladas e toneladas de pano”, comenta a lojista. A produção de roupas plus size sai mais caro que outras. Cristina confirma essa informação: “esse é um investimento de R$ 10 a R$ 15 mil, fora a mão de obra que é muito difícil, como vocês podem ver usamos costureiras bolivianas”. Uma máquina para produção dessas roupas sai entre dois a dois mil e quinhentos reais, sendo estas as mais baratas. Algumas delas podem chegar até dez mil reais. Fora toda produção necessária para elaboração de fotos. A moda hoje é como a tecnologia. “Saiu nos desfiles chiques de Milão, Londres, Paris, menos de um mês os caras já tem o mesmo tecido, mesma padronagem para te vender”, conta Cristina. Aqui no Brasil temos um desfile chamado “Fashion Week Plus Size”. Juliana Romano conta que gosta muito de fazer matérias sobre esse evento, acha sempre muito divertido. Ela também conta que gostou muito de entrevistar a famosa Fabiana Karla.

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O processo de produção leva em média de dez a quinze dias, desde a criação do modelo até a fase de costura acabada, indo assim para as lojas. A concorrência hoje é maior. “Antes tinha o quê? Uma meia dúzia de gente que fazia tamanhos grandes? Agora não, por causa de uma crise de mercado, o pessoal começou a dar tiros para todos os lados, então realmente aumentou muito”, afirma Cristina. Mesmo com esse aumento, ainda existem muitas lojas que não possuem roupas com tamanhos grandes. “Eu ainda sonho em entrar em qualquer loja e poder gostar de qualquer peça, sabendo que terá meu número, porque as vezes eu até tenho dinheiro, só não tenho opção. Felizmente tenho visto muitas lojas plus size surgirem ultimamente e com um gosto beirando o impecável”, comenta a blogueira. O site da loja de Cristina não funciona tão bem quanto o Facebook. O retorno que a rede social dá é muito maior que do site ou da produção de catálogos, sendo que estes eram caríssimos para produzir e não tinham um retorno bom. Uma novidade é a venda pelo aplicativo Whatsapp “é muito rápido, vejam, essa é uma cliente, conversamos hoje de manhã, ela pediu para separar as estampas e vem buscar, se ela não conseguir buscar, ela deposita e eu mando pelo correio, temos até um grupo onde colocamos as novidades da loja”, conta. Uma questão que se tornou polêmica no mundo da moda Plus Size são as modelos “magras” demais. “Eu tenho que explicar 800 vezes que plus size é toda e qualquer mulher que vista 46 para cima, independente de quão gorda ou magra ela

aparenta ser”, diz Juliana Romano. Cristina costumava ter uma modelo, mas por causa dos trabalhos como atriz emagreceu. “A modelo não pode ser maior que 46, o mercado de moda é uma ilusão, na verdade a indústria é uma ilusão”, afirma. Angela Valentim é modelo Plus Size na empresa Pro Namib Models. “Sou gordinha desde criança, então quando resolvi ser modelo pluz size não tive tanta dificuldade para me encaixar, mas mesmo assim já tive problemas no trabalho por ter perdido um número, caindo do 46 pro 44. Minha empresa queria porque queria que eu fosse 46, e apesar de na maior parte da minha vida querer ser magra tive que engordar”. Outra polêmica que ocorre em torno da moda Plus Size é a questão do preconceito, que é abordado de várias maneiras. “O assunto ainda é um tabu. A gente vive dois opostos hoje: o mundo fitness e o mundo plus size. Raras são as vezes que eles se encontram. Então, sempre tem a patrulha da magreza pra falar que gordo é doente”, critica a blogueira Juliana. Angela conta: “Já criticaram minha escolha de ser modelo porque na visão deles era vergonhoso mostrar meu corpo”. Angela também relata “quando era mais nova sofria muito bullying por causa do meu peso extra, e por isso resolvi virar modelo e mostrar que gordinhas também podem se vestir bem. Mas ainda tem pessoas que julgam ser perda de tempo arranjar roupas boas e com facilidade para pessoas gordas”. Raquel Contenti diz “há um preconceito que envolve a moda plus size que eu ainda não vi ser quebrado”.

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Valter Rafael Narciso, consultor técnico e consumidor da moda plus size, aponta que mesmo quando alguém não sofre preconceito diretamente, ela pode presenciar esse tipo de prática “Não, nunca cheguei a sofrer preconceito, mas já vi acontecer principalmente com mulheres em lojas de grife”. Assim como Angela, Cristina, Juliana e Rafael têm em mente que a moda Plus Size tem o poder de ajudar na autoestima. As pessoas acima do peso tem o direito de ter a atenção do mundo da moda. “O que eu pretendo é só que as leitoras se amem e se cuidem mais”, comenta Ju-

liana. “Sim, eu acho que a moda plus size mexe com a autoestima positivamente porque as pessoas com peso não acreditam que possam ser fisicamente atraentes ou admiráveis. Existir um estilo, uma moda que abrange e aproveita o sobre peso da pessoa, a deixando bonita, faz com que ela se sinta confortável socialmente e consiga acreditar que ela também pode ser bonita e admirável para os outros. Que o seu peso não importa”, diz a modelo Angela. “Eu acho que mexe positivamente porque as pessoas com peso notam que o mercado da atenção as suas necessidades e anseios sociais”, comenta o con52

sumidor Valter Rafael. Outra questão, além da autoestima, também presente no dia a dia da moda plus size e de seu crescimento no mercado é a maneira que ela se apresenta a seu público. Rafael comenta que influencia de duas maneiras “positivamente na aceitação, pois é como se o mercado da moda estivesse abrindo os braços e dizendo ‘você também é aceito’, Por outro lado, isso também influência de forma negativa porque um dos maiores incentivos pra pessoa ter um físico saudável é a vontade de entrar naquela roupa mais justa que fica encostada no armário por


não ser vir no momento”. Apesar de o mercado ainda não ser totalmente favorável, o preconceito ainda existente. Todos os entrevistados estão de acordo que, as polêmicas e problemas de confiança que são gerados em volta da moda plus size, terão cada vez menos espaço. Rafael concorda que o mercado está cada vez maior, e também diz que se tivesse um nicho mais focado para a moda masculina faria bastante sucesso “pois roupas plus size masculinas atraem não somente o público voltado para esse tipo de roupa,

mas também para homens que preferem roupas largas, como por exemplo, skatistas, cantores de rap, jogadores e fãs de basquete”. Segundo Raquel os tipos de roupa mais difíceis de achar são as bonitas. “As roupas são sempre largas demais, retas demais, transformam a pessoa em um bujão. Eu, por exemplo, tenho curvas, mas as roupas plus size não deixam elas aparecerem. Fica sempre aquela sensação de usar uma capa de galão de cinco litros”. Para Rafael, as roupas mais chiques e bonitas também são as que 53

ele tem mais dificuldade de achar no mercado. “As roupas mais difíceis de achar são as sociais em primeiro lugar, seguido de roupas de frio como jaquetas, blusas, calças moletom, pois demanda mais material e não são roupas baratas. Quantas lojas você vê vendendo uma simples camisa de algodão plus size? Elas já têm uma boa diferença de preço e dificuldade de serem encontradas no mercado mesmo sendo uma peça simples. Agora imagine o preço e a dificuldade de se encontrar um blazer de marca e qualidade”.


Voluntariado Rosa

Ophelia Santos di Pace, Clea Ozon e Maria Lucia Medrano, voluntárias da APFCC

por Ana Giardini

Os avanços na medicina podem ser tidos como promissores, ao considerar sua velocidade. Com eles, tornou-se possível a cura de muitas doenças e a melhora da qualidade de vida para outras doenças que ainda hoje seguem sem cura. O câncer, que ainda hoje tem alto percentual de fatalidades, pode ser combatido e, por vezes, vencido. Os tratamentos, porém, costumam ter efeitos colaterais desagradáveis, tornando assim necessário o acompanhamento humanizado. Afinal, de nada basta uma boa medicina que não seja reforçada com o apoio emocional necessário para que a mesma possa ter efeito. A Associação Paulista de Combate ao Câncer, a APFCC, tem como objetivo o trabalho de humanização para com os pacientes de câncer e trabalha há 20 anos para ajudar não só o paciente que já foi diagnosticado, mas também na divulgação de métodos de prevenção da doença. A associação conta atualmente com mais de 250 voluntárias da APFCC, e todas vestem não só o uniforme rosa claro, mas também sorrisos. 54


“O trabalho melhorou bastente porque fomos aperfeiçoando”, afirma Ophelia Santos di Pace, que é coordenadora geral das voluntárias há cerca de 18 anos. “E temos um lema, que é ensinar a implantar associações. Como éramos bem organizadas, começamos a ser chamadas para implantar associações pelas cidades do interior”. De 22 cidades que tiveram ajuda da APFCC para implantar trabalho voluntário focado em ajudar pacientes com câncer, o número cresceu, e hoje, depois de 17 anos, mais de setenta cidades no país oferecem assistência voluntária a pacientes com câncer. “O que acontece é que o paciente vai para sua cidade e é acolhido por esse voluntariado,” explica Ophelia, que comparece a encontros destinados a coordernar o voluntariado em favor de pacientes com câncer no Brasil todos os anos. Ela conta que as voluntárias se atentam às necessidades dos pacientes dentro de sua própria cidade, em um trabalho diferenciado do da APFCC. “Atuamos dentro dos hospitais e elas atuam na sua cidade, o que em São Paulo é impossível de se fazer”. Ophelia fala de pacientes que não possuem condições de comprar seus próprios remédios, que moram sozinhos e são incapazes de cozinhar, e diz que as voluntárias se encarregam tanto da compra de remédios quanto de providenciar a alimentação do paciente.

Denise Cirillo, atual presidente da APFCC

“Se chega a papelada e o paciente tem que tomar quimioterapia, então ele tem que ir e vir, às vezes três ou quatro vezes por semana, e a cidade e as voluntárias providenciam uma condução para ele ir e vir, veem todas as necessidades dele para não perder o trabalho do tratamento. É uma coisa que dá muito certo.”

Diretoria Rosa “Há 21 anos, antes da APFCC, eu era uma dona de casa.” diz Deise Mendes Cirillo, atual presidente da associação. “Recebi um telefonema de 55

um hospital que eu nunca tinha ouvido falar, o Hospital Infantil Darcy Vargas, e o diretor do hospital dizia que queria muito que eu tivesse uma reunião lá no hospital. Achei estranho por não conhecer ninguém de lá mas meu marido falou para ir e ‘ver o que era’, e fui. Quando cheguei lá, eu entrei numa sala com uma mesa bem grande de reuniões cheia de médicos e achei engraçado, pensei ‘Que será que eu fiz?’” Deise, na época, trabalhava em outra associação e era voluntária no departamento de manutenção no AC Camargo Cancer Center, conhecido coloquialmente como Hospital do Câncer. “Eles disseram, ‘Dona Deise nós chamamos a senhora


porque sabemos que a senhora é uma empreendedora e a senhora gosta de construir, formar os espaços. E eu realmente gostava.” Foi pedido à Deise que ela encontrasse um empresário que lhe fornecesse recursos para que ela comprasse o material necessário para reformar um espaço no hospital, na intenção de criar um local específico de atendimento oncológico. “Disseram o seguinte: as crianças chegam no pronto socorro e são diagnosticadas com câncer e temos até o espaço pra montar uma oncologia mas não temos como elas fazerem uma quimioterapia, então elas saem daqui e vão para outros hospitais.” Os presentes na reunião informaram Deise que havia espaço, planta e mão de obra para a construção da ala de oncologia, mas não o material necessário para a obra. “Eu na hora fiquei encantada, agradeci, perguntei ‘Como que o senhor confia em mim? A gente nem se conhece’ e responderam ‘Já ouvi falar na senhora e temos certeza que a senhora vai conseguir’.”

Ações Filantrópicas A Associação também contribui com os pacientes de outras maneiras que não a chamada humanização, fornecendo aos pacientes cestas básicas, kits médicos e roupas.

Brena Siqueira Silva, de 20 anos, é mãe de Vitória, de 2 anos. “Estamos aqui há 2 anos. A experiência aqui tá sendo muito boa, todo mundo me trata bem. E eu nunca precisei de ajuda das voluntárias, mas a menina do nosso quarto sim, e eu vejo que é dado.” Sthefanny Caroline Menezes dos Santos, que fez oito anos no dia 10 de setembro, diz gostar muito das voluntárias. “Elas cuidam da gente, brincam com a gente.” “A Sthefanny ficou doente um tempo e a gente não sabia o que era, daí descobriram aqui e aqui ela ficou e daqui ela não saiu mais”, conta sua mãe, Caroline do Santos Mezes, de vinte e sete anos. “As voluntárias são uns anjos, ajudam com tudo que você precisa, se você não tem uma condução você pede pra elas e elas ajudam, tanto…” Caroline diz ser grata às voluntárias. “Você precisa conversar e elas estão aqui, às vezes você precisa de alguma coisa material e elas ajudam, se você precisa de um remédio… Elas sempre estão dispostas a ajudar a gente, né.” Caroline também fala da ajuda das voluntárias em tempos mais difíceis. “Às vezes lá em cima a gente está internado e a gente não tem como fazer uma coisa, elas sobem lá, elas tentam conversar com as mães, com as crianças, ver se estão precisando de alguma coisa… Elas estão sempre por perto e eu acho bonito porque elas fazem com amor, elas 56

não fazem as coisas de qualquer jeito, é uma coisa que você vê que elas fazem de coração.” Caroline conta também sobre o cuidado das voluntárias, que “com todo o amor”, ajeitam e servem pão, leite e café. “Elas veem se você quer mais, se você quer alguma coisa diferente. Outro dia elas saíram para comprar um pão de queijo pra Sthefanny. A gente fica todas essas horas aqui e elas se preocupam se a gente está bem, se a gente está sendo bem tratada, então acho bem legal, assim, o trabalho delas.”

Ana Paula Nunes Brasil, de 32 anos, é médica hematologista no Hospital Infantil Darcy Vargas e trabalha no ambulatório da oncohematologia. Ela diz que as voluntárias ajudam muito com os pacientes e afirma agradecer muito pelo quão atenciosas as voluntárias são. “Uma coisa interessante é que desde quando vim trabalhar aqui é que a gente chama os pacientes e às vezes falam ‘Ah não, agora não’ porque as voluntárias estão lá brincando, dando comida pra eles, dando atenção, tudo, então é uma parceria mesmo com o nosso trabalho”.


Andrea, professora

As voluntárias também participam de outros projetos que visam contribuir para o bem estar do paciente e que procuram mantê-lo no tratamento contra o câncer. No ano 2000, conseguiram, em conjunto com a SPTrans, disponibilizar o bilhete único gratuito para crianças ou adolescentes com câncer e o acompanhante responsável por ajudar a enfermo com o tratamento da doença - o benefício é assegurado em conjunto com a lei 11.250, de 1º de Outubro de 1992, que garante o

direito conquistado na cidade de São Paulo. Em outros âmbitos, a associação buscou, desde 1994, que a Secretaria da Educação implantasse o projeto Educação no Leito, que hoje já está em vigor e beneficia inúmeras crianças e adolescentes que sofrem da doença. Na Educação no Leito, professores estaduais ajudam alunos internados a acompanhar o progresso que, em outro caso, teriam na escola. Andrea Alves de Oliveira é professora no projeto e dava aula 57

em uma escola do estado antes de entrar no projeto. “Estou aqui há 17 anos”, diz. “Abriram inscrições para dar aula em classe hospitalar, me inscrevi e fui uma das escolhidas para trabalhar aqui. Venho aqui todos os dias, de segunda a sexta, na parte da manhã.” Andrea hoje acompanha crianças e adolescentes que se encontram no Hospital Infantil Darcy Vargas e conta que foram as voluntárias quem montaram as classes onde ela hoje dá aula para os pacientes. “ É um trabalho em conjunto”, ela afirma.


Giane e Amanda

Giane Yada também é professora do Estado, contratada pela Secretaria da Educação para atuar com os alunos que se encontram internados por um longo período. “Nosso papel primordial é entrar em contato com a escola regular desse aluno e fazer uma ponte, a escola regular vai disponibilizar o material e em cima desse material enviado pela esco-

la regular a gente faz o acompanhamento pedagógico, sanando algumas dúvidas, favorecendo o aprendizado.” Giane está no Darcy Vargas há 8 anos. “As voluntárias sempre estão nos andares, perguntando pras mães se precisam de alguma coisa, são parceiras, disponibilizam material.” Quando entrevistada, Giane estava ajudando Amanda, de 13 anos, com 58

sua lição de matemática. A APFCC, ainda no Hospital Darcy Vargas, ajuda na área de odontologia infantil, doando equipamentos para que o trabalho odontológico pudesse ser realizado. Ana Rosa Mauricio é dentista serviço público e trabalha, como outras de sua categora, em hospitais onde as voluntárias também atuam. “As voluntárias é que estão sempre aqui auxiliando nos trabalhos” Brinca. “Estou aqui há 20 anos, e a gente trabalha com as crianças da oncologia e da hematologia, da nefrologia, são esses pacientes com quem a gente trabalha.” A Associação, hoje, não é mais um voluntariado exclusivamente feminino. Ophelia, coordenadora das voluntárias, é voluntária na àrea do câncer há 30 anos e diz que hoje em dia, é difícil achar voluntárias. “Homens também já estão começando a entrar para serem voluntários” Ela conta. Os voluntários, que somam em torno de 10, costumam ser aposentados ou trabalhadores autônomos. “Para a pessoa que trabalha, geralmente não dá certo.” Ophela diz. Ela explica que, pela associação trabalhar de segunda à sexta feira, fica difícil encontrar voluntários e voluntárias em uma faixa etária que condiza com a da grande classe trabalhadora do país. “Existem muitas associações que trabalham de sábado e domingo e que precisam de voluntarios.” Ophelia ainda concluí: “Acho muito digno.”


Cartão vermelho às injustiças Os caras que apitam, levantam cartões e bandeiras, escutam desaforos e levam sapatadas nos gramados

Quem vê o professor e autor de livros didáticos, Cláudio Alves, o professor universitário, Zeca Marques, e até mesmo o modelo fotográfico, Guilherme Ceretta, mal imagina o quanto eles já foram xingados simples-

mente porque sopraram – ou deixaram de soprar – um apito. Mais difícil do que estar em campo defendendo o time em que joga, é calçar as chuteiras para defender a justiça. Chutar a bola na rede é fácil quando comparado ao trabalho do

árbitro de agradar uma torcida extremamente polarizada e que sempre está lá, com o sapato na mão, esperando um apito gritar ou um cartão levantar contra ou a favor seu time.

Bruna Soares Rafael Palone

Foto: Rafael Palone 59


Reprodução / Claudio Alves

“Se errei - e errei, sim não foi por maldade” O ex-árbitro Cláudio Pinto Alves diz que não apagaria nenhum jogo de sua memória. “Se errei – e errei, sim – não foi por maldade”. A partida mais importante que apitou foi entre Santos e Corinthians e a que mais gostou foi uma final de segunda divisão em que a arbitragem tirou nota dez (em jogos importantes, os árbitros são avaliados). A paixão pelo futebol veio desde jovem, quando jogava futebol de salão pelo São Paulo Futebol Clube. O preconceito da época contra o esporte fez com que seu pai não concordasse que o filho se tornasse um jogador profissional. Apesar de ter se formado em biologia e desistido da ideia de se tornar um jogador profissional, ele não desistiu dos campos. Calçou as chuteiras de uma maneira “mais séria” após ligar para a Federação Paulista de Futebol (FPF) e começar a fazer aulas de arbitragem na escola de árbitros Flávio Iazetti, em 1990. “A pressão é terrível. O medo é terrível. Dentro de campo, ficamos protegidos por um simples alambrado. A torcida não perdoa, nos ofendem desde o início até o final do jogo. Cospem, jogam urina, arremessam rádios de pilha, pilha, sapatos, pedras”. Cláudio conta que, para manter a concentração em meio a tanta pressão, o segredo é focar-se apenas no jogo e ignorar que há outras pessoas na arquibancada, por mais que elas tentassem chamar atenção. Em 1996, deixou a arbitragem e um dos motivos foi o temor da esposa por sua segurança. Torcedor do Palmeiras, confessa que na hora de torcer não se incomoda tanto com a arbitragem. Incomoda-se muito mais com os comentaristas de arbitragem e os críticos que nunca entraram em um campo de futebol. Segundo ele, a arbitragem do futebol é antiquada por opção, porque com tanta tecnologia muitas injustiças seriam evitadas.

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Zeca Marques, ex-árbitro de futebol, sempre foi muito ligado ao futebol e ao esporte no geral. Decidiu ser árbitro porque nunca teve oportunidade de praticar futebol profissionalmente. Então via a arbitragem como única saída para se manter por perto do universo esportivo. Em 1992, entrou em contato com a Federação Paulista de Futebol (FPF), e se inscreveu para o curso em dezembro desse ano. Seus pais mantiveram-se indiferentes quanto à escolha do filho, não se opuseram, mas também não apoiaram. Sobre arbitrar, ele diz que é um trabalho por vezes ingrato e se apoia em que há um juízo universal de que os árbitros sempre erram, e de maneira deliberada, contra seu time. Mas, afirma que, diante disso, é preciso manter equilíbrio e tranquilidade para não se deixar influenciar pelas pressões que o árbitro sofre o tempo todo. Atuou como árbitro de 1982 a 2000 e durante esse período, conta que procurou manter um excelente preparo físico, com treinos realizados três vezes por semana. A alimentação também era equilibrada, especialmente em vésperas e dias de jogos. A partida mais importante que apitou foi Corinthians x São Paulo, pelo Campeonato Paulista de Futebol Feminino de 1997. O jogo foi realizado no Estádio Ícaro de Castro Melo, no

Complexo do Ginásio do Ibirapuera e teve transmissão ao vivo, pela TV Bandeirantes, para todo o país. Os dois times concentravam grande parte das atletas que haviam obtido a medalha olímpica com a Seleção Brasileira em Atlanta (EUA), no ano anterior. Mas, a partida preferida de Zeca foi Rio Branco x São Paulo, pela finalíssima do Campeonato Paulista de Juvenis (atual Sub-17) de 1996. O jogo teve muitas alternâncias no placar e acabou sendo decidido na cobrança de pênaltis. O Rio Branco sagrou-se campeão. Já a pior partida, a que poderia esquecer ou apagar, seria a partida Taquaritinga 1 x 0 Matonense, realizada em 1995. Zeca expulsou um atleta do time da casa no primeiro tempo e os jogadores do Taquaritinga dirigiram-se para ele de forma violenta. “Tive a impressão de que seria agredido e refugiei-me próximo da área em que se encontrava a Polícia Militar. Após esse lance, tive uma atuação muito ruim ao longo da partida, e não consegui manter o equilíbrio para levar o jogo até o final de forma positiva’’, conta. Houve muitas reclamações, de parte a parte. Apesar disso, Zeca também é torcedor. Seu time é a Portuguesa e assim como os outros torcedores, também reclama dos árbitros, mas explica que é natural, porque o futebol é movido pela paixão, e, portanto, o mesmo ocorre com ele. Agora, Zeca 61


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Foto: Rafael Palone

é professor universitário desde 2009 no Departamento de Ciências Humanas da UNESP – Campus de Bauru (SP), mas ainda tem seu árbitro preferido: Oscar Roberto Godói, que não teve grande projeção internacional por questões políticas da arbitragem brasileira. Mas, e apesar do temperamento explosivo, tinha uma condução impecável das partidas, tanto no aspecto técnico como no aspecto disciplinar, destaca. Sobre a arbitragem atual, defende que houve muitos avanços, com a valorização do ofício por meio de uma remuneração bastante razoável e que hoje os árbitros estão melhor preparados fisicamente e culturalmente para o exercício desta atividade. “Seria interessante que houvesse a profissionalização da arbitragem, o que permitiria a oferta de melhores condições para a formação do árbitro (condicionamento físico, apoio psicológico, capacitação técnica etc.) e também formas mais claras de cobrança e avaliação”, conclui Zeca. Diferentemente de Cláudio e Zeca, os árbitros Guilherme Ceretta e José Cláudio Rocha continuam indo aos gramados e salões para apitar. Ceretta e sua família jamais imaginavam que ele seria um dos árbitros mais reconhecidos no país. Entre seus trabalhos, está o jogo em que Rogério Ceni marcou o 100º gol e finais do Campeonato Paulista – inclusive a de 2014. “Ser reconhecido como um dos bons árbitros deste país me dá a certeza de que acertei mais do que errei. Não posso ser perfeito, mas posso ser justo”. José Rocha classifica a partida Corinthians x Paulista como sua preferida e Mirassol x Ponte Preta, em 2011, como a mais importante. Lista quatro pilares aos quais a arbitragem é essencial: físico, técnico, disciplinar e mental. É preciso encarar desde os exercícios físicos de correr em um campo de um lado para o outro até o exercício mental de aguentar uma torcida. “Eu não me irrito com árbitros, pois sei qual é a dificuldade de estar lá”, afirma José. “Eu também sou torcedor. Às vezes me irrito com a arbitragem, assim como acredito que se irritam comigo. Aprendo a cada dia com os erros e acertos meus e de meus colegas”, completa Ceretta. Antes de guardar os cartões no bolso, pendu-


Foto: Rafael Palone

COMO SE TORNAR UM ÁRBITRO rar o apito no pescoço e segurar a bandeira, o árbitro passa por um processo de treinamento e formação. O curso de arbitragem é oferecido em São Paulo pela Federação Paulista de Futebol (FPF) e pela Associação de Árbitros da Grande São Paulo (AAGSP). Com duração de três meses é composto por aulas práticas e teóricas. As aulas teóricas do curso da AAGSP são realizadas de maneira inusitada: em um campo de futebol no Campo Limpo, apitando um campeonato de jogadores mirins com 12 anos ou menores. Mesmo assim, não falta a torcida para gritar e cobrar dos juízes. Os pais revoltados porque o garoto do outro time não levou um cartão, ou por causa da falta que não foi marcada ou do impedimento injusto. Apesar disso, os erros são justificáveis e também são como uma forma de aprender. Ao fim da partida, os árbitros se reúnem e discutem todo o jogo, os deslizes e os acertos. Também se reúnem para dar risada dos comentários da torcida, o que também é um treino para lidar com a pressão de um campo cheio. Em geral, quem mais se interessa pelo serviço de árbi-

tro são jogadores que buscam uma visão mais técnica do jogo, professores de educação física ou, como é o caso de Jefferson Souza, que está fazendo o curso para “saber um pouco de tudo”. “Eu já fiz um curso técnico de enfermagem, estou no quarto semestre de Educação Física e nas últimas semanas do curso de arbitragem. Posso apitar um jogo, auxiliar um jogador e socorrê-lo”. Mas, o foco principal de Jefferson nos três cursos é para quando ele tirar a licenciatura. Na hora de dar aula, vai ter um entendimento maior de qualquer um dos problemas que podem surgir; seja um joelho ralado ou uma briga por causa de uma falta marcada. “O mais importante a ser passado em uma aula de arbitragem são as técnicas para que o árbitro não assista ao jogo como um torcedor”, diz o pro63

fessor Felix Costa. “Se o árbitro está seguro, ele ergue o cartão e vira as costas, porque sabe que o motivo para fazer aquilo está nas regras”. Segundo ele, o importante é fazer o que deve ser feito e apitar para que o jogo continue. Dessa forma, os jogadores não vão brigar nem argumentar, porque a bola vai estar rolando e, enquanto um time discute com o juiz, o outro pode estar marcando um gol. É muito comum que árbitros levem a culpa por problemas em jogos de futebol, já que eles são os responsáveis por “manter a ordem” em um ambiente completamente tomado pelo fervor dos torcedores. Tanto os árbitros que atuam atualmente, como Ceretta e José, quanto os ex-árbitros, Zeca e Cláudio e os árbitros em formação como Jefferson, afirmam que ser árbitro é amar o esporte além da paixão.


Intercâmbio:

com o pĂŠ na estrada

Bianca Luzetti Paloma Ghorayeb

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ue viajar é bom todo mundo concorda. E cada dia mais o intercâmbio tem se popularizado no Brasil. Quem nunca saiu do país, com certeza conhece alguém que vai ou já foi. É indiscutível que em um intercâmbio você aprenderá muito melhor e mais rápido um novo idioma do que em qualquer curso aqui no Brasil. Isso porque durante o intercâmbio, você é imerso no idioma que deseja aprender e isso significa contato 24 horas por dia, 7 dias por semana. Jéssica Favalli, de 21 anos, fará seu primeiro intercâmbio dentro de um mês e vê essa viagem como uma oportunidade de “se encontrar”. Além disso, a imersão em novas culturas põe em choque nossa visão unilateral do mundo. Talvez esse seja um dos maiores motivos para tantos jovens procurarem essa experiência. “Já comecei três cursos de graduação e não me encontrei em nenhum deles,

Tamires recebe boas-vindas na Universidade de Pittsburg

então acho que essa viagem vai me fazer enxergar as coisas de um modo diferente e me ajudar a ver o que eu quero pra minha vida”, diz. Jéssica vai para Connecticuc para aprender inglês e, segundo ela, não aprender só sobre outras culturas, mas também quer aprender a se conhecer melhor. O que todos os intercambistas têm em comum é que durante o intercâmbio eles percebem que o mundo é muito maior do que se imaginava. Percebem o que realmente gostam, o que é importante, o que sentem falta, etc. Jéssica já se adianta a dizer que o mais sentirá falta será a comida, seu pai, suas amigas inseparáveis e das baladas de São Paulo. Mas, além do aperto no coração vai também uma vontade incontrolável de explorar, conhecer e aprender muito. Muitas pessoas não pesquisam sobre intercâmbio pois acreditam que é um sonho inalcançável. A boa notícia é que há pacotes para todos os bolsos. Há 65

uma infinidade de destinos, programas, tempo de duração, forma de pagamento etc. O professor de Jornalismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Edson Capoano, esclareceu algumas das dúvidas na hora de começar a procurar por um intercambio. “A primeira dica é criar uma ordem pra pesquisa: por região, por curso, por período, pra ter um foco. Aí dá pra comparar um com o outro, senão voce fica sem referência”, aconselha. Um exemplo vivo de que o esforço dá certo, é a aluna Tamires Lietti, que cursava Jornalismo no Mackenzie, mas atualmente reside em Pittsburgh, nos EUA. Ela está realizando seu intercâmbio pelo programa “Fluxo Contínuo”, promovido pela COI (Coordenadoria de Cooperaçao Institucional e Internacional), em sua universidade, e conta que precisou passar por diversos processos seletivos e burocráticos para conseguir a tão sonhada viagem. “Precisa ter a média acima


de 7, ter poucas dependências, tirar uma determinada (e muito boa) nota no TOEFL, ter carta de recomendação... É bastante coisa pra juntar e correr atrás”. Tamires também conta que apesar da adaptação estar sendo fácil (em parte por já ter ido com o inglês fluente), o sistema de ensino é algo para se acostumar aos poucos, uma vez que é completamente diferente do nosso em termos de presença, nota e conteúdo. Como conselho para os futuros viajantes ela adverte “Seja um bom aluno. Suas notas e comportamento te abrirão muitas portas. O trabalho duro gera bons frutos. Se preparar para o intercâmbio é um processo que começa bem antes da viagem”. Assim como Tamires, a hoje estudante de Relações Públicas da Anhembi Morumbi, Paula Cunha, foi atrás do “american dream” e fez o último ano do Ensino Médio na Philadelphia (EUA). Morou em uma casa de família e sua irmã temporária era líder de torcida, o que a fez muito popular na escola. Ela fez a viagem por meio de uma agência de viagens que providenciou tudo, desde o passaporte até as acomodações. Paula conta que viveu tudo o que vemos nos filmes americanos, inclusive as festas com os copos vermelhos. “O que eu mais sinto falta dos EUA é a forma como tudo lá funciona, como escolas e hospitais. Não que tudo seja perfeito, mas é bem diferente do Brasil. E da minha ‘host family’, que me tratou muito bem do início ao fim da viagem”, disse ela.

Já para os interessados a viajar durante a faculdade, a Coordenadora de Programas e Convênios do Mackenzie, Cindy Veloso explica que o Mackenzie é uma das Universidades conveniadas ao Programa Ciência sem Fronteiras, e a COI é o canal de acesso aos processos necessários para participação do Programa e que em média eles fazem o atendimento de mais de 2000 alunos para tratar de assuntos como Ciência sem Fronteiras e Fluxo Contínuo. Ela esclareceu também que para cada edital que é aberto na COI existe um processo específico, como por exemplo, além de estar regularmente matriculado, são exigidos documentos pertinentes aos editais tais como certificado de conhecimento do idioma do país de destino, passaporte, entre outros. Cindy contou que para

o Ciência Sem Fronteiras o destino mais procurado é o Estados Unidos. Já para o processo Fluxo Continuo, Espanha e Portugal. O programa Santander Universidades também oferece bolsas de estudos em vários países do mundo como Espanha, China, Argentina, Chile, Colômbia, México, Uruguai, Peru, Porto Rico e Portugal. Todo ano eles lançam novas vagas. A aluna de engenharia da FEI, Maria Victória Souza conseguiu a melhor e também a pior experiência da sua vida – de acordo com ela – por meio do Rotary Club, onde é habituada desde pequena por causa de seu pai, integrante do clube e responsável por algumas áreas do programa de intercâmbio. A ex-intercambista morou por um ano na Austrália, na casa de uma “host family” com a qual mantém contato até hoje. Conseguir a viagem nem sempre é fácil. “Tive que pas-

Paula encontra sua host family nos Estados Unidos 66


Maria Victória pratica snorkeling, esporte muito popular na Austrália

sar por um processo seletivo com provas e entrevistas para garantir minha classificação e dependendo disso poderia escolher o país de destino”, conta. Apesar de ter deixado pra trás o namorado, os amigos e a família, ela diz ter passado o melhor ano da sua vida lá, do outro lado do continente e assume “faria de novo sem pensar duas vezes, então espero não ter oportunidade tão cedo, pois atualmente meus objetivos são outros”.

QUANDO NEM TUDO SÃO FLORES... Apesar do intercambio parecer um sonho para mui-

tos, nem tudo é garantia de sair 100% certo. Beatriz Duarte, estudante de Psicologia do Mackenzie, viajou aos 16 anos para os Estados Unidos e hoje, aos 20, conta as dificuldades que passou com sua “host Family”. “A família me recebeu super bem e a princípio era legal comigo, mas o filho mais velho deles vivia dando indiretas pra mim, até um dia me abordar sexualmente na cozinha”, relembra. Depois de tentar ignorar a situação com o então “host brother”, o clima na casa ficou ainda mais pesado, levando Beatriz a tomar a decisão de voltar para o Brasil. “Eu falei pros meus pais que não queria mais ficar lá, expliquei toda a situação. Achei que eles fossem 67

me mandar não desistir da viagem e só trocar de casa, mas eles me apoiaram muito”. Mas Beatriz não desistiu de viajar. Ela fez intercâmbio na Polônia depois e fez tantos amigos lá que não consegue ficar muito tempo sem fazer uma visitinha ao país. Entre todas as formas de pesquisar e ficar por dentro dos programas de bolsa, os blogs sobre intercâmbio, que além de avisarem sempre sobre as inscrições e compartilharem experiências de viagens, são os mais práticos e interativos. O blog Canal do Intercâmbio é super atualizado nessas questões e ainda conta com vários colunistas que dividem relatos sobre suas viagens. O Partiu Intercâmbio também tem milhares de informações para quem procura dar um giro pelo mundo. Ele é feito por uma jornalista chamada Bruna Passos Amaral, que já conheceu 24 países e dá dicas sobre todos eles Para quem não vê a hora de desbravar esse mundão, Otávio Tuera, representante da agência de intercâmbio IE (localizada em Higienópolis), conta que para as pessoas ansiosas, pode-se programar um intercâmbio para a Europa em menos de 20 dias. Já países como Estados Unidos e Austrália requerem mais burocracia e por isso essas viagens devem ser planejadas com antecedência. Na IE os destinos mais baratos são Malta, África do Sul e Canadá (cerca de sete mil reais para um período pequeno). Os mais caros são Paris, Nova Iorque, Londres e Berlim.


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Algumas pessoas cuidam melhor de seus animais do que de seus irmãos. Mas a verdade é que um cachorro ou gato não precisa de muito para lhe dedicar sua lealdade e carinho. Não é à toa que uma das imagens mais fáceis de encontrar na cidade de São Paulo é um morador de rua dividindo seu único cobertor com um cão. O problema é que outra cena ilógica é tão frequente quanto: animais maltratados por seus donos. Todo ser humano tem seus direitos básicos protegidos e garantidos pela Constituição. Com os bichinhos não é diferente! Eles são tutelados pelo Estado e defendidos por leis que garantem sua integridade e segurança. Luiz Scalea, coordenador da Associação Protetora dos Animais São Francisco de Assis, trabalha exclusivamente para que tais leis sejam cumpridas. “Quando encontramos alguém que judia, a gente retira o animal e leva o caso para a delegacia. A pessoa é fichada e responde pelo crime”. A ONG leva o bicho ao médico veterinário, onde ele é tratado, vacinado e castrado - um procedimento padrão seguido por todos os colaboradores antes de encaminhar

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para adoção. “A gente cuida e busca um dono que dê carinho e um lar digno aos resgatados, essa é a nossa missão de vida”, afirma Scalea. Luiz comanda uma feira todos os sábados com ponto fixo na Rua Alagoas, no bairro Higienópolis, onde os animais resgatados são expostos ao público. “Escolhemos bairros mais nobres, porque, assim, é feita uma melhor doação, pelo fato de os donos terem melhores condições. Não é preconceito, mas, sim, uma opção melhor para esses animais que exigem maiores cuidados e gastos”. Somente neste local, mais de 3.000 doações aconteceram, e ainda são realizadas feiras aos domingos em pontos itinerantes, assim, mais famílias têm a oportunidade de adotar um bichinho de estimação. Para funcionar, a ONG conta com a colaboração de muitos voluntários. Os cuidadores não são fixos, vão conforme a disponibilidade. Melissa Fernandes é interprete durante a semana e uma das muitas colaboradoras aos sábados. “É extremamente gratificante! Você está mudando a vida desses animais e ao mesmo tempo muda a vida dos adotantes também!”, fala a jovem, muito empolgada. Contudo, Fernandes é muito enfática quanto a preferência da população. “A pessoa vem aqui e diz ‘quero cachorro pequeno’, e eles mostram com a mão um espaço de 10 centímetros”, mostra a voluntária. “Acho que precisa de um trabalho maior de conscientização da população”. Outra cuidadora é a professora de Ciências Roberta Lacava, que está envolvida na causa animal há mais de 15 anos. Lacava também fala sobre o preconceito sofrido por animais idosos, pretos, cegos, mancos e sem alguma parte do corpo. “É uma pena as pessoas não os verem pelo que são, mas pelo que apresentam. É a mesma coisa de crianças de orfanato. Um adolescente de 14

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anos tem menor chance do que um bebê”. Roberta participa de um grupo chamado Ajuda Animal (A.A.). “A gente não consegue acolher todos, porque, infelizmente, não podemos abraçar o mundo, mas fazemos o que podemos para ajudar os abandonados”. Hoje, ela tem aproximadamente 80 cães e 20 gatos na sua casa. Segundo a cuidadora, a prioridade é dos que estão muito machucados. Depois de tratados, ela os encaminha os para adoção. “A gente procura entrevistar bem nas feiras, porque não adianta doar pra qualquer um, de qualquer jeito”. Qualquer pessoa que encontrar um animal abandonado e quiser tratá-lo conta com o serviço do Centro de Zoonoses da cidade para vacinação e castração gratuitas. Depois da recuperação do animal, se o cuidador quiser buscar uma família que queira dar continuação aos seus tratamentos e carinhos, pode agendar um dia na feira para doação. Segundo Scalea, os animais geralmente chegam com receio, traumatizados com a violência e o abandono. Os cuidadores precisam de força de vontade, amor e respeito. Ele conta que a crueldade não tem limite. “Esta noite eu resgatei uma cadela prenha com o pai e uma mãezinha com 9 filhotes. Recebemos uma ligação de denúncia, a cachorra deu cria em cima de um viaduto em construção, em um lugar que será concretado. Ou a gente os resgatava, ou eles concretariam os cachorros”. Arthur Sampaio, de apenas 8 anos, acompanhava os pais na feira em busca de um cachorro. “Meu cachorro morreu há alguns meses e eu quero outro para poder brincar, para cuidar”. Depois de algum tempo olhando o viveiro, acariciando os animais e brincando com os mais agitados, o menino se encantou por um. “Eu gostei

Melissa Fernandes, colaboradora da P.A. 70


desse porque ele é bem brincalhão, igual a mim!” Fernanda, mãe de Arthur, ressalta a importância da adoção. “A semana toda procurei um local para comprar um cachorro para o Arthur, mas vendo tantos cães para adoção, acho errado. e uma judiação”. Para levar um bichinho desta feira, o adotante paga uma taxa de 70 reais e preenche uma ficha com todos os seus dados. O cuidador se responsabiliza por contactar frequentemente a nova família, para saber se o animal se adaptou e está em boas condições, caso contrário, pode haver devolução. “Não há muitos casos de devolução, mas abrimos essa possibilidade, porque queremos que seja uma adoção consciente”, conta o coordenador. Esta também é a principal preocupação de outra ONG. A Associação Natureza em Forma ressalta a importância da entrevista antes da adoção. “A pessoa passa por uma entrevista para a gente ver se ela tem condições físicas, emocionais e financeira para manter o animal. Tudo para a segurança do bichinho”, conta Henrique Muraro, um dos cuidadores da ONG e estudante de Psicologia. Esta associação não se restringe ao atendimento de cães e gatos apenas. O prédio localizado na região da Praça República conta com várias repartições e é possível encontrar hamsters, ratos de laboratório, porquinho da índia, coelho e até mesmo um galo. Porém, estes são os animais de maior permanência no abrigo. “A procura existe, o problema é que a maioria das pessoas não tem os pré-requisitos para adotá-los. Então não podemos liberar a adoção”, diz Henrique. Ele guia um passeio pelas instalações da

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ONG e não se segura quando chega ao espaço dos cães. “Este é o Mike”, mostra com orgulho o mestiço labrador creme enquanto fala para o cão “oi bebê!”. Os latidos vêm de todos os lados quanto ele continua, “Mike foi vítima de maus-tratos. Perdeu a visão do olho direito devido a muitas pauladas na cabeça”. Muraro demonstra o espírito da Associação ao abrir gaiola por gaiola para acariciar os animais e conta a história de cada um. Tem o Balzaque, um cão negro e sem raça que tem câncer, que foi adotado e devolvido na mesma semana. A Lulu, mistura de poodle com vira-lata, uma cadelinha branca encontrada com marcas de queimadura de cigarro. Tem a ala dos “quietinhos” e dos “bagunceiros”, dos novinhos e dos velhinhos e mais adiante, a ala dos gatos. Tudo muito amplo e higienizado quando mencionado o assunto, Henrique logo fala, “Importante que aqui a gente não ‘super-popula’. Damos importância ao conforto dos animais, então não pegamos mais do que podemos abrigar. Sai um, aí sim entra outro”. Assim também funciona no abrigo de dona Maria da Luz. Aposentada e protetora de animais há 37 anos, ela brinca “Sou da época que nem existia ração”. Dona Maria conta que, naquele dia, em sua casa ela abrigava 41 cães e 22 gatos, estava superlotada. “Se a gente não doa, a gente não pode resgatar. E

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a gente tem que resgatar, porque a miséria é muita, o abandono é terrível!”, lamenta a cuidadora. Uma pesquisa da Organização Mundial da Saúde aponta que em todo o território brasileiro existem cerca de 30 milhões de animais abandonados, 20 milhões de cães e 10 milhões de gatos. Apenas na cidade de São Paulo, aproximadamente 2 milhões vivem nas ruas. Entre estes animais estava o Ted, mestiço de shao-shao com vira-lata, encontrado vagando na rua pela jovem empresária Carol Couto. Couto relembra o momento em que o resgatou, “O Ted foi encontrado na rua, com feridas graves por todo o corpo, esquelético e sem esboçar qualquer tipo de reação. Era de cortar o coração!”. A empresária o encaminhou ao veterinário, realizou todos os exames e o levou para casa. “Tive medo de que ele não fosse resistir”, emenda. Carol é toda carinhos para com o animal de pelos caramelos e abundantes. “Adotar é um ato de amor onde você se torna responsável por uma criatura que precisa de você, dos seus cuidados, do seu carinho”, fala a jovem, sentada no chão ao lado do animal. E ela completa, “O Ted é um presente na minha vida. A felicidade dele quando me vê faz tudo valer a pena. Não há dinheiro que compre”.


Além das feirinhas de adoção, a prefeitura mantém o Centro de Controle de Zoonoses (CCZ), responsável por recolher e cuidar dos animais abandonados e os disponibilizam para adoção. De acordo com Manoel, funcionário do CCZ, não basta adotar, as pessoas devem ter consciência da responsabilidade ao adotar um animal de estimação: Registro Geral do Animal (RGA) • O RGA identifica o animal e seu proprietário. O Centro de Controle de Zoonoses ou os estabelecimentos veterinários credenciados para registrar seu animal. Usar coleira e guia • Durante o passeio, é importante o uso coleira e guia. É segurança para o animal e para as pessoas. Se o animal for bravo, utilize também a focinheira para evitar agressões.

Abrigo • O cão deve ter abrigo confortável, protegido do sol, da chuva e do vento. Já os gatos preferem dormir em locais altos e aconchegantes. Vacinação e vermifugação • Os filhotes devem ser vacinados com 2, 3 e 4 meses de idade e os adultos, anualmente, com vacina contra a raiva e doenças próprias da espécie. Castração • É uma cirurgia que impede o surgimento de crias indesejadas, diminuindo o abandono e os maus tratos dos animais pelas ruas. Pode ser feita tanto nas fêmeas como nos machos. Além das campanhas de adoção, o CCZ realiza diversas ações ao longo do ano como mutirões de castração, com apoio de ONGs conveniadas e campanhas gratuitas de vacinação contra a raiva.

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Como Danilo Gentili e Rafinha Bastos reinventam o

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JEITINHO formato americano do late night show Larissa Santos e Ellen Simão

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enário com paisagem de cidade, banda, locutor, plateia, mesa com sofá para convidados ilustres e um apresentador espontâneo, inteligente e divertido. Adicionando as tradicionais canecas, eis a receita para se fazer um late night. Derivado dos talk shows, o formato desse tipo de programa de entrevistas se consolidou nos Estados Unidos a partir de 1960. “Talk show” significa literalmente um “programa de conversa”, onde entrevistas e entretenimento são o foco. Já o primo late night mantém a principal característica, só que com o humor mais explorado. Johnny Carson foi o principal difusor do formato, ficando 30 anos na tevê americana com seu Tonight Show. No Brasil, o primeiro talk show foi ao ar sob o comando de Silveira Sampaio. O “SS Show” foi lançado no fim da década de 60 e atraiu o olhar daquele que se consagraria como nossa referência nacional no gênero: Jô Soares. Jô estreou no SBT seu próprio late night, o “Jô Soares Onze Meia”, em 1988. Sob influência de Silveira Sampaio, com quem trabalhou 20 anos antes, Jô se consolidou como entrevistador e seu programa, com modificações, está até hoje no ar. Por quase três décadas, Jô Soares dominou o gênero no país, inspirando muitas pessoas, inclusive seus atuais concorrentes.

Danilo Gentili, assim como Jô, se destacou graças ao humor. Descoberto fazendo stand up em bares, foi convidado para ser repórter no CQC da Bandeirantes em 2008. Três anos depois, estreava na mesma emissora seu late night “Agora é Tarde”. Criação própria do humorista, o talk show noturno de Gentili tinha a difícil missão de rivalizar com o veterano da Rede Globo. A disputa seria muito mais por inovação do que por audiência, já que, na época, a Band registrava no início da madrugada 0,6 pontos – contra aproximadamente seis pontos da Globo na mesma faixa de horário. A ideia de confrontar Jô Soares era ousada e por isso Danilo teve dificuldades para tirar o programa do papel. “Demorei três anos para convencer a emissora de que poderia ser legal ter um talk show. Eles falavam ‘não terá cast, as pessoas não vão aceitar vir aqui”, lembra o apresentador. Mas por ser um grande apreciador do formato, Gentili insistiu até conseguir emplacar o “Agora é Tarde”. “Eu queria fazer porque enxerguei um espaço na TV para isso. Durante todo esse tempo só tinha o Jô Soares e, por algum motivo que desconheço, ninguém mais tentou fazer. Como fã, eu queria assistir uma outra opção e não tinha”. De forma tímida, o late night de Danilo Gentili estreou com exibição apenas duas vezes na semana. Meses depois, o programa já ia ao ar de terça a sexta-feira, dando uma média de quatro pontos no Ibope. 75


Rafinha Bastos entrevista Falcão no Agora é Tarde

Eu nunca tinha cogitado fazer sem ser da maneira que o Jô faz

PARA A INTERNET Mais do que “ameaçar” Jô Soares, Gentili mostrou que era possível fazer late night no Brasil de outra maneira. O sucesso do “Agora é Tarde” despertou o interesse de Rodrigo Fernandes para criar o próprio programa. Conhecido pelo seu blog “Jacaré Banguela” e por diversos vídeos que produz no Youtube, Rodrigo sempre gostou de talk shows. “Antes do Danilo estrear [na Band], eu fui em todos os pilotos que ele fez. Mas eu nunca tinha cogitado fazer [um talk show] sem ser da maneira que o Jô faz. O Danilo estreou, foi dando certo e pensei `agora dá para fazer`”, ele comenta. A partir de então, Rodrigo começou a produzir o “JB Fora do Ar”, seu programa de entrevistas para a Internet. “Eu queria fazer para a televisão, então fiz um piloto 76

primeiro, mas ficou muito ruim”. Ele fez mais alguns pilotos até achar o ideal. Levou para diversas emissoras, mas ainda não conseguiu o interesse de nenhuma. Quando tem algum patrocinador, produz o Fora do Ar para seu público online. Para inspiração, ele conta que assistiu muito ao Johnny Carson. “Ele tinha uma postura muito diferente da do Jô, se divertia com o convidado. Eu também tento ser descontraído com os meus, dou sempre muita risada e fico o tempo que quiser rindo”. Esse controle do tempo por Rodrigo é refletido em suas entrevistas, que ficam mais espontâneas e menos engessadas. Ele é seu próprio roteirista, produtor, diretor e editor. Toda essa liberdade é positiva, mas o blogueiro sente falta de uma equipe. “O programa só acontece se eu faço tudo. A vantagem


de estar na televisão é que tem uma equipe, que está se preocupando com todos os pontos. Eu, ao mesmo tempo que entrevisto o Maurício de Sousa, estou também me preocupando com todos os outros detalhes”, explica. NOVOS ARES No fim de 2013, Danilo Gentili assinou contrato com o SBT para seu novo late show “The Noite”. Levando grande parte da equipe do seu programa anterior, Gentili estreou em março de 2014 com bom índice de audiência. Alguns dias antes, Rafinha Bastos assumia o “Agora é Tarde”, totalmente reformulado, com novo elenco e novos quadros. “Quisemos começar três dias antes do Danilo, para a gente ser a novidade e não ele”, conta Gaston Marano, coordenador de conteúdo do “Agora é Tarde”. Polêmicas entre emissoras à parte, a ida de Gentili para o canal de Silvio Santos de fato surpreendeu muita gente. Quase tanto a escolha de dar um programa para Rafinha Bastos. “Ele tinha uma certa rejeição do público por uma piada que fez. Mas o Rafinha já tinha histórico na Band e na produtora [Cuatro Cabezas]. Foi uma boa escolha e foi natural, era o primeiro nome que aparecia na cabeça de todo mundo”, continua o produtor. A princípio, achava-se que Rafinha e Danilo iriam competir diretamente, deixando Jô Soares na liderança isolada da audiência. “Achávamos que competiríamos contra a Record. No final, acabamos competindo diretamente contra a Globo. O objetivo era consolidar o segundo lugar do SBT, mas acabamos consolidando a própria liderança com o ‘The Noite’”, diz Bruno Santa, produtor de Gentili. Os números comprovam o sucesso do “The Noite”: enquanto a Bandeirantes fica na média de dois pontos, SBT e Globo disputam o primeiro lugar no Ibope, ficando sempre na média de quatro pontos. A rivalidade entre Danilo e Jô Soares é mais acirrada porque seus programas começam quase no mesmo horário. Enquanto Rafinha Bastos encerra o “Agora é Tarde”, por volta da uma da madrugada, Jô Soares está entrando no ar e, na maioria dos dias da semana, Danilo Gentili também. “Hoje eu entendo que nosso trabalho é competir com o número um, que é a Globo, e não com os outros talk shows”, comenta o apresentador do SBT. 77


Rafinha Bastos apresenta o late night show Agora é Tarde

INSPIRAÇÕES E CRIAÇÕES

Rafinha Bastos tem o apoio de Marcelo Mansfield, único a não mudar de emissora com Gentili, a banda “Os Nerds”, comandada por André Abujamra e, fazendo os quadros de humor, Gustavo Mendes e Marco Gonçalves. “Esse é um diferencial dos programas brasileiros, já que nos talk shows gringos não têm elenco, mas têm convidados fixos, que sempre vão lá”, acrescenta Murilo. Para dar mais “nossa cara” ao formato americano, ambos os programas contam com esquetes e quadros humorísticos. Léo e Murilo comandam o “Cyberbullying” no “The Noite”, além de especiais protagonizados individualmente. No “Agora é Tarde”, Marco e Gustavo também têm momentos solo e o “Passou na TV” traz sempre um resumo do mais inusitado que aconteceu na grade aberta. Muitas ideias são importadas, como o “Mestre Mandou” de Gentili, baseado no estrangeiro “Impractical Jokers”, mas o conteúdo original é bem mais valorizado. “Nas primeiras reuniões que fizemos falamos de tentar copiar o menos possível e até fazer o contrário”, diz Bruno. Para o roteirista do “The Noite”, Rodrigo Frederico, seria muito fácil simplesmente copiar os quadros americanos, já que o público brasileiro não tem essa referência. “Quem

Tanto Jô Soares, como Danilo Gentili e Rafinha Bastos são fortemente inspirados nos late nights americanos. Jay Leno, Conan O’Brian, Jimmy Fallon, David Letermann, Jimmy Kimmel e o pioneiro Carson são alguns nomes referências para os brasileiros. Mas enquanto Jô segue à risca a receita tradicional, Gentili abriu espaço para a inovação no formato e, graças à isso, conseguiu dar uma identidade para os programas brasileiros. “O Jô Soares tem um cenário típico de talk show, mas o late night é mais do que a conversa”, explica o comediante. “É um programa de entrevistas que tem algo a mais. Um dia tem uma mesa com humoristas comentando as notícias da semana, no outro pode ter um quadro, como o ‘Mestre Mandou’. Desde o início, essa sempre foi minha visão de talk show e foi isso que tentei levar para o ‘Agora é Tarde’”. Uma característica marcante tanto do “The Noite” como do “Agora é Tarde” é o elenco. Danilo Gentili conta com os humoristas Léo Lins e Murilo Couto, o locutor Diguinho Coruja, a banda Ultraje a Rigor e a assistente de palco Juliana Oliveira. Já 78


Danilo Gentili entrevista Lucarelli e Lucão da seleção brasileira de vôlei.

contido por receio de atritos com a Band. Além disso, ele tinha a missão de readaptar todo um programa que tinha sido criado por outra pessoa. Para explorar mais o humor, Rafinha apostou em quadros diferentes com os convidados que, além de entrevista, participavam de jogos. “Hoje no ‘Agora é Tarde’ não tem mais essas brincadeiras porque o público não se identificou com aquilo”, comenta Rodrigo Fernandes. No primeiro semestre deste ano, Jô Soares ficou de licença médica por 45 dias e esse tempo deu mais vantagem para Danilo Gentili. Assumindo a liderança diversas vezes, o apresentador do SBT deixou para trás, além de seu concorrente da Bandeirantes, novos talk shows de outras emissoras que, mesmo passando a noite, não chegam a ser late nights e nem atrair o público conquistado por Gentili e Bastos. Mesmo que tivessem o mesmo formato, Danilo não enxergaria eles como concorrentes; prefere pensar que acertou. “Essa é a prova de que tudo aquilo que ouvi lá atrás, de que não daria certo e que ninguém se interessaria, estava errado. Se hoje está todo mundo tentando fazer isso, acho que eu que estava certo, né?”.

quer copiar, copia. Não digo que 100% de tudo fizemos é original porque não é, tem muita coisa que virou quadro a partir de coisas que vimos por aí”. Para ele, a maior dificuldade é inovar no conteúdo, mas diz sempre ter material para criar. “O lado bom é que trabalhamos com acontecimentos da semana, notícias importantes e fazemos piadas em cima de tudo isso”, finaliza. BOOM Para Gaston Marano, o sucesso dos novos talk shows no Brasil se deve aos apresentadores. “O boom do late night show atual tem a ver com o furor do stand-up. Isso e o gosto do público brasileiro por produtos norte-americanos”, explica. Danilo também acredita que o sucesso de um late night depende do apresentador. “Todos os talk shows têm o mesmo formato, mas é a personalidade de quem apresenta que define o programa. Se um talk show chega tão longe como o do Jô, a culpa é dele por ter dado tão certo”. Quando Rafinha Bastos assumiu o “Agora é Tarde”, muitos apontaram que o comediante estava 79


O vício na conectividade é algo cada vez mais comum nas salas de aula, ambiente de trabalho e na vida social no Brasil

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Ana Jones e Talita Mello

ense nesta cena: uma pessoa de cabeça baixa, com o celular na mão, encarando-o e teclando à velocidade da luz. É uma situação muito comum, certo? Facilmente vemos pessoas com a cabeça baixa encarando uma telinha brilhante. Não é raro isto em pontos de ônibus, no metrô, nas salas de aulas, em mesas nos bares e restaurantes, em casa no sofá, na cama antes de dormir. Tem gente que leva o celular até para o banheiro. Estamos cada vez mais conectados à Internet. Segundo dados do Ibope Media, somos 105 milhões de internautas no Brasil, o 5º país mais conectado. E este número vem crescendo nos últimos anos. O percentual de usuários conectados aumentou de 27% para 48% entre 2007 e 2011. Deste modo grande parte da população brasileira tem acesso à rede. Não só através de um computador ou laptop, mas principalmente através dos smartphones. De acordo com pesquisa da consultoria Nielsen três em cada dez brasileiros possui um smartphone. O acesso à internet pelos dispositivos móveis é facilitada já que as pessoas andam com seus aparelhos sempre por perto, ao seu alcance, interagindo em qualquer lugar a qualquer hora, a um toque está perto de todos os amigos, o que dá uma sensação ainda maior de intimidade com o aparelho. Hoje para conversar com os amigos basta um clique, o que é muito atrativo. Olhando de fora parecem engraçadas as cenas que do começo, absurdas. Porém, elas são tão comuns que passaram a ser triviais. Mas o que tem de tão interessante e atrativo neste aparelhinho que faz com que nós nunca os soltemos, ficamos encarando e checando a todo o momento? Isso é um vício? É uma doença? Quais os sintomas? Quais são os limites? Como esta nova situação vem interferindo em nossos relacionamentos, trabalho e estudos? Segundo o psicólogo Walter Lapa, ex-professor do Mackenzie, aposentado, o uso da internet de maneira compulsiva ocorre quando “o individuo vive numa grande ansiedade por recebimento de emails ou mensagens, tem obsessão pelo que está acontecendo na internet, principalmente redes sociais, troca atividades ou a vida social pela navegação”. Além disso, complementa dizendo que um sintoma que caracteriza o vício é a síndrome de abstinência, quando há um sofrimento pela privação. “A internet começa a se tornar um compulsão, um vício, e porque não dizer uma doença.”

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O ambiente escolar exige silêncio e atenção. Ao entrar em uma sala de aula do ensino fundamental ao superior os celulares estão sempre presentes. Teoricamente poderiam até facilitar o ensino já que ferramentas de busca simplificam o acesso a informação e pesquisa. Porém os alunos, durante as aulas pouco se interessam pelo conteúdo e pelo o que o professor está passando. Eduardo Nicoletti, 52 anos, professor na escola Universitário, vê o desinteresse dos alunos. Em sua sala de aula, 90 por cento dos alunos usam o celular, o que desestimula o professor, pois dá a sensação de que aqueles não estão interessados no que está sendo dito. Usar as redes sociais, mandar mensagens e tirar fotos são as práticas mais feitas pelos estudantes, que deixam de participar da aula. Alguns até tentam esconder, outros nem se dão ao trabalho. Porém, o uso dessa tecnologia vai além disso, como para colar nas provas. Tentam tirar foto da prova e mandar para colegas das outras salas. Para tentar impedir isso, Eduardo faz provas diferentes. Mesmo sendo proibido por lei, este equipamento eletrônico ainda é usado no horário de aula. Apesar dos males que o 81

celular e a conectividade trazem para a educação, é possível obter algo positivo disso. Misturar as aulas com a grande quantidade de recursos que a internet oferece, faz com que a aula se torne mais interessante. “O professor que acha que a lousa, o giz e livros vão ensinar os alunos deve repensar, deve mudar seu método de ensino, fazer aulas mais dinâmicas e fazendo o uso da internet, que vem crescendo muito de alguns anos para cá.”, diz Eduardo. Walter Lapa, psicólogo, relata que a conectividade pode interferir no processo de aprendizagem do aluno tanto positiva como negativamente. “A Internet se apresenta como uma ferramenta indispensável no ensino-aprendizagem da leitura e da escrita”, diz Walter. Porém, Lapa ressalta que o uso inadequado desse recurso pode trazer implicações no processo de aprendizado do aluno, pois quando este é “viciado”, encontra-se num estado patológico que o mantém em constante estado de tensão e estresse, por isso não consegue fazer uso adequado de seus recursos cognitivos. Leonardo Machado, 15 anos, estudante do segundo ano do ensino médio na Escola Estadual Professora Anésia


Loureiro Gama, está cercado pela conectividade. Ele possui um smartphone e sempre o tem à mão. Na escola não é diferente. Leonardo admite que utiliza o celular durante a aula, assim como seus amigos e colegas, porém, acredita que isso não interfere em seu aprendizado, pois não o usa durante as explicações dos professores. Além de mandar mensagens e usar a calculadora, Machado já usou o celular para colar, escondendo-o no estojo, sem que o professor percebesse. Mas ele diz que a maioria das pessoas não cola desse modo, por ser mais difícil. De

mais de 30 alunos na classe, apenas quatro estudantes não costumam utilizar esse equipamento na sala. Por passar quase dez horas na escola, esse é o local em que ele mais utiliza o equipamento eletrônico, lendo notícias, usando redes sociais. Nunca pensou em parar de utilizá-lo, pois isso se transformou em algo rotineiro, além de perder contato com amigos que não encontra frequentemente. O máximo de tempo que Leonardo conseguiu ficar sem o celular foi um dia. Ele se considera viciado em conectividade, mas não deixaria a internet ou o celular de lado.

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Leonardo Machado duplamente conectado pelo celular e computador


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ois problemas opostos acontecem no ambiente de trabalho em relação ao uso da internet. De um lado aqueles que no trabalho ficam conectados as redes sociais, ficam em sites e outros e perdem tempo de trabalho. De outro, aqueles que trabalham demais e usam a web como mais uma ferramenta de trabalho, assim fazem hora extra fora do trabalho. James Cícero, 55 anos, presidente da Givaudan Brasil, é um caso de quem trabalha demais por conta da web, internet, smartphones e as facilidades da conectividade. James relata que por conta da internet se trabalha mais, pelo contato às pessoas ser mais fácil e dinâmico. Dependendo da responsabilidade que se tem dentro de seu trabalho, é necessário ficar conectado, mesmo em fins de semana e férias. Por conta das pessoas usarem as redes sociais no meio do expediente de trabalho, James pensou em bloquear o acesso a esses sites, porém isso não se efetivou. Haveria insatisfação e há quem use as redes sociais para relacionamento profissional. O psicólogo Lapa fala 83

sobre a ergonomia: “é uma ciência que procura estudar as inf luências do trabalho sobre o comportamento das pessoas. O princípio da ergonomia é fazer com que o trabalho e as máquinas se adaptem ao homem, e não o contrário, mas infelizmente o que vemos é o mau uso dos recentes meios tecnológicos que transformam seus usuários em ‘viciados’.” Assim é cada vez mais difícil separar o pessoal do profissional, atrapalhando o rendimento da equipe. Outro extremo desta questão são as pessoas que usam a internet como ferramenta para o trabalho, mas estão tão envolvidos com ele que nas horas de descanso fazem hora extra em casa via web. Muitos não conseguem se desligar das preocupações no trabalho nem nas férias, e não deixam de checar o email da empresa, falar com os funcionários, e continuam trabalhando neste período. Usando os smartphones e a conectividade como ferramenta para facilitar esta comunicação exagerada com a empresa. “Estar permanentemente conectado ao trabalho pelo uso de dispositivos móveis, como notebooks e smartphones, torna a


Crédito-Ana Jones

cada dia mais difícil separar a jornada de trabalho do restante dos momentos que deveriam ser de descanso e, consequentemente, aumenta os níveis de estresse.”, explica Lapa sobre esta questão. Isto pode chegar a um ponto onde o rendimento desta pessoa seja comprometido, por questões de saúde emocional e física, pois o desgaste é muito grande. Domingos Zamberlan, 43 anos, gerente de sistemas do McDonald´s, se considera viciado no trabalho. Ele costuma chegar ao escritório por volta das 9h da manhã e sai as 19h, porém, trabalha muito além desse período. Às 6h30, quando acorda, já checa os emails recebidos durante a noite, verifica a agenda e programa as atividades do dia. À noite, mesmo fora do escritório, Domingos segue trabalhando até às 21h checando os emails novamente e avaliando relatórios. Zamberlan diz estar conectado 24 horas por dia, até mesmo em casa. “Estou 100% conectado a programas de mensagens instantâneas (Whatsapp), rede social corporativa (Yammer), aplicativos de conexão remota e também ligações telefônicas.”, diz Domingos. Já que trabalha na área de tecnologia da informação, incidentes durante a madrugada ou em finais de semana podem ocorrer, assim, Domingos precisa estar sempre conectado para resolvê-los.

Domingos Zamberlan trabalha em sua casa pelo celular e computador 84


Hospital para dependentes Responsáveis pelo projeto do Hospital das Clínicas explicam o drama e o tratamento desta doença A psicóloga clínica Sylvia Van Enck, especialista em terapia de família e casal e terapeuta comunitária no Hospital das Clinicas, conta que o projeto do hospital começou em 2006 com grupos de estudos e em 2007 a equipe se consolidou. O trabalho realizado pelo hospital é feito tanto com adolescentes quanto com adultos, porém, em grupos separados. Paralelamente, há um trabalho feito com os pais dos adolescentes para trabalhar seu psicológico. Ela conta que normalmente quem vem pedir ajuda, já desesperados são esses pais. Cornélia B.Martini, psicóloga clínica, especialista nos transtornos do controle dos impulsos no Hospital das Clínicas diz que muitos pais, angustiados, procuram tratamento para seus filhos pois estes deixam de lado a higiene, sua vida social, o que atrapalha a rotina do dia a dia. Até mesmo, no casos dos adultos, quem procura ajuda são os pais ou familiares. Eles se sentem culpados pela situação do filho, pois de algum modo incentivaram esse vício, seja

com equipamentos, permitir comer fast-foods enquanto usam o computador e não dar limites ao uso do equipamento. Muitas vezes os pacientes são estimulados pela família ao uso das tecnologias, pois os pais são de uma geração que não está acostumada com tanta tecnologia e não percebem o mal que podem estar fazendo a seus filhos. Sylvia explica que o prejuízo, não só para a saúde mental e a sociabilidade, mas também para a física. Há a questão de obesidade, anorexia, problemas de visão e falta de cuidados básicos de higiene, pois muitos fazem suas necessidades dentro do quarto para não sairem de perto do computador.

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A psicóloga Van Enck diz que muitos dos pacientes são encaminhados para a terapia e retornam para serem avaliados, em que estágio se encontram, depois são direcionados para grupos e os atendimentos são quinzenais. Vários quadros podem vir acompanhados de depressão ou fobia social. Há casos em que é necessário o tratamento com medicamentos prescritos pelo psiquiatra. A maioria é viciada em jogos online e no caso de a pessoa ter que parar de jogar, há punições por parte dos grupos de jogadores, às vezes monetárias ou perder posições no ranking do jogo, o que contribui para o fato de não quererem parar de jogar. Sobre as reações apresentadas pelos compulsivos, ela conta que a agressividade é grande “chegando a casos de agressões com cadeiras e facas contra os pais”. A compulsão chega ao extremo de muitos ameaçarem suicídio por causa da privação. E “assim como os viciados em drogas e álcool, eles também não admitem o vício. Dizem poder parar quando quiserem”.


DEPENDêNCIA Por Bruna Matos e Tatiana Venturacci

De acordo com uma pesquisa realizada através do painel online da Conactai, pelo Ibope, 95% dos jovens brasileiros entre 15 e 33 anos se consideram viciados em tecnologia. Todos que se classificam como dependentes usam o Facebook. O Whatsapp está presente no dia a dia de 63% dos jovens, e o Instagram é usado por 59%. Essa dependência é analizada pela psicologia comportamental, que como o próprio nome já diz, estuda o comportamento e estado fisiológico das pessoas, um dos ramos da área que afirma que o vício é desencadeado a partir de uma relação entre o estímulo e o prazer químico, que era desencadeada por um reforço ou ainda, uma questão meramente biológica.

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uem nunca ficou, naquele dia sem nada para fazer assistindo séries de televisão, no celular ou na internet? Os vícios modernos são as dependências que mais estão presentes na população, entre eles estão o vício pela internet, pelo celular e por séries de televisão. O uso da tecnologia pode ser considerado a salvação dos tempos atuais. Tanto para facilitar as pesquisas, quanto para salvar do ócio naquele dia que “não estou afim de sair de casa”. Os casos pela compulsão por internet crescem rapidamente, devido ao fato de cada vez mais pessoas se conectarem e a cada ano a tecnologia se tornar mais atrativa e versátil.

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Nem sempre virtudes A todo o momento novas pessoas se ligam à rede, e novos atrativos são criados para que elas permaneçam conectadas. A partir do momento em que a vida pessoal, profissional e sentimental é afetada pelo exagero de tempo usado para ficar navegando, é diagnosticado como um caso de internet-dependência. Em São Paulo, uma pesquisa feita no Hospital das Clínicas aponta que cerca de oito milhões de pessoas apresentam quadros relacionados à dependência da tecnologia. Ou seja, aproximadamente 4% da população brasileira está ligada a alguma doença relacionada as tecnologias. Existem casos de “viciados em tecnologia” que morreram por permanecerem tempo demais

na frente do computador. Isso se deve ao fato de haver certas doenças que se desenvolvem pela permanência em uma determinada posição. Não somente o corpo sofre com o uso imprudente das novas tecnologias, mas também a mente. A psicóloga Leila Dias acredita que diferenciar o abuso de utilização da rede e o uso para trabalho é necessário. A especialista estima que 10% dos internautas brasileiros acessam a internet de forma excessiva. “Na prática, cerca de 4% dos internautas brasileiros apresentam sintomas do vício à web”, ressalta.

Não tira o olho da internet Passar horas do dia em frente ao computador navegando pela internet, enviando e-mails, comprado online ou jogando são sinais de um “ciberviciado”. A psicóloga Leila Dias 88

diz que além de danos físicos, o vício aqui tratado é considerado um problema psiquiátrico. Ela comenta que aparecem sintomas da doença como a preocupação de estar sempre conectado e “antenado”, mentir sobre o tempo que passa navegando e isolamento social. João Ribeiro conta que antes de entrar na faculdade era viciado em videogame e internet. “Eu estou limpo há sete semanas” - brinca – “antes eu nem saia de casa direito, adorava passar meu tempo livre descendo a barra do Facebook”. O estudante diz que, a partir do momento que percebeu que passava muito tempo na internet, e que isso afetaria em sua vida acadêmica, começou a se policiar. “Agora só pra fazer trabalho. Mas, sempre dá pra dar aquela fugidinha”. Segundo Leila, essa dependência provem do prazer temporário, causando a perda da autoestima, o que causa um ciclo vicioso. “Se o padrão de uso da internet por alguém interfere em sua vida pessoal ou em suas relações de trabalho, essa pessoa deve procurar ajuda”. Casos de infidelidade virtual são outro problema tratado no consultório da psicóloga Dias. Para Margaret Simas, Psicóloga Clinica, Psicanalista e Ludoterapeuta (atendimento


Celular sempre na mão

de adulto, adolescente, criança, família e casal), os viciados em internet tendem a ter outros problemas psiquiátricos, como a depressão e ansiedade, ou até mesmo enfrentar problemas familiares. A psicóloga também diz que esse vício geralmente vem acompanhado de outros vícios, como em sexo, álcool e tabaco.

Viciada por série

Rafaella Francesconi Mazetto, 18 anos, estudante de engenharia de automação e controle no Centro Universitário, da FEI, conta que começou o seu vício por séries com 11 anos. “ Comecei a assistir E.R. com minha mãe, quando estava na 6ª série e piorou no 9º ano, com a estreia de The Vampire Diaries”.

Apesar de estudar engenharia e trabalhar em um projeto na faculdade, Rafaella não parou com suas séries, apenas as adapta de acordo com a sua rotina. “Na FEI, além de estudar engenharia também trabalho no projeto FEI AeroDesign. Esse ano, chego em casa de segunda a sexta às nove horas da noite. Costumo assistir uma série por dia, a medida que os episódios são disponibilizados. Aos finais de semana costumo assistir séries sábado a noite por 3 ou 4 horas”. Muito além de uma novela, as séries possuem mais profundidade e envolvem mais o telespectador. Com a disponibilidade cada vez maior com a internet, fica muito mais fácil assistir na hora que você quiser. Sua ligação com séries é tão grande que no momento Rafaella assiste 24 séries e conta qual foi a sua finalizada em tempo recorde. “Assisti oito temporadas de Bones em uma semana”, finaliza.

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A “nomofobia”, como é conhecida a angústia gerada pela incapacidade de ficar sem o celular, é proporcionalmente aumentada na media que os smartphones tornam-se populares. Rafael Ventura, 24 anos, analista de inteligência de mercado, não desgruda do celular. “Passo umas nove horas por dia nele”. Além de utilizá-lo como complemento do trabalho, o aparelho também é utilizado para jogos e é claro, comunicação. Não só um usuário assíduo, Rafael é apaixonado por tecnologia e sempre pesquisa aparelhos novos de celular para trocar quando o novo se mostra melhor que o seu atual. “ Não consigo me controlar. Adoro estar por dentro dos novos aparelhos e sempre pesquisar qual é o melhor, por isso troco de celular de ano em ano”. Apesar das inúmeras possibilidades que um aparelho móvel oferece, Rafael permanece no aplicativo mais utilizado no mundo: “ Não adianta, o que eu passo mais tempo é no Whatsapp”, conta com uma voz risonha.


‘‘Na prática, cerca de 4% dos internautas brasileiros apresentam sintomas do vício à web’’

Farinha do mesmo saco Comer, viajar, fofocar. Coisas comuns que irmãs compartilham, mas as irmãs Joana e Catarina Garcia gostam de compartilhar seus vícios. Catarina, chefe de cozinha, 22 anos, como irmã mais velha, introduziu o mundo tecnológico no dia a dia das duas. “Eu sempre amei séries, sou viciada desde Everybody hates Cris até Lost”, diz Catarina, já olhando para o relógio pra ter certeza de que nao perderia um episódio de Masterchef. “Eu comecei vendo Smallvile e Lost. Então apresentei Kyle para a Jojo, e agora somos parceiras de

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crime” diz Catarina, rindo ao se lembrar do fato. A estudante Joana Garcia diz que apesar de gostar muito de séries, seu vício principal é o uso do celular. “No meu celular eu posso ver as séries que a Catal me apresenta também “, diz olhando para a irmã mais velha. Joana percebeu que estava exagerando no uso de seu smartphone a partir do momento em que seu rendimento escolar abaixou. Ela agradece por essa tecnologia, pois assim ela conheceu pessoas com o mesmo interesse dela através das redes sociais. “Não acho que seja errado eu gostar de ficar com meu celular o tempo todo, mas agora que eu vou


prestar vestibular é melhor eu dar uma segurada no tempo e me dedicar mais”, encerra com um ar alegre (e mexendo no celular). Junto com a tecnologia veio a aproximação com a família. Por conta da diferença da idade, a comunicação era algo raro, mas agora com esses interesses em comum, elas passam mais tempo uma com a outra e em contato com primos distantes. “Como eu e a Jojo agora conseguimos nos comunicar a qualquer momento, nós pesquisamos várias viagens para fazer junto com os primos”, conta Catarina. As irmãs conseguiram lidar com os problemas juntas. “Quando a Catal passava por alguma discriminação por ser homossexual ou por seu peso, eu me aprofundava sobre o assunto com pesquisas no Google e em grupos da internet para entender

melhor a cabeça da minha irmã. Hoje somos tão próximas que duvido que teríamos conseguido sem a internet”.

O problema pode ser contido Para as pessoas que possuem esse vício, o Hospital das Clínicas abriu um espaço especial para esses dependentes. O projeto começou em 2006 e a equipe se consolidou em 2007, trabalhando com adolescentes e adultos. “Em relação aos jovem, o trabalho com os pais é fundamental”, comenta a psicóloga clínica, especialista nos transtornos do controle do impulso, Silvia Van Ench. A psicóloga ressalta que a procura vem aumentado muito nesses últimos anos e em relação 91

aos adolescentes e crianças e o foco deve ser nos pais. “ Os pais ficam angustiados porque os filhos deixam sua vida social de lado, é um trabalho que exige paciência”. Os pais muitas vezes são os responsáveis por esse vício, por ser uma novidade para eles, encaram como algo bom para os filhos. ‘’ Os pais ficam codependentes, pois estimulam e propiciam o conforto para o filho jogar e usar a internet’’. Silvia conta que inicialmente a pessoa passa por uma entrevista inicial para ver seu estágio da dependência, com o acompanhamento psiquiátrico e psicológico e depois é encaminhado para grupos atendidos quinzenalmente. “ O trabalho em grupo é importante porque ficaram afastados da vida social por muito tempo”. Alguns vícios podem vir com quadros de depressão e fobia social, além de alguns dependentes se tornarem anoréxicos ou obesos, por isso um tratamento específico é necessário, na maioria das vezes essa praxe envolve outras doenças juntas. O vício pela tecnologia não pode ser resolvido, mas com muita paciência o quadro pode ser revertido e controlado. Após a terapia Silvia conta que é muito legal quando as pessoas já tratadas retomam atividades que deixaram para trás e percebem que são coisas positivas. “O tratamento é para saber como usar a tecnologia e não para parar de usar”, finaliza Silvia.


Em busca da cultura perdida Da periferia às raízes africanas, as manifestações culturais marginais ganham espaço Texto por Pedro Balciunas | Fotos e colaboração de Débora Fernandes

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e olharmos para a cidade em que vivemos provavelmente não conseguiremos enxergar as muitas cidades que existem dentro dela. Acreditar que existe apenas uma concepção de mundo – aquela com a qual se está acostumado – também não é aconselhável, como a própria história mostrou e como continua sendo escrita. A chance de frustração é grande e a partir dela podem nascer noções equivocadas de compreensão dessa nova cultura. O resultado: preconceito. Um povo que não é apegado às suas raízes, que não cuida de seu patrimônio histórico, corre o risco do desaparecimento cultural. É intrigante imaginar que uma cidade como São Paulo, dita moderna e atual por seus conterrâneos, seja extremamente conservadora em termos e noções artísticas. A culpa não é somente dos paulistas e é recorrente no mundo inteiro. Animal dotado de pré-jul-

gamentos, o ser humano como produtor e crítico de arte sempre sentenciou o que pode ser considerado bom e o que deve ser considerado ruim. Sempre decidiu o que merece estar em uma grande galeria de arte e o que não é digno sequer de ser descoberto, estudado e respeitado. Com a música não foi, e nem é, diferente. Quando o Brasil vivia uma ferrenha ditadura militar e era melhor não ter uma opinião do que tê-la e guardá-la para si, a valorização da cultura estrangeira pela população brasileira se acentuou. Claro, não é possível generalizar, mas a grande massa de jovens classe média e média-alta do país - hoje já pais e mães - conviviam muito mais com músicas norte-americanas do que com a produção nacional quase inexistente nas rádios. Tal fato é explicável. Os principais artistas brasileiros estavam exilados ou censurados, além do sucateamento das rá-

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dios AM – de maior alcance, o que representava um perigo para os militares –, e do incentivo ao desenvolvimento das rádios FM – com melhor qualidade para a música e menor alcance – seria normal essa preferência. O problema ainda persiste mesmo após quase 30 anos do fim do Regime Militar. Como incentivo, o governo federal aprovou em 2011 a Lei da TV Paga, que estipula três horas e meia por semana de programação nacional. Mesmo que esse percentual seja mínimo, o avanço poderia ter sido arquivado, tal como o projeto de lei de 1414/2003 que estipulava o mínimo de 50% de música nacional nas rádios. Não é à toa que manifestações culturais consideradas marginais estejam ganhando força e espaço. É importante ressaltar que a marginalidade citada não é somente geográfica, mas também no circuito intelectual e acadêmico.


Retomada A cultura do hip-hop desceu os morros, deixou as periferias paulistanas para chegar ao “asfalto”. O mesmo aconteceu com o funk e com o próprio samba, no passado, se recorrermos à história. Quem encampou o passeio foi a 31ª Bienal de Arte, cujo tema não poderia ser mais propício para os coletivos artísticos que buscam espaço para mostrar seu trabalho. Não é de se espantar. O prédio idealizado por Oscar Niemeyer e financiado pelo mecenas Ciccilo Matarazzo e por sua esposa Iolanda Penteado é fruto de um modernismo tardio e sinônimo da subversão artística num estado que se traveste da mudança, mas continua conservador e reacionário como nos anos da 94

Revolução Constitucionalista. Um desses coletivos é o A.L.M.A (Arma Lírica Musical da Alma). Apesar do significado da sigla, os idealizadores Lucas Félix e Wendel da Silva Reis deixam bem claro que o título é subjetivo. “Preferimos deixar o público interpretar como quiser”, expõe Félix. Para ele, o hip-hop é uma porta de entrada ao jovem que se interessa por arte. “É um canal para adquirir cultura”, confirma. Citando movimentos de vanguarda, como o surrealismo, Lucas, que é estudante de Rádio e TV na FMU, defende a cultura do hip-hop como forma de enriquecimento cultural. Aos 21 anos, Lucas confessa que somente em 2012 passou


a ter contato profissional com o rap, um dos quatro elementos da cultura hip-hop – os outros são o DJ (Disc Jocquéy - música), o grafitti (pintura) e o B-boy (ou B-girl, na dança). Desde 2009, porém, que sua figura morena e magra frequenta os eventos como a Sexta Freak, na Consolação e a Rinha dos MC’s, no Metrô Santa Cruz. A Rinha dos MC’s, aliás, é um dos mais famosos eventos de hip-hop na cidade de São Paulo. O nome não abre margem para muitas suposições: são jovens que, através de rimas, tentam ganhar a disputa, que pode ser de dois tipos (ver box). Tratar de coisas que não existem é desafiador. A 31ª Bienal de Arte, porém, se mostrou capaz de discutir um tema tão complexo. No momento em que a periferia, preta e marginalizada cantou com suas rimas, suas denúncias e suas críticas,

a “elite” artística que estava em excursão por ali parou de pé para acompanhar – alguns inclusive já estavam sentados. A quantidade de aplausos não só mostrou o valor dessa manifestação; Eles legitimaram o que Lucas Félix chama de um novo “jeito de fazer poesia”. Se o hip-hop chega, na maioria das vezes, com seu tom de denúncia do descaso, há outros movimentos também presentes nesta edição da Bienal que buscam a reconciliação com as raízes culturais. É o caso de um grupo de índios guaranis – que fez curta apresentação de cantos e danças com crianças - e da Comunidade Cultural Sambaqui, comandada por Rosângela Macedo, de 44 anos. Com bumbos e tambores, Rosângela puxa na voz os sambas embalados pelos batuques afropaulistas. O objetivo da comunidade, segundo Rosângela,

é a “manutenção da cultura tradicional”, como o jongo, o batuque de umbigada, o samba lenço e o samba de bumbo, dentre outros. No entanto, o coletivo busca outros elementos, não somente o canto e a dança. A referência ao sitio arqueológico do Sambaqui, que data culturas brasileiras de até 10 mil anos atrás, deixa claro as intenções da comunidade. “Não se trata apenas de um grupo de representação. Buscamos contato permanente com a cultura”, frisou Rosângela. Ela lamenta que as três últimas gerações passaram sem conhecer a nuance africana de nossa cultura. O motivo principal: o êxodo para os grandes centros urbanos, como São Paulo. “A loucura que é se readaptar em São Paulo...”, as reticências de Rosângela explicam mais que qualquer palavra. Quem mora aqui sabe.

Um pouco da cultura hip hop As batalhas de rimas de MC’s (Mestre de Cerimônia) podem ser de dois tipos: a batalha de temas e a batalha de sangue. Na primeira, a plateia normalmente sugere um tema para que os MC’s formulem seu raciocionío. Já na batalha de sangue, a intenção é atacar - somente com rimas - o adversário. O vencedor é decidido pelos gritos e aplausos da plateia. Surgido nos suburbios de Nova York durante os anos 1970, o hip-hop se popularizou no Brasil a partir da década de 80.

Conheça, acompanhe, participe! Rinha dos MC’s - https://www.facebook.com/RinhaDosMcs?fref=ts A.L.M.A - https://www.facebook.com/almacoletivo?fref=ts Grupo Sambaqui - https://www.facebook.com/grupo.sambaqui?fref=ts U.C.R.A.N - http://www.ucran.com.br/

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Preconceito e democratização da mídia “Quando dá dinheiro, a mídia abre a porta”, enfatiza Lucas Félix. Tanto para ele, como para Wendel, o WNL como é chamado artisticamente, o rap tem se desenvolvido e ganhado espaço no país. A presença na mídia, porém, continua vinculada à interesses capitalistas e não culturais. A abertura da Bienal para manifestações artísticas marginalizadas e desconhecidas representa um avanço para a cultura social, porém, o preconceito que ainda se manifesta continua forte. A mídia tem papel decisivo nisso, já que não se abre para promover o debate da inclusão. Uma das lutas desses coletivos marginalizados é por espaço na esfera pública – o que contribuiria para o conhecimento e para a preservação e difusão cultural. Para Amanda Ferreira, produtora da Rinha dos MC’s, a importância da presença do hip-hop na Bienal como cultura não incluída no circuito da arte é algo importante. “Quando você transpõe esse contexto pra um ambiente como o da bienal você acaba extrapolando essas fronteiras”, provocou. Ela destaca também a importância da troca de pontos de vista, pois como sugere o próprio tema da Bienal, o que “não existe” pode ser apenas algo desconhecido. “Às vezes a gente não sabe o que está acontecendo em outros lugares, por isso a troca é importante”, reforçou Amanda. Uma cultura já consolidada em grandes centros urbanos do Sudeste é a nordestina. Quem fala sobre isso é o paraibano e repentista Sebastião Marinho, que usa a viola para fazer suas rimas – sempre em sextilhas. Morador de São Paulo desde 1977, ele conta que se frustrou ao chegar à cidade que nunca para. “Pensei que fosse mais bonita”, confessa ele, lembrando do cinza que ainda hoje domina São Paulo. Os tempos eram outros também. Em uma ditadura militar – já capengando – o preconceito, segundo ele, era bem maior. Ofensas como “cabeça chata” eram frequentes, assim como a truculência da polícia. “Isso não são artistas, são uns vagabundos”, relembrou Sebastião sobre a fala de um dos guardas que, em certa ocasião, levou o grupo de repentistas para uma delegacia por se apresentarem num bar da cidade. 96


Foi dessa necessidade de preservar a cultura do nordeste em São Paulo que surgiu a U.C.R.A.N (União dos Cordelistas, Repentistas e Apologistas do Nordeste). Com a viola em mãos e o chapéu de couro na cabeça – “um símbolo do homem do campo nordestino” – Sebastião dá certeza de que, mesmo com as manifestações de ódio contra nordestinos, a coisa era muito pior. “A cultura de São Paulo é híbrida, toda misturada. Preconceito hoje é uma bobagem. Não faz sentido”, resumiu enquanto dedilhava as cordas da viola. Gabriela de Brito Vieira, a Gabi, de 19 anos, “começou a batalhar” na Sexta Freak da Avenida Paulista. Moradora do Jabaquara, Gabi é das poucas meninas que participam das batalhas. “Preconceito no começo você ganha, ninguém nunca te viu rimando”. Apesar disso, ela não acredita em discriminação, mas em insegurança tanto dos homens quanto das próprias mulheres. Por conta de ser uma disputa solo, onde há troca de

ideias, Gabi diz que alguns homens podem ter receio de rimar com uma mulher e serem machistas. Ela minimiza a questão e diz que tem mais a ver com a qualidade da rima. “A mina rima bem e mostra seu valor”, opinou com sorriso no rosto. Rosângela, da comunidade Sambaqui, também crê na importância da mídia para a recuperação da cultura popular nas cidades, mas com um olhar que não a transforme em produto “Pra gente não interessa que vire uma moda”, deixa claro Rosângela. Com seus cantos, o Sambaqui transmite o sentimento pela falta das festas populares. As letras simples, como a dedicada a São Benedito, padroeiro dos cozinheiros, é uma das formas de refletir um caminho para a reconciliação com a cultura popular brasileira. Em outra letra, costumes do homem do campo, inimagináveis para o ritmo de vida paulistano: “Oh, mãe, cadê o Zé? Oh, mãe cadê o Zé? Tá sentado no toco cheirando rapé, ta sentado no toco cheirando rapé...”

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“Uma das lutas desses coletivos marginalizados é por espaço na esfera pública – o que contribuiria para o conhecimento e para a preservação e difusão cultural ”


Nina Teodoro na sala do Castelo 98


O BUM do Castelo O Museu da Imagem e do Som comemora os 20 anos do Castelo Rá-Tim-Bum Camila Rolim - Texto Letícia Gamero - Fotos

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m um dos bairros mais luxuosos de São Paulo, na Av. Europa, está localizado o MIS (Museu da Imagem e do Som). Já abrigou exposições de figuras reconhecidas mundialmente, como Stanley Kubrick e David Bowie. Mas, dessa vez, a ideia de André Sturm – diretor do Museu - foi de mostrar ao público paulistano que o Brasil também produz obras dignas de estarem em um museu interativo como este. O Castelo Rá-Tim-Bum, transmitido pela TV Cultura entre 1994 e 1997, foi o escolhido para se instalar no terreno do MIS em comemoração aos 20 anos do programa. Depois de David Bowie movimentar quase 85 mil ingressos na bilheteria, não se imaginava que o Castelo seria o novo recorde de público e a futura exposição mais falada na cidade. Sucesso total entre o público infanto-juvenil, o programa com certeza deixou milhares de admiradores, que desde o dia 16 de julho, fazem filas enormes para poder visitar o espaço em que Nino, Zeca, Biba, Pedro, Dr. Victor, Morgana e Celeste viveram diversas histórias. As filas logo na estreia eram quilométricas. Pessoas chegavam a ficar 3 horas na fila, sem saber se entrariam ou não. Com esse ponto negativo, a organização do museu montou um esquema para que as pessoas gastem apenas 10 segundos na bilheteria, e comprem seu ingresso para um horário específico para a visitação. Dessa forma, o público fica livre para sair e voltar para a fila de entrada minutos antes de seu horário. Ingressos online são liberados somente para os sábados, e são disputadíssimos, acabando num piscar de olhos!

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Família Marconeli, após a visita ao Castelo

Pode-se dizer que o público dessa exposição, diferentemente das anteriores do MIS, reúne várias gerações. Famílias se reúnem para apreciar a história que fez ou ainda faz parte de suas vidas. É o caso de Fabrícia Eugênia de Souza, 37 anos, que mora no interior de São Paulo, e entre os compromissos que tinha na capital, se organizou para poder visitar a exposição. Ela confessa que mesmo não tendo assistido muita televisão em sua infância, tem boas memórias do Castelo Rá-Tim-Bum. Com sua filha de 2

anos no colo, ela conta que seu interesse na visita foi mais pela pequena: “O que acho legal de levá-la nessa idade para esse tipo de evento é para criar o hábito de frequentar museus, e introduzi-la nesse tipo de entretenimento, que eu acho bastante produtiva para o desenvolvimento da criança”. Na entrada do Castelo, quem nos recebe é o porteiro mais famoso da televisão brasileira. Sua recepção é encantadora, nos fazendo ficar mais ansiosos ainda para os dois andares de ex100

posição Após a passagem pelo Porteiro, quadros nas paredes mostram os primeiros roteiros originais escritos. E sem mais delongas, o personagem Nino já está nos esperando – em um holograma de tamanho real - dando boas-vindas e contando o que encontraremos ao entrar em sua casa. Setas vão indicando o caminho da próxima sala. Vamos passando pelas cortinas pretas, brancas e coloridas. Descobrindo a cada sala algo novo, que desperta atenção e lembranças que por ventura se perderam com o passar dos anos. Bastante interativa, a biblioteca é recheada de livros pelo chão e pelas paredes. Alguns até se movem. Muitos objetos são originais do acervo da TV Cultura, trazendo ainda mais realidade aos espaços. É claro que os personagens estão em toda parte! O Gato Pintado está nesse espaço, podendo ser visto de pertinho. Todos têm uma riqueza de detalhes admirável, nos fazendo em alguns momentos esquecer que alguns deles não podem ser tocados ou pisados. Continuando a visita, a próxima sala é o laboratório dos cientistas malucos Tíbio e Perônio, com diversos objetos que faziam parte do universo dos personagens. Buscando sempre interatividade e sonoridade, o famoso bordão do Dr. Victor “Raios e Trovões!” é ouvido de longe na próxima sala. Se você não estiver ligado é um susto garantido!


A monitora Larissa Kitagawa conta que “por incrível que pareça, as crianças são mais comportadas do que os adultos! A gente vê muitas crianças dando bronca nos pais quando eles tocam nos objetos que têm a mão vermelha” - Foram colocadas placas para mostrar que o objeto não pode ser tocado ou pisado, com o cuidado de não estragar nenhum peça original - “Mas eu entendo a comoção de todos, porque como o Castelo fez parte da nossa infância, acabamos esquecendo as regras por conta da empolgação”. Larissa explica que a maioria do público é adulto, na faixa dos 20/30 anos, mas que algumas crianças mais novas acompanharam o Castelo Rá-Tim-Bum ou pela própria TV Cultura, ou pela TV Rá-Tim-Bum, então algumas chegam e já conhecem todos os personagens. Apesar de muitos visitantes terem realmente acompanhado o programa, ela conta que “existem algumas pessoas sim que nós percebemos que vêm visitar só porque a exposição está Larissa Kitagawa na biblioteca do Dr. Victor famosa, e não porque conhecem e gostam do programa”. A próxima sala é dos personagens Mau e Godofredo. Um espaço com o chão interativo, nos dando receio de pisar em baratas virtuais. Para aqueles que querem relembrar alguns episódios do Castelo, o MIS colocou diversos deles em televisões espalhadas, com cadeiras e sofás, para você se sentir em casa. Em um clima psicodélico, a sala do Etevaldo é bem maluca! Jogo de luzes nos fazem sentir de fato no espaço sideral. Temos que andar em uma plataforma que balança, é emocionante! A visitante Samantha, acompanhada de seu marido e filhos, contou que quando os meninos eram bem pequenos, já colocava o Castelo para eles assistirem. “Foi uma novidade para eles poderem estar nos espaços que os personagens viviam. Estamos adorando a exposição, e sei que tem muitas coisas boas até o fim!” A sala principal conta com a árvore, o sofá, o quarto do Nino, a cozinha, e o famoso banco giratório, onde os visitantes podem ter a experiência de rodar que nunca pensaram poder ter antes.

Grupo de amigos em torno da Celeste 101


A visitante Luciana Amaral, 22 anos, disse que achou impecável a produção. “Desde a parte do roteiro, é tudo maravilhoso. Poder tocar nas coisas também... O quarto do Nino, nossa! Estou realizada! Demorei vinte e dois anos para realizar meu sonho, que é rodar no quarto do Nino”. Os figurinos originais dos personagens estão em manequins, chamando muito a atenção do público. A visitante Ana Clara Nadin diz que “ver todos os figurinos originais é bastante empolgante, saber que o que estava na minha televisão está agora na minha frente”. Ao perguntarmos qual foi seu personagem favorito, Ana disse que era uma pergunta muito difícil, já que gostava de todos. Depois de pensar por uns minutos, a personagem Morgana foi a escolhida: “Por toda a vivência que ela teve, as histórias que ela conta, todo o seu jeito maternal... Vejo ela como uma pessoa muito sábia e interessante”.

Após todas as salas visitadas, muitas fotos e ‘selfies’ tiradas, o público sai muito satisfeito com tudo o que presenciou. Fernanda Marconeli, 32 anos, levou seus filhos e disse que a exposição superou suas expectativas. “Trouxe meus filhos à exposição porque o Castelo fez parte da minha infância e eu quis mostrar para eles um pouco do que eu assistia quando era pequena. Eles gostaram muito! O Felipe (o mais velho) já assistiu o programa, e ele adorou ver pessoalmente o que via na televisão”. Os fãs do programa não podem perder a emocionante visita ao Castelo Rá-Tim-Bum, no MIS. É uma forma indescritível de ver de perto tudo o que foi assistido durante anos na televisão ou no videocassete, e se sentir anestesiado ao tocar e pisar onde os personagens já estiveram.

Falando com Biba Cynthia Rachel fala sobre a personagem que marcou sua carreira

Como você foi parar no Castelo Rá-Tim-Bum? Eu já trabalhava num programa da TV Cultura chamado O Professor, e estavam fazendo testes para o Castelo. O diretor me viu nos corredores e me chamou pra participar. Fiz o teste meio escondido do diretor do meu programa, mas deu tudo certo. Qual foi a importância da Biba na sua trajetória? É um personagem que nunca vou esquecer, é maravilhoso ainda ser lembrada por ele, fico muito feliz de ter feito parte da infância das pessoas. Havia semelhanças entre você e a personagem? Como lidava com o tamanho sucesso do programa na época? Havia algumas sim! Eu sempre fui do grupinho dos meninos, por exemplo (risos). Teve uma época que o assédio era bem grande mesmo, a gente evitava de ir em alguns lugares, essas coisas, mas como trabalho nisso desde muito nova, consegui lidar de uma maneira tranquila. O que você achou da ideia de reunir em uma exposição a vida do Castelo Rá Tim Bum para que os fãs e integrantes desse projeto, como você possam relembrar? Eu achei fantástico! Nunca imaginei que isso fosse acontecer um dia. Fiquei feliz, pois o programa merecia uma homenagem assim!

O casal Laura Nishi e Theo Fernandes em visita á casa do Nino 102


Como o Castelo surgiu no MIS André Sturm, diretor do Museu, conta como a ideia da exposição aconteceu

Como surgiu a ideia da exposição? Surgiu em junho/julho do ano passado, quando já estávamos trabalhando na exposição do Stanley Kublick e do David Bowie, e eu queria fazer alguma exposição que fosse ligada à cultura do Brasil de alguma maneira. Fiquei pensando em temas, e uma das pessoas da minha equipe comentou que esse ano fazia 20 anos do Castelo Rá-Tim-Bum. Eu achei que esse seria um bom tema, e começamos a trabalhar nesse projeto. Entramos em contato com a TV Cultura para pedir autorização para eles, mas a exposição foi toda feita por nós. Eles emprestaram objetos originais e figurinos, e alguns deles estavam deteriorados, então nós os restauramos. Restauramos também os bonecos, mas alguns infelizmente não existiam mais, então trouxemos os artistas que os fizeram na época, ou pessoas da equipe, por isso eu brinco que são “réplicas originais” que estão aqui, porque elas foram

feitas pelos mesmos artistas. Você acha que por o Castelo Rá-Tim-Bum ter sido muito popular na televisão, trouxe um público diferente pro MIS que não viria em outra exposição, internacional por exemplo, como a do David Bowie? A exposição do Kublick, que é um cineasta que morreu em 1999, trouxe 85 mil pessoas no Museu. A exposição do Bowie, que é um artista que começou nos anos 60, trouxe quase 85 mil pessoas no Museu também. O que a gente tem feito aqui no MIS é um trabalho de apresentar exposições com artistas e assuntos interessantes, mas mais do que isso, a gente constrói exposições que ofereçam pro público uma experiência sensorial. No Castelo Rá-Tim-Bum, quando eu estava desenvolvendo a exposição, muita gente me disse que existiam muitos fãs, mas eram todos de 20, 30 anos, as crianças vão achar chato. Mas tem muitas crianças vindo aqui e adorando, e eles não eram fãs do Castelo! O nosso papel aqui é justa103

mente criar exposições que não sejam experiências tediosas, que não faça ninguém vir na ‘marra’ por ser importante culturalmente. Queremos que as pessoas percebam que o museu pode ser um lugar divertido, bacana, que você vá com seus amigos e tire fotos e selfies. Arrisco dizer que na exposição do Kublick foi a primeira vez que um museu estimulou o público a tirar fotos, pois não proibimos a fotografia dentro dela. Isso ajudou o sucesso. Ficamos entre o Top 10 do Instagram durante os primeiros dias da exposição, de tanta gente que estava postando foto, e isso tem um efeito multiplicador. O Castelo Rá-Tim-Bum proporcionou o sucesso de bilheteria do MIS até o momento? Sem dúvidas! O Castelo foi o maior sucesso da história do MIS, muito além da nossa expectativa. Já está na marca das 100 mil pessoas em apenas dois meses de exposição. É um número incrível considerando que só deixamos entrar 180 pessoas por hora. Se tivéssemos mais espaço, teria dado mais público. Eu não ando mais de carro. Ando de metrô, ônibus e táxi às vezes. Para vir pra cá, pego um ônibus que desce a Rua Augusta, e quando ele vira a Av. Brasil, o cobrador já grita “próximo ponto é o MIS!”. Isso é a prova de quantas pessoas estão perguntando onde fica a exposição. Então é muito satisfatório ver toda a movimentação que as pessoas estão fazendo para a visita.


Chuva de Arroz Singular ou Plural? Liberdade ou Compromisso? Por que algumas pessoas dividem do mesmo desejo de casar e outras nĂŁo? Reportagem Maria Rita Fotos Gabriela Meira

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J

á dizia Vinicius de Moraes, “A vida é arte do encontro, embora haja tanto desencontro pela vida” e que arte! Não fomos feitos para completar alguém, mas sim para complementar, adicionar, dar um gosto a mais um na vida do outro. Embora fosse assim mesmo que poderia ser, há muitas pessoas que não compartilham do mesmo desejo das outras de se casarem. Casar ou não, eis a questão na vida de tanta gente. Talvez porque alguns muitos não querem se comprometer, abrir mão da liberdade ou apenas não vêem a necessidade de se casar para selar o amor. Um casamento necessita de maturidade e planejamento de ambos os lados. Carla Demarchi, 22, vendedora de vestidos de noiva, desabafa. “As pessoas confundem a vontade de dormir junto com amor. É preciso repensar valores. Um casamento deve ser muito bem pensado e planejado, não sei se estou preparada agora”. Um casamento é para sempre, ou pelo o menos deveria ser. Com o passar do tempo, as pessoas mudam sua forma de pensar e mudam seus interesses. Não é qualquer pessoa que conseguirá passar ao lado de outra para o resto da vida. O ideal é que o casal continue a sem complementar. Por isso, um planejamento se torna fundamental. Para o obstreta Carlos Soratto, 45, o casamento, o ato casar, é só uma convenção que a

sociedade impõe. “Você pode estar junto com a pessoa, mas não necessariamente precisa se casar. Você pode ter sua liberdade e ser feliz e estável com alguém, sem precisar oficializar em papéis”. Hoje, mais do que nunca, homens e mulheres preferem focar na carreira, aproveitar a vida, a família e os amigos sem a obrigação de dever satisfação a alguém. Para eles, isso é chato e cansativo, não querem deixar de lado a liberdade e nem cair na rotina. Apesar de muitos votos negativos para o casamento, ainda há os que querem se casar e apostam na vida à dois, deixando de lado todo o individualismo existente em cada um. Se casar, consequentemente, te torna uma pessoa melhor, mais responsável, preciso, organizado, exigente e carinhoso. Um estudo australiano, realizado na Universidade de La Trobe, em Melbourne, revelou que homens e mulheres casados são mais felizes e menos estressados. Isso se dá ao fato do companheirismo, de poder contar com o parceiro tanto nos momentos bons, quanto nos difíceis. As pessoas estão deixando de se comprometer, muitas vezes por medo, ou por possuírem outras prioridades na vida. Para o publicitário Vicente Barreto, 21, é uma consequência natural. “Quando você ama uma pessoa e se vê a vida inteira com ela, você quer se casar. 105

“As pessoas confundem a vontade de dormir junto com amor. É preciso repensar valores“

E por isso eu acho o casamento como algo espontâneo. Eu quero construir uma família, ter uma grande festa, celebrar o momento e aproveitar muito!”. Ter uma companhia com o objetivo de crescimento mútuo tanto pessoal, quanto profissional é essencial. A maquiadora Ana Clara Cardoso, casada, 42, conclui fervorosa: “casamento é uma delícia. É óbvio que o convívio com o outro nem sempre é fácil e sempre tem seus tropeços, mas a tolerância é algo importantíssimo em um casamento. Só sei que dividir a vida com uma pessoa boa é bacana, bacana demais!”.


A

os 25 anos, o empresário Henrique Lacerda se mudou para São Paulo e com o ritmo frenético do trabalho, acabou deixando de lado a sua vida social. Foi assim que se deu férias e foi viajar. O destino escolhido foi Vancouver, Candá. “Convivi com pessoas de diversas culturas, aprendi e ensinei muitas coisas. A mais importante delas foi o que na vida não tem nada muito certo, ela vai muito além do que pensamos”, fala, entusiasmado. Com uma bagagem de 30 anos, Henrique Lacerda, muitas vezes indeciso, tem hoje, uma única certeza: Quer se casar. Para ele, a família é algo que dá sentido à vida e afirma empolgado que o legal é compartilhar experiências. “Como daqui a 100 anos eu não vou existir, quero alguém para dar continuidade ao meu legado!”. Foi na viagem que Henrique teve a convicção do seu desejo de construir uma família. “Não quero ficar sozinho e nem me dedicar somente ao trabalho como fazia antes. Quero me casar e ter uma família gigante.”, diz animado. Em busca de alguém complementá-lo em vários sentidos, o empresário reflete: “Cada um tem que buscar o que é melhor para si mesmo, né? E a gente sabe o que é bom quando encontra! A vida com as suas imperfeições deve ser experimentada de cabeça aberta.”. Henrique também tem o exemplo de seus pais, Solange e Marcos Lacerda, que já são casados há 36 anos. “Minha família é bem tradicional e católica, principalmente quando o assunto é casamento”. Uma das melhores memórias de Henrique, principalmente na infância, era observar seus pais e ter a certeza que também queria seguir os mesmos passos no futuro. “Nas reuniões de família, eu e meus primos sempre fingíamos brincar de casamento. Acredito que isso já está em mim a muito tempo”, relembra o empresário.

Henrique Lacerda

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Adriana Leite

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driana Leite, hoje tem 36 anos, é paulistana e vive cercada de memórias. “Menina mulher, é assim que eu me defino. Sempre fui muito espoleta, menina menino sabe?” Filha do meio do casal Fátima e Pedro, Adriana perdeu o pai quando tinha apenas seis anos, momento que segundo ela ficou muito marcado, pois a partir daquele momento ela teve de crescer demais para poder ajudar a mãe. Dentre os seus maiores orgulhos está o fato dela ter começado a frequentar matinês aos 14 anos. Se esse fosse o fato mais importante estaria ótimo. “Eu e a minha prima Érica pegávamos o carro da minha mãe escondido e íamos para uma matinê em Santana. Nós nos achávamos um máximo, até que nos descobriram e levei uma surra que nem se compara a qualquer outra”. Apesar de todas as farras, festas e viagens, Adriana sempre trabalhou e deu duro. “Comecei a trabalhar cedo para ajudar a minha mãe com as contas de casa. Fiz faculdade de turismo e hoje sou bancaria. Esse é mais um dos contrastes da minha vida”. “Tive o Caio, meu filho, com 29 anos. Não chamo de produção independente, pois o pai dele é muito presente”. João, pai do Caio, queria casar com Adriana, mas o máximo que conseguiu foi um mês morando juntos. Segundo Adriana, hoje ela vive um dos melhores momentos de sua vida. “Hoje estou noiva, tenho um bom trabalho, Graças a Deus tenho saúde e energia para acompanhar meu filho. Não acredito que o noivado vá virar casamento, mas quem sabe mais uma daquelas experiências de morar junto, quem sabe dessa vez da certo. A vida é feita de tentativas né?”.


C

asar-se exige um planejamento, em média, de um ano e meio de antecedência. Muitos detalhes estão envolvidos, como a lista de casamento, o buffet que será contratado, o local da cerimônia, a decoração da festa, a busca pelo profissional que cuidará da noiva, entre outros. Rose Menezes, a assessora das noivas que trabalha no salão de estética MG Marinho, conta que o chamado “Dia de Noiva” tem o serviço básico que é o penteado, a maquiagem, sobrancelhas, pedicure e manicure. “Antes do grande evento, é necessário um pré-teste com a noiva para esclarecer tudo que ela deseja fazer”, acrescenta. Para Rose Menezes, o tratamento com as noivas deve ser sempre especial. “Nós preparamos um cardápio de acordo com o que elas gostam e elas tomam o café da manhã, almoçam e tomam o café da tarde com a gente. Tudo feito no maior capricho! O dia é especial para elas, então tudo deve ser perfeito!”, diz entusiasmada. “Quando elas fecham os pacotes, que é sempre dias antes do casamento, gostamos de marcar encontros com a noiva, para que ela se sinta à vontade com a nossa equipe. Dessa forma organizamos com antecedência tudo que a noiva deseja e no dia só realizamos tudo o que foi pedido”, explica Rose. A assessora conta ainda que como a noiva passa o

dia inteiro no salão, elas costumam levar companhias. “Muitas trazem as madrinhas, mãe, a família toda. Elas fazem a festa e é uma delícia! Quando elas saem daqui, estão tão empolgadas que às vezes acontece algum incidente, como uma vez que uma noiva veio com um vestido apertadinho e não conseguia andar, então quando ela foi entrar no carro, ela deu um pulo e o vestido rasgou todinho!”, complementa, risonha. O salão é sempre lotado de noivas, mesmo que existam pesquisas que dizem que os casamentos duram menos. “O que eu percebo é que são pessoas muito jovens casando. Pessoas jovens até demais, eu acho , né!”, finaliza pensativa. Uma das preocupações da noiva sempre inclui a busca por um buffet que agrade. Katia Moreira trabalha com casamentos há 8 anos, têm

uma experiência interessante sobre o que é legal de oferecer para os clientes que buscam por sua ajuda. “Sempre procuramos melhorar para agradar ainda mais os clientes”, conta ela. Meses antes do dia do casamento, o ideal é que a noiva analise o cardápio do buffet e discuta coisas que ela deseja ou não que tenha na festa. “Temos várias opções de cardápios, podemos acrescentar ou tirar coisas. . “Queremos sempre agradar ao cliente. Se eles querem a festa mais divertida, nós vamos tentar fazer a festa mais divertida para eles!”, afirma Katia. A empresa do buffet Kroko possui grandes profissionais. ”Aqui aprendemos a trabalhar em equipe e ver como um todo. Um ajuda ao outro, é assim que funciona e flui o nosso trabalho! Somos uma equipe diferenciada, temos uma estrutura organizada!”, finaliza a dona do buffet.

Tânia Maria, noiva, se prepara para o grande dia. Rose Meninezes (esquerda) e Ana Clara Cardoso (direita) 108


T

ânia Maria Fonseca, 24, conheceu seu marido de uma forma diferente e engraçada. Ela trabalhava em uma loja que fabricava etiquetas para roupa e ele era dono de uma loja de roupas . Ele sempre ligava na loja e era ela que atendia, até que um dia ele decidiu marcar, por telefone, um encontro entre eles. “Ele queria sair para jantar e ficava sempre pedindo meu telefone pessoal, mas eu não passei. Não conhecia ele, né?”, disse sorrindo. A vendedora conta que ele era muito insistente e como ela não queria passar o seu telefone, ele decidiu ir até a loja, mas antes de ir pediu que o amigo fosse primeiro para ver como era Tânia. Ao chegar na loja, o futuro marido da vendedora pediu o telefone dela novamente e ela não quis passar. “Eu lembro que ele me disse que ia desistir se fosse para ser daquele jeito. E fiquei com ele na cabeça por dias, então acabei mandando um e-mail. Logo ele me respondeu, combinamos de sair e fomos!”, relembra nostálgica. Eles namoraram por cinco anos e são noivos desde junho do ano passado, época que deram início aos preparativos para o grande dia. “Casar para mim nunca foi um sonho. Meu sonho mesmo era terminar minha faculdade e arrumar um bom emprego, mas as coisas acontecem naturalmente. Quando você percebe, você já está completamente envolvida com a pessoa e com a situação. Para quem não queria se casar, estamos muito bem. Estou extremamente feliz!”, conta emocionada e ansiosa para o grande momento da sua vida. O casamento aconteceu no dia 20 de setembro.

Tânia Maria, noiva, minutos antes da cerimônia que aconteceu dia 20 de setembro, na Paróquia São Judas Tadeu (Tatuapé - São Paulo) 109


Vestido de Noiva Da tradição à industria. O acessório mais importante de toda cerimônia de casamento tem uma rua inteira e exclusiva em São Paulo

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oiva: moça que geralmente usa branco por fora e vermelho por dentro.” Definição de Adriana Falcão, roteirista e escritora. A definição não poderia ser melhor. É muito mais do que estar comprometido pelo resto da vida com alguém. “É um estado de espírito”, completa Marina Machado, noiva há 1 ano e meio. Um breve passeio pela Rua São Caetano, a famosa “Rua das Noivas” em São Paulo, precisamente localizada no bairro da Luz, mostra como funciona o mundo do casamento. Uma tarefa que na verdade, não é nada

fácil e muito exaustiva, mas que tem uma recompensa inesquecível. As mulheres que vão na Rua das Noivas, certamente buscam pelo vestido perfeito, dos sonhos. Para um momento único, um vestido único. É assim que Marina Machado define. “Eu acho que sou diferente das outras noivas. Meu “vestido único”, é um bem simples, longo, mas bem elegante. Não sou tradicional. Já vim aqui cinco vezes e dessa vez já tenho o meu escolhido.’’ O preparo de um casamento é feito nos mínimos detalhes, que são os mais importantes. Lista de convidados, local da

cerimônia, o cerimonialista, o buffet que será contratado, a decoração e por aí vai. “Só de pensar em tudo que falta, me cansa! A única coisa que sei que vou me divertir fazendo é a degustação para o buffet. Quero encomendar muitos ‘‘bem casado’’, meu favorito!’’ E não só as noivas passam pela Rua São Caetano, noivos também, madrinhas e padrinhos. Todos os acessórios que uma pessoa precisa para um casamento se encontra lá. O passeio é grande e o tempo tem que ser livre para conseguir ver tantas coisas legais, diferentes e por preços bacanas. As diversas opções de vestidos que se encontram na loja Via Sposa - Rua São Caetano

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União sob rodas

A descoberta de uma paixão que uniu ainda mais um pai e um filho

Beatriz DestefanI e Camilla Queiroz

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efferson e Vinicius nunca tiveram uma relação muito próxima. O amor pela bicicleta, fez com que os dois se aproximassem. Começaram a fazer longas viagens, conversavam, passavam muito tempo juntos. Viajaram por muitos lugares diferentes incluindo: litoral paulista (duração de cinco dias) e Belo Horizonte (oito dias). A mais longa foi para Florianópolis, durando dez dias. Jefferson Pezeta costumava transitar de carro pela cidade de São Paulo. Fazia o percurso de casa para o trabalho e ficava exausto com a lentidão. Foi então que decidiu mudar seu meio de transporte, adotando a bicicleta. Além de ser um meio bem mais rápido. Jefferson apresentou a bicicleta para seu filho Vinicius, que segue o mesmo caminho do pai. “O gosto por pedalar e por praticar esportes, junto ao fato de odiar ficar preso no carro em um trânsito, foi o que o me incentivou a usar a bicicleta como um meio de transporte”. Diz Jefferson Pazeta, que tem amor pela bicicleta desde os seus seis anos de idade. Durante a semana, Jefferson utiliza a bicicleta para trabalhar, pedalando em média 25km por dia. Aos finais de semana, junto ao seu filho, usa como um hobbie, pedalando pela ciclofaixa e diz chegar a fazer 100km em um domingo. Além da cidade, gosta de pedalar também em estradas,

fazendo longas viagens, quando possível. Deixando de lado os transportes públicos e o carro, Jefferson economiza muito mais durante o mês, pelo fato da bicicleta não usar combustível.“Os estacionamentos para bicicleta, são, na maioria gratuitos. Além disso, não consome mais que 300 reais anuais de manutenção, sendo ela, em grande parte, troca de pneus furados e ajustes no freio e marchas”.Completa Jefferson. Durante as suas longas viagens, pai e filho conversam sobre todos os assuntos, afinal têm tempo, muito tempo. Jefferson ensina bastante seu filho sobre tudo e Vinicius se inspira nele. “Falo sobre minhas namoradas, sobre dores, medos e decepções. Ele me conta das vezes que sofreu, dos dias que foi feliz e me dá algumas dicas pra lidar com as mulheres, eu não concordo muito, mas eu amo ou111

vi-lo falar”, completa Vinicius. Na estrada, conversam também sobre as dificuldades do trajeto, das paisagens lindas que encontram no decorrer do passeio. “Acho mágico a maneira com que ele olha com paixão pra tudo aquilo. Ele me conta como era na juventude, sobre as maratonas que participou, sobre os lugares que ele pedalou e eu me sinto especial por fazer parte disso. Depois que começamos a viajar, eu ganhei muito mais do que condicionamento físico ou músculos, eu ganhei um novo melhor amigo”, diz Vinicius que diz ter mudado totalmente sua relação com seu pai após começarem a pedalar. Vinicius começou a postar vídeos dasviagens dos dois. O canal no Youtube aparece com o nome de Jrpezeta. Nós costumamos filmar as viagens. Alguns vídeos podem ser vistos se colocar Jrpezeta.


Larissa Kato e Kamila Gleice

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Heranças sobre rodas

A

o longo da vida colecionamos muitas coisas, sendo um infinito de materiais variados. Desde selos, quadrinhos, pelúcias, CDs, papéis de bala, insetos... Enfim, seja lá qual for o objeto que desperta seu interesse, o ato de colecionar tem o poder

de acender uma enorme paixão dentro de nós. Os de automóveis antigos que o digam, pois mesmo sendo um passatempo caro, dizem que é quase impossível desapegar. Conhecido como Antigomobilismo, ou Antigomodelismo, a prática de colecionar e restaurar carros antigos são uma paixão mundial. Um hobby que conta hoje com aproximadamente 10 mil praticantes só no nosso país. Por onde passam, eles chamam atenção e atraem olhares curiosos dos que não tem conhecimento nenhum sobre o assunto. São alvos de fotos até quando estão parados no estacionamento de um Mc Donald’s, por exemplo. “Ei, quer vender?” “Troca comigo!” “Você aluga?”, clamam os pedestres e motoristas fascinados pelo excêntrico design. O empresário Wagner Silvestre Mazzali, de 50 anos, herdou o gosto de seu pai, o primeiro automóvel que adquiriu para colecionar foi um Ford Phaeton 1929, há oito anos. Além de ga113

rantir a herança histórica dos modelos, cada carro tráz insubstituíveis memórias. “A gente vai se divertindo. Uma vez estávamos voltando de águas de Lindóia, eu e o meu pai, e chovia mais dentro do carro do que fora. Cheguei aqui com as calças molhadas, mas com prazer”, diz em meio às risadas. O gasto para manter um destes carros é bem alto. Um pneu pode chegar a custar R$1mil; fora as peças, que algumas vezes precisam ser importadas; há também a necessidade de um mecânico especializado nesse tipo de serviço. Augusto Geraldini, presidente do Clube do Fordinho, ressalta que a maioria dos mecânicos especializados já está em idade avançada e muitos já faleceram. “Não existe um manual de instruções para a mecânica desses carros, então é um conhecimento que vai se perdendo”. Também existem clubes que promovem cursos e workshops de restauração de carros antigos tanto na parte mecânica, como elétrica, funilaria, pintura, tapeçaria e marcenaria. Tudo isso coopera para o aumento de gastos na manutenção de um automóvel antigo, mas há quem diga que prefere trabalhar mais a deixar de manter o hobby.


Colecionadores

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modo com que o dono trata sua coleção varia de acordo com o perfil de cada um. O de Wagner não deriva de exposições ou corridas, mas do simples ato de dirigir. Atualmente, possui seis modelos de automóveis, entre eles um Fusca, uma Lambreta, um MP Lafer, e um Ford Roadster 61. É bem notável sua felicidade quando começa com as artimanhas para ligar o carro e ouve o barulho do motor. Diferente de seu pai, Warderley Mazzali, 73, que tem mais prazer em apenas manter a coleção. Andou em

um Ford A quando tinha 10 anos de idade. Desde então, nunca esqueceu a experiência, e insistiu com o filho de que precisava ter um carro desses. Nunca perdia a chance de reforçar: “Não morro sem ter um Ford”. Ocasionalmente, usa sua coleção para fazer casamentos. Porém, não exige pagamento em dinheiro, e sim a compra de mais ou menos R$500 em brinquedos para no fim do ano distribui-los nas creches enquanto espalha sua graça vestido de Papai Noel. Mário Risegalto Neto, 59, é chefe de oncologia no hos-

Wanderley e Wagner Mazzalli 114

pital A.C Camargo até às 16h. Após este horário, ele veste a alma curiosa de mecânico e trabalha em sua oficina de restauração e manutenção de carros de época, apenas por hobby. “Desde pequeno meu pai me ensinou a gostar de carros antigos. Quando passava um na rua, ele falava para gente qual era a marca, o modelo, e o ano em que foi fabricado, assim fui pegando o gosto”. Há oito anos, ele adquiriu o seu primeiro Ford Phaeton 1928 e começou a arrumá-lo conta própria. Atualmente tem cinco modelos, dois estão


por restaurar. Orgulhoso, conta a história de seu Ford 1929, e todo o processo de restauração, desde os ratos que ali habitavam até a troca das peças. Enquanto uns começaram a colecionar pela paixão, outros começaram por mero acaso. Nelson Cerri, 78, entrou nesse mundo há 25 anos quando um amigo lhe deu um Ford 1929 para pagar parte de uma dívida. Mas, por ter dificuldades em ligar o automóvel, o deixou parado em sua fábrica por quase dez anos. Quando tentou vender em um dos encontros, um mecânico o convenceu de que não havia nada de errado com o carro, e o levou para participar de um passeio a Jundiaí com os outros proprietários. O resultado não poderia ser outro, além de seguir a viagem sem nenhum problema, ficou deslumbrado com os gritos e olhares das outras pessoas. “Quando cheguei lá, uma TV local me parou e contei um monte de mentiras, porque não sabia nada sobre o carro”, relembra, rindo. Depois se associou ao Clube do Fordinho e não parou mais de comprar. Ao todo são quase 30 carros guardados em sua fábrica em Carapicuíba. Entre eles, quatro Fords, um Chevrolet, um Jaguar, uma Mercedes, um Impala e um Jipe de guerra. A respeito dos custos, Nelson afirma que começou a encarar tudo como um investimento. “Carro an-

Mário Risegalto Neto

tigo ganha preço, enquanto o novo perde”. Como os filhos já são casados, a paixão pelos carros caiu como uma luva. Orgulhoso, conta que só não sai as segundas, pois nos outros dias está sempre em algum passeio, encontro ou viagem. A vida do Fordequeiro fez bem não só a ele, mas a esposa também, que perdeu a timidez, e agora conversa, ri, e faz amizades sem medo. 115

Nelson Cerri


Essas relações também são o motivo principal de Ervin Moretti e sua esposa Flávia, a continuar nesse meio. Ele tem 60 anos, e há nove tornou-se sócio do Clube do Fordinho e também do Fusca Clube. Sua coleção começou com um Fusca 1979. “Foi o carro que eu aprendi a dirigir, e era o carro que meus pais tinham. Como ele é verde, nós o chamamos de Horácio (da turma da Mônica)”. Também possuem um Ford Escort 1975 marrom, o “Cascão”, e uma Kombi 1973 vermelha, a “Mônica”. Não tem interesse em adquirir um Ford 1929, porque além do modelo ser caro, as peças precisam ser importadas. “Eu e a minha esposa estamos aqui mais pelas

amizades do que pelos carros. Esse é objetivo de ter um carro antigo, ter boas amizades” Flávia, 57, também partilha do gosto por carros de época e gosta de frequentar regularmente os encontros de colecionadores. Tentam ir em pelo menos um encontro por mês, variando entre os primeiros domingos na Estação da Luz, quartas no Clube do Fordinho, quintas no Clube do Chevrolet, ou Fusca Clube no ultimo sábado do mês. Conta que carros antigos lhe fazem reviver a sua juventude. “Eu me lembro bem, eu aprendi a dirigir na Kombi do meu pai, de 1974. Na época, a autoescola só tinha Fusca, então é o tipo de carro que a gente sempre teve na memória. 116

Flávia Moretti Quando surgiu a oportunidade de comprar um, foi como voltar ao passado”. Flávia também ressalta a valorização que os automóveis sofreram ao longo dos anos. “Hoje já é considerado chique ter um carro antigo. Antes as pessoas compravam um Fusca para ter um carro a mais, quando começou o rodízio muitas pessoas fizeram isso. Hoje, um Fusca é um ícone”.


O casal também tem outros fascínios. Aos 7 anos, Ervin recebeu um brinquedo de seu pai, um Fusca que hoje marca o início de uma coleção de mil miniaturas. Entre eles Ferraris, Fuscas, Cadillacs, Batmovéis, Kombis, Fords, Romisetas, Chevrolets, chaveiros, Lambretas, helicópteros, e dioramas – mini cenários –, todos confeccionados a mão. Os cuidados não são os mesmos dos carros originais, mas chegam perto. Para manter a coleção em ordem, é preciso dispor de espaço e método. As prateleiras precisam estar sempre fechadas para não ocorrer o contato com o pó. Também é necessário arranjar uma forma de classificar todos os itens como placas especificando o nome, e o ano do carro. Ervin conta que não pretende parar com a coleção e que sempre costuma adquirir modelos novos. Sua paixão por carros independe de tamanho.

Ervin Moretti 117


Encontros San Girardi

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Noé Da’Agostini Neto

iferente dos clubes, em que o ambiente é como um almoço familiar, o clima dos encontros é mais descontraído, como uma saída entre amigos. Coolers lotados de cervejas e o cheiro dos pastéis e espetinhos de carne compõem o ambiente com as altas gargalhadas. San Girardi faz parte do Antigos Auto Clube de São Paulo, e também é o organizador do Encontro de Carros Antigos da Avenida Maria Whitaker. Ao lado de sua F100 1940, apelidada de “Preta Gostosa”, conta que seu objetivo é promover um encontro para todos os que possuem ou se interessam possam brincar e conversar sobre os carros. Basta estacionar o carro, pegar algo para comer e beber, e interagir com as pessoas e proprietários. Porém, também é necessário bom senso dos que participam, pois vez ou outra aparece algum revendedor, fugindo da proposta original. Os donos que frequentam os encontros assemelham118

-se aos de clubes quando comparados pelos motivos que os levaram a ter determinado modelo – geralmente por lembrar algo da infância ou pela influência de parentes –, mas se diferenciam na quantidade de posses. Os de encontros geralmente possuem apenas um carro, e só o vendem ou compram outro em raros casos. O primeiro carro de Noé Da’Agostini Neto, 56, foi um Chevrolet Veraneio por ser o carro que seu pai o levava para passear. Mas 9 anos atrás, invadiram sua casa e levaram seu automóvel, fazendo-o adquirir outro por necessidade. Por coincidência, um amigo estava interessado em outro modelo na época, e como não tinha dinheiro para pagar, resolveu vender sua Rural Willys 1972. Noé compensa a saudades de seu Veraneio focando nos sorrisos e euforia das crianças quando veem a duplicidade de cores de seu carro, enxergando-o como um brinquedo em tamanho gigante. Por trás do design, a Rural carrega uma grande história, porque foi muito utilizado na construção de Brasília, já que tem um imenso – e expansivo – porta-malas capaz de carregar várias ferramentas, sacos de cimento, e trabalhadores.


André Luiz e Hermes Magaiver

André Luiz e Hermes Magaiver, ambos com 43, encantam-se por um segmento diferente, os chamados Rat Rods. Originalmente desenvolvidos como alternativa aos altos preços dos Hot Rods, – carros totalmente modificados pelos donos, mas com tapeçaria, brilho, e acabamento perfeito –, os Rats têm por obrigação uma aparência inacabada, – amassados, enferrujados, com pintura fosca ou apenas fundo –, e muitas vezes têm seus para-lamas, capôs, estribos e para-choques removidos. Ao contrário do que muitos pensam, não é uma sucata que mal pode andar. Na verdade, a mecânica deve ser impecável e potente, mesmo com aparência descuidada. Normalmente são usados os Ford v8 Flathead, antigos Chrysler Hemi ou modernos Small E Big-block, os “diamantes entre os motores”, segundo André. Ele começou a montar seu carro há 20 anos e até chegou a ganhar corridas. Enche o peito ao ouvir os deboches e as brincadeiras dos amigos sobre sua lataria, pois nenhum deles têm um motor tão potente e veloz. Independente do modelo, motivo ou perfil, os que entram nesse mundo raramente conseguem deixá-lo. É algo além de uma mera paixão por objetos. É uma lembrança dos anos vividos, uma herança para os filhos. Um hobby que torna-se vida.

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Da capital musical para o Interior Guilherme Garelha

velho som tocava Sara Vaughan enquanto eu o esperava. Era noite de sexta-feira e na escola só restava um último aluno. Sobre a mesa de seu escritório estava um DiGiorgio 1989. O violão com jacarandá todo suado, era a peça que mais enfeitava o ambiente, uma verdadeira raridade. Chegou meio atrapalhado, e enquanto derrubava os papéis que segurava esboçou um sorriso quando me viu. Ali estava Jacob Silva Filho, 63 anos, nascido em Jacareí, cidade interiorana de São Paulo. Com os 187 mil habitantes, o pequeno município soa menor que a maioria dos bairros da grande capital paulistana. Depois de anos tocando nas noites da cidade grande, o músico aposentado voltou para onde foi criado e ali decidiu se amainar. Dono de uma das poucas escolas de música do município, a Spettabille, o violonista Jacareiense estudou no famoso CLAM, Centro Livre de Aprendizagem Musical, fundado em 1973 na cidade de São Paulo pelo Zimbo Trio e o baterista João Rodrigues Ariza, que na época, eram grandes expoente

Jacob Silva Filho, e seu Violao Digiorgio. 120


da música instrumental nacional e que acabaram por fazer história no cenário da música brasileira. “Esse centro era muito diferente para aqueles tempos. Acabou revolucionando todos os métodos de ensino porque simplesmente não existia a separação do erudito para o popular, isso acabou influenciando a formação musical de grandes músicos que vieram nas gerações seguintes.” Passaram pelo Velho Centro, importantes nomes da música brasileira como Chico Cézar, Alaíde Costa, e o sambista Eduardo Gudin. “O que eu mais tenho saudade daquela época é que a boa música era mais apreciada pela garotada, sabe. Você ia tocar bossa nova e Jazz, e as casas de shows ficavam lotadas de gente jovem. Aquilo acabava sendo muito consolador para mim.” Afirmava com toda convicção aparente de um senhor de 63 anos. Sua branca barba lhe dava um certo tom de autoridade, fazia você crer com mais confiança no que dizia e nas histórias que contava. Em 79, ele conta que quase foi para o Rio de Janeiro se aventurar na música. Na época, o movimento artístico musical era muito mais forte e ativo na capital carioca, e muitos músicos paulistas acabavam indo para lá em função disso. Mas Jacob conta que acabou não indo por causa de uma paixão. ”Tinha muitos amigos lá, todos bem encaminhados, estava tudo no jeito mas acabei não indo por causa da garota que gostava.” Logo depois, o violonista se casou com Mirtes e acabou tendo um filho com ela, Damiã. “Se eu tivesse ido para o Rio, talvez hoje seria menos frustrado como músico, mas com certeza não teria a família que tenho.” Ressaltou depois do relato de sua quase ida. O velho musico tirou seu cachimbo e o acendeu ali mesmo. “Voltei pra cá porque a São Paulo que você conhece acabou me cansando. Enjoei daquela vida desplanejada que tinha, sonhava em ficar famoso e acompanhar grandes cantores e grandes grupos”. Em seu tempo de mocidade, relata que queria ser igual ao João Gilberto, “foi meu grande ídolo de juventude”. Jacob ainda conta que quase toda sua Influência musical desabrochava quando colocava “Chega de Saudade” do próprio João, e também “Afro Sambas” de Baden Powel, no toca discos da casa de sua mãe.

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artista que tocou nos bailes da capital por quase 10 anos, desistiu do sonho pelas dificuldades que acabou encontrando no caminho. Diz que a única coisa boa que acabou plantando na cidade grande foram os amigos. “até hoje os vejo, assim como eu, eles também acabaram por voltar para o interior.” O músico comprou a escola de um velho amigo, e há 13 anos vem tocando o negócio pouco lucrativo pelo amor que expressa à música. “Acho que no final de tudo, a única coisa que a gente não pode desistir mesmo é do carinho pela música. Sem ela a gente acaba ficando doente, é ela que tem me movido nos últimos anos”. Mesmo se passado 40 anos desde que Jacob fora para são Paulo estudar e tentar a vida na música, isso ainda acontece na vida das pequenas cidades perto da capital. Hamilton Palma, 26 anos, que faz sua vida nas noites da pequena cidade interiorana paulista, é um exemplo disso, o jovem contrabaixista fora para capital estudar na “Escola de Música do Estado de São Paulo”. O baixista, que começou tarde na música, conta que mesmo com o grande fluxo de músicos migran- Hamilton Palma, toando seu Contrabaixo em sua residencia, em Jacarei, SP. do para a capital, “no interior ainda surgem alguns trabalhos”. Além das aulas que ministra na escola de Jacob, Hamilton toca e também em cerimônias sacramentais. “A grande maioria dos músiem bares e restaurantes da região, cos aqui da cidade vão pra São Paulo estudar na EMESP”. 122


undada em 1989, a Escola de Música do Estado de São Paulo, teve como seu primeiro Reitor, o grande compositor e maestro Antônio Carlos Jobim. Na época, ele foi chamado pelo então secretário da Cultura do Estado, Fernando Moraes, para ocupar a cadeira na Universidade. Por um bom tempo, a Escola foi chamada por “ULM” (Universidade Livre de Música), e sua sede se localizava no Bairro do Bom Retiro, SP. Porém em 2001, a Universidade teve suas atividades transferidas para o prédio localizado no Largo General Osório, que fica na Luz, aí então a escola foi rebatizada com o nome de ”Centro de Estudos Musicais Tom Jobim”, posteriormente, com o seu nome atual: Escola de Música do Estado de São Paulo - Tom Jobim (EMESP Tom Jobim). Músicos como Jacob e Hamilton são o retrato do que é a música, não só nas grandes concentrações urbanas, como Capitais e centros Musicais como a EMESP, mas também nas pequenas cidades, onde na figura do músico existe uma maior exaltação, pois a única forma de dissipação de uma cultura musical mais diversificada e feita por eles.

O contrabaixista fazendo sua musica.

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I Wanna Rock!

Apesar do nome, a Galeria do Rock abriga várias tribos e estilos Por Rodrigo Ribeiro Fotos Lucas Teves

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ocê conhece a Galeria do Rock? O espaço é conhecido no país inteiro por reunir tribos e pessoas de todos os gêneros musicais: do skatista que gosta de rap até o comerciante que curte heavy metal. Situado no coração da cidade de São Paulo entre a Rua 24 de Maio, 62 e o Largo do Paissandu (Avenida São João), a fachada e as redondezas denotam certo abandono da região, o local parece sujo, abandonado, punk... Sim, um visual punk, isso é o que define uma galeria com tanta história, rodeado por muito amor, violência e o bom e velho Rock and Roll. Pessoas de todas as partes do país visitam a galeria atrás de itens de suas bandas favoritas, como é o caso do casal de noivos Claudio José Nascimento e Simone Araujo. Vieram de Salvador somente para visitar a galeria. Claudio, metaleiro de coração, que, na sua terceira visita à galeria trouxe Simone, que gosta de reggae e rap. “É bem legal, nunca tinha visto nada parecido, bem diferente de qualquer coisa da onde a gen124


Bruna Diasputo já presenciou várias brigas na Galeria

te veio”, conta Simone, com sotaque forte da região Nordeste. “Quando eu penso em tirar férias, eu penso em algum lugar com natureza, praia. Mas aqui realmente foi uma ótima opção, vou vir mais vezes aqui”, fala animada. Claudio, fã de heavy metal desde a juventude, sempre ouviu falar que existi uma galeria de rock em São Paulo, “As lojas lá no Nordeste compravam material daqui pra revender lá, como discos e camisetas”, diz. Pela galeria passam diariamente 20 mil pessoas, circulando pelas 450 lojas de vários tipos e estilos, se agrupam dos mais variados tipos de pessoas, com seus dreads, piercings, tatuagens em toda parte imaginável do corpo, usando camisetas pretas com estampa de alguma banda, e todas elas se reúnem de forma (na maioria das vezes) pacifica. Porém nem sempre foi assim.

Dazed and Confused (Atordoado e Confuso) Bruna Diasputo, de 21 anos, vendedora de uma loja de roupas e acessórios de skate, conta que já viu na galeria rolar muita briga. “Vi várias pessoas morrendo, de suicídio a assassinatos, a ultima que vi faz uns oito meses, uma menina foi esfaqueada na porta da galeria.” conta. “Há uns anos atrás ela (a galeria) era bem diferente do que é hoje, agora é muito shopping, antes era um local mais underground, tinha muita “treta” de punk, briga de gangues, agora nada disso mais existe. Ficou mais comercial e tranquilo. Eu acho que essas brigas existem pela galeria estar localizada no Centro de São Paulo. Há uma convergência muito forte de pessoas”, explica. Outra pessoa que já viu rolar muita briga é o dono de um dos locais mais antigos e tradicionais da galeria, Luiz Antonio Mendes da Costa, 49 anos, da “Rainha do Paissandu”, lanchonete localizada no térreo da Galeria. É conhecida por ser um estabelecimento que existe há mais de 40 anos. São Paulino com orgulho, conta como o local mudou esses anos todos: “Nos anos 70 as coisas eram bem diferentes, as influências musicais eram outras, a cidade era outra. Na São João, pra você ter uma ideia, tinha carnaval de rua, algo que nem existe mais” conta. ”Tá bem mais calmo, o público alvo mudou bastante”. Fala que mesmo não tendo sido vítima de nenhum assalto, já presenciou algumas situações: “Já vi acontecer muito com outras lojas, além de ter muito furto entre as pessoas, bandido atravessava a galeria até de moto pra roubar. Muito trombadinha passava aqui” explica. O “culpado” dessa nova imagem da galeria foi Antonio Souza 125


Neto, mais conhecido como Toninho da galeria, atual administrador. Tem esse cargo desde os anos 90, quando teve que revitalizar e cuidar dos problemas que o local estava tendo na época (ver Box). Jornalista, sociólogo e fotógrafo profissional, Toninho é conhecido por seu jeito acolhedor e pacífico, bem diferente do que se pode imaginar de um fã de rock pesado. Toninho é amplamente conhecido não só dentro como fora da galeria, tendo virado até personagem de novela da Globo, interpretado por Leonardo Medeiros na novela “Tempos Modernos”. Toninho conta com mais de 50 colaboradores para administrar o local, distribuindo dois seguranças por andar e sete que transitam de ponta a ponta, além dos à paisana, que se disfarçam no público para impedir alguma confusão. We Built This City on Rock and Roll (Nós Construímos esta Cidade em Rock n’ Roll) É na galeria onde muitos jovens se reúnem para trocar experiências musicais, comprar instrumentos, discos, camisetas e acessórios de suas bandas favoritas, é lá que também rola muitos encontros de fã-clubes de bandas, como Sepultura e Beatles. A jovem tatuadora Ariel Rodriguez, profissional há quatro anos, veio do Rio de Janeiro procurando emprego e está na galeria há menos de um ano. Estampa a sua profissão com

Bruno Frias, tatuador e fã de bandas independentes

as várias tatuagens que tem no corpo, além de piercings e alargador. Quem vê, não sabe que é uma menina tímida e simpática. Diz que adora a galeria pela sua diversidade e pelos itens que somente são achados no local, “Eu gosto dessa forma como ela traz gente de todo tipo, junta várias culturas, e, por ser uma galeria, é um espaço de encontro pra tatuadores, algo que é difícil de encontrar por ai.” explica. Bruno Frias, tatuador há três anos, trabalha há oito meses em 126

uma loja de tatuagem. Diz que gosta do local por aproximar o artista independente do consumidor: “Eu compro muito CD de artistas independentes, para fortalecer esse mercado” fala. “A galeria é um ótimo lugar para esses artistas divulgarem seu trabalho: quatro ou cinco grupos de Rap sempre vendem na entrada da galeria. Várias lojas no subsolo aceitam produtos independentes, que vendem os discos desses artistas e depois os pagam”, conta.


Rainha do Paissandu, a mais famosa lanchonete da Galeira

Where The Wild Things Are (Onde as Coisas Selvagens Estão) A galeria é dividida em quatro andares. No subsolo se concentram lojas dedicadas a tribo do Hip Hop e a cultura de rua, focando seus negócios em sneakers, customização de bonés, lojas de tinta e spray. Já no térreo,há uma mistura mais homogênea entre lojas de roupa, estúdios de tattoo e até lanchonetes nas entradas para encher a barriga dos ávidos consumidores, sendo a mais famosa a “Rainha do Paissandu”, conhecida pelos frequentadores pelo seu famoso Sucão e por seus hambúrgueres. “An-

tes de ser lanchonete, era especializado em frios,” conta Luiz, dono da lanchonete “e, naquela época, como não tínhamos tempo para almoçar e não tinha muitas opções aqui no Centro, existia uma padaria chamada Airosa, na Avenida São João, e meu pai sempre pedia pra eu comprar uns pãezinhos e, como nós vendíamos frios, fazíamos uns lanches. Era algo só pra gente, sabe.” “As pessoas começaram a achar que a gente vendia lanche, aproveitamos e começamos a vender. Com o passar do tempo virou 127


lanchonete” explica. Ele também conta de o porquê do nome da lanchonete: “Antigamente era “Laticínios Paissandu”, mas como virou lanchonete, tiramos o “Laticínios” e mantivemos “Paissandu”, que é o nome de uma praça aqui perto, virando “Rainha do Paissandu”. Os lanches, famosos pela fartura dos recheios, são um prato cheio para quem quer experimentar um bom hambúrguer. “Tem o “Frios Sortidos” e o “X-Fartura”, o antigo “X-Tudo”, é o que mais sai”. E pra acompanhar, vem o famoso Sucão, um suco natural servido na jarra. Subindo as escadas rolantes, nos próximos três andares, entramos no mundo do rock e das lojas mais famosas, como o “Consulado do Rock”, loja de camisetas que fornece aos fãs do gênero as famigeradas camisetas pretas com estampas de bandas. Mesmo com a era digital e a lenta morte dos discos, há ainda muitas lojas que vendem para os colecionadores, com edições raras e especiais. Estúdios de tattoo, cabeleireiros e ingressos para shows completam

“Sem essa revitalização, essa loja já teria fechado faz tempo”

Anderson Matins, vendedor do Baratos Afins

o andar. Outra loja que se destaca é a “Baratos Afins”, loja mais antiga da galeria, tradicional tanto nos produtos quanto nos frequentadores e no próprio dono do local. Vende principalmente discos e vinis de todos os tipos imagináveis, tendo um acervo que inveja qualquer entusiasta. O dono do local, Luiz Calanca, mais conhecido como “Seu Luiz” pela maioria das pessoas, tem uma alma de adolescente (16 anos, de acordo com ele) preso num corpo de 61. Produtor musical, vendedor e colecionador de discos, Calanca foi um dos primeiros a

fundar uma loja musical na galeria. Saído da cidade de Flórida Paulista, no interior de São Paulo, veio para cá com 13 anos e começou a se apaixonar por tudo que envolvia música. Antes de ser galeria do Rock, era “Shopping Center Grandes Galerias”, contando com “comércios” duvidosos, os chamados inferninhos. Nesse meio, Calanca vendia discos na “Baratos Afins” e dividia a sala com um argentino que fazia brasões das famílias imperiais que durou pouco tempo. “Aqui tinha uma sala funcionando e cinco vazias. O pessoal jogava lixo dentro e ninguém limpava. 128

Já vi um cara cheirando cocaína na porta da minha loja”, conta. Já no início dos anos oitenta, o rock e o punk chegavam forte no Brasil e com isso a concorrência musical começou a crescer. Jovens saíam de seus bairros e iam para o centro de São Paulo procurar aquela atitude vista em Ramones e Sex Pistols. “Tudo era loja de disco. E eu vim pra galeria, pro segundo andar, porque era tudo que eu podia ter naquele momento. Eu era micro empresário. Eu trabalhava com um perfil diferenciado da rua porque era impossível competir com as megastores das ruas, todas de disco. O disco de vinil viveu momentos gloriosos aqui no centro de São Paulo. Era a boca do vinil”, diz Calanca. Anderson Martins, 35 anos, trabalhando na loja desde os 13, conta como foi “contratado” para trabalhar na loja: “Tava empinando pipa quando um vizinho meu falou se eu


queria trabalhar, eu disse que não, estava muito bem empinando pipa o dia inteiro. Esse vizinho foi falar com meu pai que chegou pra mim, quebrou minha pipa no meio e falou: “Amanhã você vai trabalhar e parar de vagabundear”, sai chorando.” Diz rindo. Desde então nunca trabalhou em outro lugar. Fala que todo dia é uma surpresa, mesmo para alguém que trabalha há tanto tempo lá, e que não tem problema em continuar trabalhando ali. “Com o tempo a gente se acomoda, amo o que faço e não penso em mudar de emprego tão cedo, a galeria faz parte da minha vida a tanto tempo que eu não saberia fazer nada sem ela” conta. Já no terceiro e quarto andar, ficam localizados os mais famosos e tradicionais salões de beleza, sendo um deles o “Índio Cabeleireiros”. Derly Ro-

drigues, mais conhecido como Índio, dono do local, é especializado em venda e compra de cabelos, e até hoje é uma das lojas mais requisitadas do ramo. Com pouquíssimo tempo para conversar, Índio, com seu vasto bigode e óculos de aro claro, conta que até artistas como Luciano Huck já foram fazer matérias ali. Sempre agradecido por seu amigo, Toninho, de ter revitalizado o estabelecimento, “Sem essa revitalização, essa loja já teria fechado faz tempo” diz.

No final, independente das diferenças de gosto, ou de que tribo cada pessoa é, o que atrai na galeria é o seu amor incondicional a música e a sua cultura, seja ela feita aqui ou em qualquer parte do país, todas tem um lugar para chamar de seu no coração da metrópole paulistana.

História da Galeria Pouca gente sabe, mas a galeria começou como uma galeria de salões de beleza, lojas de serigrafia e assistência técnica de aparelhos eletroeletrônicos quando foi construída em 1963, com o nome original de “Shopping Center Grandes Galerias”. Somente na década de 70, foi que a galeria começou a abrigar lojas de discos que começaram a dar fama ao local, que era frequentada na sua maior parte por fãs de rock, ganhando assim o apelido de Galeria do Rock. O prédio, planejado pelo arquiteto Alfredo Mathias, famoso por ter também feito o projeto do Shopping Iguatemi e do Palácio Anchieta, tem uma personalidade forte por seu formato ondulado, inspirado em um prédio situado ali perto, o edifício Copan, de Oscar Niemeyer. Nos anos 90, a galeria passou por um projeto de revitalização, que se deve principalmente ao seu atual síndico conhecido pelo apelido de Toninho da Galeria, que na época que começou a administrar o local, ficou conhecido como “Santo Milagreiro” por todos os problemas que teve que resolver logo no começo de seu mandato. Desde então a galeria se transformou, agregando lojas de vários tipos e gostos e se transformando em um dos pontos turísticos mais famosos da Cidade de São Paulo.

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Parem as máquinas: o ônibus não parou Pedro Balciunas

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e todas as infinitas síndromes que já existem, tem uma em particular que anda tomando conta do brasileiro. É a síndrome do manifestante Black bloc. Ele chega no protesto, atrapalha todo o movimetno democrático, quebra o banco, o restaurante, taca fogo em ônibus. Aí a prefeitura de São Paulo, na mão desses vermelhos estrelistas, vem com essa campanha de que “ônibus incendiado não leva a lugar nenhum”. Pode parecer egoísmo, mas aquele motorista que se recusou a abrir a porta do ônibus para mim, que estava a menos de um metro de distância do ponto, também não. Que me adianta um ônibus inteiro se eu mesmo não saí do lugar? A resposta é previsível... Que homem na face desta terra paulistana nunca correu, sem sucesso evidentemente, atrás de um coletivo lotado, para em seguida gritar

um sonoro ‘desgraçado’ com todos os érres e ésses para o motorista? Uma coisa é fato: a mãe desse cara só não é mais achincalhada que a do juiz em final de Copa do Mundo com Brasil X Argentina. A culpa sempre será do juiz. E do PT, como dita a recente moda partidária. Por sermos filhos de uma sociedade patriarcal e machista, acho que os homens deveriam se ajudar mais. Vejam as mulheres aí, caros amigos, compartilhando a maquiagem, a roupa e até o namorado em alguns casos. A solidariedade feminina, com seu jeitinho brasileiro mais brasileiro ainda, me encanta. Quando é uma “cumadi” que dirige o ônibus essas metidas a fazer serviço de homem – a coisa funciona de outra maneira. E como funciona. Quando você, homem de pernas peludas, vai chegando correndo no ponto com ônibus já saindo, ela não te ignora, não finge que você é gasoso. Simplesmente abre a porta e te deixa entrar. 130

É com o pensamento de filósofo da janela de ônibus – isso, é claro, quando pego o “bonde” andando e consigo sentar na janelinha – que chego à conclusão que se os homens se ajudassem a sociedade não seria machista. Não seria nem sociedade e o motorista não teria a oportunidade de ignorar o meu sinal de parada com as mãos. O ônibus pararia e eu poderia chegar na hora para meu compromisso. Parem as máquinas, o trânsito, as obras da do metrô se for preciso! Sou um cidadão honesto, desses que pega às oito e sai às cinco, que vota a cada dois anos e não perde um só capítulo da novela das oito, agora oficialmente das nove mesmo nunca tendo começado antes das oito e trinta. Se a novela não começa na hora certa, qual o problema do motorista em abrir a porta do ônibus fora do ponto? Nenhum. Queimem os livros, queimem os sutiãs, queimem os ônibus, eles não vão para lugar algum

mesmo.



RINO COM

e j o h r i u r t s n o c é l a t n e Fundam a o futur . r a p e s a b a

Há 144 anos, o Colégio Presbiteriano Mackenzie oferece uma educação baseada em valores cristãos, na ética e na valorização do conhecimento. Ensino de qualidade e de princípios para preparar o seu filho para o pleno exercício da cidadania.

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