Mercosul: um mercado em construção O bloco econômico na beira do precipício; como o governo e a diplomacia dos países impacta na relação geopolítica da América Latina
© Felipe Márin
Por Camila Barros, Camilo Mota, Manuela Pestana e Maria Luiza Marinho
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egundo portal oficial do Mercado Comum do Sul (Mercosul), o bloco configura “a mais abrangente iniciativa de integração regional da América Latina”, tendo como seus fundadores Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai, no início de 1990. Atualmente, a coligação vincula a maioria dos países sul-americanos na posição de “Estados associados”, como é o caso do Chile. Dentro dessa classificação, as nações podem usufruir dos benefícios econômicos que integram a união aduaneira. No entanto, não possuem poder de voto dentro da estrutura institucional do bloco. “Uma característica desses blocos – também presente no Mercosul – é que entre si eles têm um tratamento especial, como se fossem membros de uma comunidade econômica. E com o resto do mundo tem a mesma espécie de mercado, essa é a ideia da Tarifa Externa Comum”, explica Adalton Diniz, economista e também professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo em entrevista ao Contraponto. Diniz ainda complementa sobre o funcionamento da “TEC”: “Já que existe o livre comércio dentro do bloco, um país que quisesse vender para qualquer membro escolheria a menor tarifa de importação para receber o produto e depois entrar para as demais nações. Para evitar esse problema, eles têm o acordo de que, nas suas relações comerciais com o resto do mundo, todos vão agir na mesma maneira.” A realidade é que sempre existiu relativo distanciamento e rivalidade entre os países da América meridional. “Na minha época, brincavam que o Brasil estava de costas para a América (do Sul)” acrescenta; ainda que essas nações tenham diversas semelhanças políticas e paralelismos históricos. O professor aponta que, não por acaso, o primeiro encontro efetivo entre todos os líderes da área tenha ocorrido apenas nos anos 2000. “É sintomático que só foi possível fazer uma reunião com esses chefes de Estado naquele momento, e vinte anos depois, uma eventual associação entre esses países tenha naufragado. Já não se sabe se vai sobreviver” – explica. Essa unilateralidade do Mercosul, descrita por Diniz, ainda que inerente ao bloco desde sua formação, vem sofrendo significativo declínio durante a gestão de Jair Bolsonaro e a implementação da política externa encabeçada pelo seu chanceler, Ernesto Araújo. A linha diplomática adotada pelo atual presidente pressupõe uma forte subordinação no que diz respeito aos
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Manifestante na beira do prédio
interesses estadunidenses, ao passo que demonstra um descaso em nutrir relações harmônicas com os demais países do bloco. Diniz aponta que, se tratando do cenário regional, “sempre se acaba buscando uma saída individual e Araújo representa essa mentalidade descaradamente”. Ainda faz um contraponto ao mencionar a aproximação exagerada com Trump: “O Brasil concede tudo que puder aos EUA para tentar uma relação privilegiada. É surpreendente que eles não tenham feito o Mercosul naufragar”. Kurt Perez, engenheiro comercial chileno, explica ao Contraponto essa linha de concordância entre Brasil e Chile: “é muita ignorância quererem fazer comércio com os poderosos – Estados Unidos e China – e continuar ignorando o bloco” esclarece a respeito do distanciamento comercial dos países da América do Sul.
O individualismo na política econômica Em 22 de setembro, o presidente brasileiro fez um discurso na abertura da 75ª Assembleia Geral ONU com falácias que incomodaram a população como um todo, ao afirmar que a economia brasileira “anda bem”. A questão que tem segurado a corda do país à beira do precipício é a atuação do auxílio emergencial (verba disponibilizada para atenuar os danos da Covid-19 no país), o teatro que enaltece a comédia humana do presidente. A explicação dada por Adalton Diniz, relata o quanto a fama diplomática que o Brasil tinha, vem se perdendo, e consequentemente afetando nossa economia e mercado: “Se não fosse o acordo de livre comércio entre Europa e MERCOSUL, desconfio que já teriam deixado de lado esse bloco”. Com o passar do tempo, desde o encontro entre os países da América do Sul no ano 2000, o Brasil
tem se afastado do Mercosul e aproximando-se da China e Estados Unidos. Graduanda em economia, Carolina Marçal dá uma breve explicação sobre os riscos da atual política econômica do país, e recorda como a barreira que o Brasil vem criando pode interferir na sua relação comercial: “É preciso tirar o capitalismo brasileiro do atraso” e acrescenta que isso “não vai ser feito com o neoliberalismo do Paulo Guedes”. O chileno Kurt Yunge Perez ainda traz à tona essa proximidade das políticas chilenas e brasileiras, sinalizando a importância de uma reforma. “Para mim, o liberalismo manipula e explora as pessoas. Não tem como um sistema desse continuar sem ser questionado”, afirma. O Chile possui como base o Estado Mínimo. “A diferença é que não somos tão ligados à política como os chilenos”, declara Adalton. “Eles sempre têm manifestações. O Mercosul não interessa ao empresário de médio/pequeno porte, [eles] estão preocupados em como abafar os sindicatos”. Os chilenos reivindicam ações do Estado e Kurt ainda retoma acrescentando: “hoje, as alianças só estão sendo feitas por interesse em mercadoria e não nos benefícios entre os países. O individualismo pode acabar com nossa economia.” A situação dos países sul-americanos, no começo do milênio até o início de 2010, era de considerável prosperidade, mas houve um declínio. Adalton Diniz explica: “há diálogo, mas não integração na relação do Brasil e Chile, que cirandeia um ao outro, resistindo à conversa sobre o Bloco Econômico”. Os governos brasileiros, antes, buscavam relações de proximidade, o que atualmente parece utópico, já que o individualismo do atual ministro da economia corrompe qualquer ligação
CONTRAPONTO Jornal Laboratório do Curso de Jornalismo – PUC-SP