Revista Versátil

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Informe Publicitário

“Uma nova abordagem para o turismo na região costeira brasileira”

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Paraty Bungalows Hotel & Bar Construído com influência do estilo arquitetônico e decorativo do litoral americano da década de 1960, contrastando com interior moderno e confortável, o Paraty Bungalows Hotel & Bar faz parte de um segmento exclusivo na região da costa carioca. A decoração é temática, inspirada no “Classic Hollywood”, com inspiração permanente da coleção de itens raros sobre música e cinema.

muitos outros materiais cedidos por grandes nomes do cinema mundial. Seleção das melhores bebidas importadas e locais. Complementando, ainda há uma biblioteca contendo vasta seleção de livros sobre filmes e programas de TV clássicos, artigos exclusivos e autênticos

Conta com layout diferenciado, inspirado no estilo boutique: possui oito bungalows individuais com bastante espaço, bem iluminados e divididos em dois ambientes. Cada um com: banheira Jacuzzi para duas pessoas, sistema de água pressurizada e aquecida a gás, TV de LCD, DVD player, TV a cabo, micro system estéreo, closet, camas king-size com colchões ortopédicos, cortinas blackout, ar-condicionado com regulagem para quente e frio, internet wi-fi gratuita e minibar.

Já a piscina conta com a mais moderna tecnologia de purificação da água sem presença de cloro, totalmente iluminada, bar com assentos de aço inoxidável e mesa, Jacuzzi aquecida, deck feito com pedra natural e serviço de bar disponível. Na área da

sobre Country-Music, Clássica e Rock and Roll. Também é aberto para não hóspedes, entretanto, devem ser feitas reservas.

piscina há também a sauna e o bar Whisky & Cocktail. Outra vantagem é a de estar a dois quilômetros do centro, na praia Jabaquara. A diária para casal sai por R$390,00 e o hotel está oferecendo hospedagem para 3ª pessoa grátis no mesmo quarto. A tarifa inclui ainda café da manhã e um welcome drink no Riviera Hotel Bar.

Paraty Bunga

lows Hotel &

Bar

Rua D. Pedro I Praia Jabaquar a Paraty/Rio de Janeiro (24) 3371-263 8 Diária: R$390 ,00 (o casal) Promoção 3ª pessoa grátis em cama roll in www.paratyb ungalows.com

O Bar conta com temática voltada ao cinema, com uma enorme coleção de itens raros e autênticos sobre famosos filmes produzidos em Hollywood: pôsteres autografados, LPs, fotos, contratos de atuação e

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Caro leitor

Nesta edição a Versátil conversou com o ator Celso Frateschi, que vive Giordano Bruno na peça Processo de Giordano Bruno. O filósofo foi morto pela Inquisição do Santo Ofício, em 1600, por não renegar os próprios ideais. Como afirmar, àquela época, que a Terra era apenas um astro como os outros e que o universo era infinito e abrigava outros mundos? Hoje ainda se cometem injustiças semelhantes por não se aceitar diferenças de opiniões. Talvez porque falte tolerância e conhecimento. No texto Alegoria da caverna, de Platão, os homens, acorrentados, veem apenas sombras na parede interna. Sair da caverna, dos nossos preconceitos, abrir-se para o novo e experimentá-lo requer coragem. Não há como alcançar satisfação sem ousadia, e em diversas ocasiões, o preço é alto: paga-se com a vida. Em 1600 foi Giordano Bruno. Hoje outros continuam sendo mártires, doando a vida por uma educação de qualidade, lutando pela igualdade de gêneros, credos e preferências sexuais. Aqui fica a sugestão: assistir à peça e refletir por que valem a pena as nossas lutas. “Você tem fome de quê?”

Boa leitura! Claudia Liba

Publisher Claudia Liba claudia.liba@revistaversatil.com.br Conselho Editorial Alexandre Lourenço Antonio Gomes Claudia Ramos Lessa Gabriel L. Schleiniger Manoel Britto Foto de Capa João Caldas Jornalistas Claudia Liba MTB 66658SP Valéria Diniz MTB 66736SP Redação, edição de texto e revisão Valéria Diniz redacao@revistaversatil.com.br

Projeto gráfico e diagramação Mauro Souza Assistente de arte André Hiro Colaboradores Alexandre Lourenço Claudia Ramos Lessa Claudio Soares Rubens Borges Analista de rede social Gabriel L. Schleiniger

Distribuição Butantã, Morumbi, Parque dos Príncipes, Vila Madalena, Vila São Francisco. PARA ANUNCIAR ENTRE EM CONTATO (11) 8851 7082 / 3798 8135 ou envie uma mensagem para comercial@revistaversatil.com.br Versátil é uma publicação mensal, direcionada a mailing Vip, e não se responsabiliza por eventuais mudanças na

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educação

Educação, sim. Escola, sim ou não? perfil

Renata Castello Branco em Paraisópolis páginas verdes

Desafios da gestão de resíduos: o que fazer?

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capa

Celso Frateschi A hora e a vez de Giordano Bruno panorama

Os limites da tolerância e dos preconceitos musicais cultura versátil

livros

exposição

diversatilidade

Carta de um jornalista arrependido errata Edição 35 Maio 2012 Os musicais Roda Viva e Ópera do Malandro foram realizados no teatro e não na TV (como consta na pág. 14, no final do primeiro parágrafo da coluna do meio).

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Educação, sim. E A modernidade tem que conhecer os deveres e direitos que fundamentam o tratado de convivência humana através de suas leis.

Ser educado pressupõe um cidadão do mais alto quilate no quadro dos civilizados. A modernidade tem que conhecer os deveres e direitos que fundamentam o tratado de convivência humana através de suas leis. Da mesma forma, as ciências são legitimadas como fontes de aperfeiçoamento e de transformação; as ideologias, como refinamento cultural; a religiosidade, como aceitação da promessa de continuidade da existência. Eis tudo, ou quase tudo, em uma sociedade oscilante — que sai da tranquila Idade Média para o frenético movimento da pós-modernidade —, no volante do capitalismo, que aliena, que escraviza as pessoas em seus ritos de produzir e consumir, criando novos propósitos para os anseios do bem viver. A escola nasce velha em seu modelo de confinar pessoas na tenra idade e impor sua pedagogia sempre autoritária em nome do bem formar, educar e criar cidadãos. Acima

de qualquer suspeita, a escola retira os prazeres da infância descomprometida e livre para os folguedos, levando as crianças à obrigação de acordar pontualmente, vestir uniforme e aprender coisas de pouco interesse ou serventia no presente e no futuro. Criticam-se o governo, os mestres, alunos, prédios e métodos, mas não se critica a escola como instituição. Será este um caminho tranquilo para adquirir saber? Quantos serão os bem-sucedidos após dez ou vinte anos de prisão nos bancos escolares? Boas intenções existem como forma de minimizar o sofrimento, sempre disfarçado em nome do bem. Professores treinados para ensinar ludicamente, espaços coloridos e material didático com jogos e diversões disfarçam o clima hostil, e lá se vão anos e anos de serviço educacional obrigatório. Pais anseiam colocar os filhos cada vez mais precocemente nas escolas para prepará-los para a vida adulta, e também

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m. Escola, sim ou nรฃo?

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para guardá-los e ocupá-los enquanto correm em busca do sustento ou de maiores ganhos para assegurar o futuro. O presente só existe como degrau para um futuro incerto. Nada impede a criança de gozar a sua liberdade de ser. Tristes ou alegres, devem ir à escola. A gripezinha ao pé da TV somente nas férias ou diante de uma mãe, avó ou empregada tolerante que dispõem de tempo para esta escapulida. A discussão sobre o aumento do tempo na escola não passa pelas crianças, ou, poderíamos dizer, por todas as crianças. Algumas dão o seu depoimento do quanto é bom ficar na escola em tempo integral, inclusive nas férias. Estudar deve ser sempre bom, mas não é para a “criançaproblema”, que protesta contra tamanha intervenção em sua infância. Quem protesta é excluído das pesquisas sobre o assunto. Nada de ruas, praças e quintais. O playground tem horário de funcionamento e o recreio é curto para extravasar a sede de crescer como os lírios do campo. Crianças não fazem greve para reivindicar redução da jornada de estudo. Os adultos legislam e preferem maior tempo de confinamento. Enquanto a tecnologia nos liberta, criando robôs cada vez mais inteligentes, capazes de executar 360 trilhões de operações por segundo — como o Watson, criado nos laboratórios da IBM, ou o Deep Blue, que venceu o campeão de xadrez Garry Kasparov — a

Pais anseiam colocar os filhos cada vez mais precocemente nas escolas para prepará-los para a vida adulta, e também para guardá-los e ocupá-los enquanto correm em busca do sustento ou de maiores ganhos para assegurar o futuro. escola continua a repetir seus antigos jargões. As máquinas inteligentes desafiam os homens e, em ritmo de guerra, ganham a competição quando os substituem em postos de trabalho. O Google, por exemplo, mostra a primeira enciclopédia gigante e infinita a ser consultada em um “estalar de dedos” ou “piscar de olhos” (expressões pouco utilizadas por jovens internautas). Darcy Ribeiro, um dos idealizadores da escola em período integral, afirmou que, se fosse criança, preferiria ser

menino de rua para gozar de liberdade. A Escola da Ponte (e similares), modelo de escola aberta desenvolvida em Portugal, demonstrou a possibilidade da inserção espontânea de crianças e jovens considerados marginalizados por viver no mundo do crime, ligados a drogas, prostituição e violência, que buscam a escola como fonte de saber. Querem conhecer as coisas de acordo com os seus momentos e acabam por expandir o universo de conhecimentos, buscando cada vez mais um caminho suave, escolhido por si próprios. É utopia ou transgressão o ato de repensar de forma inteligente a pesada instituição chamada escola? A quem cabe a responsabilidade de equiparar o programa das escolas ao mundo da tecnologia, esquecendo galhofices como a inclusão digital, uma vez que as crianças já nascem com chips deste conhecimento e muitos ensinam seus professores a operarem as precárias máquinas das escolas? Despertem os sábios e convoque-os para movimentos e ONGs capazes de sensibilizar o Estado para a bandeira da libertação da infância. Que crianças e jovens possam viver a plenitude de serem livres das grades escolares e de seus derivados (cursos e academias), que em pouco tempo os tornam mais obsoletos que um robô movimentando um esqueleto humano. Claudia Ramos Lessa é professora e mestre em psicologia social.

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Renata Castello Branco em Paraisópolis Depois de revelar os meandros de Heliópolis, a fotógrafa Renata Castello Branco escolheu a comunidade de Paraisópolis, a segunda maior de São Paulo, com população estimada em 120 mil moradores, para realizar seu trabalho. Fotografando 95 casas, Renata valorizou, Versátil: Como surgiu a ideia do trabalho em Paraisópolis? Inicialmente, qual era o seu objetivo? Renata: Em 2010, ao visitar a retrospectiva do artista plástico Hélio Oiticica, me chamou a atenção um texto sobre os parangolés, que dizia que a inspiração para a confecção daquelas capas advinha da observação da estrutura fragmentária das favelas. Neste instante, lembrei-me de uma imagem, uma foto de meu arquivo pessoal, um skyline da comunidade de Paraisópolis, mais especificamente do bairro do Grotinho. Lembrava uma colcha de retalhos, ou “bricolage”, como se referia o próprio Oiticica. Assim surgiu Paraisópolis – uma cidade dentro da outra. Rodrigo

Castello, meu produtor, Negro San, nosso guia, e eu, mapeamos essa foto, batendo em cerca de 400 portas, contando sobre nosso projeto e convidando os moradores a participar do trabalho. Procuramos praticamente todas as casas que aparecem naquela foto ou que estão escondidas atrás em pequenas vielas. O objetivo era o registro da estética deste segmento da população, como os espaços

Uma vez por semana íamos à comunidade fotografar e colher depoimentos.

entre outros aspectos, a criatividade e a espontaneidade que se manifestaram visualmente no interior de cada uma delas. A exposição Paraisópolis, uma cidade dentro da outra fica no SESC Pompeia até 29 de julho, seguindo para o CEU Paraisópolis em agosto. Confiram entrevista exclusiva para a Versátil. estavam organizados, qual o critério de escolha dos objetos e como esses objetos ressignificavam o espaço. V: De que forma você apresentou a ideia à comunidade e qual foi a reação inicial das pessoas? R: Eu havia feito, em 2008, um livro na comunidade de Heliópolis. Meu produtor, Rodrigo Castello, batia nas portas, mostrava o livro de Heliópolis, contava sobre este novo projeto e convidava os moradores a participar. V: Como se deu o encontro com Negro San e qual a importância dele em seu trabalho? R: Já conhecíamos o Negro San, havia sido nosso guia em um 9

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trabalho anterior que fizemos na comunidade para o CDHU. Sua presença foi fundamental neste trabalho. Você não entra com uma câmera nas comunidades sem ter um guia local, alguém conhecido e aprovado pela comunidade. Ele foi o “fio de Ariadne” que nos conduziu por esse enorme labirinto que é Paraisópolis, a segunda maior comunidade de São Paulo.

à comunidade fotografar e colher depoimentos. A cada dia fotografávamos de três a quatro casas. Era bastante trabalhoso, porque as casas costumam ser muito pequenas e mal iluminadas. Tínhamos que fazer a luz, você pode imaginar, duas fontes de luz, câmera, tripés, computadores. Precisamos contar com a paciência e boa vontade dos moradores.

V: Como era a sua rotina em Paraisópolis? Pode contar histórias que marcaram sua vida? R: Toda semana, durante um ano e meio, o Rodrigo ia à comunidade fazer a pré-produção. Contatava os moradores, fotografava as casas e trazia para eu escolher. Uma vez por semana íamos

V: De quanto tempo você precisou para fotografar? Como deu por encerrado o trabalho? R: Minha meta inicial era fotografar 100 casas. Quando chegamos à marca de 84, percebi que já tinha um panorama daquilo que gostaria de mostrar e material suficiente para, além da exposição, fazer

Acho que com a minha exposição as pessoas vão ter uma visão da comunidade pouco comum. Mostro o interior das casas das pessoas de uma forma dignificante.

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um livro. Assim, encerramos o trabalho. V: Como era a sua imagem de Paraisópolis antes e depois deste trabalho? R: Já fotografei em inúmeras comunidades e sei que cada uma tem características próprias, principalmente em função de sua formação. Por exemplo, Heliópolis é uma comunidade basicamente de paulistanos que trabalham ou trabalharam no ABC. Paraisópolis é uma comunidade de nordestinos. Nunca fotografei a casa de um paulista em Paraisópolis. Isto determina diferenças de hábitos na comunidade. Por exemplo, Heliópolis quase não tem passarinhos em gaiola, já Paraisópolis, por ter uma tradição sertaneja, tem muitos passarinhos nas casas. Isto faz com que as pessoas se visitem para trocar, comprar e vender passarinhos, se encontrem em grupos nos finais de semana para participar de uma “briga de galo” com os passarinhos. Na verdade, eles não chamam desta

forma, mas é uma competição pública de qual macho canta mais. Agora conheço características específicas deste lugar, que criam para mim um “contorno colorido” que o distingue de outros. V: O que ficou do seu trabalho para a comunidade? R: Acho que com a minha exposição as pessoas vão ter uma visão da comunidade pouco comum. Mostro o interior das casas das pessoas de uma forma dignificante. A forma com que organizam seus espaços e decoram suas casas é bastante peculiar. Também faremos uma itinerância da exposição, do SESC Pompeia para o CEU Paraisópolis, e levaremos o livro de presente para todos os moradores das casas fotografadas. V: O que considera uma boa foto? O que é necessário para ser um bom fotógrafo? R: Posso dizer o que é importante para a minha fotografia. Não se trata de

uma mesma fórmula para todos. É necessário que se tenha amor pelo que faz, que seja persistente e que estude técnicas de iluminação, filosofia e arte. V: Depois de Paraisópolis, para onde deseja ir? R: Para o Delta do Parnaíba, no Piauí, lugar de minhas origens.

por Valéria Diniz

Serviç

o PARAI SÓ UMA C POLIS, I DA OU DADE DENT RO TRA SESC P ompei a. Rua Clé li (11) 38 a, 93, Pompe 7 ia, Até 29 1 7700. de julh o.

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A imprensa tem divulgado números de crescimento da economia bastante favoráveis nos últimos tempos. O governo, por sua vez, tem incrementado os programas sociais que promovem o aumento da renda e a melhor distribuição de riquezas. As famílias estão obtendo melhor qualidade de vida e a possibilidade de consumir produtos que há alguns anos nem pensavam em comprar. Tudo isto é muito bom: após muito sacrifício, os brasileiros, que por muitos anos conviveram com a inflação e a pobreza, hoje podem desfrutar de uma economia estável e preços acessíveis. Por outro lado, esta condição de melhora no padrão de vida leva à possibilidade da sociedade consumir mais produtos para satisfação de necessidades básicas, e por que não dizer, até de algumas extravagâncias que antes não eram possíveis, como realizar uma viagem mais longa ou adquirir o segundo veículo para a família. Entendemos ser muito positivo todo este panorama favorável, mas temos que pensar em alguns aspectos que são as consequências desta situação. O aumento do consumo de produtos certamente levará ao aumento de resíduos — gerados tanto no descarte do produto final como durante o processo de produção.

Podemos citar como exemplo as vendas de aparelhos de telefones celulares. Com base nos últimos levantamentos, o Brasil possui hoje cerca de 500 milhões de aparelhos vendidos. Isto representa algo próximo de três aparelhos por habitante. Há alguns anos, a população sequer possuía um telefone fixo. O rápido crescimento do mercado de telefonia móvel e o barateamento dos custos possibilitaram à população substituir o aparelho no momento em que percebe que o antigo está obsoleto. Isto acontece com uma velocidade incrível. Além disto, se pensarmos que um produto pode ser envolto, em alguns casos, em até sete embalagens, o consumo deste produto gerará uma quantidade ainda maior de resíduos. O mesmo ocorre em relação a computadores, aparelhos de TV e outros produtos disponíveis no mercado. O que fazer, então, com os produtos descartados, as embalagens e os insumos? Pensando no desafio à gestão dos resíduos, o governo propôs um texto para a Política Nacional de Resíduos Sólidos que atribui a todos os participantes da cadeia produtiva e de consumo, desde o produtor até o consumidor final,

O aumento do consumo de produtos certamente levará ao aumento de resíduos — gerados tanto no descarte do produto final como durante o processo de produção.

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A proposta mais viável até o momento está na implantação da logística reversa. Primeiramente, temos que entender do que estamos falando. A logística reversa consiste em um processo de retirada de produtos novos ou usados da cadeia de suprimentos, retornandoos aos responsáveis por sua geração para uma destinação adequada. Isto requer uma estratégia de logística inversa da que temos hoje nas empresas, que estude os melhores meios para fazer com que seus produtos cheguem até o consumidor final. Na

Desde a idealização e o projeto de um produto, o fabricante deve pensar em utilizar, na produção, material adequado, que permita seu reaproveitamento ou reciclagem.

logística reversa, devem-se estabelecer pontos de coleta para receber os bens usados do usuário final ou remover ativos da cadeia de suprimento para que se possa atingir uso mais eficiente do material. A efetiva implantação da Política Nacional de Resíduos Sólidos envolverá todas as camadas da sociedade: o fabricante do produto, os distribuidores e revendedores, o consumidor e o próprio governo. Estes “atores” deverão estabelecer iniciativas conjuntas para atingir os objetivos da legislação. O que parece ser simples não é tão fácil de ser implantado. A princípio, parece que basta estabelecer pontos de coleta, onde o consumidor final depositará seus resíduos, e alguém passará para coletá-los e encaminhá-los à reciclagem.

Porém, não é tão simples assim. Desde a idealização e o projeto de um produto, o fabricante deve pensar em utilizar, na produção, material adequado, que permita seu reaproveitamento ou reciclagem, garantindo que não se perca a maior parte de seu valor pelo manuseio ou armazenamento incorreto. Outro aspecto é que os produtos devem ter, tanto em sua distribuição para o consumo quanto em seu retorno à destinação, um sistema de transporte adequado, que preserve sua qualidade. Ainda se deve pensar na devolução dos bens ao fabricante — ou na venda dos mesmos em mercado secundário —, no reaproveitamento, na reciclagem ou em uma combinação que gere o maior valor para os bens. Cabe, então, um esforço conjunto entre os “atores” para que tais medidas sejam possíveis. O governo deve incentivar os mecanismos de coleta, estabelecendo parcerias e apoio à sociedade, que, por sua vez, deve exigir dos empresários sua cota de participação no processo. A quem cabe o pontapé inicial? Algumas empresas — como algumas do grupo varejista, que incentivam uma sinergia com os seus distribuidores — já adotam

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Rockwell Kent

a responsabilidade pela redução, destinação e pelo reaproveitamento destes resíduos. O grande problema é como fazer a implantação desta política em um país com dimensão territorial tão grande e culturas tão diferenciadas.


A solução para o problema dos resíduos sólidos no medidas para o recolhimento dos resíduos sólidos gerados por suas atividades. Com base em dados obtidos no 2º Encontro Técnico Política Nacional de Resíduos Sólidos, realizado em 28 de junho de 2011, ações do Grupo Pão de Açúcar dão conta da redução de 15% dos rejeitos enviados para aterros sanitários devido à implantação de 226 estações de reciclagem, distribuídas em 32 cidades brasileiras.

pela destinação dos resíduos, mas também por uma forma sustentável

a projetos voltados à coleta, reciclagem, destinação de resíduos sólidos e formação de cooperativas — integrando o governo, a iniciativa privada, as ONGs e a população.

pós-consumo e materiais recicláveis, e coordenar ações que permitam às cooperativas de catadores terem mais lucro e produtividade.

Pense bem. A solução para o problema dos resíduos sólidos no país não passa só pela destinação dos resíduos, mas também por uma forma sustentável de consumo à qual devemos nos adaptar e, assim, estabelecer uma nova ordem para a gestão dos resíduos sólidos.

Em paralelo, a Prefeitura de São Paulo, por meio do Fundo Especial do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável – FEMA, publicou em 12 de março um Edital de chamamento para apoio

é administrador, especialista em educação ambiental e secretário executivo do Fundo Especial do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (FEMA).

de consumo.

Rubens Borges

Rockwell Kent

O governo, por sua vez, vem incentivando parcerias com empresários, por exemplo, através do programa Dê a Mão para o Futuro - Ajude a gerar trabalho e renda, que será implantado no Estado de São Paulo para promover o hábito de separar embalagens

país não passa só

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Celso Frateschi Ator, autor e diretor, Celso Frateschi não tem sua força representada somente nos palcos. Ele também se apropria da palavra “atuar” para transformar a sociedade. Nos anos 1970, fundou o Teatro Núcleo Independente; em 1986, o Teatro Pequeno e, dez anos depois, com Roberto Lage, o Teatro Ágora Centro para o Desenvolvimento Teatral. A pesquisa, o estudo de autores e obras, a formação e o desenvolvimento de atores eram objetivos dos grupos. Mas, indiscutivelmente, o objetivo maior sempre foi, e ainda é, levar cultura às pessoas para que possam questionar a realidade em que vivem. A intensa atividade política também faz parte da vida de Celso Frateschi. Em 1989 foi Secretário de Cultura e, entre 1997 e 1998, Secretário de Esportes e Turismo, ambos os cargos na Prefeitura Municipal de Santo André. Assumiu, em 2001, a Direção do Departamento de Teatros da Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo. Em 2007, nomeado pelo então ministro da Cultura, Gilberto Gil, assumiu a Funarte – Fundação Nacional de Artes.

Foto: João Caldas

Na peça Processo de Giordano Bruno, Celso Frateschi vive o filósofo Giordano Bruno (1548-1575), morto pela Inquisição da Igreja Católica em 1600. A igreja acusou-o de herege por defender a ideia de que o sol girava ao redor da Terra e de que o universo era infinito, podendo haver outros mundos além da Terra. Diante do tribunal da inquisição, Giordano Bruno não abjurou suas ideias e foi queimado vivo.

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a hora e a vez de

Giordano Bruno “Um universo? Uma outra gruta, como na época em que habitava nas cavernas. É contra essa visão finita e doméstica do universo que levanto a minha voz. O espaço é infinito e acolhe inumeráveis astros que nele se movem. Cada um desses astros é tal que por si só pode mover-se e girar, é tão autossuficiente e capaz que por si só pode ser digno de ser considerado um mundo, é tão perfeito que pode conter inumeráveis e excelentes indivíduos, cujas condições de vida estarão em conformidade com o ambiente deles. A natureza infinita de Deus não é compatível com a criação de um mundo finito. Deus não limitou a criação concedendo preferências particulares à Terra, e o homem não pode decidir se a Terra é mais ou menos nobre do que um outro planeta. Talvez os habitantes de outros planetas sejam mais nobres que nós. Acredito que Deus tenha criado um infinito governado por uma livre vontade cósmica universal, uma unidade que abrange num todo único o espaço e o tempo, uma relatividade universal na imensidão da alma do mundo governada pela mente.”

Texto da peça Processo de Giordano Bruno, de Mario Moretti. Tradução de Rubens Rusche.

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Versátil: Celso, qual foi a sua primeira impressão diante do texto Processo de Giordano Bruno e da possibilidade de viver o filósofo que terminou a vida como mártir? Celso Frateschi: Giordano Bruno é um personagem presente na minha vida desde a década de 1970, quando assisti à interpretação de Gian Maria Volonte no filme de Giuliano Montaldo. Ao ler o original de Mario Moretti na tradução de Rubens Rusche, a memória dos anos de chumbo da ditadura militar voltou com força no meu espírito. Representar esse cientista e filósofo renascentista, que virou mártir ao ser queimado vivo pela Inquisição Católica, se desenha para mim como uma homenagem a todos os brasileiros que lutaram pela liberdade e que foram mortos ou desaparecidos, mas ainda estão esquecidos pelo Estado e pela sociedade brasileira. V: No início do texto, Giordano Bruno se refere a Mocenigo, que o denunciou, da seguinte forma: “Mocenigo acusoume de querer partir para ir ensinar a outras pessoas as mesmas ciências que lhe havia ensinado e recorreu a todo tipo de expediente para impedirme. Em seguida chamou um guarda e me mandou prender.” Atualmente, você vê a aquisição de conhecimento como ferramenta de controle social? O momento político em que vivemos remete às manipulações que o texto aborda?

CF: O conhecimento é ferramenta de libertação. Restringi-lo é uma forma de controle social. Hoje percebemos, nos meios de comunicação de massa, tentativas cada vez mais toscas de se exercer esse controle. No palco, busco uma forma de representar que proponha essa reflexão ao público. O personagem é mostrado em construção, como que pedindo a opinião da plateia sobre o que se passa a cada cena. Não mostro um personagem fechado e conclusivo, mas ofereço possibilidades de leituras diferenciadas, revelando o máximo de ângulos possíveis de sua personalidade. V: Acha que ainda repetimos comportamentos sectários? CF: Sinto que o momento em que vivemos ainda é um momento onde o preconceito, o sectarismo e o fundamentalismo são culturalmente dominantes, infelizmente. Talvez a manifestação da nossa diversidade ainda provoque a ira daqueles que, por insegurança, acreditam em “verdades absolutas”. Mas elas lhes dão apenas uma falsa impressão de tranquilidade. Qualquer balançar dessas verdades gera violência para garantir a afirmação dessas “verdades”. Parece que, segundo Freud, Bruno pertenceu aos primeiros que, junto com Copérnico e Galileu, promoveram o primeiro grande abalo das nossas grandes certezas, a de

Fotos: João Caldas

O conhecimento é ferramenta de libertação. Restringi-lo é uma forma de controle social. Hoje percebemos, nos meios de comunicação de massa, tentativas cada vez mais toscas de se exercer esse controle.

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V: Quando se refere à morte, Giordano Bruno faz uma analogia com a mente humana, que sai de sua prisão e se move por onde não há finais, limites, margens, muralhas. Na sua opinião, o ato de pensar é livre em uma sociedade democrática como a nossa?

V: Segundo a igreja católica, são necessárias a fé, a esperança e a caridade para que o homem alcance a salvação. O que pensa a respeito? CF: Não tenho esse tipo de crença. A esperança talvez só nos retarde a ação, e num mundo sem violência e injustiça, a caridade e a ajuda talvez não fossem necessárias. V: “Cedeste à humildade que se satisfaz com a fé. Não exercitas a inteligência, te prendes à autoridade. Não pensas mais, crês!” Você identifica atitude semelhante em relação à religião nos dias atuais?

CF: A religião pressupõe a fé cega em seus dogmas e isso não convive com o pensamento crítico. V: Você tem fé em quê? CF: Na vida. V: Ser ator no Brasil é ser também uma espécie de mártir? CF: Não. Ser ator para mim é um prazer e espero que o público também sinta prazer semelhante ao assistir aos nossos espetáculos.

por Claudia Liba

Fotos: João Caldas

que a Terra não era o centro do universo. O segundo abalo nos proporcionou Darwin, com o evolucionismo. O terceiro veio do próprio Freud, com a descoberta do nosso inconsciente. A potência de geração de felicidade desses abalos está na mesma proporção que a geração de infelicidade.

CF: Creio que estamos num processo de construção de nossa democracia. Um lento processo, mas que caminha. E a caminhada é eterna.

Serviço DE PROCESSO RUNO B O N GIORDA Moretti. o ri á M Texto: . bens Rusche Direção: Ru teschi, André Fra Com Celso i, elo Brandin Correa, Ang s e rm Feliz, He Dagoberto s. e m a uro Sch Baroli e Ma ra. o g Teatro Á la osa, 672, Be rb a B i Rua Ru 284 0290. Vista, (11) 3 lho. Até 15 de ju

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Na hora, simplesmente sorri assertivamente e seguimos nosso caminho. Mas a frase ficou em minha cabeça e me fez refletir sobre por que aquilo do que gostamos é melhor do que o gosto do outro? Vou ficar só no terreno musical, minha seara, para não complicar a reflexão, que pode ser estendida para qualquer situação em que exista escolha pessoal.

Dia desses, ao caminhar com uma amiga, tivemos o nosso espaço sonoro invadido pelo som extremamente alto de um carro estacionado, que tocava um gênero musical não apreciado por nós (não vou dizer qual para evitar qualquer tipo de preconceito). Ela disse: “que coisa ruim, eles bem que podiam ouvir Mozart ou Chico Buarque”.

Por que o que ouço é melhor do que a preferência do outro? Obviamente, acredito não ser isto a verdade, mas apenas para mim isto é verdade. Tenho quase certeza de que, para o outro, o que ouço é horrível, e apenas o que ele ouve é bom. Pronto, está estabelecido o conflito. Vamos à batalha!

Antes de tudo, devemos lembrar o seguinte: a música, assim como diversas manifestações artísticas, é apenas uma forma de expressão. Expressão de quê? Ah, de coisas e situações diversas. Ora nos manifestamos porque estamos felizes, ou porque estamos tristes, ou porque queremos nos comunicar com seres divinos, ou porque queremos meditar, enfim, porque estamos vivos. Expressão é isto, alguém querendo dizer algo, e só. Concordo que temos informações e formações diferentes, bem como sentimos de maneiras diversas e reagimos ao mundo de formas diferentes. Nosso planeta possui diferentes condições climáticas e

Gustave Doré - A Divina Comédia de Dante Alighieri (Canto 30)

“O inferno são os outros”, disse Sartre em sua peça teatral Huis-clos (Entre Quatro Paredes). Eu diria que o inferno são os outros e nós mesmos. Não quero, com este texto, comprovar tais frases, mas sim propor uma reflexão para que, quem sabe, algum de nós se torne uma espécie de paraíso — senão para os outros, ao menos para si próprio.

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Gustave Doré - A Divina Comédia de Dante Alighieri (Canto 30)


Igor Stravinsky teve a obra “A Sagração da Primavera” violentamente vaiada em sua estreia (gerando, inclusive, ataques de fúria por parte da plateia). Nos dias atuais, esta obra faz parte do repertório de todas as orquestras sinfônicas.

geográficas, e nossa adaptação ao meio ambiente ocorre de formas igualmente diversas. Graças a Deus é assim, caso contrário, o mundo seria um local muito chato e previsível. Neste ponto, é preciso lembrar outra coisa: a adequação, ou melhor, aquilo que é mais apropriado para determinada situação. Se estivermos com alguém que amamos, é conveniente dizer ou manifestar este sentimento. Se estivermos em um templo, é conveniente manifestar nossa fé, bem como se estivermos em um velório, é conveniente expressar nossa tristeza. Aqui temos um problema. Não são todas as pessoas em nossa sociedade que aceitam esta adequação, e muitas

resolvem arbitrariamente que é adequado se expressar ou colocar a pleno volume sua música preferida em qualquer situação ou local. Existem leis para regulamentar esta situação, mas elas são ignoradas sem o menor sentimento de culpa. Isto, sim, devemos combater e condenar. Apesar de chegar a um consenso (e eu espero que muitos concordem com a questão da adequação, para a convivência pacífica dos seres em nossa sociedade), isto ainda não responde a nossa pergunta inicial. Como um gênero pode ser superior a outro? Existe uma tabela? Sei que este assunto não pode ser tratado de maneira leviana, e tampouco resolvido em poucas linhas.

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Existem tratados, livros e muitos pensadores que discutem e pensam sobre este assunto, e não quero rivalizar com eles. Quero apenas despertar a reflexão. Não existe a tal tabela de classificação do bom gosto musical (existiram tentativas, mas não as discutirei). Podemos pensar em outros elementos para alguma classificação, tais como complexidade harmônica ou melódica, mas isto não determina a qualidade da obra. Uma obra pode ser simples e bela — e existem várias assim —, ou pode ser complexamente horrível. O uso da palavra “beleza” é também inadequado neste texto, pois obras que aceitamos como belas seriam consideradas horríveis em outras épocas. Cito um exemplo: um dos últimos quartetos para cordas (n° 19 - K. 465) de Mozart (sim, aquele mesmo, citado no início do texto, e que possui minha preferência) exibe no início uma série de dissonâncias que não foram bem aceitas em sua época, mas que hoje soam perfeitamente bem para nós (seus apreciadores, claro). Posso citar, também, a situação vivida por Igor Stravinsky, que teve a obra “A Sagração da Primavera” violentamente vaiada em sua estreia (gerando, inclusive, ataques de fúria por parte da plateia). Nos dias atuais, esta

Podemos pensar em outros elementos para alguma classificação, tais como complexidade harmônica ou melódica, mas isto não determina a qualidade da obra. Uma obra pode ser simples e bela — e existem várias assim —, ou pode ser complexamente horrível. obra faz parte do repertório de todas as orquestras sinfônicas, e certamente influenciou a maioria dos compositores sinfônicos do século XX. O que dizer, então, dos trovadores medievais, cantadores que viajavam de um vilarejo para o outro, cantando os acontecimentos da época (alguma semelhança com os repentistas e cantadores populares?!). Ah!... Neste ponto, tenho que citar novamente Mozart, que compôs várias peças corais com teor satírico e sexual (sacanagem mesmo) para serem cantadas nas tabernas. Não dá nem para dizer que as letras tinham duplo sentido, de tão diretas que elas eram (alguma semelhança com as

canções de duplo sentido atuais?!). O estranho, ou aquilo que desconhecemos, é sempre classificado inicialmente como ruim. Infelizmente, este é o ponto em comum que temos com o outro, que também acha o estranho ruim. Recentemente, soube, através de uma aluna, da reclamação de uma funcionária do escritório, que se assustou com a música ouvida em sua sala, classificando-a como algo satânico. Isto porque ela ouvia em sua sala (com o volume adequado e de maneira reservada, é bom que se diga) a sonata n° 7 para piano de Serguei Prokofiev. Posso dizer que esta é uma obra-prima de Prokofiev, mas o fato de soar estranho à funcionária, a fez sair correndo da sala. Este assunto é extenso e não poderia ser tratado em sua totalidade em um só texto. Repito, quero apenas dar início à reflexão sobre o assunto. Enfim, o que ouço não é melhor nem pior do que o que outra pessoa ouve. É apenas diferente. Devemos sempre ouvir o outro e tudo aquilo que ele traz consigo, pois através desta porta aberta damos início à possibilidade de sermos ouvidos também, sem uma série de preconceitos. Quem sabe, assim, não eliminamos os nossos infernos. Cláudio Soares klaus.soares@gmail.com

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Fotos: João Caldas

MARIA MISS Adaptação do conto “Esses Lopes”, de Guimarães Rosa, publicado no livro Tutameia. A história de uma sertaneja sonhadora, que teve a virgindade negociada pelos pais com um membro da família Lopes. Adaptação: Evill Rebouças. Direção: Yara de Novaes. Com Tania Castello, Daniel Alvim e Cacá Amaral. Teatro Eva Herz. Avenida Paulista, 2.073, Bela Vista, (11) 3170 4059. Até 25 de julho.

Foto: Barbara Copque

Foto: Felipe Araújo Lima

ESTAMIRA BEIRA DO MUNDO Adaptação do documentário Estamira, de Marcos Prado. A história real de Estamira, catadora de lixo no Aterro Sanitário do Jardim Gramacho (Rio de Janeiro), doente mental crônica com uma percepção de mundo surpreendente e devastadora. Adaptação: Dani Barros. Direção: Beatriz Sayad. Com Dani Barros. SESC Pompeia. Rua Clélia, 93, Pompeia, (11) 3871 7700. Até 29 de julho.

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Fotos: Paula Kossatz

Foto: Barbara Copque

O BOM CANÁRIO Texto: Zacharias Helm. O escritor Jack é casado com Annie, viciada em anfetaminas. Um editor de literatura pornográfica vê no romance de Jack a chance de ganhar muito dinheiro. Adaptação: Mauro Lima. Direção: Rafaela Amado e Leonardo Netto. Com Flávia Zillo, Joelson Medeiros, Érico Brás. Teatro Eva Herz. Avenida Paulista, 2.073, Bela Vista, (11) 3170 4059. Até 29 de julho.

MACBETH Texto: William Shakespeare. Trad.: Marcos Daud. Os generais Macbeth e Banquo ouvem profecias de três bruxas: o primeiro será rei; o segundo, pai de muitos reis. Macbeth, então, passa a eliminar quem ameaça seu domínio. Direção: Gabriel Villela. Com Marcello Antony, Marco Antônio Pâmio, Claudio Fontana. Teatro Vivo. Avenida Doutor Chucri Zaidan, 860, Itaim, (11) 2626 0867. Até 22 de julho. Shakespeare - Gravura de Martin Droeshout - 1623

Fotos: João Caldas

THE PILLOWMAN O HOMEM TRAVESSEIRO Texto: Martin McDonagh. Trad.: Bruno Guida. O artista é culpado pelos sentimentos que provoca? Até que ponto experiências primárias influenciam a criação? Estas são as indagações da peça. Direção: Dagoberto Feliz. Com Bruno Autran, Bruno Guida, Daniel Infantini, Flavio Tolezani e Wandré Gouveia. Viga Espaço Cênico. Rua Capote Valente, 1.323, Sumaré, (11) 3801 1843. Até 29 de julho.

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A CASA DA SEDA Antonhy Horowitz. Trad.: Maria Luiza Borges. O primeiro caso de Sherlock Holmes escrito por outro autor a obter reconhecimento e autorização oficiais para ser publicado. Na trama, um homem pede ajuda por estar sendo seguido há dias por alguém que possui uma cicatriz no rosto. Zahar. A DELICADEZA David Foenkinos. Trad.: Bernardo Ajzenberg. Oitavo romance de Foenkinos, considerado um dos melhores escritores da nova geração francesa. O livro narra as angústias e manias de cada personagem, contrastando a profundidade da paixão e da solidão com a mesquinhez e superficialidade das normas sociais. Rocco.

A REALIDADE OCULTA Brian Greene. Trad.: José Viegas Filho. O autor analisa diferentes teorias sobre os universos paralelos a partir dos fundamentos da relatividade e da mecânica quântica. Com figuras explicativas, orienta o leitor pelos labirintos da realidade profunda da matéria e do pensamento. Companhia das Letras.

A ÚLTIMA MADRUGADA João Paulo Cuenca. Considerado um dos jovens autores mais destacados da América Latina, Cuenca traz a reunião de suas melhores crônicas, publicadas em jornais entre 2003 e 2010. Na última, que dá nome ao livro, retrata, com olhar surpreso, as maravilhas do cotidiano que deixamos de perceber. LeYa.

A RODA DO VENTO Nélida Piñon. Nélida, uma das grandes damas da literatura, revela aqui um lado pouco conhecido: o de autora de livros infantis. Ela conta uma divertida história, temperada com muita imaginação, fazendo um registro de suas lembranças de infância e juventude e sobre o prazer da leitura. Record. A SUL. O SOMBREIRO Pepetela. “Manuel Cerveira Pereira, o conquistador de Benguela, é um filho da puta.” Este é o início do romance, ambientado no início do colonialismo angolano, que revela uma época desconhecida de sua história. Lutas de poder e conspirações envolvendo governadores e ordens religiosas são temas da obra. LeYa.

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CANTANDO UM BLUES Isaac Soares de Souza. Isaac conta a história do blues através de biografias e letras de músicas. O leitor se depara com um levantamento sobre a origem e influência do blues na música mundial e na música brasileira. Caricaturas das principais personalidades do blues dão ao livro um toque de humor. Estronho. CRISÁLIDA Org.: Jorge Schwartz. Fotografias de artistas, travestis, transformistas e personagens do teatro underground paulistano. As imagens são de Madalena Schwartz, feitas durante a década de 1970, período ao mesmo tempo repressivo e transgressor, graças à efervescência de temas ligados à liberdade sexual. IMS.

DIÁRIO DE BERLIM OCUPADA Ruth Andreas-Friedrich. Relato feito não por um historiador, mas por uma jornalista, que narra a derrota da Alemanha na II Guerra Mundial, a tomada de Berlim pelos russos e americanos e a barbárie que se inicia. O livro foi escrito como um diário no local dos acontecimentos. Editora Globo. FREUD, ME TIRA DESSA! Laura Conrado. Com leveza, a autora narra a história de Catarina, uma jovem que passa a morar sozinha em função do emprego. Ao procurar um terapeuta, não bastasse o doloroso processo de conhecer a si mesma, Catarina se apaixona por ele. Baseado em uma experiência da autora. Novos Talentos.

LUZES DA ÁFRICA Haroldo Castro. Um fascinante relato da jornada vivida pelo autor e seu filho, que percorreram 40 mil quilômetros no continente africano, visitando18 países. Longe dos clichês da miséria e da guerra, o livro descreve as aventuras e apresenta com lucidez uma percepção peculiar sobre um continente de surpresas. Record. MORANGO E CHOCOLATE Senel Paz. David, um jovem revolucionário, conhece Diego, homossexual assumido, patriota e nacionalista. Surge, então, o dilema: o dever “patriótico” da denúncia ou a aceitação de uma amizade inesperada? A história se passa em Havana e é um canto à amizade e à tolerância. Geração Editorial.

JAMES BROWN: SUA VIDA SUA MÚSICA R.J. Smith. Trad.: Luis Reyes Gil. Sua popularidade levou-o a fazer mais de 350 shows por ano. O livro conta a história do artista desde sua criação, no bordel de sua tia, aos 44 sucessos na Billboard. Das primeiras bandas ao show na luta mais importante da história do boxe, com Muhammad Ali na África. LeYa.

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NOSSO FIEL TRAIDOR John LeCarré. Trad.: Mauro Gama. Durante férias em Antígua, um casal britânico conhece o misterioso russo Dima e concorda em ser intermediário em um acordo com o serviço secreto britânico. O que o casal não sabe é que Dima é um dos cabeças de um esquema de lavagem de dinheiro da máfia russa. Record. NUNCA SE CASE COM UMA MULHER DE PÉS GRANDES Mineke Schipper. Trad.: Manuela Torres. Em diversas culturas, as questões de gênero são expressas em provérbios. O livro, resultado da análise feita durante anos pela autora, traz insights reveladores sobre a condição feminina através dos séculos e continentes. Bertrand Brasil.

PARIS REVIEW 2 Vários. Trad.: George Schlesinger. O volume traz entrevistas transcritas e editadas com a supervisão dos autores, nomes como Salman Rushdie, Tennessee Williams e Milan Kundera. A poetisa Elizabeth Bishop se refere ao Brasil ao reconstituir episódios de sua permanência no país. Companhia das Letras. O SOM DA REVOLUÇÃO Rodrigo Merheb. A história cultural do rock entre os anos psicodélicos de 1965 a 1969, época de intensa turbulência social. As aventuras eletrificadas de Jimi Hendrix, Beatles, Pink Floyd e Bob Dylan se interligam em uma narrativa que detalha a trilha sonora da contracultura. Civilização Brasileira. O PAI DOS BURROS: DICIONÁRIO DE LUGARESCOMUNS E FRASES FEITAS Humberto Werneck. O livro é o resultado da obsessão do jornalista, que há mais de três décadas coleciona expressões que, de tão repetidas, tornaramse lugares-comuns ou frases feitas. O uso indiscriminado tornou-as carentes de significado. Arquipélago.

O PODER DOS QUIETOS Susan Cain. Trad.: Ana Carolina Bento Ribeiro. Com base em estudos científicos e extenso trabalho de pesquisa, a autora mostra que a introversão é fundamental para a criatividade e a inovação. Para ela, as instituições dedicadas a extrovertidos desperdiçam talento, energia e felicidade. Agir. TODA RÊ BORDOSA Angeli. Todas as tiras da personagem Rê Bordosa foram restauradas digitalmente a partir dos originais do autor. Dotada de humor ácido e cinismo incontornável, Rê Bordosa viveu porres homéricos, ressacas épicas e amores tão duradouros quanto uma tira de jornal. Companhia das Letras.

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A DESASTRADA MAQUINARIA DE DESEJOS: A PROSA DO OBSERVATÓRIO DE JULIO CORTÁZAR Mônica Genelhu Fagundes. Estudo de um dos livros mais originais de Cortázar, a Prosa do Observatório. A autora defende a importância de sua leitura, analisando o texto e as fotos do autor no observatório de Jaipur (Índia). Porto de Ideias. A SUPERFÍCIE DA SOMBRA Tailor Diniz. No romance, os narradores se alternam entre dúvidas e certezas. As linhas que definem o que elas são, e até onde vão, não são concretas e é sobre elas que o personagem Antônio pensa se equilibrar, numa trama que acontece à sua revelia e que protagoniza sem perceber. Grua. CORAÇÃO DOCENTE Jorge Claudio Ribeiro. As emoções, experiências e descobertas do autor, ao longo de décadas de docência, estão em suas crônicas. Elas relatam os itinerários do professor dentro da sala de aula e em viagens de aprendizado pelo mundo. Com prefácio de Mario Sergio Cortella. Olho D’Água.

ROBIN HOOD A LENDA DA LIBERDADE Pedro Bandeira. Há muito tempo, na Inglaterra, surgiu o herói Robin Hood. Na época, reis e nobres tomavam tudo dos pobres, e quem reclamasse era preso. O herói enfrentava os poderosos, defendia os humildes e oferecia a esperança da liberdade. Ilustração: Weberson Santiago. Moderna. SERROTE#11 A revista quadrimestral do Instituto Moreira Salles traz, entre outros ensaios, um perfil da escritora Marguerite Duras feito por Enrique Vila-Matas; duas cartas de Beckett sobre Esperando Godot e um texto inédito de Susan Sontag (1933-2004), “Peregrinação”, no qual descreve o encontro com Thomas Mann. IMS.

FÉ NA ESTRADA: SEGUINDO OS PASSOS DE JACK KEROUAC Dodô Azevedo. Dodô leu On the road, de Jack Kerouac, aos 16 anos, e fez planos de refazer a viagem do autor aos EUA para resgatar a cultura beatnik. Em 2003, com um inglês “macarrônico”, realizou seu sonho e tornou-se conhecido da Costa Leste a Oeste. Casa da Palavra.

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Mick Carnicelli Paisagem, São Paulo, 1943

AUDÁCIA CONCRETA AS COLAGENS DE LUIZ SACILOTTO Sacilotto (1924-2003) usou a colagem para vencer suas limitações motoras. A mostra exibe 20 colagens (nunca expostas), serigrafias e estudos sobre o seu processo criativo. O público pode ver um dos últimos registros do artista em vida: um documentário produzido pela SESC TV. CAIXA Cultural São Paulo. Praça da Sé, 111, Centro, (11) 3321 4400. Grátis. Até 29 de julho.

SÃO PAULO, UM OLHAR DE IMIGRANTES Cerca de 30 trabalhos apresentam São Paulo sob o olhar de artistas imigrantes que chegaram à cidade no início do século XIX. Entre eles estão os japoneses Massao Okinaka e Tomoo Handa, os italianos Mick Carniceli e Ottone Zorlini, o húngaro Thomas Farkas e a alemã Hilde Webber. Pinacoteca do Estado de São Paulo. Praça da Luz, 2, Bom Retiro, (11) 3324 1000. Até dezembro de 2012.

MEMÓRIA DO RITO TRADIÇÕES POPULARES ITALIANAS Lamberto Scipioni. Ao longo do ano, eventos religiosos, esportivos e folclóricos ocorrem em toda a Itália, em um mosaico de cores, sabores, cantos, danças, artesanato e costumes locais. O fotógrafo ítalo-brasileiro registrou vários ritos que refletem a diversidade cultural das cidades italianas. Grátis. SESC Vila Mariana. Rua Pelotas, 141, Vila Mariana, (11) 5080 3000. Até 12 de agosto.

VISÕES DE GUERRA Reunião de 75 aquarelas de Lasar Segall, feitas para um caderno jamais publicado, assim como obras relacionadas (pinturas, desenhos, esboços). Segall desenhou-o no Brasil, durante a Segunda Guerra, retratando a debilidade humana diante do horror. O caderno foi exposto ao público apenas duas vezes. Centro da Cultura Judaica. Rua Oscar Freire, 2.500, Pinheiros, (11) 3065 4333. Até 12 de agosto.

gli spinati

sartiglia

polenta

regata veneziana

Desenho original do Caderno “Visões de Guerra 1940-1943”, Acervo Museu Lasar Segall IBRAM – MinC

Nossa Senhora Achiropita

Campo de concentração, 1945, coleção particular

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Carta de um jornalista arrependido O texto abaixo foi encontrado em um barco à deriva e é verídico. “Caro leitor, eu peço desculpas. Sim! Peço desculpas pelo engodo que esta coluna foi durante todos estes anos. Quanta mentira, quanta dissimulação, quanto dado omitido e distorcido! Aos que enxergaram neste espaço um excerto de verdade e uma análise apurada, lamento dizer que meus textos nunca passaram de uma espécie de ficção marota e interesseira. Sou uma vergonha à classe jornalística! Sei que é difícil de acreditar que, durante tantos anos, textos bem escritos com linguagem clara e português castiço fossem produtos de uma mente doentia, de absoluta deformação moral. A verdade é que o papel aceita tudo. E a cabeça de quem lê, reproduz, tal qual um cacoete, o papel do papel. Quem maneja uma pena com habilidade sabe construir uma ilusão. Quantas vezes não bajulei você, leitor! Fiz apologia de sua suposta sabedoria, enaltecendo sua experiência democrática. Que balela! Como pode um povo ser sábio se reelege os mesmos vigaristas e corruptos eleição após eleição? Nunca acreditei nisso. Sempre achei o grande público uma massa de manobra dócil e indolente, pronta para ser guiada à urna como um bezerro em sacrifício. Dissimulei descaradamente meu desprezo por essa falta de cultura política e irresponsabilidade cidadã porque precisava de leitores. E eu sabia que podemos nos defender de uma ofensa, mas somos indefesos contra um elogio: adular o leitor era o melhor caminho para conquistá-lo e aumentar a repercussão da minha coluna. Fiz aquilo que é sagrado para políticos populistas: enaltecer o povo e seus valores, mesmo quando são ignorantes, predatórios, hipócritas e não civilizados.

Mas isso é apenas marginal na minha lista de pecados. Quantas vezes não noticiei fatos enviesados, soprados em meus ouvidos por pessoas com interesses privados em veicular suas versões pela imprensa? Alegando interesse público, eu noticiava o que minha fonte queria, ganhando um furo jornalístico e a fidelidade da fonte, o que me garantia furos futuros. E minha fonte se lambuzava no deleite da vingança e da retaliação contra seus inimigos políticos. Se não havia um grande furo, eu simplesmente recheava meu texto com informações irrelevantes e dispersivas, geralmente atacando genericamente a corrupção do país. Quantas vezes defendi pontos de vista pessoais usando a expressão ‘Pesquisas indicam que...’ , quando na verdade não havia pesquisa nenhuma! (Como é bom não ter que referenciar notícias de jornal). Mesmo quando havia, eu tratava de omitir todas as pesquisas em contrário para dar uma impressão de conhecimento consolidado e unânime. Quantas cartas de leitores recebi me contestando, várias delas muito bem fundamentadas. Eu as ignorava solenemente, sabendo que elas jamais iriam repercutir sem um espaço para serem conhecidas. A Internet atrapalhou bastante nesse sentido, mas raros são os internautas com visão crítica para discernir um texto pertinente da montanha colossal de lixo e futilidade distrativa que flutua pelo oceano da rede. Basta bater o olho na área de comentários dos sites de notícias, que mais parece a parede pichada de um banheiro público, com comentários ofensivos, mal escritos, superficiais, preconceituosos

e inúteis. Frequentemente se prestam mais à vaidade de quem os escreve. Quantas vezes fiz prognósticos totalmente chutados, ajustando os fatos às minhas teorias pessoais! Pirotecnia verbal sempre foi o meu forte. Apenas incidentalmente alguém se recorda de uma das inúmeras previsões minhas que deram errado. A maioria, a imensa maioria, apenas esquece, como se reformatasse o disco rígido a cada manhã. Bastava que eu retomasse os sucessos e dissolvesse os fracassos sob um manto de silêncio espesso. Meus desvios éticos não se resumem a estes descritos, mas agora que a morte se aproxima, espero que alguém encontre esta carta e a encaminhe ao jornal onde escrevo. Quem sabe esta confissão póstuma possa redimir minha alma do destino sombrio reservado aos cínicos e aos manipuladores.” O presente texto foi atribuído ao jornalista S.P.A., da TRIBUNA EMANCIPATÓRIA DE CAFEZAL DO NORTE DO RIBEIRA. O barco à deriva, no qual esta carta foi encontrada, era de propriedade desse jornalista, que foi resgatado pela polícia marítima depois de duas semanas perdido em alto-mar. Já em terra firme e devidamente hidratado, alimentado e aquecido, ele negou veementemente que fosse o autor dessa carta. Só mudou de ideia quando sua letra foi identificada por amigos e por um grafologista da polícia. Posteriormente, assumiu a autoria, mas alegou tratar-se de mero exercício de ficção. Exatamente como este texto. Alexandre Lourenço

é veterinário, microbiologista, professor, bípede, mamífero e, agora, escritor. Não necessariamente nesta ordem. duralex@uol.com.br www.microbiologia.vet.br

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