VERDE VERSÁTIL

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ano 4 edição especial semestral nov/2011 a abr/2012 - ISSN 2179 5606 - R$ 15,00

M A R I N A M O R E N A D O B R A S I L Verde



EDITORIAL

Publisher Claudia Liba

POR CLAUDIA LIBA

Direção Executiva Verde Versátil Luana Capobianco

aos leitores

Conselho Editorial Alexandre Lourenço, Antonio Gomes, Claudia Ramos Lessa, Gabriel Leicand, Gabriel L. Schleiniger, Juliana Jamilles.

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ANDRÉ LIMA

10 SAÚDE OS EFEITOS DA POLUIÇÃO NA SAÚDE PAULO SALDIVA

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Foto de Capa Cacá Meirelles

CAROS LEITORES, com muita felicidade produzimos a primeira edição Verde Versátil, sonhada há tanto tempo! Uma expressão usada por Marina Silva na entrevista dá o tom desta edição especial: é necessário ser “sonhático”. Em minha infância, vislumbrava um mundo com maior envolvimento entre as pessoas, entre as pessoas e a natureza. Havia ar puro, passeios no pico do Jaraguá, Horto Florestal, com poucos automóveis nas ruas. Tinha o bate-papo entre vizinhos e brincávamos na rua. Hoje, as crianças vivem indoor. As brincadeiras de rua foram substituídas por jogos no computador. Mas nunca perdemos a capacidade de sonhar. De meus sonhos veio a escolha da profissão: bióloga. Não me cansa observar a natureza, com ela relacionar-me. Hoje, com muito prazer, levo a você, leitor, matérias de qualidade, que tornaram a Verde Versátil a primeira das futuras publicações semestrais voltadas ao tema sustentabilidade. Agradeço à Marina Silva por gentilmente nos receber e contar como seus sonhos percorreram caminhos árduos e de muitas conquistas, e aos renomados profissionais que trouxeram informações importantes sobre os biomas brasileiros, o Código Florestal e a educação ambiental. Alegra-me a presença de ilustradores, escritores e músicos nesta edição. A arte traz tons, sons e a beleza que uma vida sustentável requer. A todos que acreditaram na Versátil desde seu início, em 2007, meu carinho. A Verde Versátil inaugura uma nova fase. Não um sonho, mas um nascimento. Dedico a Verde Versátil à memória de meu pai.

Claudia Liba claudia.liba@revistaversatil.com.br twitter @versatilmagazin

Redação, Edição e Revisão de Texto Valéria Diniz redacao@revistaversatil.com.br

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17 ARQUITETURA A REFAZENDA: UMA CONTRUÇÃO SUSTENTÁVEL EDER VENDRAMEL

18 ARTE A DANÇA DA SELVA MANOEL BRITTO

20 PENSAMENTO ECOSOFIA: BICHO DE TRÊS CABEÇAS 18

Analistas de Redes Sociais Caio Gasparetto Diniz da Silva, Gabriel L. Schleiniger, Juliana Ferrari.

CLAUDIA RAMOS E LESSA

22 LIXO RECICLA ALFREDO ROCCA

24 COTIDIANO NÃO ESTOU SENTINDO NADA!

Versátil Online www.revistaversatil.com.br twitter @versatilmagazin

ANTONIO GOMES

25 POESIA A MATA F. MARCOS

Impressão W Gráfica

26 CAPA MARINA MORENA DO BRASIL

Distribuição Butantã, Morumbi, Parque dos Príncipes, Vila Madalena, Vila São Francisco.

Verde Versátil é uma publicação semestral direcionada a mailing Vip, focada em sustentabilidade e não se responsabiliza por eventuais mudanças na programação fornecida, bem como pelas opiniões emitidas nesta edição. Todos os preços e informações apresentados em anúncios publicitários são de total responsabilidade de seus respectivos anunciantes, e estão sujeitos a alterações sem prévio aviso. É proibida a reprodução parcial ou total de textos e imagens publicados sem prévia autorização.

INSTITUTO 5 ELEMENTOS/ MÔNICA BORBA

ILANA VOLCOV

Projeto Gráfico Luana Capobianco

PARA ANUNCIAR ENTRE EM CONTATO: tels. (11) 8851 7082 / (11) 3798 8135 comercial@revistaversatil.com.br

AMBIENTAL 12 EDUCAÇÃO EDUCAÇÃO PARA A SUSTENTABILIDADE

14 MÚSICA O SILÊNCIO MUSICAL - MEDITAÇÃO E MEREDITH MONK

Repórter Especial de Meio Ambiente Juliana Ferrari

Diagramação Keila Carvalho

06 CIDADANIA Código Florestal

ENTREVISTA EXCLUSIVA MARINA SILVA

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34 NEGÓCIOS LUCRO VERDE: O QUE SE ANDA FAZENDO PELO MEIO AMBIENTE? RUBENS BORGES

BRASILEIROS 38 BIOMAS AMAZÔNIA, CERRADO, PAMPA, MATA ATLÂNTICA, PANTANAL, CAATINGA POR DIVERSOS PESQUISADORES

64 EDUCAÇÃO MELHORANDO A QUALIDADE DE VIDA NAS ESCOLAS MARCOS GALVEZ

65 CRIANÇA CUIDANDO DO PLANETA 38

POR ELAS MESMAS


CIDADANIA

CÓDIGO FLORESTAL

ANDRé LIMA

André Lima, nosso entrevistado, é advogado, mestre em Gestão e Política Ambiental e pesquisador do Programa de Mudanças Climáticas do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM). Diretor do Departamento de Articulação de Ações para a Amazônia e de Políticas de Combate ao Desmatamento do Ministério do Meio Ambiente de 2007 a 2008, hoje participa ativamente das discussões sobre as alterações do Código Florestal. Defende, entre outras medidas, o incentivo à produtividade nas áreas já abertas pelo desmatamento como uma das principais soluções para o impasse. Da bancada dos ambientalistas, André não abre mão de princípios como a exigência de manutenção de 80% de floresta preservada, opondo-se aos ruralistas, que querem reduzir esse percentual para 50%. A Verde Versátil conversou com André e traz a vocês uma entrevista que esclarece, de forma bastante objetiva, o risco que o nosso país está vivendo. Vale sempre a reflexão. O IPAM é uma organização ambiental não-governamental fundada em 1995 com a missão de contribuir para um processo de desenvolvimento da Amazônia que atenda às aspirações sociais e econômicas da população.

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VV: Gostaria que o senhor explicasse de forma sintética o que está ocorrendo na prática com a questão polêmica do Código Florestal. André Lima: O que acontece é que, nos últimos dez a quinze anos, a sociedade brasileira vem acordando para a questão da preservação dos ecossistemas naturais, nossas florestas, os biomas Cerrado, Pantanal, Mata Atlântica, Amazônia, Caatinga. Esta conscientização vem se refletindo nas ações do governo no sentido de coibir e fortalecer o controle do desmatamento, fiscalizando e cobrando a fiscalização em relação às leis ambientais. Uma destas leis é a do Código Florestal; a outra é a Lei de Crimes Ambientais. Com a conscientização, o governo começou a forçar a implementação da lei. Isto significa que o muito que foi feito de errado para trás, em termos de desmatamento ilegal, principalmente nas chamadas Áreas de Preservação Permanente (margem de rios, nascentes, montanhas, morros e outras áreas), foram desmatadas ilegalmente. Muitas recentemente, nos últimos dez anos, e o governo está na cola cobrando a recuperação destas áreas. Por isto existe uma reação das classes representativas de lideranças políticas do setor agropecuário para que a legislação seja revista, para que não sejam cobradas pelo que foi feito de errado.

VV: Poderia citar alguns exemplos de discordâncias entre ambientalistas e ruralistas? AL: Poderia citar vários, mas vou me deter nos mais urgentes. Um problema grave é que a proposta é ignorar, simplesmente, tudo o que foi feito de errado. Criaram uma figura chamada Área Rural Consolidada, que propõe a manutenção de vários tipos de ocupações ilegais na beira de rios, nas nascentes. Crimes de desmatamento ocorridos até julho de 2008, portanto bem recentes, podem ser beneficiados pelo conceito de Área Rural Consolidada. O que os ambientalistas aceitam e propõem como uma forma de tentar chegar a um acordo é considerar consolidados os desmatamentos contínuos anteriores à Lei de Crimes Ambientais e às mudanças que ocorreram no próprio local. Se você fez um desmatamento na década de 1990 até a entrada da Lei de Crimes Ambientais em 1998, é possível considerar como Área Rural Consolidada, porque até então a lei ou era ambígua, ou foi alterada, criando situações que não eram interpretadas como ilegais. As pessoas ocupavam conforme a lei, mas depois se tornava ilegal. É quase consenso entre os ambientalistas que é possível trabalhar o conceito de Área Rural Consolidada. Mas não nos novos desmatamentos! Inclusive, temos uma Lei de Crimes Ambientais para fortalecer a situação da degradação ambiental e, depois disto, a gente vai dar anistia para desmatamentos ocorridos entre 1998 e 2000 e pouco. Tem uma distância muito grande. Significa 140 milhões de hectares de desmatamentos ilegais ocorridos no Cerrado e na Amazônia. Não estou falando nem dos outros biomas! Então, há um volume grande de desmatamento ilegal em que o Estado ou a lei podem acabar privilegiando quem a infligiu, sem dar nenhum tipo de benefício para quem a cumpriu. É uma lei injusta. VV: Então, o senhor vê um retrocesso no relatório apresentado, que acarretaria incentivo ao desmatamento? AL: Incentiva o desmatamento por dois motivos: primeiro, porque está premiando o infrator, o que gera um sentimento de impunidade e, por outro lado, muito grave, a lei também cria facilidades para a regularização de novos desmatamentos, ou seja, vai valer a pena desmatar. VV: Quais consequências o senhor vê caso seja aprovado o relatório proposto pelo deputado Aldo Rebelo no Senado? AL: Não dá para prever! A verdade é que o boato que corre no meio rural é que tudo o que foi feito para trás vai ficar como está! Isto gerou, por exemplo, no Estado do Mato Grosso,

Miriam Prochnow

“a lei também cria facilidades para a regularização de novos desmatamentos, ou seja, vai valer a pena desmatar”

uma corrida para aumentar o desmatamento. Aumentou nos últimos três meses! E a gente debita esta corrida ao debate do Código Florestal. VV: Os cientistas da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência) e a ABC (Academia Brasileira de Ciência) manifestaram-se publicamente, através de uma carta ao presidente do Senado, José Sarney, solicitando discussão mais profunda em relação às alterações propostas. Gostaria de saber do senhor qual é o peso das análises da equipe técnica de biólogos, engenheiros florestais, ecólogos e outros profissionais altamente gabaritados para a compreensão e as decisões pertinentes ao assunto sobre o que vivenciamos hoje em relação ao Código Florestal. AL: Deveria ser mais relevante. O problema é que os ruralistas levam esta discussão para os campos econômico e político. Justificam a necessidade da utilização destas áreas através de argumentos econômicos, mas desconsideram completamente que o desgaste e a degradação ambiental também têm um custo para eles. Custo não mensurável objetivamente de forma clara, mas custo que será cobrado da sociedade a longo prazo. Tem a ciência econômica, a ciência política e as ciências naturais. As naturais dizendo que a proposta é ruim; as econômicas tratando a questão de forma enviesada e com lacunas, porque não avançaram o suficiente para poder tratar a economia ecológica, a economia da degradação ambiental e o custo da mesma a médio ou longo prazo para a sociedade, o poder público e a produção agropecuária. E tem as ciências políticas, outro elemento desta história. Há uma conjuntura política volátil: a base de apoio do governo Dilma varia de acordo com 7


“O PROBLEMA DO DESMATAMENTO NÃO SE REFERE APENAS À AMAZÔNIA, MAS AOS BIOMAS DO PAÍS INTEIRO“

os temas. Em relação ao Código Florestal, o governo não se empenhou para fazer cumprir isto. A Dilma se comprometeu durante a campanha a não aceitar retrocesso, anistia e mais desmatamento. VV: Como seria possível resolver a questão da área agricultável, uma vez que vivemos em uma condição privilegiada em relação ao tamanho desta área? AL: Antes de tudo, o problema do desmatamento não se refere apenas à Amazônia, mas aos biomas do país inteiro. Sobretudo na região Centro-Sul, porque a média de vegetação nesta região não passa de 20%. Ainda nesta área, há sub-regiões que não têm nada de vegetação, e isto tem consequências não apenas para o clima local, mas para a produção de insumos para pecuária e a disponibilidade de água. Por isto há cada vez mais transposições, aquedutos e aquíferos, cujos custos são muito altos. Quando a gente tem malha hídrica, ela tem que ser mantida, conservada. O Código Florestal serve para isto. A sua pergunta não é fácil responder, mas é fundamental que a sociedade não esqueça em quem votou. Deve ir atrás dos parlamentares, mandar e-mail, ligar para gabinetes, assessorias, dizer que está preocupada com o tema e o que espera do trabalho deles, para que se sintam monitorados, pressionados. Há uma distância muito grande entre o que os parlamentares fazem em Brasília e o discurso deles nas campanhas, nos eventos midiáticos. Distância entre discurso e prática. Se não criarmos algum tipo de constrangimento em nossos parlamentares, eles vão se sentir à vontade para votar o assunto de acordo com o projeto no momento da votação.

VV: Quanto tempo ainda temos para fazer esta “pressão”? AL: Pouco mais de um mês. Na verdade, é pra já, porque a matéria já foi para a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) e está no Senado. Agora, passa a ser discutida no Ministério da Ciência e Tecnologia, da Agricultura e, por último, na Comissão do Meio Ambiente. Na plenária do Senado, dependendo do que for decidido, volta para a Câmara, porque a tendência é modificar o relatório no Senado. É um processo complexo, um rolo compressor até a votação, e o esforço que estamos fazendo é para ter mais debates para compreender melhor a proposta e poder melhorar. VV: O que você falaria para as crianças sobre meio ambiente? AL: É o direito delas que está sendo dispensado. Hoje, a gente já paga um pouco da conta do que nossos avós fizeram. As crianças de hoje terão mais dificuldades quando forem adultas, porque receberão algo, infelizmente, pior: clima mais aquecido, água mais cara, menos áreas de lazer, o equilíbrio ambiental bastante comprometido. Isto com desdobramentos em vários campos, como cultura, lazer, saúde e até na educação, porque a biodiversidade é a chave para a ciência e a tecnologia. Estou falando do direito da criança. Saibam que seus pais têm responsabilidade pelo que vão deixar aos filhos. Falem com seus pais para que se mobilizem e assinem o abaixo-assinado!

(entrevista concedida em out/11) 8


“A poluição traz os mesmos problemas que o cigarro”

“Se for correr, é preferível que não seja em vias de tráfego, e é melhor tentar fugir dos horários de pico”

SAÚDE

OS EFEITOS DA POLUIÇÃO NA SAÚDE

PAULO SALDIVA por Juliana Ferrari e Claudia Liba

Uma busca constante e atual de nossa sociedade é o resgate do contato com a natureza para melhorar a qualidade de vida. Evidentemente, o homem distanciou-se do que o mantém vivo, com saúde. Daí o aumento de demandas como alimentos orgânicos, automóveis movidos a álcool, biocombustíveis em frotas de veículos pesados, a preferência por produtos sustentáveis. Apresentamos aqui uma conversa com o Dr. Paulo Saldiva, da FMUSP (Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo). Ele fala sobre os problemas de saúde decorrentes da poluição do ar e expõe dados alarmantes que mostram a necessidade de encontrar formas de alcançar melhor qualidade de vida no ambiente urbano. Verde Versátil: Moradores de bairros como Granja Viana, Ibirapuera, Jardins, ou próximos a grandes áreas verdes, como Parque do Carmo e Serra da Cantareira, sofrem menos com a poluição atmosférica? Paulo Saldiva: Não. A poluição do ar tem uma mobilidade grande pelas características da área. É evidente que, se você mora do lado de uma avenida, de grandes corredores de tráfego, são os locais onde tem maior concentração de poluentes. Mas você pode ter, mesmo fora dos grandes corredores de tráfego, certa mobilidade de poluentes. A região oeste é uma das regiões onde precursores de ozônio emitidos em São Paulo vão gerar ozônio nessas regiões. A Granja Viana pode ter um nível maior de ozônio; em geral, poluentes secundários, não aqueles que saem dos escapamentos dos carros. Os maiores níveis de ozônio em São Paulo estão em direção às regiões noroeste e oeste, pelo tipo de vento que ocorre durante o dia. VV: Quais impactos na saúde estão associados à má qualidade do ar? Como podemos preveni-los ou minimizá-los? PS: A poluição do ar tem um risco pequeno, mas, infelizmente, o número de pessoas afetadas é grande. Quem mora em cidades poluídas tem mais de 10% de chance para desenvolver câncer de pulmão. Um indivíduo que fuma dois maços de cigarro por dia tem um risco quinze vezes maior do que isto. Então, o risco é de 1.500 contra 10, ou seja, a poluição traz os mesmos problemas que o cigarro traz, só que em pequena escala. Porém, a poluição tem uma característica diferente do cigarro, já que afeta muitas pessoas. Embora o risco seja pequeno, a porcentagem atribuída de doenças é grande, porque todo mundo está exposto, inclusive crianças, idosos, indivíduos que já têm doenças respiratórias e cardiovasculares e que decidiram não fumar. Existem janelas na nossa vida, como também condições de saúde que nos fragilizam e fazem com

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que a poluição afete os mais vulneráveis. Um exemplo é o infarto do miocárdio. De 8% a 10% dos infartos do miocárdio na cidade de São Paulo são atribuíveis à poluição do ar, ou seja, a poluição não é a maior causa do infarto do miocárdio, mas é suficiente para quem infartou, e tem tamanho grande para aparecer na fotografia. Das mortes em São Paulo por causas naturais, em torno de 7% são causadas pela poluição do ar. Não é a maior causa da mortalidade, porém ela aparece de uma forma bastante significativa. VV: Em relação ao câncer, a poluição só está associada ao câncer de pulmão? PS: Câncer de pulmão e vias aéreas com certeza. E algo, talvez, em relação ao câncer de mama em mulheres jovens. Uma das hipóteses pra explicar esse aparecimento de câncer de mama em pessoas mais jovens relaciona-se aos disruptores endócrinos, presentes nos alimentos e na poluição do ar. VV: Mesmo sem carga genética? Não necessariamente estas mulheres são portadoras do gene BRCA? PS: Não, nem todo câncer de mama é dependente do gene BRCA, mas em pessoas com histórico familiar, a poluição pode ser um fator agravante. Existem evidências de que compostos, principalmente do diesel, são capazes de promover alterações endócrinas. Tanto que, nas regiões mais poluídas de São Paulo, o número de nascimentos de meninos cai em relação ao de meninas. VV: Interessante, um dado ao qual muita gente não tem acesso. PS: O que a poluição faz é tudo o que o cigarro faz: aumento do risco de doença respiratória, envelhecimento precoce do pulmão, aumento do risco de aterosclerose, aumento do risco de infarto agudo do miocárdio, baixo peso dos bebês ao nascer, maior risco de abortamento e alguns tipos de câncer, mais notadamente de via aérea superior e pulmão e, em alguns casos, suspeita-se que câncer de mama também.

VV: Quando pensamos em prática de esportes, existem mesmo problemas associados a fazer caminhada ou corrida em determinados horários do dia? PS: O que acontece é que, em algumas cidades mais privilegiadas, como Rio de Janeiro ou cidades litorâneas, existem calçadas próprias pra que as pessoas pratiquem esportes nas ruas. Geralmente, estão associadas à orla marítima. Em São Paulo não. Nossas calçadas são horrorosas. Tanto que a maior causa de acidentes de tráfego em São Paulo é a queda da própria altura em calçadas esburacadas. Mais de 50% dos casos que chegam até o Instituto de Ortopedia da Faculdade de Medicina da USP é de gente que está andando a pé. Porque, nas calçadas, o pedestre não aparece. Tem um segmento invisível da população! No jornal, vi uma foto do chamado “caos aéreo”, as pessoas esperando de vinte a trinta minutos pra pegar um táxi no aeroporto de Congonhas. Outro dia, fui dar uma aula na estação Tiradentes do metrô e, geralmente, pego a linha verde em direção à FMUSP. Fiquei vinte e cinco minutos na estação, tentando entrar no trem, e não consegui. O caos do transporte já ocorre no Jardim Ângela, nos trens da CPTM e as pessoas não aparecem. Só quando o caos começa a pegar o andar de cima é que você tem a primeira página do jornal. O que temos hoje, na cidade de São Paulo, são calçadas inapropriadas pra andar, muito menos pra correr. Então, as pessoas começam a correr nas calçadas das avenidas, o que é um mau negócio, porque os grandes corredores de tráfego podem ser comparados a novas chaminés. Saíram as indústrias, já deixam de produzir bens para vender serviços e, consequentemente, você tem as emissões saindo, predominantemente, das avenidas. Durante a corrida, você aumenta a ventilação e, consequentemente, inala mais poluentes em lugares pouco adequados. Mesmo nos parques, Aclimação, Ibirapuera, as pessoas que correm regularmente vão construindo uma trilha externa, junto às grades, para diminuir a monotonia do treino e inalam mais poluentes. Se for correr, é preferível que não seja em vias de tráfego, e é melhor tentar fugir dos horários de pico.

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www.5elementos.org.br

“a natureza é perfeita, harmônica e sábia”

EDUCAÇÃO AMBIENTAL

EDUCAÇÃO PARA A SUSTENTABILIDADE

INSTITUTO 5 ELEMENTOS / MÔNICA BORBA

Fundado em 1993, o Instituto 5 Elementos é uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP) que realiza diversas atividades relacionadas à cultura da sustentabilidade. São temas trabalhados pelo Instituto a gestão de resíduos sólidos, as formas de consumo, mudanças climáticas e atitudes sustentáveis. Em suas oficinas, há diversas atividades teóricas e práticas - como os Cursos de Educação para a Sustentabilidade e a manutenção dos Centros de Educação Ambiental de Caucaia do Alto (CEA) - que implantam, em parceria com a comunidade, sistemas de aquecimento de água com energia solar, compostagem, tratamento biológico para a água, viveiros, minhocários, agroflorestas, banheiros ecológicos, jardins de plantas comestíveis, medicinais e ornamentais. E também o projeto de trilhas em nascentes estudando e valorizando a Mata Ciliar. Diversos prêmios foram conquistados pelo Instituto, como o Prêmio ANA (Agência Nacional de Águas) 2010 - com o projeto “Cenários Atlas Socioambiental e Oficinas na bacia hidrográfica dos rios Sorocaba Médio-Tietê”. A Verde Versátil conversou com a ambientalista Mônica Pilz Borba, que fundou o Instituto 5 Elementos ao lado de Minka Ilse Bojadsen e Mônica Renard. Atualmente, Mônica é coordenadora do Instituto. Verde Versátil: Educação ambiental é um tema muito abrangente. Poderia defini-lo para nós? Mônica Borba: O tema educação ambiental pressupõe a ênfase na educação que tenha foco na observação, pesquisa 12

e compreensão de como acontecem as complexas relações entre a vida nos ambientes natural, rural e urbano. Faz parte desta aprendizagem a valorização da compreensão dos ciclos de vida de todos os seres e elementos que coexistem em nosso planeta. Perceber que todos somos UM é fundamental neste processo, pois nós somos parte do Universo e do Planeta. VV: O que é a ecoalfabetização? MB: A alfabetização ecológica incentiva que aprendamos com os “princípios ecológicos” e promove determinadas leituras e interpretações preferenciais sobre a natureza. Entre essas, a de que a natureza é perfeita, harmônica e sábia. VV: Em que contexto surgiu o Instituto 5 Elementos e quais foram as motivações que levaram à sua criação? Por que existem tantas ONGs e OSCIPs trabalhando com educação ambiental? MB: O Instituto 5 Elementos nasceu do desejo de educadoras em promover o tema educação ambiental nas escolas, empresas e nas instâncias governamentais. As fundadoras se conheceram na Pró-Jureia, que, em 1989, lutava para transformar a Jureia em uma estação ecológica. Depois desta luta ganha, montamos um grupo de educação ambiental na Pró-Jureia, onde estudávamos o tema e promovíamos ações junto a educadores em Peruíbe, cidade vizinha ao Parque Ecológico da Jureia. Em 1993 fundamos o Instituto 5 Elementos e agora, com dezoito anos de ação, ampliamos sua missão ao promover a Educação para a Sustentabilidade, tema prioritário para a construção de uma sociedade sustentável.

“A educação ambiental deve ser promovida por meio de projetos interdisciplinares, e não numa única matéria”

VV: Como começou a ser introduzido o tema educação ambiental nas escolas? MB: Desde 1999 foi constituída a Política Nacional de educação ambiental, dando ênfase a este tema nas escolas. Porém, esta lei exige que sejam criadas leis, regulamentações e planos nos Estados e municípios que levem em conta sua realidade local, seu bioma. Enfim, ainda temos muito trabalho pela frente. VV: Ainda sobre as escolas, deve-se trabalhar a educação ambiental como disciplina ou abordar o tema indiretamente em todas as situações apresentadas aos alunos? MB: A educação ambiental deve ser promovida por meio de projetos interdisciplinares, e não numa única matéria. O tema necessita de todas as áreas do saber para avançarmos no conhecimento da complexidade das relações entre as vidas existentes em nosso planeta. VV: Poderia contar um pouco sobre o projeto “5 REs” (reduzir, reutilizar, recuperar, reciclar e repensar os hábitos de consumo), desenvolvido pelo Instituto 5 Elementos? MB: Em 2009, lançamos a Coleção Consumo Sustentável e Ação, uma iniciativa de produção de material educativo em prol da sustentabilidade. O primeiro título da coleção desenvolve a temática sobre a questão da geração e tratamento dos resíduos sólidos, propondo rever nossos hábitos de consumo. Nesta publicação, dirigida aos professores, também há sugestões de atividades educativas que promovem o consumo sustentável. Os demais títulos são voltados a crianças e jovens, e trazem um enredo onde os

alunos da Escola da Vida têm a tarefa de pesquisar sobre o ciclo do lixo - Papel, Plástico, Metal, Vidro e Orgânico - para apresentarem na Feira de Ciências com o tema Consumo Sustentável. Dentro deste contexto, os alunos interagem com vários personagens da comunidade, que trazem novos conhecimentos e reflexões sobre de onde vem e para onde vai tudo neste planeta! VV: No Brasil, assim como nos países africanos, há questões muito urgentes, como a pobreza, a falta de saneamento e alimento. Embora todas as questões sejam intimamente associadas aos problemas ambientais, as intervenções em educação ambiental são viáveis? A senhora poderia contar exemplos de novas posturas que foram mantidas nas comunidades em que trabalhou? MB: O Instituto 5 Elementos atua com foco na implantação de políticas públicas nas áreas de gestão dos recursos hídricos, resíduos sólidos, biodiversidade, agricultura orgânica, com o princípio básico de que somente com a participação das comunidades envolvidas nestas questões poderemos, de fato, alterar nosso futuro comum. Atualmente, estamos promovendo o desenvolvimento sustentável local de diversos municípios do Brasil, com base na educação para a sustentabilidade. Os primeiros resultados já estão aparecendo, pois hoje a consciência ambiental já é muito maior do que há dezoito anos, quando iniciamos nossa atuação. O tema sustentabilidade está em todo o lugar e temos a certeza de que estamos construindo este conceito de forma participativa. 13


Quando abrimos mão de nossos julgamentos, podemos agir de maneira mais natural. Se estamos ocupados, fazendo avaliações, perdemos a oportunidade de aproveitar o agora, momento em que realmente se pode perceber, agir e mudar as coisas.

No palco, quanto menos julgamentos, mais clareza mental. MÚSICA

O SILÊNCIO MUSICAL - MEDITAÇÃO E MEREDITH MONK

ILANA VOLCOV

Quando a Claudia Liba me pediu uma sugestão de pauta para a área musical, pensei em diferentes artistas ligados à meditação. Fiquei tão entusiasmada com a matéria que me ofereci para a tarefa! Mas o leitor pode estar se perguntando: por que a meditação está relacionada ao tema meio ambiente? Ou mesmo: de que forma a meditação pode contribuir para o trabalho artístico ou, simplesmente, para o exercício da criatividade? Se você já pratica meditação e estas perguntas não passaram pela sua mente, espere para conhecer um pouco mais sobre o trabalho de Meredith Monk. Muitas vezes ouvi comentários como: “não consigo meditar, minha cabeça não para!”. Meditar não significa ausência de pensamentos, mas tomar consciência dos pensamentos no momento em que aparecem. E, em seguida, não se identificar com eles. Temos cerca de 70 mil pensamentos por dia: nossos humores, emoções, opiniões mudam diversas vezes ao longo de poucas horas. Entretanto, escolhemos alguns e sedimentamos padrões de comportamento, julgamentos, sentenças. Imagine ter alguns minutos para enxergar com consciência os pensamentos escolhidos. (Pode não ser simples, pois talvez você não goste do que verá). Imagine que esses e todos os demais pensamentos que surgirem não fiquem retidos, apenas passem. Você aceita tudo o que surgir na sua mente sem julgar se é bom ou mau, ou se isso precisa ficar com você. Você não se prende a nada. 14

Vamos supor que você seja um artista, criando uma música sobre o tema jardim e, na meditação, apareça uma nova imagem para a canção, uma caneta. Claro, você não precisa usar essa ideia. Mas, se quiser aproveitá-la, talvez a canção passe a falar sobre o desenho de um jardim, ou sobre um casal que rabisca seus nomes na árvore, como em “Juazeiro”, de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira. O mais interessante é que, normalmente, quando a tal da caneta aparece, é ela quem dá sentido aos demais elementos da composição. Noel Rosa, ao compor, costumava esboçar as letras com palavras que surgiam de maneira espontânea durante a escuta da melodia. Mais tarde é que entrelaçava esses dados, aparentemente sem nexo, lapidando a canção. É também por acolher diferentes pensamentos que surgem durante a meditação que o praticante aproveita uma área criativa que não combina, inicialmente, com suas preferências estéticas, seu comportamento ou sua personalidade. No caso de um cantor, ele pode moldar a própria voz conforme determinados padrões estéticos, ou pode explorar o canto com maior liberdade e inventar um caminho. Meredith Monk vem de uma família de cantores e, por esta razão, sentiu necessidade de formular um jeito próprio de cantar e de estar no palco. Em 2009, esteve no Brasil para apresentar o espetáculo “Impermanência”, dar cursos e falar sobre a importância da meditação em sua arte. Em uma palestra, a artista americana disse que “trabalhar com arte nos dá a possibilidade de quebrar padrões”, e que “não há diferença entre a atividade espiritual e a arte”. São afirmações que merecem horas de conversa e de estudo, mas talvez seja possível esboçar uma interpretação mais superficial.

O músico fica a serviço da música, despido de interferências. Se elas aparecem, não ficam retidas durante a execução musical. O artista está alerta e focado: enquanto o ego se aquieta, usa seu instinto, sua intuição e permite que algo sublime se manifeste. Ainda durante a palestra, Meredith mencionou sua opção por vocalizar com “verdade emocional” ao invés de usar truques. Explico: a artista identificou duas formas de fazer arte: 1. a arte como um produto, em que se trabalha num universo conhecido; 2. a arte como um desafio, começando do zero, com inocência, deparando-se com o desconhecido. O artista fica curioso e persegue pistas como um detetive. Atravessa o medo, tateia no escuro, descobre o inesperado.

sente, e vemos as pessoas de cima de uma corda bamba, é essa a nossa experiência. A vulnerabilidade é um aspecto maravilhoso da apresentação ao vivo. O artista existe e todos na plateia existem; estamos todos no mesmo espaço e no mesmo momento. Compartilhamos esse tempo e esse espaço. Em suma, a experiência torna-se como a figura do número 8, um signo do infinito, que apenas vai e vem, vai e vem, dá voltas e retorna.” Em 2008, quando Bobby McFerrin, grande cantor e pesquisador da voz (famoso pela canção “Don’t worry, be happy”), encerrou sua apresentação em Salvador, no lugar do bis, foi até a plateia responder perguntas. Ao ouvir a esperada questão “Bobby, are you happy?”, respondeu: “Claro, estou vivo, meu coração está batendo!”. Após o show, tive a oportunidade de pedir-lhe sugestões para minha prática de improvisação vocal. Um dos exercícios sugeridos foi cantar com os barulhos que me cercam, como o motor de um carro, o ranger da janela, o pio do passarinho, passos sobre o piso de madeira. Trata-se de uma espécie de meditação! Não se pode estar atento a tais eventos sem estar alerta, sem viver o momento presente com total entrega.

“Sempre pensei que fazer arte é como caminhar até a beira de um despenhadeiro, correr o risco e saltar. No começo de uma nova obra ou de um dia de trabalho está o desconhecido. Ser artista é questionar, vagando pela escuridão, apenas pressentindo o que se manifestará, é não ter certeza, é tolerar o medo. Quando a curiosidade e o interesse se tornam mais presentes que o desconforto, conseguimos apreciar o mistério, e a exploração se torna vívida e vibrante. Então de fato ultrapassamos o medo, e há um sentido de descoberta”, diz Meredith.

Mas o improviso e a interação com o inesperado trazem riscos. Se nesta situação o cantor for tomado pela ansiedade, pelo julgamento ou pelo medo, o resultado será menos criativo, menos musical. No programa do espetáculo “Impermanência”, Meredith Monk fala sobre a questão: “Cada vez que criamos uma obra, o medo está sempre lá, sempre o estamos trabalhando, brincando com ele, permitindo que o interesse e a curiosidade pelo que fazemos se tornem mais fortes do que a ansiedade”. Sua proposta obriga o artista a se lançar, arriscar-se e se superar. Exige coragem, concentração, honestidade, abertura, generosidade e muita investigação. É um caminho que potencializa o indivíduo e torna mais hábil sua comunicação com os demais, de maneira criativa e cheia de vitalidade.

Ela investiga o canto sem palavras, pois acredita que, desta forma, seja possível falar de maneira mais profunda. Pesquisa também novos vocabulários, tanto para a voz como para os gestos corporais, optando pela performance, articulando som, movimento e imagens: “Na performance, a arte é uma estrutura, e o performer traz luminosidade, dá vida a essa estrutura.” Para ela “a beleza da situação de uma apresentação ao vivo está na possibilidade de um desastre completo a cada momento. Ao fazer um filme ou gravar um disco, em certo momento podemos cortar tudo aquilo de que não gostamos. E eles se tornam uma forma fixa. Na apresentação ao vivo, no entanto, tudo é real, tempo pre-

A meditação é um tema abrangente. Como sou apenas uma praticante e não uma estudiosa, não vou abordar aspectos mais profundos. Mas podemos retomar a importância de romper padrões. Quando superamos nossos medos e barreiras, abrindo mão do excesso de julgamentos, nossa agressividade naturalmente diminui. E se estivermos conscientes do nosso estado mental e emocional, seremos capazes de trocar a reação pela ação. (Foi comprovado que a meditação em massa é capaz de reduzir o número de casos de violência na região do evento. David Lynch fala sobre este assunto em seu livro Em Águas Profundas: Criatividade e Meditação). 15


Outro aspecto: junto com o sono, a alimentação e a respiração, a meditação é uma das nossas principais fontes de energia. Todas podem gerar vitalidade, equilíbrio, disposição, produtividade. (Reparem que dificilmente desfrutamos das fontes de energia em quantidades e/ou qualidades adequadas). A alimentação interfere nos estados da mente e, por esta razão, costuma-se praticar a meditação antes das refeições. Algumas comidas podem trazer agitação, raiva, irritação; outras, podem gerar inércia, letargia e depressão. Poderíamos conhecer os benefícios de cada alimento para colocar no prato aquilo que atenderia nossas reais necessidades. Porém, ingerimos comidas e bebidas sedutoras, pouco nutritivas, com muitos aditivos químicos e mínima energia vital. Quando observamos os efeitos dos alimentos em nosso corpo, a qualidade se torna presente em nossa refeição. Frutas e verduras frescas entram no lugar de enlatados, congelados e comidas instantâneas. Chás e sucos naturais substituem refrigerantes e produtos “de caixinha”. Como a meditação nos ajuda a perceber os efeitos das toxinas, é natural reduzir o consumo de carnes.

Este assunto é bastante polêmico, pois temos resistência a mudar hábitos, e muitas pessoas não acham graça em levar uma vida saudável. Desconhecemos a forma com que nossas compras afetam a saúde do planeta. Somos consumidores fantásticos. Quanto mais estressados, mais gastamos dinheiro em busca de algum prazer. A meditação interfere nesta dinâmica, pois nos ajuda a reduzir o estresse. A partir dessas linhas, é possível vislumbrar o poder de uma sociedade que medita.

Indivíduos mais conscientes questionam padrões estabelecidos. Talvez não consumam produtos desnecessários ou comidas pobres em nutrientes. Talvez não propaguem a violência, talvez não usem tantos remédios. Talvez encontrem soluções mais criativas. Talvez apreciem trabalhos artísticos mais profundos. Ou simplesmente passem seus dias com mais vitalidade. Decerto, serão indivíduos com grande capacidade de escuta: haverá habilidade para reconhecer aquilo que surge quando se encontra o silêncio. Visite: www.meredithmonk.org Ilana Volcov é cantora, compositora e educadora musical. Lançou, em 2010, o CD Banguê, seu primeiro álbum solo. Dicas de outros artistas ligados à meditação e ao vegetarianismo, por Ed Motta: Sun Ra, Horace Silver, Donovan, Alice Coltrane.

ARQUITETURA

A REFAZENDA: UMA CONSTRUÇÃO SUSTENTÁVEL

EDER VENDRAMEL

O projeto elaborado pelo arquiteto Eder Vendramel na cidade de Bernardino de Campos (SP) tem como base uma fazenda repartida em três partes pelos familiares proprietários.

costumo projetar, mas a ideia de reutilizar materiais me conquistou”. Este é apenas um dos projetos de construção sustentável realizado pelo arquiteto, que recebeu o prêmio Solvay de Arquitetura Sustentável em 2006.

No passado, a Fazenda Agropecuária Modelo contava com sete casas. Havia a sede, construída nos moldes da época - datada do início do século XX - com materiais de boa qualidade: tijolos de olaria, portas e janelas feitas com madeiras de árvores do local, como eucaliptos, e madeiras de demolição (entre outros, extraídos da própria região). Além da sede, mais seis casas foram construídas na fazenda com os mesmos materiais. Em uma das áreas, agora dividida entre os irmãos, permanecem uma casa e uma piscina construídas há dez anos. Nesta mesma área, o proprietário, hoje falecido, utilizou materiais de três das sete casas que seriam destruídas, pois estavam muito velhas e não seriam mais usadas. Daí nasceu o projeto relatado por Eder: “A ideia partiu da necessidade de ter um anexo para receber hóspedes e possibilitar aos moradores o convívio próximo à piscina. Com as madeiras, portas, janelas, telhas e tijolos das outras casas, projetei um anexo em forma de L ao redor da piscina, com sala, quarto, cozinha e banheiro. Também projetei neste espaço uma pequena casa para hóspedes, com sala, quarto, banheiro e cozinha, reaproveitando totalmente os materiais das antigas casas. Entre estas casas, foi elaborado um projeto de paisagismo com plantas e árvores locais e um açude, completando o cenário. Este projeto não é contemporâneo como

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fotografias de Eder Vendramel Eder Vendramel é arquiteto esvendra@hotmail.com 17


ARTE

A DANÇA DA SELVA

MANOEL BRITtO

A DANÇA DA SELVA Quem olha a selva de avião tem a impressão de que a paisagem está sem movimento, estática. Mas se fizermos um filme acelerado veremos que na verdade a floresta dança. Nossa atenção não consegue acompanhar o que é muito lento, nem o que é muito rápido. É impossível seguir os ponteiros da hora do relógio (muito lento) ou observar uma bala saindo de um revólver (muito rápido). Sem que a gente perceba as árvores nascem, crescem até 20, 30, 50 metros de altura, vivem o seu ciclo e morrem, desintegrando-se no solo e fornecendo matéria-prima para as plantas que estão chegando. Cada patamar de altura das árvores segura a umidade no planeta mantendo o clima ideal para cada estação. Fotossíntese, fungos, sombras e águas comemoram o casamento entre o Sol e a Terra neste jogo entre a luz e a clorofila que existe desde muito antes de nós até muito tempo depois, como se esta dança fosse eterna. Assim sendo, assim seja! Manoel Britto RainForest / Manoel Britto

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PENSAMENTO

ECOSOFIA: BICHO DE TRÊS CABEÇAS

CLAUDIA RAMOS LESSA

A visão de alguns filósofos pós-modernos solucionaria a difícil polêmica diante da escolha entre o “inseto” e o “inseticida”. A vida seria transformada ou reinventada pelos humanos conscientes, dentro de conceitos “ético-políticos” propostos pela ecosofia. Termo cunhado em 1972 por Arne Naess, ecosofia representa a fusão de conhecimentos da ecologia com a filosofia. Propõe uma mudança radical em nossa forma de viver e utilizar os recursos do planeta e do Universo, para assim garantir a integridade dos sistemas, a preservação da biodiversidade e promover a tomada de consciência sobre a existência e o respeito humano. Desta forma, tornou-se palavra de ordem dos movimentos verdes, das políticas de sustentabilidade e das pessoas descontentes com as “barbeiragens” na condução do planeta. O livro As Três Ecologias, escrito pelo filósofo pós-moderno Felix Guattari, denuncia a demência humana na busca de satisfazer necessidades propostas pela mídia. Ele acredita que as pessoas são estimuladas ao consumo desenfreado de bens e serviços, que, além de desnaturar o homem, corrói de forma brutal as reservas naturais e incita a competição, a violência, a perda da identidade e singularidade da pessoa. Guattari propõe “uma autêntica revolução política, social e cultural reorientando os objetivos da produção de bens materiais e imateriais”, desenhando as três cabeças da ecosofia. Ele nos convida a repensar e reinventar nossas relações: primeiro, com o meio ambiente, composto pela natureza, pelo planeta e o Universo; segundo, com as relações sociais, domando os nossos instintos de violência e poder de dominação; terceiro, no campo individual, onde a subjetividade humana - sensibilidade, inteligência e desejo - seria reinventada, tornando-se, a um só tempo, solidária e cada vez mais diferente, conquistando a singularidade de cada ser.

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A ecosofia radicaliza ao dizer que a questão ambiental deve ser vista na escala planetária. No campo social, teríamos que reinventar a maneira de ser e, na questão individual, a relação do sujeito com o corpo e a mente. Da lógica cartesiana iríamos para a “eco-lógica”, utilizando todos os recursos dispostos pela ciência e a tecnologia para repor os desgastes ocasionados pela ambição de produzir e consumir, destruindo a vida natural, deteriorando as relações humanas e ameaçando nossa própria espécie. Segundo o filósofo canadense Mc Luahn, “a tecnologia do homem é o que ele tem de mais humano”. Assim, sugere que tal capacidade pode nos salvar da degradação. Foi Mc Luahn quem nos trouxe a ideia da “aldeia global”, pois percebia que a evolução da tecnologia levaria o mundo, então grande e cheio de distâncias, a ficar totalmente transparente e integrado, facilitando a conscientização dos problemas comuns. A sustentabilidade, que hoje preenche o vazio dos discursos, seria consciência comum à preservação. Para Joseph Tainter, “qualquer sociedade que use continuamente recursos críticos de modo insustentável, entrará em colapso”. A globalização chegou unindo os homens pela tecnologia e a economia de mercado, mas não trouxe, de pronto, nem transparência nem conscientização. A

mídia da globalização continua confundindo e preservando a estrutura econômica de poder que mantém parte da população na miséria e tenta perpetuar práticas de destruição e dominação. Falsos discursos, corrupção de bens e ideias globalizam a perversidade. Derrubar ou conservar as florestas torna-se uma questão de ponto de vista, apregoando que a reciclagem e a economia doméstica vão repor ao planeta o que foi abocanhado em 200 anos de produção desenfreada de grandes grupos econômicos. O certo é que será difícil sobreviver desprezando a visão “antropo-ética” proposta por Edgar Morin quando diz que temos que trabalhar para a humanização da humanidade, alcançar a unidade planetária na diversidade, desenvolver a ética da solidariedade e ensinar a ética do gênero humano. Difícil ou utópico? A palavra difícil abre uma possibilidade, enquanto a utopia seria a palavra a ser usada quando pensamos nas propostas dos filósofos pós-modernos, que sinalizam o caos. Finalmente, segundo o nosso Paulo Freire, “a conscientização nos convida a assumir uma posição utópica frente ao mundo”. Ele afirma que o utópico não é irrealizável e só depende da vontade e do empenho humano. Ecosofia se conjunga com utopia. Para onde vamos? Planeta, sociedade e pessoas. Claudia Ramos Lessa é diretora da Soares & Lessa Consultoria Empresarial. crlessa@terra.com.br www.planejamentodevidaecarreira.blogspot.com

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Verde Versátil: De todos os resíduos, qual mais agride o meio ambiente? Alfredo Rocca: Os resíduos mais impactantes ao meio ambiente são aqueles considerados perigosos por serem tóxicos, persistentes, reativos, corrosivos, inflamáveis ou patogênicos. VV: Como é feito o descarte dos resíduos na cidade de São Paulo? AR: Os resíduos dos serviços de limpeza pública, incluindo os da coleta de lixo domiciliar, são predominantemente descartados em aterros. Apenas uma pequena porcentagem, inferior a 10%, é reciclada. Os resíduos de serviços de saúde são enviados a unidades de desinfecção e depositados em aterros. Os resíduos industriais são depositados em aterros ou incinerados.

LIXO

RECICLA

ALFREDO ROCCA por Michele Correa de Almeida A cada dia o tema sustentabilidade é mais discutido e levado a sério mundialmente. E não temos como falar a respeito sem tocar nas questões relacionadas aos resíduos. Atualmente, na cidade de São Paulo, são produzidas 13 mil toneladas de resíduos domiciliares todos os dias – e mais 13 mil toneladas de outros tipos de resíduos. O que agrava o problema é que menos de 10% deles são reciclados. Para minimizar a situação, a população precisa se conscientizar da necessidade da reciclagem. Já o poder público deve organizar a coleta e investir mais na implantação de novas cooperativas de reciclagem. Mas podemos ser otimistas, pois tanto a população quanto os governantes e empresários têm se preocupado com a questão e proposto medidas concretas a favor da preservação ambiental. Um exemplo são as sacolas plásticas, que, a partir de 2012, não poderão ser mais comercializadas no Estado de São Paulo, contribuindo para a diminuição dos resíduos. Nesta edição especial, a Verde Versátil entrevistou Alfredo Carlos Cardoso Rocca, gerente da Divisão de Áreas Contaminadas da CETESB (Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental), professor e engenheiro civil pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo.

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VV: Quais os resíduos que podem ser reaproveitados e como? AR: Do lixo urbano, principalmente os papéis, plásticos, vidros, madeiras, latas e resíduos metálicos. Dos resíduos industriais, principalmente as embalagens, borras de óleo, borras de tinta, solventes, fibras têxteis, madeira e sucatas. Os resíduos entram novamente em processos produtivos, substituindo matérias-primas virgens ou insumos. VV: De que forma o poder público pode resolver a questão da geração e reaproveitamento dos resíduos? AR: A solução começa pela conscientização da população sobre a necessidade de segregar os resíduos em recicláveis e não recicláveis. Depois, pela organização do sistema de coleta e destinação, e também do setor produtivo, para possibilitar a reciclagem. Por fim, dar um destino adequado aos rejeitos, mediante incineração, aproveitamento energético e aterro das cinzas (menos de 30% da quantidade gerada).

VV: Quais são os principais problemas associados à geração de lixo e à conscientização da população de São Paulo? AR: Os principais problemas estão associados ao consumo insustentável, induzido pela mídia, à falta de conscientização sobre a necessidade de segregar e reciclar os resíduos e à falta de cobrança dos cidadãos para que o poder público implante soluções adequadas de destinação dos resíduos. VV: Como seria possível reciclar todo o resíduo domiciliar da cidade de São Paulo? AR: Todo o resíduo, é praticamente impossível. Mas uma boa parcela pode ser reciclada mediante o reaproveitamento de materiais recicláveis, compostagem da fração orgânica e aproveitamento energético.

Com o objetivo de incentivar a população a reciclar resíduos, a Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo) inaugurou em junho o primeiro dos 20 Ecopostos de recolhimento de material reciclável na região metropolitana de São Paulo. O local recebe papel/papelão, plástico, metal, vidro e óleo de fritura. Todo o material entregue para reciclagem será repassado a cooperativas e ONGs que trabalham com estes resíduos, como a Cooper Vivabem. Ecoposto Sabesp. Rua Sumidouro, 448 - Pinheiros.

Michele Correa de Almeida é aluna do Curso Superior Tecnológico em Gestão Ambiental.

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COTIDIANO

NÃO ESTOU SENTINDO NADA!

ANTONIO GOMES “Socorro, não estou sentindo nada”, começa assim uma canção do Arnaldo Antunes. Lembrei-me dela num percurso curto, mas suficiente: pegando o trem da Barra Funda à Luz. Fazia muito frio, tempo úmido, o trem lento, muitas paradas, notei os casebres ladeando a via - a favela cresce dia a dia -, os barracos dependurados qual em palafitas, alguns a ponto de despencar sobre os trilhos...

POESIA

Observei, mas não senti...

Sou um homem do mato. Lá aprendi as estações do ano, Pelo cheiro da terra, O vento, o canto dos pássaros.

A MATA

F. MARCOS

Um deles em especial, perdido no que supus cantinho dos mais úmidos, ficava colado atrás de uma coluna de concreto, quase que só dava pra ver seu telhado, o qual, pelo que notei, servia de lixeira: os moradores dos outros jogavam de tudo na cobertura do que ficava mais abaixo. Imaginei a infestação de ratos...

Lá também, aprendi sobre as chuvas. Pois os pássaros a anunciavam logo pela manhã.

Mas não senti nada, não... só observava! O trem demorava tanto, parecia que nunca chegaria à Luz, o que fazer? Fiquei de olho no cortiço, imaginei que tipo de gente morava ali, se escondia, convivia com baratas, restos, a ponto de despencar nos trilhos da CPTM e aguentar aquele frio. O dia estava de rachar. Rangiam-me os dentes...

Os bichos também me ensinavam coisas. Onde encontrar água na estação da seca, Os frutos comestíveis, Os remédios para todos os males.

Mas eu mesmo, nem tchum! Sentir? Sentia nada, não...

Na mata onde vivi, Havia harmonia. Na alta madrugada havia o cantar da coruja. O amanhecer era saudado pelo sabiá.

Lembrei-me, meio à toa, de ter recentemente passado de ônibus na estrada de Taipas. Num dos trechos mais estreitos dela era possível, da janela da condução, assistir a um tico da novela das oito na TV do morador, que, certamente, já está habituado ao ronronar dos ônibus, aos olhares indiscretos e à fumaça que avança todos os dias janela adentro. Pensei: quanto de insensibilidade é necessário para suportar este tipo de vida?

Hoje sou um homem da cidade. Trago comigo a alta tecnologia. ipods, ipads, iphone.

Mas logo divaguei sobre outro tipo, que tive o privilégio de conhecer. Ele mora sozinho num apartamento no Morumbi: quatrocentos metros quadrados de puro luxo e solidão garantidos! E pasmei novamente: quanto de insensibilidade é necessário para que um felizardo, de sua ampla sacada, observe sem dor a favela que se expande vizinha aos castelos?

Eles me trazem músicas, Textos e contatos com os outros. Sou o que se diz aqui um homem antenado.

Poxa, mas dizer que eu sentia algo de verdade a respeito, não. Só lembrava, ao acaso da demora...

Socorro! Não estou sentindo nada, mas assisto a tudo, e me parece, às vezes, que antes que qualquer ação pública venha a dar conta de um sistema mais digno de vida, há que se resgatar a sensibilidade: quem é incapaz de sentir algo, quem sente nada, “nem medo, nem calor, nem fogo”, custa a dar conta do próprio nariz. Perdido na pressa da metrópole dirá perceber que a dor alheia é também a sua, e que o planeta não sustenta mais tanta insensibilidade.

Luana Capobianco

Voltando ao trem, que nunca mais andava, e às favelas, que sempre se arranjam nalgum canto, notei, também meio em vão, que eu não era nem melhor, nem pior do que os caras que convivem com os ratos, nem mais sensível que o ricaço que me disse outro dia: “Até acho vantajoso que a empregada more na favela - é pertinho, não gasto um centavo a mais com condução”. (Ele...).

Mas que falta a mata me dá. Sua água cristalina, Seu verde de arrepiar. E milhões de pássaros a cantar. Tenho aqui comigo até um GPS, Mas aquela minha mata, Essa nunca mais vou localizar. F. Marcos Um cara que acredita em sonhos e planta amigos.

Mas tudo isto é indiferente... Basta que o trem volte a andar, basta que eu não perca o horário, basta que eu consiga chegar ao serviço, cumpra o compromisso e conquiste uma promoção. Antes que o mundo morra por falta de carinho. Antonio Gomes é músico, compositor e escritor (antonigomes@gmail.com). 24

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capa

marina morena do brasil

entrevista exclusiva com Marina Silva por Claudia Liba fotografias de Cacá Meirelles

Ela nasceu no Acre, de um casal de nordestinos, em 08 de fevereiro de 1958 e recebeu o nome Maria Osmarina Marina Silva Vaz de Lima. Seus pais tiveram onze filhos, dos quais três morreram. Cresceu em uma pequena comunidade, Breu Velho, no Seringal Bagaço. Sua luta pelo meio ambiente o mundo inteiro conhece. Ela é uma mulher pequena, morena, tem quatro filhos e se declara palmeirense. Em 16 de maio de 2010, lançou sua pré-candidatura à Presidência da República. Vinte milhões de brasileiros votaram nesta mulher. É com Marina Silva que inauguramos a edição Verde Versátil.

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Verde Versátil: Queria ouvir um pouco, Marina, sobre o fato de você ter nascido na Amazônia. Como isto influenciou a sua luta como ambientalista? Quais os aspectos mais marcantes que a conduziram para este caminho? Marina Silva: A minha relação com a floresta, com a mata, é de complementaridade, porque, nas circunstâncias em que vivi até os 16 anos, a gente dependia da floresta pra tudo. Era da floresta que a gente tirava os alimentos, que a gente tirava materiais para fazer a casa, o forro, produtos pra vender e comprar coisas que a gente não produzia. Era da floresta que vinham os mitos, os mistérios e a maior parte dos remédios. Os chás, quando a gente adoecia, ia lá na floresta pegar casca de jatobá pra fazer chá para curar anemia. Se ficava com malária, ia pegar quinaquina, uma árvore, pra fazer um chá amargo, um quinino. A relação com a floresta sempre foi de complementaridade mesmo. De existência. Obviamente, durante uma grande parte, eu não tinha a consciência de que essa floresta poderia estar ameaçada. Na minha infância, a floresta era tão grande, tão poderosa, havia tantos mistérios, que ela era invencível. Ela não precisava de proteção, mas era a gente que precisava se proteger da floresta. Quando fui crescendo, vendo a abertura da BR-364, o processo de compra das margens da estrada, transformando-as em fazendas, a compra de vários seringais - inclusive onde nasci, o seringal do Bagaço, com uma floresta riquíssima em castanhais - , espécies de bichos sendo destruídas, então, tive a noção de que poderiam acabar com a floresta, e que poderiam também acabar com a gente! Fora da floresta, era como se não tivéssemos lugar. Quem era seringueiro, quem era índio, ia ser o quê? Quando a sua profissão é associada a uma condição natural, você deixa de existir quando esta condição natural não existe mais. Isto foi acontecendo com uma espécie de medo, receio, e foi um passo pra se transformar em sentimento de resistência, de luta, de não querer. Foi quando conheci o Chico Mendes e o frei Leonardo Boff, que começaram a dizer que a gente tinha que lutar contra a expulsão dos seringueiros e a transformação de seringais em fazendas. Era possível melhorar a vida das pessoas morando na floresta. 28

VV: Diante destas questões, cabe a ideia conservacionista do elemento humano no espaço, no local, auxiliando neste processo? É importante manter as pessoas neste contexto? MS: Com certeza. A ideia do ambientalismo que surge no Brasil, sobretudo com os seringueiros no Acre, faz esta integração. Até então, pensar em ecologia e defesa do meio ambiente estava associado ao afastamento da natureza e do homem. De repente, você vê que é possível ter uma relação também de integração, respeitando determinados espaços. Criar uma relação de coexistência, convivência. O homem, com alto ou baixo impacto, vai impactar a natureza. Mas ele também é impactado por ela. O importante é perceber que parte desta natureza “de fora” precisa ser conservada integralmente - e uma parte pode ser usada, desde que tenha a possibilidade de regeneração, de não estagnação. O perigo é quando a interferência leva à devastação. É um processo de retroalimentação. A presença humana não pode ser tão agressiva a ponto de fazer estagnar processos vivos naturais, e nem estes processos podem ser uma ação imperativa a ponto de nos estagnar enquanto capacidade criativa, de elaboração e de transformação.

VV: Há um argumento muito utilizado em relação a situações como a construção da usina de Belo Monte de que no ambiente urbano temos mais conforto e as pessoas que vivem na Amazônia também têm direito a tais condições. A senhora concorda com esse tipo de argumentação? MS: Há uma demanda muito grande hoje no mundo por recursos naturais. Se mantido esse ritmo, não haverá capacidade de suporte para esta demanda. Como suprir as necessidades legítimas das pessoas sem esgotar os recursos naturais? É uma grande equação para este início de século. O que sinto é que não dá pra resolver esta equação sem um questionamento da forma de fazer as coisas e da forma de ser. A nossa forma de ser é que nos leva a fazer coisas para além da capacidade suporte do planeta. Se, hoje, com 7 bilhões de pessoas, o planeta já está no vermelho em 30%, daqui a trinta anos, quando formos 9,5 bilhões, se mantivermos o mesmo nível de extração dos ecossistemas, com certeza não haverá como sobreviver. Por outro lado, a gente tem que pensar em princípio de equidade. O modelo de vida que a gente tem é dos europeus, dos japoneses, dos americanos. Só que esse modelo de vida, se universalizado para 7 bilhões, precisaremos de quatro planetas Terra. A gente só tem um. Entra aqui um questionamento de natureza ética: se esse modelo não puder ser universalizado para todos os humanos, ele não tem como ser eticamente defendido. Então, temos que fazer um questionamento do modelo de desenvolvimento. Ultimamente, estou brigando com o termo desenvolvimento sustentável, prefiro amadurecimento sustentável. Porque tudo tem um processo de estabilização em algum momento. Você nasce, cresce, e um dia chega o momento em que você vai amadurecer. Acho que a humanidade tem uma relação infantilizada com o planeta, que vai crescendo, crescendo, como se fosse um bebezão que não vai parar de crescer. Acho que precisamos pensar um processo de amadurecimento. Chegará o momento em que precisaremos estabilizar a forma de extrair, de criar um padrão civilizatório que não leve a uma relação de crescer sem raiz. E tudo que cresce muito sem raiz, você, que é bióloga, sabe que vai cair! Então precisamos de um amadurecimento sustentável que

seja civilizatório. Mas existem ainda países e povos que ainda não conseguiram o nível de atendimento de necessidades essenciais que precisam - e precisam mesmo! Alimento, saúde, moradia, saneamento, qualidade de vida justa. Fazendo este questionamento, talvez a gente não precise estimular tanto, como referência de felicidade, o ter coisas. Quando é feito este questionamento, ele é legítimo para ressignificar nossas experiências em termos de uso de recursos. Vamos ressignificar nossas experiências no sentido de buscar o que nos faz sentir plenos, realizados, acolhidos e acolhedores uns dos outros, que não seja pelas credenciais do consumo. Tem aí um questionamento de natureza ética em relação ao planeta. Ou estamos tão intoxicados por ter que consumir, que não conseguimos reverter o processo? Como em “eu sei que o cigarro faz mal, mas não consigo parar de fumar”. A mesma coisa com o álcool ou outra coisa que agrida o seu organismo. Será que o consumo é algo que, mesmo sabendo que está sacrificando o planeta e morrendo junto com ele, a gente não para de fazer as mesmas coisas, ter um organismo mais saudável? VV: A senhora falou em pronunciamento realizado em um espaço em São Paulo, ao deixar o Partido Verde, que era preciso ser “sonhático”. Primeiro sonhar e idealizar para depois buscar. Em relação à nova forma de pensar a política, de agregar políticos oriundos de partidos diferentes, com ideias diferentes rumo a um objetivo comum, o que acontecerá com a política Marina Silva? MS: Acho que estou vivendo um momento muito rico, muito especial, de descobrir que a política pode ser vivida com surpresas. Geralmente, as pessoas acham que a política é um espaço de cálculo e previsibilidade. Mas a política viva, transformadora, como uma palavra que transita, ela se transforma e é transformada, se agrega e é agregada a outros sentidos e significados. Não pode ser vivida como um ato sempre pensado, calculado, planejado. Para mim, fazer política nasce de uma experiência viva, da relação com as instituições, com as pessoas, com os acontecimentos. Não posso ter um padrão para proteger o meu “capital político”, 29


“Eu não vou me desfiliar das causas”

de comportamento e de fala, que me leve a achar que eu de perdoar. E o imprevisível? Só é possível suportar com a estou ali preservando isto. Não! Eu tenho que descobrir em promessa, com o compromisso. Se eu disser “eu me comcada realidade o que faz com que minha contribuição posprometo com vocês, que vocês nunca vão morrer”, alguém sa ser efetiva, livre, criativa, produtiva e saudável. Pra mim, leva a sério esse compromisso? Não há credibilidade. Então, isso é política. É não se deixar aprisionar pela mesmice, melhor é viver o imprevisível de forma saudável e criativa, pelo conservadorismo. Se sustentado pelo acolhimento vida é sucessiva. Está de outras pessoas, de outros eu projetasse algo em mi- “a nha vida, a última coisa que sucessiva nos meus filhos, olhares. Estou vivendo um iria projetar era que eu seria é sucessiva em você e a momento de imprevisibilicandidata à Presidência da dade na política. Mas eu não da vida é o estou vivendo isto sozinha. O República em 2010! Nunca sucessividade projetei isso na minha vida. que faz com que a vida seja mundo inteiro está vivendo Supondo que eu projetasum momento de imprevisipermanente” se, ia pensar que chegaria a bilidade na política. O que é quase 20 milhões de votos? Não! Isto é uma demonstração previsível nós não queremos, mas preferimos o imprevisível de que há surpresa no fazer humano. Existe uma espécie para poder contar uns com os outros e criar algo mesmo que de cavalo de troia dentro de nós, para o bem ou para o em cima de experiências passadas. mal, que faz com que a gente seja seres interessantes muito mais do que seres previsíveis. Estou vivendo o moVV: Quando a senhora fala sobre o perdão ser uma formento de poder não ficar ansiosa com a imprevisibilidade ma de reverter o irreversível, politicamente, já teve que e me colocar no processo. A Hannah Arendt afirma que há se perdoar por algum motivo? Sair do PT foi dolorido? coisas que o homem não consegue suportar. Ele não conseFoi um momento de se perdoar ou não? gue suportar o irreversível, e nem o imprevisível. O irreversíMS: Existiu uma dor, e lhe digo que é uma dor que não pasvel é insuportável como a morte. Ninguém fica pensando na sou. É um luto que está sendo elaborado. Por outro lado, morte, porque o homem não consegue simbolizar a morte. há uma experiência viva que não morreu, que está sendo E como não consegue, não fala muito sobre ela. A morte é ressignificada e que continua lá, no PT, nas pessoas que uma espécie de não dito, e a gente vive com esse não dito. eu sei que são íntegras, meus parceiros, pelo menos para Isto é algo irreversível. O que faz com que a gente suporte mim vão ser para sempre. Quando saí do PT e me filiei ao esse irreversível da morte? É a sucessividade da vida. Eu sei PV, naquela manhã eu estava muito triste, muito angustiaque já estou aqui dobrando o cabo da Boa Esperança, mas a da, chorava muito. Minhas filhas, preocupadas comigo, divida é sucessiva. Está sucessiva nos meus filhos, é sucessiva ziam: “Mãe, tem uma festa lá e você está chorando, então em você e a sucessividade da vida é o que faz com que a por que saiu do PT?”. Eu me vi naquela angústia e vieram vida seja permanente. Temos também dificuldade de lidar duas coisas na minha cabeça, duas poesias. Uma do Guicom o irreversível. Ela diz que só há um remédio: o perdão. marães Rosa e uma oração-poesia de Santo Agostinho. Na Se o amado te traiu e você o ama, e ele diz “pisei na bola”, o poesia do Guimarães Rosa, no conto “Nenhum nenhuma”, que você vai fazer, vai cair do prédio? Vai ficar infeliz o reso personagem em determinado momento diz assim: “Será to da vida com a galhada que você levou, ou você perdoa? que um dia, quando a gente se separar, você será capaz Você consegue viver o irreversível revertendo-o pelo perde, sem querer, sem saber, continuar gostando de mim? dão, mas o fato é que o amado traiu. Aí é a nossa capacidade E gostando e gostando?” Isto é o que estou sentindo. 30

Sei que sem querer, sem saber, eu continuo gostando do Lula. Eu continuo gostando da experiência bonita que foi vivida no Brasil e que era uma promessa. Mas percebi que a promessa não tinha mais credibilidade onde deveria ter credibilidade. O compromisso com o desenvolvimento sustentável era o mesmo compromisso que era para ter com a democracia, com a questão social. Por que não conseguia ser com o que agora era essencial, visceral pra vida da humanidade? Eu não podia ficar. Não importava o quanto doesse, tinha que sair. No PV, em que eu ia entrar, era novo, não conhecia as pessoas. Todo mundo dizia que havia processos verticalizados, fisiologismo, mas tinha pessoas em que eu confiava muito, como o Gabeira, a Aspásia Camargo, o Sérgio Xavier. Ia ser sustentada por estas pessoas, que ainda me sustentam ainda estando no PV. Aí entra o Santo Agostinho. Quando ele se converteu, aos quarenta e poucos anos, foi um pouco “malandro”. Sua mãe era muito religiosa e ele completamente “roda solta”. Ele faz uma oração em determinado momento e diz: “Dá-me a castidade, ó Deus; mas não agora!”. Isto é para dizer o quanto o processo de conversão dele foi difícil. Mas quando se converte, diz: “Tarde vos amei, beleza tão nova e tão antiga. Tarde vos amei. É que estavas tão fora e tão dentro de mim!”. Quando ele acha que é o seu encontro com o Espírito Santo, todas as coisas que fazia não eram nada diante dele se conectar com ele mesmo! Era a sua semelhança com Deus. Então, pensei: “As bandeiras do PV sempre estiveram dentro de mim. Eu é que estava fora de mim.” Estas bandeiras, pra mim, não são o partido. Não é se filiar ao partido. Eu não vou me desfiliar das causas. VV: Marina, o que é possível fazer em relação às alterações do Código Florestal? MS: A sociedade brasileira tem uma contribuição muito grande para dar nessa história do Código. E Hannah Arendt que nos ajude de novo. Para o irreversível só existe o perdão,

mas ela diz: “Só é possível perdoar aquilo que seja passível de punição”. O holocausto não pode ser punido, logo, não existe perdão. Quem consegue punir a atrocidade tamanha de destruir a Mata Atlântica, a Amazônia? Isto não tem como ser punido! E ela, não sendo pessoa de fé, diz que os Evangelhos e Jesus elaboram esta questão de forma maravilhosa. Diz que para determinados males causados para a humanidade, melhor seria se a pessoa causadora tivesse uma pedra amarrada ao pé e fosse lançada no mar. É o princípio de que determinados males não podem ser causados à humanidade. Há uma interdição daquilo que a gente pode punir, humanamente falando. E para além daquilo que a gente pode perdoar.

Temos que saber que destruir a floresta é um processo irreversível, com prejuízos irreversíveis, e que isso não tem como ser perdoado. Se não tem como ser perdoado, melhor que não seja feito. Não há como reverter o processo e há uma responsabilidade enorme pra que a gente possa interditar, para o nosso próprio bem, a nossa loucura de não compreender que destruir a floresta é destruir a si próprio. VV: Na época em que a senhora era ministra, havia a campanha pelo desmatamento zero. Ao mesmo tempo, houve um movimento da grande mídia que anunciava com grande frequência focos de desmatamento, trazendo ambiguidade à interpretação dos dados reais. Na realidade, houve redução drástica do desmatamento durante sua permanência como ministra do Meio Ambiente. Então, onde reside o problema? Por que há tanta dificuldade para efetivamente proibir o desmatamento? MS: O problema somos nós! Esse desmatamento que conseguimos diminuir, vou falar com você uma coisa: não fui eu, não foi o Lula! Foi a sociedade brasileira! Nós já somos 31


Entrevista concedida em out/11. Colaborou nesta entrevista Juliana Jamilles. 32

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celou, deu sustentação política, agora correm o risco de andar para trás. E não podemos andar pra trás. O Código Florestal é uma espécie de armagedon. Se a gente tiver um Código com as alterações de relatório do Aldo Rebelo, nós abrimos as porteiras para um retrocesso tamanho numa agenda que, nos últimos trinta anos, o Brasil vem avançando! Avançando em termos de marco regulatório, de estrutura, de resultados efetivos.

Ter reduzido o desmatamento em quase 80% nos últimos cinco anos é uma conquista da sociedade brasileira. E é esta conquista que está ameaçada agora e que não podemos deixar. Como isso pode ser feito? Só há um caminho: mobilização efetiva! Eu não sei o que temos que dizer aos senadores, eu não sei o que a gente tem que dizer para a Dilma, pra evitar que isso aconteça. Mas, se a sociedade não interditar o Congresso, eles vão mudar a lei. E vão mudar de forma disfarçada.

Luana Capobianco

um produto da sociedade brasileira. Não haveria Marina Silva ministra do Meio Ambiente sem o consentimento da população brasileira, o emponderamento da sociedade. Há vinte anos, estavam matando Chico Mendes porque ele estava querendo defender o seringal em que morava! Só aquele pedacinho! Ele morreu, mas o Brasil não sabia quem era o Chico Mendes. E, se não tivesse vindo aqui o Al Gore, a revista Time, se o jornal New York Times não tivesse dado a notícia de primeira página, não haveria a repercussão que teve. Vinte anos se passaram e, ao invés da Polícia Federal dar suporte para o fazendeiro desmatar, a sociedade brasileira fez com que nós tivéssemos 480 policiais federais indo ao Mato Grosso prender grileiros, secretário corrupto, e desmontar um esquema de corrupção. Qualquer ministro que colocasse 725 pessoas na cadeia, desconstituísse 1.500 empresas, que ajudasse a inibir 35 mil unidades de grilagem, se não fosse pelo suporte da sociedade, cairia! Morreria! Isto é sociedade! Na hora em que a sociedade decidir que não quer mais saber de carne que venha de propriedade com desmatamento ilegal, quando a sociedade estabelecer como um valor que não leva pra sua casa aquilo que é produzido com trabalho escravo, com trabalho infantil, na hora em que a sociedade estabelecer isto como valor, a gente vai conseguir reverter. Não da noite pro dia. A gente tem ganhos e perdas. Estamos vivendo um momento de ameaça de um retrocesso. Estas conquistas que a sociedade chan-


“Não devemos esquecer que o meio ambiente é o meio em que vivemos. Se vivemos em um local urbanizado, este é o ambiente que devemos considerar”

NEGÓCIOS

LUCRO VERDE: O QUE SE ANDA FAZENDO PELO MEIO AMBIENTE?

RUBENS BORGES Muito se fala em meio ambiente, desenvolvimento sustentável, ações ambientais, preservação da natureza... Mas, efetivamente, quais são as ações a favor da preservação ambiental? Quando falamos em grandes ações em prol da preservação ambiental, logo imaginamos ações governamentais, que, através de uma legislação específica ou de fiscalização, são capazes de conter desmatamentos, preservar mananciais ou evitar que uma indústria emita mais poluentes do que a legislação permite. E é verdade. Cabe ao poder público, através do estabelecimento de políticas públicas e ações fiscalizatórias, coibir os excessos que podem prejudicar a saúde e o bem-estar coletivo. Outro conceito que devemos destacar é que, ao falar de meio ambiente, lembramos a floresta amazônica, o mico leão dourado ou as falésias do nosso vasto litoral. Porém, não devemos esquecer que o meio ambiente é o meio em que vivemos. Se vivemos em um local urbanizado, este é o ambiente que devemos considerar. É necessário pensar em como manter uma melhor qualidade de vida, ainda que estejamos em meio a trânsito, poluição do ar, ruídos, falta de verde. Como sentimos o nosso ambiente? O homem é um ser subjetivo para o qual sentimentos e sensações são diferentes uns dos outros. Sentimos o ambiente e suas influências de formas diferentes. Por exemplo: um indígena, acostumado a viver junto à natureza e com sua cultura própria, provavelmente verá um ambiente urbanizado como um lugar impossível de se viver - o que para nós é um ambiente perfeitamente habitável.

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Talvez tenhamos que avançar um pouco na questão de como cada um sente o seu ambiente. A poluição o incomoda? Até que ponto você se irrita com o trânsito de São Paulo? Ainda que todos saibam que o trânsito, a poluição e a falta de segurança trazem problemas sérios à saúde física e psicológica, cada pessoa sente e tem reações variadas diante das situações. Ainda que elas incomodem mais ou menos cada pessoa, algo precisa ser feito para tornar a vida nas grandes cidades um pouco melhor. Em um contexto onde o meio ambiente tornou-se fundamental para a continuidade da vida na Terra, o fomento a políticas públicas ambientais surge como um desafio. Muitos mecanismos têm sido propostos, como as Parcerias Público e Privadas, a criação de ferramentas de financiamento de planos, programas e projetos ambientais e, ainda, os chamados consórcios municipais, onde os pequenos municípios, que não dispõem de muitos recursos técnicos e financeiros, podem juntar-se para obter melhores resultados em suas ações, com o apoio de outras esferas de governo. No entanto, os resultados somente serão obtidos se houver esforço conjunto entre os governos municipal, estadual e a União, no sentido de se integrarem em busca de resultados comuns. Quando falamos em fomento, estamos nos referindo ao dinheiro para o financiamento de projetos ambientais. Sem esforço conjunto, as iniciativas bem sucedidas realizadas até o momento correm o risco de ter eficácia comprometida por se tornarem iniciativas isoladas.

Entre diversas iniciativas adotadas pelo poder público a favor do meio ambiente, uma que merece destaque é a criação dos Fundos Socioambientais Públicos para incentivar a implantação de projetos ambientais em diversas áreas - envolvendo educação ambiental, intervenções como o plantio urbano, o reflorestamento, a preservação de florestas e mananciais. Cada esfera de governo pode ter fundos ambientais próprios, com finalidades específicas - como o Fundo Nacional do Meio Ambiente, o Fundo para preservação da Amazônia, os Fundos de Recursos Hídricos e de Direitos Difusos. Para integrar e fortalecer a operação e o funcionamento dos Fundos Socioambientais foi criada a Rede Nacional de Fundos Socioambientais Públicos, que integra informações e troca de experiências entre fundos de todo o Brasil - públicos ou privados - no sentido de obter melhores resultados e o incentivo à criação de novos fundos socioambientais. No âmbito do município de São Paulo, foi criado em 2001 o Fundo Especial do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, conhecido como FEMA. Presidido pelo Secretário Municipal do Verde e do Meio Ambiente, o Conselho do FEMA é composto paritariamente por membros do governo e representantes da sociedade civil. Isto representa a participação direta da população nas decisões de aplicação dos recursos desse fundo. Quando falamos em Fundo, estamos falando de uma instituição que possui recursos financeiros para aplicação específica. Trata-se de uma via de mão dupla: para haver recursos disponíveis, eles devem ser gerados de alguma forma. As for-

mas de geração de recursos para alimentar o FEMA são, entre outras, dotações orçamentárias próprias, recursos advindos de acordos, contratos, doações, Termos de Compromissos Ambientais (TCAs), Créditos de Carbono e uso de espaços públicos. Estes recursos são depositados em uma conta corrente específica e lá permanecem até serem usados no apoio a projetos ambientais. E como são aplicados estes recursos? O apoio a projetos é feito de forma direta, através de organizações não-governamentais ou órgãos públicos cujos projetos atendam a política ambiental do Município e especificações de oito editais de chamamento para a seleção dos projetos. Após análise, os projetos são submetidos à deliberação do Conselho do Fundo, que elege quais serão beneficiados com os recursos. O princípio deste modelo de apoio financeiro às ONGs surge da necessidade do governo de realizar ações com o apoio das lideranças locais, o que permite maior segurança na obtenção de resultados positivos, pois, quando se conta com o engajamento da população, os resultados tornam-se mais eficientes e estáveis, garantindo a sustentabilidade dos projetos. Além disto, é necessário reconhecer que o poder público não dispõe de recursos humanos e técnicos para a realização de um número de projetos que atenda à demanda da população para a questão ambiental de forma pontual, respeitando as especificidades e características de cada região. Somente uma entidade local com conhecimento das necessidades e precariedades locais poderá fazê-lo. Dessa forma, as parcerias são o melhor instrumento para se atingir objetivos concretos. 35


O Fundo Especial do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável – FEMA vem apoiando projetos desde 2005, quando ocorreu o lançamento do Edital número 01, que, como piloto, financiou apenas três projetos. A partir daí, anualmente é lançado pelo menos um edital de chamamento para a seleção de projetos, com crescimento exponencial no número de projetos apresentados. Para que os resultados sejam mais eficientes e as ações não se diluam em uma cidade tão grande e com tantos problemas ambientais, alguns editais focam um tema ou local específico da mesma. Assim, os objetivos dos projetos tornam-se mais visíveis para os beneficiados, que passam a perceber melhor seus resultados. Foi o que ocorreu entre os anos de 2005 e 2009, com o lançamento de três editais direcionados à preservação de Áreas de Proteção Ambiental e mananciais no extremo sul da cidade de São Paulo, mais especificamente as APAs dos rios Capivari-Monos e Boboré-Colônia. Durante este período, foram aplicados mais de R$ 3 milhões em projetos de educação ambiental, criação de viveiros, agricultura urbana sustentável, além de trabalhos com a comunidade indígena e a colônia alemã que habitam a região. Ao todo, o Fundo Especial do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável já lançou oito editais, com um número to-

tal de mais de sessenta projetos implantados e um montante de mais de R$ 6 milhões aplicados. Além disto, através de projetos de recuperação de áreas verdes, implantação de praças, implantação de centro de recuperação de animais silvestres e projetos de implantação de parques lineares, já foram aplicados pela Prefeitura mais de R$ 30 milhões, obtidos através de leilões de créditos de carbono gerados pela queima, e geração de energia dos aterros sanitários Bandeirantes e São João. A Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente também vem trabalhando para a aprovação de um projeto de lei que, se aprovado pela Câmara de Vereadores, permitirá que o FEMA efetue o pagamento por serviços ambientais (PSA) diretamente aos proprietários de terras que possuam áreas preservadas que forneçam serviço ambiental para toda a cidade. A expectativa para o próximo ano é o lançamento de um novo edital que garanta a continuidade das parcerias entre o poder público e a sociedade civil numa mesma direção. Vale informar que as reuniões do Conselho do Fundo Especial do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável FEMA são abertas à população, e seu calendário encontra-se disponível no site da Prefeitura do Município de São Paulo.

Rubens Borges é administrador, especialista em Educação Ambiental e Secretário Executivo do Fundo Especial do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (FEMA).

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BIOMAS BRASILEIROS

AMAZÔNIA

PLÍNIO AGUIAR RIBEIRO

fotografias de Miriam Prochnow e Wigold B. Schäffer

características “é surpreendente pensar que o bioma Amazônico ocupa quase metade do território brasileiro. Isso traz uma série de responsabilidades ao Brasil, que detém quase 60% do bioma, lembrando que o restante está espalhado em outros oito países”

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Verde Versátil: Quais as principais características do bioma Amazônico, que o diferenciam dos demais? Plínio Ribeiro: Eu diria que a principal diferença em relação aos outros biomas é o tamanho e o histórico da ocupação. É claro que existe uma infinidade de diferenças ecológicas entre eles, mas é surpreendente pensar que o bioma Amazônico ocupa quase metade do território brasileiro. Isso traz uma série de responsabilidades ao Brasil, que detém quase 60% do bioma, lembrando que o restante está espalhado em outros oito países. Na Amazônia tudo é colossal. Só os afluentes do rio Amazonas possuem aproximadamente 25.000 km de trechos navegáveis. É muito importante não considerar toda essa área como se fosse tudo homogêneo. Na verdade, tirando o verde das árvores, quase todo o resto é diferente de região pra região. Há muitas amazônias na Amazônia: cultural, social e ecologicamente falando.

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ameaças

potencialidades

visite

atrativos

VV: Quais as principais ameaças que o bioma enfrenta e qual é a situação de conservação atual? PR: Quando se pensa em Amazônia, duas coisas vêm à mente: floresta e desmatamento - e, é claro, a relação entre as duas.

VV: Quais as potencialidades do bioma em termos de serviços ambientais e desenvolvimento de oportunidades econômicas sustentáveis? PR: As potencialidades são muitas, mas os meios ainda inadequados. É importante lembrar que mais de 90% do que resta de floresta na Amazônia está localizado em áreas públicas: Territórios Indígenas, Unidades de Conservação e as chamadas “terras sem destinação”. As oportunidades econômicas, por sua natureza, só podem ser aproveitadas por agentes privados, logo, se faz urgentemente necessária a criação de instrumentos que permitam parcerias público-privadas para que elas sejam perseguidas. A falta desse ambiente legal de atuação conduz muita gente a entrar na ilegalidade em busca de retornos a curto prazo, e, numa área desse tamanho, é praticamente impossível coibir esse tipo de atuação. As atividades sustentáveis exigem um período muito mais longo para trazerem os retornos desejáveis, e para que esse investimento aconteça é preciso segurança institucional, fundiária e crédito específico. Aumentar o risco da ilegalidade é também uma forma de diminuir a concorrência desleal.

VV: Por que o bioma em questão merece uma visita de nosso leitor? PR: Alguns números falam por si só: 1.300 espécies de peixes conhecidas de um total estimado de 4.000, a onda mais longa do mundo na pororoca do rio Araguari, 170 etnias e mais de 100 idiomas, a maior biodiversidade do planeta. Conhecer a Amazônia é conhecer o Brasil.

VV: Quando viajar para conhecer o bioma amazônico, o que nosso leitor não pode deixar de conhecer? Pode citar, além dos atrativos naturais, aspectos humanos, como alimentação, modo de vida da população local, manifestações artísticas e culturais? PR: Numa região tão grande e tão diversa, fica difícil listar os atrativos mais interessantes. Várias viagens e expedições são necessárias. Mas existem alguns lugares que são mágicos: Alter do Chão, próxima a Santarém, com suas praias brancas e águas azuis. O arquipélago de Anavilhanas, próximo a Manaus. Manaus é uma cidade interessantíssima, que abriga a história da época da borracha e onde é possível presenciar o “choque” entre civilização e natureza. São Gabriel da Cachoeira, sem dúvida, é um dos municípios mais belos do país. A Reserva de Desenvolvimento Sustentável de Mamirauá, que tão bem soube conciliar turismo, manejo e conservação. Uma viagem de carro entre Porto Velho e Rio Branco dá uma pista do que é uma fronteira se expandindo e levando a floresta no caminho. Xapuri, no Acre, que conta a vida dos seringueiros pela manutenção de suas florestas. Macapá tem um belo forte erguido na época dos portugueses, e é possível ver a imensidão da foz do Amazonas. Boa Vista, cidade planejada, de onde saem uma série de excursões principalmente ao Monte Roraima. O Parque Estadual do Cristalino, no norte do Mato Grosso, que é uma região riquíssima em diversidade de pássaros. Belém tem uma culinária e cultura sensacionais, com destaque para o carimbó. Sem contar a ilha de Algodoal, não muito distante da capital paraense, onde é possível observar o encontro da floresta com o oceano Atlântico, atraindo uma grande quantidade de aves migratórias, com uma variação de maré inacreditável. Enfim, viagens para a vida inteira.

Estima-se que perto de 18% da Amazônia Legal (área que não se limita ao bioma) já esteja completamente desmatada. Outros 40% já sofreram algum grau de degradação, o que torna essas áreas mais suscetíveis a futuros desmatamentos, invasões e fogo. As ameaças são muitas: madeira ilegal, pecuária, conversão de florestas em agricultura de larga escala. Mas isso é, no fundo, o resultado de visões de desenvolvimento que não estão conectadas à conservação, e, principalmente, da nossa incapacidade em atribuir valor econômico à floresta em pé.

Plínio Aguiar Ribeiro é diretor executivo e cofundador da Biofílica Investimentos Ambientais, empresa brasileira focada na gestão de florestas na Amazônia e comercialização de seus respectivos serviços ambientais. Foi produtor do documentário “Return to the Amazon”, de Jean Michel Cousteau. É formado em administração de empresas pelo Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper) e tem mestrado em Meio Ambiente e Políticas Públicas pela Universidade de Columbia em Nova Iorque.

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“As atividades sustentáveis exigem um período muito mais longo para trazerem os retornos desejáveis, e para que esse investimento aconteça é preciso segurança institucional, fundiária e crédito específico”

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BIOMAS BRASILEIROS

CERRADO

MAURO PIRES

fotografias de Miriam Prochnow e Wigold B. Schäffer

características Verde Versátil: Quais as principais características do bioma Cerrado, que o diferenciam dos demais? Mauro Pires: O Cerrado é o segundo maior bioma brasileiro, com área de 2 milhões de km², abrangendo dez Estados e o Distrito Federal, e responsável pelas principais nascentes que vertem suas águas para formar as bacias hidrográficas do continente sul-americano: a bacia do Tocantins-Araguaia, que faz parte da bacia Amazônica, a do São Francisco e a do rio Paraná-Prata. Sua biodiversidade é estimada em pelo menos 5% de todas as espécies terrestres do planeta, com mais de 12 mil espécies lenhosas. É considerado uma espécie de “floresta para baixo”, pois, embora boa parte de suas árvores não sejam tão altas quanto às das florestas tropicais, têm profundas raízes, muitas das quais chegam a 12 m de profundidade. Daí, sua grande importância em termos de armazenamento de carbono. Quando é desmatado ou queimado, sua bio42

massa acaba transformando-se em gases de efeito estufa, o que prejudica o clima global. Ele é pouco conhecido, até mesmo pelos brasileiros! Mundialmente, quando se pensa no meio ambiente do Brasil, os olhos se voltam primeiro para a Amazônia e, às vezes, para a Mata Atlântica. Outros biomas brasileiros, como a Caatinga e o próprio Cerrado, não recebem a atenção internacional. Basta imaginar o seguinte: quando pensamos em savanas, todo mundo lembra as savanas africanas, mas desconhece que o Brasil também tem as suas! O Cerrado é um tipo diferenciado de savana, porque é formado por vários tipos de vegetação. O melhor é vê-lo como um grande mosaico vegetacional, com grande variação: tem desde ecossistemas formados principalmente por gramíneas, como o campo limpo ou campo sujo, chega até os tipos denominados “cerradão” e às matas ciliares - que quase se confundem com as florestas tropicais tipicamente conhecidas. 43


ameaças VV: Quais as principais ameaças que o bioma enfrenta e qual é a situação de conservação atual? MP: Segundo dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), o bioma Cerrado teve uma área suprimida de 48,22% até o ano de 2009. Ou seja, quase metade de sua área original. No período de 2002 a 2008, a taxa anual média de desmatamento foi de aproximadamente 14.200 km², a maior taxa dentre os seis biomas brasileiros. Isso equivale a um valor médio anual duas vezes maior do que a taxa de desmatamento da Amazônia em 2009 (7.400 km²), embora o bioma tenha uma área duas vezes menor que a floresta amazônica. Ou seja, o ritmo do desmatamento é mais intenso e veloz, pois começou há quatro décadas. As principais atividades econômicas associadas ao desmatamento na região têm a ver com a pecuária, a agricultura e a extração de matéria lenhosa para a produção de carvão vegetal - usado para a produção de ferro gusa - e aço, sobretudo no polo siderúrgico de Minas Gerais. Embora o percentual de Reserva Legal (área dentro de cada propriedade) devesse ser destinado ao uso sustentável e à conservação - seja de apenas 20% do total da propriedade (à exceção dos 35% das áreas de Cerrado dentro da Amazônia Legal) - muitas propriedades chegam a ter 100% de sua área totalmente desmatada. Isto leva a vários prejuízos, inclusive econômicos. Os rios se tornam assoreados, os animais perdem seu habitat, e os serviços ambientais, como a polinização das plantas e a manutenção do ciclo hidrológico, ficam prejudicados. Os próprios agricultores se tornam vítimas, porque, sem a polinização natural, acabam gastando mais com fertilizantes e agrotóxicos, que contaminam solo e rios. E, como a água é cada vez mais cara, com o assoreamento aumentam as despesas para obtê-la com a qualidade necessária. Além disso, o Cerrado tem poucos parques e reservas ambientais. Menos de 3% do bioma está dentro de Unidades de Conservação de Proteção Integral.

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potencialidades

visite

atrativos

VV: Quais as potencialidades do bioma em termos de serviços ambientais e desenvolvimento de oportunidades econômicas sustentáveis? MP: O Cerrado é visto como o celeiro do mundo, porque nele ocorre boa parte do agronegócio brasileiro. É possível usá-lo e produzir alimentos sem destruí-lo. É um ambiente cheio de oportunidades. Como está no coração do Brasil, conta com uma malha rodoviária muito propícia, por exemplo, para o ecoturismo. Seus frutos são usados na fabricação de doces, geleias e muitas outras guloseimas. Seus princípios ativos são úteis na indústria cosmética e medicinal.

VV: Por que o bioma em questão merece uma visita de nosso leitor? MP: Porque ele é lindo, fácil de chegar e merece ser valorizado.

VV: Quando viajar para conhecer o bioma Cerrado, o que nosso leitor não pode deixar de conhecer? Pode citar, além dos atrativos naturais, aspectos humanos, como alimentação, modo de vida da população local, manifestações artísticas e culturais? MP: O Cerrado faz parte da cultura sertaneja do interior do Brasil. Nele ocorrem diversas festas locais, como a Festa das Cavalhadas, em Pirenópolis-GO, no mês de maio. Aliás, está aí uma boa oportunidade para conhecer as belezas do Cerrado: Pirenópolis, além de ser uma charmosa cidade de estilo colonial, abriga inúmeras cachoeiras, que são uma grande atração turística. E está a uma hora e meia de carro, saindo de Brasília. Os parques nacionais do bioma, como o Parque Nacional da Chapada dos Guimarães, próximo a Cuiabá, o Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros, a duas horas de Brasília, e o Parque Serra do Cipó, em Minas Gerais, são boas opções de turismo e lazer.

“O Cerrado é o segundo maior bioma brasileiro, com área de 2 milhões de km², abrangendo dez estados e o Distrito Federal”

“o Cerrado tem poucos parques e reservas ambientais. Menos de 3% do bioma está dentro de Unidades de Conservação de Proteção Integral”

Mauro Pires é sociológo, analista ambiental do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e diretor do Departamento de Políticas de Combate ao Desmatamento do Ministério do Meio Ambiente (MMA).

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BIOMAS BRASILEIROS

PAMPA

EDUARDO VÉLEZ

fotografias de Miriam Prochnow e Wigold B. Schäffer

características Verde Versátil: Quais as principais características do bioma Pampa, que o diferenciam dos demais? Eduardo Vélez: No bioma Pampa, a vegetação nativa predominante são os campos, ao invés das florestas. Na maior parte do bioma, o relevo é suavemente ondulado, formando pequenas elevações denominadas coxilhas. O clima é subtropical e se caracteriza pela presença de chuvas bem distribuídas ao longo do ano e temperaturas médias mais baixas. A vegetação herbácea (capins, gramas, ervas), que recobre as paisagens tipicamente abertas, é muito diversificada, com cerca de 450 espécies de gramíneas. Também ocorrem capões de mata, estreitas florestas de galeria e árvores isoladas, além de formações arbustivas que dão

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um aspecto de savana para várias porções do bioma. Estão presentes muitas espécies de aves, répteis e mamíferos que dependem da existência dos campos para a sua sobrevivência (ema, perdiz, codorna, veado–campeiro, zorrilho, tatu-mulita, tuco-tuco). Na sua porção sudeste, a oeste da Laguna dos Patos, o Pampa também abriga uma região montanhosa e geologicamente muito antiga, denominada de Serra do Sudeste, com elevações próximas de 600 m. Nesta região estão presentes formações geológicas singulares, com ruínas e guaritas de rara beleza cênica nas redondezas de Caçapava do Sul. Também estão presentes muitas espécies de cactos endêmicas (que só ocorrem naquela região) sobre alforamentos rochosos.

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ameaças

potencialidades

visite

atrativos

VV: Quais as principais ameaças que o bioma enfrenta e qual é a situação de conservação atual? EV: As principais ameaças à biodiversidade do Pampa decorrem da conversão dos campos em extensas áreas de agricultura, especialmente para o plantio de soja e de arroz. Atualmente, há uma grande preocupação com o avanço da silvicultura, já que grandes plantações de eucalipto estão sendo implantadas no Pampa, especialmente em locais menos propícios para a agricultura. Em 2008, somente 36% de sua cobertura vegetal nativa ainda estava conservada e muitas regiões já haviam perdido completamente as características das paisagens originais. Talvez pela pouca presença de florestas, este bioma tenha recebido tão pouca atenção do ponto de vista da conservação da sua biodiversidade. No Pampa há pouquíssimas unidades de conservação (parques e reservas) e as que existem são pequenas e ainda não foram devidamente implementadas.

VV: Quais as potencialidades do bioma em termos de serviços ambientais e desenvolvimento de oportunidades econômicas sustentáveis? EV: A vocação econômica do Pampa são as atividades pastoris. A pecuária praticada de forma sustentável, tendo a vegetação nativa dos campos como recurso forrageiro, representa uma alternativa de produção com baixo nível de insumos, garantia de ganhos econômicos e pouco impacto sobre os ambientes naturais, desde que aplicadas técnicas de manejo ecológico da vegetação campestre.

VV: Por que o bioma em questão merece uma visita de nosso leitor? EV: O Pampa se estende em direção ao sul, ocupando todo o Uruguai e parte da Argentina, conformando uma das regiões de campos temperados mais importantes do planeta. Para quem vive num país “florestal”, vale a pena conhecer as paisagens pampeanas e aproveitar para percorrê-las também em roteiros pelo interior dos nossos países hermanos. Desde a colonização ibérica, o desenvolvimento das atividades pastoris no Pampa ensejou o desenvolvimento de uma cultura mestiça singular, de característica transnacional, representada pela figura do gaúcho. Conhecer o Pampa representa uma grande oportunidade de contato com o modo de vida, os costumes, usos, valores e tradições desta importante cultura nacional. A região também conta com uma rica história de contendas e batalhas pela conquista do território entre portugueses e espanhóis e foi também o palco da Revolução Farroupilha (1835-1845).

VV: Quando viajar para conhecer o bioma Pampa, o que nosso leitor não pode deixar de conhecer? Pode citar, além dos atrativos naturais, aspectos humanos, como alimentação, modo de vida da população local, manifestações artísticas e culturais? EV: Um bom passeio pelo Pampa começa em Porto Alegre e vai até a cidade de Caçapava do Sul, onde podem ser visitadas formações geológicas de grande beleza cênica como as Guaritas, a Pedra do Segredo e a Casa de Pedra. A seguir vai-se até a cidade de Bagé, onde ocorre a Festa Internacional do Churrasco, no mês de novembro. Desde esta cidade percorre-se as paisagens da Campanha Gaúcha, passando pela cidade de Dom Pedrito até chegar à cidade fronteiriça de Santana do Livramento. Em Livramento há pousadas em estâncias onde podem ser apreciadas as lidas campeiras, vinícolas e oportunidade de compras no free shop de Rivera, no Uruguai. Outra opção para conhecer as manifestações artísticas e culturais é visitar o Pampa durante os festejos da Semana Farroupilha, de 7 a 20 de setembro, ou escolher um dos diversos rodeios que ocorrem ao longo do ano.

É um paradoxo que se desmate a Amazônia para criar gado, e se plante eucalipto no Pampa desconsiderando a vocação natural do bioma para a pecuária.

Eduardo Vélez é biólogo com pós-graduação em ecologia. Foi diretor do Museu de Ciências Naturais da Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul e diretor de Patrimônio Genético do Ministério do Meio Ambiente. Reside em Porto Alegre e participa como consultor em projetos de conservação da natureza.

“Um bom passeio pelo Pampa começa em Porto Alegre e vai até a cidade de Caçapava do Sul, onde podem ser visitadas formações geológicas de grande beleza cênica como as Guaritas, a Pedra do Segredo e a Casa de Pedra”

Mais informações www.turismo.rs.gov.br. www.semanafarroupilha.com.br www.dupago.com.br 48

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BIOMAS BRASILEIROS

MATA ATLÂNTICA

MÁRCIA HIROTA

fotografias de Miriam Prochnow e Wigold B. Schäffer

características Verde Versátil: Quais as principais características do bioma Mata Atlântica, que o diferenciam dos demais? Márcia Hirota: A Mata Atlântica está entre as mais importantes e ameaçadas florestas do planeta. Abrange um mosaico de fisionomias e vegetação, com florestas ombrófilas densas, abertas e mistas; florestas estacionais deciduais e semideciduais; campos de altitude, mangues e restingas que se estendem ao longo da costa brasileira, do Nordeste ao Sul, atingindo áreas da Argentina e do Paraguai nas regiões Sudeste e Sul. No Brasil, o bioma Mata Atlântica abrangia uma área equivalente a 1.315.460 km² e estendia-se originalmente ao longo de 17 Estados (Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Goiás, Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Espírito Santo, Bahia, Alagoas, Sergipe, Paraíba, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Ceará e Piauí). É um dos

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biomas mais ricos em termos de biodiversidade, com mais de 20 mil espécies de plantas, sendo 8 mil endêmicas; 270 espécies conhecidas de mamíferos (55 endêmicas); 1.020 espécies de aves (188 endêmicas); 197 répteis (60 endêmicas); 372 anfíbios (mais de 90 endêmicas); 350 peixes (133 endêmicas). Embora rico, o bioma Mata Atlântica é um dos mais ameaçados de extinção do planeta. Das 633 espécies de animais ameaçados de extinção no Brasil, 383 ocorrem na Mata Atlântica. A área é considerada um hotspot mundial, ou seja, uma das mais ricas em biodiversidade e mais ameaçadas do planeta. Foi decretada Reserva da Biosfera pela UNESCO e Patrimônio Nacional pela Constituição Federal de 1988. É o único bioma brasileiro que tem uma lei específica desde 2006, Lei nº 11.428, publicada em 2008 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

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ameaças

potencialidades

visite

atrativos

VV: Quais as principais ameaças que o bioma enfrenta e qual é a situação de conservação atual? MH: O bioma Mata Atlântica foi o primeiro a ser descoberto pelos europeus. A história do Brasil é a história da devastação da Mata Atlântica. No início da “descoberta”, os portugueses vislumbraram a Terra Brasilis como uma inesgotável fonte de renda. O uso do pau-brasil, árvore da qual era extraída uma tintura muito utilizada pela indústria têxtil na época, gerava uma imensa mão de obra disponível a ser catequizada, os povos indígenas, que eram considerados as principais matérias-primas. Do quase extermínio do pau-brasil, partimos para os diversos ciclos econômicos, como o do ouro, o da cana-de-açúcar e, posteriormente, o do café. Outros ciclos econômicos vieram e, como se já não bastassem os milhares hectares destruídos para a (des) construção do país, vivemos, mais recentemente, um veloz processo de industrialização e, consequentemente, a urbanização - com as principais cidades brasileiras assentadas hoje na área original da Mata Atlântica. Temos, atualmente, 7,9% de remanescentes florestais, considerando as ilhas de floresta nativa acima de 100 hectares. Ou seja, restam hoje menos de 8% da Mata Atlântica original. Se considerarmos todos os fragmentos florestais acima de 3 hectares, temos 11% da área original. O processo de devastação é contemporâneo e, embora o ritmo tenha diminuído, ainda ocorrem desmatamentos em várias regiões do Brasil, seja para expansão das fronteiras agrícola e pecuária, a ocupação humana nas cidades, as queimadas e obras de infraestrutura.

VV: Quais as potencialidades do bioma em termos de serviços ambientais e desenvolvimento de oportunidades econômicas sustentáveis? MH: A Mata Atlântica beneficia direta e indiretamente mais de 118 milhões de habitantes, que correspondem a 62% da população do país. A floresta ajuda na regulagem do fluxo de mananciais hídricos, garantindo o abastecimento de água de muitas cidades brasileiras. Ajuda também a evitar a erosão e diminuir a incidência de desastres naturais, protegendo o solo. Também atua no controle do clima e é fonte de alimentos e plantas medicinais. As maiores potencialidades estão nos atrativos que oferece, regiões com beleza cênica singular. Os maiores desafios são aliar o desenvolvimento regional e a conservação da natureza, seja por meio do turismo, do manejo de espécies e outras atividades sustentáveis, que propiciam negócios e geram trabalho e renda para as comunidades locais.

VV: Por que o bioma em questão merece uma visita de nosso leitor? MH: Boa parte das cidades brasileiras encontra-se em área de Mata Atlântica. Sabe-se da qualidade de vida que a Mata Atlântica proporciona a essa população e, dentre outras funções, de seus inúmeros benefícios, diretos e indiretos. Para citar alguns, primeiramente, o vital: a água, já que ela protege e regula o fluxo de mananciais hídricos que abastecem as cidades e principais metrópoles brasileiras. Além disso, abriga rica e enorme biodiversidade, preserva beleza paisagística e um patrimônio histórico de valor inestimável, abrigando várias comunidades indígenas, caiçaras, ribeirinhas e quilombolas, que constituem a genuína identidade cultural do Brasil.

VV: Quando viajar para conhecer o bioma Mata Atlântica, o que nosso leitor não pode deixar de conhecer? Pode citar, além dos atrativos naturais, aspectos humanos, como alimentação, modo de vida da população local, manifestações artísticas e culturais? MH: São várias dicas. Em primeiro lugar visitar e conhecer a Mata Atlântica. Há vários parques espalhados nos Estados, seja na região costeira ou mais no interior, que devem ser visitados. Existem paisagens belíssimas e inúmeras atividades que cada um pode fazer. Alguns exemplos: Parques Nacionais do Iguaçu (PR), Itatiaia (RJ/MG/SP), Tijuca, (RJ), Monte Pascoal (BA) e outras áreas bem preservadas. Em cada região, as pessoas podem apreciar as comidas típicas: peixe à caiçara, moqueca baiana ou capixaba; frutas da época, jabuticaba, caju, mangaba, pitanga; alimentos como o palmito-juçara, pinhão, erva-mate. Mas conhecer e cuidar da Mata Atlântica também é conhecer e cuidar do ambiente ao nosso redor. Lutar pela arborização urbana e pelos parques dentro das cidades; descartar corretamente o lixo; evitar desmatamentos; economizar água, energia e outros recursos; procurar alternativas para o uso excessivo de veículos, tudo isto também faz parte da atitude de conhecer e proteger este bioma tão importante para os brasileiros.

“Das 633 espécies de animais ameaçados de extinção no Brasil, 383 ocorrem na Mata Atlântica”

“A história do Brasil é a história da devastação da Mata Atlântica”

Márcia Hirota é diretora de gestão do conhecimento da Fundação SOS Mata Atlântica, supervisora dos programas e projetos institucionais e coordenadora do Atlas dos Remanescentes Florestais da Mata Atlântica, desenvolvido em parceria com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE).

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BIOMAS BRASILEIROS

PANTANAL

NÍCIA WENDEL DE MAGALHÃES

fotografias de Miriam Prochnow e Wigold B. Schäffer

características Verde Versátil: Quais as principais características do bioma Pantanal, que o diferenciam dos demais? Nícia Magalhães: O Pantanal é privilegiado, porque é uma mistura, compõe um verdadeiro mosaico. Em relação à parte botânica, tem vegetação de Cerrado, de Mata Atlântica e Amazônia. Nas áreas secas, existem topos de morros de formação calcária e vegetação de Caatinga. Consequentemente, em relação à fauna, há animais que migram da Mata Amazônica. Se você vai ao Pantanal do Sul, vê bichos da Mata Atlântica com facilidade, e até migração dos Andes. O nome “pantanal” não é muito adequado, porque o Pantanal

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não é um pântano. É seco e, na época das secas, o povo sofre, porque a água vai embora e tem que fazer poços. O que regula a vegetação e a exuberância do Pantanal são as enchentes do rio Paraguai. Toda a área pertence à bacia do rio Paraguai. Politicamente, há oitenta anos o Mato Grosso era um Estado só; depois, foi dividido em Mato Grosso do Sul e Mato Grosso. Praticamente não há diferença de aspecto, mas de animais encontrados se atravessarmos o Mato Grosso de leste a oeste ou de norte a sul. As migrações variam e, assim, há épocas em que não é possível ver alguns animais. O Pantanal é um complexo.

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visite

atrativos

VV: Quais as principais ameaças que o bioma enfrenta e qual é a situação de conservação atual? NM: Eu conheço bem o Pantanal desde os anos 80. Íamos com frequência na beirada do rio Miranda e acompanhamos como o lugar começou a ser ocupado demais. Com a pesca e o turismo de massa, o lugar acabou se deteriorando e acabaram os bichos. Hoje para observação de animais é necessário o acompanhamento de biólogos que conhecem a área, seus ciclos e os hábitos das espécies.

VV: Quais as potencialidades do bioma em termos de serviços ambientais e desenvolvimento de oportunidades econômicas sustentáveis? NM: O grande atrativo do Pantanal para os turistas ainda é ver bichos. E um turismo consciente pode ajudar a proteger o bioma. Por exemplo, conheci uma fazenda que faz parcerias com universidades, pesquisa animais, trabalha com rastreamento de onças, jaguatiricas e onça parda. Eu já tinha ouvido falar e visitei o local com uma turma de turistas. Foi muito divertido, porque houve diversão e atrativos para todos os gostos. Chegamos num calor danado, houve mudança de tempo, chuva, frio pela manhã. Deu para passear bem e vimos os bichos saindo, muito lindo!

VV: Por que o bioma em questão merece uma visita de nosso leitor? NM: Em nenhum lugar do Brasil podemos encontrar vegetação de Caatinga, Cerrado, Mata Atlântica e Amazônia na mesma área. O visitante não pode deixar de ver esta complexidade.

VV: Quando viajar para conhecer o bioma Pantanal, o que nosso leitor não pode deixar de conhecer? Pode citar, além dos atrativos naturais, aspectos humanos, como alimentação, modo de vida da população local, manifestações artísticas e culturais? NM: Se você for observar plantas, os ipês florescem nas secas. Coincide com a época boa de ver os bichos. Mas se quer ver cambará, tem que ser em outra época. A melhor época para visitar o bioma é do fim de maio até setembro, mês em que começam as chuvas e os bichos estão todos em volta das lagoas, concentrados. Há lugares com veículos adaptados para safáris em que se pode fazer o melhor de tudo: passeios noturnos. Os guias levam lanternas e encontram o brilho nos olhos dos animais, que, já acostumados, continuam fazendo o que estavam fazendo. A gente rejuvenesce quando faz uma viagem assim.

“Em nenhum lugar do Brasil podemos encontrar vegetação de Caatinga, Cerrado, Mata Atlântica e Amazônia na mesma área”

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“O Pantanal é privilegiado, porque é uma mistura, compõe um verdadeiro mosaico”

Nícia Wendel de Magalhães é uma das precursoras da educação ambiental no Brasil e professora por excelência. Ambientalista, formou-se em História Natural pela Universidade de São Paulo e foi professora do ensino médio em escolas da rede pública e privada. Em 1981 fundou a ECO – Associação para Estudos do Ambiente, ONG que entre os anos de 1981 a 1995 promoveu projetos educativos levando alunos a campo. Mais tarde passou a realizar expedições ecológicas pelo Brasil e hoje atua em diversos projetos ambientais com comunidades.

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BIOMAS BRASILEIROS

CAATINGA

MIRIAM PROCHNOW E WIGOLD B. CHÄFFER

fotografias de Miriam Prochnow e Wigold B. Schäffer

características

“O Parque Nacional da Chapada Diamantina, com seus 152.000 hectares, é um dos mais fascinantes parques naturais no Brasil, marcado pelo encontro de vegetações típicas da Caatinga, Cerrado e Mata Atlântica, onde bromélias, orquídeas, sempre-vivas e cactos vivem em harmonia, adaptados aos mais variados ambientes ... O parque e seu entorno são o berço de 50% dos rios que banham o território baiano”

“O Parque Nacional da Serra da Capivara é também um dos mais importantes patrimônios culturais pré-históricos do Brasil, com a maior concentração de sítios arqueológicos atualmente conhecida nas Américas. Tudo isso fez com que a Organização das Nações Unidas pela Educação, Ciência e Cultura (Unesco) reconhecesse o Parque como Patrimônio Cultural da Humanidade”

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Verde Versátil: Quais as principais características do bioma Caatinga, que o diferenciam dos demais? Nas terras que guardam as memórias dos habitantes mais antigos do Brasil, e por onde andaram Lampião e Maria Bonita, existem outras histórias que mexem com a emoção. Uma das mais recentes e significativas é a da ararinha-azul (Cyanopsitta spixii), uma espécie endêmica da Caatinga cujo último exemplar, que vivia no Raso da Catarina, na Bahia, desapareceu para sempre da natureza em outubro do ano 2000, depois de insistentes tentativas dos pesquisadores em conseguir um par para o macho solitário que habitava uma das paisagens mais inóspitas e secas do país. Estamos falando da Caatinga, uma região semiárida, onde chove pouco e onde a vida tem um ritmo próprio, ditado pelas condições especiais impostas pela natureza. Caatinga é um nome de origem indígena. Vem do tupi caa, que significa mata, e tinga que significa branca (mata branca). Com 844.453 km², a Caatinga ocupa aproximadamente 11% do território do país, e é o único bioma exclusivamente brasileiro. É o menos conhecido dos nossos biomas, predominando no Nordeste, onde abrange de forma contínua parte dos Estados do Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia, e uma pequena parte no Sudeste, ao norte de Minas Gerais. Segundo o IBGE, o tipo de vegetação predominante no bioma é a Savana Estépica (Caatinga), com fisionomia decidual e espinhosa, composta de árvores e arvoretas que perdem as folhas na época seca, e com a presença de cactos e bromélias. No bioma Caatinga são encontrados ainda outros tipos de vegetação, como as florestas estacionais deciduais e semideciduais, associadas a ambientes

especiais, como áreas serranas, brejos e outros tipos de bolsões climáticos mais amenos. Essas áreas de florestas estacionais, conhecidas como encraves florestais do Nordeste, juntamente com as restingas e os manguezais existentes na região, integram os tipos de vegetação da Mata Atlântica e são protegidas pela Lei da Mata Atlântica (Lei nº 11.428, de 2006). Uma das principais áreas de florestas estacionais no interior do Nordeste abrange as chapadas da Serra das Confusões e da Serra Vermelha no Piauí. A região apresenta duas estações quentes distintas: uma marcada pela seca e outra pelas chuvas. A estação seca é a mais longa, podendo durar de sete a nove meses por ano. Entretanto, em alguns casos não chove durante anos sucessivos. Estas estações criam duas paisagens completamente diferentes. No período seco, a quase totalidade das árvores e outras plantas perdem as folhas. Nessa época, a Caatinga está despida, cinzenta e espinhosa. Com o surgimento das primeiras chuvas a paisagem muda rapidamente e a Caatinga é logo coberta de imenso e novo verde - que emana da enorme quantidade de pequenas folhas - e o solo fica forrado de pequenas plantas, mudando a paisagem para um verde exuberante. Um verde que se espalha por toda a parte, nas ervas e na abundante ramificação dos arbustos e das árvores. Na Caatinga, a média anual de chuva varia de 300 a 800 mm, o que torna intermitentes a grande maioria dos rios que nascem na região, os quais permanecem secos de cinco a sete meses no ano. O rio São Francisco é o principal rio que cruza os sertões da Caatinga, mantendo seu fluxo d’água perene, com águas trazidas de nascentes localizadas em outras regiões climáticas e hídricas, como a Mata Atlântica e o Cerrado.

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“Diversas espécies de plantas têm potencial para uso sustentável forrageiro, alimentício e medicinal” potencialidades

ameaças VV: Quais as principais ameaças que o bioma enfrenta e qual é a situação de conservação atual? Dados do Ministério do Meio Ambiente apontam que a porcentagem de cobertura vegetal da Caatinga ainda está em torno de 55%. Apesar desse índice razoável de cobertura vegetal, quando comparado com outros biomas, como, por exemplo, a Mata Atlântica, a Caatinga sofre com desmatamentos (muitos deles para produção de lenha e carvão vegetal) e queimadas que desencadeiam processos de desertificação. A desertificação é resultado do desmatamento e do mau uso do solo, e já existem alguns núcleos onde o processo está bem mais avançado, como Seridó (RN), Irauçuba (CE), Gilbués (PI) e Cabrobó (PE). Para se ter uma ideia da gravidade do problema, basta olhar os números que mostram que a área total suscetível à desertificação aumentou de aproximadamente 900.000 km² (2003) para mais de 1,3 milhão de km² (2007). A continuar esse processo, as regiões semiáridas do Brasil podem se transformar em áridas ou semidesertos nos próximos sessenta anos. Além de comprometer a qualidade de vida das pessoas que convivem com essa realidade, os processos de desertificação trazem prejuízos econômicos enormes ao país. Para melhorar as condições de vida na região é fundamental que se faça o controle do desmatamento e o combate à desertificação. No entanto, o desmatamento na região persiste, principalmente, no sul do Estado do Piauí e em algumas regiões da Bahia e do Ceará. Levantamento divulgado pelo Ministério do Meio Ambiente em 2010 mostra que a Caatinga já perdeu cerca de 45% de sua cobertura vegetal original. Entre 2002 e 2008 foram desmatados 16.576 km², área equivalente a 2% do bioma. A vegetação é derrubada especialmente para lenha e fabricação de carvão vegetal, destinado a alimentar siderúrgicas de Minas Gerais e do Espírito Santo e, também, para o polo gesseiro e o de cerâmica do Nordeste. Na região da Serra Vermelha, no sul do Piauí, o desmatamento para a produção de carvão envolve um esquema criminoso que conta com a colaboração de agentes públicos e empresários, conforme apontou recente relatório da Polícia Federal. A chapada da Serra Vermelha, assim como os 60

vales adjacentes, é coberta por floresta estacional decidual, tipo de vegetação protegida pela Lei da Mata Atlântica (Lei nº 11.428 de 2006). A cobertura florestal da Serra Vermelha exerce também importante papel na recarga dos aquíferos e do lençol freático do Vale do Gurgueia. A Serra Vermelha começou a ser ameaçada quando o Ibama, em março de 2006, aprovou o “Projeto Energia Verde” sem exigência de Estudo de Impacto Ambiental e respectivo Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA). O projeto, que previa o desmatamento de 78 mil hectares de floresta foi cancelado pelo próprio Ibama em 2007, após denúncia do programa Globo Repórter (Rede Globo). O cancelamento do projeto foi mantido pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região pelo fato de prever desmatamento de floresta estacional protegida pela Lei da Mata Atlântica e por prever o corte raso de 100% da floresta, o que não configura um Plano de Manejo Florestal Sustentável. Em maio de 2006, o Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), por iniciativa da Fundação Rio Parnaíba (Furpa), aprovou moção propondo a criação de um Parque Nacional na Serra Vermelha. A partir daí, o Ministério do Meio Ambiente e o Instituto Chico Mendes (ICMBio) realizaram estudos técnicos que apontaram que a totalidade da Serra Vermelha deveria ser incluída na ampliação do Parque Nacional da Serra das Confusões, processo que já estava em andamento. Estranhamente, ignorando os estudos técnicos e todos os pedidos da comunidade científica e ambientalista, o governo federal, em 31/12/2010, ampliou o Parque Nacional da Serra das Confusões, excluindo a região da Serra Vermelha. Essa decisão deixou novamente a região à mercê dos desmatadores e produtores de carvão. Diante dessa nova ameaça, a Reapi e a Rede de ONGs da Mata Atlântica (RMA) mantêm a campanha pela criação do Parque Nacional da Serra Vermelha. Outro que está na briga contra o desmatamento e pela preservação da Serra Vermelha é o Ministério Público Federal do Piauí. O leitor também pode ajudar a salvar a Serra Vermelha da destruição.

VV: Quais as potencialidades do bioma em termos de serviços ambientais e desenvolvimento de oportunidades econômicas sustentáveis? Diversas espécies de plantas têm potencial para uso sustentável forrageiro, alimentício e medicinal. As espécies medicinais são a aroeira (adstringente), o araticum (antidiarreico), o velame e o marmeleiro (antifebris). Do caroá e do sisal são extraídas fibras para artesanato, e o cajueiro e o umbuzeiro são utilizados na produção de doces. As plantas da Caatinga têm alta capacidade de resistência à seca e algumas espécies de cactáceas, como o mandacaru (Cereus jamacaru), desenvolveram a capacidade de armazenar água. O mandacaru é um cacto de porte arbóreo que atinge até 3 m de altura e é utilizado como alternativa alimentar e fonte de água para os animais na época da seca. Seus frutos são muito atrativos e saborosos, sendo consumidos in natura pela população local. Entre os animais endêmicos da Caatinga, o mocó (Kerodon rupestris) é um roedor que vive exclusivamente nos paredões e lajedos das serras. Pesquisas apontaram que o mocó vive há pelo menos 30 mil anos na região, datação obtida de fezes mumificadas encontradas nos sítios arqueológicos. Nos períodos secos, o mocó alimenta-se principalmente de cascas e resinas de árvores.

“Levantamento divulgado pelo Ministério do Meio Ambiente em 2010 mostra que a Caatinga já perdeu cerca de 45% de sua cobertura vegetal original. Entre 2002 e 2008 foram desmatados 16.576 km², área equivalente a 2% do bioma”

Mais informações http://serravermelha.blog.terra.com.br 61


visite

Ararinha-azul

atrativos

VV: Por que o bioma em questão merece uma visita de nosso leitor? É na Caatinga, também, que se encontram os sítios arqueológicos mais importantes do Brasil, como os localizados no interior do Parque Nacional da Serra da Capivara, representados, em sua maioria, por pinturas e gravuras rupestres nas quais se encontram vestígios da mais antiga presença do homem no Brasil (100.000 anos atrás). No período seco, os sertanejos precisam caminhar quilômetros em busca da água dos açudes e das raras fontes. Uma das principais iniciativas para erradicar a pobreza e a fome na região é o Programa Um Milhão de Cisternas (P1MC). Este programa é uma das ações do Programa de Formação e Mobilização Social para a Convivência com o Semiárido da Articulação no Semiárido Brasileiro (ASA), uma rede formada por cerca de 750 organizações da sociedade civil que atuam na gestão e no desenvolvimento de políticas de convivência com a região semiárida. O objetivo do programa é beneficiar cerca de cinco milhões de pessoas em toda região semiárida, com água potável para beber e cozinhar. A cisterna é uma tecnologia simples, de baixo custo e adaptável a qualquer região. A água das chuvas que cai no telhado da casa é captada e canalizada até a cisterna, que tem capacidade de armazenar aproximadamente 16 mil litros, quantidade suficiente para uma família de cinco pessoas beber e cozinhar por um período de seis a oito meses – época da seca na região. Desde que surgiu, em 2003, o programa já construiu mais de 300 mil cisternas, beneficiando mais de 1,5 milhões de pessoas. Só 7% do bioma Caatinga se encontram em unidades de conservação, e menos de 1% em unidades de conservação de proteção integral, como Parques, Reservas Biológicas e Estações Ecológicas, que são as mais restritivas à intervenção do ser humano. Proteger os recursos naturais e criar novas Unidades de Conservação, além de implantar aquelas já criadas, é uma das formas mais efetivas de promover o desenvolvimento de alternativas econômicas na região. Paisagens exuberantes, rica biodiversidade e aspectos culturais e históricos oferecem um grande potencial de desenvolvimento sustentável com geração de emprego e renda para a população da região. Isto já é realidade nos municípios que abrigam os Parques Nacionais da Serra da Capivara e Sete Cidades, no Piauí, e o Parque Nacional da Chapada Diamantina, na Bahia.

A ararinha-azul foi estudada pela primeira vez em seu habitat natural pelo naturalista alemão Johan Baptist von Spix, em 1819, em Juazeiro (BA). O nome científico Cyanopsitta spixii: Cyano significa “azul”; psitta significa “papagaio”, e o termo spixii homenageia o naturalista que a descreveu. O nome popular ararinha-azul é bem apropriado, pois a ave é praticamente toda azul, com apenas um pouco de cinza. É a menor das araras-azuis brasileiras, medindo cerca de 57 cm, dos quais 35 cm só de cauda. A ararinha-azul era uma ave endêmica da caatinga baiana e ocupava desde o extremo norte da Bahia até o sul do rio São Francisco. Vivia nas árvores mais altas, junto aos riachos intermitentes da caatinga, e alimentava-se principalmente de sementes de buriti e de outras árvores. A ararinha-azul sempre foi rara na natureza e uma das espécies mais ameaçadas de extinção do planeta. É considerada oficialmente extinta da natureza pelo Ministério do Meio Ambiente desde 2002, ano em que não foi mais encontrado o último exemplar conhecido em vida livre. Os raros indivíduos ainda existentes estão em cativeiro em diversas partes do mundo e participam de um programa de manejo reprodutivo coordenado pelo IBAMA. As principais causas da extinção da espécie na natureza são a destruição do ambiente natural e, principalmente, o tráfico de animais silvestres.

VV: Quando viajar para conhecer o bioma Caatinga, o que nosso leitor não pode deixar de conhecer? Pode citar, além dos atrativos naturais, aspectos humanos, como alimentação, modo de vida da população local, manifestações artísticas e culturais? Uma visita ao Parque Nacional da Serra da Capivara é uma verdadeira imersão no Brasil pré-histórico. Localizado no sudeste do Piauí, a 350 km de Teresina, tem 129.140 hectares e abrange parte dos municípios de São Raimundo Nonato, São João do Piauí, Coronel José Dias e Canto do Buriti. Além da exuberante paisagem, com grandes boqueirões e belíssimos paredões rochosos multicoloridos, da vegetação que mostra a intensidade da vida de uma região semiárida e uma fauna específica ainda pouco estudada, o parque é também um dos mais importantes patrimônios culturais pré-históricos do Brasil, com a maior concentração de sítios arqueológicos atualmente conhecida nas Américas. Tudo isso fez com que a Organização das Nações Unidas pela Educação, Ciência e Cultura (Unesco) reconhecesse o Parque como Patrimônio Cultural da Humanidade. Segundo dados da Fundação do Museu do Homem Americano, estão cadastrados no parque 912 sítios arqueológicos, entre os quais 657 apresentam pinturas rupestres. Além do parque em si, duas outras visitas devem ser feitas. Uma é ao Museu do Homem Americano, em São Raimundo Nonato, onde está exposto o material escavado no parque e a outra é à Cerâmica Serra da Capivara onde são produzidas pela comunidade local, num resgate das tradições dos povos ceramistas, peças com pinturas rupestres encontradas no parque. O Parque Nacional de Sete Cidades é uma das principais atrações turísticas do Nordeste. Com área de 6.221 hectares está localizado a 190 km de Teresina (PI), nos municípios de Piracuruca e Brasileira. Seu principal atrativo é um conjunto de sete grandes afloramentos rochosos em formato de ruínas, com aproximadamente 190 milhões de anos e inscrições rupestres de várias tonalidades, conhecido como “as sete cidades de pedra”. Várias nascentes formam

Miriam Prochnow é pedagoga, especialista em Ecologia Aplicada, coordenadora de Políticas Públicas da Apremavi e secretária executiva do Diálogo Florestal.

Fontes

riachos e cachoeiras que também são atrativos para os visitantes. Na primeira cidade temos a “Piscina dos Milagres”, onde fica uma das nascentes do parque que nunca deixou de jorrar, mesmo nos anos mais secos. Na segunda cidade está o “Arco do Triunfo”, que recebeu este nome por lembrar o arco francês. Na terceira cidade pode ser vista a “Cabeça de Dom Pedro I”, rocha que lembra o rosto do imperador do Brasil. Assim, seguindo de cidade à cidade, o visitante tem a oportunidade de mergulhar num imenso patrimônio natural e histórico de nosso país. Já o Parque Nacional da Chapada Diamantina, com seus 152.000 hectares, é um dos mais fascinantes parques naturais no Brasil, marcado pelo encontro de vegetações típicas da Caatinga, Cerrado e Mata Atlântica, onde bromélias, orquídeas, sempre-vivas e cactos vivem em harmonia, adaptados aos mais variados ambientes. Muitas plantas são endêmicas da região, ou seja, só ocorrem ali. Localiza-se numa região de serras e cavernas nos municípios de Lençóis, Mucugê, Palmeiras, Andaraí e Ibicoara, no Estado da Bahia, onde no passado predominou a atividade do garimpo, dando origem à cidade histórica de Lençóis, que ainda hoje guarda as características da época. O parque e seu entorno são o berço de 50% dos rios que banham o território baiano. O rio Paraguassu é fundamental para a vida no semiárido da região. As águas da chapada também têm características bem particulares. Muito limpas, podem ser ultratransparentes ou então escuras como um chá. De uma das muitas serras e morros do parque, cai em queda livre a Cachoeira da Fumaça. Com mais de 340 m de altura, durante muito tempo ficou conhecida como a mais alta do Brasil. Em época de estiagem, de maio a setembro, ela fica com pouca água e o vento leva de volta as gotinhas formando a famosa “Fumaça”. No Vale do Capão pode ser avistado o Morrão, que, com seus 1.418 m de altitude, é uma das vistas mais marcantes do parque. O parque é um paraíso para os praticantes do trekking, sendo um dos roteiros mais procurados o Vale do Pati.

http://www.wwf.org.br/informacoes/questoes_ambientais/biomas/bioma_caatinga/ http://www.fumdham.org.br/parque.asp http://www.icmbio.gov.br/o-que-fazemos/visitacao/ucs-abertas-a-visitacao/32-parques-nacionais/199-parque-nacional-da-serra-da-capivara

Wigold B. Schäffer é administrador e ambientalista. Trabalhou no Ministério do Meio Ambiente (MMA) de 1999 a 2010. Atualmente é consultor do PNUD, Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, atuando junto ao MMA.

http://www.icmbio.gov.br/o-que-fazemos/visitacao/ucs-abertas-a-visitacao/32-parques-nacionais/208-parque-nacional-das-sete-cidades http://www.ibama.gov.br/revista/7cida/texto_7cida.htm http://www.mma.gov.br http://www.maisnatureza.com/animais/especies-extintas/ararinha-azul/ http://www.zoologico.sp.gov.br/aves/ararinhaazul.htm http://www.ibge.gov.br/home/geociencias/calendarios/calendario.shtm http://serravermelha.blog.terra.com.br/

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“Um dos objetivos do Projeto (APE) é aprimorar e ampliar ações relacionadas ao Meio Ambiente e à Sustentabilidade por meio de atividades”

Francesco Tonucci, filósofo e educador italiano, levantou uma questão polêmica na obra A solidão da criança:

“Diante do fracasso da cidade pensada pelos adultos (que aprisiona, que é regida pelo medo, que não privilegia o convívio em comunidade), em se tratando de política urbana, devíamos consultar as crianças! É necessário que as cidades se tornem cidades das crianças.” A Verde Versátil oferece aqui um estímulo, uma provocação. Convide seu filho, ou criança com a qual tenha proximidade, a fazer um desenho que seja a representação viva de como deveria ser esta cidade e como deveríamos cuidar do nosso meio ambiente.

EDUCAÇÃO

MELHORANDO A QUALIDADE DE VIDA NAS ESCOLAS PROJETO AÇÕES PREVENTIVAS NAS ESCOLAS (APE)

MARCOS GALVEZ

CRIANÇA

CUIDANDO DO PLANETA

POR ELAS MESMAS

O desafio da educação paulista, nos últimos anos, passou da universalização da educação básica, etapa praticamente vencida, para a construção de uma escola de qualidade, em que os alunos, sujeitos do processo educativo, possam encontrar espaço efetivo para o desenvolvimento pessoal e coletivo na perspectiva democrática. A qualidade pretendida é aquela que põe em relevo, para além de conteúdos acadêmicos, os socioculturais e a possibilidade de vivências direcionadas à qualidade de vida, ao exercício da convivência solidária, à leitura e interpretação do mundo em constante transformação. Diante deste compromisso, a Secretaria de Estado da Educação de São Paulo propõe ações que contribuem para a inclusão social de crianças e jovens, minimizando sua vulnerabilidade e possibilitando sua plena formação como cidadãos. Em 2003 foi criado o Programa Escola da Família (PEF) e, em 2004, o Projeto Ações Preventivas na Escola (APE). O Programa (PEF) proporciona a abertura de escolas da Rede Estadual de Ensino aos finais de semana com o objetivo de criar uma cultura de paz, despertar potencialidades e ampliar os horizontes culturais de seus participantes. Cada escola organiza as atividades dentro de quatro eixos: Esporte, Cultura, Saúde e Trabalho. O Projeto (APE), desenvolvido pela Fundação Faculdade de Medicina da USP, promove ações integradas ao Programa, e tem como proposta o desenvolvimento de atividades que busquem o despertar do autocuidado para a prevenção de agravos e a aquisição de hábitos saudáveis para a melhoria da qualidade de vida da comunidade que participa do Programa, fortalecendo o eixo Saúde. Um dos objetivos do Projeto (APE) é aprimorar e ampliar ações relacionadas ao Meio Ambiente e à Sustentabilidade por meio de atividades como: coleta seletiva de lixo, horta comunitária, oficinas de reciclagem, revitalização do canteiro da escola, oficinas de confecção de produtos de limpeza caseiros e ecológicos, desfile de moda com materiais recicláveis e palestras sobre educação ambiental utilizando o conceito dos 5 Rs: Repensar os hábitos de consumo e descarte, Recusar produtos que prejudicam o meio ambiente e a saúde, Reduzir o consumo desnecessário, Reutilizar e recuperar ao máximo antes de descartar e Reciclar materiais. Atualmente, o Programa e o Projeto são desenvolvidos em mais de 2.300 escolas da Rede Estadual de Ensino em todo o Estado de São Paulo. Venha participar desta iniciativa e faça parte da nossa grande família. Marcos Galvez é coordenador do Projeto Ações Preventivas na Escola. 64

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Expedição cultural e gastronômica para a Itália

leva os visitantes a paisagens cinematográficas. São grupos pequenos, não perca tempo! A viagem para a Puglia integra as ações culturais do Projeto Santu Paulu.

Santu Paulu

Memória viva e acessível Difusão cultural

para maiores informações:

www.santupaulu.com.br

APRENDER BRINCANDO, BRINCAR APRENDENDO! Desde 1977 a Ponto de Partida oferece um ensino especializado e direcionado a crianças de 1 a 6 anos. Nossa proposta concebe a criança como um ser histórico, psicológico e social, propondo uma educação que inclui a criança, a família e os educadores num processo contínuo de construção do conhecimento, já que conhecer é viver, é agir, avaliar e refletir. A criança aprende sempre, desde que desafiada na sua curiosidade e no desejo de saber, perguntar, pesquisar, brincar. Brincar é coisa séria acreditamos que a criança aprende privilegiadamente quando brinca. venha conhecer a Ponto de Partida seu dia a dia, seus espaços amplos, bem cuidados e planejados para muitas descobertas com alegria!

A educação do seu filho começa aqui! Temos meio período e integral. Tels (11) 3031 2418 / 3031 7286 Rua Alvarenga, 1.540 Butantã SP

www.pontodepartidaescola.com.br



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