Select 32 ok

Page 55

76

NOS ÚLTIMOS ANOS, O MUNDO DA ARTE TEM DEMONSTRADO UM GRANDE INTERESSE PELO OCULTO, O MÍSTICO, O MÁGICO E O ESPIRITUAL. MUITAS EXPOSIÇÕES CELEBRAM A “ARTE OCULTA”, AS GALERIAS ABREM AS PORTAS PARA TODO TIPO DE ESPIRITUALIDADE, E PRESTIGIOSAS REVISTAS DE ARTE COMO FRIEZE E ARTFORUM PUBLICAM LONGOS ARTIGOS SOBRE COMO AS IDEIAS OCULTAS, ANTES RELEGADAS ÀS MARGENS DA CULTURA, HOJE FAZEM PARTE DO SEU CENTRO VITAL. Para aqueles que, como eu, há muito

estudam as ligações entre a cultura e o oculto, esse grande interesse é bem-vindo. No entanto, devemos evitar o clássico “Por que demoraram tanto?” ao ver os atrasados fazerem fila para aprovar tudo o que é etéreo, metafísico, ectoplasmático e invisível. Na verdade, é claro que a arte e o oculto – que significa apenas isso, “invisível” – têm uma longa história. Podemos até dizer que os dois estiveram presentes no nascimento da própria autoconsciência humana, a julgar pelas evidências extraídas da arte nas cavernas pré-históricas de lugares como Les Trois Frères e Lascaux, na França, e Alta Mira, na Espanha. Como afirma o “arqueólogo cognitivo” David Lewis-Williams em The Mind in the Cave: Consciousness and the Origin of Art (2002), as estranhas figuras “teriantrópicas” – feitas de partes animais e humanas – que decoram as cavernas do Paleolítico Superior (entre 50 mil e 10 mil anos atrás) são um produto da inclinação de nossos antigos ancestrais pelos estados alterados de consciência, muito provavelmente induzidos por plantas alucinógenas. Enquanto estavam em estado de transe, na profundeza desses espaços quase inacessíveis – como mostra o notável filme de Werner Herzog, Cave of Forgotten Dreams (2011) –, nossos precursores pré-históricos viajavam a outros mundos, aos planos espirituais, e deixaram um vestígio do que encontraram nas paredes ao seu redor. Se fazer símbolos é um sinal de autoconsciência, como acreditava o filósofo Ernst Cassirer, os primeiros símbolos que indicam a autoconsciência humana referiam-se a um mundo invisível. MAGOS OPERANTES NO RENASCIMENTO

Podemos perdoar nossos ancestrais seminus e sem instrução por acalentarem crenças em um mundo invisível, mas certamente a maior parte da arte que veio depois se livrou daquilo que, para nós, pós-modernos, é no máximo uma ideia bizarra? Mas que dizer do Renascimento, quando o Artista, como o conhecemos (ainda não “a artista”), apareceu em cena? O Renascimento foi, é claro, um período em que as glórias do passado clássico foram redescobertas após os anos obscuros da Idade Média. Isso significou Platão, em particular, mas, como afirma a historiadora Frances Yates em Giordano Bruno and the Hermetic Tradition (1971), também significou a redes-

HISTÓRIA

ALTA OCULTURA Como textos visionários e conhecimentos secretos se infiltraram na arte, na música e na literatura ocidental, fomentando um caldo de “subcultura oculta” G A R Y L AC H M A N

Na página à direita, aquarela da série The Eye of the Lord (c. 1864), de Georgiana Houghton

32_Haute_Occulture.indd 48

13/09/16 21:53


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.