5 minute read

Venha nos fazer uma visita.

(21) 2502-5522

CEP: 20261-232

Advertisement

Tel: (21) 2502-5522 contato@laruniao.com.br www.laruniao.com.br lar união laruniao lar uniao

Faça um donativo. Apoie nossa instituição.

Apostando No Hist Rico Do Profeta

Em 4 de novembro de 2022, o colunista do New York Times Thomas Friedman lamentou que “o Israel que conhecíamos se foi”. Ele comentava sobre o resultado das mais recentes eleições de Israel e a construção de uma coalizão de governo com forte e inegável tendência antidemocrática.

Aproximadamente três meses depois, confirmadas as intenções do governo, a sociedade israelense começou a reagir. Manifestações com dezenas de milhares de pessoas passaram a ser parte regular do final do Shabat em Tel Aviv e em muitos outros locais.

Em 13 de fevereiro, aproximadamente cem mil pessoas (o equivalente a mais de dois milhões no Brasil) se deslocaram de todas as cidades do país para Jerusalém com o intuito de manifestar o seu desagrado pela apresentação do primeiro projeto de lei que periga eliminar a independência do poder judiciário em Israel.

Nas primeiras manifestações a maioria das pessoas era de uma faixa etária mais madura. Gradativamente se percebeu uma evidente queda na idade média das pessoas, com muitos jovens tomando a frente dos protestos mais recentes.

Ao mesmo tempo, o governo deu sinais de ter “piscado”. Uma proposta de um partido ultraortodoxo que implantaria um regime anti-igualitário nas visitas e nas orações no Kotel haMaaravi (chamado de Muro das Lamentações no Brasil) foi rechaçada pelo primeiro-ministro e dois dias depois o ministro da Justiça disse estar disposto a negociar com a oposição – com a mediação do presidente Herzog – projetos de lei que aprimorem o sistema democrático em Israel sem destruí-lo.

Claro que a atitude do governo ainda não tranquilizou nem um pouco a oposição, pois tudo está ocorrendo até agora apenas no fugidio nível de declarações para a imprensa. Mas o governo parece ter se sensibilizado com as manifestações. É desconhecido neste momento (meados de fevereiro de 2023) se a intensidade das manifestações vai aumentar ou diminuir-desaparecer, se o governo vai negociar e se a negociação vai ocasionar uma significativa mudança de postura.

Em 1993 Thomas Friedman aclamou Arafat como um estadista em busca de paz. Em 2000 ele se encantou com o histórico de Bashar Assad e previu que ele iria liberalizar a Síria e encerrar o envolvimento do Irã no Líbano. Os acordos de normalização das relações de 2020 com os Emirados Árabes Unidos, Bahrein, Marrocos e Sudão desafiaram a visão de Friedman, eis que foram firmados sem analisar a questão palestina que ele considerava central na aproximação entre Israel e os países árabes.

Assim que seu desastroso histórico como profeta (a lista acima é apenas parcial) nos permite ter alguma esperança.

Cat Strofe E Cat Strofe

Os judeus denominam “Shoá” o extermínio de 6 milhões de correligionários na Europa entre os anos 1939 e 1945. O significado literal da palavra é “catástrofe” e ela foi adotada pelos judeus em torno de 1940, quando o extermínio ainda dava seus primeiros passos.

A palavra tem origem bíblica, ela é encontrada pela primeira vez no livro do profeta Yeshayahu (Isaías), quando ele prevê a destruição que acontecerá ao reino do norte pela mão dos Assírios.

Os árabes denominam “Nakba” o exílio – tanto o forçado como o voluntário – de 700 mil árabes por conta da derrota na guerra que provocaram contra o nascente Estado de Israel em 1948-1949. O significado da palavra é “catástrofe” e ela só foi adotada como rótulo do acontecimento por todos os palestinos em 1998, quando o estabelecimento de Israel se mostrou definitivo e não havia mais esperança de reverter o resultado da guerra.

Shoá e Nakba, duas catástrofes. O que elas têm em comum?

Em 30 de janeiro de 1939, discursando no Parlamento Alemão (Reichstag) o Chanceler Adolf Hitler declarou que caso a Alemanha fosse “obrigada” a entrar numa guerra, ela acarretaria o final do judaísmo na Europa, conforme suas palavras: “a aniquilação da raça judaica na Europa”. A profecia de Hitler foi autocumprida. Ele iniciou a guerra e a Alemanha tentou aniquilar os judeus nos territórios que conquistou.

A Shoá lamenta a consequência do sucesso da tentativa de genocídio nazista.

Em 11 de outubro de 1947, em entrevista a um jornal egípcio, o Secretário-Geral da Liga Árabe Azam Pashá declarou “eu espero que os judeus não nos forcem a ir para a guerra porque ela será uma guerra de extermínio e um massacre perigoso que a história vai registrar como sendo similar ao massacre dos Mongóis ou da guerra contra os Cruzados”. A Liga Árabe iniciou uma guerra onde tentou sem sucesso exterminar os judeus.

A Nakba lamenta a consequência do fracasso da tentativa de extermínio árabe.

No que elas diferem?

A Shoá foi imposta aos judeus. Eles não a procuraram e não a provocaram. Não tendo meios para enfrentá-la, tudo o que puderam fazer foi tentar fugir dela.

O rótulo Shoá foi adotado naturalmente. Nada mais natural do que chamar uma catástrofe de catástrofe.

A Shoá não criou o Estado de Israel, eis que ele estava em gestação pragmática desde o final do século 19 e espiritual desde sempre.

A Shoá tampouco criou a identidade judaica. Os judeus se percebem como povo há milênios.

A Nakba foi provocada pela Liga Árabe. Ela a procurou e a provocou. Tendo os recursos para promover a guerra ela assim o fez, esperando sair vitoriosa.

Muito provavelmente o rótulo Nakba foi adotado em oposição ao rótulo adotado pelos judeus.

A tragédia dos palestinos é fruto da Nakba. Sem a guerra promovida pela Liga Árabe em 1948-1949 ela não teria acontecido.

A Nakba criou a identidade palestina. Antes do Estado de Israel os árabes da região não se percebiam como palestinos.

Shoá e Nakba. Palavras com o mesmo significado. Que rotulam eventos diametralmente opostos.

O Luto No Placar 1

Minutos finais de um jogo da Euroliga de basquete na arena Menora Mivtachim em Tel Aviv no dia 29 de dezembro de 2022. O time da casa acaba de virar um jogo que vinha perdendo desde o início e a torcida que lota completamente o estádio reage da mesma forma estrondosa como qualquer torcida brasileira nas mesmas circunstâncias.

Neste momento o placar central da arena mostra uma foto de Pelé, ao lado de seu nome com a inscrição 1940-2022 abaixo. Imediatamente a intensidade do ruído dos torcedores cai drasticamente enquanto a voz nos alto-falantes anuncia “O maior jogador de futebol de todos os tempos, Pelé, acabou de falecer.” Seguindo o costume local de homenagem aos falecidos, o público se levanta e bate palmas por alguns minutos.

Que outro brasileiro é imediatamente reconhecido e homenageado em todas as partes do mundo e é capaz de provocar um parênteses de respeito e consternação no meio de uma celebração de intensa alegria?

O Luto No Placar 2

Seis semanas depois, em 9 de fevereiro de 2023, o público mais uma vez lota completamente a arena Menora Mivtachim em Tel Aviv esperando o começo de mais um jogo de basquete da Euroliga. São 21:05, o momento exato programado para o começo da partida, mas em vez de se agruparem no círculo central para o alçamento da bola pelo árbitro, os dois times perfilam-se lado a lado enquanto que o placar mostra as palavras “Together with Türkiye & Syria” e o alto-falante pede um minuto de silêncio em lembrança das vítimas do terremoto ocorrido dias antes que deixou dezenas de milhares de mortos.

Todos se levantam e guardam um minuto inteiro de silêncio total. Não se escuta um sussurro. O respeito é absoluto. A Síria não reconhece Israel desde a sua fundação e se considera em permanente estado de guerra contra o país. Não há a menor dúvida que muitos naquela arena perderam familiares próximos em guerras contra a Síria. Mas todos eles sabem distinguir as questões políticas das tragédias pessoais.

This article is from: