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MISSÃO DESTINADA AO FRACASSO
Olhos vigilantes nas resoluções da ONU
Nascido em Montreal, Canadá, Hillel C. Neuer é advogado internacional, escritor e diretor executivo da UN Watch, ONG para os Direitos Humanos e de vigilância da ONU com sede em Genebra, Suíça. Neuer é o presidente fundador da Cúpula de Genebra para Direitos Humanos e Democracia, uma coalizão de 25 ONGs de todo o mundo.
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A UN Watch foi criada em 1993 pelo advogado norte-americano e ativista pelos Direitos Humanos, o líder judaico Morris Abraham. Abraham trabalhou muito próximo a Martin Luther King e, nos anos 1960, foi uma figura de destaque no Movimento pelos Direitos Civis dos cidadãos afro-americanos, talvez a pessoa branca de maior destaque naquele movimento. Foi também ativo na ONU representando os Estados Unidos na Comissão de Direitos Humanos e, em 1989, foi nomeado embaixador norte-americano junto à ONU, em Genebra. Ele serviu em Genebra por quatro anos e, em seguida, teve a ideia de criar uma instituição independente para observar a ONU, com foco em duas áreas: uma universal, verificando se a ONU se mantém aderente aos princípios de sua carta fundacional, que é um documento muito nobre, idealizado por Eleanor Roosevelt e outros ativistas internacionais nos anos 1940; e uma particular, lutando contra a discriminação dos judeus e do Estado de Israel.
Hillel, qual sua motivação para trabalhar nesta arena tão complicada?
Eu entrei na UN Watch 11 anos depois de sua criação. Sempre fui muito entusiasmado por Israel e pelas causas judaicas. Quando eu era criança, surgiu o movimento em apoio aos judeus da União Soviética, que eram proibidos de emigrar para Israel. O inverno de Toronto é muito severo, os termômetros marcam -200, -300 C. Mesmo assim, os alunos da minha escola, a Hebrew Academy, marchavam semana após semana para a frente do consulado soviético no centro da cidade gritando One two three four, open up the iron door; five six seven eigth, let our people emigrate: Um, dois, três, quatro – abra a porta de ferro; cinco, seis, sete, oito –deixe meu povo emigrar. Quem organizava essas manifestações, a partir de um pequeno pódio com seu megafone em frente ao consulado, era o advogado hoje aposentado Irwin Cotler. Cotler foi um dos mais relevantes advogados pelos Direitos Humanos de todos os tempos. Ele defendeu Natan Sharansky e Nelson Mandela, entre outros. Mais tarde, quando eu entrei na faculdade de Direito McGill, Cotler foi meu professor e ali me dei conta de que queria fazer o que ele fazia. Ele é a minha principal inspiração, advogando pelos Direitos Humanos Universais, advogando pelos direitos do povo judeu e para que Israel tenha tratamento igualitário nos foros do mundo.
Em 2022, houve uma única resolução contra o Irã, uma única contra a Coreia do Norte, uma única contra a Síria, mas 15 contra Israel. Em média, há de 15 a 20 resoluções por ano que condenam Israel, contra uma única a um daqueles países mais conhecidos pelo seu desprezo pelos Direitos Humanos.
Uma outra fonte importante de inspiração é a minha família, que é profundamente sionista. Muitos familiares fizeram aliá, inclusive meus avós. A minha escola também teve um papel muito importante na minha formação judaica e sionista. Em resumo, eu cresci num ambiente muito comprometido com o povo judeu e com o Estado de Israel.
A ONU existe e não vai deixar de existir. Nosso objetivo não é nos preocupar com a sua existência, mas sim pensar como fazer com que ela funcione melhor. Nós acreditamos nos princípios da ONU, estamos felizes que exista um foro para as nações se encontrarem. Sem dúvida, precisamos de um lugar de encontro e coordenação.
Quais são os grandes sucessos da UN Watch e também seus maiores fracassos?
Vou começar pelos fracassos. Nós estamos num lugar destinado ao fracasso! Há na ONU uma maioria automática contra Israel e, em muitos casos, também contra os Direitos Humanos.
Há 193 países na Assembleia Geral das Nações Unidas. Cerca de 150 deles votam sistematicamente e de maneira muito tendenciosa contra Israel, em resoluções que não estão minimamente interessadas em trazer a paz e sim exclusivamente em demonizar Israel.
Em 2022, houve uma única resolução contra o Irã, uma única contra a Coreia do Norte, uma única contra a Síria, mas 15 contra Israel. Houve também seis resoluções contra a Rússia, pela invasão da Ucrânia e o bombardeio indiscriminado de população civil, mas esse foi um caso isolado. Em média, há de 15 a 20 resoluções por ano que condenam Israel, contra uma única a um daqueles países mais conhecidos pelo seu desprezo pelos Direitos Humanos.
As resoluções contra Israel nunca mencionam o Hamas, nunca mencionam a Jihad Islâmica, nunca mencionam o Fatah. São todas muito tendenciosas e, em grande parte, são votadas com uma maioria muito grande. Em alguns casos, os Estados Unidos e alguns países europeus se abstêm, mas a maioria é sempre muito significativa. O Brasil sob Bolsonaro foi um pouco mais equilibrado.
Então, esse é o contexto. Estamos destinados a fracassar. A luta política na ONU é diferente do embate num parlamento, onde você confronta argumentos. Na ONU, se você luta por tratamento igual para Israel ou por Direitos Humanos, na maioria dos casos, você vai falhar.
Mas é claro que fazemos todo o
Irwin possível para expor o que acontece para que as pessoas tenham ciência.
Temos uma nova ferramenta, um banco de dados: unwatch.org/database.
Ali, você pode ver exatamente como seu país votou nas resoluções sobre Israel e comparar com os votos de outros países. Você também pode mandar uma mensagem para o Ministro do Exterior do seu país, pedindo para ele ter uma posição mais equilibrada. Instamos os países a mudar seus votos automáticos.
Na lista de nossos sucessos está a liderança na campanha para expulsar o regime do Irã da Comissão de Direitos da Mulher. Iniciamos a campanha quando o regime foi instaurado há um ano e meio e, em 14 de dezembro de 2022, obtivemos uma votação positiva, o que foi um grande sucesso.
Também lideramos a campanha para expulsar a Rússia do Conselho de Direitos Humanos e tivemos sucesso em abril deste ano.
Um outro sucesso foi o bloqueio da representante do Catar para presidência do Fórum de Direitos
Humanos. Nós revelamos o fato de que ela odeia gays, já tendo expressado publicamente mais de uma vez que “Deus os amaldiçoe”. Também revelamos que ela odeia judeus, uma vez que declarou que foi educada desde criança a ver os judeus como inimigos e que considera isso algo positivo. Nós expusemos tweets dela advogando pelo assassinato dos judeus e outras dezenas de manifestações odiosas semelhantes. Sua conta do Twitter em árabe tinha dezenas de milhares de seguidores. Depois das nossas revelações, ela cancelou a conta.
Por tudo isso, ela não foi eleita para o cargo, que foi ocupado pelo representante das Bahamas. Diferente de Genebra, onde ela foi humilhada, no Catar houve uma forte reação a seu favor, afirmando que ela perdeu o posto, mas é uma heroína, pois defende os princípios e valores do país. Eu me pergunto, que valores seriam esses? Odiar judeus e gays? O Catar é um país muito rico que, normalmente, consegue o que quer. Nesse caso, entretanto, eles foram derrotados.
Também expusemos a incitação ao ódio, antissemitismo e terrorismo perpretado pelos professores da UNRWA [a agência de socorro e trabalho para os palestinos]. A agência reconheceu que tem problemas no recrutamento de seu pessoal e uma boa quantidade desses professores foi suspensa.
A ONU está cumprindo o seu papel? Se não está, ela tem razão de existir?
A ONU existe e não vai deixar de existir. Nosso objetivo não é nos preocupar com a sua existência, mas sim pensar como fazer com que ela funcione melhor. Nós acreditamos nos princípios da ONU, estamos felizes que exista um foro para as nações se encontrarem. Sem dúvida, precisamos de um lugar de encontro e coordenação, como vimos agora com a questão da pandemia. Eu não sei dizer se a Organização Mundial da Saúde fez um bom trabalho ou não, mas é óbvio que precisamos de cooperação e coordenação.
Quando a Rússia invade a Ucrânia e quando o Irã mata mulheres que protestam, nós mobilizamos o mundo para que ele expresse sua opinião e, nesses casos, a ONU sim fez coisas boas. No caso do Irã ainda não foi o suficiente, mas algo está acontecendo. Foi criada uma comissão de inquérito, o que é apenas o começo, mas já é bom.
Contudo, há casos em que a ONU faz coisas terríveis. Por exemplo, com relação a Israel, a ONU dá força aos terroristas. Aqui na frente do meu escritório em Genebra, no Comitê de Direitos Humanos, eles criaram uma comissão de inquérito que incentiva o terrorismo. O
Hamas sabe que se disparar milhares de foguetes contra Tel Aviv, Sderot e outras cidades, Israel vai retaliar alvejando os locais de onde esses foguetes são lançados, que são próximos de áreas civis palestinas. O Hamas sabe que, no momento em que isso acontecer, a mídia vai se voltar para Israel e que grupos como a Anistia Internacional e o Humans
Right Watch, que foram sequestrados, vão reagir de forma equivocada. Isso vai parar na ONU, que por sua vez vai dizer que a culpa é de Israel.
E também em casos não relacionados com Israel, a ONU não é boa. 70% do Conselho dos Direitos Humanos é composto por ditaduras.
Algumas terríveis, outras menos terríveis, mas mesmo assim são 70%!
Temos a China, que é uma ditadura terrível, Cuba que é um Estado policial, Eritreia, Líbia, Catar, Cazaquistão, Paquistão. Isso não é nada bom, mas na minha opinião temos que lutar para que nossos países [ele se refere a países democráticos] façam a coisa certa.
Por exemplo, acerca da votação para expulsar o Irã do Conselho de Direito das Mulheres, alguns países europeus estão indecisos sobre como votar. Esses países afirmam não gostar de expulsões. O Ministro do Exterior holandês, por exemplo, diz que não sabe se expulsar é uma boa solução. Nós temos então que trabalhar com esses países, como a Holanda, com os Estados Unidos, com o Brasil, com a França, para que façam a coisa certa.
A resposta é bloquear os representantes das ditaduras, fazendo com que nossos países não fiquem passivos.
Como votam os países
Uma seleção dos votos de alguns países
Qual é o argumento para a não expulsão das ditaduras dos comitês?
Argumenta-se apenas, como você disse anteriormente, que “a expulsão não é uma boa solução”, ou há algo mais consistente?
Por exemplo, o Ministro do Exterior da Holanda fez um discurso no parlamento dizendo três coisas. Em primeiro lugar, ele afirmou que o Comitê do Status da Mulher (CSW, em inglês) é um organismo que tem como objetivo conseguir um acordo com os “menos conscientes”. Ele não chama de ditadura um país que mata manifestantes, mas sim de “país menos consciente”. Esse é o argumento da “grande tenda” [big tent], onde todos tem que estar dentro. Eu não aceito esse argumento, porque nem todos precisam ser membros do comitê, apenas 45 países. Os demais podem funcionar como observadores. Mas eles procuram consenso e assim todos têm que estar dentro, o que produz resoluções que não atingem o problema.
A carta da ONU diz mais ou menos isso, ela diz que o país-membro tem que ser “um país que ama a paz”. Contudo, a prática nunca foi de reunir apenas as democracias. Desde o princípio, a Rússia sob Stalin teve um assento não apenas na ONU, como também no Conselho de Segurança.
A desproporcionalidade anti-Israel
O segundo argumento foi pior. Ele disse “eu não sei o que a expulsão vai fazer de bom”, o que é ridículo, porque para a população que está sofrendo no Irã a expulsão foi muito importante. E o terceiro argumento foi [e Hillel começa a rir] “temos que ser consistentes: se vamos expulsar o Irã, temos que expulsar muitos outros”. Ele está certo nisso, é claro, mas a questão não é essa, mas sim fazer a coisa certa. Agora expulsamos o Irã que está promovendo uma repressão terrível, depois pensamos nos outros. É a primeira vez que temos os votos para expulsar um membro de um comitê, não vamos deixar o ótimo ser o inimigo do bom.
Quando a Arábia Saudita foi eleita há cinco anos, a Ministra do Exterior da Suécia, Margot Wallström, disse: “você não pode querer que apenas a Suécia e a