Josp 3119 pag 12

Page 1

12 | Esporte |

14 a 20 de setembro de 2016 | www.arquisp.org.br

Daniel Gomes

danielgomes.jornalista@gmail.com Márcio Rodrigues/MPIX/CPB

Cerimônia de abertura da paralimpíada alerta para problemas de acessibilidade e inclusão no Brasil Em sua cadeira de rodas, com a tocha paralímpica nas mãos, em meio à chuva que cai no estádio do Maracanã, o nadador Clodoaldo Silva, 37, se depara com um obstáculo: uma escadaria que o separa da pira a ser acendida. Diante da situação, ele abre os braços e olha para os lados como a se perguntar: “Como farei agora?” Instantes depois, a escadaria se transforma em uma rampa e o atleta, que participa de sua quinta paralimpíada, finalmente conclui o trajeto e acende a pira dos Jogos Rio 2016. Na vida de Clodoaldo Silva e das outras pessoas com algum tipo de deficiência no Brasil, as dificuldades com a acessibilidade acontecem diariamente e não são resolvidas “em um passe de mágica”, como aconteceu na cerimônia de abertura da Paralimpíada, no dia 7, que teve esse momento pensado justamente para alertar sobre a urgência de iniciativas de inclusão e acessibilidade em todo o Brasil. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgados em 2012, indicam que apenas 4,7% das ruas do país têm rampas de acesso para cadeirantes e basta uma simples volta pelos quarteirões da cidade de São Paulo, por exemplo, para perceber outras dificuldades, como a grande quantidade de calçadas esburacadas. Na tentativa de solucionar essa situação, já tramita no Congresso Nacional um projeto de lei para padronizar as calçadas em todo o país, a fim de facilitar a circulação, em vias públicas, de pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida. “Hoje cabe aos municípios a fiscalização das calçadas e como não há um parâmetro para isso, a gente começa a ver cada um fazendo a coisa como acha que deve ser feito. O fato de simplesmente cortar e rebaixar a guia da calçada, sem observar o ângulo exato para o acesso, acaba sendo um risco de torná-la uma rampa para impulsionar ainda mais a cadeira de rodas e arremessar o cadeirante, mas já existe uma inclinação que é definida por normativa da ABNT [Associação Brasileira de Normas Técnicas]

o i e m o ‘E n a h n i t . . . o h n i do cam ’ a i r a d a c s e a um

para esse tipo de acesso”, comentou, ao O SÃO PAULO, Antônio Renato Cunha, professor de Direito da Universidade Mackenzie Rio, que coordena o grupo de pesquisa Acessibilidade Jurídica. O professor Antônio Renato destacou a importância da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146), em vigor desde julho de 2015, que busca assegurar e promover o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais das pessoas com deficiência, para sua inclusão social e cidadania, não só na questão da acessibilidade, mas

também na utilização de espaços, mobiliários, equipamentos urbanos, edificações, transportes e outros serviços e instalações abertos ao público. Na avaliação do professor, a realização da paralimpíada no Rio vai colaborar para uma mudança da visão da sociedade em relação à garantia de direitos das pessoas com deficiência. “Agora nos Jogos, vemos o deficiente físico como um herói, medalhista, como alguém que a gente sai especialmente de casa para ver, para torcer por ele. Os Jogos no Rio de Janeiro vêm abrilhantar

esse momento, temos visto uma evolução na garantia dos direitos”, afirmou o professor, destacando que com a Lei 13.146, “toda ação e política pública que for implementada por qualquer ente federativo – União, estados ou municípios – precisa observar que as pessoas com deficiência são portadoras de direitos e devem ser incluídas no que a lei chama de desenho universal, ou seja, ter, por exemplo, ruas, calçadas, preparadas para receber as pessoas com ou sem deficiência”, detalhou.

Maurício Pommê: ‘Desistir é mais fácil, vamos seguir brigando e lutando’ Os mais de 4.300 atletas que participam desta paralimpíada chegaram ao Rio de Janeiro com o sonho de conquistar uma medalha. Não foi diferente com Maurício Pommê, 46, que competiu no tênis em cadeira de rodas. Apaixonado pela modalidade desde a infância, em 1997 ele caiu do telhado de uma quadra de tênis e sofreu uma lesão medular, ficando paraplégico. No ano seguinte, incentivado pelos amigos, passou a praticar o tênis em cadeira de

rodas, esporte no qual representou o país nas paralimpíadas de Atenas 2004, Pequim 2008, Londres 2012 e agora no Rio de Janeiro. A capital fluminense, aliás, traz boas recordações a Maurício. “Um dos momentos mais bacanas da minha carreira foi ter subido no pódio no Rio de Janeiro, no Parapan, em 2007, com todos os amigos e a família na quadra central vendo a gente ganhar a medalha de ouro”, recordou o atleta, que, além dessa conquista nas duplas

masculinas em 2007, foi medalhista de bronze no individual no Parapan de Guadalajara 2011. Ainda não foi desta vez que Maurício chegou à sua primeira medalha paralímpica. Nos Jogos do Rio, ele foi eliminado no torneio de simples e no de duplas (com Carlos Santos), mas esse homem de vida dedicada ao tênis (já foi professor da modalidade e atualmente tem uma academia) não desanima. “Cada um tem que ter seus sonhos,

cada um tem que ter as suas metas e não desistir. Sempre vai ser um caminho complicado, difícil, mas tem que seguir brigando, lutando, até a hora em que a gente consegue o que quer. Desistir é mais fácil, vamos seguir brigando e lutando, essa é a ideia. Se a gente quer mesmo de verdade algo e vai atrás, sem esperar acontecer, a gente acaba conseguindo o que deseja”, incentiva Maurício Pommê. (Entrevista concedida a Vitor Alves Loscalzo/O SÃO PAULO)


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.