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Inflacao e a instabilidade dos contratos de direito privado

TESE APJ?ESENTADA A VI CONFERENCIA HEMISFERICA DE SEGUROSBUENOS AIRES

David

A VORAGEM dos disturbios que na vida dos povos provoca a desvglorizagao da moeda, sao arrastados os contratos de direito privado, afetados desde logo de instabilidade que conduz ao inevitavel desequilibrio das prestagoes.

As turbagoes da incerteza assumem o aspecto de terror panico resultante das revolu^oes economicas, poiiticas ou sociais, que geram a psicose da inquie tude em que se agita o mundo atual.

Ripert, atraves de melancolica visao do declinio do direito, fala do Estado que «modificando o valor da moeda. altera. por isso, o valor economico da obngagao. As depreciagoes monetarias succssivas desscs liltimos anos foram a causa de uma perturbagao profunda», Seria, portanto, paradoxal que numa sociedade onde a ordem legal se modificasse incessantemente. a ordem convencional pcrmanecesse inalteravel.

Ao passarem as condi^oes economi cas por alteraqoes profundas, imaginarse a imutabilidade do contrato seria pretender um anacronismo. O contrato nao mais e a ordem estavel disse o autor de La Regie Morale dans les Obhgattons Chiles. «inais Vetcinel devenh:,. pois o credor nao adquirc um direito, porem a simples esperan?a de que o juiz considere legitima sua pretensao. Costuma-se verificar posterior-mente a conclusao do contrato uma lesao resultante das bruscas varia^oes da situa^ao economica, e torna-se fatal semelhante lesao quando a moeda esta SLijeita a variagoes.

Consta do conteudo do contrato um prego determinado em dinheiro, porem o respective credito a tal importancia. ao cabo de certo tempo, deixa de corresponder ao valor do bem transmitido ou da prestagao efctuada.

Vem dai a instabilidade que na cxpressao de Savatier em seu notavel trabalho Les Metamorphoses economiques et sodales du Droit Civil d'Anjourd hid. conduz ao eclatement do contrato, resultante do dinamismo produzido por duas forgas oriundas da mesma origem, uma impondo-se cco'lomicamente no terreno dos fatos materiais. e outra fazendo socialmente apelo ao sentimento de justiga. Uma e outra nasceram da brusca conquista que submeteu o homera as forgas da natureza. Toda agao huinana desen- volvc-se sob a dupla prcssao do fator economico e do social. orgamentos desde a modestia dos domesticos a compiexidade dos orgamentos piiblicos, provocando as nmnifestacoes tangiveis das turbagoes poiiticas. eco nomicas e sociais. caracteristica da atualidade.

No direito antigo, do Codigo Napoleonico ao nosso Codigo Civil, o con trato cstava na cscala do bomem, do individuo, cnquanto o contrato atual fica na escaia da colctividade. na cs cala da nagao, do continente ou da humanidade.

Veio se uecruindo a doutrina da autonomia da vontade para conceberse, entao, o contrato originado de uma tecnica nova em que a ideia de liberdade humana cede lugar a concepgao materialista, surgindo. assim, o dhigismo contratual. O homem nao domina mais o que ele faz, porem e dominado por sua obra porquanto prctendendo conquistar a mateiia, foi esta afinal que o ncabou conquistando.

Nesse evoluir revolucionario permanece, entretanto, a aspiragao a seguridade economica e a seguridade juridica. condigao imprescindivel para viver o licmcm cm sOciedade.

Constituindo todo contrato um ato de previsao e de tomada de possa no futuro na cxpressao de Ripcri. exige uma situagao de estabilidadc em que as partes contratantes, sera receios de desvalorizagoes monetarias, pcssam com exatidao pesar as vantagcns e inconveniencias da operagao, decidindo com pcrfeito conhecimento de causa. Assim e cue sob o ponto de vista juridico, a maior vitima da instabilidado e o con trato. O desequilibrio para os con tratos cm curso, trazendo por vezcs vantagens ilusorias para uma das partes, acarreta para outra incvitavelmente prejuizo injusto e surpreendente.

A inflagao solapando as energias da cconomia nacional pelo aviltamento do valor da moeda, e causa da instabilidade de todds as coisas e, por isso, no tocante ao direito dos contratos, os efeitos da desvalorizagao inonetaria tern destaqueii desastrosos e decisivos. Isto porque ab-^ta a sufc.slancia dcs contratos. o seu contciido economico, e como a vida do pais desenvolve-se c dcsempenha-se num encadeamenlo de contratos, a instabilidade propaga-se a fodos cs sctores.

A desvalorizagao progressiva da moeda por forga de emissoes continuadas, desmonta a previsao de todos os

Diante da queda vertiginosa do valor da moeda, determinando o aumento sempre crescente do custo de vida, os contratos a longo prazo tais como o seguro de vida, -e oatros sob diversas formas de poupanga, vao-se escasseando por se tornarem de cficacia improvavel.

Aquele que contrata assim o faz na pretensao de obter uma situagao de seguridade no futuro e. por isso, convenciona com elcmcntos de certeza. Ainda mesmo nos contratos aleatorios, as partes cstipulam na convicgao de certeza no descmpenho das obrigagoes reciprocas.

Contratando um seguro de incendio, por exemplo, a parte que assume o risco tem como certo que o premio recebido e o juste prego da responsabiiidade contraida, como a outra parte que o pagou, conta com a indenizagao, pela certeza que Ihe infunde a organizagao tecnica capaz de se descbrigar cabalmenic.

Esta equivalencia de certeza e o elemento essential de vaiidade do contrato e a sua propria causa. As prestagoes expressam-se em termos monetarios, e ao atingi-los a inflagao, e, entao, o contrato ferido no seu conteiido economico. Rompe-se o equiiibrio, dando lugar a que apareqa a lesao.

A vontade das partes nao se dirige realmente, observa Saleilles, senao para OS resuhados economicos que tern em vista, encarando o ato economico que elas concluem como meio de atingi-los, como um instrumento, ou como um intermediario, e nao como um fim.

A instabilidade do valor da moeda transmite-se no contrato, e as vontades soberanas fazendo lei entre as partes, segundo os codigos que consagraram o direito dos confrafos — acabam frustradas pelas alteraqoes fundamentals dos objetivos que tiveram em vista.

O ciclo dramatico em que vive o mundo atual, quando a necessidade cada vez mais crescente de moeda acarreta maiores emissoes, quando a inquietude em- permanente receio pelo dia de amanha, propaga instabilidade a todas as coisas, agravando ao insuportavel o custo de vida, constitui a estabilidade monetaria a aspiraqao comum a todos os povos. Nao ha previsao nem caiculos que resistara a erosao da moeda, conforme apropriadamente denominou o economista Aldo M. Azevedo.

Somente 3 estabilidade monetaria permitiria o funcionamento normal do contrato. Entretanto, estabilidade nao se conquista senao a custa de disposiqao herculea para 0 trabalho, de persistente confian^a e vontade ferrea de realizar e patriotico espirito de sacrificio, conjunto de fatores de um movimento deflacionario. A recuperacao economica da Alemanha, Inglaterra, Holanda, traria a respeito uma projeijao luminosa.

Combater a inflagao nao e, todavia, missao do jurista, e sim tarefa dos governos e economistas nos programas de rigida politica economica e financeira. Porem nos movimentos de tal envergadura, toma o jurista sempre parte, pois que Ihe incumbe, no dizer do eminente professor da Universidade de Rennes, Andre Trasbot — procurar se existe na instabilidade. certa seguranga para 0 contrato a instalar-se na mobilidade de todas as coisas, permitindo, assim, que se chegue a um clima de tranquilidade para os interesses privados, facilitando desta sorte os esforgos do poder publico no saneamento da moeda.

Surgiu, por isso, uma corrente de opiniao de respeito a rigidez do con trato, nao mais em sua letra formal, porem, no seu conteudo real, querendo, pois, as partes que se Ihe desse maior leveza, segundo as flutuagoes da moeda, no sent'do de favorecer a mobilidade do contrato no meio economico por si proprio movel. £ o caminho pelo qual se possa atingir a seguridade contratual, se nao absoluta, pelo menos para Ihc permitir razoavel funcionamento; porquanto, pretender a imobilidade no mundo onde tudo e mobilidade, constitiuria a maior das insegurangas, situagao confrangedora que inspirou a teoria da imprevisao.

Para Josserand no seu «L'Esprit des Droits et de leur RelatwUe». a nova teoria consi&tc num procedimento de acomodagao em que o juiz e legislador, libertando a formula do contrato, efetuam uma revisao mais ou menos piofunda e assim praticam uma intervengao ou dirigismo contratual.

A teoria da imprevisao exprimindo a revolta dos fates contra o codigo, «atribui ao juiz o poder de levar em conta na aplicagao e funcionamento das convengoes, acontecimentos inesperados, verdadeiras circunstancias extra contratuais3 aparecidas apos a conclusao, mas que ferem brutalmerie a economia do convencionado, deste modo definitivamente desarticulada. Devedor e fornecedor lesados pelo golpe inesperado do destino sentem-sc, entao, forgados a pedir em contra-partida uma modificagao, revisao ou mesmo resolugao do contrato ante 0 choque de retcrno das forgas economicas contra o direito. Medidas dirimentcs podem, j^ois, ser estabelecidas sobre a prbpria vontade das partes admitindo a revisao, suspensao ou resolugao de dispositivos contratuais com aplicagao de uma clausula subentendida, a clausula «rebns sic stantibus» que permitindo a permanencia do contrato, investe 0 juiz de arbitro das partes.

Nas crises inflacionarias quando a desvalorizagao da moeda subverte todas as previsoes, vieram juristas sustentar que os ccntratos seriam suscetiveis de revisao por causa da imprevisao.

A jurisprudencia opos forte resistencia a nova teoria, observa o eminente autor do Le Regime Democratique et le importanda numerica anunciada no contrato. sinislros vduntarios c de combater o jogo e aposta.

Droit Ciuil Modecne. pois que a solugao parecia inconciliavel com o Co digo Civil, nao sendo concebivel supor do lado dos contratantes, a intengao de nao manter aquilo que deliberadamente estipularam para longo terrao; e a imutabilidade do contrato era assim defendida em favor e no interesse do direito das partes.

A realidade, entretanto, na logica irrefrag.ivel dos fatos, vinha demonstrar que o contrato. ferido em sua substancia com a modificagao do seu con teudo monetario, tornaria a execugao imensamente gravosa para uma das partes cuja prestagao passaria a inexequivel com risco de sua capacidade financeira e da propria subsistencia do contrato pelo dcsequilibrio verificado.

Nos contratos de fornecimento ou de empreitada, por exemplo, as bruscas desvalorizagSes da moeda atingem frontalmente o emprciteiro agravado muitas vezes aq dobro-no valor das obrigagoes contraidas, ante a elevagao dos pregos dos materiais e salarios: incorrendo. portanto, em forte dcse quilibrio, sua obra e irrejhzavel. Quer dizer, se o custo de material e salarios fosse na ocasiao de prego elevado conforme posteriormente aconteceu, o con trato certamentc nao se teria concluido pela impossibilidade do empreiteiro em estabelecer na base economica estipulada.

Se 0 conteudo monetario e fundamentalmente alterado, as prestagoes decorrentes tornam-se irrealizaveis por forga da lesao a que a parte incorre arrastada a ruina.

A imutabilidade do contrato sustentada pelo antigo direito, trasmuda-se hoje na maior das insegurangas qu-; reclama a providSncia da di utrina da imprevisao.

A eqiiidade certanrante exigiria revisao de diversas situa^oes que, entretanto, nem sempre poderia juridicamente praticar, sendo em tais circunstandas que a linica revisao posslvel, aquela consentida pelas partes, amigavclmente, por coincidente com os interesses reciprocos — e jamais cabendo a clausula tadta rebus sic stantibus.

Nos contraLos cujas condi^oes foram estabelecidas na base de apreciada moeda, o desequilibrio resulta completo e a injusti^a e flagrante em virtude da elevagao gcral dos pre?os determinada pela desvaloriza^ao da moeda. A impossibilidade de execucao do contrato, iinicamente resulta de causa monetaria, pois que estabelecida sobre a moeda apreciada, sua execugao passa a ser em moeda deprcciada, a que o credor nao pode recusar em virtude do curso forgado que o interdita de exigir outra moeda mais valorizada. Assim acontece com o cmprestimo em que o emprestador nao obtem rendimento satisfatorio, pois que o concedeu em moeda valorizada c recebe juros e amortizagoe.s em moeda desvalorizada; e se o devedcr liuuicla; antecipadaraente, realiza uma opttagao lucrativa, em prejuizo do credor.

Nos contratos de miituo, a obrigagao de restituir e em moeda, corrente, na a situagao em virtude da qua] experimenta o individuo um dano patrimonial por forga de certo cvento, conforme seria de acontecer com o proprietario. 0 credor hipotecario, o depositario. n usufrutario, o locatario.

Com relagao aos contratos de arrendamento, produz-se o desequilibrio economico, por se verificar que o valor dos alugueres vai deixando de corre.sponder ao valor do imovel crescentc na proporgao da desvalorizagao da moeda. O locador nao obtem o devido rendimento equivalente ao valor do predlo alugado, situagao essa que sc agrava com as majoragoes de ordem fiscal. Intervem, entao, o legislador, c no espirito de ampanr a enndade contratual economicamente mais fraca, estatue a lei do inquilinato, congelando OS alugueres. Mantem desta sorte, uma iniqiiidade no contrato com a nao equivalencia das prestagoes pelo desequi librio da depreciagao da moeda.

Foi ai que se veio conceber o risco, subjetivamente em fungao do segurado, isto e, que ri.sco haveria soracntc quando recaisse em coisa sobre a qual tivesse o segurado interesse, e por isso, risco e interesse apresentarem-se corao termos equivalentes. Tornandose, assim, p interesse. elemento funda mental do seguro, foi, portanto. capaz de afastar o jogo ou aposta que no dizer de Vivante sempre acompanhou o legitimo seguro como uma sombra ameagadora.

No concernente ao contrato de scguro a desvalorizagao da moeda fereIhe a csscncia vital, e falseando o sentido de seguridade, sacrificando a reposigao dc valores, desta sorte, subverte o p'incipio de indenidade.

Dos seus primordios, quando o seguro nao havia se despojado da concepga) de compra e venda de coisas e de risv-os, escreve A. Donati, o seguro maritime trazia como fundamental fungao a de dispor o segurado economica.r.ente a reparagao da fortuna do mar. iencic pois como simples instruniento, eir.fcora imperfeito, uma fungao indcnilar'a que se vinha criando, com o fini de evitar o quanco possivel os

O principio dc indenizagao veio assim tragar ao segiiio a rota a seguir nc desempenho de sua magna missao. Na fungao indenitaria consLste o cxercicio normal dos segurqs de coisas, fungao esta que Ihe determina a justa coexistcncia na vida econoniica dos povns como o instrumento apropriado de resguardo a todos os valores e de cobertura das atividades produtivas.

A teoria do interesse suscitada por dois eminentes tratadistas alemaes Ehrenberg e Kisch, adquiriu consideravel importancia porque veio «permitir uma exata aplicagao do principio de que o seguro de coisas e um contrato dc indenizagao».

A nocao de interesse e puramente cconomica, significando a relagao do individuo com objetos do mundo ex terior, relagao essa que por seu teor economico expressa-se em valor pecuniario ligado a coisas de utilidade, para o individuo que se interessa, entao, a que nao sofram sinistros. Ou seja.

Interesses diversos, todos de legitima relagao convergem para o mesmo bem — o predio — que a primeira vista, apresenta-se como o objeto do seguro; entretanto. nao e propriamcnte o predio esse objeto, e sim o interesse de cada um a que o imovel nao sofra dano eventual por forga da defesa de direito.s que sobre o mesmo recaem. Assim e que 0 proprietario scgura um valor pa trimonial, o credor hipotecario, a quantia ainda devida na ocasiao do sinistro, o usufrutario, a conservagao do bem que envolve a duragao de seus direitos, o depositario e o locatario suas responsabilidades e prerrogativas contratuais, Sao, portanto, interesses distintos c distintamente seguraveis que a cada qual dos respectivos titulares incumbe resguardar, verificando-se, assim, que o seguro recai sobre o interesse e a coisa nao e senao objeto do risco.

Somente podera um objeto ser segu rado senao por aquele que tern interesse na sua conservagao, em virtude do di reito dc propriedade ou de direito real que 0 vincule a coisa segurada, setido outrossim necessario que o interesse tenha carater economico e seja apreciavel em dinheiro; apresentando-se a coisa em fungao de seu valor.

A coisa podera desaparecer pelo si nistro, porem o interesse do dono perpetua-se na indenizagao; pois se o predio foi destruido pelo incendio, seu valor patrimonial ficou conservado mediante o seguro.

A teoria do interesse cifra-se, pois, na nitida conclusao de C. Weens em L Assurances des Choses Contrai llndenite: — «o verdadeiro objetc do seguro nao 6 pois a coisa como antes se acreditava, porem o interesse..>

Desta sorte, a concepgao do interesse depois de se firmar em postulado economico corrente, cristalizou-se no aireito do seguro, realizando uma das mais felizes inovaeoes, pois segundc observaram Godard e Charmenticr no seu «Code des Assurances». vinha pcrmitir mais livre campo ao prngresso do seguro. e maior flexibilidade as suas diversas modalidades. Tal incorpora?ao ao dominio juridico assumiu ainda maior iraportancia pois Que vinha dar ao prindpio de indeniza^ao dos seguros de coisas, solida estrutura ensejando as mais engenhosas combinagoes adaptadas a complexidade continuamente acresdda a produ^ao e cifculagao de bens.

A lei francesa de 1930 no art. 32 determina indsivamente em termos de carater absoluto:

^Toda pessoa tendo interesse na conservacao de uma coisa pode faze-la segurar.

^Todo interest direto ou indircto a nao realizagao de um risco pode ser objeto de um seguro».

Ja, entretanto. a lei federal Sui?a de 1908, sua provavel inspiradora pela virtude de boa experiencia, havia consagrado o preceito do interesse no art. 48:

«Todo intereise economico que uma pessoa possd ter a que um sinist.'-o nao acontega, pode se: objeto de um seguro contra dano£/>, bem como no art. 49: — «o valor do seguro e o valor do interesse segurnao no momento da conclusao do contr<.to».

O principio indenitario teve acolhimcnto do Codigo Civil italiano no art. 1.904 que fobnina de nulidade o contrato «se no momento em que o seguro deva ter inicio nao e.xiste um interesse do segurado ao ressarcimento do dano».

Portanto, a teoria do interesse segixravel estatuida na legislagao ou firmada em doutrina pela jurisprudencia, veio estabelecei como preceito normativo a fun?ao indenitaria do seguro de coisa; fungao esta que se estendendo ao dannum emergens c lucrum Cessans abrangeria, outrossim, a situagao de rerponsabilidade civil em que o segu rado tern interesse em prevenir-se da perda de dinheiro, pagando indenlragao a vitima.

Todas as vezes que na variedadc c complexidade das situagoes que se apresentem, houver o preceito de indenizagao de desempenhar seu papel, darsc-a sob influencia da conccp^ao do interesse seguravcl na pernianencia de sua expressao pecuniaria.

Sente-se na logica implacavcl dos fatos, que tudo que for em sua essencia vital ferido, so encontra o caminho da destrui^ao, e, assim, acontecz qv.ando a desvalorizacao da moeda atingindo a substancia do interesse, corrompe o prindpio indenitario.

Os interesse economicos em presen^a sao poc isso afetados, provocando o desequilibrio contratual e deste mode frustrada a agao do seguro.

Aquele oue contrata um seguro. tcm por objetivo imediato, adquirir uma sitiiagao de estabilidade que pretendc transportar para o futuro e que representa a unica defesa do interesse economico a resguardar-se no tempo contra as surpresas do destine. £sse contrato, nlmiamente de previsao, nao se conciliaria com a teoria da imprevisao.

Visando a garantir estabilidade, a deprecia^ao da moeda impede e amiia ^ o elemcnto de equilibrio que o seguro mantem na vida cconomica. Garantindo a solvabilidade futurci do devcdor que implica no desenvolvimento do credito, esta fun^ao do seguro torna-sc instavel, senao frustrada, ante as bruscas'quedas do valor da moeda.

A depreciagao da moeda falsea o cxercicio do seguro, obstando-ihc a nornialidade da fun^ao, sorte, alias, de todo contrato que envolve pagamento em dinheiro. Extremamente dificil adaptar ou ajustar o contrato do se guro a baixa da moeda no ato de sua execu?ao: contrato sinalagmatico que e. seria provocar o desequilibrio eco nomico das presta?6es. Representando 0 premio, o prego do risco assumido, ao transformar-se este no sinistro, ja o valor da moeda e, entao, inferior aquele do premio pago. O custo do premio perde assim a equivalencia e correla^ao com o custo da liquida^ao, tornando flagrante o desequilibrio do contrato.

Seria, portanto, necessario variac o premio impondo-se-Ihe um valor esfandarf.

A fixidez do valor de compra da moeda, escreve /. Hemard, e condi^ao fundamental a fim de que o seguro funcionc em condi^oes satisfatorias, desenipenhando plenamente seu objetivo economico — I'essor de I'sssurance est lie a la stabilite monetaire».

No conccrnente ao resseguro, a situa(;ao agrava-se consideravelmentc pois ^s flutuagSes das divisas dificultam e complicam a contabilidade, acresccndo novo risco ao risco do seguro.

O sentido internacional do resseguro implica uma diversidade de moeda, e, portanto, disparidade de valores.

Em tal conjuntura o desenvolvimento do seguro depara-se com obstaculos de dificil remogao, tornando-se improvavel o progresso das empresas.

Nos seguros a longo prazo e de prestagao sucessiva ••—seguros de vida que repousam sobre a capitalizagao, a anualidade do premio e afetada pelas flutuagoes da moeda, bem como, desvalorizadas gradativamente as respectivas reservas matematicas na continuidade de suas formagoes.

Essa peculiaridade do seguro de vida permite que se Ihe abra margem a certa revisao, nao em subscrever o segurado novas apolices, porem, em valorizar o capital contraido a longo prazo em caso de morte, com um suplemento do premio mediante um termo aditivo ao contrato.

A desvalorizagao da moeda na devastagao inflacionaria por que passa- ram nagoes europeias em seguida a guerra de 1914, criou uma situagao mquietante e ambiencia hostil aos contratos de seguro. Tentou-se, por isso, inserir junto as estipulagoes, dispositivos de salvaguarda dos interesses reciprocos, sendo preferivel como a mais radical nao se comprometer per longo prazo.

Na Alemanha onde a desvalorizagao chegou ao inccncebivel, procurou-se mtroduzir uma clausula indice — index Klausel — que permitia fazer variar o premie e a importancia segurada na conformidade do valor real da mocda, ou seja o valor do memento; dispositivo adaptado automaticamenfe aos pregos correntes. com reserva do direito de denuncia de parte do segurado.

As consequencias da inflagao acentuam-se na economia do seguro com certa particularidade ante a estreita ligagao existente entre bancos e companhias de seguros. As operagoes convizinham com as bancarias, pois que banqueiros e seguradores acumuiam capitals com o objetivo de faze-los frutificar sao ambos manipuladores e fabncantes de rendimentos. Porem. enquanto as de seguros sao em maior Prazo, as bancarias sao a curto prazo, Portanto. mais tempo ao seguro de expor-se as flutuagoes monetarias; embora as operagoes se entrosem em mecanismo de reciprocidade, a depreciagao afeta com maior agudeza ao seguro,

A cstabilidade monetaria e portanto a aspiragao suprema do seguro, emanada de sua razao de ser. como o nseio de todos os contratos, pois que se a vida dos povos palpita na multiplicagao dos contratos e sendo estes a lei ditada pela vontade das partes, e a lei da propria vida que reclame a cstabilidade.

Empreender a conquista da estabilidade e todavia missao extremamentc complexa por exigir agao pertinaz e sadia politica deflacionaria indene de quaisquer tolerancias.

Recuperagao constitue empreendimento de excelsa magnitude, pois rccuperar significa criar duas vezes. fa2endo que os desastres friitifiquem em beneficios, determinando a ressurreigao do destruido. a fecundagao das ruinas.

A solugao do angustiante problema consiste na procura de equilibria adaptando a estabilidade a instabilidade em esforgos inauditos, para o quanto possivel, estabelecer harmonia entre eiementos opostos, seraelhante ao navegador que em meio da tormenta busca desesperadamente a estabilidade do barco ante a impetuosidade dos vagaIhoes. Sao situagoes de que se espera transitoriedade e que reclamam por isso, providencias excepcionais. medidas de emergencia visando a por ordem ante a propagagao da desordem. Tenta-se, pois, abrir caminho que conduza a norraalizagao, sem entretanto fugir as contingencias da conjuntura economica.

O seguro e principalmente afetado pela inflagao nos premios com influencia conseqiienfe na capacidade de indenizar da empresa. O aspecto dessa vulnerabilidade tem preocupado especialistas do assunto, cujo contrato com a realidade.Ihes grangea autoridade inconteste. Sobre as taxas de seguro manifestou-se /. /. de Souza Mendes do Instituto de Resseguros do Brasil em estudo publicado na Rcvista de Seguros de junho de 1956. e sobre a estrutura das cmpresas no concernente aos limites de retengao o ilustre segurador Humherto Roncaratti em tese apresentada a Primcira Conferencia Brasileira de Seguros Privados em agosto de 1953.

Nitidamente a inflagao repercute sobre as taxas de seguros, ao notar-se que a elevagao do custo de vida no Brasil, segundo dados estatisticos autenticos. seguiu acentuada curve ascendente que partindo do indice 100 em 1950, atingiu em margo de 1956 a 243. A mesma proporgao obedece a elevagao dos pregos das utilldades e com rigorosa exatidao, tambem a majoragao da cobertura de tais valores pelo seguro. Nao e licito admitir-se que a cobertura adquirida mediante a paga de um premio, seja este o mesmo do ano anterior, pois que seria subverter a tecnica da operagao, frustrando-se o principio de indenizagao.

A progressividade

Da Desvalorizagao

determina-a Souza Mendes no citado trabalho segundo dados estatisticos coIhidos em fontes autenticas:

1951 ,— 11.0 % a mais sobre o ano anterior.

Forgado o seguro a penetrar no cicio inflacionario em virtude de sua agao previdencia! de cobertura de valores, torna-se imperioso a que se proceda a um reajustamento de valores, ou uma adaptagao das taxas aos indices da desvalorizagao da moeda, uma prudente acomodagao a conjuntura economica. fi uma conCinuada revisao de tarifas que opera no contrato de seguro a maneira da clausula subentendida rebus SIC stantibus.

Outro aspecto da influencia corrosiva da inflagao, aborda o competente segurador Roncaratti no respeito a estrutura tecnica da empresa quanto aos Umites de retengao.

Limite de refengao e urn fator dc equilibrio das carteiras de seguros para cada lisco assumido, isto nas epocas normais de estabilidade monetaria. quer dizer, portanto, nos periodos de instabilidade. em que sua fungao desajusta-se fundamentalmente ?

Consistindo o limite de retengao na quantia maxima ou minima "que pode atingir a retengao pcopria de um segu rador em cada risco isolado. 6 absolutamente certo que a continuada perda do poder aquisitivo da moeda, sactifi- ca esse elemento fundamental na capacidade de solvencia da empresa. Limite de retengao tem sentido equivalente a limite de responsabiiidade, em fun^ao, pois, da capacidade do segurador, condi^ao fundamental de eficiencia do principio de indenizagao.

CONCLUSoES

^ O preceito indenitario dos scguros de coisas, juridicamente denominados contratos de indeniza^ao, constitue importante fator de equilibrio na economia dos povos pelo poder de eliminar prejuizos e repor valores, tornando-se, por isso, de premente necessidade incutir-lhe a for^a de equilibrio que a inflagao debilita. Dar equilibrio a estc elemento a fim de que ele transmita 0 equilibrio propria de sua fungao.

II — Imp6e-se, portanto, que sobre OS dois elementos — premio e retengao, 0 primeiro, vinculo de inicio do contrato, como preqo da responsabiiidade transmitida e o segundo como refor^o de garantia da solvencia do segurador, estes extremes entre os quais se deduz a opera^ao, deverao ambos passar por process© de adaptabilidade as oscilacoes dos valores, de reajustamento ao poder aquisitivo da raoeda, sincronizando-se a conjuntura economica.

III Dada a condigao de transitoriedade das crises, as providencias ne- cessarias terao caratcr excepcional como medidas de emergencia que consistiriam na revisao periodica das tarifas de seguros e dos limites de retenqao em continuada observagao.

IV — Processo previsto. senao no texto, como principalmente no espirito e objetivo das leis de controle do Estado, nao exigindo, por isso, legislagao de excegao, comporta-se perfeitamente na agao dos orgaos de superintendencia e fiscalizagao do Poder Publico em conjungao com as entidades de classe.

V — A complexidade do problema reside na transitoriedade da situagao, sobre cuja instabilidade ha de se estabelecer a forga de equilibrio do prin cipio de indenizagao, incutindo maior flexibilidade ao seguro, devendo, por tanto, competir a entidade em permanente e direto contact© com a realidade:

— No Brasil, 30 Departamento Nacional de Seguros Privados e Capitaiizagao e Institute de Resseguros, aliados a agao do Sindicato como da Federagao das Empresas de Seguros Privados e Capitalizagao, comp>etindo, outrossim, as nagoes latino-americanas participantes desta memoravel Conferencia, aos respectivos organismos tecnicos similares sob cuja vigilancia se desenvolve 0 progress© da instituigao do seguro privado.

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