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Educação a distância: vantagens e desafios

Ensino no ambiente digital proporciona acesso à graduação, além de ser alvo de procura de quem busca especialização

por: Mayara Oliveira

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Quando terminou o ensino médio em 2015, Aline Barbosa sonhava cursar veterinária. Sem dinheiro, adiou a entrada na primeira graduação, com a esperança de que a situação melhoraria em pouco tempo. No início de 2018, já com 19 anos e sem perspectiva de finalmente entrar na faculdade que queria, optou por um curso EaD (educação a distância) para estudar biomedicina. “Veterinária é um curso muito caro e difícil de ingressar em uma faculdade pública. Achei melhor manter os pés no chão e fazer o que está dentro da minha realidade”, conta ela.

A educação a distância surgiu com a promessa de dar oportunidade de estudo aos que não conseguem cumprir a jornada de aula presencial, na maioria das vezes por trabalharem nesse período, morarem em locais em que não há universidades ou mesmo por algum problema de saúde. Além da flexibilidade de horá rio, os cursos costumam ser mais baratos, já que não contam com a presença física do professor. Ainda é possível concluir uma faculdade ou pós-graduação em tempo reduzido. Para muitos, o EaD é considerado uma das revoluções da educação.

De acordo com dados do Censo da Educação Superior de 2017, divulgado pelo Ministério da Educa ção (MEC), o número de alunos matriculados aumentou 3% em relação ao ano anterior. O crescimento ocorreu na modalidade à distância. Com a expansão, o EaD já representa 21,2% do total de alunos e, em 2007, era apenas 7%.

Para André Lacerda, coordenador de docentes do EaD do Centro Univer sitário IESB, a proposta é, basicamente, reduzir à distância. “Não existem fron teiras. A modalidade traz o que há de mais moderno na tecnologia de educação e informação. Tudo que é presencial pode ser feito à distância”, comenta. Perfil do aluno De acordo com dados do MEC de 2017, as mulheres são 77% dos estudantes de EaD. Os solteiros representam 76,6% dos concluintes dos cursos presenciais, modalidade de ensino que também concentra 46,7% dos alunos com idade entre 16 e 24 anos. Quase 80% dos alunos de EaD trabalham, porcentagem que é de 57,7% nos cursos presenciais.

Para o atual ministro da Educa ção, Rossieli Soares, o perfil de um estudante EaD é de alguém que busca especialização. “É aquela pessoa que está mais estabilizada, trabalhando e que quer continuar crescendo na carreira”, afirma.

A estudante Ana Rafaela Moura concluiu o curso presencial de admi nistração em uma instituição privada. Hoje, com 28 anos, para poupar tempo e conciliar com a rotina de trabalho, resolveu fazer a segunda graduação por EaD. “Avaliei como a mais vantajosa para conseguir conciliar toda a minha rotina de trabalho, estudo e vida social”, explica.

“Não existem fronteiras. A modalidade (EaD) traz o que há de mais moderno na tecnologia de educação e informação”

André Lacerda, professor do IESB

Miriam optou pela modalidade EaD por não ter mais condições físicas de ir presencialmente para a faculdade

A estudante cursa pedagogia na modalidade 100% EaD e se sente confortável com o que é proposto. Mas, apesar das vantagens de preço, flexibili dade de horário e comodidade, ela diz sentir falta da interação presencial com outros alunos. Por outro lado, na opinião dela, o curso agrega bastante ao seu atual trabalho como pedagoga em uma escola infantil. “A teoria eu aprendo online, à distância, e a prática eu posso viver no meu trabalho, com as crianças”, ressalta.

Quando adolescente, a auxiliar administrativa Miriam do Socorro Alves, 57, não conseguiu entrar na Universidade Federal do Pará para o curso de medicina. Grávida, aos 25 anos, se mudou para Brasília e não pensava mais em estudar. Foi no segundo semestre do ano passado que decidiu cursar design de interiores também na modalidade 100% EaD.

COMO SURGIU O EAD?

Estudos revelam que pouco antes de 1900 já havia anúncios em jornais a respeito de cursos de datilografia (para usar máquinas de escrever) oferecidos por professores particulares. Formalmente, em 1904 é que as escolas de Ensino a Distância foram oficialmente instaladas como solução para que pessoas que viviam distantes de instituições físicas pudessem aprender. Surgiram, além de cursos nos Estados Unidos, iniciativas em países localizados na Europa, África, Ásia, Oceania e, mais tarde, na América do Sul. Na década de 1920, o Brasil já contava com os primeiros cursos transmitidos pelas ondas do rádio, a novidade tecnológica da época. Os estudantes utilizavam material impresso para aprender Português, Francês e temas relacionados à radiodifusão.

No final da década de 1970 , começou em Brasília a primeira experiência de EaD nos cursos superiores. Nesse período, muitos brasileiros já acompanhavam os telecursos, transmitidos pela TV, acompanhado do material impresso e o rádio.

No começo, os cursos EaD eram voltados para aperfeiçoamento profis sional ou ofereciam conteúdo complementar da formação universitária. Com o passar do tempo, foi se tornando possível fazer até uma graduação completa a distância.

No Brasil, o EaD surgiu com cursos de qualificação profissional. O registro mais antigo é de 1904, com um anúncio nos classificados do Jornal do Brasil de um curso de datilografia por correspondência. Em meados da década de 1990, as instituições passaram a utilizar a internet para publicar conteúdos e promover interações. Foi nesse período que várias universidades formalizaram suas iniciativas EaD, até a criação da Secretaria de Educação a Distância (SEED), do Ministério da Educação (MEC), em 1996. Naquele mesmo ano, o EaD no Brasil passou a contar com uma legislação abrangente que hoje garante, por exemplo, a validade de diplomas emitidos pelos cursos nesta modalidade. Fonte: Ministério da Educação (MEC)

“Trabalho o dia inteiro e, devido a minha idade e aos meus problemas de saúde, não tenho mais condições físicas de ir presencialmente para a faculdade”. Miriam conta que a escolha do curso, apesar de não se relacionar com o seu atual trabalho, foi feita de acordo a paixão por decoração. “Quando eu era adolescente, perdi minha mãe para o câncer e queria cuidar dos outros, mas, depois de adulta, fui descobrindo afeições por outras áreas”, explica.

Renato Dutra, diretor de educação a distância do Centro Universitário IESB, diz que, na modalidade EaD, as instituições que trabalham com a dinâmica a distância têm um papel fundamental para fazer com que o protagonismo do aluno seja um sucesso. “A instituição tem o papel de oferecer recursos para o aluno desenvolver suas habilidades em determinada situação. A partir disso, ele cria sua rotina de disposição e comprometimento”, opina.

Apesar das vantagens, João Carlos da Silva, 59, não se adaptou à modalidade a distância. Hoje, formado em Teologia por uma instituição privada, ele justifica a mudança para o ensino presencial devido à falta de interação na plataforma digital. “Comecei o ensino a distância pelas inúmeras vantagens, como flexibilidade e preço da mensalidade, mas senti falta da troca de ideias entre alunos e docentes no ambiente físico. Era como se a interação no ambiente digital fosse limitada, assim como o meu conhecimento”, argumenta.

Para a pedagoga Patrícia Cabral, o aluno de um curso presencial, além de criar uma relação de proximidade com os professores, também tem a oportunidade de desenvolver relações com colegas de aula que podem influenciar no futuro

“Era como se a interação no ambiente digital fosse limitada, assim como o meu conhecimento”

João Carlos da Silva, teólogo

João Carlos da Silva, 59, não se adaptou à modalidade a distância e se formou em Teologia presencialmente

VANTAGENS E DESVANTAGENS

VANTAGENS - Desenvolve a autonomia do aluno - Preços mais baixos - Flexibilidade: o aluno pode estudar quando e onde quiser - Não é preciso se deslocar para participar das aulas - Respeita o ritmo de aprendizado de cada aluno - Sem barreiras geográficas

DESVANTAGENS - Falta de interação social - Pouca cobrança direta dos professores e colegas - Impossibilidade de compartilhar a responsabilidade com colegas - Menos cursos disponíveis - Discussões online focam no conteúdo e dificilmente alcançam questões do cotidiano do aluno - Menos dinamismo

Fonte: Patrícia Cabral, pedagoga

profissional. “A troca de conhecimentos que vem da interação, de discussões em sala de aula e do planejamento de trabalhos ajuda o aluno a desenvolver um senso crítico e abrir a mente para novas ideias”, observa.

Patrícia ainda diz que tanto a modali dade a distância, como a presencial possuem vantagens e desvanta gens. “Para saber qual modalidade escolher, é preciso levar em conta o estilo de vida do indivíduo, assim como suas necessidades pessoais e perspectivas de futuro. A dica aqui é conhecer seus sonhos e objetivos para o futuro e fazer a escolha que mais possa gerar frutos”, analisa. EaD caminha junto com a tecnologia da informação e isso é essencial. Ela está presente em todos os momentos da nossa vida, o que me proporciona acessar uma aula a partir do meu smarthphone em qualquer hora e em qualquer lugar”, argumenta. Além disso, acredita que o mercado tende a buscar por mais profissionais formados em graduações a distância por motivos de disciplina. “O EaD acostuma o aluno a cumprir prazos, a ler mais, desenvolvendo sua própria autonomia. Isso tudo acaba sendo de interesse de uma empresa contratante, por exemplo”, conclui.

De acordo com a presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), Maria Inês Fini, a educação a distância está em constante crescimento e é importante tanto para o profissional, quanto para o mercado online. “Nenhuma profissão, nenhuma atividade, vai durar para sempre no mundo do trabalho (físico). Essa possibilidade de EaD para o trabalhador é muito importante. A partir de agora, num mundo tão digital, vamos precisar dessa modalidade de ensino”, afirma ela. De acordo com o Inep, a educação a distância está em crescimento e é importante tanto para o profissional, quanto para o mercado

Legislação EaD A educação a distância é regulamentada em todo o território nacional. De acordo com o Ministério da Educação (MEC), as instituições de ensino superior podem ampliar a oferta de cursos superiores de graduação e pós-graduação. Além disso, através da legislação, é possível criar polos de EaD pelas próprias instituições, sem credenciamento prévio para a oferta presencial.

Com a regulamentação, as instituições podem oferecer, exclu sivamente, cursos a distância, sem a oferta simultânea de cursos presenciais. A estratégia do MEC, segundo o próprio órgão, é ampliar a oferta de ensino superior no país.

André Lacerda diz que, antes do avanço tecnológico, o mercado profissional enxergava o ensino a distância de forma negativa, pois as pessoas faziam cursos de baixa qualidade. “Hoje, o

Aline Barbosa, 19, decidiu cursar biomedicina na modalidade

Qualidade do ensino a distância Os dados do Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade) 2017, divulgados pelo Ministério da Educação (MEC) em outubro, mostram que, na modalidade presencial, 6,1% dos cursos têm conceito 5. No caso do ensino à distância são 2,4% no patamar mais alto.

O ministro da Educação disse que o ensino superior a distância tem se revelado uma possibilidade de inclusão no país, mas que é preciso monitorar a qualidade. “Observamos que temos que acompanhar na questão da qualidade. Tivemos uma concentração no conceito 3, que é razoável, mas também no conceito 2”, alertou.

O Enade tem conceitos de 1 a 5, do pior para o melhor desempenho. Apesar da diferença da nota, o ministro ainda argumenta que não se pode comparar as notas dos cursos presenciais e a distância, devido à diferenças de perfil entre os alunos de ambas as modalidades. Rossieli também comenta que a razoável nota da educação a distância no Enade pode ser devido à recente instalação da modali dade no Brasil. “A avaliação do Enade é importante porque nos dá um norte para as políticas públicas do ministério referentes à educação a distância”, completa.

O Enade é realizado com base em um ciclo trienal no qual a cada ano uma área diferente é avaliada em universidades públicas e privadas. A prova é composta por 40 questões, sendo uma parte de formação geral, que leva em conta atuação ética, e compõe 25% da prova; e outra de questões específicas relativas ao conteúdo do curso, que representa 75% do exame. A maioria das perguntas é de múltipla escolha e algumas são discursivas. 

MAIS SOBRE A LEGISLAÇÃO EAD

Atualmente, existem diversos decretos, portarias e normativas que regulamentam a EaD no Brasil. Elas têm como objetivo fazer com que as instituições sigam essas normas pré-estabelecidas para de que o ensino seja transmitido de maneira formal. Abaixo, é possível observar, um pequeno histórico de alguns dos decretos que regulamentam a educação a distância no Brasil.

DECRETO Nº 5.622/2005 Além de regulamentar o art. 80 da Lei nº 9.394 de 20 de dezembro de 1996, o decreto, que possui seis artigos, instituiu orientações gerais para este tipo de ensino, tais como metodologia, avaliação do desempenho do aluno, o credenciamento de instituições, entre outros.

DECRETO 5.773/2006 De maio de 2006, o decreto tem por finalidade regulamentar, supervisionar e avaliar as instituições de educação superior e também de cursos sequenciais no sistema federal de ensino. O decreto conta com cinco capítulos que falam sobre a regulamentação e competências que cada entidade deve compor, o credenciamento específico (art.26) das instituições de ensino, fases do processo de credenciamento das instituições tanto como Mantenedora ou como Mantida. DECRETO 6.303/2007 O Decreto 6.303 foi editado para adequações nos decretos nº 5.622/2005 e 5.773/2006. No primeiro decreto, com o intuito de ajustar o credenciamento junto a SINAES (Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior) incluindo novas regras as unidades de educação com atividade presencial. Já no segundo Decreto, altera o processo de Credenciamento de Campus Fora de Sede onde originalmente, tratava do processo de Credenciamento de Curso ou Campus Fora de Sede, entretanto o decreto de 2007 fez esta alteração em virtude de não existir a prática de credenciamento de cursos.

DECRETO Nº 9.057/2017 Publicado em 26 de maio de 2017, tal decreto tem o objetivo de atualizar a legislação que regulamenta a educação à distância no país. Define, ainda, que a oferta de pós-graduação EaD, não necessita de credenciamento específico, ou seja, as instituições que já possuem o credenciamento a distância, estão autorizadas a ofertar essa modalidade. O decreto também regulamenta a oferta de cursos para o ensino médio e para a educação profissional técnica de nível médio.

Fonte: Ministério da Educação (MEC)

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