Revista In Form@ção. Volume 6, número 8

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Volume VI - Nº. 8

Dezembro / 2020

Revista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)


Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Sistema Estadual de Bibliotecas Escolares - SIEBE / SEDUC – PA _____________________________________________________________________ Revista In Form@ção / Secretaria de Estado de Educação. Cefor. – v. 6, n. 8 (Dez. 2020). - Belém, PA : SEDUC, CEFOR, 2020 (on-line) Semestral ISSN: 2448-1106 1. Educação – Ensino e Aprendizagem. 2. Metodologia. I. Secretaria de Estado de Educação do Pará. Cefor. ____________________________________________________________________ CDD - 22. ed.

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Sumário APRESENTAÇÃO..............................................................................................................................................................................5 A PRODUÇÃO TEXTUAL A PARTIR DAS MARCAS DO LUGAR ONDE VIVO................................................................................7 Adriana Ranzani Gimenes Almeida; Auxiliador Jairo de Sousa; Francisca Oliveira da Cruz A PROJEÇÃO DAS AULAS EXPERIMENTAIS DE FÍSICA NA MOSTRA BRASILEIRA DE FOGUETES......................................21 Alan Luis Figueiredo da Paz CAMINHOS DA DOCÊNCIA.............................................................................................................................................................35 Eliana Nobre do Carmo HORTA VERTICAL NO ENSINO MÉDIO NOTURNO: UMA EXPERIÊNCIA QUE DEU CERTO…………………………................46 Emanoel Oliveira Santos SEMANA DA CONSCIÊNCIA NEGRA E LITERATURA DE CORDEL: RELATO DE EXPERIÊNCIAS NO ENSINO DE HISTÓRIA NA ESCOLA ESTADUAL RUTH PASSARINHO (BELÉM-PA, 2019)…………………………………………...……………................55 Geraldo Magella de Menezes Neto EDUCAÇÃO MUSICAL À LUZ DA TEORIA DE R. MURRAY SCHAFER: CONTRIBUIÇÕES PARA O ENSINO DE MÚSICA NA EDUCAÇÃO BÁSICA................................................................................……………………………………...……………................69 Jeová de Jesus Couto A INCLUSÃO NA PRÁTICA DE PROFESSORES : DESAFIOS, ENTRAVES E POSSIBILIDADES NA FORMAÇÃO CONTINUADA EM SERVIÇO.........................…………………………………………………………………………………...……………................77 Marcelo Augusto Vilaça de Lima SURDOS E MERCADO DE TRABALHO: DESAFIOS CONTEMPORÂNEOS.........................………………………………….........91 Maria Cristianne do Carmo Conder; Maria Cristina Santos do Carmo; Ana Telma Monteiro de Sousa; UMA HISTORIOGRAFIA SOBRE LOGARÍTMO..................................................................……………………………...…….........102 Martinho Mota Dias Júnior; Fábio José da Costa Alves; DECRETO ESTADUAL 1.974/2018: INOVAÇÃO NAS LICITAÇÕES PÚBLICAS NO ESTADO DO PARÁ..................................112 Nícolas Pinto Alves; Lívia Donza Barroso; João Patrício de Lima Júnior; UMA EXPERIÊNCIA COM O TEATRO NO ENSINO DA LÍNGUA INGLESA: COMUNICAÇÃO E ORALIDADE..........................124 Vitor da Silva Carvalho RELATO SOBRE UMA ATIVIDADE REALIZADA POR ESTUDANTES DE UM CLUBE DE CIÊNCIAS ESCOLAR EM UM ORQUIDÁRIO DE ORIXIMINÁ-PA ............................................................................................................................................................132 Tatiana Queiroz Sardinha; Douglas Farley Barroso Pereira; USO DO IMC NA CONSTRUÇÃO E INTERPRETAÇÃO DE TABELAS E GRÁFICOS NAS AULAS DE CIÊNCIAS ..................140 Claudeth de Souza Pinto Alex Corrêa da Silva

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Expediente A Revista InForm@ção é uma publicação online do Centro de Formação dos Profissionais da Educação Básica do Estado do Pará (CEFOR), de periodicidade semestral, destinada à publicação de artigos científicos e relatos de experiências de autoria dos professores e servidores da Secretaria de Estado de Educação do Pará, em especial os que atuam nas escolas da rede estadual, com objetivo de socializar experiências e resultados de pesquisas, reconhecendo e valorizando as contribuições teóricas e metodológicas dos autores. GOVERNO DO ESTADO DO PARÁ GOVERNADOR Helder Zahluth Barbalho VICE-GOVERNADOR

AUTOR CORPORATIVO Centro de Formação dos Profissionais da Educação do Estado do Pará Endereço: Rua Gama Abreu, 256 - Bairro de Nazaré Belém – Pará CEP: 66.015-130 E-mail: cefor@seduc.pa.gov.br E-mail: ceforrevista@gmail.com Telefone: (091) 3230-4050

Lúcio Dutra Vale SECRETARIA DE ESTADO DE EDUCAÇÃO Elieth de Fátima Silva Braga SECRETARIA ADJUNTA DE ENSINO (SAEN) Regina Lucia de Souza Pantoja SECRETARIA ADJUNTA DE GESTÃO DE PESSOAS (SAGEP)

EDITORES Nádia Eliane Cortez Brasil Sandra Lúcia Paris Conselho Editorial André Luís Pereira de Freitas Francisco Augusto Lima Paes Gláucia Nazaré Baía e Silva Nádia Eliane Cortez Brasil Ocimar Marcelo Souza de Carvalho Sandra Lúcia Paris CAPA André Luís Pereira de Freitas Periodicidade: semestral Endereço eletrônico: https://issuu.com/entresaberes

Naira Luiza Pina Silva SECRETARIA ADJUNTA DE PLANEJAMENTO E GESTÃO (SAPG) Delciene Loureiro Corrêa SECRETARIA ADJUNTA DE LOGÍSTICA ESCOLAR (SALE) Alexandre Buchacra CENTRO DE FORMAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO DO ESTADO DO PARÁ (CEFOR) Francisco Augusto Lima Paes

PARECERISTAS AD HOC Profa. Ma. Ana Lúcia da Silva Brito Prof. Me. Dionísio José da Costa Sá Profa. Dra. Elizabete Pereira Pires Profa. Ma. Esilene dos Santos Reis Arruda Profa. Ma. Esther Maria de Souza Braga Prof. Dr. Flávio Nazareno Araújo Mesquita Profa. Ma. Gláucia de Nazaré Baía e Silva Profa. Me. João Amaro Ferreira Neto Prof. Me. Josivan João Monteiro Raiol Prof. Dr. Luiz Fernando Cardoso e Cardoso Prof. Dra. Maíra Oliveira Maia Profa. Me. Maura Suely Portela Brelaz Prof. Dr. Mauro Márcio Tavares da Silva Profa. Ma. Missilene Silva Barreto Prof. Me. Ocimar Marcelo Souza de Carvalho Profa. Ma. Raimunda Nazaré Fernandes Prof. Dr. Roberto Araújo Martins Prof. Me. Roberto Pinheiro Araújo Profa. Dra. Rosineide de Souza Jucá Profa. Dra. Sandra Lúcia Paris Profa. Ma. Salier Juliane dos Santos Castro Profa. Ma. Valena Miranda Mesquita

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Apresentação A Revista InForm@ção, lançada em outubro de 2015, apresenta-se aos leitores em sua 8ª edição, renovando o compromisso da Secretaria de Estado de Educação do Pará, por meio do Centro de Formação dos profissionais da Educação Básica do Estado Pará (CEFOR), de promover e dar visibilidade a produção científica dos educadores da rede estadual de Educação Básica. Nesta edição constatamos que cada vez mais cresce o interesse pelos profissionais de ensino e de gestão da rede pública ao exercício da construção, reflexão e proposições vivenciadas e/ou em processo dentro das unidades escolares. É de grande importância que essas práticas saiam do senso comum para o conhecimento científico a fim de que possam tornar-se objeto de investigação, estudos e pesquisas nos campos mais diversos do conhecimento. Foram trinta e cinco (35) trabalhos inscritos e submetidos a análise, sendo que dezesseis (16) estão na categoria de relatos de experiência e dezenove (19) na categoria de artigos científicos. Doze (12) trabalhos foram aprovados para publicação. A seguir, apresentamos em síntese, os trabalhos, autores e os lugares de onde falam nessa 8ª edição, a saber: O relato de experiência “A PRODUÇÃO TEXTUAL A PARTIR DAS MARCAS ONDE VIVO” de autoria de Adriana Ranzini Gimenes Almeida – Altamira/Pará consiste num exercício de reflexão das práticas pedagógicas de ensino e aprendizagem de leitura e escrita dentro da concepção do letramento baseados na teoria de Oliveira (2010) cuja temática fala da importância e do dever da escola de ensinar os alunos a escrever para inseri-los nas práticas e nas situações de multiletramentos existentes na sociedade. Tem como principal objetivo incentivar o exercício da leitura e da escrita, além de valorizar e elevar a autoestima dos educandos com o intuito de torná-los sujeitos do processo, agentes da ação nessa interação com a leitura, escrita e o meio social e protagonismo dessa ação. “A PROJEÇÃO DAS AULAS EXPERIMENTAIS DE FÍSICA NA MOSTRA BRASILEIRA DE FOGUETES” de autoria de Alan Luís Figueiredo da Paz – Salvaterra/Pará relata a experiência da projeção das aulas experimentais de Física, por meio da construção de base de lançamento de foguetes construídos de garrafa pet para serem expostos na Mostra Brasileira de Foguetes (MOBFOG). Essa atividade foi desenvolvida com os alunos do 1º ao 4º ano do Ensino Técnico Integrado (Ensino Médio e Técnico), regularmente matriculados na Escola de Ensino Técnico do Estado do Pará – EETEPA, situada no município de Salvaterra/Pará, arquipélago do Marajó. “O USO DO JORNAL PARA A ALFABETIZAÇÃO DE CRIANÇAS” de Cláudia Telma da Cruz Lima – Belém/Pará, traz uma experiência pedagógica desenvolvida em uma escola da Rede Pública Estadual de Belém, onde utilizamos o jornal como ferramenta pedagógica para alfabetizar crianças de uma turma do 3º ano do Ensino Fundamental. “CAMINHOS DA DOCÊNCIA” de Eliana Nobre do Carmo – Tomé-Açú/Pará é um relato que evidencia os caminhos percorridos antes, durante e após a formação docente, inicial e continuada, sua importância e algumas contribuições para a prática docente. Ancorados em uma abordagem teórica, os registros descritos demonstram a importância da formação docente, bem como apontam algumas dificuldades enfrentadas no exercício do ato de ensinar. “HORTA VERTICAL NO ENSINO MÉDIO NOTURNO: uma experiência que deu certo!” de autoria de Emanoel Oliveira dos Santos – Belém/Pará é um relato que trata sobre a experiência de cultivar hortas verticais em garrafas pet. Foi desenvolvida com alunos do 3ª série do ensino médio noturno da EEEFM Abelardo Leão Condurú em Mosqueiro, Belém-PA. As turmas realizaram pesquisa bibliográfica para identificar as características de cada planta, principalmente em relação ao cultivo e irrigação. Os resultados obtidos foram apresentados na forma de seminários entre as turmas, e os produtos expostos na feira de ciências da escola.

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“SEMANA DA CONSCIÊNCIA NEGRA e LITERATURA DE CORDEL: relato de experiências no ensino de História na Escola Estadual Ruth Passarinho” – Belém/Pará de Geraldo Magella de Menezes Neto. O autor aborda a Lei n. 10.639/2003 que estabeleceu a obrigatoriedade do ensino da história e cultura africana e afro-brasileira. O relato de experiências tem como lócus a Escola Estadual Ruth Passarinho, em Belém do Pará, cuja discussão da temática se deu com uma turma do 7º ano, tendo como recurso didático a literatura de cordel a partir do livro Heroínas negras brasileiras em 15 cordéis, da cordelista e escritora cearense Jarid Arraes. “A INCLUSÃO NA PRÁTICA DE PROFESSORES DAS SÉRIES INICIAIS: DESAFIOS, ENTRAVES E POSSIBILIDADES NA FORMAÇÃO CONTINUADA EM SERVIÇO” de Marcelo Augusto Vilaça de Lima – Belém/Pará aborda a investigação e análise dos desafios e perspectivas da prática inclusiva dos professores no que se refere ao processo de formação continuada em serviço. “SURDOS E MERCADO DE TRABALHO: desafios contemporâneos de Maria Cristiane do Carmo Conder, Maria Cristina Santos do Carmo e Ana Telma Monteiro de Sousa – Belém/Pará, tem por objetivo analisar os desafios enfrentados pelos surdos no cotidiano do mercado de trabalho nas empresas em Belém/PA inferindo as dificuldades e barreiras enfrentadas por eles na comunicação e na execução de suas tarefas. A metodologia utilizada foi uma pesquisa do tipo estudo de caso exploratório descritivo sob a ótica da abordagem qualitativa. O lócus de investigação foi a Escola Estadual “Astério de Campos”, Faculdade Integrada “Brasil Amazônia” – FIBRA e Sistema Nacional de Emprego - SINE que fica dentro do Centro Integrado de Inclusão e Cidadania - CIIC, envolvendo pessoas com surdez que estão no campo de trabalho. “UMA HISTORIOGRAFIA SOBRE LOGARÍTMO” de Martinho Mota Dias Júnior e Fábio José da Costa Alves – Tucuruí/Pará tem como foco o estudo de Logaritmo no Ensino Médio, tendo como objetivo apresentar uma metodologia diferenciada com uso de uma historiografia no sentido de mostrar aos estudantes o surgimento do Logaritmo, quem foi o seu precursor e seus colaboradores, à época de seu descobrimento, os acontecimentos históricos referentes ao período escolhido, e por fim, as principais contribuições que cada um dos chamados “personagens contemporâneos” realizaram sobre o tema e/ou invenções, descobertas científicas importantes com relativo destaque histórico na matemática. “DECRETO ESTADUAL 1.974/2018: INOVAÇÃO NAS LICITAÇÕES PÚBLICAS NO ESTADO DO PARÁ”. de Nicolas Pinto Alves, Lívia Donza Barroso e João Patrício de Lima Júnior – Belém – Pará, tem como objetivo analisar o Decreto Estadual Nº 1.974/2018 e a sua viabilidade na aplicação das licitações na área da Educação, fazendo uma comparação com a lei Nº 8.666 de 21 de junho de 1993. Nesta pesquisa os autores, procuram abordar a seguinte questão: em que medida a adoção do Decreto Nº. 1.974 de 31/01/2018 contribuiu para reduzir o tempo nas licitações de obras na Secretaria de Educação do Estado do Pará? É uma pesquisa documental, pois a metodologia utilizada constitui-se em uma análise comparativa entre as duas legislações, tomando como categoria o tempo. “RELATO SOBRE UMA ATIVIDADE REALIZADA POR UM CLUBE DE CIÊNCIAS ESCOLAR EM UM ORQUIDÁRIO DE ORIXIMINÁ” – Oriximiná/Pará de autoria de Tatiana Queiroz Sardinha e Douglas Farley Barroso Pereira, tem por objetivo evidenciar as percepções sobre uma atividade desenvolvida por estudantes de um Clube de Ciências escolar em um orquidário particular do município de OriximináPará. Trata-se de uma pesquisa descritiva. Para ajudar a compor o relato foram aplicados questionários a uma estudante clubista, um professor de Biologia, a diretora da escola e ao orquidófilo - proprietário do orquidário. Ademais, reiteramos nossos mais sinceros agradecimentos aos professores-autores, ao nosso corpo de pareceristas internos e externos e a colaboração constante do professor André Freitas, responsável pela arte da capa. Desejamos que os textos publicados fomentem novos estudos e incentivem novas publicações. Boa leitura!

Comissão Editorial

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A Produção Textual a partir das Marcas do Lugar Onde Vivo Adriana Ranzani Gimenes Almeida1 Auxiliador Jairo de Sousa2 Francisca Oliveira da Cruz3 RESUMO Este trabalho é um exercício de reflexão de práticas pedagógicas de ensino e aprendizagem de leitura e escrita dentro da concepção do letramento baseados na teoria de Oliveira (2010) cuja temática fala da importância e do dever da escola de ensinar os alunos a escrever para inseri-los nas práticas e nas situações de multiletramentos existentes na sociedade; além desse aporte teórico, usamos outros referenciais como: Kleiman (2007), Street (2003) e Soares (2004) que subsidiaram nossa trajetória durante a execução das atividades. Como metodologia, realizamos oficinas de leitura e escrita, rodas de conversas com escritores e cidadãos altamirenses, entrevistas, leitura e produção de textos. O principal objetivo deste trabalho foi incentivar o exercício da leitura e da escrita, além de valorizar e elevar a autoestima dos educandos com o intuito de torná-los sujeitos do processo, agentes da ação nessa interação com a leitura, escrita e meio social e protagonistas dessa ação. Além da coletânea de textos produzidos pelos educandos, nos gêneros: Poema (5º ano); Memórias Literárias (6º e 7º ano) e Crônicas (8º e 9º ano) na Escola Municipal Ensino Fundamental. Dr. Ulysses Guimarães, o trabalho desenvolvido proporcionou elevação da autoestima, autoconfiança, maior interação da turma, melhora na escrita/leitura e o despertar para futuros escritores. Palavras-chave: Leitura. Produção textual. Protagonismo. Multiletramentos.

INTRODUÇÃO Sabe-se que “ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção” (FREIRE, 1996, p. 47). Os professores fascinantes objetivam que seus alunos sejam líderes de si mesmos (CURY, 2003). Estas afirmações reforçam a ideia de que a escola precisa reavaliar e dinamizar sua prática dentro e fora da sala de aula, visando motivar os alunos e mudar o cenário educacional.

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Graduada em Letras pela Universidade Federal do Pará - UFPA, Especialista em Metodologia do Ensino da Língua Portuguesa e Literatura pela FACINTER. Professora de Língua Portuguesa na SEMED-Altamira, Professora de Língua Portuguesa na SEDUC-PA. E-mail: adriana.almeida@escola.seduc.pa.gov.br. (93) 991729088.

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Graduado em Letras pela Universidade Federal do Pará - UFPA, Especialista em Linguagens, Códigos e suas Tecnologias – FACINTER. Mestre em Letras pela UFOPA. Professor de Língua Portuguesa na SEMED-Altamira e Vitória do Xingu. Email: jairomsc07@gmail.com. (93) 991892440.

Graduada em Letras - UFPA, Especialista em Linguagem e Ensino pela Universidade Federal do Pará - UFPA. Professora de Língua Portuguesa na SEMED-Altamira - Pará. E-mail: fraciscacruz@gmail.com. (93) 991531552.

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A prática educacional da leitura e da escrita é um importante desafio a ser vencido pelas escolas públicas. Pensando nisto, na escola de Ensino Fundamental Dr. Ulysses Guimarães, em parceria com os professores Auxiliador de Sousa e Francisca Oliveira, demos o primeiro passo e inscrevemos nossas turmas na Olimpíada de Língua Portuguesa – OLP (CENPEC, 2019); em busca de uma metodologia atrativa que gerasse conhecimentos mais significativos e inspirados pela OLP, surgiu a ideia de produzir textos a partir de histórias vividas e contadas por moradores da cidade de Altamira, no Estado do Pará. A partir de então, as aulas de Língua Portuguesa, da escola Dr. Ulysses Guimarães, nas turmas de 5º ao 9º ano do ensino fundamental, foram planejadas por ano, de acordo com as oficinas de poesia, memórias e crônicas, seguindo os materiais da Olimpíada de Língua Portuguesa de 2019. Nesse sentido, nossa prática seguiu de acordo com o planejamento das ações implementadas e estudo do material: cadernos das oficinas conforme as categorias (Poema: Poetas da escola; Memórias Literárias: Se bem me lembro; Crônicas: A ocasião faz o escritor), revista de apoio ao professor: Na Ponta do Lápis, além dos cursos oferecido na plataforma do site da Olimpíada; recursos formativos: sequências didáticas, cadernos de orientação, vídeos, jogos e recursos didáticos para auxiliar os professores em suas práticas; entrevistas com escritores e relatos de experiências no blog da OLP, as conversas com a Olímpia, personagem criada pela OLP para interagir com os professores inscritos no concurso, esclarecer dúvidas, orientar, motivar e estabelecer uma relação de empatia nesse processo. Foram aulas bastante significativas de leitura, de conhecimento, pesquisas e entrevistas compartilhando saberes sobre a temática geral, “O lugar onde vivo”.

A leitura e a escrita a partir de múltiplos letramentos “A palavra falada é um fenômeno natural; a palavra escrita é um fenômeno cultural” (PESSOA, 1999, p. 19), dessa forma, a criança nasce e no meio social no qual está, aprende a falar de forma natural e espontânea, no entanto, ela aprende a escrever, geralmente, num contexto escolar, formal, sob influência e interação cultural e social; isso implica que a fala e a escrita não são a mesma coisa, embora relacionadas (OLIVEIRA, 2010), são, na verdade, um continuum um do outro (MARCUSCHI, 2001). Aprender a escrever é uma tarefa que requer esforço por parte dos alunos e do professor para que o aprendizado vá além da simples tarefa escolar (OLIVEIRA, 2010,). É preciso não só decodificar sons e letras, mas entender os significados do uso da leitura e da escrita em diferentes contextos (JUSTO; RUBIO, 2013); assim, 4

URL: www.escrevendoofuturo.org.br.

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Um dos objetivos principais da escola é justamente possibilitar que seus alunos possam participar das várias práticas sociais que se utilizam da leitura e da escrita (letramentos) na vida da cidade, de maneira ética, crítica e democrática. Para fazê-lo, é preciso que a educação linguística leve em conta hoje: os multiletramentos ou letramentos múltiplos, também de maneira ética e democrática, deixando de ignorar ou apagar os letramentos das culturas locais de seus agentes [...]; os letramentos multissemióticos exigidos pelos textos contemporâneos [...]; os letramentos críticos e protagonistas requeridos para o trato ético dos discursos em uma sociedade saturada de textos e que não pode lidar com eles de maneira instantânea, amora e alienada [...] (ROJO, 2009, p. 107).

As práticas pedagógicas de ensino e aprendizagem de leitura e escrita, sem dúvida, ainda é um desafio. Rojo (2012) define o conceito de multiletramentos como textos compostos de inúmeras linguagens e que exigem habilidades de compreensão e produção para ganhar, significados. Dessa forma, principal meta da escola, no que diz respeito ao ensinar português, deve ser estimular os alunos a ler e escrever, para inseri-los nas práticas e nas situações de letramentos múltiplos existentes na sociedade (OLIVEIRA, 2010). Cabe a nós educadores, o papel de criar oportunidades, multiplicar e democratizar as práticas de leitura e escrita, favorecendo o acesso dos educandos aos mais variados gêneros textuais, dentro e fora da sala de aula, uma vez que a escola é uma agência de letramentos por excelência, que deve criar espaços para experimentar novas formas de participação nas práticas sociais e letradas, e assim constituir múltiplos letramentos na vida social de nossos alunos (KLEIMAN, 2007). Ressaltamos, ainda, a proposição de objetivos de aprendizagem e desenvolvimento que concorrem para a capacidade dos estudantes de relacionarem textos, percebendo os efeitos de sentidos decorrentes da intertextualidade temática e da polifonia resultante da inserção – explícita ou não – de diferentes vozes nos textos. A relação entre textos e vozes se expressa, também, nas práticas de compartilhamento que promovem a escuta e a produção de textos, de diferentes gêneros e em diferentes mídias, que se prestam à expressão das preferências e das apreciações do que foi lido/ouvido/assistido. De acordo com a BNCC (BRASIL, 2018), o texto é o ponto central para definição dos conteúdos, habilidades e objetivos. É preciso proporcionar aos alunos experiências que contribuam para a ampliação dos múltiplos letramentos, conforme apontado nas orientações da Base, de forma a possibilitar a participação significativa e crítica nas diversas práticas sociais permeadas/ constituídas pela oralidade, pela escrita e por outras linguagens. Ler e escrever é dialogar com o mundo e isso equivale à passagem da aula de gramática normativa para as práticas de leitura e escrita demandada por práticas sociais (PEIXOTO, 2019). É preciso ressaltar que não basta apenas a presença da escrita para haver letramentos, é preciso sua interação em uma realização social da qual a escrita faça parte. Assim, é importante que haja uma situação específica em que as coisas estejam acontecendo, e em que se possa vê-las (STREET, 2003).

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Portanto, a escrita é uma atividade processual que ocorre por meio de leituras, reflexões e acesso a diferentes fontes de informação; é uma atividade que mobiliza um repertório de conhecimentos e, por isso, não pode ser improvisada (ANTUNES, 2009). É preciso caminhar em direção ao conceito de letramentos: do saber ler e escrever em direção ao ser capaz de fazer uso da leitura e da escrita em situações reais de interação (SOARES, 2004). Assim, este relato de experiência evidencia a importância da produção textual a partir das marcas do lugar em que o aluno está inserido.

O percurso dos jovens escritores O trabalho desenvolvido com os alunos em sala de aula teve como objetivo geral incentivar o exercício da leitura e da escrita, além de valorizar e elevar a autoestima dos educandos a fim de que floresça o protagonismo juvenil e suas vivências façam parte da aprendizagem. Além disso, entendemos que seria importante atentar para pontos não menos essenciais que consolidasse nosso objetivo maior, assim, as atividades realizadas procuraram ainda: desenvolver o processo de leitura e escrita, sob a perspectiva dos multiletramentos; proporcionar meios de interação social e cultural para fundamentar a produção escrita dos alunos; coletar informações da história de moradores da região para a produção de poesias, crônicas e memórias literárias; e produzir um livro com uma coletânea de textos produzidos pelos alunos do ensino fundamental. Para tanto, como já mencionado, inscrevemos nossas turmas na Olimpíada de Língua Portuguesa 2019, em busca de uma metodologia atrativa que envolvesse nossos alunos. Assim, nossas atividades seguiram as orientações pedagógicas desse concurso nacional de Língua Portuguesa. E nós, na função de professores pesquisadores, imergimo-nos nos estudos dos gêneros, estudando as oficinas, compartilhando experiências, construindo e adequando planos de trabalhos, por acreditarmos que um trabalho pode obter mais sucesso se planejado. Planejar é antecipar mentalmente uma ação a ser realizada é agir de acordo com o previsto; é buscar algo incrível, essencialmente humano: o real comandado pelo ideal. Percebemos assim que o planejamento só tem sentido se o sujeito se coloca numa perspectiva de mudança (VASCONCELLOS, 2000, p. 79).

Nossa principal meta era envolver nossos estudantes numa perspectiva de multiletramentos, promovendo eventos e práticas em que eles pudessem escrever de forma significativa, sentindo-se parte nesse construto social da cultura escrita. Pode-se afirmar que foram momentos mágicos em que lugares, histórias e lembranças vividas por moradores da região começaram a ser ouvidas e escritas. O aluno tornou-se o autor da sua história e desse processo surgiram lindas poesias, memórias literárias e crônicas, levando-os ao protagonismo de sua aprendizagem e como forma identitária de pertencimento do “lugar onde vive”. Revista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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No ínterim dessas ações, os alunos passaram por oficinas para aprender conceitos básicos, estrutura e características das categorias: poesias, memórias, crônicas; tiveram contato com a leitura de textos voltados à temática e já premiados em outras edições das OLP, além de atividades relacionadas à análise dos textos; em seguida, os educandos foram orientados por meio de vídeos e questionários sobre como realizar uma entrevista; e também foi convidada uma pessoa influente da sociedade altamirense para palestrar sobre sua história pessoal e suas atividades em movimentos sociais da localidade. Para isso, convidamos a ativista Antônia Melo da Silva, coordenadora geral do Movimento Xingu Vivo Para Sempre para uma palestra no auditório da 10ª URE (Foto 1); três turmas participaram do evento que durou, aproximadamente, uma hora e, em seguida, houve interação com a palestrante com oportunidade para perguntas via entrevista (Foto 2); os alunos e professores se emocionar com histórias de dor, de luta e de vencedores. Dessa palestra, nasceram muitos textos, um deles foi selecionado, “A Guerreira do Xingu”, escrito pela aluna do 7º ano, Sophia Tabosa que representou a escola na OLP, na categoria Memórias Literárias, e fez parte do livro produzido pela turma “Marcas do Lugar onde Vivo”.

Fig. 01 e Fig. 02 — Palestra com a ativista Antônia Melo da Silva Fig. 01

Fig. 02

Fonte: Acervo fotográfico da Escola Dr. Ulysses Guimarães, 2019.

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Além disso, essas atividades foram incrementadas com os “Chás Literários”, um momento descontraído, também de palestra, com cerca de uma hora e meia de duração, com direito a pipoca, chá, biscoito, café e suco; as atividades eram desenvolvidas na sala de leitura da escola, em que escritores locais convidados contavam suas experiências com o ato de escrever e compartilhavam as angústias, os desafios, o prazer e as conquistas da vida de um artista das palavras. Ao todo, foram realizados dois “Chás Literários” em dias diferentes: um com a escritora Rosângela Maria Tôrres Emerique (Foto 3) e outro com o escritor Édio Wilson Soares da Silva (Foto 4), ambos membros da Academia Altamirense de Letras. Fig. 03 - Chá Literário com a escritora Rosângela Maria Tôrres Emerique

Fonte: Acervo fotográfico da Escola Dr. Ulysses Guimarães, 2019.

Fig. 04 - Chá Literário com o escritor Édio Wilson Soares da Silva

Fonte: Acervo fotográfico da Escola Dr. Ulysses Guimarães, 2019.

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No início, os palestrantes faziam sempre uma breve apresentação do seu currículo, falando da carreira e das obras, além de dividirem conosco algumas curiosidades de quando eram estudantes. Na sequência, realizávamos um bate-papo em que os alunos puderam entrevistar e dialogar com os escritores sobre o processo de criação literária e os particulares desse “brincar com as palavras”. Os escritores também deram dicas e sugestões de como criar personagens, fazer a descrição dos espaços, pensar em temas interessantes e sobre escrita criativa e, no final, realizávamos um coquetel com sorteio de alguns livros dos autores (Foto 5) e sessão de fotos (Foto 6). Fig. 05 - Chá Literário - brinde da obra da escritora Rosângela Maria Tôrres Emerique

Fonte: Acervo fotográfico da Escola Dr. Ulysses Guimarães, 2019.

Fig. 06 - Chá Literário – sessão de fotos com o escritor Édio Wilson Soares da Silva

Fonte: Acervo fotográfico da Escola Dr. Ulysses Guimarães, 2019.

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É importante destacar, que dentre as muitas perguntas feitas à escritora, algumas nos chamaram a atenção, como: “Você gosta de ler e de escrever desde criança?”; “Você sempre foi boa em Língua Portuguesa?”. Quanto às respostas, a escritora Rosângela Emerique, respondeu que desde criança sempre gostou de ler, pois seu pai semanalmente emprestava livros na biblioteca para ela ler, mas que não era tão boa em Língua Portuguesa, e sempre ressaltava em sua fala que “ninguém é escritor sem ser leitor antes”. No que se refere às perguntas feitas para o escritor Édio da Silva, que dá um enfoque maior na produção de crônicas, a pergunta que chamou nossa atenção foi: “De onde surgem suas ideias e inspiração?” cuja resposta do escritor, foi que desde criança gostava de ouvir as histórias contadas por seu pai e por outras pessoas idosas e, isso serviu para inspirá-lo. Nesse sentido, todas as programações realizadas, levaram em conta a assertiva de que cabe ao professor criar condições para que os educandos, enquanto sujeitos na produção de textos, possam se apropriar de conhecimentos discursivos e linguísticos de diferentes gêneros textuais, relacionados à realidade por meio de projetos pedagógicos que evidencie a leitura, a produção escrita e a circulação social (LOPES-ROSSI, 2002); assim, procuramos lançar mão de atividades que levasse ao desenvolvimento dessa competênci, valorizando as experiências socioculturais de cada aluno. Depois das palestras, dos chás literários, das pesquisas, das leituras e das vivências que tiveram, cada estudante foi desafiado a escolher alguém, conhecido ou não, da família ou reconhecido pela sociedade local, para conhecer a história de vida da pessoa e escrevê-la. Os alunos fizeram entrevistas com a pessoa escolhida, uns gravaram com celular, outros anotaram em cadernos as respostas dos entrevistados. Após a realização das entrevistas, eles começaram a versão preliminar do texto, de acordo com a categoria proposta pela OLP para cada série: Poema (5º ano EF), Memórias Literárias (6º e 7º anos EF) e Crônica (8º e 9º anos EF). Como não poderia deixar de ser, em se tratando de produção escritas, começaram as muitas “idas e vindas” no processo, pois o ato de escrever pressupõe revisões e reescritas até o resultado final, o texto. Os estudantes traziam seus textos redigidos à mão e entregavam para nós analisarmos; iniciamos com eles a fase de revisão em que fazíamos as observações no texto e os chamávamos para darmos as explicações e tiramos as dúvidas que tinham mesmo com os bilhetes orientadores as observações do texto, dávamos mais uns dois ou três dias para a reescrita e nova entrega (DOLZ; NOVERRAZ; SCHNEUWLY, 2004). Alguns textos precisaram de poucas reescrituras e outros mais; e ao ver seu texto em processo final e aprovado para a OLP, o aluno demonstrava uma imensa satisfação; isso nos incentivava também a criar atividades com as etapas de produção do texto, aprimorando as disRevista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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cussões e as pesquisas sobre o tema, favorecendo, assim, a concatenação das ideias, a estruturação textual, até a revisão colaborativa do texto (LOPES-ROSSI, 2002). Concluído a versão final dos textos, fomos até a sala de informática da escola para cada aluno digitar seu texto e deixar salvo em uma pasta no computador (Fotos 7 e 8). A partir dali, alguns textos foram encaminhados para as etapas Escolar, Municipal e Estadual da Olimpíada de Língua Portuguesa; em seguida, cada um de nós, professores, escolhemos entre 25 e 30 melhores textos e encaminhamos a uma equipe de professores voluntários fazerem uma nova seleção de 61 textos para compor a I Coletânea. Fig. 07 - Chá Literário - brinde da obra da escritora Rosângela Maria Tôrres Emerique

Fonte: Acervo fotográfico da Escola Dr. Ulysses Guimarães, 2019.

Fig. 08 - Aluna digitando sua produção textual

Fonte: Acervo fotográfico da Escola Dr. Ulysses Guimarães, 2019.

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O resultado dessa experiência de prática textual escrita foi publicado em um livro que intitulamos “Marcas do lugar onde vivo”; essa obra é composta de uma coletânea com 61 (sessenta e um) textos produzidos pelos educandos que revelam importantes lugares e momentos vivenciados por moradores de Altamira. Na sua organização, mobilizamos os estudantes, os familiares e toda a escola: professores, equipe diretiva e funcionários em geral e contatamos profissionais para a edição e diagramação do livro; inclusive, realizamos um concurso para a criação da arte da capa do livro que os motivou ainda mais a protagonizarem sua aprendizagem e a desenvolver suas habilidades inventivas. Todos esses momentos foram marcantes para a comunidade escolar e conseguimos envolver a família de uma feita que os múltiplos letramentos vão além das quatro paredes da sala de aula; e como atividade para trazer os familiares para o nosso contexto, fizemos um prélançamento do livro (Foto 9) e convidamos as famílias, apresentando o protótipo da obra que, evidentemente, encantou e deixou os pais mais felizes e cheios de orgulho de seus filhos.

Fig. 09 - Alunos escritores no pré-lançamento do livro.

Fonte: Acervo fotográfico da Escola Dr. Ulysses Guimarães, 2019.

Depois de juntar os textos, corrigir, revisar e publicar chegou o grande dia, a cerimônia de lançamento do livro (Foto 10) e autógrafos dos alunos (Foto 11): momento de interação, socialização, apresentações e confraternização.

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Fig. 10 - Professores de Língua Portuguesa na cerimônia de lançamento do livro.

Fonte: Acervo fotográfico da Escola Dr. Ulysses Guimarães, 2019.

Fig. 11 - Aluna Ana Carolina Cunha Almeida - auto-

Fig. 12 - Alunos/escritores com o livro publicado

grafando o livro.

Fonte: Acervo fotográfico da Escola Dr. Ulysses Guimarães, 2019.

Na programação, a ansiedade tomou conta de cada envolvido no processo, porém, isso não redundou em nervosismo e nem tensão, do contrário, nosso evento foi velado pela alegria e pela satisfação por termos conseguido chegar até aquele momento de pura emoção e encantamento; e cada um com protagonista dessa festa, exibia com orgulho o produto de todo um processo que seu deu nas aulas de Língua Portuguesa (Foto 12). Os olhares de cada aluno, família, professor, percorriam todo o espaço e cruzavam-se em meio a tanta magia; fomos, assim, envolvidos por uma atmosfera de satisfação e entusiasmo, pois tudo refletia com muita emoção; em nosso interior só havia prazer e gratidão: tudo era luz. Além disso, nenhum dos atores desse processo foi esquecido; aqueles que deram voz aos alunos na produção, foram homenageadas numa apresentação cultural (Foto 13). Revista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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Fig. 13 - Apresentação cultural para lançamento do livro. Homenagem às pessoas que tiveram suas histórias relatadas nos livros

Fonte: Acervo fotográfico da Escola Dr. Ulysses Guimarães, 2019.

Com isso, entendemos que é essencial que o professor possibilite práticas de ensino que culmine em eventos de divulgação ao público com a produção textual dos alunos, durante o desenvolvimento de um projeto (LOPES-ROSSI, 2002) e a realização desse lançamento de livro permitiu a todos saberem o valor da escola, dos professores que nela atuam e dos alunos que pertencem a ela, além de dar acesso imediato ao resultado de meses de engajamento na concretização desta, que foi, acima de tudo, uma experiência ímpar na vida de cada personagem que compõem a história do primeiro livro lançado (Fotos 14 e 15) por uma escola da rede municipal de ensino fundamental de Altamira. Fig. 14 - Livros impressos

Fonte: Acervo fotográfico da Escola Dr. Ulysses Guimarães, 2019.

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Fig. 15 - Livros impressos

Fonte: Acervo fotográfico da Escola Dr. Ulysses Guimarães, 2019.

O espaço, Teatro Municipal de Altamira, era apropriado para suportar um pouco mais de duzentas pessoas, ainda assim conseguimos colocar ali quase trezentas, de uma feita que ansiávamos por mostrar o que somos capazes quando bem orientados e cuidados. Nossa intensão mesmo era realizar o evento em praça pública para envolvermos o entorno da escola com uma visibilidade maior; no entanto, como dissemos, tudo foi luz e isso não tirou o brilho do evento tampouco o dos nossos olhos ao contemplarmos tudo que fomos capazes de fazer em conjunto.

CONSIDERAÇÕES FINAIS Este relato é o produto final de uma experiência de sucesso rumo a um ensino significativo de Língua Portuguesa e estímulo de futuros escritores. Neste trabalho, destacamos a interação dos educandos em todo o processo de construção dos textos, nas entrevistas, nos chás literários, nas rodas de conversas e nas oficinas de leitura e produção, marcados pelo progresso no ensino e aprendizagem. A capacidade de ouvir o outro, de conhecer mais da sua própria história e, portanto, valorizar seu povo, sua cultura e seus saberes foram destaques, enriqueceram o processo educativo e, com certeza, formaram cidadãos mais conscientes e esclarecidos. Os momentos de produção, reflexão e reescrita foram explorados no projeto e isso refletiu no uso mais consciente da língua. A escola precisa promover cada vez mais eventos e práticas de multiletramentos, pois como afirma Marcuschi (2001, p. 32) “em si mesma a escrita não produz mecanicamente resultados sociais. O contexto social exerce forte influência sobre o papel da escrita”. Os usos da escrita se realizam de fato nos contextos sociais, e nossa experiência aqui compartilhada demonstra que é possível fazer com que os estudantes se envolvam e sejam sujeitos ativos e protagonistas nesse processo.

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A projeção das aulas experimentais de Física na Mostra Brasileira de Foguetes Alan Luiz Figueiredo da Paz1 RESUMO Este relato de experiência, visa discorrer acerca da projeção das aulas experimentais de Física, por meio da construção de base de lançamento de foguetes e foguete de garrafa pet, aplicados na Mostra Brasileira de Foguetes (MOBFOG). O trabalho foi desenvolvido com a alunos do 1º ao 4º ano do ensino técnico integrado (ensino médio e técnico), regularmente matriculados na Escola de Ensino Técnico do Estado do Pará – EETEPA, situada no município de Salvaterra – PA, arquipélago do Marajó. A abordagem experimental no ensino de Física supervisionada pelo professor e gerenciada pelo aluno, possibilita não somente a aquisição de conhecimentos, mas realça reflexões acerca da prática docente, ensino por protagonismo do aluno e mudanças de perspectiva de vida e ensino. No primeiro ano de aplicação da MOBFOG em nossa escola, obtivemos 23 alunos inscritos, divididos em 8 equipes de dois ou três alunos. Diante dos resultados alcançados na seletiva interna, a equipe MARAJÓ HLI 16 foi convidada a participar do Jornada de Foguetes no Rio de Janeiro, na presente olimpíada, obteram a distância 186,3m, o que resultou a conquista do título de equipe campeã da Jornada de Foguetes. O mérito alcançado possibilitou o compartilhamento de conhecimentos astronômicos e astronáuticos pela equipe campeã e professor com alunos da própria escola e comunidade externa, aproximando aluno-professor e aluno-disciplina, além de estimular outros alunos a participarem desta olimpíada, bem como de oportunizar a projeção acadêmica e profissional dos envolvidos. Palavras-chave: Aula experimental. Metodologias ativas. MOBFOG.

1. INTRODUÇÃO O presente relato de experiência intitulado “A projeção das aulas experimentais de Física na Monstra Brasileira de Foguetes ”, visa relatar a inserção e vivência acerca do alcance das aulas experimentais de Física na formação dos alunos, além despertar o interesse pelas aulas de Física, Astronomia, Astronáutica e ciências afins, bem como prepará-los e projetá-los para as olímpiadas nacionais, em especial a Mostra Brasileira de Foguetes (MOBFOG).

1

Professor de Física da SEDUC- Pa. Especialista em Ensino de Física pela Faculdade Martins (FAMART). Pós-graduando em Neuropsicopedagogia com ênfase em educação inclusiva pelo Centro de Ensino Superior de Vitória (CESV).

2

MOBFOG (Mostra Brasileira de Foguetes): É uma olimpíada experimental realizada anualmente e internamente pelas escolas, organizada pela Sociedade Astronômica Brasileira (SAB) em parceria com a Agência Espacial Brasileira (AEB) entre alunos de todos os anos do ensino fundamental e médio em todo território nacional.

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O interesse pela inserção da prática metodológica experimental, partiu durante minha formação (autor deste relato), tanto na educação básica (ensino fundamental) quanto no ensino superior, quando constatei que a aprendizagem se tornava mais eficiente, significativa e gratificante por meio da consonância entre teoria e prática. Na ocasião, quando eu e os demais colegas de sala de aula éramos instigados a manusear experimentações, como por exemplo a modelagem de Quelônios (répteis da ordem Chelonia), com materiais alternativos, como ouriço de cocô e papelão, a aprendizagem oferecia significância, haja vista, que estávamos a “construir” um conhecimento que era novo em nosso aprendizado, isto tonava a aula envolvente e contagiante. Outras memórias enraizaram tal abordagem metodológica em meu cognitivo, como a identificação de briófitas e pteridófitos a campo aberto, além da incisão em pequenos peixes para identificação da bexiga natatória e sua funcionalidade. Práticas simples que alicerçavam o conhecimento e criavam pontos de ancoragem. Metodologias como estas, aproximava-me do professor e de sua prática, o que por sua vez, eternizava a figura destes profissionais em minha formação O presente autor é Licenciado em Ciências Naturais com habilitação em Física, além de Licenciado em Ciências Biológicas, com Pós-graduação no ensino de Física, com regência há três anos em sala de aula, com aluno do ensino médio profissionalizante na disciplina de Física. Em 2017 comecei a lecionar, inseri nas minhas aulas, algumas práticas experimentais, não somente para facilitar a internalização do conteúdo, mas para colocar o aluno na condição de “cientista”, com desenvolvimento de habilidades reflexivas, auto avaliativas e interativas. Neste sentido, a experimentação deve ser uma estratégia adotada, pois gera diálogos, problematizações, observações, refutações acerca da experimentação (GUIMARÃES, 2009 apud PONTICELLI et al, 2013), isto é, gera reflexões individuas num contexto coletivo. O protagonismo do aluno não enfraquece a importância da figura do professor, pelo contrário, realça e ressignifica que a aprendizagem é conjunta e não unilateral (DEBALD et a, 2020), mas sim democrática, numa sistemática coletiva. O professor atua como mediador e esclarecedor do processo de ensino e aprendizagem (BARBOSA e MOURA, 2014), logo, aceitar metodologias ativas, denota acolhimento de novos conhecimento e empatia com a informação que é atribuída ao aluno. Este trabalho apresenta em seu desenvolvimento as seguintes seções metodológicas: Divulgação da MOBFOG e Jornada de Foguetes; Orientação das equipes; Seletiva Interna; Preparação para a Jornada de Foguetes; Participação na Jornada de Foguetes; Resultados alcançados e Considerações Finais.

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DESENVOLVIMENTO O relato de experiência compartilhado, é resultado da inserção de metodologias ativas, com uma abordagem experimental, aplicada numa perspectiva estimuladora e participativa na 13º MOBFOG ocorrida no ano de 2019. O trabalho foi desenvolvido com a alunos do 1º ao 4º ano do ensino técnico integrado (ensino médio e técnico) regularmente matriculados na Escola de Ensino Técnico do Estado do Pará – EETEPA, situada no município de Salvaterra – PA, arquipélago do Marajó, no período de maio a novembro de 2019. A experimentação como metodologia ativa é compreendida como estratégia por descoberta, baseada na perspectiva de reconstrução do conhecimento cientifico, seja de forma individual ou coletiva, através da interação com o objeto ou meio (HIGA e OLIVEIRA, 2012). No entanto, sua aplicação perpassa por entraves que distanciam a prática experimental do protagonismo do aluno, como a carência de recursos didáticos, tempo extra para elaboração das atividades, a prática pode sair do controle, incerteza nas capacidades cognitivas e atitudinais do aluno. A presente pesquisa apresenta uma análise metodológica qualitativa de natureza interpretativa, haja vista que, quando o aluno é colocado na condição de cientista ou pesquisador, este percebe a atenção voltado ao seu processo formativo inserido pelo professor (ABOU SAAB e GODOY, 2007), isto possibilita um maior envolvimento do aluno no processo de aprendizagem. A pesquisa valeu-se dos diálogos dos alunos participantes desta iniciativa inédita em nossa escola, como forma de elucidar e corroborar as mudanças geradas em cada aluno. A proposta de trabalho desenvolvida, consiste na construção de Bases de Foguetes de cano de PVC (Policloreto de Polivinila) ou outros materiais e Foguetes proveniente de garrafa Pet (Politereftalato de etileno). Por meio desta iniciativa, foi possivel introduzir conceitos e aplicações físicas, como as leis de Newton, lançamento obliquo, aerodinâmica, reação química, força de arrasto, velocidade média e etc. A proposta dirigia instruir e capacitar os alunos a desenvolverem seus próprios projetos de Lançamento de foguete e, por conseguinte participar da 13ª MOBFOG. É valido destacar, que a prática de lançamento de foguetes já era uma constante realizada deste 2017, porém somente em 2019 dispus de maior visibilidade em razão MOBFOG. Logo, a execução da atividade deu-se de forma amistosa e sem dificuldades, uma vez que a maioria do alunado já possuía noções básicas de confecção e lançamento de foguetes de garrafa pet, pois aplicava esta prática em minhas aulas sobre Cinemática e Dinâmica.

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Da divulgação da MOBFOG e Jornada de Foguetes. Previamente à divulgação da olimpíada na escola, consultei o site da MOBFOG para assim, fundamentar-me sobre as regras regidas pelo edital da 13º edição da MOBFOG, além de conhecer a plataforma do site, bem como pesquisar acerca da construção de bases de lançamento e foguetes de garrafa PET. Posteriormente, dialoguei com a coordenação pedagógica e direção da escola para consentimento do cadastro da escola na olimpíada. Uma vez a escola cadastrada, ocorreu a divulgação nas salas de aulas por meio de conversações e com o auxílio do Data show, expus uma síntese das normas e exigências contidas certame seletivo, bem como exibir vídeos disponíveis no Youtube com depoimentos de participantes que se destacaram em edições anteriores, como forma de estimular e inspirar nossos alunos. No primeiro ano de aplicação da MOBFOG em nossa escola, obtivemos 23 alunos inscritos, divididos em 8 equipes de dois ou três alunos. Da orientação das equipes. Nesta etapa, foi criado um grupo de comunicação e informes no aplicativo WhatsApp como forma de orientar remotamente as equipes, haja vista que nem todas as equipes poderiam possuíam disponibilidade para encontros presenciais, no entanto, as orientações ocorriam em horário vagos dentro da escola. Desta forma, atendia as equipes de forma presencial e remotamente. Neste grupo, foi postado diversos links sobre tutorial de construção bases de foguetes e foguetes de garrafas pet. Os links e sites eram diversificados, elucidavam por exemplo, melhor garrafa pet a ser utilizada; material para se fazer uma aleta resistente, seu formato e tamanho; tipo de coifa (bico do foguete); como evitar que pressurização escape do foguete; centro de massa e pressão do foguete; proporção de vinagre e bicarbonato de sódio; funcionamento do gatilho de propulsão do foguete; angulação da base de foguete, entre outros. A maioria das equipes construíram suas bases e foguetes por meio da autonomia investigativa e cientifica, numa perspectiva do protagonismo estudantil. A aprendizagem por protagonismo desenvolvida pelo aluno está além do “desenvolvimento de suas capacidades de abstração, reflexão, interpretação, proposição e ação, [...]” (BRASIL, 2018, p. 465), perpassa pela projeção destas experiências no projeto de vida desses alunos, bem como soma-se a tomada de decisões, leitura da realidade, autoconhecimento e responsabilidade social.

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WhatsApp: aplicativo interativo de troca de mensagens e comunicação, através de testos, áudio, imagens e vídeo pela internet, disponível para smartphones Android, iOS, Windows Phone, Nokia e computadores Mac e Windows.

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Uma vez criada as bases de lançamentos e foguetes, cada equipe iniciou sua sequência de testes, para assim verificar a eficácia da prática (SOUSA, 2010), por meio dos testes os alunos descartam as variáveis inconsistentes e validaram os fatores que contribuem para a progressão da prática experimental em questão. Da Seletiva Interna. A seletiva ocorreu no dia 10 de maio de 2019, o local escolhido foi o Campo de Pouso de aviões de pequeno porte do município de Salvaterra, com a participação de 23 alunos (Fig. 1). Previamente ao lançamento, ocorreu o sorteio para delinear a ordem de lançamento das equipes, o que possibilitou a sistematização de lançamentos e organização. Cada equipe dispôs de dois lançamentos, o melhor alcance entre as duas tentativas constituiria a distância registrada da equipe no site da MOBFOG.

Fig. 1. Equipes participantes da seletiva interna. Fonte: PAZ, 2019.

Para facilitar a marcação do alcance dos foguetes lançados, foram distribuídas na extensão do Campo de Pouso placas com demarcação e com auxílio de uma trena, a marcação ocorria de forma mais prática. Cada equipe apresentou sua base construída com cano de PVC de 20mm ou 25mm, além de dois ou mais foguetes de garrafa PET, este quantitativo de foguetes deve-se ao fato de que após a colisão do foguete com o solo, sua estrutura é desconfigurada ou se torna instável para um próximo lançamento. Como forma de manter a segurança e seguir as exigências do edital, as equipes estavam com EPI (Equipamento de Proteção Individual) constituído de calça jeans, tênis, óculos de proteção e jalecos (MOBFOG, 2019). Infelizmente apenas o manômetro não foi utilizado nas bases de lançamento em razão de sua carência em nossa região e devido ao seu preço mediante a realidade dos alunos. No momento do lançamento dos foguetes, cada equipe convenientemente utilizou para a reação química medidas particulares de vinagre, constituído de 4% ácido acético e bicarbonato Revista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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de sódio de acordo com os inúmeros testes realizados antes da seletiva. A reação química entre os dois produtos, libera dióxido de carbono (CO2), o que pressuriza o sistema base-foguete (FONSECA et al, 2018). Após pressurização, as equipes verificam a pressão ideal no interior do foguete, para assim, acionar o dispositivo que prende o foguete (gatilho) na base de lançamento e assim, a propulsão é realizada. O desempenho das equipes foi satisfatório, poucas equipes obtiveram falhas, geralmente associada ao escape da pressão interna do foguete ou o mal manuseio do gatilho de acionamento do foguete ou ainda deficiência na aerodinâmica dos foguetes. A primeira participação da escola EETEPA – Salvaterra na 13º MOBFOG foi promissora, haja vista que equipes ultrapassaram a marca mínima solicitada do edital da seleção, isto é, ultrapassaram os 100m de alcance, condição necessária para receber o convite para outra fase chamada de Jornada de Foguetes, realizada em Barra do Piraí, no Rio de Janeiro. Na Tabela 01, constam as metragens alcançadas pelas 8 equipes, cada equipe é mensurada na tabela pelas iniciais dos nomes dos integrantes. Tabela 1 - Metragem alcançada no lançamento de Foguetes. Equipes J.T.R.

Distância (m) 101m

A.C.R.

61m

A.M.W. D.G.J.

70m 56m

D.J.R.

94m

H.LI. A.L.

113m 102m

R.W.S.

70m

Fonte: PAZ, 2019.

A tabela mensura que as equipes obtiveram mais 50% de êxito em seus lançamentos, bem como três equipes destacaram-se, com ultrapassagem de 100m de distância, contudo, apenas uma equipe por escola é convidada a participar do Jornada de Foguetes, isto é, a equipe H.L.I., que em seguida passou a ser chamada equipe MARAJÒ H.LI. 16. O termo Marajó faz referência ao local de origem, as letras H.L.I. condizem com as inicias dos nomes dos três alunos (Hugo, Lucas e Ingler) e nº 16 faz referência ao ano de ingresso da instituição EETEPA,

Da preparação para a Jornada de Foguetes. Diante do convite, elaborou-se um planejamento de metas, com reuniões para melhoria e aperfeiçoamento da base de foguetes e foguetes de garrafa PET. Indiquei a equipe vários links para fundamentação e filtragem de informações para testagem, bem como leitura de artigos nesta linha abordagem, para assim, consolidarem sua explanação no evento. Mediante análises e Revista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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discussões, a equipe decidiu idealizar outra base de lançamento de foguetes para apresentar e utilizar na Jornada de Foguetes, bem como construir um novo modelo de foguete mais eficiente. Diante dos diálogos acordados, selecionou-se na Tabela 2 os materiais necessários, bem como estão ilustrados na Fig. 2: Tabela 2 - Materiais para construção da base de lançamento de foguetes. Nome Quantidade Vara de Cano 50 mm 1 Cano de esgoto 40 mm (10 1 cm) Joelho (L) 8 Cano T 25 mm 12 Luva de redução 50/25mm 1 Luva de redução 50/20mm 1 Luva de 50 mm 2 Luva de 40 mm 1 Anilha 1 Abraçadeira de nylon 12 Abraçadeira p/ mangueira de 2 fogão Registro 2 Cola PVC 1 Torneira de Jardim 1 CAP 2 Manômetro 1 Serra 1

Fig. 2. Materiais utilizados na construção da base de foguetes.

Fonte: PAZ, 2019

Fonte: PAZ, 2019

Da construção da Base de Foguetes e Foguete de garrafa PET. De posse dos materiais, a equipe iniciou a construção da base de lançamento, aferindo medições e serrando os canos de PVC (Fig. 3 e Fig. 4). Para melhor percepção da estrutura da base de foguete, construiu-se uma mini maquete de isopor e mediante sua configuração, a estrutura foi moldada (Fig. 5). Para fins mensuráveis, destacou-se as medições de cada seção de cano PVC contida na estrutura da base de foguete (Fig. 6 (a) e Fig. 6 (b). Fig. 3. Equipe realizando as medições da base de foguetes.

Fig. 4. Alunos serrando cano de PVC de 25mm.

Fonte: PAZ, 2019

Fonte: PAZ, 2019

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Fig. 5. Montagem da Base

Fig. 6. (a) Lado anterior da base de foguete com as medições.

Fonte: PAZ, 2019

Fonte: PAZ, 2019

Fig. 6. (b) Lateral da base do foguete com as medições.

Fig. 7. Base de Lançamento de Foguetes finalizada.

Fonte: PAZ, 2019

Fonte: PAZ, 2019

Na Figura 7, observamos a Base de Lançamento de Foguete finalizada, as gregas (símbolo marajoara) estampadas na base, representam a linguagem iconográfica de nossa cultura. A cor vermelho e preto representam respectivamente a coloração o urucum e o carvão, utilizados por nossos ancestrais na expressão cultural. Ao finalizar a base de lançamento, iniciou-se a etapa de criação do foguete de garrafa PET. A equipe testou diferentes modelos de garrafas, com diferentes capacidades volumétricas, assim como formato e tipo de material para as aletas (asas do foguete), tipo de coifa (bico do foguete), proporção de vinagre e bicarbonato, nível de pressurização medido pelo manômetro e acionamento do gatilho de lançamento. A base de lançamento apresentou a angulação de 45º (NOWACKI e SANTOS, 2016), posição está que configura a angulação ideal para atingir maior alcance segundo as literaturas e testagens da equipe.

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Foram realizados dezenas de testes com o meu acompanhamento e ponderações, isto, possibilitou eliminar as variáveis desfavoráveis e chegar aos seguintes resultados. Conclui-se que a garrafas PET de 1litro, de uma marca específica, apresentou maior desempenho, pois seu formato cilíndrico (Fig. 8) era o mais plano possível encontrado em nossa região, o que possibilitou maior aerodinâmica, menor força de arrasto e menor massa. Adotou-se para a coifa do foguete, a parte superior de uma taça de acrílico com formato ogival ou parabólico (Fig. 9), pois observou-se que durante a colisão do foguete com o solo, este componente pouco danificou-se. Em relação as aletas, optou-se por utilizar e reaproveitar persianas de PVC (Fig. 10), devido resistência com o ar, além de serem planas e rígidas. Na Fig. 13 apresentamos o modelo de foguete finalizado com maiores resultados nos testes Pré Jornada de Foguetes. Fig. 8. Garrafa PET de 1L.

Fonte: PAZ, 2019

Fig. 11. Garrafas cortadas e fixadas com fita isolante

Fonte: PAZ, 2019

Fig. 9. Taça de Acrílico

Fonte: PAZ, 2019

Fig. 12. Fixação das Aletas

Fonte: PAZ, 2019

Fig. 10. Aleta de Persiana

Fonte: PAZ, 2019

Fig. 13. Foguete utilizado na Jornada de Foguetes

Fonte: PAZ, 2019

Os testes realizados com este foguete (Fig. 13) e com a base de lançamento de foguete (Fig. 7), foram otimistas, os alcances variaram entre 150m a 219m. A melhor proporção de vinagre e bicarbonato de sódio utilizados para atingir a máxima distância foi de 500ml para 60g, com pressurização de 130psi a 150psi. É notório perceber a customização realizada pela equipe na escolha por materiais alternativos, de baixo custo e fácil acesso, haja vista que o edital exigia a criatividade na elaboração dos projetos. Apenas o dispositivo manômetro foi de difícil acesso, pois não comercializavam em nossa região, necessário comprar por site de vendas on-line.

Jornada de Foguetes. A Jornada de Foguetes é um evento nacional que ocorre na cidade Barra do Piraí, no estado do Rio de Janeiro, com as melhores equipes provenientes da seleção interna (MOBFOG) de cada escola. Neste evento, com duração de uma semana, as equipes se reúnem para com-

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partilhar de suas experiências e aprendizados com estudantes de todo o Brasil, tanto de escolas públicas quanto privadas, bem como professores de diferentes áreas do conhecimento. A equipe MARAJÓ H.L.I. 16 esteve entre as 50 equipes convidadas, com a incumbência de expor toda trajetória de seu projeto (Fig. 14), bem como demonstrar a execução de sua base de lançamento de foguete e foguetes de garrafa PET. Fig. 14. Apresentação da equipe MARAJÓ H.L.I. 16.

Fonte: PAZ, 2019

Fig. 15. Equipe MARAJÓ H.L.I 16 preparada para o lançamento de foguete.

Fonte: PAZ, 2019

Durante o evento, alunos e professores assistem palestras na área da astronomia e astronáutica, bem como participam de minicursos de construção de foguetes pressurizados e de combustíveis sólidos. Após as formações, cada equipe sistematicamente demonstrou o lançamento de seus foguetes por meio de suas bases de lançamentos, com direito a dois lançamentos. Nossa equipe obteve em seu primeiro lançamento obliquo a distância de 186m e no segundo lançamento a metragem de 158m, a maior distância prevalece como a metragem da equipe. Ao final do evento todas as equipes são premiadas com certificados de participação e dependendo de sua distância alcançada, a equipe recebe medalhas e troféus de ouro, prata e bronze. A solene premiação iniciava, as metragens das equipes eram divulgadas em um telão, em seguida recebiam suas premiações diante de todas as equipes, com calorosa parabenização. Dezenas de equipes já haviam recebido sua premiação e continuávamos ansiosos, nervosos e apreensivos..., até que, nossa equipe MARAJÓ H.L.I. 16 acabara de ser anunciada, nossa metragem possibilitou se enquadrar na categoria dos campões, conquistávamos assim, o título de equipe Campeã da Jornada de Foguetes (Fig. 16). Uma associação de emoções e memórias aflorava, toda dedicação, coragem, gastos econômicos, e aflição resultava em uma conquista inédita em nossa querida Ilha de Marajó e em nosso Estado do Pará.

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Fig. 16. . Equipe MARAJÒ HLI 16 recebendo troféu e medalhas de Campeão da Jornada de Foguetes do presidente da MOBFOG.

O resultado deste trabalho corroborou a credibilidade investida em nossos alunos, ao assumirem o protagonismo juvenil de sua formação e aprendizado. Fomos recebidos em nossa cidade com carinho e comemoração, direcionados pela a escola, professores, pais de alunos e alunos. Destaco aqui o poder transformado que as aulas experimentais podem ocasionar no âmbito escolar da vida de nossos promissores alunos. Uma simples aula prática, projetava agora personagens de uma realidade tão diferente das demais regiões do Brasil.

Resultados alcançados A inserção desta proposta metodológica nas aulas de Física associadas a olimpíada Mostra Brasileira de Foguetes desencadeou grande repercussão em nossa escola, cidade e redes sociais. Observou-se que esta conquista olímpica despertou em nossos alunos o interesse não apenas na MOBFOG, mas do mesmo modo nas aulas de Física, assim como na valorização do professor. De fato, essa conquista é inefável, proveniente de uma equipe possuía propósitos em comum, somaram coragem diante de múltiplos desafios, bem como a projeção de nossos alunos a lugares, experiências, percepções e aprendizados que outrora não haviam conquistados. Nossos campeões foram convidados a somar saberes em eventos como feiras de ciências (Fig. 17) de outras escolas, demonstrar o funcionamento de sua base de foguetes e foguetes, bem como compartilhar de suas experiências com outros jovens, numa perspectiva de que a dedicação, doação e ações conjuntas podem resultar em conquistas imensuráveis. Seguidamente ministraram palestra e oficina de confecção de foguetes de garrafa PET para alunos da própria escola (Fig. 18). A equipe assumia postura de cientistas, preocupados com a forma de repassar o conhecimento de forma categórica e estimulante.

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Fig. 17 Equipe MARAJÓ H.L.I. 16 demonstrando o funcionamento de seu projeto.

Fig. 18 Oficina de confecção de foguetes

Fonte: PAZ, 2019

Fonte: PAZ, 2019

Como educador, saber ouvir o aluno diante de uma intervenção pedagógica é uma necessidade, tal habilidade é o mecanismo de verificação da intervenção metodológica aplicada no processo de ensino e aprendizagem, isto é, o retorno do aluno possibilita identificar se a prática instigou o aluno a reflexão, numa perspectiva de mudança pessoal e profissional. Nesses pressupostos, exponho a seguir as falas consentidas e identificadas dos três alunos acerca das mudanças, percepções, experiências e conhecimentos alcançados por meio desta estimada olimpíada de lançamento de foguetes. Foi incrível a experiência de participar da MOBFOG, tivemos a oportunidade de conhecer mais sobre a está olimpíada, além de conhecimentos de astronomia e astronáutica. Tudo foi novo para mim, foi muito emocionante conhece pessoas novas, um pouco da cultura dos participantes e levar um pouco da cultura do Marajó, que por sinal foi bem aceita. Confesso que estava um pouco tenso e com medo, pois não sabíamos qual visão teriam de nós, mas ao conhecerem toda nossa trajetória e dificuldades de locomoção, passamos a ser admirados. Mostramos nosso melhor, sempre com alegria, pois estávamos a li para se divertir, sem nenhum descontentamento. Tudo foi inesquecível, desde a viagem até o dia que nossa equipe se apresentou para os estudantes de vários estados. Confesso que estava nervoso na hora da apresentação, mas, foi mais uma forma de adquirir experiência. Nosso comprometimento trouxe reconhecimento para mim, para a equipe e para nossa escola. Minha equipe foi ótima, jamais esquecerei esse momento maravilhoso em minha formação. (LUCAS LIMA, 2020).

O relato acima expressa a apreensão e medo diante de um desafio atípico a sua realidade, ressalta também, a preocupação de qual visão os outros participantes teriam de sua equipe, pois vinham de um local no extremo do pais, pouco conhecido, com cultura e costumes diferentes. De fato, a equipe surpreendeu as demais equipes ao relatar as dificuldades de locomoção, num percurso de duração de aproximadamente 3154 km, com direito a locomoção de via balsa, navio, avião e carro, para assim, vivenciar esse momento diferente do nosso cotidiano. Soma-se a esta expressividade de emoções a seguinte fala: Participar da Jornada de foguetes, foi uma experiência sensacional, a expansão de conhecimento foi inevitável. Sabe aquela realidade que nos cerca, que temos como padrão? .... Então, quando nosso avião aterrissou no Rio de Janeiro, ela foi quebrada, estávamos em uma terra diferente, cultura diferente, alunos de todos os estados do Brasil, reunidos com o mesmo objetivo, compartilhar conhecimento. A cada palestra e oficina eu me surpreendia, percebemos que existia um oceano de ideias para confeccionar foguetes que eram desconhecidas por nós, mas agora podemos repassar isso

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para os futuros alunos que iram nos representar lá. Foi um momento que nunca vou esquecer, hoje carrego comigo tudo o que vivemos em Barra do Piraí - RJ. Desejo que mais equipes da região marajoara participem da MOBFOG e Jornada de Foguetes e nos representem nessa jornada e traga conhecimentos para outros alunos. (INGLER DANTAS, 2020).

A expressividade do aluno, remente a uma participação inacreditável, pois cada um carrega consigo múltiplas dificuldades e medos até participar deste evento interestadual, quando suas reflexões foram ampliadas. Os eventos científicos realmente apresentam este perfil, possibilitar o contato com realidades e culturas diferentes, expandir vivencias e alterar a postura reflexiva e atitudinal do participante. O aluno ainda enfatiza o dever de socialização da experiência adquirida, como forma de estimular e confirmar que é provável a participação em um evento de grande expressividade cientifica, bem como reforça o convite a outras equipes acerca da eminente participação de nossos alunos marajoaras neste evento. Agrega-se a esta expressividade de aprendizados, o pensar a seguir: Certas experiências nunca se apagaram de minha memória, assim como a primeira vez que tive o contato com Sistemas Operacionais do curso de Técnico em Informática. Da mesma forma como a maravilhosa e esquecível trajeto na Jornada de Foguetes em 2019, no Rio de Janeiro. Não foi fácil chegar lá, primeiramente tínhamos que nos classificar em primeiro lugar em nossa escola (EETEPASalvaterra). Uma vez selecionados, foram meses tentando conseguir dinheiro e apoio para viagem, além de muitas tentativas de inovar e turbinar nossa Base de Foguete e o próprio Foguete. Fizemos vários cálculos e testes até chegar numa distância aproximada de 220 metros. Mas tudo isso foi ainda mais espantoso quando chegou o dia da viagem, ainda não estava acreditando que iríamos participar de uma Olimpíada Nacional (Meu Deus), "cara que loucura!".... Quando chegamos no Rio de Janeiro, foi um jogo de cintura, andar numa cidade desconhecida, nosso guia foi o Google Mapas e Uber. Hoje as memórias estão internalizadas, agradeço a EETEPA - Salvaterra e Professor Alan por proporcionar essa grande experiência que nunca sairá da minha memória. (HUGO LIMA, 2020).

O relato acima reafirma a inefável experiência firmada em nosso consciente, bem como reforça a dedicação, pesquisa e testagens assumidas mediante a necessidade de apresentar um exímio trabalho. Por fim, elucida o agradecimento aos vários personagens que embasaram força nesta jornada. Ressalto ainda o envolvimento determinante de nossa Direção escolar, Secretária do Estado, Pais, professores e representantes locais. A conquista alcançada é resultado de um coletivo que diante das barreiras, não se oprimiu em contribuir para projeção de nossos alunos. CONSIDERAÇÕES FINAIS A participação em olimpíadas nacionais possibilita refletir acerca da mudança pessoal, educacional e profissional gerada nos personagens envolvidos, desde a troca de experiências, percepção de realidades, formação continuada, aproximação família- escola e professor aluno, alem da autoafirmação de seu trabalho e ideais. De fato, as olimpíadas reforçam a aplicabilidade do protagonismo estudantil, além de novas descobertas, novos lugares, novos personagens, ideias, técnicas e conhecimentos, além de somar valor a análise curricular dos envolvidos. As olímpiadas possibilitam a motivação, agregação de desafios, necessidade de autonomia mediante aquisição de conhecimentos e saberes, bem como projetar nossos alunos a possíveis conquistas acadêmicas. Revista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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REFERÊNCIAS ABOU SAAB, L. A.; GODOY, M. T. Experimentação nas aulas de biologia e a apropriação do saber. UEPG, 2007. Disponível em: <http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/pde/ arquivos/446-4.pdf>. Acesso em: 28 set. 2020. BRASIL. Base Nacional Comum Curricular: Ensino Médio. Brasília: MEC/Secretaria de Educação Básica, 2018. DEBALD, B; et al. Metodologias Ativas no Ensino Superior: O Protagonismo do Aluno. Porto Alegre: Penso, 2020. FONSECA, M. V. S; et al. Uma abordagem didática para a pressão interna de foguetes de garrafa PET propulsionados pela reação química entre vinagre e bicarbonato de sódio. Revista Brasileira de Ensino de Física, vol. 40, nº 3, 2018. Disponível em: https://www.scielo.br/ pdf/rbef/v40n3/ 1806-9126-RBEF-40-3-e3504.pdf. Acesso em: 11 out. 2020. HIGA, I.; OLIVEIRA, O. B. A experimentação nas pesquisas sobre o ensino de Física: fundamentos epistemológicos e pedagógicos. Educar em Revista, Curitiba, v. 28, n. 44, p. 75-92, 2012. Disponível em <https://www.scielo.br/pdf/er/n44 /n44a06.pdf>. Acesso em 25 set. 2020. MOBFOG. Regulamento da 13ª Mostra Brasileira de Foguetes - 13ª MOBFOG – 2019. Disponível em <http://www.oba.org.br/sisglob/sisglob_arquivos/REGULAMENTO%20DA % 20MOBFOG%20DE%202019.pdf>. Acesso em 11 out. 2020. NOWACKI, L.; SANTOS, C. F. R. Catapultas e foguetes – uma proposta de experimentação para as aulas de física. 2016. Disponível em: < http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/ cadernospde/pdebusca/producoes_pde/2016/2016_artigo_fis_unicentro_luiznowacki.pdf>. Acesso em 11 out 2020. PONTICELLI, F. A.; ZUCOLOTTO, A. M.; BELUCO, A. A EXPERIMENTAÇÃO NA CONSTRUÇÃO DE CONCEITOS EM FÍSICO-QUÍMICA. In: Atas do IX Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em Ciências – IX ENPEC Águas de Lindóia, SP.2013. Disponível em: <http:// www.nutes.ufrj.br/abrapec/ixenpec/atas/resumos /R1435-1.pdf> Acesso em 31 set. 2020. SOUSA, A.J.de. A importância da Física experimental no processo de ensino e aprendizagem. 2010. 29f. Trabalho de Conclusão e Curso (Graduação). UFU. Uberlândia. 2010. Disponível em: <http://www.infis.ufu.br/infissys/pdf/AMILSON%20JO%C3%83O %20DE%20SOUSA.pdf. >. Acesso em 11 out. 2020.

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Caminhos da Docência Eliana Nobre do Carmo1 RESUMO O trabalho apresenta um Relato de Experiência que evidencia os caminhos percorridos antes, durante e após a formação docente, inicial e continuada, sua importância e algumas contribuições para a prática docente. Ancorados em uma abordagem teórica, os registros descritos demonstram a importância da formação docente, bem como apontam algumas dificuldades enfrentadas no exercício do ato de ensinar. No relato da experiência em sala de aula, o trabalho apresenta a experiência com o ensino do gênero textual memórias literárias, uma categoria textual proposta pela Olimpíada de Língua Portuguesa. A metodologia de trabalho desenvolvida foi a sequência didática, seguindo e extrapolando as orientações do caderno do professor, material disponibilizado pelo Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária/CENPEC, organizador da Olimpíada. O resultado da experiência demonstrou que tanto a formação docente quanto o compromisso social e profissional do professor são imprescindíveis para a formação dos alunos. Palavras-chave: Formação docente. Prática docente. Gênero textual.

INTRODUÇÃO Para a construção deste Relato de Experiência, trarei, à luz de um suporte teórico, um breve relato da escolha da profissão, da trajetória acadêmica e da atuação docente. São apresentados também alguns desafios no ensino de Língua Portuguesa na educação básica do município de Tomé-Açu, nordeste paraense. O percurso apresentado neste trabalho vai desde a minha experiência de formação inicial no curso do magistério, posteriormente, a continuação nos cursos de Licenciatura em Pedagogia (FUNDEF/UFPA), seguido pelo curso de Letras/Língua Portuguesa (PARFOR/UFPA), até apresentar alguns recortes de uma experiência de trabalho durante a participação na Olimpíada de Língua Portuguesa/CENPEC. É explicitado ainda, neste relato, a importância de se obter o conhecimento científico por meio de uma graduação voltada para a área da educação. E como, através das políticas educacionais voltadas para o plano de ações articuladas de formação de professores da educação básica-PARFOR, pude realizar um grande sonho que de obter a formação adequada para a área em que atuo, professora de Língua Portuguesa. O trabalho está organizado de forma a apresentar os registros, sem, contudo, isolar-se numa fala neutra, pois eles são ancorados em autores que discutem a formação docente como LIBÂNEO (2003), BERTOLO (2000), CANDAU (1999), NÓVOA (1997), entre outros.

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Professora de Língua Portuguesa/SEDUC/Pa. Especialista em Educação/SEDUC/Pa. Graduada em Pedagogia /UFPA, Graduada Em Letras/Língua Portuguesa /UFPA, com Pós-Graduação Lato-Sensu em Formação Docente/UFPA. Email: eliana.nobre@escola.seduc.pa.gov.br

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Sabendo da complexidade que é descrever os caminhos da atuação docente ao longo dos anos, foram priorizados alguns fenômenos em estudo. O recorte destacado para este trabalho está centrado na experiência vivenciada com alunos do 8º ano do Ensino Fundamental, da Escola Luterana. Trata-se de um trabalho com o gênero textual memórias literárias, uma das categorias da Olimpíada de Língua Portuguesa, desenvolvido através de uma sequência didática. Por fim, pode-se perceber que a formação acadêmica é necessária e tem significativa contribuição. Autores como Marcuschi (2002, 2008, 2011); Schneuwly & Dolz (2004); Antunes (2003), entre outros, orientam a experiência com o ensino de língua, apresentada neste relato. Todavia, não se deve prescindir da atenção à realidade manifestada na sala de aula. Os desafios surgem e necessitam ser superados. É esse constante movimento que garante a dinâmica do conhecimento, da trajetória docente e da existência humana. DIÁLOGO ENTRE TEORIA E PRÁTICA NAS POLÍTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES É comum observarmos nos trabalhos acadêmicos, tais como memorial e relatos de experiência, os impactos da formação recebida. Todo estudante viveu e/ou conviveu com os mestres durante sua trajetória escolar. No meu caso, não foi diferente. Se para alguns, as marcas são quase imperceptíveis; para mim, elas foram e são bem acentuadas. Ainda na infância, quando cursava as séries iniciais do ensino fundamental, nasceu o desejo de ser professora. Eu admirava o desvelo com que minha professora de 3ª série ministrava suas aulas. Por vezes muito séria e rigorosa, em outras, demonstrava gentileza e espírito materno. Frequentemente nos chamava de filhos e agíamos quase como tal. Porém, anos mais tarde, a paixão pela profissão sofreu duro impacto. Um professor encarregou-se de frustrar minhas aspirações profissionais. Ele utilizou como atividade de início de ano letivo, um teste de sondagem, no qual uma das perguntas era sobre a profissão desejada. Eu respondi com muita firmeza a minha opção – professora. No entanto, a argumentação do professor foi que nunca conheceu um professor rico e que o mais rico da escola possuía uma “Monareta” (uma marca de bicicleta). Acrescentou que, se eu quisesse alimentar meus futuros filhos e viver bem, deveria escolher outra profissão. Com minha submissão, sem nenhuma argumentação, e o pouco conhecimento, sufoquei o desejo e passei a pensar em ser advogada. Apesar de esse fato ter acontecido na década de 80, na minha cidade, Tomé-Açu, ainda predominava a concepção da “professora-tia”. Não havia uma valorização profissional quanto ao trabalho da professora, o que se percebia era uma importância à chamada vocação e às características pessoais, que incluíam ter paciência e jeito para lidar com crianças. Chegando, inclusive, a professora primária a ser intitulada “tia”. Esse fenômeno foi objeto de estudo, pois gerou, segundo Novaes (1992) uma grande preocupação entre os educadores. Vários artigos foram publicados apontando essa nítida desvalorização profissional da professora primária. Muitas professoras não pareciam satisfeitas com a profissão e, comumente, falavam que os salários não compensavam tanto trabalho. Hoje, é possível compreender que o exercício do ofício docente está perpassado por tantas variáveis e que todas as categorias merecem uma análise profunda para dar conta de propiciar o desenvolvimento profissional e educacional, e consequentemente econômico, cultural e social. Revista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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Buscar uma formação capaz de subsidiar uma prática transformadora tem sido o grito de todos os que se debruçam nos estudos do fenômeno educativo. Nesse sentido, muitos cursos, palestras e conferências têm sido postos à disposição dos/as professores/as e a grande maioria tem se engajado nestes, todavia pouco se tem visto em relação à transformação da prática docente, uma vez que a formação não se constrói por acumulação (de cursos, de conhecimentos ou de técnicas), mas sim através de um trabalho de reflexividade crítica sobre as práticas e de (re) construção permanente de uma identidade pessoal (NÓVOA, 1997, p. 25).

Há algum tempo vivenciamos uma realidade em que as questões econômicas sobrepõem -se às socioeducacionais. Nesse contexto, são traçadas novas diretrizes para a educação nacional visando uma maior economia de recursos financeiros. Novas reformulações são delineadas, e ao docente é repassada a responsabilidade de reverter os índices alarmantes do fracasso escolar. Assim, são pensadas as competências que deve ter o/a profissional da educação, onde e como ele/ela deve adquirir essas competências. A documentação de regulamenta as políticas educacionais é vasta e está sempre sendo ajustada aos mais variados interesses dos atores sociais. Para discutir formação continuada de professores, é necessário primeiramente discutir o conceito de formação docente. Placco e Silva (2003) no sentido de conceituar a formação docente e ainda apresentar as dimensões que deve conter essa formação lançam uma pergunta fundamental: O que é formar? As autoras defendem a perspectiva do formar como um processo que proporciona referências e parâmetros, superando a sedução de modelar uma forma única, e que oferece “um continente e uma matriz a partir das quais algo possa vir a ser” (FIGUEIREDO Apud PLACCO E SILVA, 2003, p.25). Na visão das autoras, formar não se reduz ao oferecimento de novas metodologias e técnicas ou ao aparato tecnológico, sobretudo, é um processo contínuo, uma vez que se realiza no próprio homem e este é um ser inconcluso e inacabado. Contudo, imbricado a este processo está um determinante fundamental que é a concepção de educação de cada educador. Dependendo de qual seja ela, o produto poderá ser um sujeito crítico, preocupado com a transformação, ou um sujeito passivo e/ou predominantemente reprodutivista. Nóvoa (1997), faz uma crítica aos atuais cursos de formação de professores, pois a formação não se constrói por acumulação (de cursos, de conhecimentos ou de técnicas), mas sim através de um trabalho de reflexividade crítica sobre as práticas e de (re)construção permanente de uma identidade pessoal. Assim se verifica outros determinantes que contribuem para a repetição das velhas práticas, mesmo após a participação em cursos que apresentam propostas inovadoras e atuais. Entre alguns determinantes estão: o compromisso, que é predominantemente subjetivo; as condições estruturais, a forma como o sujeito é visto na sociedade; o modo como são traçados os objetivos e fins da educação e, ainda, as condições organizacionais da escola, que devem manter uma articulação constante entre todos os atores educacionais e nem sempre o faz. Bertolo (2000) observa que a vinculação entre educação e produtividade está na centralidade das discussões dos organismos internacionais. As preocupações em desenvolver políticas de formação continuada nascem no bojo das discussões desses organismos e visam o ajustaRevista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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mento de políticas educacionais (vemos isto na LDB, PNE, PCNs) dos países em desenvolvimento à política do custo-benefício. Acreditamos que a proposta de formação continuada não pode ser gerada de cima para baixo, mas a formação de um educador crítico-reflexivo pressupõe, necessariamente, seu envolvimento na elaboração, produção e execução da nova proposta de formação continuada, onde novos desafios são acrescentados à docência. Manter-se atualizado sobre as novas metodologias de ensino e desenvolver práticas pedagógicas eficientes são alguns dos desafios impostos para os/as docentes no atual contexto educacional. Quando na verdade vão sendo esquecidas as questões de cunho social mais amplas, como os debates acerca de temas como organização social, qualidade de vida na perspectiva coletiva e de valorização do outro, entre outros. Nota-se, contudo, que o discurso governamental sobre a formação profissional do professor situa-se num contexto ambivalente ou contraditório: de um lado, a retórica da importância dessa formação; de outro, a realidade da miséria social e acadêmica que lhe concedeu (Imbernon, 2004). O que se percebe é a defesa puramente econômica do custo-benefício, deixando de fora os investimentos em outros aspectos como: infraestrutura, salário dos professores e quantidade de alunos por turma. É visível o distanciamento entre os anseios de uma categoria e a fala da lei, porém a distância é maior ainda entre a fala da lei e sua materialização (FALEIROS, 2007). Os resultados gerados não são formulados pacificamente, mas são engendrados num espaço de correlação de forças entre os atores do processo social. E, conforme já exposto, tem tido uma predominância da classe dominante que julga suas ações a partir de uma maior economia de recursos quando se trata de investimentos nas políticas de cunho social. É neste conflito que está situada a formação continuada de professores. Formação necessária ao desenvolvimento do processo educacional e à profissionalização docente. O que se tem observado, portanto, é a desvalorização da educação enquanto direito público, pois ela passa a ser apenas um produto a mais a ser consumido de acordo com a escolha de cada um e as possibilidades do consumidor para pagar por um produto de boa qualidade. Torna-se necessário, portanto, pensar a formação docente (inicial e continuada) como momentos de um processo de construção de uma prática qualificada e de afirmação da identidade e profissionalização do professor. A categoria docente, atualmente, passa por momentos difíceis de desprestígio social, salários aviltantes e péssimas condições de trabalho. Mesmo estando permeados de mecanismos que forçam e reforçam as políticas de cunho, sobretudo, econômico, os reclames dos movimentos sociais continuam e devem ser fortalecidos por todos àqueles que não alienados sabem do compromisso maior da educação. O grande salto, segundo Candau (1999) é a superação de uma visão monolítica da situação, que apenas reforça a lógica do “pensamento único” e do discurso homogeneizador. Historicamente no Brasil, a educação não é prioridade e os investimentos destinados à mesma, ainda não ocupam parcela significativa no orçamento da União, dificultando melhores Revista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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condições de trabalho e a produção do conhecimento, o que compromete a construção do cidadão participativo, autêntico, autônomo, crítico, consciente do seu papel na sociedade. Reconhecer, pois, a importância da educação e valorizar os profissionais da educação são caminhos para o desenvolvimento do nosso país. Com a crescente incorporação de ciência e tecnologia aos processos produtivos e sociais, a serviço dos processos de acumulação do capital internacionalizado, configura uma aparente contradição: quanto mais se simplificam as tarefas, mais conhecimento se exige do trabalhador, e, em decorrência, ampliação de sua escolaridade, a par de processos permanentes de educação continuada. Torna-se necessário considerar, na formação de professores, estudos e práticas que lhe permitam apropriar-se das diferentes formas de leitura e interpretação da realidade que se constituem em objeto de vários campos do conhecimento. Essa visão mais ampla de formação precisa ser defendida pelos profissionais da educação de todas as áreas.

A TRAJETÓRIA ACADÊMICA E AS CONTRIBUIÇÕES PARA O ENSINO DE LÍNGUA Quanto ao percurso de formação docente, deixo aqui registrado o meu olhar e minha opção pelo magistério, sem, contudo, querer definir e/ou encontrar “o culpado” pela ineficiência da formação dos docentes. Se por um lado tive o sonho abandonado na infância, por outro tive a oportunidade de resgatá-lo, quando cursei o antigo magistério. Foi então, que comecei a dar aulas de reforço em minha residência e já procurava instrumentos que me subsidiassem a prática. Ao concluir o magistério, pretendia entrar na universidade, mas não tinha como me deslocar para capital. Cinco anos após a conclusão do magistério, comecei a atuar como professora em escola pública – era o ano de 1994. A minha primeira experiência com a docência foi com a disciplina de Língua Portuguesa, na 4ª etapa da EJA. Isto se tornou possível porque havia carência de professores qualificados em nossa cidade. Sentia cada vez mais a necessidade de continuar estudando, pois percebia que a sociedade em transformação não permitia mais as práticas escolares mecanizadas. Eu queria fazer uma graduação em Letras, mas não tinha condições financeiras para me deslocar para outros municípios. Somente 12 anos mais tarde, foi ofertado em nossa cidade um curso de nível superior pela UFPA, era o curo de Pedagogia. Entre os quase trezentos professores do município, somente cinquenta puderam preencher as vagas ofertadas e fazer o curso (Contrato Prefeitura/UFPA, com recursos do FUNDEF). No início éramos apenas calouros, eufóricos por ter conseguido uma vaga na conceituada Universidade Federal do Pará, uma vez que ainda são poucos os cidadãos contemplados com a possibilidade de estudar em universidades públicas e de qualidade. Após o ingresso, vieram as disciplinas e com elas o conhecimento foi tomando novas formas, novos significados. A construção do conhecimento parecia dolorosa e, quando achávamos que estava construído era preciso desconstruirmos tudo. Percebemos que o conhecimento é polissêmico e nunca o desvelaremos na sua totalidade. Mas a busca, esta é incessante.

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Para nossa turma essa busca chegava a ser quase desesperadora, pois havíamos chegado às cadeiras da universidade carregando as angústias do ofício docente. Já éramos todos professores e queríamos respostas para todos os porquês. Era preciso um certo distanciamento do cotidiano para poder refletir a gênese de alguns conflitos que permeiam o contexto socioeconômico, histórico e cultural e que por sua vez manifestam-se no universo escolar. Educar para transformar foi o nosso maior desafio. Não importaria o campo de trabalho, quer na empresa, quer na instituição escolar, enfim nas diversas atuações do pedagogo, víamos a possibilidade de construir um mundo melhor. Apesar de receber as grandes e imprescindíveis contribuições do Curso de Pedagogia, eu queria cursar Letras, pois desde o meu ingresso na docência (1994) até os dias atuais, trabalho com a disciplina de Língua Portuguesa. Ao concluir a referida graduação, pude confirmar o que já sabia, era necessário continuar o processo de formação. Em 2009 enfrentei outro processo seletivo a fim de aprofundar, construir, desconstruir e reconstruir saberes que me auxiliassem no exercício da profissão e no pensar sobre ela. Assim, consegui fazer a especialização em formação docente, também pela UFPA, Campus Universitário de Castanhal. Já em 2011, como resultado da Política Nacional de Formação dos Profissionais do Magistério da Educação Básica (Res. 6755 Janeiro/2009), através da Plataforma Freire, pude ingressar no tão sonhado Curso de Letras – Língua Portuguesa. O ingresso no curso de letras não poderia ser o único responsável pela mudança de minha prática docente. Foi preciso o contato com as disciplinas e o empenho em avançar no conhecimento para que, aos poucos, eu percebesse que a visão de ensino de língua que eu priorizava não respondia satisfatoriamente às necessidades dos educandos da atualidade. Como tirar a gramática, tão grandiosa e eloquente, de seu lugar privilegiado e colocar outros elementos, analisados à luz da sociolinguística, por exemplo, como também merecedores de créditos? Foi a minha primeira grande resistência. Nos caminhos da formação, autores como MARCUSCHI, 2008, ANTUNES, 2010, entre outros, que desde os anos 80 trazem a abordagem sociointeracionista nos seus estudos, ajudam na superação das dificuldades enfrentadas para superar o modelo tradicional do ensino de língua. Nessa concepção, a língua não é vista apenas como estrutura ou processo cognitivo, tampouco como mero instrumento de comunicação. A língua é efetivada em um meio social e histórico, em que os usuários fazem seu uso em práticas contextualizadas com propósitos definidos. Esse processo é dialógico, dinâmico, pois para que o significado seja construído necessita do outro. O enfoque no confronto entre gramática tradicional, normativa, que dita regras e, gramática entendida como a explicitação dos conhecimentos que o falante tem de sua língua, foi se ampliando dentro do curso. No entanto, as discussões não trouxeram uma substituição de uma por outra proposta. O que se percebe é um debate rico e que cabe ao docente, necessariamente, apreender essas reflexões e encontrar a forma adequada para se trabalhar essa criatividade linguística na atividade de produção/compreensão do texto: as duas dimensões do fato linguístico – a frase e o texto – são bem diferenciadas na prática.

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Desfazia-se, assim, a concepção mecanicista de atividade de linguagem como sendo uma simples rotina escolar e, aos poucos, ia compreendendo a atividade de linguagem como uma atividade humana, histórica e social. Percebia o deslocamento da unidade do processo ensino/ aprendizagem no âmbito da frase para o discurso ou texto. O texto falado ou escrito é constituído na interação, vale dizer que essa concepção interativa dá ênfase “ao processo de construção e não ao produto”. Isso significa que esse processo de construção envolve “reflexão sobre a experiência e experiência de reflexão”, o que leva a uma compreensão dialética da interpretação e da instauração do sentido, conforme ANTUNES (2003). São muitas as contribuições do curso para o melhor desempenho de minha prática docente. Entre essas contribuições, posso citar o meu olhar para a escolha do livro didático, e a eleição das atividades. Para a escolha das atividades, o que tento levar em consideração é a forma como o texto é explorado nas questões. Se nelas, o aluno é questionado sobre quais argumentos usará para justificar um ponto de vista, o que parece ser uma estratégia interessante, uma vez que uma não aceitação de um argumento pode gerar o contra-argumento. Para isso, afirmase que um bom texto argumentativo é aquele que equilibra os dois tipos de argumento: a verdade e a opinião. Também escolho questões que propiciem a discussão oral. Uma vez que a discussão oral, segundo a perspectiva teórica bakhtiniana, revela que ao discutir oralmente o tema usa-se um gênero primário; ao elaborar o que foi discutido e transpor isso para um texto escrito, usa-se um gênero secundário. Para que os alunos tenham um bom conhecimento dos gêneros textuais através do livro didático e para que esse material esteja de acordo com o que indicam as Orientações Curriculares Nacionais, é imprescindível que os estudos avancem no sentido de ampliar o debate acerca da necessidade de sair de uma abordagem centrada nas estruturas do texto, ou até mesmo no produtor desse texto, na qual a linguagem é uma expressão monológica, individual, racional estática, para considerar as influências de fatores de ordens diversas, sejam sociais, culturais, históricas, políticas, econômicas ou ideológicas. Afinal, não se pode conceber alunos passivos, como se pensou há décadas. O desenvolvimento educacional dos sujeitos e consequentemente do país depende também dessas questões. Cabe ao professor posicionar-se como orientador do conhecimento. Que aja como um profissional que aproveita o que o livro tem a oferecer. Ainda que o material didático deixe a desejar em termos de conceitos, propostas e exercícios, o professor tem o dever de ir além das propostas do livro didático, analisando o que funciona para cada turma, utilizando exemplos e textos atuais, entre outros, pois o educador não deve se tornar dependente do livro didático, pois nenhum manual didático ou qualquer outra literatura produzida dará conta de esgotar todos os questionamentos e possibilidades acerca da apropriação, funcionamento e desenvolvimento da linguagem. São questões que sempre fomentarão os estudos. Todavia aí está um poderoso combustível que move o conhecimento: sua inesgotabilidade. Como resultado das contribuições da trajetória acadêmica exposta neste trabalho, farei um relato sucinto da experiência vivenciada com alunos do 8º ano do Ensino Fundamental, da Escola Luterana.

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BREVE RELATO DO ENSINO DE LÍNGUA A PARTIR DAS ATIVIDADES DA OLIMPÍADA DE LINGUA PORTUGUESA Trata-se de um trabalho com o gênero textual memórias literárias, uma das categorias da Olimpíada de Língua Portuguesa/CENPEC, desenvolvido através da sequência didática, como orienta Schneuwly & Dolz (2004). Participar da 3ª Olimpíada de Língua Portuguesa foi, simultaneamente, um desafio e um privilégio. Desafio, porque a árdua tarefa de estimular a leitura e desenvolver competência de escrita nos alunos exige muito estudo, pesquisa e conhecimento. E privilégio, por estarmos envolvidos em um projeto rico e bem planejado, que oportunizou não só o desenvolvimento das produções escritas dos alunos, como também a formação dos professores de língua portuguesa de nossa escola. Formação que, para mim, foi ampliada, pois pude participar do curso on-line Sequência Didática: Aprendendo por Meio de Resenhas. Além dos materiais da Olimpíada, o curso me ajudou a pensar em metodologias mais eficientes para o trabalho com gêneros em sala de aula. Assim, vi-me diante de uma oportunidade singular. Consciente do desafio, iniciei apresentando a Olimpíada. Falei da sequência didática, expliquei os objetivos e finalidade. Conforme o projeto, caberia às turmas de 8º ano o trabalho com o Gênero Memórias. Todavia, para trabalhar esse gênero, precisei primeiramente vencer uma inquietação: como falar de memórias para uma classe de adolescentes que despreza o antigo, o passado e a velhice? Era preciso conquistá-los. Propus-me a isso. No início tudo parecia estranho. Afinal, o que era ser um memorialista? O próprio gênero memórias era novo no ambiente escolar. Produzir memórias de outras pessoas, mas relatando como se fossem suas, parecia muito complexo para as turmas. Apesar das novas exigências de escrita do mundo atual, nossas escolas ainda lutam para romper com a tradição livresca. E, sem tirar o mérito, vemos que predominam as produções de textos conhecidas como “redações escolares”. Então, como estimular os alunos a ir em busca da matéria-prima a fim de transformá-la em obra-prima? Esta questão parecia crucial. Depois das primeiras conversas sobre o gênero, partimos para as leituras. Lemos alternadamente todos os textos do material. Tentei motivá-los a cada leitura. Sabia, no entanto, que eram necessárias muitas outras leituras, releituras e discussão. Percebia que meus alunos não se sentiam capazes de produzir textos semelhantes aos até então apresentados. Imediatamente comecei a esclarecê-los que aquelas produções eram resultantes de escritas e reescritas. Dito isto, colocamos a “mão na massa”. Os alunos pesquisaram muitos outros textos do mesmo gênero e, aos poucos, foram elencando diferentes formas de escrita. As distinções entre textos narrados em primeira pessoa e em terceira, foram sendo percebidas, e assim, íamos sendo envolvidos com o gênero. A seguir, comecei a falar do privilégio de ouvir os moradores mais antigos da cidade contarem suas experiências. Dizia que, ao entrevistar um morador da comunidade, os alunos deveriam estar atentos a todo tipo de manifestação, física ou não. Caberia aos alunos-autores das memórias tornar aquele depoimento um texto vivo, real e contagiante. À medida que discutíamos, outros elementos iam sendo compreendidos. Seguimos com os debates. Falávamos das crescentes e velozes transformações econômicas, culturais e sociais Revista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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e, diante disso, salientamos a importância do registro das memórias dos sujeitos que as carregam. Alguns alunos já compreendiam que muitas dessas memórias explicavam o porquê dos nomes de ruas, praças, monumentos e manifestações culturais de nossa cidade e que, muitas delas, não eram encontradas nos documentos oficiais. Já envolvidos com o gênero, propus a primeira produção escrita. Como muitos não possuíam quaisquer meios eletrônicos para gravar as entrevistas, orientei a listarem os fatos relatados pelos entrevistados para depois produzir a escrita. No momento das leituras e discussões acerca da primeira escrita, senti que não íamos avançar. Diversos textos apresentavam parágrafos desconexos e com fuga do principal fato narrado (culpei-me pela orientação em forma de listagem). Vacilaram na coesão, apresentaram desvios ortográficos e gramaticais, entre outros. Não me vi capaz de orientá-los em todos os problemas até então detectados. Três turmas estavam envolvidas e eu não queria que ninguém ficasse de fora, então, como dar conta da empreitada? Eu não poderia apenas dizer como deveria ser a reescrita, nem tinha como proceder dessa forma. Primeiro, porque a rotina da escola envolve muitas outras atividades. Segundo, porque não era apenas apontando as falhas no texto que os alunos seriam capazes de produzir aprendizagem para escrever com competência. Defendo a ideia de que a boa escrita é resultante de um exercício articulado e bem elaborado do pensamento. Assim, era necessário fazê-los perceber as lacunas do texto e instruí-los a buscar os recursos necessários para a reescrita. Enquanto me indagava se era possível continuar, conversava com os professores envolvidos no projeto, com professores de outras disciplinas e com a diretora. Também lia os materiais da Olimpíada, e, sobretudo, lia o caderno do professor. Nessa interação, recobrei as energias. Passada a angústia, comecei a perceber, através das oficinas propostas, que a tessitura era lenta. De posse do material, procurei elencar os problemas e tratá-los um de cada vez. Os alunos que apresentaram maior compreensão e habilidade nas produções foram convidados a auxiliarem os demais e, assim, pudemos prosseguir. Com a permissão dos alunos, utilizei seus próprios textos para orientá-los. Os exemplos utilizados ajudaram a demonstrar que não necessitamos de muitas palavras para expressar sentimentos e emoções, mas de algumas habilidades no uso da escrita. Seguindo o passo-a-passo de cada oficina avançamos para as próximas produções. Na penúltima leitura dos textos, havia muita empolgação. Num espírito descontraído, muitos já se sentiam memorialistas. Algumas memórias quase completavam outras. Curiosidades acerca de nossa história puderam ser compartilhadas nas turmas. Isso era gratificante. Vieram as produções finais e, nesse momento, tive uma grata surpresa. Ao analisar os textos para encaminhá-los à comissão escolar, vi que alguns alunos com bastantes dificuldades nas primeiras produções, agora, apresentavam maior domínio do gênero e surpreendiam pela forma com que captaram olhares significativos do lugar onde vivemos. Era tão rico o material que, enquanto os textos selecionados estavam com a comissão escolar, os debates continuavam em sala de aula. Eu estava de posse de memórias de pessoas do anonimato, que construíram suas histórias e, concomitantemente, a deste lugar.

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Ao encerrar as atividades do projeto e fazer a avaliação, eu percebia que, embora os textos não fossem selecionados na olimpíada, tampouco tivéssemos ali grandes escritores, tínhamos sim, grandes atletas. Entre várias barreiras quebradas, uma me enchia de orgulho, já falavam dos idosos com mais respeito. Tinham deles se aproximado e de alguma forma o admiravam. Não eram mais os mesmos. As discussões em sala de aula pareciam incorporadas às suas memórias. E eu, na olimpíada da educação, já tinha a minha medalha.

CONSIDERAÇÕES FINAIS Posso afirmar que sou apaixonada pela profissão docente, sem contudo, deixar de perceber todas as contradições que permeiam o campo educacional. Essas reflexões fazem parte de minha história profissional. E, como integrante de uma categoria, acredito que, nós professores/as, devemos nos apropriar das regulamentações impostas à classe não apenas para constatá-la enquanto camisa de força, mas também perceber nelas mesmas as falhas e/ou possibilidades de transformação e assim contribuir para novas reformulações dentro da esfera sócio educacional. Ao apresentar alguns passos da minha trajetória docente apresento vários ganhos no caminho da formação e da prática docente. O trabalho com o ensino exige muitas habilidades. E o ensino de língua não foge à regra. Formar leitores/escritores proficientes não é tarefa fácil. É preciso compreender os movimentos linguísticos que o aluno opera no processo de produção textual e refacção da escrita. O que dizer, como dizer, que palavras usar; que tratamento dar ao texto ou ao novo texto, são alguns dos desafios que devem ser enfrentados. O trabalho com o gênero memória proporcionou desenvolvimento no processo do ensino de Língua Portuguesa. Esse avanço pôde ser percebido tanto no uso da modalidade escrita da língua, pois todos produziram memórias literárias; quanto no uso da modalidade oral, nos momentos em que os debates foram realizados em sala de aula. Portanto, no percurso percorrido, podemos afirmar que o conhecimento teóricoacadêmico, aliado ao compromisso social do professor, contribui para o desenvolvimento de boas práticas de ensino. Sem pretender dar conta de esgotar as questões que envolvem os estudos acerca da formação docente e/ou do ensino de língua, este trabalho apresenta um relato de experiência ancorado na visão sociointeracionista e convida os docentes/leitores a pensar em um projeto de sociedade menos injusta e excludente.

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Horta Vertical no Ensino Médio Noturno: Uma experiência que deu certo Emanoel Oliveira Santos1 RESUMO A experiência de cultivar hortas verticais em garrafas pet, foi desenvolvida com alunos do terceiro ano do ensino médio noturno da EEEFM Abelardo Leão Condurú em Mosqueiro, Belém-PA. Através de sorteio feitos nas turmas, cada uma recebeu sementes de um tipo de vegetal para cultivo, como coentro, alface, couve, cebolinha e feijão de metro. As turmas realizaram pesquisa bibliográfica para identificar as características de cada planta, principalmente em relação ao cultivo e irrigação. De forma cooperativa cada turma construiu sua estrutura física para alocar sua horta vertical, usando para isso, principalmente madeira de sobra de construção civil. O cultivo das sementes deu-se em garrafas pet de dois litros coletadas pelos próprios alunos às margens das praias que cercam a ilha, após descarte inadequado deste tipo de plástico nas praias pelos visitantes. Para o manejo das hortas cada turma criou um cronograma próprio de revezamento de seus membros para rega, adubação dos vegetais e manutenção das hortas. Destacou-se o empenho e a dedicação de todos os alunos das turmas envolvidas e de outras que aderiram a proposta voluntariamente. Outro aspecto importante foi a integração destas turmas com o ambiente escolar, o que promoveu consequentemente aumento de frequência, assiduidade e permanência na escola, contribuindo assim para diminuir a possibilidade de evasão escolar destes alunos. Os resultados obtidos foram apresentados na forma de seminários entre as turmas, e os produtos expostos na feira de ciências da escola no mês de dezembro de 2013. Palavras-chave: Ensino Médio. Mosqueiro. Horta Vertical.

INTRODUÇÃO A evasão escolar é um problema que vem sendo discutido por diversos pesquisadores e educadores há muito tempo. Porém, essa é uma questão que está longe de ser resolvida e os índices de abandono da escola têm aumentado a cada ano, bem como as altas taxas de reprovação que juntos caracterizam o fracasso escolar. (BATISTA; SOUZA; OLIVEIRA, 2009). Ela é decorrente de vários fatores, como econômicos, políticos e sociais que geram na sociedade amplas desigualdades e exclusões, sendo que os mais afetados são alunos do ensino médio e de modo especial os do ensino médio noturno, pois é no noturno que os alunos sentem ainda mais dificuldades em conciliar trabalho e escola, além dos já conhecidos fatores econômicos e sociais que contribuem para a sua desistência (BRAGA, 2009).

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Professor de Biologia da EEEFM Abelardo Leão Condurú, Graduado pela UFPA em Ciências Biológica, Mestre em Biologia Celular pela UFPA e Doutor em Genética pela UFPR. E-mail: emanoelprof@gmail.com

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Em relação a problemática da evasão escolar autores como Fornari (2010) a consideram como um problema social, pois suas consequências levam o aluno à exclusão social. Ferreira (2001) e Queiroz (2002) afirmam que a evasão escolar não é responsabilidade apenas da escola, mas também da família, das políticas de governo, já que o Estado não cumpre o seu papel como deveria e do próprio aluno e a evasão escolar está diretamente relacionada ao ingresso do aluno na criminalidade, o convívio familiar conflituoso, à má qualidade do ensino, à necessidade do educando trabalhar para ajudar a família e até mesmo para o seu próprio sustento, além de outros fatores. Campos & Oliveira (2003), a consideram um problema que transpõe a sala de aula e vai além dos muros da escola e tem diversas razões de ordem social e principalmente econômica, tais como: necessidade do aluno trabalhar para ajudar nas despesas de sua casa, violência no ambiente escolar, faltas de professor, falta de material didático e formação inadequada oferecida pela escola aos alunos. Sousa et al. (2011) cita que os fatores externos são o trabalho, as desigualdades sociais, a relação familiar e as drogas e os internos mais comuns estão assentados na própria escola, na linguagem e no professor. Cortez (2007) considera que é necessário fazer um perfil do aluno do noturno, para que se consiga entender suas causas de evasão. Já que o aluno do ensino médio público noturno como característica, em sua maioria trabalha, está na faixa etária inadequada para a série em que estuda, normalmente vive com os pais (um ou ambos), ou já tem família, e tem na escola a visão de uma chance para melhorar o salário (profissão). O autor considera ainda que a maioria só pretende terminar o ensino médio, não pretendendo ingressar no ensino superior. Cortez (2007) considera ainda que um ponto importante do perfil do aluno do noturno é o real uso do que ele está aprendendo na escola, pois se um aluno que não tem a perspectiva de cursar o ensino superior, ouve de um professor que é importante àquela matéria para o vestibular ou Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), ele certamente irá se desinteressar pelo assunto, e mesmo que venha a decidir em fazer uma universidade, ele poderá fazer um dos tantos cursos prévestibulares ou pré-ENEM que existem. Há também outros agravantes que contribuem neste processo de evasão do ensino médio noturno, que é o fato do período noturno oferecer uma gama de atividades sociais alternativas em relação à escola, como festas, bares, etc., onde na maioria das vezes o aluno sai de casa com a intenção de realmente ir à escola, mas ao tomar conhecimento de outro programa acaba desistindo. O papel do professor neste processo é discutido por Cortez (2007) que considera importante verificar até que ponto o professor pode influenciar ou evitar a evasão escolar do noturno, sem esquecer que o professor do noturno, também é um trabalhador durante o dia, atuando como professor ou outra função, e que também podem ter estímulos negativos que façam com que o ensino seja mal aplicado por meio de metodologias inadequadas, e também muitas vezes deixando de prestar atenção em alunos desinteressados em razão de outros mais interessados; É aquela história de “dar aula só para os alunos da frente”. O autor destaca que é muito importante que o professor diagnostique um possível aluno candidato a evasão. O que nós professores poderíamos fazer? Uma proposta seria ressignificar nossos conteúdos fazendo que os alunos do noturno realmente achem um uso efetivo do que ensinamos e não só com a desculpa de que vão prestar um vestibular. Não podemos culpar professores ou alunos pela evasão. Mas um bom começo é a mudança de postura no ensino noturno do aluno, dando a devida prioridade que o ensino merece e do professor, mudando sua postura como educador que deseja muito mais do que somente alunos que passem de ano (CORTEZ, 2007). Revista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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A partir destas reflexões sobre o papel do professor e do aluno, especialmente do turno noturno, frente ao processo de ensino e aprendizagem, desenvolvemos a proposta de construção de hortas verticais feitas de garrafas pet por alunos do ensino médio noturno da Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Abelardo Leão Condurú, que fica localizada na ilha de Mosqueiro, distrito administrativo de Belém-Pará.

2. DESENVOLVIMENTO A ILHA DE MOSQUEIRO Mosqueiro é uma ilha fluvial localizada na costa oriental do rio Pará, possui uma área de aproximadamente 220.000 km² e está localizada a 70 km de distância do centro da capital, é um dos Distrito Administrativo do município de Belém. Possui 17 km de praias de água doce com movimento de maré. Sua população estimada é de cerca de 50 mil habitantes (WIKIPEDIA, 2020). A denominação Mosqueiro teria advindo da nomenclatura “moquear”, processo que consistia na defumação do pescado para mantê-lo conservado por bastante tempo (MEIRA FILHO, 1978), em função deste processo a localidade ficou conhecida como “Ilha do Moqueio”, que com o tempo passou a ser denominada de Ilha do Mosqueiro. O acesso a ilha pode ser feito via rodoviária pela BR 316 e PA 391 através da ponte Sebastião R. de Oliveira com 1.457,35 m de extensão sobre do Furo das Marinhas, mas o transporte fluvial também já foi utilizado para o deslocamento à ilha. Está limitada ao norte pelo rio Pará e pela Baia do Guajará, a oeste pela Baia de Santo Antonio, ao sul pela Baia do Sol e a leste pelo Furo das Marinhas que separa a ilha do continente (BELÉM, 2003). É um dos principais balneários do município, contém 19 bairros e inúmeras praias, que em períodos de alta temporada (férias escolares e feriados prolongados), o cotidiano local é totalmente alterado passando a receber, segundo Leal (2004), cerca de 300 mil pessoas. A EEEFM Abelardo L. Condurú é uma das três escolas públicas estaduais que ofertam o ensino médio regular na ilha, surgiu a partir da Escola Reunida de Carananduba, que em 28 de agosto de 1976, no governo de Aluízio Chaves, passou a se chamar Escola Estadual de 1º grau Professor Abelardo Leão Condurú, em homenagem ao professor e advogado Abelardo Leão Condurú, que lecionou a disciplina de Matemática por mais de dez anos na Escola Normal do Pará, mais tarde, a escola passou a se chamar Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Professor Abelardo Leão Condurú. Segundo o Censo Escolar de 2019, a escola dispunha de vinte e uma turmas de ensino médio, distribuídas nos turnos manhã, tarde e noite, com cerca de 780 alunos matriculados. A HORTA VERTICAL A Horta Vertical surgiu da necessidade de se implantar uma atividade extraclasse aos alunos do terceiro ano do Ensino Médio, em especial os do turno noturno da EEEFM Abelardo Leão Condurú, visto que as potencialidades da estrutura física da escola são ótimas para o desenvolvimento de projetos desta natureza, e que iniciativas como esta, que fornecem aos alunos novas práticas no contexto didático pedagógico fornecem elementos fundamentais ao processo de ensino e aprendizagem. Essas práticas podem servir de aliadas no combate à evasão escolar e o desestimulo frente aos conceitos, quase sempre teóricos, dos objetos de aprendizagem. O início das atividades deu-se no início do segundo semestre letivo do ano 2013, com as Revista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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três turmas de terceiro ano do ensino médio noturno, identificadas da seguinte forma: 303, 304 e 305, com uma pesquisa prévia a respeito das hortaliças que melhor se enquadrariam no clima quente e úmido de nossa região, escolhendo-se as seguintes: - Cebolinha (Allium fistulosum) - Alface (Lactuca sativa) - Coentro (Coriandrum sativum) - Feijão de Metro (Vigna unguiculata) - Couve (Brassica oleracea) Para não haver discussões a respeito de favorecimento em relação a hortaliça, realizamos um sorteio entre as turmas, resultando na seguinte distribuição: Turma 303 – Cebolinha; Turma 304 – Feijão de metro; Turma 305 – Alface. Atendendo a uma solicitação da Coordenação Pedagógica inseriu-se as turmas do terceiro ano da manhã e da tarde, 301 e 302, ficando responsáveis pelo cultivo da couve e coentro, respectivamente. Após a definição da hortaliça a ser cultivada, cada turma realizou uma pesquisa bibliográfica sobre as principais características do vegetal, culminando num esboço escrito que orientaria a prática do cultivo. O segundo momento iniciou com a construção da estrutura da horta vertical, no pátio da escola, em área previamente definida (Figura 01). Deve-se ressaltar que na construção dessa estrutura, grande parte da madeira utilizada foi de sobras da construção civil. A construção das estruturas das hortas exigiu uma parceria entre todos os membros da turma, pela necessidade comum de equipamentos e insumos, como madeira, pregos, garrafas pet, além da preparação do solo e obtenção de adubo.

Figura 01 – Construção da estrutura das Hortas Verticais no pátio da EEEFM Prof. Abelardo Leão Condurú. Fotos: Emanoel Santos.

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As garrafas pet utilizadas como vasos para a germinação das sementes e cultivo das hortaliças, em sua maioria, foram coletadas nas praias após o descarte inadequado feito pelos banhistas (Figura 02).

Figura 02 – Preparação das Garrafas Pet como vasos para germinação e cultivo das hortaliças. Fotos: Emanoel Santos.

A partir da instalação das hortas verticais, e posterior germinação das sementes, conforme mostra a Figura 03, cada turma precisou elaborar um cronograma de eventos que envolvia limpeza da horta, rega diária, adubação e acompanhamento do desenvolvimento dos vegetais. Este momento foi muito interessante, ao considerarmos o trabalho coletivo levando em consideração a disponibilidade de individual. Assim duplas foram formadas, e todos os dias tínhamos equipes de cada turma fazendo o acompanhamento de sua respectiva horta, apesar da obrigação das duplas, o interesse pela manutenção foi tanto, que vários membros participavam dos cuidados. Ressalta-se que nenhum incidente relevante surgiu nesta etapa que prejudicasse o andamento do projeto, visto que há na escola várias outras turmas de diversas faixas etárias que poderiam por algum descuido prejudicar o desenvolvimento de algum vegetal.

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Figura 03 – Fase inicial de germinação das hortaliças: (A) Couve- Turma 301. (B) Cebolinha- Turma 304. (C) Alface- Turma 303. (D) Coentro- Turma 302. (E) Feijão de Metro- Turma 305. Fotos: Emanoel Santos

Com o crescimento e desenvolvimento das hortaliças, evidenciou-se o orgulho de cada turma, pois o empenho e a dedicação de cada aluno começaram a mostrar resultados, chamando a atenção de toda a comunidade escolar. Os conhecimentos que alguns alunos traziam de hortas tradicionais aliavam-se a novos que surgiam do cultivo cuidadoso de hortaliças num espaço limitado que é uma garrafa pet, numa horta vertical, e o interesse dos alunos no tema Botânica aflorou-se.

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Figura 04 – Desenvolvimento das hortaliças: (A) Coentro- Turma 302. (B) Cebolinha- Turma 304. (C) Alface - Turma 303. (D) Feijão de Metro- Turma 305. (E) Couve- Turma 301. Fotos: Emanoel Santos

Considerações em relação ao relacionamento entre alunos são necessárias, pois foi um fator positivo observado, pois alunos que tinham pouca interação com os colegas de turma, passaram a interagir muito intensamente, e de maneira geral com todos, lideranças surgiram dentro das turmas frente aos desafios. E mais, alunos que apresentavam baixa frequência e que seriam potenciais alunos desistentes, reapareceram interessados em participar das aulas e em especial da atividade proposta, inclusive mostrando predisposição de implementar o cultivo de hortas verticais em sua residência, com o objetivo de terem disponíveis hortaliças frescas, podendo até mesmo se tornar uma fonte de renda extra. Na figura 04 percebemos o pleno desenvolvimento das hortaliças, graças aos cuidados e manutenção das hortas pelos alunos.

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O principal momento de avaliação das turmas, além de relatórios semanais, se deu por meio de uma exposição das hortaliças produzidas, com explicações sobre a construção das estruturas e o manejo dos vegetais, em seminários ocorridos dentro das turmas, e também durante a exposição na Feira de Ciências da Escola no final do período letivo de 2013, o que foi considerado pelo professor responsável como principal atributo de composição da nota que compôs a 4ª avaliação escolar, já que o projeto ocorreu no segundo semestre.

CONSIDERAÇÕES FINAIS No currículo, os conteúdos relacionados ao tema ambiente estão presentes em várias áreas do conhecimento, e a proposta da construção de uma horta vertical, propicia aos alunos, segundo Oliveira et al. (2014), o contato com a natureza, estimulando assim um trabalho interdisciplinar. E neste sentido, a escola, enquanto formadora de cidadãos, deve encontrar meios efetivos para que cada estudante compreenda os fenômenos naturais, as ações humanas e suas consequências para consigo, sensibilizando os indivíduos para que ajam de modo responsável e com consciência, conservando o ambiente saudável no presente e para o futuro (EFFTING, 2007). Assim a Horta Vertical surge no ambiente escolar como uma proposta de ensino interdisciplinar, capaz de tirar os estudantes da sala de aula e mostrar novas possibilidades de aprendizagem, mais significativa e interessante, de modo que se sintam motivados a realizá-la (BRITO, 2014). Além de poder incentivar os estudantes a levar a proposta para suas casas e comunidade, transformando-se num agente disseminador (FERREIRA, 2012). Também adquirem novos valores e formas de pensar, repensam suas atitudes e propagam os conhecimentos adquiridos (CRIBB, 2010) Como as hortaliças escolhidas apresentam um ciclo de vida curto, todo o desenvolvimento delas pode ser acompanhado pelos estudantes durante o período escolar, do plantio a colheita, o que possibilita, que estes conheçam as características da produção com vistas para o autoconsumo (LINHARES; ROJAS; RODRIGUES, 2017). Neste trabalho os alunos puderam reconhecer as contribuições da horta vertical para o consumo diário. Perceberam que podem reutilizar materiais que seriam descartados, desenvolveram aspectos cooperativistas, durante a divisão de tarefas e responsabilidades assumidas, o que estreitou as relações interpessoais entre os membros das turmas envolvidas, assim como elevou o interesse destes pelo ambiente escolar e pelas atividades propostas não só em Biologia como em outras disciplinas. Conseguimos trazer o aluno de volta ao centro das atenções e principalmente resgatá-lo de uma possível evasão, o que só aumentaria os índices de desistência escolar do ensino médio noturno.

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“SEMANA DA CONSCIÊNCIA NEGRA” E LITERATURA DE CORDEL: RELATO DE EXPERIÊNCIAS NO ENSINO DE HISTÓRIA NA ESCOLA ESTADUAL RUTH PASSARINHO (BELÉM-PA, 2019)1 Geraldo Magella de Menezes Neto2 RESUMO A lei 10639/03 estabeleceu a obrigatoriedade do ensino da história e cultura afro-brasileira e a “Semana da Consciência Negra” nas escolas. Desde então, as instituições de ensino têm promovido eventos e atividades como forma de valorização da população negra e também para combater o racismo. Nesse sentido, o presente artigo apresenta um relato de experiência sobre atividades desenvolvidas na Escola Estadual Ruth Passarinho, em Belém do Pará, para discussão da temática negra com uma turma do 7º ano, no ano de 2019. Para tal, utilizamos como recurso didático a literatura de cordel a partir do livro Heroínas negras brasileiras em 15 cordéis, da cordelista e escritora cearense Jarid Arraes. Utilizando versos biográficos sobre Aqualtune, Dandara dos Palmares, Tereza de Benguela e Eva Maria de Bonsucesso, analisamos a trajetória das mulheres negras na história do Brasil, destacando suas lutas em suas épocas, como a resistência à escravidão e contra a violência contra a mulher. Dentre as atividades realizadas, estão a produção de cartazes e a realização de uma peça sobre a vida de Eva Maria de Bonsucesso. Entendemos que a literatura de cordel produzida por Jarid Arraes, que pode auxiliar nas discussões de questões como o racismo e gênero, contribuindo para valorizar a trajetória de mulheres negras na história do Brasil. Palavras-chave: Ensino de História. História e cultura afro-brasileira. Literatura de cordel.

1. INTRODUÇÃO3 Eu só acho um absurdo Porque nunca ouvi falar Na escola ou na tevê Nunca vi ninguém contar Sobre a garra de Aqualtune E o que pode conquistar Uma história como a dela Deveria ser contada Em todo livro escolar Deveria ser lembrada No teatro e no cinema Que ela fosse retratada. (ARRAES, 2017, pp. 31-32).

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Uma versão preliminar deste trabalho foi apresentada no X Encontro Estadual de História da Anpuh-Bahia - “Combates pela História”, realizado de forma online entre os dias 20 e 23 de outubro de 2020. 2 Doutor em História Social da Amazônia na Universidade Federal do Pará (UFPA). Professor de História da Secretaria Municipal de Educação de Belém-PA (SEMEC). Professor de História e Estudos Amazônicos da Secretaria de Estado de Educação do Pará (SEDUC). E-mail: geraldoneto53@hotmail.com 3 O autor agradece à vice-diretora Heloísa e às coordenadoras pedagógicas Irlana e Vânia, da Escola Ruth Passarinho, pelo apoio na realização da atividade relatada neste texto. Este trabalho é dedicado aos alunos da escola.

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Os versos da literatura de cordel de Jarid Arraes4 chamam atenção para uma discussão importante: a exclusão ou a pouca abordagem da história afro-brasileira no currículo escolar. Os versos fazem parte da narrativa da vida de Aqualtune, uma princesa africana que foi escravizada no Brasil e fez parte da resistência negra contra a escravidão, além de ser avó de Zumbi dos Palmares. (ARRAES, 2017). A história da Aqualtune não aparece nos livros didáticos de História, sendo pouco conhecida, fato que é denunciado pela cordelista Jarid Arraes. Tomamos como ponto de partida estes versos para trazer neste artigo um relato de experiência no ensino de História sobre a discussão da temática negra em sala de aula. Apresento aqui atividades desenvolvidas em uma turma do 7º ano na Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Ruth Passarinho5, de Belém do Pará, na “Semana da Consciência Negra”, no mês de novembro de 2019. A obra de Jarid Arraes, Heroínas negras brasileiras em 15 cordéis foi utilizada como recurso didático para trabalhar com os alunos a temática afro-brasileira. O texto está dividido da seguinte forma: primeiro, discuto a importância da lei 10639/03 que estabeleceu a obrigatoriedade do ensino da história e cultura afro-brasileira em sala de aula e faço um comentário sobre o livro didático de História adotado escola Ruth Passarinho; segundo, discorro sobre o livro Heroínas negras brasileiras em 15 cordéis e a literatura de cordel enquanto fonte para uma discussão da história dos negros no Brasil; por fim, apresento as atividades desenvolvidas na escola na “Semana da Consciência Negra”.

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Jarid Arraes é escritora, cordelista, poeta e autora dos livros Redemoinho em dia quente, Um buraco com meu nome, As lendas de Dandara e Heroínas negras brasileiras em 15 cordéis. Curadora do selo literário “Ferina”, atualmente vive em São Paulo (SP), onde criou o clube da escrita para mulheres e tem mais de 70 títulos publicados em literatura de cordel. Ver http://jaridarraes.com/biografia/ Acesso em: 04 out. 2020.

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A escola Ruth Passarinho se localiza no bairro Curió-Utinga, em Belém. A escola possui 502 alunos matriculados

nos três turnos – manhã, tarde e noite. A clientela atendida pela escola é basicamente formada por crianças, jovens e adultos provenientes de família de baixa renda, com baixo poder aquisitivo e que residem na área de invasão próxima ao manancial do Utinga e outras próximas ao Porto da CEASA. (EEEFM RUTH PASSARINHO, 2019, p. 5). A missão da escola, segundo o que estabelece o seu Projeto Político Pedagógico, é “assegurar um ensino de qualidade, democrático e participativo, a fim de garantir aos educandos o acesso e permanência à escola, formando cidadãos críticos e autônomos, capazes de agir na transformação da sociedade.” (EEEFM RUTH PASSARINHO, 2019, pp. 11-12). Dessa forma, pensamos numa atividade relacionada à temática negra que estimulasse uma consciência crítica em relação ao racismo existente no Brasil.

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2. DESENVOLVIMENTO 2.1 – A lei 10639/03 e a história e cultura afro-brasileira A lei 10639/03, instituída pelo governo federal no início do governo Lula, se tornou um marco importante porque estabeleceu a obrigatoriedade do ensino da história e cultura afro-brasileira nas escolas. O conteúdo programático sugerido pela lei inclui o estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil. Além disso, estabeleceu o dia 20 de novembro como “Dia Nacional da Consciência Negra”, data que passou a fazer parte do calendário escolar. (BRASIL, 2003)6 . A lei, resultado principalmente da demanda do movimento negro, é fundamental porque ao longo do tempo a história dos negros foi “apagada” da história do Brasil ensinada nas escolas por meio dos livros didáticos. Tal silenciamento foi um projeto das elites intelectuais e políticas brasileiras desde o século XIX, a partir da atuação do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) que, ao pensarem um projeto de nação, buscaram valorizar a contribuição do branco português que era visto como um ser civilizado. Assim, almejavam que o Brasil atingisse o “grau de civilização” das nações europeias, desprezando a influência do negro africano, visando assim um “embranquecimento” da sociedade brasileira7. Tal desvalorização da história dos negros se estendeu por um longo período do século XX. Kabengele Munanga aponta que: A história da África na historiografia colonial foi negada e quando foi contada o foi do ponto de vista do colonizador. Da mesma maneira, a história do negro no Brasil passou pela mesma estratégia de falsificação e de negação e quando foi contada o foi do ponto de vista do outro e de seus interesses. (MUNANGA, 2015, p. 31).

Os livros didáticos no Brasil, seguindo os projetos e as ideias das elites políticas e intelectuais iniciados no século XIX, também reproduziram por muito tempo o “apagamento” dos negros na história –, ora simplesmente silenciando suas contribuições, ora representando-os de forma estereotipada, apenas como escravos. Munanga observa que: Partindo da tomada de consciência dessa realidade, sabemos que nossos instrumentos de trabalho na escola e na sala de aula, isto é, os livros e outros materiais didáticos visuais e audiovisuais carregam os mesmos conteúdos viciados, depreciativos e preconceituoso em relação aos povos e culturas não oriundos do mundo ocidental. (MUNANGA, 2005, p. 15).

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Nesse contexto de lutas do movimento negro que culminou na promulgação da lei 10639/03, o Ministério da Edu-

cação patrocinou a publicação do livro Superando o racismo na escola, organizado por Kabengele Munanga, acolhendo sugestão do Grupo Interministerial para Valorização da População Negra. (MUNANGA, 2005). O livro era destinado aos professores da educação básica, com sugestões de atitudes práticas contra o racismo no cotidiano escolar. 7

Conforme aponta Lilia Schwarcz, em um contexto de discussão da história da nação e da identidade nacional, o

IHGB fez um concurso em 1844 sobre o melhor projeto com o tema “Como escrever a história do Brasil”. O vencedor foi o naturalista alemão Karl Friedrich Phillipp Von Martius, que propunha uma maneira de entender o Brasil a partir das três raças que o compunham: o branco, o índio e o negro. Contudo, cada uma teria um papel específico nesta história: ao branco, cabia representar o papel de elemento civilizador. Ao índio, era necessário restituir sua dignidade original, ajudando-o a galgar os degraus da civilização. Ao negro, por fim, restava o espaço da detração, uma vez que era entendido como fator de impedimento ao progresso da nação. (SCHWARCZ, 1993, pp. 146-147).

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Dessa forma, a lei também é um importante recurso para se combater o racismo8 , o preconceito racial9 e a discriminação racial10 , práticas infelizmente ainda presentes na sociedade brasileira, caracterizada pela desigualdade racial11 . A partir da educação, busca-se uma formação que possa conscientizar a sociedade para uma postura de respeito aos negros, sua diversidade, cultura e história. Tal postura é necessária, porque, conforme analisa Ana Célia da Silva, a ausência de uma identificação dos alunos negros com a sua cultura e a sua história na escola e nos materiais didáticos, cria um sentimento de “auto-rejeição” e “baixa auto-estima”: Os estereótipos, a representação parcial e minimizada da realidade, conduzem o estereotipado e representado, em grande parte, à auto-rejeição, à construção de uma baixa autoestima, à rejeição ao seu assemelhado, conduzindo-o à procura dos valores representados como universais, na ilusão de tornar-se aquele outro e de libertar-se da dominação e inferiorização. Os sinais da auto-rejeição são visíveis nos descendentes de africanos, bem como nos descendentes de indígenas aculturados na América Latina. (SILVA, 2005, p. 30).

Seguindo as orientações da lei 10639/03, na Escola Ruth Passarinho são realizadas atividades voltadas para a valorização da história e cultura afro-brasileira, culminando na “Semana da Consciência Negra”, no mês de novembro. Com o evento, a escola corrobora com o que diz Munanga, que acredita que a educação é capaz de oferecer tanto aos jovens como aos adultos “a possibilidade de questionar e desconstruir os mitos de superioridade e inferioridade entre grupos humanos que foram introjetados neles pela cultura racista na qual foram socializados.” (MUNANGA, 2005, p. 17).

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Segundo Nilma Lino Gomes, “o racismo é, por um lado, um comportamento, uma ação resultante da aversão, por vezes, do ódio, em relação a pessoas que possuem um pertencimento racial observável por meio de sinais, tais como: cor da pele, tipo de cabelo, etc. Ele é por outro lado um conjunto de ideias e imagens referente aos grupos humanos que acreditam na existência de raças superiores e inferiores. O racismo também resulta da vontade de se impor uma verdade ou uma crença particular como única e verdadeira.” (GOMES, 2005, p. 52). 9 Nilma Lino Gomes aponta que “o preconceito é um julgamento negativo e prévio dos membros de um grupo racial de pertença, de uma etnia ou de uma religião ou de pessoas que ocupam outro papel social significativo. Esse julgamento prévio apresenta como característica principal a inflexibilidade pois tende a ser mantido sem levar em conta os fatos que o contestem. Trata-se do conceito ou opinião formados antecipadamente, sem maior ponderação ou conhecimento dos fatos. O preconceito inclui a relação entre pessoas e grupos humanos. Ele inclui a concepção que o indivíduo tem de si mesmo e também do outro.” (GOMES, 2005, p. 54). 10 Para Nilma Lino Gomes, “a discriminação racial pode ser considerada como a prática do racismo e a efetivação do preconceito. Enquanto o racismo e o preconceito encontram-se no âmbito das doutrinas e dos julgamentos, das concepções de mundo e das crenças, a discriminação é a adoção de práticas que os efetivam.” (GOMES, 2005, p. 55). 11 Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 56,10% da população brasileira se declara negra (O IBGE considera negros como a soma dos que se declaram pretos e pardos). Contudo, os negros são minoria nas posições de liderança no mercado de trabalho e entre os representantes políticos no Legislativo. Também são uma parte ínfima da magistratura brasileira. Entre aqueles que não têm emprego ou estão subocupados, negros são a maior parte. Também são a maior parte entre as vítimas de homicídio e compõem mais de 60% da população carcerária do país. Negros também são subrepresentados no cinema, sendo minoria entre os vencedores e os integrantes de júris de premiações. Ver AFONSO, Nathália. Dia da Consciência Negra: números expõem desigualdade racial no Brasil. 20 nov. 2019. Disponível em: https://piaui.folha.uol.com.br/lupa/2019/11/20/consciencia-negra-numeros-brasil/ Acesso em: 05 out. 2020.

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Embora em Belém o dia 20 de novembro não seja feriado como em outras capitais, na cidade ocorrem várias programações, organizadas pelas escolas e pelo movimento negro, a exemplo do Centro de Estudos e Defesa do Negro no Pará (CEDENPA)12 , que visam debater a situação da população negra na região. As coordenadoras da escola recomendaram realizar alguma atividade sobre a temática negra que envolvesse os alunos; ao final seriam atribuídos dois pontos (2,0) que valeriam para todas as disciplinas. Fiquei responsável por coordenar as atividades da turma do 7º ano. Em primeiro lugar, recorri ao material disponível que cada aluno da escola possuía: o livro didático de História. O livro adotado pela escola era o Integralis história 7º ano, cujos autores são Pedro Santiago13, Maria Aparecida Pontes14, Célia Cerqueira15, da editora IBEP, de São Paulo. (SANTIAGO; PONTES; CERQUEIRA, 2015). O livro foi aprovado pelo Programa Nacional do livro Didático (PNLD) para os anos de 2017, 2018 e 2019. Tive uma surpresa ao verificar que nos onze capítulos do livro não havia nenhum capítulo sobre a África e sobre os negros no Brasil16! Isto em plena vigência da lei 10639/03. Outros livros voltados para o 7º ano costumam abordar os reinos africanos antes de tratar das navegações europeias dos séculos XV e XVI17. O livro Integralis história 7º ano traz em seus capítulos uma abordagem eurocêntrica, dedicando apenas um para tratar do mundo islâmico e outro sobre os povos ameríndios, como os maias, astecas e incas, além dos povos tupi-guarani no Brasil18. Mesmo o livro didático indicando em sua bibliografia de referência os livros História geral da África, coordenado por Gamal Mokhtar, e A enxada e a lança: a África antes dos portugueses, de Alberto da Costa e Silva, entendemos que o uso dessas obras não foi o suficiente para o livro didático realizar uma abordagem mais profunda da história do continente africano e dos negros no Brasil.

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Segundo informações de seu site, o Cedenpa “é uma Entidade sem fins lucrativos, sem vínculos políticospartidários, fundada em 10 de agosto de 1980 e legalizado em 27 de abril de 1982, que, a partir do Estado do Pará, vem contribuindo no processo de superação do racismo, preconceito e discriminação, que produzem a desigualdades sócio-raciais, de gênero e outras, prejudicando, sobretudo, a população negra e indígena, em todos os aspectos da sociedade brasileira. Trata-se de uma associação composta por um bocado de negras e negros, de diferentes faixas etárias, níveis de escolaridade, níveis de informação, profissões/ ocupações, orientações sexuais, níveis de renda, religiões, estaturas, volume corporal, vícios, e outros aspectos da individualidade. Junto com esse punhado de negras e negros, estão, também, um punhado de pessoas não-negras, as quais, de diferentes maneiras, apoiam esse difícil trabalho de protagonizar ações voltadas a remover obstáculos antigos e novos, impostos pelo segmento racial-racista hegemônico.” Ver CEDENPA. Quem Somos. Disponível em: http://www.cedenpa.org.br/ Quem-somos Acesso em: 06 out. 2020. 13 Pedro Santiago é graduado pela Universidade de São Paulo (USP), Mestre em História Social do Trabalho pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Professor do Ensino Básico na rede pública e Professor universitário. (SANTIAGO; PONTES; CERQUEIRA, 2015). 14 Maria Aparecida Pontes é Pedagoga, graduada pelas Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU) e consultora pedagógica na área de publicações didáticas. 15 Célia Cerqueira é Bibliotecária, graduada pela Universidade de Brasília (UNB) e consultora pedagógica na área de publicações didáticas. 16 Cabe esclarecer que não participei da escolha deste livro, pois iniciei minhas atividades como professor da escola somente em setembro de 2019. 17 Afirmo isto baseado em minha experiência docente com livros didáticos do ensino fundamental em escolas públicas da Secretaria Municipal de Educação de Belém (SEMEC) e da Secretaria de Estado de Educação do Pará (SEDUC). 18

Os capítulos do livro Integralis história 7º ano são os seguintes: “O mundo bizantino”; “O mundo islâmico”; “O mundo carolíngio”; Feudalismo: sociedade e cultura”; “Sob o domínio da Igreja”; “O comércio e as cidades”; “O Renascimento”; “O poder dos reis”; “A era das Grandes Navegações”; “Os povos nativos”; “A Igreja em Reforma”.

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Acerca disto, recorremos a Kabengele Munanga, que observa: É possível ensinar a história do Brasil sem incluir a história de todos os grupos étnicoraciais que aqui se encontraram em condições históricas diferentes e desiguais? De que maneira é ensinada ou foi ensinada a história da África e dos brasileiros de ascendência africana no sistema educativo brasileiro? A análise crítica da historiografia brasileira ainda existente mostra que essa história foi ensinada de maneira distorcida, falsificada e preconceituosa, comparativamente à história de outros continentes, principalmente do continente europeu e dos brasileiros de ascendência europeia. (MUNANGA, 2015, p. 25).

Essa narrativa construída pelo livro didático é, desse modo, resquício de décadas de silenciamento da história dos negros no Brasil na escola. Dessa maneira, tendo em vista que ainda há dificuldades de acesso a materiais adequados para a questão no ambiente escolar, o papel e a iniciativa do professor de História se torna fundamental para a promoção de uma discussão da história e cultura afro-brasileira em sala de aula. 2.2 - O livro Heroínas negras brasileiras em 15 cordéis, de Jarid Arraes Diante da lacuna do livro didático da escola em relação à história da África dos negros no Brasil, decidi abordar no mês de novembro na turma do 7º ano conteúdos referentes à presença negra no Brasil. Mesmo com as limitações encontradas, entendo que a escola e os professores possuem um papel da maior relevância e o dever de fazer uma abordagem da história e cultura afro-brasileira. Conforme indica Nilma Lino Gomes: A escola tem um papel importante a cumprir nesse debate. Os (as) professores(as) não devem silenciar diante dos preconceitos e discriminações raciais. Antes, devem cumprir o seu papel de educadores(as), construindo práticas pedagógicas e estratégias de promoção da igualdade racial no cotidiano da sala de aula. Para tal é importante saber mais sobre a história e a cultura africana e afro-brasileira, superar opiniões preconceituosas sobre os negros, denunciar o racismo e a discriminação racial e implementar ações afirmativas voltadas para o povo negro, ou seja, é preciso superar e romper com o mito da democracia racial. (GOMES, 2005, p. 60).

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Tendo essa conscientização, realizei uma pesquisa e decidi utilizar como recurso didático a literatura de cordel19, a partir do livro Heroínas negras brasileiras em 15 cordéis, pois traz a biografia de mulheres negras ao longo da história do Brasil20. O livro é produzido em formato de versos da literatura de cordel, o que torna a leitura também mais acessível e atraente para os alunos21. Após ler o livro, escolhi quatro biografias de mulheres negras para trabalhar com a turma do 7º ano: Aqualtune, já citada anteriormente, Dandara dos Palmares, Eva Maria do Bonsucesso e Tereza de Benguela. A escolha de Aqualtune, Dandara dos Palmares e Tereza de Benguela se deu pelo fato de terem participado da resistência à escravidão nos quilombos dos séculos XVII e XVIII. Dandara dos Palmares era parceira de Zumbi dos Palmares com quem teve três filhos, diz-se que ela lutava capoeira e combatia nos diversos ataques a Palmares no século XVII, participando ativamente da resistência do quilombo (ARRAES, 2017, p. 53). Jarid Arraes a apresenta como uma guerreira que tinha como principal objetivo a liberdade dos negros: Guerrear pelo seu povo Era o que lhe motivava O sonho da liberdade Para todos cultivava Sendo muito decidida Era até envaidecida Pela força que ostentava. (ARRAES, 2017, p. 49). Liderava os palmarinos Lado a lado com Zumbi Entre espadas e outras armas Escutava-se o zunir Dos seus golpes tão certeiros Que aplicava bem ligeiros Pra ferir ou confundir. (ARRAES, 2017, p. 50).

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O cordel trata-se de uma literatura em formato de poesia rimada com regras específicas. A forma poética é a característica fundamental do cordel. Não existe cordel em forma de prosa, apenas em forma de versos rimados. Márcia Abreu afirma que para adequar-se à “estrutura oficial” da literatura de cordel, um texto deve ser escrito “em versos setessilábicos ou em décimas, com estrofes de seis, sete ou dez versos”. Deve seguir um “esquema fixo de rimas e deve apresentar um conteúdo linear e claramente organizado”. Deve, portanto, ter “rima, métrica e oração.” (ABREU, 1999, p. 119). O cordel surgiu no Nordeste do Brasil no final do século XIX, sendo o poeta paraibano Leandro Gomes de Barros (1865-1918) o primeiro a produzir de forma sistemática e viver da venda de folhetos. Os folhetos de cordel vendidos inicialmente eram impressos em papel pardo, de má qualidade, medindo de 15 a 17 x 11 cm. Nas capas se estampam o nome do autor, os títulos dos poemas, o nome da tipografia impressora e seu endereço. Algumas vezes, a data de publicação, o preço, a indicação do local de venda. (TERRA, 1983, p. 23). Em relação ao número de páginas, Joseph Luyten aponta que o folheto é feito a partir de uma folha tipo sulfite dobrada em quatro. Por isso, o número de páginas da literatura de cordel deve ser múltiplo de oito, já que cada folha sulfite dobrada em quatro dá possibilidade para oito páginas impressas. (LUYTEN, 2005, p. 45). Atualmente existem vários suportes do cordel além dos folhetos, como livros e nas redes sociais da internet e aplicativos. Em 19 de novembro de 2018 a literatura de cordel foi reconhecida como Patrimônio Cultural Imaterial Brasileiro pelo Conselho Consultivo do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). Ver Portal G1 PE. Literatura de cordel recebe título de Patrimônio Cultural Imaterial Brasileiro. 19 set. 2019. Disponível em: https:// g1.globo.com/pe/pernambuco/noticia/2018/09/19/literatura-de-cordel-recebe-titulo-de-patrimonio-cultural-imaterial-brasileiro.ghtml Acesso em: 03 out. 2020. 20 As quinze mulheres negras biografadas em versos de cordel por Jarid Arraes são: Antonieta de Barros, Aqualtune, Carolina Maria de Jesus, Dandara dos Palmares, Esperança Garcia, Eva Maria do Bonsucesso, Laudelina de Campos, Luísa Mahin, Maria Felipa, Maria Firmina dos Reis, Mariana Crioula, Na Agontimé, Tereza de Benguela, Tia Ciata e Zacimba Gaba. 21 Ao longo dos anos o cordel foi um dos meios de alfabetização das camadas populares do interior do Brasil. Renato Campos já observava na década de 1970 que, “levados pelo desejo de ler folhetos, muitos trabalhadores têm se alfabetizado” e que “os professores e assistentes sociais poderão encontrar na literatura de cordel, valioso auxílio para o bom êxito das suas tarefas.” (CAMPOS, 1977, p. 10).

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Tereza de Benguela viveu no Mato Grosso durante o século XVIII e se tornou uma rainha quilombola, chefe do quilombo do Quariterê, comandando toda a administração, economia e política do quilombo. Os negros e indígenas sob sua liderança resistiram à escravidão por 20 anos, até 1770, quando o quilombo foi destruído. Em sua homenagem, o dia 25 de julho foi instituído “Dia Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra”. (ARRAES, 2017, p. 143). A cordelista Jarid Arraes demonstra a importância de Tereza de Benguela nos seguintes versos: Dia vinte e cinco de julho É o dia de lembrar De Tereza de Benguela Que heroína a reinar Foi durante sua vida Sem jamais silenciar. Que exemplo inspirador Que mulher tão imponente Foi Tereza de Benguela Uma deusa para a gente Que até hoje não desiste Dessa luta pertinente. (ARRAES, 2017, p. 41).

Essas histórias são significativas para dar visibilidade às resistências contra a escravidão no Brasil, pois, conforme Munanga: A questão do negro tal como colocada hoje se apoia sobre uma constatação: o tráfico e a escravidão ocupam uma posição marginal na história nacional. No entanto, a história e a cultura dos escravizados são constitutivas da história coletiva como o são o tráfico e a escravidão. Ora, a história nacional não integra ou pouco integra os relatos de sofrimento, de resistência, de silêncio e de participação. (MUNANGA, 2015, p. 28).

No mesmo sentido, observando também a questão da presença do negro no livro didático, Ana Célia da Silva aponta as possibilidades para o professor em abordar as resistências negras ao longo da história do Brasil: A presença do negro nos livros, frequentemente como escravo, sem referência ao seu passado de homem livre antes da escravidão e às lutas de libertação que desenvolveu no período da escravidão e desenvolve hoje por direitos de cidadania, pode ser corrigida se o professor contar a história de Zumbi dos Palmares, dos quilombos, das revoltas e insurreições ocorridas durante a escravidão; contar algo do que foi a organização sóciopolíticoeconômica e cultural na África pré-colonial; e também sobre a luta das organizações negras, hoje, no Brasil e nas Américas. (SILVA, 2005, p. 25).

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Eva Maria do Bonsucesso foi escolhida para a atividade na “Semana da Consciência Negra” por simbolizar uma resistência à violência contra a mulher. Ela, uma negra alforriada, trabalhava como quitandeira no Rio de Janeiro no século XIX. Foi agredida por um senhor branco, José Inácio de Medeiros, e, não aceitando apanhar, revidou a agressão. O caso foi parar na justiça, que deu ganho de causa para Eva, sendo um “raríssimo exemplo de uma mulher negra que conseguiu vencer um caso contra um senhor branco, que acabou sendo preso.” (ARRAES, 2017, p. 73). A intenção de trazer à tona a história de Eva Maria do Bonsucesso era a de dialogar com um tema bastante atual, que é a violência contra a mulher no Brasil, da qual a mulher negra é a maior vítima22 , e a necessidade de conscientizar os alunos para lutar contra essa prática. Imagine que coragem Que essa Eva possuía Por lutar pelo direito Pelo que constituía Sua fé na liberdade Sua força na verdade Que jamais ela escondia. É por isso que eu digo Que ela teve um heroísmo Pois sem medo de lutar Enfrentou foi o racismo Por saber que estava certa Se manteve sempre alerta E peitou o vil machismo. (ARRAES, 2017, p. 72).

As biografias das quatro mulheres em versos de cordel se mostram um interessante recurso didático para trabalhar a questão da história e cultura afro-brasileira. Concordo com Kalina Silva, que aponta que o trabalho com biografias em sala de aula se justifica por duas razões principais: “o forte apelo que esse gênero exerce sobre o público leigo e o papel que a biografia pode desenvolver como representação do contexto histórico ao qual pertence o biografado.” (SILVA, 2010, p. 17). As biografias das mulheres negras produzidas por Jarid Arraes também contribuem para dar visibilidade às mulheres na história, haja vista que na maioria das vezes os livros didáticos trazem uma narrativa masculina, valorizando mais as ações dos homens ao longo do tempo. Tal recurso didático nos permite trabalhar com os alunos o conceito de “gênero”, a construção social da diferença sexual. Carla Bassanezi Pinsky destaca a importância de se falar dessa questão em sala de aula:

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As mulheres negras são vítimas mais recorrentes de homicídios. Segundo o Atlas da Violência, a taxa de assassinatos dessas mulheres cresceu 29,9% de 2007 a 2017. No mesmo período, o índice de homicídio de mulheres não-negras cresceu 4,5%. As mulheres negras também são o principal grupo de risco nos casos de feminicídio. Os dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2019 mostram que 61% das mulheres que sofreram feminicídio no Brasil eram negras. Ver AFONSO, Nathália. Dia da Consciência Negra: números expõem desigualdade racial no Brasil. 20 nov. 2019. Disponível em: https://piaui.folha.uol.com.br/ lupa/2019/11/20/consciencia-negra-numeros-brasil/ Acesso em: 05 out. 2020.

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Ao observar que as ideias a respeito do que é “ser homem” e “ser mulher”, os papéis considerados femininos e os masculinos ou a condição das mulheres, por exemplo, foram se transformando ao longo da história (como e por que), os alunos passam a ter uma visão mais crítica de suas próprias concepções, bem como das regras sociais e verdades apresentadas como absolutas e definitivas no que diz respeito às relações de gênero. (PINSKY, 2010, pp. 32-33).

2.3 – A realização das atividades na “Semana da Consciência Negra” Escolhidas as biografias das personagens, providenciei cópias dos capítulos do livro de Jarid Arraes e distribui para as equipes que foram formadas. Cada grupo ficou responsável por uma história de cada uma das mulheres negras biografadas. Para planejar as atividades, recorri a alguns estudos que trazem sugestões e experiências de como trabalhar com os folhetos de cordel em sala de aula (LIMA, 2006; MARINHO; PINHEIRO, 2012) e no ensino de História (LACERDA; MENEZES NETO, 2010; MENEZES NETO, 2016). Em primeiro lugar, realizei junto com os alunos a leitura em voz alta das histórias. Segundo Marinho e Pinheiro, esta forma de leitura do cordel é “indispensável”, assim como a repetição, já que ela “ajudará a perceber o ritmo e encontrar os diferentes andamentos que o folheto possa comportar e trabalhar as entonações de modo adequado.” Desse modo, “diferentes e repetidas leituras em voz alta é que vão tornando o folheto uma experiência para o leitor.” (MARINHO; PINHEIRO, 2012, p. 129). A leitura foi feita da seguinte forma: nas primeiras estrofes eu fazia a leitura para os alunos tomarem conhecimento do ritmo da leitura de um cordel, respeitando suas rimas. Depois, metade da sala fazia a leitura das estrofes de uma página e em seguida a outra metade lia a página seguinte. Na última página, toda a sala lia as estofes finais junto. Durante a leitura, fui explicando para os alunos o significado de algumas palavras que não entendiam e chamando a atenção para algumas estrofes que traziam informações importantes para se compreender da história narrada. Além da leitura oral do cordel, Arievaldo Viana Lima sugere “elaborar um questionário sobre a narrativa do folheto.” (LIMA, 2006, p. 59). Nesse sentido, após a leitura, elaborei questionários para cada equipe sobre Aqualtune, Dandara dos Palmares, Eva Maria do Bonsucesso e Tereza de Benguela com o objetivo de lerem os versos com atenção para encontrarem as respostas e conhecerem mais as mulheres negras biografadas. As perguntas eram bem diretas, para intepretação de texto: quem eram as mulheres, em que período elas viveram, quais as suas lutas e qual a sua importância. A atividade seguinte foi a elaboração de cartazes sobre as mulheres negras biografadas. Cada equipe escolhia algumas estrofes mais significativas para escrever nos cartazes e também fazia desenhos representando as personagens. Tais cartazes ficaram em exposição na escola durante a “Semana da Consciência Negra”.

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Outra atividade realizada foi a elaboração de uma peça teatral23 , denominada de “jogo dramático” por Marinho e Pinheiro, “uma atividade agradável e que recupera a capacidade da criança e do jovem de fantasiar, de recriar a realidade.” (MARINHO; PINHEIRO, 2012, p. 130). A peça foi construída a partir da biografia em cordel de Eva Maria do Bonsucesso. Procuramos envolver toda a turma do 7º ano na atividade, com alunos interpretando personagens como Eva, Inácio de Medeiros, o delegado, o juiz, os advogados; os alunos restantes participaram como o público que acompanhou o julgamento de Eva. Na peça, a personagem Eva, interpretada por uma aluna negra, ocupou o papel de protagonismo, justamente para evidenciar a narrativa a partir de seu ponto de vista, como mulher negra que sofreu injustiças no Brasil do início do século XIX, mas que lutou por seus direitos. Ao abordar a questão do gênero como tema para as aulas de História, Carla Bassanezi Pinsky sugere que o importante é fornecer aos estudantes “elementos para um ‘olhar de gênero’, ou seja, fazer com que eles percebam como o masculino e o feminino têm sido e ainda são representados e, a partir disso, como as sociedades se organizam com base nessas representações.” (PINSKY, 2010, p. 29). Além disso, a personagem Eva foi um meio de valorização da identidade racial negra. Como diz Munanga: Sem construir a sua identidade “racial” ou étnica, alienada no universo racista brasileiro, o negro não poderá participar do processo de construção da democracia e da identidade nacional plural em pé de igualdade com seus compatriotas de outras ascendências. (MUNANGA, 2015, p. 25).

A peça foi assistida pelos alunos das outras turmas, professores, coordenação e direção da escola. Apesar do planejamento e ensaios, naturalmente houve dificuldades durante a execução: alguns alunos se esqueceram de suas falas, outros ficaram tímidos diante da presença de público. No entanto, entendo que a mensagem principal foi divulgada: uma manifestação contra o racismo e contra a violência sofrida pelas mulheres.

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O cordel tem sido constante fonte de inspiração para os músicos, compositores, escritores, artistas plásticos, diretores de cinema e TV e autores de teatro. O exemplo mais marcante é o Auto da Compadecida, de Ariano Suassuna, que além de utilizar o personagem João Grilo, baseia-se na narrativa de três folhetos de cordel: O dinheiro (O testamento do cachorro), O cavalo que defecava dinheiro, ambos de Leandro Gomes de Barros, e O castigo da soberba, de Manoel Vieira do Paraíso. (LIMA, 2006, p. 59).

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3. CONSIDERAÇÕES FINAIS Apesar das dificuldades, considero que as atividades realizadas foram relevantes para o ensino de História no 7º ano da Escola Ruth Passarinho. As lacunas no material didático em relação à história e cultura afro-brasileira serviram de incentivo para a busca de alternativas, encontrada na obra de Jarid Arraes com as biografias das mulheres negras em cordel. Os versos da cordelista também permitiram uma abordagem que levasse em conta a questão de gênero possibilitando uma abordagem tornando as mulheres protagonistas. Essa experiência também buscou estimular nos alunos uma conscientização acerca do racismo no Brasil, algo que ainda está presente na atualidade. Dessa forma, a História ajuda na formação de cidadãos antirracistas, sendo esta uma formação necessária para alunos de todas as origens, se quisermos construir uma sociedade mais democrática e que promova o respeito às diferenças. Segundo Munanga: O resgate da memória coletiva e da história da comunidade negra não interessa apenas aos alunos de ascendência negra. Interessa também aos alunos de outras ascendências étnicas, principalmente branca, pois ao receber uma educação envenenada pelos preconceitos, eles também tiveram suas estruturas psíquicas afetadas. Além disso, essa memória não pertence somente aos negros. Ela pertence a todos, tendo em vista que a cultura da qual nos alimentamos quotidianamente é fruto de todos os segmentos étnicos que, apesar das condições desiguais nas quais se desenvolvem, contribuíram cada um de seu modo na formação da riqueza econômica e social e da identidade nacional. (MUNANGA, 2005, p. 16).

Assim, espero que este artigo seja uma forma de estimular e conscientizar, especialmente educadores e graduandos de licenciatura, a discussão da história e cultura afro-brasileira em sala de aula. Não como um modelo a ser seguido, mas como objeto de crítica e reflexão, para que cada vez mais possamos contribuir para a uma sociedade mais tolerante e que respeite as diferenças, algo que é urgentemente necessário principalmente nos tempos atuais.

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REFERÊNCIAS Livro didático PONTES, Maria Aparecida; CERQUEIRA, Célia; SANTIAGO, Pedro. Integralis história 7º ano. São Paulo: IBEP, 2015. Sites AFONSO, Nathália. Dia da Consciência Negra: números expõem desigualdade racial no Brasil. 20 nov. 2019. Disponível em: https://piaui.folha.uol.com.br/lupa/2019/11/20/consciencia-negranumeros-brasil/ Acesso em: 05 out. 2020. BRASIL. Lei nº 10639, de 9 de janeiro de 2003. Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira”, e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.639.htm Acesso em: 02 out. 2020. CEDENPA. Quem Somos. Disponível em: http://www.cedenpa.org.br/Quem-somos Acesso em: 06 out. 2020. Jarid Arraes. Disponível em: http://jaridarraes.com/biografia/ Acesso em: 04 out. 2020. Portal G1 PE. Literatura de cordel recebe título de Patrimônio Cultural Imaterial Brasileiro. 19 set. 2019. Disponível em: https://g1.globo.com/pe/pernambuco/noticia/2018/09/19/literatura-de-cordel -recebe-titulo-de-patrimonio-cultural-imaterial-brasileiro.ghtml Acesso em: 03 out. 2020. Bibliografia ABREU, Márcia. História de cordéis e folhetos. Campinas, SP: Mercado de Letras/Associação de Leitura do Brasil, 1999. ARRAES, Jarid. Heroínas negras brasileiras em 15 cordéis. São Paulo: Pólen, 2017. EEEFM RUTH PASSARINHO. Projeto Político Pedagógico da Escola Estadual Ruth Passarinho: Inclusão e diversidade para uma educação pública de qualidade. Belém, 2019. CAMPOS, Renato. Ideologia dos poetas populares do Nordeste. 2 ed. Recife: Instituto Joaquim Nabuco de Pesquisas Sociais; Rio de Janeiro: FUNARTE, 1977. GOMES, Nilma Lino. Alguns termos e conceitos presentes no debate sobre relações raciais no Brasil: uma breve discussão. In: BRASIL. Educação anti-racista: caminhos abertos pela Lei federal nº 10.639/03. Brasília, MEC, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, 2005. LACERDA, Franciane Gama; MENEZES NETO, Geraldo Magella de. Ensino e pesquisa em História: a literatura de cordel na sala de aula. Outros Tempos. vol. 7, n. 10, p. 217-236, dez. 2010. LIMA, Arievaldo Viana (org.). Acorda cordel na sala de aula. Fortaleza: Tupynanquim /QueimaBucha, 2006. LUYTEN, Joseph. O que é literatura de cordel. São Paulo: Brasiliense, 2005. MARINHO, Ana Cristina; PINHEIRO, Hélder. O cordel no cotidiano escolar. São Paulo: Cortez, 2012. MENEZES NETO, Geraldo Magella de. “Musas filhas de Apolo, tragam-me inspiração, para narrar uma guerra, de nação contra nação”: a literatura de cordel no ensino da Grécia Antiga, um Revista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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EDUCAÇÃO MUSICAL À LUZ DA TEORIA DE R. MURRAY SCHAFER: CONTRIBUIÇÕES PARA O ENSINO DE MÚSICA NA EDUCAÇÃO BÁSICA Jeová de Jesus Couto1 RESUMO Este trabalho situa-se no campo da educação musical e busca apresentar contribuições para o ensino de música. Aponta caminhos metodológicos para um ensino que tem enfrentado dificuldades em sua aplicação na escola pública. Utilizando dos estudos sobre paisagem sonora e educação musical do educador musical canadense R. Murray Schafer, traz à baila as contribuições do autor para a educação musical na educação básica, com as quais encontramos em sua teoria possibilidades de aplicação em meio às dificuldades encontradas para o desenvolvimento do conteúdo música, no trabalho docente nas escolas. A partir do conhecimento de ideias do teórico, tais como paisagem sonora e escuta ativa e reflexiva do ambiente, e colocando paralelamente o contexto amazônico como campo de observação desta escuta de sonoridades específicas, enxerga-se possibilidades na exploração de diversos sons, como matéria prima da música, que podem ser estudados de forma ativa e criativa, apresentando varais maneiras para um ensino fundamentado na reflexão sobre os sons, na colaboração e na coautoria dos sujeitos, professor e alunos, envolvidos nos processos de ensino-aprendizagem. PALAVRAS-CHAVE: Educação Musical. Paisagem Sonora. Trabalho docente. Ensino de Música.

INTRODUÇÃO Mais de uma década após a promulgação da lei 11.769 de agosto de 2008, que, na prática, deveria assegurar o ensino de música nas escolas de educação básica, e, por conseguinte, qualificar as ações no âmbito da educação musical, continuamos a vivenciar práticas musicais aquém das necessidades e expectativas de educandos, percebidas na minha prática, especialmente na escola pública. Não são poucos os motivos destes entraves. Porém, nota-se um desajuste entre o ideal e o real, que em muito pode se dar em função do pouco tempo de embasamento teórico e metodológico, de boa parte dos professores que ensinam música nas escolas.

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Graduação em Pedagogia (UFPA); Música (UNIS-MG); Especialista em Informática Educativa (UFLA); Mestrado em Artes (UFPA). EMAIL: jjcoutto@hotmail.com

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Esta questão tem nos instigado a fomentar uma discussão iniciada ainda durante o mestrado, quando fizemos as primeiras leituras sobre as ideias do educador e pesquisador canadense R. Murray Schafer sobre o tema paisagem sonora e sua relação com a educação musical. Na oportunidade, buscávamos respostas para um dos objetivos propostos em nossa dissertação que pretendia apontar “perspectivas para uma educação musical formativa na educação básica do município de Breves-PA”. O tema Paisagem Sonora, mesmo não constituindo naquele momento tema central na pesquisa, foi brevemente discutido, auxiliando-nos a entender que uma das perspectivas para aquele ensino de música desafiador está na formação inicial de professores em educação musical, para a qual as ideias de Schafer (2011) podem ter relevante contribuição. Hoje, ao robustecer as leituras e amadurecer as ideias sobre o tema, entendemos que a discussão sobre paisagem sonora na educação musical é rica em ideias e repleta de possibilidades para o auxílio dos profissionais da educação que ministram música nas escolas, mas que se limitam pela falta de formação em educação musical. A partir deste ponto, este trabalho irá apresentar o pesquisador R. Murray Schafer, trazendo informações sobre os pressupostos de sua teoria. Abre-se um parêntese para demonstrar os desafios da educação pública, mas retorna demonstrando as possibilidades e aplicabilidades da teoria de Schafer para a educação, discutindo campos de exploração específicos. Apresenta-se alguns autores alinhados aos estudos do teórico. Demonstra-se os procedimentos metodológicos utilizados para o desenvolvimento deste trabalho e finaliza-se com considerações que ratificam a relevância das teorias de Schafer para a educação musical no ensino público, tendo em vista seu potencial como método ativo e rico em possibilidades na região amazônica.

2. MURRAY SCHAFER E EDUCAÇÃO MUSICAL 2.1 - Conhecendo o trabalho de R. Murray Schafer De acordo com Vale e Silva (2017) o pedagogo e educador musical R. Muray Schafer pertence à segunda geração de pesquisadores em educação musical de métodos ativos2. Seus trabalhos são voltados a questões contemporâneas, como as diferentes sonoridades do mundo, que se dão em decorrência de questões tecnológicas e culturais. Um trecho da obra Educação Sonora (2009) é bastante reveladora sobre o trabalho do autor. Vamos observá-la: O ambiente ao meu redor, enquanto escrevo, é uma paisagem sonora. Através de minha janela aberta ouço o vento roçando as folhas dos álamos. Os filhotes de passarinhos acabaram de romper a casca dos ovos em seu ninho, pois é junho, e o ar está pleno de seu canto. Dentro, o refrigerador, repentinamente, faz-se presente, com seu zunido penetrante. Respiro profundamente e continuo a baforar o meu cachimbo, que dá pequenos estouros em quanto fumo. Minha caneta passeia suavemente por sobre o papel vazio; o som se enrola irregularmente e, então, estala quando pingo um “i”, ou acrescento um ponto final. Essa é a paisagem sonora nessa tarde calma em minha casa de campo. [...] (SCHAFER, 2009, p. 14).

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Métodos ativos estão relacionados ao contato com a música pela experimentação e pela criação, em vez dos estudos técnicos e da repetição (VALE e SILVA, 2017, p. 83).

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Acima, ao anunciar o texto, não seria exagero usarmos o termo “ouvir” no lugar de “observar”, visto que o autor descreve com riqueza de detalhes a sonoridade vivenciada por ele, estimulando nossa imaginação, nosso “ouvido pensante”. A escuta reflexiva e criativa é uma das bases constitutivas do pensamento de Murray Schafer, quando nos apresenta a ideia de Paisagem Sonora. O texto, lido ainda no mestrado, fez-nos abrir os olhos – especialmente os ouvidos –, para uma educação musical atenta aos sons a nossa volta, a partir da escuta sensível do ambiente, da reflexão analítica e da proposição para novas experiências para ensino de música. Este “ouvido reflexivo”, que percebe as minúcias do ambiente a sua volta, criativo e extremamente observador, pode ser estudado na educação básica com nossas crianças e adolescentes. Considerando nossa região, a riqueza sonora do Marajó compõe diariamente belíssimas “orquestrações”, mediante ao canto dos pássaros, do vento na copa das árvores, das chuvaradas ao cair sobre as florestas, sobre os telhados, sobre o chão produzindo os mais diversos sonidos. Todavia, as ações tecnológicas do homem também refazem o contexto sonoro local, porque vilarejos viraram cidades importantes na região – Breves é uma delas – e estas cidades produzem sons mecanizados de todo o tipo (carros, caminhões, motocicletas, embarcações motorizadas), que também podem ser observados, organizados e estudados em sua natureza física (natural ou tecnológica), entendendo assim que o estudo da música pode se dá, primeiramente, pela escuta ativa e inteligente da matéria prima da música, o som. Ressalta-se que metodologias de ensino ativas primam por um fazer pedagógico que valoriza a criação, dando foco ao educando que agora protagoniza a construção do seu conhecimento. Não permite ignorar a sociedade do conhecimento e suas competências cognitivas, pessoais e sociais, que não se adquirem da forma convencional, mas que exige proatividade, colaboração, personalização e visão empreendedora (MORAN, 2015).

2.2 - Desafio da educação pública: formação O ensino de música na escola pública tem sido uma prática historicamente desafiadora em nosso país. (DUARTE JÚNIOR, 1991; FUCCI-AMATO, 2012). Dividindo espaço com as diversas outras linguagens do campo das artes, o conteúdo “música” tem se resumido, salvo algumas exceções, unicamente a momentos de descontração, de divertimento ou deleite, legandolhe um perfil descompromissado (BELLOCHIO, 2000; LOUREIRO, 2012). É certo que não são poucos os problemas que geram dificuldades para o ensino de música, mas um deles está na falta de formação dos professores em educação musical. Durante o mestrado, os relatos que ouvimos de professores que coordenadores pedagógicos denunciavam que a dificuldade mais acentuada situava-se na falta de formação específica, e isto lhes trazia grandes obstáculos frente aos currículos que lhes eram apresentados. Foi a partir desta constatação que começamos a refletir sobre uma alternativa para formação de professores em educação musical, encontrando nos estudos de Schafer e outros pesquisadores de sua obra uma alternativa.

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2.3 - Possibilidades à luz da teoria de Schafer: aprofundando o conhecimento A expressão Paisagem Sonora tem sua origem no âmbito do World Soundscape Project, movimento liderado pelo pesquisador canadense R. Murray Schafer, na década de 70, na Universidade de Simon Fraser, Canadá. Nasceu da preocupação deste pesquisador com o ambiente sonoro que se tornara cada vez mais poluído devido a multiplicidade de dispositivos mecânicos que transformavam de forma veloz a paisagem sonoras em Vancouver, Canadá. A inquietação de Schafer se estendeu a paisagem sonora do mundo, e ele passou a coordenar um grupo de músicos, compositores e pesquisadores buscando “estudar o ambiente acústico para determinar como os sons afetam nossas vidas, e, a partir dessas informações, tentar desenhar paisagens sonoras mais saudáveis e belas para o futuro” (SCHAFER, 1998, p. 158 apud SANTOS, 2006, p. 14). O trabalho desenvolvido por Schafer e seus colaboradores abriu horizontes musicais para o que tem sido chamado de “ecologia acústica”, ciência que segundo Schafer (1977, p. 71 apud SANTOS, 2006, p. 15) tem se preocupado com “o estudo dos efeitos do ambiente acústico, ou paisagem sonora, nas respostas físicas ou características comportamentais das criaturas que nele vivem”. Indubitavelmente é um trabalho de grande relevância para a humanidade, haja vista que “a sociedade moderna pode estar se ensurdecendo com ruídos” (Schafer, 2009, p. 15). Todavia, a linha de pensamento nesta pesquisa estará centrada nas contribuições de Schafer para a educação musical, cujas ideias têm reverberado de forma bastante significativa. Em sua obra O ouvido pensante (2011), Schafer escreve um capítulo à parte, para tratar de sua experiência na educação musical, e sua primeira orientação para os professores é a de que “não há mais professores, apenas uma comunidade de aprendizes que precisam experimentar colocar o fazer musical criativo no centro dos currículos” (idem, 2011). Defende que na aula de música deve haver lugar para a expressão individual. Critica um currículo previamente organizado para o treinamento do virtuosismo musical, antes crê que o ensino da música antecede à técnica do instrumento, diz ele: “tenho tentando fazer com que a descoberta entusiástica da música preceda a habilidade de tocar um instrumento, ou de ler notas [...]”, (SCHAFER, 2011, p. 270). Observemos que Schafer utiliza o termo “preceder”, indicando que a música pode ser um saber inicializado sem a utilização de instrumentos. Isto nos remete às ideias do célebre educador brasileiro Paulo Freire que também fez uso desta palavra como o mesmo sentido em seus tratados sobre alfabetização. Dizia ele que “a leitura do mundo precede a leitura da palavra” (FREIRE, 1981). Afirmava isto por levar em conta o fato de que os educandos, ao chegarem à sala de aula, já têm algumas familiaridades com a língua materna, pois a utilizam constantemente através da comunicação verbal. De forma semelhante, Schafer valoriza a experiência obtida no campo a ser explorado – o ambiente sonoro –, repleto em possibilidades de experimentação, instigando a “leitura do mundo com os ouvidos”. Conhecer o ambiente sonoro que nos rodeia e desenvolver experiências com ele explorando-o de maneira tal que isto se transforme numa alfabetização musical, seria um procedimento de grande valia na educação básica, pois, afinal, o que são os sons para a música se não a sua matéria prima substancial?

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2.4 - Campos específicos na teoria de Schafer para a educação musical O trabalho em educação musical de Schafer se concentra principalmente em três campos (ibdem, p.272). Procurando ser sucinto apresentaremos somente os dois mais relevantes: 1) Procurar descobrir todo o potencial criativo das crianças para que possam fazer música por si mesmas; 2) Apresentar aos alunos de todas as idades os sons do ambiente; tratar a paisagem sonora do mundo como uma composição musical, da qual o homem é o principal compositor; e fazer julgamentos críticos que levem à melhoria de sua qualidade.

Em relação ao primeiro campo, Schafer destaca o potencial criativo. Em sua visão, a música precisa ser pensada como um objeto que exercite a mente para a percepção e análise. “Estamos entrando em uma nova era da educação, que é programada para a descoberta e não para a instrução”, ressalta. (ibdem, p.274). Segundo ele, não há nada tão instigante numa aula quanto fazer perguntas aos alunos. Sugere que façamos proposições como: “o silêncio é ilusório: procure encontrá-lo”; “Escreva todos os sons que você ouvir”; “Encontre um som que consista de um som pesado, grave, formado por um batuque surdo, seguido por um trinado agudo” (ibdem, p.275). No segundo campo, que trata especificamente de se explorar a paisagem sonora do mundo, Schafer discute sobre memória auditiva. Da mesma forma, procurando estimular a memória dos alunos, sugere questionamentos como: “Qual foi o som mais agudo que vocês ouviram nos últimos dez minutos? Qual o mais forte? Quantos aviões você ouviu hoje? Quem tem a voz falada mais bonita na sua família ou aqui na classe? (SCHAFER, 2011, p. 276). 2.5 - Alguns autores alinhados a teoria de Schafer Buscando por trabalhos que se fundamentam na obra de Murray Schafer e sua aplicabilidade no ambiente escolar, detectamos estudos importantes: Silva (2012) defende atividades de apreciação/percepção, na qual os educandos devam analisar e documentar os sons ocorridos em um evento sonoro específico como a chuva, por exemplo. A autora afirma que a escuta ativa e o pensamento crítico podem aumentar a consciência dos indivíduos sobre os sons do ambiente. Santos (2006) sugere a necessidade de os educadores musicais fundamentarem suas práticas voltadas ao desenvolvimento de “ouvidos para ouvir”, de “liberdade para criar” e de “coragem para escutar”. Estimula uma ação educativa musical que promova o desenvolvimento de uma escuta enquanto ato de poder e de ação criativa, imaginativa e construtiva. (KATER apud SANTOS, 2006, p. 2). Santos (2006) ao propor uma escuta ativa da rua como ambiente rico em sonoridades observa que “ao escutar o ambiente para além da significação, a criança pode experienciar outras escutas, atualizando ideias de música e questionando a própria noção de música. Vale e Silva (2017) afirmam que as propostas de Schafer são como um convite para uma pausa, uma interrupção em meio aos avanços tecnológicos que nos submergem num mundo sonoramente poluído que nos deseduca e nos dessensibiliza. As autoras ressaltam que “aprender a ouvir” talvez seja um dos principais objetivos do ensino de música, e que Murray Schafer teve continuamente a preocupação de sempre levar os alunos a notar sons que na verdade nunca haviam percebido. Para Marton (2008), “a arte musiRevista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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cal faz aflorar a audição interior, o encontro do sujeito consigo mesmo, produzindo o diálogo entre sua sensibilidade ética e estética, a ordem e o caos, o silêncio e o ruído, a repetição e a criação” (MARTON, 2008, p. 19). Os estudos de R. Murray Schafer e de outros estudiosos sobre o tema paisagem sonora nos inspiram a pensar: seria importante ressaltar o ambiente do lugar (região amazônica), pois, num trabalho que se propõe a estimular a escuta sensível, atenta, e criativa, como não por em relevo um ambiente sonoro rico por sua diversidade, mergulhado no contexto amazônico tal como é a região amazônica? Não desejamos fazer deste trabalho um estudo situado especificamente no campo da etnomusicologia. Isto exigiria um maior aprofundamento. Mas, é importante considerar algumas sonoridades específicas do lugar como as produzidas pelos animais – na região ainda é muito comum nos quintais das casas o cantar do galo e dos passarinhos no alvorecer –, ou os motores dos barcos a ir e vir, e, ainda, de forma mais suave, o som dos remos ao tocarem a água do rio impulsionando as canoas dos ribeirinhos. Voltando a destacar a importância da pesquisa para a formação de professores, Nóvoa (2009) diz que dentre os atributos de um “bom professor” destaca-se uma trilogia situada no saber (conhecimentos), no saber-ser (capacidades) e no saber-fazer (atitudes). Freire (1996) também nos ensinou que a formação continuada permite ao professor ir além de sua intuição, desenvolvendo aulas mais ricas em argumentos, exemplos e opções didáticas numa substituição do saber ingênuo pelo pensar certo. Por isso, acredito que a prática dos professores no desenvolvimento do conteúdo música possa ter significativa melhora a partir do engajamento em formação docente que fortaleça uma prática pedagógica mais fundamentada, sendo os estudos R. Murray Schafer capazes de subsidiar propostas metodológicas importantes para a área da educação musical. 3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Para o desenvolvimento deste trabalho, buscamos na literatura algumas obras do educador Canadense R. Murray Schafer (2001; 2009; 2011), e também alguns artigos publicados que nos trouxeram fundamentação nas obras do autor (KATER apud SANTOS, 2006; SANTOS, 2006; MARTON, 2008; SILVA, 2017), nos auxiliando a consolidar o pensamento de que a teoria em educação musical de Shafer possui apontamentos de relevância para a prática musical na educação básica da escola pública. Somados a estas obras, buscamos outras que tratam sobre o ensino de música e que discutem didática numa perspectiva do ensino criativo, ativo e formador de coautores (alunos) no desenvolvimento do conhecimento (FREIRE, 1996; MORAN, 2006; NÓVOA, 2009;) Foi importante também a experiência adquirida na pesquisa de campo, durante o mestrado, aplicada no município de Breves-PA, em escolas de educação básica. Embora naquele momento esta pesquisa não tenha objetivado trazer informações mais precisas sobre a formação de professores que desenvolvem o conteúdo música, ela nos forneceu algumas informações que denunciaram que as maiores dificuldades dos professores naquele momento estava na falta ou pouca formação em música. Isto nos estimulou a refletir em alternativas para o ensino de música. Uma alternativa, fruto destas reflexões, foram estudos de Schafer, aqui apresentados de forma concisa.

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4. CONSIDERAÇÕES FINAIS Consideramos de grande importância a formação de professores no campo da educação musical, tendo em vista às dificuldades que estes profissionais possuem ao desenvolver metodologias eficazes para o ensino de música nas escolas de educação básica. Dessa forma, buscou-se na literatura os estudos R. Murray Schafer e outros autores de pensamento semelhante, tanto no trato com o conteúdo música quanto no aspecto mais genérico, concernente ao entendimento sobre educação e formação de professores. Entendemos que as ideias de Schafer podem trazer ricos ensinamentos aos nossos professores, especialmente aos que desenvolvem a música enquanto conteúdo curricular, mas que não possuem formação inicial, ou que, mesmo a possuindo, não tem dado o devido valor às múltiplas possibilidades de exploração dom som. Há ainda muito a se refletir sobre as possibilidades de desenvolvimento da música mediante a este ouvir mais atento sobre os sons a nossa volta. O contexto sonoro amazônico, rico em possibilidades no que tange à escuta ativa de nossas cidades e, especialmente, da natureza, é um laboratório que precisa ser melhor explorado e levado a conhecimento de nossos alunos. Eles crescem ouvindo estas sonoridades, mas precisam transformar as informações captadas pelos ouvidos em conhecimento. Só um profissional qualificado para mediar este processo pode auxiliar na transformação de informações em conhecimento.

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REFERÊNCIAS BELLOCHIO, Cláudia Ribeiro. A Educação Musical nas séries iniciais do ensino fundamental: olhando e construindo junto às práticas cotidianas do professor. Tese de Doutorado. Porto Alegre: UFRGS, 2000. Campinas. SP: Papirus, 2012b. DUARTE JÚNIOR, João-Francisco. Por que arte-educação? 9. ed. Campinas, SP: Papirus 1991. (Coleção Ágere). FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. Paz e Terra, 1996. ______. Abertura do Congresso Brasileiro de Leitura – Campinas, novembro de 1981. FUCCI-AMATO, Rita. Escola e Educação Musical: (Des)caminhos Históricos e Horizontes. Campinas, SP. Papirus, 2012. LOUREIRO. Alícia Maria Almeida. O ensino de música na escola fundamental. 8. ed. MORAN, José. [Coleção Mídias Contemporâneas. Convergências Midiáticas, Educação e Cidadania: aproximações jovens. Vol. II] Carlos Alberto de Souza e Ofelia Elisa Torres Morales (orgs.). PG: Foca Foto-PROEX/UEPG, 2015. NÓVOA, António. Para uma formação de professores construída dentro da profissão. Revista Educación, Madrid, n. 350, p. 203-218, set/dez 2009. SANTOS, Fátima Carneiro. A paisagem sonora, a criança e a cidade: exercícios de escuta e de composição para uma ampliação da ideia de música / Fátima Carneiro dos Santos. – Campinas, SP: 2006. SILVA, Alessandra Nunes de Castro. Trilha de sons, construindo a escrita musical. Música na Educação Básica. Londrina, v.4, n.4, novembro de 2012. MARTON, Slmara Lídia. Paisagem Sonora, tempos e autoformação. Silmara Lídia Marton. Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Natal. 2008. SCHAFER, R. Murray. A Afinação do Mundo: uma exploração pioneira pela história passada e pelo atual estado do mais negligenciado aspecto do nosso ambiente: a paisagem sonora. Tradução Maria Trench Fonterrada. São Paulo: Editora UNESP, 2001, 381 p. ________. Educação Sonora. 100 exercícios de escuta e criação de sons. São Paulo: Melhoramentos, 2009. ________. O ouvido pensante. Tradução Marisa Trench de O. Fonterrada. São Paulo: Universidade Estadual Paulista, 2011. VALE; SILVA. A metodologia musical de Murray Schafer e sua aplicabilidade em escolas de Educação Básica. Educação, Batatais, v. 7, n. 3, p. 81-101, jan./jun. 2017.

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A Inclusão na Prática de Professores: Desafios, entraves e Possibilidades na Formação Continuada em Serviço Marcelo Augusto Vilaça de Lima1 RESUMO Objetivou-se neste artigo investigar e analisar a respeito dos desafios e perspectivas da prática inclusiva dos professores, no que se refere ao processo de formação continuada em serviço. Utilizou-se como procedimentos a pesquisa bibliográfica com base em autores como Mitler (2015), Sassaki (2009,2012,2014,2019), Mantoan (2015,2018,2019) dentre outros autores que discutem a formação pedagógica na perspectiva da inclusão, bem como a formação continuada do trabalho pedagógico. Verificou -se que os autores coadunam com a necessidade de uma formação continuada em serviço na qual possibilitara aos docentes condições de refletir a respeito de suas práticas pedagógicas, bem como possibilitam um amadurecimento da necessidade de formação continuada. Conclui-se que a inclusão ainda é considerada um grande desafio para a prática docente e compreender que esta reflexão-ação-reflexão nasce da consciência do profissional em educação de que, não existem práticas prontas e acabadas, muito menos manuais pedagógicos, no entanto, as práticas devem ser redimensionadas de acordo com as concepções pedagógicas de cada docente advindas de suas experiências cotidianas e das formações em serviço. Eixo Temático: Formação de Professores. Palavras-Chaves: Inclusão. Formação em serviço. Desafios e Perspectivas.

INTRODUÇÃO O contexto da sociedade atual, repleto de incertezas e de mudanças de paradigmas, torna o debate a respeito da inclusão cada vez mais presente em escolas e em universidades. Vive -se num grande paradoxo. Segundo Baumam (2009) a sociedade se caracteriza pela pósmodernidade que tem como premissa o reforço de práticas individualizadas em detrimento das questões coletivas. Assim, este paradoxo repleto de perversidade impõe uma postura egocêntrica do indivíduo que vai de encontro com os discursos de uma sociedade inclusiva. A escola neste contexto reflete as mazelas de uma sociedade individualizada, e apesar de toda discussão a respeito da inclusão, ainda encontra-se distante de uma ação coletiva que de fato assuma um postura diferenciada, que modifique de forma positiva a rotina de cada sujeito dentro das instituições educativas.

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Pedagogo, Mestre em Gestão e Desenvolvimento Regional pela UNITAU, especialista em Gestão Escolar (UEPA), Currículo e Avaliação da Educação Básica (UNAMA), Ciência Politica (FACIMAB), Relações Etnicas para o Ensino Fundamental (UFPA), Educação Especial com ênfase em inclusão (Faculdade Futura). Especialista em Educação Classe III da Secretaria de Estado de Educação. E-mail: vilaca.marcelo@gmail.com

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Para Sassaki (2014) a inclusão escolar enquanto ação coletiva, apesar de ter avançado nos debates e produções acadêmicas, ainda se distancia de uma ação efetiva dentro da escola. O autor ressalta que há um risco de que o debate a respeito da inclusão se torne um mero discurso e as práticas permaneçam segregando e excluindo as minorias. No entanto, ressalta-se que nos últimos dez anos já se percebe ações (mesmo que ainda focais) inclusivas nas escolas. Isso representa um ganho na organização de uma proposta educativa que atenda todos sem exceção. No Estado do Pará, esse debate fica cada vez intenso a partir da necessidade de os discursos saírem das falácias e comecem a fazer parte do cotidiano docente. Assim, as propostas de formação do professor se efetivam por meio de cursos e aperfeiçoamento profissional em serviço. Coaduna-se com as ideias de Libâneo (2016) quando o autor aponta a formação continuada como uma ação indispensável na organização de práticas pedagógicas que valorizem os educandos em todas as suas necessidades. Assim, a política de inclusão se estabelece como uma ação de Estado. A Secretaria de Educação do Estado do Pará- SEDUC, possui uma organização distribuída em unidades descentralizadas da sede, chamadas de Unidades Seduc na Escola (USE). Atualmente a Secretaria de Educação possui 19 USES para atender as escolas da região metropolitana de Belém. Cada USE fica responsável de visibilizar condições e formações em serviço para os docentes que são lotados nas escolas. Assim, garante-se momentos de estudos coletivos o que de certa forma poderia contribuir para os ajustes necessários focando a aprendizagem dos educandos. Com base neste contexto e por fazer parte da equipe técnica de uma USE, como especialista em educação classe III, surge a curiosidade em querer saber o que os autores que estudam a respeito da inclusão e de formação continuada compreendem destes momentos de formação em serviço dos profissionais da educação. Esta curiosidade se intensifica a partir de um ano (2020) repleto de incertezas, consequência da pandemia que assola a sociedade e que fez com que as pessoas se distanciassem, como estratégia de prevenção ao COVID-19. As escolas tiveram que reinventar suas ações e formações (online, remota, a distância) em busca de um modelo que seja capaz de amenizar as mazelas impetradas pela pandemia. O Objetivo desta pesquisa foi investigar e analisar a respeito dos desafios e perspectivas da prática inclusiva do professor no que se refere ao processo de formação continuada em serviço. Para isso utilizou-se a pesquisa bibliográfica como estratégia para coletar dados. Verificou-se que os autores pesquisados são enfáticos em afirmar que a formação continuada em serviço deve ser uma ação incansável e presente em todas as escolas, tendo em vista que as práticas devem ser pensadas e repensadas numa ação dialética por cada profissional de educação. Porém, também apresentam a ideia de que não basta apenas ter formação continuada em serviço, mas que seja criado uma cultura de formação e de sucesso dentro das escolas. Que as formações em serviço não se caracterizem como uma mera política de inclusão que são realizadas apenas para aparentar uma preocupação com a garantia legal da inclusão, mas que sejam percebidas e vivenciadas como elemento de inquietação e de reflexão a respeito da prática docente.

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Esse ato de refletir sobre a ação é uma condição para trazer uma prática inclusiva questionadora, crítica, construtiva e criativa. Esse ato de formação poderá viabilizar nos sujeitos que atuam diretamente nas escolas um romper de paradigmas e um não-acomodar diante de situação adversas. O desafio é grande, porém as perspectivas de se ter uma sociedade menos excludente são reais. A formação continuada em serviço deve ser incentivada e persistente no aperfeiçoamento profissional do docente, configurando-se numa política de enfrentamento a normalidade e proporcionando aos sujeitos a capacidade de se reinventar na construção de um mundo diferente. A primeira seção deste artigo trás as discussões teóricas relacionadas ao contexto social pós-moderno bem como o debate a respeito da inclusão, seus conceitos, seus dilemas e como a formação continuada poderá ser um grande aliado na reconfiguração da escola na perspectiva da inclusão. A segunda seção apresenta os caminhos metodológicos adotados e por fim apresenta-se os resultados a partir da intercessão das ideias dos autores pesquisados. DISCUSSÕES TEÓRICAS Esta seção apresenta as discussões teóricas que fundamentaram o pesquisador na compreensão de saberes relacionados ao tema da inclusão escolar e da formação continuada para os docentes. EDUCAÇÃO, SOCIEDADE, PÓS MODERNIDADE E INCLUSÃO: Para compreender como a inclusão se configura na atualidade, é necessário discorrer de modo geral como a sociedade se apresenta. Assim, buscou-se nas ideias de Baumam (2014), Santos (2016) e Libâneo (2016) o referencial teórico para descrever a chamada pósmodernidade e como esta se relaciona com a inclusão escolar. O termo sociedade pós-moderna aqui apresentado segue os pensamentos de Baumam (2014) que compreende a sociedade de forma fluida, líquida, passageira. Não há mais espaços para as certezas. A transitoriedade das ações e das ideias é o elemento propulsor da modernidade líquida. Essa fluidez acarreta consequências enormes para o dia a dia do indivíduo e este necessita se reinventar diariamente para que pelo menos faça parte deste cenário de incertezas. De acordo com as contribuições teóricas de Libâneo (2016) a sociedade atualmente se caracteriza pela instabilidade teórica e pela alienação do indivíduo frente ao aprofundamento de ideias que deveriam ser o sustentáculo de um repensar suas ações. Esse distanciamento do debate teórico ou como o autor chama de “superficialidade teórica” promove um arraigar de ações tidas como normal durante séculos. Inclusive, o termo “Normalidade” aqui é apresentado de acordo com as ideias de Santos (2016) que traz o termo para demonstrar que a sociedade (homem) tende a se acomodar e resistir diante de qualquer ação que se distancie da que estava acostumado. Ainda nas teorias de Santos (2016), o paradoxo liquidez versus resistência se configura um desafio enorme para a inserção e implementação da política inclusiva. O autor apresenta uma reflexão importante nesse desestabilizar teoricamente. Para ele, a educação é o caminho que deveria introduzir essa cultura da pesquisa, da indignação ao que está posto onde a exclusão se configura de forma cada vez mais perversa. Não há espaço para uma educação que pre-

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ga a acomodação, a repetição, o distanciamento de uma reflexão cotidiana. A educação tem que ser conduzida de forma ampla e repleta de inquietações teóricas que poderão ajudar na formação do indivíduo. Porém, os vícios de uma educação tradicional insistem em aparecer nas estruturas escolar e consequentemente nos indivíduos que lá estão presentes. Para Lima (2014) o maior desafio da educação está neste processo de se desprender de “verdades” absolutas e se colocar numa posição de constante inquietação e busca de ideias que possam redimensionar as práticas cotidianas. Esse desestabilizar, necessariamente deve ser uma ação diariamente praticada pelo sujeito. A escola neste contexto tem a obrigação de provocar nos indivíduos o prazer e a necessidade da busca do conhecimento e assim, tornar o aluno (a) sujeito de sua própria aprendizagem, garantindo a chamada autonomia intelectual. De modo geral, a pós-modernidade, ao mesmo tempo em que prioriza os interesses individuais, utiliza elementos e discursos de uma sociedade cada vez mais digital e tecnológica que demanda das interações virtuais no qual é exigido competências e habilidades aos cidadãos como um pré requisito no mundo do trabalho. Toda essa transitoriedade e precarização da coletividade fere os princípios de uma escola inclusiva. Para Mittler (2015) a inclusão foi aderida pelas escolas de forma equivocada, tendo em vista que apesar de ser uma garantia legal que esta presenta na Constituição de 1988 e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9394/96 – LDBEN o que ainda prevalece é a homogeneização em detrimento da heterogeneização dos indivíduos, onde o normal, o padrão é mais considerado e valorizado. Finalmente é importante ressaltar que o contexto de incertezas favorece práticas transitórias e individualizadas que ferem princípios de uma escola efetivamente inclusiva, porém, segundo Lima (2014) os desafios da inclusão devem ser colocados inicialmente com essa criação de uma cultura de indignação e questionamento. Não é uma tarefa simples, porém já se iniciou uma proposta de ressignificação da escola em busca de uma educação menos integradora e mais inclusiva. ENTENDIMENTOS A RESPEITO DE INCLUSÃO ESCOLAR Dentro de um contexto arquitetado no qual o paradoxo da inclusão versus individualização esta presente e bastante vivo, para compreender a relevância da inclusão escolar, faz-se necessário rever alguns entendimentos que foram construídos ao longo doa anos e como esse se concretizam no ambiente escolar e a partir desse momento como surgem novas reflexões que merecem ser trazidas para a discussão do tema. Para Sartoretto (2019) o significado de inclusão esta associado a ideia de respeito as diferenças. Inclusão escolar, assim, deve ser pensada como uma ação dos sujeitos que fazem parte da escola de não somente respeitar a diferença entre os indivíduos, mas criar estratégias de interação e convívio, sempre partindo da ideia da heterogeneidade. A escola na perspectiva de uma sociedade inclusiva, segundo Boaventura Santos (2019) deve ser um ambiente repleto de atividades que assegurem o ser humano a ter não somente valorizada sua individualidade e necessidades, mas um espaço que priorize a diversidade na sua essência. Desta forma, pensar em inclusão escolar é, necessariamente, ter a capacidade de compreender que as diferenças são naturais e assim devem ser respeitadas e trabalhadas. As dúvidas e incertezas de uma ação efetivamente inclusiva, devem ser tratadas como Revista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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“combustível” que movimenta a prática dos sujeitos que fazem parte da escola. Não tem como mudar a prática apenas conhecendo os conceitos de inclusão. A prática (ação e reflexão) deve ser realizada de forma dinâmica e processual, na qual as experimentações e realizações devem ser alvo de uma busca de novos conceitos que nortearão futuras práticas. Mitller (2015) é enfático em apresentar que os entendimentos a respeito da educação inclusiva são primordiais para que as ações práticas sejam efetivadas com a menor chance de excluir e/ou segregar qualquer pessoa que apresente características que se afastem de uma normalidade imposta. Desta forma, o autor declara que a escola e principalmente os educadores devem estar abertos aos seus saberes e não saberes para nortear uma prática mais inclusiva. Do ponto de vista de Sassaki (2016) a inclusão e mais precisamente a inclusão escolar, apesar de todo o amparo legal já existente, necessita ser mais vivido e aprendido de forma concreta pelos sujeitos da escola. O autor apresenta sua preocupação do não fazer inclusivo, pelo fato das pessoas pouco se instrumentalizarem teoricamente e apresentar uma ideia de inclusão superficial que se distancia de uma prática mais humanizadora e efetiva. Esse não fazer a inclusão está acompanhado de uma ação homogeneizadora e segregadora. A discussão sobre Inclusão escolar não pode ficar somente no campo das ideias. Ela precisa ser vivida, presenciada, refletida cotidianamente, reaprendida. Não há receitas prontas a serem usadas como guias nas escolas. Porém, conhecer seus fundamentos são a base de uma ressignificação do dia a dia na escola. E este conhecer os fundamentos (apesar dos avanços significativos teoricamente) precisa virar uma cultura de formação continuada e de um aperfeiçoamento profissional diário do educador. Assim, a inclusão escolar é edificada de acordo com as necessidades de cada espaço escolar. A Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Inclusão apresenta conceitos e entendimentos de como a escola e principalmente seus sujeitos devem se valer dos conceitos de inclusão para que suas ações sejam carregadas de enfrentamentos e principalmente mediados por práticas que trabalhem de fato a diversidade na escola. É relevante trazer a discussão de que a inclusão escolar necessita desta inquietude do cidadão em busca de novas e significativas práticas. Essa cultura de sucesso, infelizmente ainda não é uma regra em todas as escolas. Desestabilizar as certezas é o primeiro passo para a inclusão real. FORMAÇÃO DOCENTE NA PERSPECTIVA DA INCLUSÃO ESCOLAR Um dos pilares na construção de uma sociedade inclusiva, está na compreensão de que as pessoas necessitam estudar, ou seja, para colocar em prática uma escola inclusiva, deve-se ter minimamente conhecimentos teóricos que irão nortear as futuras ações na escola. Neste sentido, a formação continuada surge como um sustentáculo na prática do professor. Para Pimenta (2016) a formação continuada de professores tem que ser efetivada de diversas formas. No entanto, a autora destaca a formação continuada em serviço para que os docentes tenham a capacidade de reinventar suas ações e de construir um fazer diferenciado que não somente agregue a ideia de interação do aluno deficiente, mas que sua prática se efetive na perspectiva de uma sala de aula inclusiva. No entanto, apesar do momento de crescimento de cursos de graduação, pós graduação (lato sensu e stricto sensu), aperfeiçoamento profissional, cursos online etc. A formação precisa ir além do mero repasse de informações e com intenções de certificações. Pensar a formação Revista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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continuada, segundo Libâneo (2016) requer uma preocupação do sujeito em buscar sua autonomia intelectual e um incentivar ao que Shon (2009) denomina de ação, reflexão e ação. Assim, a busca de novas informações e conhecimentos por parte do docente requer esse desprender de saberes prontos e acabados. A ideia da formação de professores deve ser apresentada como um ato de responsabilidade e ousadia dos profissionais da educação nesse processo de reconstruir seu cotidiano. Deve-se evitar as compreensões de que a formação docente é a garantia de uma prática diferenciada. Neste sentido, Libâneo (2016) apresenta uma crítica aos modelos de formação na atualidade. Para o autor, os modelos de formação continuada estão muito mais preocupados no repasse de teorias do que efetivamente instrumentalizar os docentes para a busca incessante do conhecimento, para o autor, essa busca é o que promoverá a mudança efetiva na postura de cada um. As reflexões de modelos de formação de professores para a educação inclusiva avançam nas ideias de Mantoan (2019) quando a professora apresenta a necessidade de os cursos terem este caráter de mutação constante, tendo em vista que a dinamicidade da sociedade traz uma série de repercussões no fazer docente. A autora, inclusive, faz críticas severas aos cursos de formação continuada que, apesar de toda a discussão teórica envolvida, apresentam modelos de formação que pouco incentivam essa criação de uma prática efetivamente inclusiva. A busca por formação continuada está associada ao momento socioeconômico que se vive, pois existe uma tendência em acolher os professores que possuem algum aperfeiçoamento profissional, reduzindo as chances daqueles que não tiveram oportunidade de ampliar seus horizontes teoricamente. Isso significa que o mercado de trabalho coloca como uma de suas exigências a titularidade e a dinamicidade dos profissionais. Como consequência destas exigências, plainam cursos “milagrosos” e formações aligeiradas que demonstram, mas uma preocupação muito mais ligada ao capital do que de fato na transformação do status quo. Ainda nas ideias de Mantoan (2019) essa postura de inquietação do docente deve ser o elemento mais cultivado nas formações que esbarram ainda em currículos fechados e teoricamente amarrados. Desta forma, ao pensar numa proposta de formação continuada em serviço, a autora apresenta uma ideia de formação hibrida, no qual teoria e prática são trabalhadas de forma indissociável e com o apoio das novas tecnologias. Libâneo (2016) defende a ideia de um contínuo de formação docente e para isso, as políticas de formação precisam passar por uma reformulação em seus currículos. Não há mais possibilidade de uma formação ortodoxa e engessada em conceitos. Há uma urgência em promover uma cultura de formação capaz de incentivar novas posturas e ações dos sujeitos que fazem parte da escola. Negar essa dinamicidade, segundo o autor, torna a formação sem sentido e meramente burocrática. Pimenta (2016) reforça a preocupação na oferta de uma formação continuada em serviço. Para a autora, os docentes são responsabilizados pela sua formação, no entanto, não se pode negar a obrigação do Estado em oferecer valorização e formação aos profissionais da educação e para isso a oferta deve ser continua e permanente. Não se pode negar o avanço na oferta de cursos de formação em serviço, porém, ainda há de se questionar a forma como esses modelos são ofertados e implementados nas escolas. Somente a participação não é suficiente para que a mudança de fato aconteça. Revista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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Um ponto que merece uma atenção especial é a ampliação dos materiais e apoio teórico sobre a educação especial na perspectiva da inclusão. Nos últimos 20 anos, segundo a professora Mantoan (2019) houve um acréscimo significativo nas produções teóricas a respeito da educação inclusiva, esse crescimento está diretamente ligado a formação de grupos de pesquisas, cursos de pós graduação e aperfeiçoamento profissional que incentivam na organização de documentos que fundamentam as ações nesta linha de pensamento. Infelizmente para alguns profissionais a formação continuada em serviço serve apenas como uma mera formalidade legal. Não se pode deixar de lado a compreensão de que a busca pela autonomia intelectual nasce do interesse em trazer para a prática docente novas mediações teóricas capazes de evidenciar uma sociedade realmente inclusiva. A efetivação deste modelo, demanda vontade política para ofertar de fato uma formação que seja (não somente a saída para os problemas da inclusão no Brasil) capaz de promover uma desestabilização teórica nos sujeitos que estão na prática da educação inclusiva. O desenho curricular das formações, segundo Silva (2017) permite (ou pelo menos deveria) uma postura dos sujeitos não mais como um ser passivo que apenas absorve os conteúdos que são apresentados (as vezes) de forma completamente desvinculados e desassociados do contexto da escola. Contudo, apesar dos enormes desafios a serem enfrentados nessa nova formatação de sociedade. O que se deve compreender desse momento é a clareza de uma formação capaz de criar no individuo essa preocupação incessante com o aperfeiçoamento de suas práticas cotidianas. Finalmente, ao pensar a formação docente em serviço, Mittler (2015) reforça a operacionalização dessas diante dos momentos de incertezas no qual se vive. Assim, o autor esclarece que as tecnologias educacionais devem ser utilizadas de forma mais intensa e preocupadas com o acesso e adesão de mais docentes, partindo da ideia de que quanto mais pessoas participarem, maior será a disseminação de teorias inclusivas que nortearam futuras práticas. DESAFIOS DA DOCÊNCIA EM TEMPOS DE INCERTEZAS Após a discussão a respeito da inclusão, seus significados, os modelos de formação e principalmente como efetivar essa formação em serviço, faz-se necessário descrever, o que os autores apresentam a respeito dos desafios de pensar numa formação docente em uma sociedade marcada pelas incertezas e pela fluidez teórica própria da sociedade pós moderna. O primeiro desafio apresentado por Libâneo (2016) esta na capacidade de cada professor ter clareza de que, apesar da formação continuada ser uma responsabilidade do Estado, cabe ao docente ter consciência da chamada formação permanente, onde a responsabilidade de atualização profissional é de cada um e para isso o professor deve sair de suas zonas de conforto e adentrar numa ação de continua reflexão sobre suas posturas e práticas. Outro desafio que precisa ser apresentado é que devido ao contexto de isolamento social (consequência da pandemia do Covid-19) as formações usando as novas tecnologias se intensificaram e nem sempre conseguiram alcançar os docentes, pois as resistências nesta forma de aprendizagem (distância e online) ainda são bastante presentes. No entanto, a oferta ainda esbarra na falta de condições físicas das escolas, onde as redes de computadores e a internet não são uma realidade o que faz com que os docentes busquem alternativas para participar desses cursos.

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Segundo a professora Mantoan (2019) o maior desafio a ser enfrentado para a inclusão está no esclarecimento teórico e metodológico de como efetivar na prática a inclusão. E para isso, segundo a autora, a mudança necessariamente perpassa pela formação e aperfeiçoamento profissional, os educadores devem ser incentivados a participarem dessas formações continuamente. Desta forma, cria-se uma postura de constante inquietação por parte do docente que necessita refletir cotidianamente suas ações em prol de um ensino efetivamente inclusivo. Mittler (2015) também reporta a necessidade de desprendimento teórico do professor diante as novas demandas sociais. Para o autor, o docente tende a se acomodar diante de pseudo práticas inclusivas, fruto de leituras superficiais e nem sempre contextualizadas com o que está posto na legislação vigente. Para modificar esta realidade, necessita-se de uma ação contínua de busca por conhecimentos que irão (de certa forma) promover uma mudança na escola. A Inclusão deve ser praticada não apenas como uma forma de integração do aluno deficiente. Só fazer parte desse contexto não permite que a escola trabalhe efetivamente a inclusão. A comunidade escolar precisa compreender que todos são diferentes e que as deficiências não desmerecem e nem desobrigam os alunos a ter uma educação digna e de qualidade. Esse olhar diferente é defendido por Sassaki (2016) como condição para uma política de inclusão que seja capaz de promover o crescimento de todos indistintamente e sem preconceitos. A estrutura física das escolas ainda se torna um agravante para a inclusão a partir do momento em que interfere na socialização, no acesso, na permanência e no sucesso dos alunos. Por mais que as formações atentem e demonstrem a necessidade das escolas estarem preparadas fisicamente para receber todos os alunos, a realidade ainda esbarra numa escola distante de uma educação inclusiva. Libâneo (2016) reforça a necessidade da formação em serviço ser vista como fruto de uma mudança de postura do indivíduo. A busca por novos conhecimentos deveria ser uma prática recorrente de todos os profissionais, isso os tornaria mais engajados com as mudanças na educação, e desta forma cria-se a materialização da formação continuada em serviço. No entanto, o autor destaca a necessidade de modelos de gestão democráticos que tenham a percepção de incluir nos seus planos de ação a formação em serviço e que esta não seja apenas um mero elemento do calendário escolar. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS E ACHADOS DA PESQUISA Para a realização deste estudo, utilizou-se a pesquisa bibliográfica. Segundo Teixeira (2012) este tipo de pesquisa se apoia nos debates e discussões de autores que efetivamente contribuem de forma significativa para construir entendimentos a respeito de um determinado assunto. Desta forma, a pesquisa bibliográfica, necessariamente precisa de um olhar ampliado do pesquisador a respeito do tema e para isso faz-se necessário uma busca intensa dos principais autores e de fontes fidedignas que auxiliem o processo de tomada de decisões e das redações dos relatórios de pesquisa. Ainda a respeito da pesquisa bibliográfica, Severino (2009) atenta para o cuidado que o pesquisador deve ter na seleção dos materiais que servirão de base para a elaboração das análises. Para isso, a busca precisa de critérios bem definidos. Assim, optou-se nesta pesquisa em sites como: periódicos da Capes, repositório de dissertações e teses da UFPA, Revista educação e Sociedade dentre outros que possuem uma confiabilidade teórica. Revista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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A partir das leituras dos artigos desses periódicos, buscou-se fazer uma intercessão dos principais autores que discutem o tema da inclusão e da formação continuada. Assim, para o tema da inclusão escolar os periódicos utilizavam basicamente os autores: Maria Teresa Mantoan, Peter Mittler, Romeo Kasumi Sassaki, Susan e William Staimback e para a temática da formação continuada utilizavam vários autores, porém os que mais apareceram foram: Jose Carlos Libâneo, Selma Garrido Pimenta, Miguel Arroio, Pablo Gentile, Paulo Freire, Antônio Nóvoa, e Demerval Saviani. Após a leitura dos autores supracitados, as resenhas e apontamentos foram o instrumento utilizado para colaborar na elaboração do artigo científico. Durante toda a pesquisa, a descrição dos fenômenos foi realizada por meio de um olhar qualitativo dos fatos. Neste sentido, a pesquisa bibliográfica contou com uma abordagem qualitativa. Para Teixeira (2012) essa abordagem se caracteriza pela potencialidade em analisar as ideias e opiniões dos autores alinhavados com uma postura mediadora e sempre preocupado com a neutralidade acadêmica. RESULTADOS VERIFICADOS A partir das ideias dos autores: Mantoan (2019), Mittler (2015) e Sassaki (2016), ficou esclarecido os significados de inclusão escolar, na qual a mesma tem que ser compreendida além de uma simples integração dos alunos deficientes em espaços de aprendizagem como a escola. Para os autores, a inclusão esta diretamente ligada a capacidade de se reinventar enquanto sujeito que faz parte da sociedade da diferença. Essa percepção de inclusão apresentada, remete a uma forma de ver, pensar e fazer a inclusão como uma ação cotidiana de desconstrução dos saberes e fazeres cristalizados numa escola da homogeneidade. Romper esse paradigma, segundo os autores citados, requer ousadia e competência técnica dos profissionais que fazem parte da educação. Essa compreensão se torna difícil, no momento político, econômico e cultural no qual se vive. Esta contemporaneidade, segundo as ideias de Baumam (2014), Libâneo (2016) e Arroio (2018), instiga o individualismo das pessoas e desta forma dificultará a adoção de uma postura inclusiva que obrigatoriamente precisa de uma concepção e um olhar a partir do diferente, do coletivo. E nesse processo de reconstrução identitária das escolas e da sociedade a figura do professor precisa não somente conhecer os conceitos a respeito da inclusão escolar, mas agir efetivamente de forma inclusiva. Nesse contexto, a proposta de uma escola inclusiva, perpassa necessariamente pela formação do professor que, infelizmente, ainda não consegue se desprender de um modelo homogeneizador de escola que se arrasta ao longo dos anos. Ter esse olhar do aperfeiçoamento constante, da busca por novas propostas pedagógicas, da ressignificação de uma prática educativa, promove nos educadores uma cultura de estudos e de reflexões diariamente. O agir de forma inclusiva (prática) não deve ser desassociado de um conjunto de teorias a respeito da inclusão. A promoção da inclusão escolar demanda um aprender consciente do professor como agente e sujeito da transformação social. Não há mais espaço para conhecimentos atravessados e com modismos educacionais. Desta forma, a tríade ação-reflexão-ação é um dos pilares na escola inclusiva. Não é fácil desprender de conhecimentos arraigados em uma escola que propaga os conhecimentos prontos e acabados e que pouco instiga nos indivíduos essa cultura de busca e formação. Porém, negar o princípio da formação continuada e permanente torna Revista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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ainda mais difícil uma prática inclusiva. Diante do exposto do contexto brasileiro, fica bastante evidente que os autores conseguem promover uma concepção de educação inclusiva, que apesar dos dilemas que ainda assolam a escola, já se tem uma postura de inquietação teórico-metodológica que deve ser promovida pela formação continuada, preferencialmente em serviço. FORMAÇÃO CONTINUADA E PRÁTICA DOCENTE: Tendo como base de estudo os autores: Pimenta (2016), Libâneo (2016), Arroio (2018), Nóvoa (2018) e Saviani (2019) a ideia da formação continuada de professores é um ponto de convergência e que merece uma atenção especial neste processo de mudanças da concepção de inclusão nas escolas. Os autores são enfáticos em afirmar que a formação continuada baliza a prática do professor no dia a dia na escola, porém, alertam que, a existência das formações para esses profissionais não garantem uma mudança de postura e uma ressignificação do cotidiano. Quando se trata de formação específica para a inclusão escolar, Sassaki (2016) e Mittler (2015) alertam que essas formações ofertadas em serviço necessitam ser ampliadas. Os autores defendem uma formação em serviço utilizando de situações do cotidiano escolar e que demandam um olhar diferenciado do professor, principalmente ao ousar em estratégias pedagógicas que tornem o espaço escolar um ambiente de respeito e de trabalho a partir das diferenças e das potencialidades de cada, o que eleva a escola para um ambiente heterogêneo e em consequência disso mais justo e equitário. No que se refere a realidade do Estado do Pará, dentro da Secretaria de Educação, desde 2016, foi implementado uma política de formação continuada em serviço, ofertado pelo CEFOR- Centro de Formação de Profissionais da Educação Básica do Estado do Pará, de acordo com as demandas de cada escola e ou USE (Unidade Seduc na Escola). Nesse contexto, investir na formação do servidor passa a ser uma ação contínua e inseparável das necessidades das escolas (SECRETARIA DE ESTADO DE EDUCAÇÃO- SEDUC-PA, 2019). Um ponto que precisa ser tratado com bastante clareza é a ideia de que Libâneo (2016) e Lima (2014) apresentam a respeito da relevância da formação continuada em serviço. Para os autores, não basta apenas ofertar a formação. É necessário que essas sejam capazes de promover a reflexão sobre a ação, na qual os professores devem questionar suas práticas e ter a capacidade de se reinventar objetivando a aprendizagem significativa dos alunos. Essa formação continuada, mais especificamente quando ligada a questão da inclusão, esbarra em alguns dilemas, principalmente quando ofertados pelas Secretarias de Educação. O primeiro dilema está na oferta demasiada de cursos extremamente teóricos e pouco vinculados a prática e o segundo dilema está na garantia de cursos em serviço, ou seja, durante a carga horária de cada professor. Ainda nas ideias de Libâneo (2116), Pimenta (2016) e Lima (2014) as formações precisam ser ajustadas com temas relevantes e principalmente interligados com o fazer pedagógico dos professores que atuam diretamente nas escolas. A organização dos cursos de formação docente precisa estar atualizada e com propostas dinâmicas na qual permitam aos participantes se perceber enquanto sujeito e objeto de mudança na escola. Revista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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Esse distanciamento entre a teoria e a prática desarticula ações, desmotiva o participante e infelizmente não consegue promover uma mudança efetiva na prática docente. A organização curricular desses cursos deve ser atualizada e promover uma dinamicidade na construção de saberes e fazeres concretos. O QUE ESPERAR DA INCLUSÃO NO CONTEXTO PÓS MODERNO? Com base nas ideias de Mantoan (2019), Mittler (2015), Sassaki (2016) e Sartoretto (2019) são muitos os desafios a serem enfrentados pela escola e pelos sujeitos que nela convivem para tornar um ambiente de fato inclusivo. Os autores concordam que dentre os vários desafios a serem enfrentados cinco são cruciais, a saber: Infraestrutura inadequada, ausência de uma gestão democrática na escola, falta de formação e preparo de professores, distanciamento da família e projeto pedagógico distante dos princípios da inclusão. A questão da infraestrutura inadequada se torna um grande entrave quando o espaço físico deixa de ofertar acessibilidade. As escolas ainda mantém um modelo arquitetônico antigo, com desníveis, sem marcação tátil, sem sinalizações em braile, portas estreitas, ausência de banheiros adaptados etc. O desafio dos modelos de gestão que ainda não conseguem se tornar efetivamente democráticas é um enorme impedimento em busca de um espaço inclusivo. Os modelos de liderança e de supervisão que na maioria é imposta, desconecta a escola de uma cultura da coletividade. As pessoas não apresentam o pertencimento da escola. O gestor que não consegue compartilhar as ações, que não se preocupa com os colaboradores e com o bem estar dos alunos, dificilmente promoverá uma cultura de inclusão. Segundo Mantoan (2019) inclusão é uma ação que demanda pertencimento do sujeito ao espaço no qual está presente. Inclusão é uma ação diária de desprendimento do individual em busca do bem estar coletivo. Assim, as escolas necessitam, por meio de seus gestores, avançar no princípio democrático. A falta ou pouca oferta de formação continuada em serviço é um enorme problema na implementação da inclusão educacional. Sem conhecer os princípios e concepções da inclusão, os professores sentem dificuldades na organização pedagógica de seu trabalho, o que dificulta o processo inclusivo. Para Mittler e Sartoretto (2019) o Estado deveria explorar ao máximo a oferta de cursos de formação de professores para diminuir a exclusão vivida no espaço escolar. Os autores defendem a ideia de que somente a formação não é suficiente, mas é necessária neste processo de ressignificação de ações pedagógicas. Segundo Mantoan (2019), Mittler (2015) e Sassaki (2016) ao pensar a inclusão obrigatoriamente se pensa na parceria com a família. Esse é um ponto crucial na organização de uma escola inclusiva. A família deve ser o grande articulador entre as questões pedagógicas vindas da escola e as necessidades reais dos alunos. Estreitar os laços entre família e escola é um desafio latente na construção de uma sociedade inclusiva. Por fim, apoiados nas ideias de Libâneo (2016), Pimenta (2016), Freire (1994) e Cunha (2014) as ações da escola devem ser pautadas e regimentadas de acordo com o Projeto Político e Pedagógico da Escola- PPP. Este deve ser o instrumento capaz de nortear as ações de seus sujeitos. Os princípios e concepções da inclusão devem ser apresentados de forma clara e específica. É bem verdade que nem sempre o fato da escola ter um PPP atualizado é uma garantia de uma escola inclusiva. O fazer diário é que embasa a inclusão. Não há regras e receitas pronRevista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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tas para ser implementada nas escolas. Inclusão ainda é um desafio a ser enfrentado todo dia. CONCLUSÃO A partir da pesquisa bibliográfica realizada, pode-se concluir que a formação continuada para os professores em serviço deve ser incentivada, sistematizada e operacionalizada, tendo em vista que não se pode pensar em mudanças de paradigmas sem estimular a capacidade de busca de novos conhecimentos. No Estado do Pará, mais precisamente no município de Belém, por meio da Secretaria de Estado de Educação – SEDUC , foi implementada uma política de formação continuada em serviço, porém, as resistências na participação são bastante presentes. Contudo, a oferta de formação continuada em serviço passa a ser um elemento de destaque na construção de uma sociedade menos excludente. Ressalta-se que os autores convergem em alguns pontos, como por exemplo, suas concepções de inclusão e as suas características. O que mais se destaca nas falas dos autores é a ideia de construção coletiva de uma cultura de inclusão. Esse tema recorrente requer um olhar diferenciado e atento dos pesquisadores, tendo em vista que para se avançar na inclusão há uma urgência na ressignificação teórica e consequentemente prática dos docentes. Os avanços na discussão do tema da inclusão e da formação de professores em serviços são significativos e a partir da evolução da compreensão de que não existe uma única forma de se implementar nas escolas a inclusão. Cabe a cada um dos sujeitos da escola refletir sobre sua prática e reinventar uma ação que caminhe nos rumos de uma sociedade e escola inclusiva. A formação continuada em serviço para os docentes já existe e é defendida como ação ímpar no processo de inclusão, porém dentro de uma sociedade marcada pelos princípios individualistas e anti-coletivos (próprios da pós-modernidade) implementar essa política de formação esbarra na oferta de cursos extremamente teóricos e distantes de uma prática concreta. Não se nega que os avanços nas discussões teóricas e na implementação de leis que deveriam assegurar a inclusão nas escolas, pois trazem uma boa base neste processo de ressignificação, no entanto, o fazer diário, a convivência em comunidade, o respeito a heterogeneidade ainda são grandes desafios a serem vencidos por todos que fazem parte da escola.

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Surdos e mercado de trabalho: desafios contemporâneos Maria Cristiane do Carmo Conder 1 Maria Cristina Santos do Carmo 2 Ana Telma Monteiro de Sousa 3 RESUMO O presente artigo tem como objetivo analisar os desafios enfrentados pelos surdos no cotidiano do mercado de trabalho nas empresas em Belém/PA, descrevendo assim as dificuldades e barreiras enfrentadas por eles na comunicação e na execução de suas tarefas. A relevância do tema pesquisado está na importância da contribuição que esta pesquisa poderá trazer, buscando melhorias no setor empresarial para que todos os colaboradores independentes de suas limitações possam ter um espaço mais aberto as diferenças, menos excludente e com menos preconceito. A base teórica do estudo foi pautada por meio de referenciais teóricos como Novaes (2014), Quadros (2007), Mantoan (2003), Sacks (1989), entre outros. No Método optou-se por realizar uma pesquisa do tipo estudo de caso exploratório descritivo sob a ótica da abordagem qualitativa. A metodologia utilizada foi uma pesquisa do tipo estudo de caso exploratório descritivo sob a ótica da abordagem qualitativa. Tendo como lócus de investigação a Escola Estadual Astério de Campos, faculdade FIBRA (Faculdade Integrada Brasil Amazônia) e no (SINE) que fica dentro do CIIC (Centro integrado de inclusão e cidadania), envolvendo pessoas com surdez que estão no campo de trabalho, no período de 18 de setembro a 09 de dezembro de 2019. Os resultados demonstraram que as práticas de contratação dos funcionários surdos ainda ocorrem de forma excludente entendendo que apesar das dificuldades encontradas pelos surdos no mercado de trabalho, eles podem superar barreiras que impedem o exercício de sua cidadania recebendo o apoio da família e escola como elementos estimuladores para seu sucesso profissional. Consideramos É fundamental que se perceba que a questão da inclusão da pessoa surda no mercado de trabalho não é apenas uma luta de quem possui alguma deficiência, mas de todos, o que denota a necessidade de uma mudança na sociedade, visando a beneficiar todo e qualquer cidadão. Palavras-chave: Surdo. Inclusão. Mercado de trabalho.

1 INTRODUÇÃO O intuito do presente trabalho é analisar a inclusão e os desafios enfrentados pelas pessoas surdas no mercado de trabalho, preocupação esta que vem ganhando espaço na sociedade, hoje um pouco mais atenta à diversidade humana. Sawaia (2007), afirma que a inclusão e exclusão são faces de uma mesma moeda e, nesse sentido, a luta por inclusão somente se justifica em espaços impregnados por exclusão. Apesar da existência do amparo legal que se refere à lei 13.146/2015 que institui a lei brasileira de inclusão da pessoa com deficiência (estatuto da pessoa com deficiência) é percebido na sociedade indícios de preconceitos não garantido o exercício da cidadania. 1

Especialização em Psicologia Educacional; CONDER, Maria Cristianne do Carmo; Universidade do Estado do Pará – UEPA. Email: cristianeconder@gmail.com 2 Especialização em educação especial; CARMO, Maria Cristina Santos; Faculdade Ipiranga. Email: mariscarmo1000@gmail.com 3 Doutorado em Gestão educacional; SOUSA, Ana Telma Monteiro de; Universidade do Estado do Pará – UEPA. Email: anatelmasousa@gmail.com

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É fundamental percebermos a questão da inclusão não apenas como uma luta de quem possui alguma deficiência, mas de todos, denotando a necessidade de uma mudança na sociedade, visando a beneficiar todo e qualquer cidadão. Diante deste contexto sentimos motivados a pesquisar e discutir a cerca deste tema ao tentar sensibilizar as empresas sobre a pessoa com deficiência, de modo que entendam a importância de promover uma inclusão social mais justa e desprovida de assistencialismo. A relevância do tema pesquisado está na importância da contribuição que esta pesquisa poderá trazer, buscando melhorias no setor empresarial para que todos os colaboradores independentes de suas limitações possam ter um espaço mais aberto as diferenças, menos excludente e com menos preconceito. Apesar de existir uma legislação, ainda observamos ações excludentes, visto que, muitas vezes, a inserção da pessoa com deficiência em diversas esferas da sociedade, avigoram-se os preconceitos e as medidas segregativas. A inclusão dos sujeitos surdos no mercado de trabalho traz um desafio vivido não somente pelo surdo, mas, também pela família que acompanha seus passos e pode ter papel decisivo nos caminhos percorrido com base nos autores Quadros (2007), Mantoan (2003), Sacks (1989), Novaes (2014), Sawaia (2007), entre outros. Diante do contexto surge a seguinte questão da pesquisa: quais os desafios enfrentados pelos surdos no mercado de trabalho nas empresas em Belém? Pretendemos também buscar respostas para as seguintes questões norteadoras que remetem as reflexões: Como as empresas tratam a inclusão da pessoa surda no meio laboral? Quais formas de assessoramento estão sendo oferecidas as pessoas surdas para superar suas limitações nas empresas? Quais as barreiras que impedem o crescimento do surdo dentro da empresa? Como objetivo geral analisar os desafios enfrentados pelos surdos no cotidiano do mercado de trabalho nas empresas em Belém/PA, além disso, investigar como as empresas tratam a inclusão do surdo no meio laboral; conhecer as dificuldades enfrentadas pelos mesmos; e identificar as barreiras enfrentadas na execução de tarefas na empresa. 2 O SUJEITO SURDO E O MUNDO DO TRABALHO: POSSIBILIDADES E LIMITES DE ATUAÇÃO Segundo Novaes (2014) os relatos históricos a respeito do tratamento recebido pelos surdos possuíam um caráter de perversidade, os surdos travaram grandes batalhas pela afirmação da sua identidade, da comunidade surda, de sua língua e da sua cultura, demonstrando avanços e recuos na abordagem social, emprestada a questão legal das deficiências, refletindo na seara do mercado de trabalho e no uso de força humana. As investigações históricas demonstram as diferentes formas que os surdos eram vistos ao longo do tempo, na Roma antiga, tanto os nobres como os plebeus tinham permissão para sacrificar os filhos que nasciam com algum tipo de deficiência. Em Esparta, os bebês e as pessoas que adquiriam alguma deficiência eram lançados ao mar ou em precipícios. Conforme O autor (2014), ainda reforça que em Atenas, uma lei determinava a morte das pessoas\ inúteis, quando a cidade estava sitiada, para aumentar a chance de sobrevivência dos perfeitos. A própria Igreja Católica adota comportamentos discriminatórios e de perseguição, substituindo a caridade pela rejeição àqueles que fugiam de um “padrão de normalidade” devido às Revista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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incapacidades físicas, os sérios problemas mentais e as malformações congênitas eram considerados, quase sempre, como sinais da ira divina, taxados como castigo de Deus. Para Mazzotta (2005, p.16) A própria religião, ao colocar o homem como “imagem e semelhança de Deus”, portanto, ser perfeito, acrescia a ideia da condição humana, incluindo-se aí a perfeição física e mental. E, não sendo parecidos com Deus”, os portadores de deficiências (ou imperfeições) eram postos à margem da condição humana, e tidas como culpadas de sua própria deficiência.

Nesse sentido, destacamos o entendimento de que a raiz de quase todas as formas de exclusão e, consequentemente, preconceito, e, discriminação contra as pessoas com deficiência foi construída ao longo da história, e que as mesmas são vistas como inúteis e sem valor para o meio social incluindo o meio produtivo. Batista (2004,) Afirma que: A inclusão social é geralmente almejada não só pelas pessoas com deficiência, mas por todo indivíduo que se sente excluído, de alguma forma, do convívio social. Os parâmetros para definir o que seja essa inclusão social são vagos ou de difícil quantificação, mas parece evidente que a inclusão social significa mais do que a mera sobrevivência.

Diante do exposto percebemos que desde os primórdios já se tinha uma grande dificuldade quanto o termo inclusão sido em muitos casos compreendido de forma equivocada, pois na maioria das vezes é adotado do ponto de vista social como sendo apenas incluir, colocar junto. Entretanto, a inclusão é antes de tudo um processo de se autoanalisar, de procurar no outro o que ele tem a nos oferecer, de perceber a forma como vê a vida, as coisas e as pessoas. Portanto, fica patente que a inclusão social engloba a aceitação das diferenças individuais e à valorização de cada pessoa na convivência dentro da diversidade humana. Kelma (2010) explica: a família apresenta uma estrutura razoavelmente estável, com regras e valores próprios, interdependência entre os seus membros e que, além disso, é um grupo social pequeno. Diante desse fato, é possível compreender que a família é a principal instituição social que influenciará no desenvolvimento do indivíduo, especialmente por estabelecer as primeiras experiências de convivência e interação com o meio. Ainda com o autor (2010), A família é parte fundamental neste cenário, pois cabe a ela à aceitação de sua criança com deficiência e à construção – ou não – de um ambiente familiar mais preparado para incluir essa criança como membro integrante, participando de suas conquistas, incentivando e abrindo as portas do mundo para que ele tenha acesso á escola e oferecendo condições para que se desenvolva como qual quer indivíduo. A primeira atitude importante dos pais consiste em acreditar nas potencialidades de seus filhos, considerando capaz de estudar, de ser independente, de trabalhar, praticar esportes e outras coisas que uma pessoa sem deficiência faz. O acesso precoce a língua de sinais é fundamental para que o indivíduo surdo se desenvolva linguisticamente e tenha possibilidades para comunicar seus desejos, necessidades e opiniões permitindo assim que o mesmo possa significar o mundo e a si próprio com a ajuda dos familiares. Aliada a família, a escola surge como uma instituição capaz de favorecer a construção de saberes, preparando o surdo para atuar de maneira competitiva no mercado de trabalho, com as mesmas chances que tem os ouvintes. A escola tem um papel significativo, não só para o deRevista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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senvolvimento cognitivo e social das crianças, mas também para sua saúde psíquica, pois ela é o primeiro espaço social promotor de separação entre a criança e a família, estabelecendo um importante elo com a cultura. De acordo com Batista (2004) a escola exerce a função mediata, é a instituição responsável pela passagem da vida particular e familiar para o domínio público, tendo assim a função social reguladora e formativa dos alunos. [...] Ela precisa assumir um compromisso com as mudanças sociais, com o aprimoramento das relações entre os cidadãos, com o cuidado e respeito em relação ao mundo físico e aos bens culturais que nos circundam. Em relação à inclusão do aluno surdo no contexto escolar, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (LDB, nº 9394/1996) estabelece que os sistemas de ensino devam assegurar, principalmente, professores especializados ou devidamente capacitados que possam atuar com qualquer pessoa especial na sala de aula. Neste sentido, entende-se que o aluno surdo tem o direito de frequentar uma sala de aula da rede regular de ensino e de ser atendido pedagogicamente em suas necessidades. Quando tratamos de inclusão do surdo ao mercado não se pode deixar de enfatizar sobre o trabalho, que proporciona integração social possibilitando o relacionamento entre pessoas, fazendo com que o indivíduo possa formar sua identidade, se incluindo na sociedade com sentimento de pertencimento a um grupo. Neste contexto os deficientes auditivos não poderiam ficar a parte deste processo. A partir deste entendimento, Aranha (2001) aponta que a criação de mecanismos para inserir pessoas com deficiência no mercado de trabalho é parte de um amplo processo de inclusão social. Esse processo se fundamenta no reconhecimento da diversidade em sociedade, garantindo o acesso a todos, independentemente de suas particularidades, como nos é referido na constituição federal de 1988 que garante direitos sociais básicos. Entretanto nem sempre esses direitos assegurados por lei condizem com as possíveis condições. Não se está tratando somente de contratação de pessoas surdas, mas também de oferecer as possibilidades para que possam desenvolver seus talentos e permanecer na empresa, atendendo ao critério de desempenho previamente estabelecido. Segundo Novaes (2014, p.122), “muitas vezes, as pessoas surdas são contratadas, principalmente no âmbito particular, e colocadas em posições subalternas e humilhantes, não valorizando as áreas nas quais possui talentos e melhores aptidões”. Para que o surdo seja inserido de uma forma menos excludente se faz necessário que haja adaptações, pois as pessoas ouvintes se sentem incapacitadas para a comunicação com o mesmo, pelo fato de não saberem a Língua de Sinais e não se sentirem preparadas para o convívio. Desta forma os surdos acabam sendo discriminados por algumas pessoas, isolando-se da sociedade e do trabalho. Segundo Bertolin, (2004, p.168): A discriminação das pessoas com algum tipo de deficiência, no que diz respeito ao acesso ao trabalho, assume uma dimensão considerável, pois significa excluí-las da sociedade negando-lhes a condição de cidadãs”. Assim, a discriminação no âmbito do trabalho, consiste em se negar ao trabalhador um tratamento igualitário em relação aos demais, tanto para a aquisição, quanto para a manutenção de um emprego.

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Para combater a banalização social é preciso defender a dignidade da pessoa com deficiência, entendendo que ela depende de todos os direitos (econômicos, sociais, civis, políticos), devemos trabalhar para uma realidade que supere as diferenças sociais, entre o direito de viver e o direito de dignidade, para que possa ser abandonada a idéia de um sujeito movido de carência e possamos criar possibilidades para nascerem novas potencialidades (SAWAIA, 2004). Para a autora supracitada, deve-se, também, considerar a subjetividade humana como uma experiência ativa de sujeitos livres, que expressa a singularidade de cada um dentro da comunidade, e permitir que possamos compreender que essas singularidades estão em busca do fortalecimento das diferenças e das singularidades diversas e não do bem da igualdade. Contudo, não seria possível iniciarmos uma reflexão sobre qualquer legislação sem antes se resgatar a Constituição Federal, promulgada em 1988, a qual oferece subsídios para garantia dos direitos sociais básicos dos cidadãos e o exercício pleno de liberdade. Tendo como princípio da igualdade e do tratamento idêntico perante a lei. No inciso XXXI do art.7°, a “proibição de qualquer discriminação no tocante a salários de administração do trabalhador com deficiência”, visando a existência de igualdade de direitos trabalhistas entre as pessoas com ou sem deficiências. A lei 8.213, de 24 de julho de 1991 - dispõe informações sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social. Conhecida como “Lei das Cotas”, em seu art. 93, estabelece também a reserva de vagas para pessoas com deficiências. Novaes (2014) descreve que o número de funcionários e o percentual de vagas destinadas as pessoas com deficiência são: I – de 100 a 200 empregados 2%, II – de 201 a 500 3%, III – de 501 a 1000 4%, IV – de 1001 em diante 5%. Para tanto as empresas que estiverem de acordo com a Lei de Cotas devem garantir, no mínimo, aos seus funcionários com deficiência o direito de ir e vir, bem como adequar o local de trabalho de acordo com a necessidade físicas e psíquicas da pessoa, além de garantir todos os seus direitos conforme legislação. O funcionário com deficiência deve exercer suas funções e consequentemente cumprir suas obrigações sem direito a qualquer forma de paternalismo ou regalias especiais. Outra lei que também ampara os deficientes, incluindo os surdos, é a Lei n°.7.853/89, em seu artigo 8°, inciso III, caracterizando como crime punível com reclusão, de um a quatro anos e multa, negar sem justa causa, a alguém, por motivos derivados de sua deficiência, emprego ou trabalho. Este comando legal visa proteger o direito das pessoas com deficiência ao acesso em residências na qualidade de autônomos, em empresas privadas, etc. (NOVAES, 2014). (NOVAES, 2014, p. 111) afirma que: “Todo trabalhador deve ter o ambiente de trabalho com condições essenciais para desenvolver suas atividades, e não é diferente com o funcionário com deficiência”. Conforme Batista (2004), [...] a presença da pessoa com deficiência pode ser benéfica para a empresa até por seus efeitos secundários, ou seja, a presença de um “estranho” na organização pode quebrar a rotina alienante do ambiente de trabalho. O processo de identificação e aceitação da própria limitação, propiciado pela afinidade com a pessoa com deficiência, pode possibilitar relações mais afetivas no ambiente do trabalho e contaminar positivamente outras relações. A afirmação de que a presença dos mesmos no ambiente de trabalho humaniza as relações supõe-se ser um processo dessa natureza.

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Apesar de existir um esforço por parte das legislações para a inclusão da pessoa com deficiência, ainda se observam ações excludentes, visto que, muitas vezes, ao se tentar incorporar a pessoa com deficiência em diversas esferas da sociedade, ainda encontramos preconceitos e as medidas segrega tórias. 3. PASSOS METODOLÓGICOS A pesquisa foi realizada através de estudos bibliográficos para conhecer um pouco mais a respeito do surdo e o trabalho, foram realizadas visitas a alguns locais, para que desta forma pudéssemos entender como se dar o percurso da entrada do surdo no mercado de trabalho. Optamos por realizar uma pesquisa de campo do tipo exploratória descritiva sob a ótica da abordagem qualitativa, tendo em visto que, busca levantar informações sobre um determinado objeto, delimitando assim um campo de trabalho, mapeando as condições de manifestações desse objeto (SEVERINO, 2000, p.132). Tendo como lócus de investigação a Escola Estadual Professor Astério de Campos, faculdade FIBRA e o CIIC (Centro de inclusão e cidadania), envolvendo, 1 assistente social do (SINE), 2 funcionários surdos e 1 coordenadora da (FIBRA), 2 funcionários surdo da escola Astério de Campos no período de 18 de setembro a 09 de dezembro de 2019. Onde investigamos como se desenvolve o processo de introdução do surdo no mercado de trabalho, mantendo a veracidade dos fatos sem que haja distorções ou tendenciosidade na coleta de dados para que não interfira nas conclusões da pesquisa. Como instrumento de coletas de dados foi utilizado a observação tendo como roteiro orientador os objetivos do estudo, com intuito de afirmar com mais segurança que qualquer método investigativo deve valer-se em mais de um momento (GIL, 2008). De acordo com Gil esta técnica consiste em que o pesquisador participe de atividades cotidianas relacionadas a uma área da vida social, a fim de estudar um aspecto de vida por meio da observação de eventos em seus contextos naturais. Outro tipo de técnica utilizada nesse trabalho foi a entrevista semiestruturada na qual consiste em uma conversa entre o investigador e o investigado e que possibilita conhecer o contexto de cada indivíduo. Baseado neste contexto “o entrevistador tem uma maior liberdade para desenvolver e direcionar perguntas que considere adequada a situação” (LAKATOS, MARCONI, 2003). Diante do exposto, entrevistamos colaboradores surdos e ouvintes através de um roteiro de questões abertas e fechadas que serviram como suporte de análise para coleta de dados. Essa é uma vantagem desse tipo de entrevista, pois o entrevistador não se prende ou segue à risca um determinado roteiro, dependendo do desenrolar da conversa, ele poderá construir ou levantar novos questionamentos, Os sujeitos da pesquisa foram Colaboradores surdos e ouvintes, nas quais foram entrevistados a assistente social do (CIIC) coordenadora da (FIBRA) e surdos da (FIBRA) e da escola Astério de campos que foram nomeado logo abaixo como S1,S2,S3,S4.em que se buscou destacar os aspectos mais importantes relatados pelos participantes quanto à comunicação, relacionamentos e trabalho, com o objetivo de saber como vivenciam o processo de comunicação e a introdução deste surdo no meio laboral.

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4 RESULTADOS 4.1 A importância da comunicação no ambiente de trabalho para o surdo Os seres humanos são altamente relacionáveis, e com isso a comunicação se torna a base de todas as atividades. O homem sempre esteve em busca e maneiras de relacionar que fossem eficientes, e hoje não é diferente. Temos diversas formas de estabelecer relações pessoais e profissionais a fim de gerar compreensão e engajamento. O surdo, por conta da dificuldade de comunicação decorrente de sua perda auditiva, encontra barreiras por não compartilhar a mesma língua de uma pessoa ouvinte fazendo com que a comunicação se torne um obstáculo para desenvolver seu trabalho com presteza. De acordo com Brito Junior et al. (2019), dentro do processo interpretativo da língua de sinais para a língua oral algumas modalidades, competências e habilidades deve ser envolvido nas práticas pedagógicas, pois é de fundamental importância a presença do interprete para que ocorra de fato o processo de inclusão. A própria lei nos mostra o quanto é importante a comunicação pois a inclusão social do surdo alcançou respaldo a partir da Lei Federal nº 10.436 onde se destacam o Art. 1º-onde é reconhecida como meio legal de comunicação a expressão a Língua Brasileira de Sinais- Libras e outros recurso de expressão a ela associados” O decreto Nº 5.6266 regulamenta a Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002, considerando a pessoa surda aquela que, por ter perda auditiva, compreende e interage com o mundo por meio de experiências visuais, manifestando sua cultura principalmente pelo uso da Língua Brasileira de Sinais – Libras no entanto ainda se precisa algumas melhorias para que de fato o surdo possa ter uma comunicação mais inclusiva e menos excludentes. Foi perguntado como ocorria a comunicação no meio laboral, se sabia Libras (língua de sinais). A grande parte dos entrevistados ouvintes afirmaram que não conseguiam se comunicar em libras, quanto aos surdos disseram que só conseguem a comunicação com os ouvintes através de gestos ou através da escrita em um caderninho de anotação pois a grande maioria não consegue se comunicar através da língua de sinais. Coordenadora- “Sei o básico, mais nossa comunicação com eles é falar pausadamente para que façam a leitura labial e a escrita em cadernetas ”. Assistente social - “Aqui temos uma equipe que auxilia como interprete, pois, sabemos minimamente comunicar em libras” Coordenadora – “Os surdos têm dificuldade de entendimento mais a partir do momento que compreendem desenvolvem suas funções normalmente”. S1- “ Não consigo fazer que entendam o que desejo repassar, muitos não sabem libras e muitas vezes não tem paciência”. S2 – “Tem uma variável, pois, nem todos são fáceis de oralizar depende de como a pessoa fala, mexendo a boca, fala muito fechado, baixo, desvia o olhar tem todos os fatores que atrapalham a oralização”. S3 – “Prefiro logo oferecer um caderno de anotação para que possa me comunicar com o ouvinte, no entanto muitos não têm paciência e prefere procurar outro colaborador que seja ouvinte neste momento me sinto ignorado isso me deixa triste”. S4 –“Devido estar trabalhando em escola de surdo não tenho tanta dificuldade no meu ambiente de trabalho”.

A trajetória na comunicação de surdos tem provocado permanentes questionamentos acerca das marcas que são deixadas nos mesmos nos espaços onde elas trabalham e convivem, pois ‘durante a pesquisa foi percebido que nos lugares que foram visitados não havia uma preocupação dos ouvintes em rever a comunicação entre eles e o surdo, nos parece que da maneira que estar sendo posta estar contribuindo positivamente para o desempenho do surdo no Revista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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meio laboral. Quanto ao depoimento do surdo notamos que os mesmos sofrem com a maneira que estar sendo conduzida a comunicação no ambiente de trabalho. Foi perguntado se havia um assessoramento para que a comunicação se tornasse mais eficaz, obtivemos como resposta: Coordenadora- “não temos nenhum tipo de assessoramento, tentamos nos comunicar e nos adaptar para que possamos nos relacionar sem maiores dificuldades”. Assistente social – “ O assessoramento que temos é a presença de uma equipe de tradutores que nos auxilia em oferecer alguns cursos de libras”.

As maiorias das organizações se preocupam apenas em cumprir as cotas, sem focar na qualificação dessa mão de obra ou em intervenções que poderiam melhorar seu desempenho no trabalho. Para Novaes (2014, p.122), “muitas vezes, as pessoas surdas são contratadas, principalmente no âmbito particular, e colocadas em posições subalternas e humilhantes, não valorizando as áreas nas quais possui talentos e melhores aptidões”. Para que o surdo seja inserido de uma forma menos excludente se faz necessário que haja um assessoramento por parte das empresas, pois as pessoas ouvintes se sentem incapacitadas para a comunicação com o mesmo, pelo fato de não saberem a Língua de Sinais e não se sentirem preparadas para este convívio.

4.2 Preconceitos e inclusão no ambiente de trabalho A inclusão social é importante desde o âmbito familiar, e em seguida na fase da escolarização, para que a pessoa com deficiência se sinta integrado para quando iniciar sua vida adulta no mercado de trabalho não se sinta excluído dentro da sociedade. Sawaia (2007), afirma que a inclusão e exclusão são faces de uma mesma moeda e, nesse sentido, a luta por inclusão somente se justifica em espaços impregnados por exclusão. Observamos que, apesar das pessoas com deficiência chegarem a diferentes espaços, com direitos garantidos por lei, não significa que houve mudança no imaginário ou na consciência da sociedade como um todo, sobre sua capacidade ou direito de ocuparem este espaço. Novaes (2014) destacamos o entendimento de que a raiz de quase todas as formas de exclusão e, consequentemente, preconceito, e, discriminação contra as pessoas com deficiência foi construída ao longo da história, e que as mesmas são vistas como inúteis e sem valor para o meio social incluindo o meio produtivo. Discorrermos sobre surdez e preconceito é descrevermos uma das interfaces do ser surdo, quando se trata de inclusão do surdo ao mercado não podemos deixar de enfatizar sobre o trabalho, que proporciona integração social possibilitando o relacionamento entre pessoas, fazendo com que o indivíduo possa formar sua identidade, se incluindo na sociedade com sentimento de pertencimento a um grupo. Neste contexto os surdos não poderiam ficar a parte deste processo. Desta forma os surdos acabam sendo discriminados por algumas pessoas, isolandose da sociedade e do trabalho. Segundo Bertolin, (2004, p.168): “A discriminação das pessoas com algum tipo de deficiência, no que diz respeito ao acesso ao trabalho, assume uma dimensão considerável, pois significa excluí-las da sociedade negando-lhes a condição de cidadãs”. Assim, a discriminação no âmbito do trabalho, consiste em se negar ao trabalhador um tratamento igualitário em relação aos demais, tanto para a aquisiRevista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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ção, quanto para a manutenção de um emprego. Foi perguntado como o surdo se sente no ambiente de trabalho, foi obtido como resposta: S1 – “apesar de muitos nos compreender, ainda sinto muito preconceito das pessoas ouvintes e isso me deixa triste”. S2 – “me sinto acolhido em relação aos colegas de trabalho, já em relação alguns alunos tem umas parcelas que despreza o surdo”. S3 – “gosto das pessoas que trabalham comigo por que já conseguem compreender minha dificuldade então é mais fácil, mais tem aqueles que ignoram o surdo achando que não somos capazes de exercer a nossa função” S4 – “me sinto muito bem não tenho problema, até porque já estudava aqui antes de me tornar colaboradora”.

Para combater a banalização social é preciso defender a dignidade da pessoa com deficiência, entendendo que ela depende de todos os direitos (econômicos, sociais, civis, políticos), devemos trabalhar para uma realidade que supere as diferenças sociais, entre o direito de viver e o direito de dignidade, para que possa ser abandonada a ideia de um sujeito movido de carência e possamos criar possibilidades para nascerem novas potencialidades (SAWAIA, 2004). Ainda com a autora (2004), devemos também, considerar a subjetividade humana como uma experiência ativa de sujeitos livres, que expressa a singularidade de cada um dentro da comunidade, e permitir que possamos compreender que essas singularidades estão em busca do fortalecimento das diferenças e das singularidades diversas e não do bem da igualdade. A inclusão tratamos como um reconhecimento e um olhar com mais profundidade a pessoas que possuem algum tipo de deficiência, uma luta incansável de uma minoria que pretende requerer seus direitos. Se há inclusão é porque houve exclusão, seja ela social educacional em todas as esferas abrangendo a totalidade do desenvolvimento do ser humano. Quando nos referimos a pergunta se a empresa tem preferência por algum tipo de deficiência, verificou-se as seguintes respostas: Coordenadora- “ não sei se tem preferência, mais aqui só temos esses surdos porque foram trazidos por um professor que conhecia eles de uma outra escola e a empresa aceitou a fazer um teste com eles e deu tudo certo” Assistente social – “ Não digo que preferência tácita, expressa, mais uma preferência silenciosa”.

É percebido durante a pesquisa, o quanto é importante o saber olhar o outro sem preconceito pois as limitações que temos não nos impedem de fazer algo que nos dedicamos a fazer precisamos respeitar que todos são iguais mesmo que aparentemente apresente diferenças, de cor, raça, deficiência entre outras aprendendo a olhar para o próximo com o respeito que gostaria para si. O termo “inclusão” é utilizado neste artigo em detrimento do termo “inserção”, pois o primeiro é mais do que estar no meio, é compartilhar, é sentir-se parte integrante de um todo. Segundo (MANTOAN 2003, p. 34) “É preciso que tenhamos o direito de sermos diferentes quando a igualdade nos descaracteriza e o direito de sermos iguais quando a diferença nos inferioriza”. As empresas precisam reinventar-se tornando o local de trabalho igual para todos, o qual seja aceito por todos e a convivência venha a ser amigável entre eles, procurando oferecer Revista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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cursos de Libras e outros métodos facilitando a comunicação entre os funcionários surdos e os funcionários ouvintes a sociedade tem que compreender que as pessoas que tem uma limitação são seres humanos e tem habilidades. E são capazes de vencer, produzir e trabalhar do mesmo modo que todos.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS No decorrer da pesquisa, percebemos que a prática da inclusão social das pessoas com surdez é ainda muito recente no Brasil. Embora existam vários estudos sobre essas pessoas nos diversos âmbitos, especificamente, a inclusão da pessoa surda no mercado de trabalho é processo que ainda está em construção. Ficou evidente neste estudo que a lei de cotas é necessária e que se a mesma não existisse certamente grande parte das pessoas que apresentam algum tipo de deficiência estariam fora do mercado de trabalho, visto que, se vive em uma sociedade que não concebeu a ideia de inclusão, inclusive no campo de trabalho percebe-se esta resistência. O maior problema enfrentado pelo surdo não é a ausência de leis, pois, já se alcançou um nível razoável de proteção. O grande entrave é o da aplicação e eficácia das leis existentes e a valorização do uso das línguas de sinais, necessitando que as empresas possibilitem que seus funcionários tenham acesso a LIBRAS melhorando assim a comunicação entre ouvintes e surdo. Sabe-se que não será fácil efetivar a inclusão somente através de determinações legais, mas o valor da política pública é tornar evidente algo que muitas vezes é ignorado. É preciso que a sociedade reveja sua postura sobre essa parcela da população e aplique o que a Constituição Brasileira dita para que efetivamente a inclusão aconteça, ou seja, que todos os direitos sejam garantidos aos surdo no mercado de trabalho. Constatamos que houve alguns avanços culturais e sociais no trato de questões que envolvem as pessoas surdas, contudo, a vontade política para a execução de programas estabelecidos e de transformação das ideias em realidade continua sendo o grande desafio. Acreditamos que estudos desta natureza possam fazer parte do bojo de pesquisas auxiliem as empresas a participar da construção de uma sociedade mais justa, valorizando os indivíduos em sua singularidade, com seus limites e potencialidades, contribuindo, assim, como instrumento de apoio ao surdo, através da difusão de referenciais que defendam essa perspectiva. No decorrer deste estudo foi possível entendermos que apesar das dificuldades encontradas pelos surdos no mercado de trabalho, eles podem superar barreiras que impedem o exercício de sua cidadania recebendo o apoio da família e escola como elementos estimuladores para seu sucesso profissional. É fundamental que se perceba que a questão da inclusão da pessoa surda no mercado de trabalho não é apenas uma luta de quem possui alguma deficiência, mas de todos, o que denota a necessidade de uma mudança na sociedade, visando a beneficiar todo e qualquer cidadão.

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Uma Historiografia sobre o Logarítmo Martinho Mota Dias Júnior 1 Fábio José da Costa Alves 2 RESUMO O estudo de logaritmo no ensino médio é um conteúdo que requer conhecimentos prévios dos estudantes, necessita de uma base para a sua plena compreensão. Com o objetivo de apresentar uma metodologia diferenciada, foi desenvolvido esta historiografia num sentido de mostrar aos estudantes o surgimento do logaritmo, quem foi o seu precursor e seus colaboradores, a época de seu descobrimento, os acontecimentos históricos referente ao período escolhido, o que estava acontecendo de mais importante nesse tempo e por fim as principais contribuições que cada um dos chamados “personagens contemporâneos” realizaram sobre o tema e/ou invenções, descobertas científicas importantes com relativo destaque histórico na matemática. Como metodologia usamos o diagrama orientador proposto por Chaquiam (2015; 2017). Para compreender este processo de evolução, foi eleito um personagem matemático principal e a partir dele alguns personagens contemporâneos do campo da matemática ou não. O eixo temático relaciona-se ao Ensino, Aprendizagem, Metodologias para Educação Básica e a categoria corresponde é de um artigo. Palavras-chave: História da Matemática. Historiografia. Logaritmo.

1 INTRODUÇÃO O estudo de logaritmo no ensino médio é um conteúdo que requer conhecimentos prévios dos estudantes, necessita de uma base para a sua plena compreensão. E muitas das vezes, os professores indagam não conseguir administrar esse conteúdo de uma forma adequada devido aos vários fatores, tais como: o tempo, que é curto; o conteúdo programático do curso de 1º ano que é extenso; os fatores externos (festas, comemorações, atividades extra classes) e entre outros.

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Licenciado em Ciências, com hab. plena em Matemática (Unama); em informática (IFPA-TUCURUÍ); Especialista em Matemática (UFPA). Mestrando em Matemática (UEPA-2019) e Graduando (Eng. Civil- UFPA-2014). Instituição: SEDUC-PA. 16ª URE. E.E.E.M. Dep. Raimundo Ribeiro de Sousa. E-mail: martinhomotadiasjunior@gmail.com ou martinho.junior@escola.seduc.pa.gov.br 2

Graduado em Matemática (UNESPA), Engenharia Civil (UFPA), Mestrado em Geofísica (UFPA) e Doutorado em Geofísica (UFPA). E-mail: fjca@uepa.br

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Com o objetivo de apresentar uma metodologia diferenciada, foi desenvolvido esta historiografia no sentido de mostrar aos estudantes o surgimento do logaritmo, quem foi o seu precursor e seus colaboradores, a época de seu descobrimento, os acontecimentos históricos referente ao período escolhido, o que estava acontecendo de mais importante nesse tempo e por fim as principais contribuições que cada um dos chamados “personagens contemporâneos” realizaram sobre o tema e/ou invenções, descobertas científicas importantes com relativo destaque histórico na matemática. O artigo começa com uma explanação sobre historiografia defendida por dois autores, em seguida apresentamos uma metodologia conhecida como diagrama metodológico com o tema Logaritmo, nesse diagrama é apresentado os personagens com suas respectivas bibliografias e entre eles é escolhido um personagem principal, junto a isso teremos os colaboradores chamados contemporâneos, nos quais podem ser matemáticos ou não e também os fatos históricos principais ocorridos nesse período. Apresentaremos o cenário mundial do século XVI, destacamos o renascimento, a invenção da imprensa, a reforma protestante. As contribuições dos personagens contemporâneos, as bibliografias dos personagens, a etimologia de logaritmo e finalmente a ideia de logaritmo segundo Napier.

2 DESENVOLVIMENTO A historiografia, segundo Saito (2015) possui duas tendências, a primeira chamada de tradicional e a segunda de atualizada. Ambas poderão embasar a construção de uma interface entre a história da matemática e o ensino. D`Ambrósio (2004, p.166) define a história sendo o conjunto dos acontecimentos humanos ocorridos no passado, e a historiografia o conjunto dos registros, interpretações e análises desses acontecimentos. Assim, dessa forma abordaremos neste artigo a historiografia atualizada na qual o passado é olhado e é contextualizado visando um processo da (re)construção do conhecimento, procurando explicações para as ações dos matemáticos e outros personagens que possam ter dialogado com eles para o desenvolvimento dessa ciência. (SAITO,2015). E ainda, segundo (SAITO;DIAS,2013) a historiografia mais atualizada, busca contextualizar o conhecimento matemático a partir de três esferas da análise histórica: contextual, historiográfica e epistemológica. Com essas três esferas são levados em consideração não apenas os aspectos internos ao desenvolvimento desse conhecimento, mas também os externos. Na esfera contextual acontece quando a investigação sobre um determinado autor de uma obra relata o local e os acontecimentos ocorridos em determinada região. Já a historiografia vai buscar as razões pelas quais um documento foi escrito nesta época, através de análises e estudos críticos das diversas histórias possíveis escritas sobre o mesmo assunto. A epistemológica trata dos conceitos e conteúdos que estão inseridos na obra. Todas se correlacionam para se contextualizar historicamente. Com isso, construímos o Diagrama-Metodológico (CHAQUIAM,2017, p. 31) no qual foi realizada uma pesquisa referente a história da matemática com o tema logaritmo. Nele destacamos as contribuições de diversos autores (personagens) para a evolução deste conteúdo. Como por exemplo: John Napier, Joost Burgi, Henry Briggs e Leonhard Euler. E para cada um desses personagens teremos uma pesquisa bibliográfica, também destacamos alguns colaboradores Revista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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contemporâneos do campo da matemática ou não e apresentaremos fatos históricos do cenário mundial da época. Figura 1: Diagrama Metodológico - Logaritmo

Fonte: Adaptado de Chaquiam, 2017, p.31

CENÁRIO MUNDIAL DO SÉCULO XVI RENASCIMENTO O Renascimento ou Renascentismo ou Renascença é o período de transição entre a Idade Média e a Idade Moderna, ocorrido principalmente na Itália, e se alastrou por toda a Europa. Foi um importante movimento de ordem artística, cultural e científica. Era uma manifestação do espírito humano que colocava o indivíduo mais próximo de Deus. Os burgueses, que surgiram da baixa idade média, patrocinaram muitos artistas e cientistas da época (mecenato) e consequentemente provocou uma divisão do renascimento em três períodos: o Trecento, Quatrocento e Cinquecento. Cada período abrangia respectivamente uma parte do período que vai do século XV ao XVI. No período Trecento, podemos destacar as obras literárias de Petrarca (“de Africa” e “Odes a Laura”) e Dante Alighieri (“Divina Comédia”); as pinturas de Giotto di Bondoni (“O beijo de Judas”, “Juízo Final”,”A lamentação”, ” Lamento ante Cristo Morto”), no Quatrocento, temos a obra de Mona Lisa do italiano Leornado da Vinci e já no final do Renascimento, o Cinquecento com destaque as obras “Auto da Barca do Inferno”(Gil Vicente), “Os Lusíadas” (Luís de Camões). Segundo Woortmann (1996), o Renascimento Também, no período do Renascimento ocorreram várias invenções, tais como o telescópio, o relógio de precisão e a imprensa. Esta última provocou uma verdadeira revolução no terreno da escrita e da leitura.

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INVENÇÃO DA IMPRENSA A máquina de impressão tipográfica foi inventada pelo alemão Johann Gutenberg no século XV, na década de 1430. Revolucionou a reprodução da escrita, pois antes era reproduzidas pelos povos: sumérios com as tabuinhas com escritas cuneiforme; os Egípcios (Papiros); os chineses (Ideogramas) e entre outras. A Bíblia, foi o primeiro livro inteiro publicado por essa nova técnica. Antes da imprensa o acesso a escrita e leitura era restrito a pequenos grupos de pessoas, geralmente escribas. Agora, com o surgimento dela, a Bíblia que era lida em Latim passou a circular melhor entre as pessoas que possuíam um idioma vernáculo (em Alemão) e foi um fato de fundamental importância à Reforma Protestante que surgiu neste período. REFORMA PROTESTANTE Com o surgimento da imprensa, os panfletos e teses do reformista Martinho Lutero, criticando a igreja católica da época, foram se popularizando. Ele era um monge agostiniano e professor de teologia que estava insatisfeito com algumas práticas e questões teológicas defendidas pela igreja católica (Indulgências). Assim, surgiu o movimento reformista, iniciado por Lutero, durante o cristianismo no século XVI e denominou-se de reforma protestante. A atuação de Lutero teve como ponto de partida a divulgação das 95 teses, devido a discordâncias de conteúdo teológico a respeito da salvação e de outras práticas e ações da Igreja. Essas teses rapidamente espalharam-se pela Europa e deram origem ao reformismo. A partir daí surgiu o protestantismo. As causas da reforma protestante estavam relacionadas a aspectos políticos, econômicos e teológicos e, também da corrupção existente na igreja católica. Em relação ao aspecto político vemos o interesse políticos oriundos de nobres que viram na reforma uma possibilidade de romper o vínculo de autoridade com o papa. Além disso, a autoridade do papa impunha-se além do campo religioso, alcançando o campo secular (político). Os reis da Europa tinham seu poder sustentado pela autoridade da Igreja, uma vez que era praticamente impossível manter-se no comando sem a aprovação do papa. Sendo assim, a Igreja Católica possuía o monopólio da vida política e religiosa europeia. No aspecto econômico, uma vez rompido esse vínculo a igreja já não estipulava a cobrança de impostos de todos os fiéis. No aspecto teológico, o ponto imediato a ser destacado é a insatisfação de Martinho Lutero com as práticas da Igreja Católica. A Igreja de Roma era, naquele período, a maior autoridade da Europa Ocidental e detinha um imenso poder, uma vez que era dona de terras e riquezas gigantescas. Antes mesmo de Lutero, muitos começaram a questionar as posições da Igreja. Já havia existido na Europa movimentos religiosos e figuras do clero católico que questionavam determinados princípios do catolicismo. A longo prazo, pode-se ressaltar, por exemplo, os valdenses, que surgiram na França no final do século XII. Em um período imediato, isto é, poucos anos antes do início da reforma, existiram os pré-reformadores na Europa, que teceram críticas à Igreja de Roma. Dois nomes que se destacaram nesse contexto foram John Wycliffe e Jan Hus. O primeiro criticava o acúmulo de poder político e os desvios da Igreja dos verdadeiros ensinamentos de Jesus. O segundo tecia críticas parecidas contra o enriquecimento da Igreja e a venda de indulgências. Martinho Lutero não tinha intenção de romper com a igreja católica, ele queria apenas que se realizasse uma reRevista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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forma em determinadas questões. O rompimento de Lutero com a Igreja Católica só aconteceu quando foi excomungado pelo papa, em 1521. Depois de explanar alguns dos principais acontecimentos ocorrido no século XVI, apresentaremos a seguir alguns personagens e suas descobertas ou invenções que fizeram e estão compreendido no intervalo de tempo do personagem principal escolhido. PERSONAGENS CONTEMPORÂNEOS E SUAS CONTRIBUIÇÕES Aqui relatamos pessoas (personagens contemporâneos) que tiveram destaque no período em que o personagem principal (John Napier) viveu, assim como as contribuições que cada um realizaram sobre o tema e/ou invenções, descobertas científicas importantes com relativo destaque histórico. Dessa forma destacamos as seguintes personagens conforme o diagrama anterior: William Oughtred (1575–1660) – inglês, ministro episcopal, matemático, publicou uma Clavis Mathematicae (A Chave Matemática). Foi o primeiro a usar a simbologia de multiplicação (x) e quem inventou a régua de cálculo (1638), baseando-se num trabalho chamado círculo das proporções, publicado em 1633. Edmund Wingate (1596 -1656) publicou na Inglaterra e na França uma compilação do trabalho de Napier em 1626, cujo título é Logarithmetique arithmetique (logaritmo aritmético). Um segundo trabalho (1633) com o título Fragmentum Logarithmotechnicae (fragmentação técnica dos logaritmos), contém os logaritmos dos senos e das tangentes, medidos todos em graus e minutos pelos quadrantes, cada grau era divididos em 100 minutos. Também, inventou um dispositivo de cálculo baseado nos logaritmos de Brigss, com o nome de Logarithmicae de Tabulae (Tabela dos Logaritmos). John Speidell (1600–1634), calculou os logaritmos naturais das funções trigonométricas, de 1 a 100.000, publicando-os em seu trabalho novos logaritmos. Nesse trabalho houve uma ampliação dos logaritmos e publicou uma tábua de logaritmos diferentes usados por Napier e Briggs. Os logaritmos de Speidell são conhecidos como logaritmos naturais, ou hiperbólicos. Adrien Vlacq (1600–1667), em 1628 refez e ampliou os cálculos logaritmos de 1 a 100.000 e associou-os aos valores trigonométricos e induziu os astrônomos a usarem logaritmos nos seus cálculos. Segundo SOARES (2006, p.35), tinha uma reputação, como certos autores de seu tempo em que o designava pelo nome: “Os tratados de Adrien”. Ludovic Probeni (s/d) é o primeiro autor alemão que adaptou o uso dos logaritmos decimais. Em 1634, publicou seu “Clavis universi Trigonométrica (A chave universal trigonométrica)”. Boventura Cavalieri (1598-1647), discípulo de Gallileu (1564–1642), e geômetra, principal autor da Geometria Indivisível ao fazer uma análise nos logaritmos referente às obras de Napier e Briggs. É claro que neste artigo relatamos uma pequena parte do universo de colaboradores da época, selecionamos os principais para lhe mostrar, em seguida destacaremos a bibliografias dos personagens que realizaram algum tipo de trabalho referente ao tema logaritmo.

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BIBLIOGRAFIAS DOS PERSONAGENS A bibliografia de John Napier, escolhido como personagem principal de nosso diagrama é considerado o criador ou inventor dos logaritmos, temos na visão de Horsburgh (1914): [...] John Naiper, o inventor dos logaritmos, nasceu em 1550, no castelo de Merchiston, perto de Edimburgo. Embora ele deva ter gasto uma parte considerável da sua vida na propriedade de sua família em Lennox e Menteith, ele tinha uma residência em Gartness, a tradição que reivindicava Gartness para a sua terra natal deveria ser abandonada. (HORSBURGH, 1914, p.2). (Tradução: SOARES)

De família rica, estudou em uma das melhores universidade do continente europeu, em Saint Andrew, porém não concluiu os estudos por motivos familiares e religiosos da época. Era considerado um gênio, mesmo sem ter um curso universitário, porém não deixou de estudar e pesquisar, prosseguindo os seus estudos no Ramo da matemática e da teologia. Aos treze anos perde sua mãe e mais tarde com a morte de seu pai, ele voltou a realizar os seus principais objetivos com suas pesquisas e principais invenções no campo da matemática. Napier morreu em sua residência, em Gartness, em 1617. As invenções de Napier não foi somente no campo da matemática, mas também no campo dos instrumentos de guerra, inventou um espelho para queimar os navios inimigos, peças de artilharia, roda de carruagem de metais, motor. Porém a maior de todas as invenções foi a criação do logaritmo, na Escócia apresentou as chamadas barras de Napier ou ossos de Napier que consistia em barras e quadrinhos para efetuar somas de parcelas parciais. Os quadrinhos de Napier eram tábuas de multiplicações montadas sobre as secções quadradas. Esse trabalho proposto por Napier estava apoiado no trabalho de Lucas Paccioli (1445–1517) sobre o método de Gelosia, que consistia em resolver multiplicação usando somas parciais. Outro fator importante que contribuiu para que Napier desvendasse os logaritmos foi o método chamado de prostaférese (prosthaphaeresis – palavra grega que significa adição e subtração) que consistia em transforma multiplicações em adições e subtrações por meio de fórmulas trigonométricas, conhecidas como fórmulas de Johannes Werner (1468–1528). Henry Briggs, um dos admiradores de Napier, professor de geometria em Oxford, nascido em 1561, yorkshire, Inglaterra. Estudou na universidade de Cambrige e formou-se em 1581. Foi professor de Geometria, na universidade de Saint-Andrews e mais tarde em Oxford. Foi o primeiro a reconhecer a importância dos logaritmos de Napier, tendo estabelecido contato com o mesmo para uma troca de ideias. Morreu em 26 de janeiro de 1631, na Inglaterra. Também, definiu conjuntamente com Napier o sistema de logaritmo de base dez, chamado de logaritmos comuns ou briggsianos. Jobst Burgi nasceu em 1552 em Lichtensteig, uma aldeia do cantão de WS-Esfoladura, Suiça. Era de família pobre, modesta e numerosa, deixou a sua terra natal para viver uma vida pobre e difícil, nunca chegou à universidade e não publicou nenhum livro, exceto as tábuas logarítmicas, morreu no ano de 1632 em Kassel (atualmente Alemanha). Um matemático amador e auto - didático, fabricador de relógios astronômicos, realizou trabalhosos cálculos na astronomia e publicou tábuas de logaritmos, em 1620, no qual não houve repercussão devido a Napier ter publicado os seus logaritmos. Apesar de não ter uma cultura literária e tão pouco um domínio do Latim, empecilhos quanto às suas invenções e publicações, possuía habilidades matemáticas com relação a trigonometria, dessa forma ajudou a Kepler e seus companheiros a desvendar algumas relações trigonométricas que não tinham solução e dificultavam os astrônomos da época. Revista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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Burgi foi o primeiro a propor os logaritmos, comparando duas progressões: uma aritmética e outra geométrica, conhecidos posteriormente como logaritmos naturais. Somente após a publicação de Napeir, depois de 6 anos que foi divulgado os seus trabalhos. Leornard Euler (1707–1783) foi um importante matemático e cientista suíço, nasceu na Basileia, Suíça. Em 1720, com 13 anos de idade entrou no curso de Teologia na Universidade da cidade de Basileia e três anos depois recebeu o grau de Mestre em Artes. Com o incentivo do matemático Johann Bernoulli, ingressou no curso de matemática concluído em 1726. Foi convidado pela imperatriz Catarina I para membro da academia de Ciências de São Petersburgo, em 1727. Depois em 1730 assumiu o cargo de professor de Física da academia e após três anos substituiu Daniel Bernoulli (filho de Johann Bernoulli) como professor de matemática. Em 1741, o rei Frederico II da Prússia convidou-o para lecionar em Berlim, permanecendo durante 25 anos e em 1744 é nomeado diretor da seção de matemática da academia. Nessa época, surgiu as famosas “cartas a uma princesa da Alemanha” ensinando a princesa de Anhalt Dessau aulas de física. Sua contribuição teve como um dos pilares a Introdução à Análise dos Infinitos, obra que constitui um dos fundamentos da matemática moderna, publicou diversos textos, entre eles, o livro “Mecânica”(1736-37), quando apresentou extensivamente a dinâmica Newtoniana na forma de análise matemática. Dedicou-se a quase todos os ramos da matemática. Entre suas contribuições mais conhecidas na matemática moderna estão: a introdução da função gama, a analogia entre o cálculo infinitesimal e o cálculo das diferenças finitas, quando discutiu minuciosamente todos os aspectos formais do Cálculo Diferencial e Integral, da época. Foi o primeiro matemático a trabalhar com as funções seno e cosseno. Em 1760, iniciou o estudo das linhas de curvatura e começou a desenvolver um novo ramo da matemática denominado Geometria Diferencial. Uma de suas maiores realizações foi o desenvolvimento do método dos algoritmos com o qual conseguiu, por exemplo, fazer a previsão das fases da lua, com a finalidade de obter informações para a elaboração de tabelas para ajudar o sistema de navegação. Também introduziu a notação moderna para as funções trigonométricas, a letra e para a base do logaritmo natural (agora também conhecido como número de Euler). Durante sua permanência em Berlim, Euler escreveu mais de 200 artigos sobre Física, Matemática e Astronomia e três livros de análise matemática. Euler foi considerado o mestre dos matemáticos do século XVIII. Após conhecer as bibliografias de nossos personagens, é importante, também, saber a origem e os significados dados por diferentes autores sobre logaritmos. A ETMOLOGIA DE LOGARITMO De acordo com Knott (1915, p.11), “a palavra logaritmo antecede da criação de John Napeir, que tem origem nessas palavras λóγων ἀῥιθµóς as quais significam números de razões”. Dessa forma, as razões propostas sobre a etimologia da palavra levaram John Napier a propor os logaritmos, os quais eram usados em termos trigonométricos.. Segundo Miguel e Miorim (2002, p.58-59) esclarecem o significado da palavra logaritmo numa “combinação entre duas palavras em Latim–Lógos e arithmós – que significam, respectivamente, “razão e número”. A junção entre as duas remete ao significado epistemológico da palavra logaritmo como número de razões, sendo que o termo razão refere-se à razão da PG e o Revista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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número, ou seja, o logaritmo, a um termo qualquer da PG. Para Magalhães (2003), a palavra logaritmo segue um conjunto de regras, ou seja, construções que são explicadas num processo de investigação histórica. Ele procura esclarecer o que significa a palavra sob a ótica de sua origem, logaritmos logos – razão; arithmos – número da razão (quantas vezes tomam-se a base como fator para se obter um número). A ideia sugerida por Magalhães assemelha-se àquela proposta por Napier no século XVII. A diferença encontrada sobre essa etimologia reside na maneira como os logaritmos eram explorados. Ao invés de envolver aritmética e trigonometria, apropria-se de um modelo algébrico-funcional baseado no estudo de potenciação e funções exponenciais. A IDEIA DE LOGARITMO PARA NAPIER Napier utilizou para descrever logaritmos a comparação aritmética sobre as razões entre os números, sendo estruturados por meio das relações de Michael Stifel (1544), que consistia em comparar duas progressões matemáticas; a progressão Geométrica (PG) com a progressão Aritmética (PA) de tal modo que o produto de dois termos da PG está associado com a soma dos termos das respectivas PA. Está relação de Stifel era muito semelhante com as barras de Napier, ambas transformavam multiplicações em somas. O logaritmo definido por Napier é bem diferente daquele que é usado hoje, principalmente no estudo de função. A sua ideia envolvia uma aritmética trigonométrica em termos de ângulos sucessivos. Propôs sua primeira análise a respeito do logaritmo através de uma experiência prática. Muitos pesquisadores se interessaram pelo assunto e sua difusão alastrou-se rapidamente pela Europa. No século XVIII, com o surgimento da álgebra, Leonard Euler demonstrou a constante e=2,7182818...chamado por número de Euler, mas como base do logaritmo é conhecido pela classe cientista de logaritmo Neperiano. Já século XX, os logaritmos começaram a ser notificados em termos algébricos por meio de exponenciais, devido ao estudo de função. Para desenvolver os logaritmos, Napier apropriouse das PA’s e PG’s, estabelecendo uma relação entre elas, uma lógica da seguinte forma: Seja duas progressões: uma geométrica e outra aritméticas enfileiradas como mostrar a seguir: 2

4

8

16

32

64

128

256

512

(PG)

1

2

3

4

5

6

7

8

9

(PA)

Então, observou-se que escolhendo dos números na PG, por exemplo 4 e 16. O produto deste dois números está associado a soma dos respectivos número correspondente da PA, 2 e 4, assim 2+4 = 6 que corresponde ao resultado do produto que era almejado, 64. E, se consideramos a PG em forma de potência de base 2 teríamos o seguinte:

Observando essa ideia, deparamos com o conceito de logaritmos, ou seja os termos da PA são os respectivos logaritmos da PG.

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O valor 2 é uma constante elevada aos valores 1,2,3, ...,9. Essa constante 2 denomina-se Base do logaritmo. Os valores dos resultados de cada potenciação (2,4,8, ...512) denomina-se de Logaritmando. E a cada expoente, por sua vez, chama-se de Logaritmo.

Dessa forma temos:

, que corresponde a

e assim por diante.

Generalizando, obtemos:

Diz-se:

Reescrevendo em forma de Logaritmo. Assim, diz-se que “m” é o logaritmo de “b” na base “a” , onde a > 0 e a ≠ 1, b > 0 Para quaisquer que sejam a, b e m reais. Essa forma utilizada para definir o logaritmo não se encontra nos livros didáticos de matemática atuais. Soares (2011). CONSIDERAÇÕES FINAIS No intuito de mostrar a história do logaritmo, surgidas a partir das ideias do matemático John Napier, com a introdução de logaritmos relacionados com as progressões Geométricas e Aritméticas, tudo isso, para desmistificar aquela espetacular fórmula da definição de logaritmo que é lançada para o estudante, de uma maneira “seca” sem uma correlação qualquer e tão pouca histórica. Daí a importância do diagrama metodológico, pois situa o estudante num contexto histórico, faz com que ele reflita e perceba o que acontecia naquela época e, além disso, o estudante percebe que é capaz de construir o logaritmo usando as mesmas ideias de Napier, através das tabelas.

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Decreto Estadual 1.974/2018: Inovação nas Licitações Públicas no Estado do Pará Nícolas Pinto Alves 1 Lívia Donza Barroso 2 João Patrício de Lima Júnior

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RESUMO O presente trabalho tem como objetivo apresentar o Decreto Estadual Nº 1.974/2018 e demonstrar a sua viabilidade na aplicação das licitações na área da educação, fazendo uma comparação com a lei Nº 8.666 de 21 de junho de 1993. Pretendemos, nesta pesquisa, responder a seguinte questão: em que medida a adoção do Decreto Nº. 1.974 de 31/01/2018 contribuiu para reduzir o tempo nas licitações de obras na Secretaria de Educação do Estado do Pará? É uma pesquisa documental, pois a metodologia utilizada constitui-se em uma análise comparativa entre as duas legislações, tomando como categoria o tempo. A escolha dessa categoria se justifica em função da morosidade das licitações realizadas nos moldes da legislação de 1993. É um artigo científico que versa sobre uma nova forma de fazer licitações de obras públicas, na área de educação no Estado do Pará. Para tanto utilizamos uma abordagem descritiva e quantitativa, pois descrevemos e quantificamos o processo de trabalho contido nas duas legislações para maior clareza do que se quer demonstrar e facilitar o entendimento do leitor. O lócus da pesquisa é um órgão público, a Secretaria de Estado de Educação, de forma mais específica o seu Núcleo de Licitação – NLIC e o objeto da análise são as licitações das obras públicas de construção, ocorridas no período compreendido entre os anos de 2017 e 2018. As fontes de pesquisa são os processos licitatórios do NLIC da Seduc, a legislação estadual e federal e dados da Imprensa Oficial do Estado do Pará. A relevância deste trabalho está no fato de ser o primeiro órgão a utilizar essa nova forma de licitação, configurando-se, portanto, como um marco histórico na administração pública do Estado o Pará, significando uma inovação processual. A pesquisa traz como resultado a constatação da celeridade no processo de licitação, portanto, diminuição significativa do tempo entre abertura da licitação com o lançamento do Edital de construção de uma obra e a homologação do resultado. Com isso, houve a diminuição do tempo de análise dos processos, pois antes o NLIC deveria analisar todos os processos que fossem protocolados no setor e nesse novo modelo analisa-se somente aqueles que apresentam mais vantagens para o erário. São resultados da pesquisa que merecem destaque ainda a maior eficiência dos mecanismos presentes na RDC, o que gera contratações mais céleres, por meio de um procedimento com menos burocracia, porém com igual seriedade e ética. Outra vantagem apontada pelo estudo sobre a nova forma licitatória é a melhoria da qualidade da educação, visto que uma obra, de construção ou de reforma traz benefícios para toda comunidade escolar, aumentando o índice de satisfação dos estudantes e de seus familiares. A abordagem teórica fundamenta-se na administração gerencial, cujo foco é o bem estar do cidadão e da cidadã e tem no Decreto 1.974 de 30 de janeiro de 2018 um exemplo. Essa nova forma de licitação recebeu o nome de Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC). Palavras-chave: Licitação. Celeridade. Inovação.

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Técnico em educação pela SEDUC/NLIC. Presidente da Comissão Especial de Licitação. Especialista em Gestão Logística e Patrimonial. Pós-graduando em Licitação e Gestão de Contratos Administrativos.nicolas.alves@seduc.pa.gov.br 2

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Coordenadora do Núcleo de Licitação. Especialização em Direito Constitucional. livia.donza@gmail.com Assistente administrativo da SEDUC/NLIC. Graduação em Letras. Membro Titular. joao.pjunior@seduc.pa.gov.br.

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1 INTRODUÇÃO O presente trabalho tem como objetivo apresentar o Decreto Estadual Nº 1.974/2018 e demonstrar a sua viabilidade na aplicação das licitações na área da educação, fazendo uma comparação com a lei Nº 8.666 de 21 de junho de 1993. Ele permitiu a troca de fase onde se analisa apenas a proposta mais vantajosa, bem como a unificação de prazos de recursais contribuindo para redução do prazo de duração da licitação. O Estado do Pará é o segundo maior Estado do Brasil, em área territorial. Possui 145 municípios conforme dados do IBGE de 2020 e de acordo com a Secretaria de Estado de Educação (SEDUC, 2020), o Pará possui 549.718 estudantes regularmente matriculados na sua rede de ensino, demonstrando assim sua importância social, visto que a educação contribui para a inclusão social e na medida em que esses estudantes se qualificam contribuem para o desenvolvimento do Estado. Entre seus órgãos da administração direta está a Secretaria de Estado de Educação do Pará – SEDUC, cuja responsabilidade é zelar pela educação de qualidade para os seus cidadãos e para as suas cidadãs, sendo que, constitucionalmente compete ao Estado, de acordo com o artigo 10 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional “assegurar o ensino fundamental e oferecer, com prioridade, o ensino médio a todos que o demandarem, respeitado o disposto no art. 38 desta Lei” (BRASIL, Lei 9394/1996). Para garantir o pleno funcionamento das atividades fins a SEDUC precisa desenvolver uma logística para construção, ampliação, reforma e manutenção de suas unidades administrativas e unidades de ensino. Em 2020, segundo a Secretaria de Estado de Educação (SEDUC, 2020) existem, no Pará 844 escolas, bem como 14 unidades anexas, totalizando 858 unidades da rede de ensino estadual, que se forem realizados quaisquer serviços na sua estrutura física necessariamente, o Núcleo de Licitação da Secretaria de Estado de Educação do Pará – SEDUC será acionado. Sua importância no órgão é significativa que o mesmo, de acordo com o organograma da SEDUC, vincula-se diretamente ao Gabinete da Secretária de Educação. Os serviços de compras nos órgãos da administração pública são cada vez mais relevantes, pois segundo Terra (2018, pag. 46), “[...] além de seu valor estratégico, o processo de compras públicas mobiliza e influencia toda a organização e ciclo socioeconômico”, haja vista o poder de compras do Estado. O processo licitatório na SEDUC abrange os mais diversos serviços e produtos que são imprescindíveis para o desenvolvimento da educação no Estado. Além, da construção, reforma, ampliação e manutenção de toda rede física de ensino e de sua estrutura administrativa como já foi citado, compete a esse Núcleo a aquisição da merenda escolar, dos móveis, dos equipamentos e de quaisquer objeto que venha necessitar esse órgão. No ano de 2018, a Secretaria de Educação do Estado do Pará, foi pioneira nesse processo de agilizar a forma de licitar, pois, a Lei Federal 12.462/2011 instituiu o Regime Diferenciado de Contratações Públicas – RDC, porém limitava esta modalidade de licitação somente para Ciência e Tecnologia e Inovação e o Governo do Estado do Pará ao regulamentar essa lei, em nível estadual, institui o Decreto Nº 1.974, com apreciação da Procuradoria Geral do Estado – PGE, estabelece no caput do artigo 1º que: “O Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC) aplica-se exclusivamente às licitações e contratos administrativos necessários à realizaRevista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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ção”, ressaltando no inciso VIII – “das obras e serviços de engenharia no âmbito dos sistemas públicos de ensino e de pesquisa, ciência e tecnologia, possibilitando a utilização dessa forma mais célere de licitação de obras na rede pública de ensino. É sobre essa inovação que este artigo foi elaborado, e a questão que pretendemos pesquisar é a seguinte: em que a adoção do Decreto Nº. 1.974 de 31/01/2018 contribuiu para reduzir o tempo das licitações de obras na Secretaria de Educação do Estado do Pará? Este artigo está assim estruturado: introdução; metodologia; administração burocrática x administração gerencial: um breve histórico; procedimento licitatório: lei federal 8.666/1993 x decreto estadual 1.974/2018; licitações na Secretaria de Estado de Educação; conclusão e referências. 2 METODOLOGIA O presente artigo científico elaborado como resultado de uma pesquisa documental sobre uma nova forma de fazer licitações de obras públicas, na área de educação no Estado do Pará. Utilizamos uma abordagem descritiva e quantitativa, pois descrevemos e quantificamos o processo de trabalho contido nas duas legislações. Zanella (2013, p. 34) destaca que “[...] a abordagem descritiva proporciona conhecer a realidade estudada, bem como suas características e seus problemas”. Esse conhecimento mais aprofundado do objeto somente foi possível porque a pesquisa foi desenvolvida no próprio local de trabalho: Núcleo de Licitação da SEDUC, tendo como sujeitos os autores deste artigo e como objeto de análise as licitações das obras públicas de construção, ocorridas no período compreendido entre os anos de 2017 e 2018. Para Zanella (2009, p. 77) a pesquisa quantitativa é “[...] aquela que se caracteriza pelo emprego de instrumentos estatísticos, tanto na coleta como no tratamento dos dados, e que tem como finalidade medir relações entre as variáveis”. A categoria de análise que utilizamos foi o tempo, isto é a celeridade processual4 , ou seja, o tempo médio de duração do processo licitatório em dias ininterruptos da abertura até a homologação dos resultados. A escolha dessa categoria se justifica em função da morosidade das licitações realizadas nos moldes da legislação de 1993. Os dados foram sistematizados em gráficos para facilitar a interpretação, referente aos certames realizados no período de 2017 a 2018. Os números da pesquisa trazem a comparação da celeridade processual em licitações de obras entre as modalidades de licitações Concorrência e Tomada de Preços, regulamentados pela 8.666/1993 com o RDC regido pelo Decreto 1.974/2018.

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A Emenda n. 45/2004 à CF que acrescentou ao art. 5º o inciso LXXVIII deu ao princípio da celeridade o status de norma supra

legal. O conteúdo do princípio da celeridade processual está ligado a ideia de economicidade, sendo que possui ênfase da nuance temporal, ou seja, o processo deve buscar a construção do provimento final no menor intervalo de tempo possível. (BONFIM, 2008)

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3 DESENVOLVIMENTO 3.1 ADMINISTRAÇÃO BUROCRÁTICA X ADMINISTRAÇÃO GERENCIAL: UM BREVE HISTÓRICO Equivocadamente, o serviço público, em geral, é considerado por determinados usuários brasileiros como ineficiente. As alegações são as mais diversas possíveis: má qualidade no atendimento, morosidade em prestar informações, informações ambíguas. Esse sentimento, lamentavelmente, se estende também às compras públicas, tendo como fundamento, segundo (BATISTA; XAVIER; MARRA; LONGO, 1996) um dos problemas crônicos do setor público no Brasil que é a predominância, em muitos órgãos, de uma prática gerencial fundamentada em estruturas com excessivos níveis hierárquicos e departamentos. Isso gera lentidão administrativa, comunicação formal, burocrática e lenta, além de serviços e produtos que, em alguns casos, não satisfazem à população. Ao investigar sobre a administração pública no Brasil (BRESSER PEREIRA 2009, p. 12) assinala que: [...] o Estado brasileiro passou por duas grandes reformas administrativas – a burocrática, iniciada em 1937, e a gerencial, que começa em 1995. A primeira ocorreu no primeiro governo Vargas, e teve como objetivo transformar a administração pública brasileira que até então era patrimonial em um universo profissional baseado no Estado de Direito e na competitividade técnica; mas amplamente visava tornar o aparelho do estado efetivo, capaz de garantir seu próprio sistema constitucional-legal. [...] A segunda reforma teve início no último quartel do século XX, no Estado Democrático Social Europeu com o objetivo de tornar o aparelho do Estado mais eficiente.

Esta segunda reforma administrativa no Estado brasileiro se faz presente na legislação nacional como observa-se no art. 37 da Constituição Federal de 1988 que em seu caput determina que o serviço público obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência visando prestar um serviço de qualidade. Este mesmo artigo em seu desdobramento do inciso XXII ressalta que “A lei disciplinará as formas de participação do usuário na administração pública direta e indireta, regulando especialmente: I - as reclamações relativas à prestação dos serviços públicos em geral, asseguradas a manutenção de serviços de atendimento ao usuário e a avaliação periódica, e interna, da qualidade dos serviços; II - o acesso dos usuários a registros administrativos e a informações sobre atos de governo, observado o disposto no art. 5º, X e XXXIII” como forma de prestar um serviço público eficiente.

O princípio da eficiência, efetivado pela Emenda Constitucional nº 19, de 4 de junho de 1998, trouxe uma nova perspectiva de administração pública no Brasil, pois tal princípio emerge com a implementação da administração pública gerencial. Para (COSTA; SOUZA, 2016, p. 151): A reforma administrativa é um exemplo de mudança da organização pública em busca da inovação, que ocorreu a partir de 1995, chegando ao que hoje conhece-se como Administração Pública Gerencial, onde o foco do Estado passou a ser com o bem-estar do cidadão e com a valorização do servidor público. Foi através desse novo paradigma que se constituiu os programas e os novos modelos de Gestão Pública com foco no cidadão.

Nesse contexto, a busca por procedimentos mais eficientes no NLIC culminou com a inovação na implementação do Decreto Estadual 1.974/2018 trazendo maior celeridade processual nas licitações de obras. Revista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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3.2. PROCEDIMENTO LICITATÓRIO: LEI FEDERAL 8.666/1993 X DECRETO ESTADUAL 1.974/2018 O processo licitatório, segundo a Lei Geral de Licitações - Lei Nº 8.666, de 21 de junho de 1993 divide-se em duas etapas, assim distribuídas: interna e externa. Segundo Amorim (2017, p. 41) a etapa interna “[...] inicia-se com a formalização da demanda administrativa, entendida como a demonstração da necessidade de aquisição de produtos, de contratação da prestação de serviços ou execução de obras. Amorim (2017, p. 42), ainda ressalta que a fase interna possui a seguinte sequência: requisição da área/unidade interessada; b) estimativa do valor (pesquisa de preços); c) autorização da despesa; d) elaboração do instrumento convocatório e seus anexos; e) análise da minuta do ato convocatório pela assessoria jurídica; f) publicação do aviso de licitação e divulgação do edital. Etapas estas que devem ser observadas, literalmente pela administração pública.

Conforme Amorim, (2017, p.79) a etapa externa do procedimento licitatório “[...] tem início com a divulgação do ato convocatório e finda com a homologação e a adjudicação do objeto da licitação ao vencedor do certame”. Os procedimentos inerentes a esta etapa modificam-se a partir da modalidade adotada. Para as modalidades de licitação utilizadas para obras (Concorrência, Tomada de Preço e Convite), Amorim (2017, p. 145) enumera a seguinte sequência: Fase de divulgação do ato convocatório e impugnação do edital (art. 21, 40 e 41); 2) Fase de habilitação ou qualificação (art. 27 a 31); 3) Fase de julgamento das propostas (art. 44 a 48); 4) Fase de homologação da licitação (art. 43, inciso VI); 5) Fase de adjudicação do objeto da licitação ao vencedor do certame (art. 43, inciso VI).

Registra-se que na etapa externa ainda existem os prazos de recursos durante o certame que acontecem nas fases de habilitação ou qualificação e julgamento das propostas (art. 109, inciso I). Os procedimentos no Regime Diferenciado de Licitações – RDC regulamentado pelo Decreto 1.974/2018 também é subdividido em duas etapas: interna e externa. A primeira tem rito semelhante ao da Lei 8.666/1993. Entretanto, na etapa externa existem algumas alterações significativas. Dentre as mais relevantes está a inversão de fase (art. 16). Para Ary, (2019, p.16) “[...] este instituto gera maior celeridade à licitação, reduzindo o prazo do certame sensivelmente, visto que, a fase de habilitação é uma das fases mais morosas do procedimento licitatório”. Realmente com a inversão de fases passou-se a analisar somente a documentação de habilitação da proposta mais vantajosa, ao invés de analisar os documentos de todas as participantes do certame. Outra mudança acentuada é a unificação do prazo de recurso após a fase de habilitação (art. 45). Diferentemente das licitações baseadas na Lei 8.666/93 onde ocorre na fase de habilitação e julgamento das propostas. Para Ary, (2019, p. 13) apesar da discussão acerca da constitucionalidade do RDC, verifica-se que seus mecanismos são dotados de maior eficiência, gerando contratações mais céleres, por meio de um procedimento com menos burocracia, porém com igual seriedade e ética. Revista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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Ressalta-se que o ministro Luiz Fux do Supremo Tribunal de Federal já se posicionou pela constitucionalidade da norma federal, potencializando a regulamentação por parte do Estado do Pará.

3.3 LICITAÇÕES NA SECRETARIA DE ESTADO DE EDUCAÇÃO DO PARÁ As licitações de obras da rede estadual de ensino até o ano de 2017 eram realizadas com base na Lei Geral de Licitações: Lei Nº 8.666, de 21 de junho de 1993, tal regramento, por meio do Art. 22 disponibiliza três modalidades de licitação que podem ser utilizadas para realização de obras, a saber: Convite, Tomada de Preços e Concorrência. O Art. 23, inciso I desta legislação estabelece os seguintes limites, tendo em vista o valor estimado da contratação: Convite até R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais), Tomada de Preços - até R$ 1.500.000,00 (um milhão e quinhentos) e Concorrência: acima de R$ 1.500.000,00 (um milhão e quinhentos). Esses valores foram atualizados no ano de 2018 a partir da promulgação do Decreto Nº 9.412, de 18 de junho de 2018, no Art.1º, inciso I, para, respectivamente, até R$ 330.000,00 (trezentos e trinta mil reais); até R$ 3.300.000,00 (três milhões e trezentos mil reais) e acima de R$ 3.300.000,00 (três milhões e trezentos mil reais). Em 2017, a Secretária de Educação procurando solucionar a questão da morosidade das licitações de obras incumbe, em reunião, no mês de junho de 2017, o Núcleo de Licitação de trazer opções mais eficientes para superar essa lentidão. O Núcleo mobilizou todo seu quadro de funcionários objetivando atender a demanda apresentada na citada reunião e após estudos, o grupo vislumbrou a possibilidade de criar uma regulamentação estadual da Lei Federal 12.462/2011 que instituiu o Regime Diferenciado de Contratações Públicas – RDC voltada para as necessidades da realidade do Estado do Pará. Após apresentarmos a proposta, a Secretária de Educação iniciou uma série de discussões junto à Secretaria de Estado de Administração – SEAD, à Secretaria de Estado de Desenvolvimento Urbano e Obras – SEDOP e à Procuradoria Geral do Estado do Pará – PGE. Houve questionamos acerca da eficiência por parte da SEDOP, todavia, os mesmos foram superados e em 30 de janeiro de 2018 foi assinado o Decreto Estadual 1.974/2018 e publicado no Diário Oficial do Estado no dia seguinte. A Secretária de Educação autorizou a adoção do novo procedimento e como resultado tivemos celeridade nos procedimentos licitatórios de obras como se observará posteriormente. Dia 29 de maio de 2018 às 10h iniciava-se a primeira licitação nos moldes do Decreto 1.974 de 30 de janeiro de 2018. Este marco histórico nas licitações de obras no Estado do Pará trouxe grande expectativa, no ambiente estadual. A primeira RDC teve como objeto a seleção da proposta mais vantajosa visando contratação de empresa de engenharia para execução de obra de construção de uma Escola de Trabalho e Produção do Pará - ETPP, localizada no município de Tucuruí – PA. O valor estimado da obra foi orçado em R$ 7.656.398,66 (sete milhões, seiscentos e cinquenta e seis mil, trezentos e noventa e oito reais e sessenta e seis centavos). Após o processo licitatório a obra foi homologada em 18 de junho de 2018, por R$ 5.300.000,00 (cinco milhões e trezentos mil) com uma economicidade ao erário de 30,78%. Todavia o que mais foi destacado nessa operação foi à celeridade do processo, respeitando todos os preceitos legais, a realização dessa licitação teve a duRevista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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ração de apenas 19 dias ininterruptos. Entretanto, é importante ressaltar que após a homologação de 15 licitações no regime de RDC, a média temporal em dias corridos ficou em 44 dias. Isso ocorreu devidos às demais licitações terem sofrido recursos administrativos inerentes ao processo licitatório. Gráfico 1 - Comparativo da celeridade processual da média das licitações homologadas entre a modalidade de concorrência da Lei 8.666/1993, com RDC - Decreto Estadual 1.974/2018, em dias corridos no ano de 2017.

Fonte: elaborado pelos autores consultando as publicações oficiais da Imprensa Oficial do Estado do Pará. - IOEPA

Comparando o tempo de licitação das concorrências realizadas em 2017 com as realizadas em 2018, verifica-se que houve uma significativa redução de 66,41%, ou seja, diminuição de 87 dias, em média, para realização de uma licitação na modalidade de concorrência no que se refere aos processos licitatórios mais complexos. Considerando os processos licitatórios realizados em 2018 temos a seguinte situação:

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Gráfico 2 - Comparativo da celeridade processual da média das licitações homologadas entre a modalidade concorrência da Lei 8.666/1993 com RDC - Decreto Estadual 1.974/2018, em dias corridos no ano de 2018.

Fonte: elaborado pelos autores consultando as publicações oficiais da Imprensa Oficial do Estado do Pará. - IOEPA

Em 2018 foram homologadas 46 licitações sendo: 19 Concorrências, 15 RDC, 12 e Tomadas de Preços. Considerando as duas modalidades com mais licitações homologados: Concorrência e RDC verificou-se que o RDC, em média, é 338.63% mais célere que a Concorrência, reduzindo-se em 149 dias o tempo de licitação em relação à Concorrência. Ao comparar as Tomadas de Preços descobriu-se que o RDC é 115,91% mais eficiente em relação ao tempo licitado. Assim, em média, houve uma redução de 51 dias para a efetivação de uma licitação realizada pela Lei 1.974/2018. Os resultados acerca da celeridade processual entre as licitações nos moldes do Decreto Estadual 1.974/2018 em detrimento das modalidades da Lei Federal 8.666/93 ficam mais evidentes quando se comparam as licitações homologadas nos anos de 2017 e 2018.

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Gráfico 3 – Quantidade de licitações homologadas entre os 2017 a 2018 na SEDUC/PA

Fonte: elaborado pelos autores consultando as publicações oficiais da Imprensa Oficial do Estado do Pará. - IOEPA

Com a implementação do RDC em 2018 houve um aumento de 104,34% nas licitações homologadas em relação ao ano de 2017. Essa evolução somente foi possível com a regulamentação do RDC, pois como se observa no gráfico a seguir o RDC foi responsável por 31,91% de todas as homologações em seu primeiro ano de execução. Embora o ano de 2018 tenha ocorrido o processo eleitoral em nível estadual e federal, a demanda por licitações de obras foram semelhantes cerca de 102 solicitações. Porém, como em 2018 implantamos um procedimento mais célere, obtivemos maior número de processos homologados, apesar do período de licitação ser apenas sete meses para a modalidade RDC. Consideramos que o processo eleitoral influenciou porque reduziu o espaço temporal para efetuar o processo licitatório que normalmente ocorre de janeiro a dezembro, sendo que tivemos que encerar as licitações em novembro daquele ano.

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Gráfico 4 – Quantidade de licitações homologadas, por modalidades, em 2018 na SEDUC/PA

Fonte: elaborado pelos autores consultando as publicações oficiais da Imprensa Oficial do Estado do Pará. - IOEPA

Os dados apresentados pelo gráfico 4 possuem uma peculiaridade. As homologações referentes às modalidades da Lei Federal 8.666/93 (Concorrência Pública e Tomada de Preço) que totalizam 31 licitações foram realizadas em 12 meses. Os 15 certames homologados nos moldes do RDC foram realizados em apenas 7 meses, evidenciando novamente a celeridade processual desta modalidade de licitação, visto que se iniciou em maio e concluiu-se essa atividade em novembro, devido ser um ano eleitoral. A celeridade nos processos licitatórios que utilizam o RDC é justificada por (ERIK; PORTO; LAVOR, 2016): A celeridade processual tem sido proveniente em decorrência, principalmente, da prerrogativa da inversão de fases, em que primeiro são verificados os preços propostos pelos licitantes, e posteriormente é analisada a documentação habilitatória, somente do vencedor. O certame também se torna mais célere, na medida em que se permite finalizar a disputa em uma sessão única, além de simplificar a fase recursal em face de habilitação ou proposta em um único momento, logo depois do julgamento das propostas de preços.

Considerando o êxito da implementação do RDC nas licitações de obras da SEDUC/PA, o planejamento do Núcleo de Licitação da SEDUC projetou uma meta ousada para 2019, com a estimativa de homologar cerca de 100 certames.

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Gráfico 5 – Projeção de Licitações a Homologar em 2019

Fonte: elaborado pelos autores consultando as publicações oficiais da Imprensa Oficial do Estado do Pará. - IOEPA

Em 2019, a equipe do NLIC tinha perspectiva de realizar somente licitação por meio do RDC. A projeção era realizar e homologar em torno de 100 certames, meta totalmente viável, pois se almejava a implantação do RDC, na forma eletrônica. Entretanto, com a mudança de governo oriunda das eleições nacionais e estaduais de 2018, bem como a limitação orçamentária proveniente da baixa atividade econômica, o projetado não foi executado. CONSIDERAÇÕES FINAIS Esta pesquisa possibilitou vislumbrar que mesmo como uma estrutura burocrática é possível desenvolver práticas gerenciais inovadoras e que melhor atendam o serviço público e a demanda dos serviços educacionais. A mudança de paradigma advém do anseio da sociedade que pressiona por serviços públicos mais eficientes e que estejam a altura dos impostos pagos por cada cidadão e por cada cidadã. O presente estudo demonstrou, a partir de dados consolidados, que a celeridade processual com a implementação do Decreto Estadual 1.974/2018 é significativa em relação as modalidades da Lei Federal 8.666/93, possibilitando sua aplicação em todos os setores da administração pública estadual. Como resultado desta pesquisa no que concerne às licitações de obras, construções e reformas, no ano de 2018 constata-se a diminuição do período de licitação, a segurança nos procedimentos e a lisura em todo processo. O referido Decreto Estadual, supracitado, criou nova possibilidade para a gestão pública em processos licitatórios de obras, entretanto, a opção por este regime de licitação é uma escolha em nível estratégico, em 2019 a gestão da Secretaria de Educação optou pela modalidade tradicional com base na Concorrência Pública em detrimento do RDC, tema a ser abordado em outro artigo, no qual será comparado as licitações do período 2018 a 2020.

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REFERÊNCIAS

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Uma Experiência com o Teatro no Ensino de Língua Inglesa: Comunicação e Oralidade Vitor da Silva Carvalho 1 RESUMO A falta do uso da língua inglesa, como instrumento de comunicação e interação oral, entre os alunos nas salas de aula e a constante utilização deste idioma apenas para leitura de textos, levou o autor deste relato de experiência a desenvolver uma apresentação em uma Amostra Cultural, na Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Frei Ambrósio, da cidade de Santarém, oeste paraense, para não somente estimular oralidade inglesa e a sua comunicabilidade, mas também otimizar a interação entre alunos e professor. Pretende-se mostrar a atuação dos alunos ao realizarem a comunicabilidade oral e diferenciada, mas, principalmente, mostrar a realização da prática oral, tão exigida pela Base Nacional Comum Curricular. Essa atividade foi realizada com uma turma de nono ano, do ensino fundamental, turno vespertino, da referida escola. Utilizou-se de uma atividade lúdica, com o teatro de fantoches, para o exercício oral do Inglês. Como enredo, apostou-se no contexto histórico da criação da cidade de Roma e na Mitologia Grega. Como estratégia metodológica, nos utilizamos de aulas direcionadas com conteúdos específicos sobre a temática e muitos ensaios, por cerca de 2 meses. Inicialmente, propomos trabalhar quatro mitologias, com a pretensão de realizar uma apresentação teatral com alunos, contudo, com as demandas do trabalho da escola e do tempo que não mais teríamos, decidimos substituir pelo teatro de fantoche, com um pequeno palco, em caixa de papelão, ornamentado, com amplificador de voz e vários fantoches do laboratório de arte, sendo esses as personagens mitológicas. Como avaliação, dois professores acompanharam o trabalho, e apontamos alguns critérios avaliativos, tais como: “Domínio e segurança”; “Pronúncia”; “Postura” e “Criatividade”, com indicadores de 1 – nível baixo - a 5 – nível elevado. A avaliação qualitativa foi satisfatória pelas análises e considerações dos avaliadores. Buscou-se referências em autores como: Susan Holder, Gillian Lazar, além da Base Nacional Comum Curricular, Orientações Curriculares para o Ensino Médio, Parâmetros Curriculares Nacionais para Língua Estrangeira e um Guia Docente desenvolvido pela Secretaria de Educação do Estado do Pará. Pode-se concluir que práticas como essas são desafiadoras, por ter a intenção de quebrar a rotina, mas também são recomendáveis a outros professores(as) de Inglês, enquanto alternativas para o ensino da língua Inglesa, quando se volta para o desenvolvimento da competência linguística de comunicação, oralidade, leitura e estimula os próprios educandos a serem protagonistas de sua aprendizagem. Palavras-chave: Ensino da Língua Inglesa. Oralidade. Apresentação teatral. Teatro de fantoches.

1 INTRODUÇÃO A necessidade de se aprender uma língua estrangeira a fim de se comunicar, interagir e conhecer diversas culturas tem rompido fronteiras geográficas. Sendo assim, aprender um segundo idioma é uma necessidade para profissionais de diversas áreas e para aqueles que se preparam para ingressar em um mercado de trabalho cada vez mais competitivo e exigente. O domínio de outro idioma significa crescimento, desenvolvimento e, acima de tudo, melhores condições de acompanhar as rápidas mudanças que vêm ocorrendo nesse novo e tecnológico século. 1

Professor de Língua Inglesa da EEEFM Frei Ambrósio, SEDUC/PA. Licenciatura em Português e Inglês pela UNIUBE – Universidade de Uberaba Especialização em Metodologia de Ensino de Língua Inglesa pela FACINTER - Universidade Internacional de Curitiba. e-mail: vtsilvacarvalho@gmail.com

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O trabalho docente tem oportunizado poucos espaços para a comunicação e interação oral em sala de aula, geralmente o professor não se comunica com os seus alunos por meio da língua inglesa, que é o foco de seu ensino, alguns, talvez a maioria não investe na principal característica que o diferencia dos demais professores de outras disciplinas, o fato de ser bilíngue. Quando isso acontece, nós professores de língua estrangeira, tiramos dos alunos a chance de se desenvolverem na aprendizagem de um segundo idioma, mais efetivamente. Somado a isso, Dutra e Mello (2004) apontam um outro fator pertinente que impossibilita o aprendizado de um idioma estrangeiro, é o fato de o Professor não dominar a própria ferramenta de trabalho. Segundo esses autores, [...] o sistema educacional brasileiro coloca no mercado de trabalho professores despreparados e muitos recorrem aos cursos de especialização em busca de uma regraduação, o que naturalmente não encontram. Esse contexto reforça, dia-a-dia, o preconceito de que só se aprende língua estrangeira em cursos livres. (DUTRA E MELLO, 2004, p.37)

Quando se trata do ensino de uma língua estrangeira, é importante que o professor tenha conhecimento dos métodos e abordagens de ensino, para que possa selecionar aquele(s) que melhor se adapta(m) à realidade de sua escola e de seus alunos. Em relação a isso, Silva et al. (2012), declaram: Ao planejarmos uma boa aula, precisamos analisar muitos aspectos para que o processo de ensinoaprendizagem de uma língua estrangeira seja bem-sucedido. Faz-se necessário que o professor conheça bem os métodos de ensino, ainda mais hoje em dia, quando não há mais apenas um método que deve ser escolhido em detrimento do outro. Por isso mesmo, esse ecletismo metodológico requer que o professor tenha uma formação mais ampla, crítica e autônoma para fazer suas escolhas e práticas de modo intencional e consistente (SILVA et al., 2012, p.4).

Além disso, há também a falta de conhecimento de metodologias para se ensinar essa matéria e que acarreta em outro problema que corresponde à aprendizagem dos alunos. Além das limitações já mencionadas. Deve-se considerar também o fato de que as condições na sala de aula da maioria das escolas brasileiras (carga horária reduzida, classes superlotadas, pouco domínio das habilidades orais por parte da maioria dos professores, material didático reduzido a giz e livro didático etc.) podem inviabilizar o ensino das quatro habilidades comunicativas (PCN LE, 1998, p. 21).

Outro fato é que a única recomendação e a mais imediatista possível para os alunos é, somente, o ensino da leitura e escrita. (...) também os únicos exames formais em Língua Estrangeira (vestibular e admissão a cursos de pós-graduação) requerem o domínio da habilidade da leitura. Portanto, a leitura atende, por um lado, às necessidades da educação formal, e, por outro, é a habilidade que o aluno pode usar em contexto social imediato (PCN LE, 1998, p. 20).

Por outro lado, com a implementação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), mudanças relacionadas à aprendizagem da língua inglesa já são perceptíveis, uma vez que esse documento a determina como componente curricular obrigatório, tanto no Ensino Fundamental II quanto no Ensino Médio. De acordo com tal documento, o aprendizado do inglês deve ser realizado de uma maneira que os alunos participem de um mundo social cada vez mais globalizado e plural. Ou seja, a língua inglesa deve ser aprendida por meio de práticas linguísticas cotidianas, discursivas e da reflexão sobre elas. Isso possibilita aos alunos o desenvolvimento de uma autonomia no uso comunicativo do idioma estrangeiro. Para tal, todos os eixos (oralidade, leitura, escrita, conhecimentos linguísticos e dimensão intercultural) devem ser trabalhados em sala de aula. (BNCC, 2018, p. 241) Revista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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Sendo assim, em face da necessidade de um ensino de Língua Estrangeira centrado na língua como prática social, o trabalho deve ser fundamentado na diversidade dos gêneros textuais, bem como na utilização de tantos outros recursos pedagógicos como a tecnológica por celular, tablets e slides. Na verdade, o que deve ser considerado pelo professor, quando planeja a sua prática, é que todos os materiais devem ser analisados e selecionados tendo em vista se são apropriados e viáveis para o processo de ensino e aprendizagem dos seus alunos. Observa-se, porém, que os textos utilizados em colégios regulares são em sua maioria textos publicitários, jornalísticos, informativos ou de opinião, mas o texto originado de uma obra literária clássica ou popular em Inglês é raramente utilizado. A literatura além de contribuir para a aquisição da língua, influencia e reforça diversos temas - sociais, políticos e econômicos - que contribuem e preparam o aluno para a formação de consciência crítica, de uma constituição pessoal histórica e social. Esse relato de experiência tem o foco de mostrar a utilização de uma prática antiga de expor conhecimento. Tal prática antiga é o Teatro e vem sendo a representação da literatura de forma presente atualmente, pois, através do teatro ampliam-se as possibilidades de o aluno dialogar consigo e com o colega. Dessa forma, pela Dramatização que desencadeia a fala criativa e seguindo as palavras de Holden (2009, p. 102) sobre a Dramatização: Atividades de fala criativa também poderiam envolver dramatização. Encerrar papéis é proveitoso para trazer a linguagem para a vida e associar a linguagem falada aos gestos, à expressão facial e ao movimento. Elas também chamam a atenção para outras características da linguagem falada, como graus de formalidade (registro), entonação e tom de voz, e dão oportunidades para explorar relacionamentos.

Segundo Holden (2009), na “interpretação” o aluno usa uma linguagem em situações curtas, entre duplas ou grupo, com uma ou duas cenas, sendo que na dramatização, é mais longa e o seu foco está tanto no ator como na plateia. Diante dessa alternativa oral que o teatro por si já se propõe emerge o objetivo deste texto relato de experiência, mostrando os passos de como a prática a ser descrita foi realizada junto com uma avaliação desta prática. O objetivo almejado é o de relatar a sua realização na Amostra Cultural realizada por uma turma na disciplina de Inglês da EEEFM Frei Ambrósio2, da cidade de Santarém, Pará.

2 DESENVOLVIMENTO: PREPARAÇÃO DA PERFORMANCE Tudo começou com um convite da Escola de incluir uma turma do nono ano, F9T902-904, constituída de alunos na faixa etária de 13 a 14 anos de idade, poucos alunos (20 no total), do turno vespertino, com aulas de Língua Inglesa no horário de 16:25h às 18:40h, nas quintasfeiras.

2

Pelas informações do PPP da escola ela é a mais antiga do Oeste do Pará com 120 anos de existência, sua data de fundação foi 03 de maio de 1900

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Essa turma do ensino fundamental - anos finais - do EEEFM Frei Ambrósio de 2019 foi escolhida pela direção pedagógica, por ser a última turma de ensino fundamental nos anos finais, no turno da tarde e após ser selecionada ela teria a incumbência de se apresentar na Amostra Cultural da escola, que se realizou no mês de outubro do mencionado ano e, nesse caso, pela primeira vez apresentar alguma prática em Língua Inglesa, já que essa disciplina nunca havia participado naquele colégio (os alunos sempre apresentaram os seus conteúdos de todas as disciplinas na Amostra Cultural, mas a disciplina de Inglês jamais havia sido contemplada). A amostra Cultural da EEEFM Frei Ambrósio visou tirar os alunos da turma F9T902-904 da rotina habitual de leitura de textos para aplicar a língua inglesa de forma interessante e, principalmente, oral já que a BNCC também exige a aplicação da oralidade de língua Inglesa. Inicialmente, todas as apresentações da escola eram para ser em formato de “jogo”, mas houve a possibilidade de haver uma apresentação teatral ao invés de um jogo, para a amostra de Inglês. No primeiro momento houve uma preparação psicológica dos alunos(as) com uma pequena demonstração de uma prática baseada em Total Physical Response (Resposta Física Total, que também é conhecido como TPR) com ordens que eu mesmo demonstrava em Inglês, falando e demonstrando, para que eles depois falassem e eu executasse. Após essa pequena prática de abertura eu os informei da Amostra Cultural que seria em Inglês e, que tal como TPR, algo semelhante seria feito para uma audiência e que mesmo sendo em Inglês outras pessoas entenderiam (por meio de uma apresentação teatral utilizando-se somente gestos e as falas memorizadas). Vale lembrar que no período de dois (2) meses de preparação e concomitante ao ensaio da Amostra eu também apliquei as minhas aulas iniciando com a Leitura de um texto sobre Mitologias (sendo uma do povo Guaraní e outra do povo Nórdico) que estavam dispostas em forma de informativos da Internet encontrados na Unidade 4, página 66 do Livro Team Up3, que mesmo sendo para oitavo ano eu adaptei para essa turma de nono ano. No segundo momento (em outra aula), nós nos reunimos em quatro equipes sendo que cada aluno(a) escolheu a sua mitologia que eram 4: Mitologia Grega, Mitologia Chinesa, Mitologia Japonesa e Criação da cidade de Roma. Toda a informação de cada mitologia foi repassada em voz alta e tivemos mais outros encontros para ensaiar, além das aulas do conteúdo em si. Porém, ao longo de nossos encontros, enquanto ensaiávamos as falas, eu percebi que era muito conteúdo para apenas 20 alunos e, então, como se tratava de pouco tempo para criarem seus respectivos scripts houve a necessidade do próprio professor criar os scripts em Inglês e de reduzir de quatro para duas equipes já que o número de alunos (as) presentes poderiam atuar em duas equipes tranquilamente. Dessa forma, a Mitologia Grega e a Criação da Cidade de Roma foram escolhidas porque os ouvintes, por mais que fossem ouvir toda a apresentação teatral em Inglês, iriam entender já que herdamos muito da cultura greco-romana.

3

Team Up, Língua Estrangeira Moderna, Inglês, Anos Finais do Ensino Fundamental, 8º ano por Renildes Dias (Autora), Elaine Hodgson (Autora), Denise Santos (Autora) e Cristina Mott-fernadnez (Autora) de 2015

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Evidentemente, os ensaios foram realizados em sala por diversos encontros, mas tais ensaios também foram usados lado a lado das atividades da própria disciplina e quanto mais próxima ficava a apresentação da turma, tanto mais as aulas serviam para trabalharmos. E, infelizmente, quanto mais os dias se aproximavam mais se percebia que havia a falta de desenvoltura no idioma por parte dos alunos, sendo isso bastante perceptível, principalmente entre as moças da turma. Neste sentido, houve a necessidade de uma aula extra usando uma aula da professora de Educação Física e mesmo assim não demonstravam segurança suficiente. A apresentação não podia ser adiada sendo que todas as equipes com suas disciplinas selecionadas iriam apresentar em um único dia, dependendo dos turnos que estudavam: manhã ou tarde. Até aquele momento não existia a ideia de fazer um teatro de fantoche pois, inicialmente e durante todos aqueles dias, tínhamos a convicção de que seria uma apresentação teatral usando o imaginário da audiência que iria acompanhar as falas e os gestos dos alunos participantes. Entretanto, em uma conversa com a pedagoga do turno vespertino surgiu a ideia de fazer uma apresentação de teatro de fantoches, tomada como alternativa formidável, pelo fato de que não precisariam memorizar os scripts e focariam apenas em ler bem, sem medo de se exporem, devido ao formato de um pequeno teatro: composto de uma caixa de tamanho proporcional, ornamentada e presa a uma mesa com fita durex; um pano por cima e atrás bem ajustado também com fita durex; uma caixa acústica amplificadora; e de fantoches para representarem as personagens. O professor ficou encarregado de trazer uma caixa ornamentada de sua casa, enquanto os alunos ensaiavam suas falas em suas respectivas residências. O trabalho e esforço dos alunos(as) foi surpreendente, o que facilitou muito no dia da apresentação. Tudo isso levou um bimestre de preparatório (desde a segunda semana de agosto logo depois da recuperação parcial do semestre até o dia da apresentação final). DIA DA APRESENTAÇÃO Finalmente, o grande dia chegou - 18 de outubro de 2019, sexta-feira à tarde. Já, naquele dia, havia ocorrido apresentações das turmas do fundamental II e Médio de manhã e ocorrendo também para as turmas da tarde. Note-se a apresentação dos alunos como consta nas imagens 1 e 2. A nossa apresentação teve dois momentos, para o público em geral e para os professores - avaliadores e um aluno convidado do terceiro ano que compreendia Inglês para ajudar no entendimento caso um dos professores não entendesse. Os critérios de avaliação eram: 

Domínio e segurança na exposição do conteúdo;

Pronúncia “Erros de Português na fala e na escrita (o que se subentende “Inglês”);

Postura no decorrer da exposição;

Criatividade na elaboração do trabalho (o que se subentende “apresentação”).

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Imagem 1- Amostra Cultural

Fonte: Relatório da Amostra Cultural

Como avaliação, dois professores acompanharam o trabalho, e apontamos alguns critérios avaliativos, tais como: “Domínio e segurança”; “Pronúncia”; “Postura” e “Criatividade”, com indicadores de 1 – nível baixo – a 5 – nível elevado. A avaliação qualitativa foi satisfatória pelas análises e considerações dos avaliadores.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao introduzir uma proposta de atividade que exige uma prática oral em língua inglesa, constatou-se que eles estavam muito ansiosos de tal prática, não pela ansiedade de ver resultados, mas de terem medo de se expor, o que não seria surpresa para ninguém, e ainda mais em Inglês. Foram dias exaustivos de preparação, já que desde os primeiros encontros até os últimos dias os alunos demonstraram ser participativos, porém a timidez foi um obstáculo superado e que dificultava na maioria das vezes e, mesmo assim, foram muito participativos e quanto mais os dias se aproximavam mais eles praticavam as suas falas, previamente escolhidas, exercitandoas em casa. Buscou-se referências em autores como: Susan Holder, Gillian Lazar, além da Base Nacional Comum Curricular, Orientações Curriculares para o Ensino Médio, Parâmetros Curriculares Nacionais para Língua Estrangeira e um Guia Docente desenvolvido pela Secretaria de Educação do Estado do Pará. No dia da apresentação tudo saiu bem e, dessa forma, expondo a apresentação aos ouvintes e demonstrando que há real possibilidade da prática oral, provocando elogios por parte de alguns que assistiram e levando a proposição de se levar a ideia desta prática oral em língua inglesa ao ano seguinte para também ser feita em outra Amostra Cultural da mesma escola. Pode-se concluir que práticas como essas são desafiadoras, por ter a intenção de quebrar a rotina, mas também são recomendáveis a outros professores(as) de Inglês, enquanto alternativas para o ensino da língua Inglesa, quando se volta para o desenvolvimento da competência linguística de comunicação, oralidade, leitura e estimula os próprios educandos a serem protagoRevista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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nistas de sua aprendizagem. Recomenda-se também que ocorra formas de auxiliar professores(as) de Inglês que, de tempos para cá, já tem se tornado mais fluentes e dedicados a sua profissão dentro de escolas regulares, e que mais do que nunca, práticas como a que foi descrita dessa apresentação oral em Inglês da Amostra Cultural se repitam em outras escolas da rede pública para criar uma cultura da aprendizagem.

REFERÊNCIAS Brasil. Ministério da Educação e Desporto. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: língua estrangeira. Brasília, DF: MEC/SEF, 1998. ______. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Base Nacional Comum Curricular. Brasília, DF: MEC, 2019. ______. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Base Nacional Comum Curricular Orientações Curriculares Para o Ensino Médio, vol 1: Linguagens, Códigos e suas Tecnologias. Brasília, DF: MEC, 2008. Corchs, Margaret. O uso de textos literários no ensaio de língua inglesa. Fortaleza, UECE, 2006 Chaguri, J. P. A Importância da Língua Inglesa nas Séries Iniciais do Ensino Fundamental. In: O DESAFIO DAS LETRAS, 2., 2004, Rolândia. Anais... Rolândia: FACCAR, 2005. 08 f. ISSN: 1808-254on-line in . Acesso em: 14 março 2020. Dias, Renildes et al. Team Up: 8º ano. 1. ed. Cotia: Macmillan, 2015. Dutra, D. P.; Mello, H. A prática reflexiva na formação inicial e continuada de professores de língua inglesa. In: ABRAHÃO, M. H. V. (Org.). Prática de ensino de línguas estrangeiras: experiências e reflexões. Campinas: Pontes, 2004. Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Frei Ambrósio. Projeto Político Pedagógico. Santarém, 2018 Holden, Susan. Ensino da língua Inglesa nos Dias Atuais. São Paulo: Special Book Services Livraria, 2009. Lazar, Gillian. literature and language teaching: a guide for teachers and trainers. Cambridge, Cambridge University Press, 2004. Micheletti, Guaraciaba. Leitura e construção do real: o lugar da poesia e da ficção. São Paulo: Cortez, 2000. Moisés, Massaud. A criação literária: poesia. São Paulo: Cultriz, 2000. Pará. Secretaria de Educação Executiva do Pará. Fundação Instituto para o Desenvolvimento da Amazônia. Programa de Melhoria e Expansão do Ensino Médio - Guia Docente: linguagem, códigos e suas tecnologias – Inglês. Belém: SEDUC/FIDESA, 2003. Prestes, Mª L. de M. A pesquisa e a construção do conhecimento científico: do planejamento aos textos, da escola à academia. São Paulo: Rêspel, 2012. SAE Digital, De Olho na BNCC: Segunda Edição, SAE Digital, 2019. Revista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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Silva, Fernanda dos Santos. Leitura de textos literários no ensino médio. Conceição do Coité: UNEB, 2011. SILVA, Adriana; DUQUE, Luciana Valeiras; SILVA, Solimar Patriota. O Uso de Podcasts no Desenvolvimento da Oralidade em Língua Inglesa. 2012. 20 f. Trabalho de Conclusão de Curso. Universidade do Grande Rio, Rio de Janeiro, 2012. Swales, J. M. Genre analysis: English in academic and research settings. Cambridge: Cambridge University Press, 1990.

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Relato sobre uma atividade realizada por estudantes de um Clube de Ciências Escolar em um Orquidário de Oriximiná-PA Tatiana Queiroz Sardinha 1 Douglas Farley Barroso Pereira 2 RESUMO O presente trabalho tem por objetivo relatar as percepções sobre uma atividade desenvolvida por estudantes de um Clube de Ciências escolar em um orquidário particular do município de Oriximiná-Pará, no período de 2017 à 2019. Trata-se de uma pesquisa descritiva do tipo relato de experiência. Para ajudar a compor o relato foram aplicados questionários a uma estudante clubista, a um professor de Biologia, à diretora da escola e ao orquidófilo proprietário do orquidário; com perguntas sobre as atividades desenvolvidas. A análise dos dados revelou que essa atividade foi considerada exitosa pelos participantes; que também a consideraram importante para promoção da iniciação científica e educação ambiental na escola. Palavras- Chave: Educação Ambiental. Iniciação Científica. Orquídeas.

1 INTRODUÇÃO As orquídeas constituem uma das maiores famílias de plantas do mundo com mais de 25 mil espécies distribuída em 800 gêneros (ROCHA, 2019). Desse total, o Brasil possui cerca de 2.785 espécies aceitas e 1.562 gêneros. No estado do Pará já foram catalogas 388 espécies e 97 gêneros (FLORA DO BRASIL, 2020). As orquídeas têm um importante valor botânico e ecológico, interagindo em associações com outras plantas ou com animais. Algumas espécies são utilizadas na medicina, cosmética e indústria alimentícia (KUMARIA e TANDON, 2001; PETROVSKA, 2012). Devido a beleza de suas flores e sua variabilidade genética, sua comercialização como planta ornamental tem se mostrado bastante rentável. As mais raras possuem um alto valor econômico, e à medida que se avançam estudos e pesquisas, novos usos são descobertos (MEZZALIRA e KUHM, 2019).

¹ Licenciada em Ciências Biológicas, UFPA, Acadêmica do Curso de Especialização em Educação e Gestão Ambiental no IESPES. Santarém-PA. douglasfarley2009@gmail.com ² Mestre em Ciências Ambientais pela UFOPA, Professor de Biologia na EEEM Padre José Nicolino de Souza, Oriximiná-PA. douglasfarley2009@gmail.com

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A principal ameaça às orquídeas são os impactos de origem antrópica como queimadas e desmatamentos, que tem se intensificado nos últimos anos e tem levado a depredação e destruição de seus habitats (CARDOSO e ISRAEL, 2005). Os orquidários são locais onde as orquídeas são cultivadas, seja para coleção e apreciação, seja para produção de espécimes para fins de conservação, comercialização ou pesquisa. Alguns trabalhos educativos vêm sendo realizados nesses locais (PELUZIO e SOARES, 2008; SANTOS et al., 2012; SOUZA-FILHO et al., 2020), o que de certa forma tem contribuído para o aumento da percepção da importância da família Orchidaceae e a conservação de seu habitat. Nessa perspectiva, o presente trabalho torna-se relevante por permitir que estudantes da Educação Básica conheçam o valor das orquídeas e sua importância para o equilíbrio dos ecossistemas, especialmente do bioma amazônico; além de estimular atividades de iniciação científica. Esse relato descreve uma atividade realizada por um Clube de Ciências de uma escola pública estadual de ensino médio do município de Oriximiná num orquidário particular próximo à escola. A pesquisa realizada pelos estudantes no orquidário revelou 99 espécies de orquídeas, distribuídas em 48 gêneros nativas da Amazônia. O objetivo principal do relato é verificar a percepção que os participantes tiveram sobre a atividade desenvolvida no espaço do orquidário. 2 PERCURSO METODOLÓGICO Contexto O município de Oriximiná fica localizado na região Oeste do Estado do Pará (Figura 1), possui uma população estimada de 74.016 habitantes em uma área de 107.613,838 Km2 (IBGE, 2020). A principal atividade econômica do município é a indústria extrativista de minério, especificamente a bauxita. O município possui duas escolas de ensino médio na zona urbana, sendo uma delas a escola onde foi desenvolvida a atividade. A escola fica localizada na região central, funcionando nos três turnos, ofertando o ensino médio e EJA avançado a 1.442 estudantes matriculados no ano de 2020 (SEDUC-PA, 2020).

Figura 1- Mapa do município de Oriximiná

Fonte: SIPAM, 2009.

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O orquidário particular onde foi desenvolvido o trabalho está localizado no centro da cidade, distante aproximadamente seis quadras da Escola. Nele há diversos tipos de orquídeas: terrestres, epífitas, rupícolas; nativas da região e de outras localidades do Brasil; espécies naturais e híbridas (Figura 2). Figura 2- Orquidário particular de Oriximiná-PA.

Foto: Josy Pontes, 2017.

Além das orquídeas há outros tipos de plantas como: bromélias, rosas do deserto, onze horas, parreira, musgos, samambaias, cactos, suculentas, plantas carnívoras, entre outras. Há também uma criação de abelhas sem ferrão Meliponíneas. Detalhamento das atividades realizadas no orquidário O Clube de Ciências onde foi desenvolvida a atividade funciona numa escola pública da rede estadual do município de Oriximiná. Ele foi criado em junho de 2017 e suas atividades acontecem no Laboratório Multidisciplinar da Escola, nos dias de terça e quinta-feira, das 18h30min às 21h00min. O Clube é composto por 30 estudantes do ensino médio, dos turnos da manhã e tarde, e um professor-orientador da escola (PEREIRA et al., 2019). As atividades desenvolvidas pelo Clube de Ciências com as Orquidáceas foram divididas em quatro etapas: elaboração de um projeto de investigação sobre orquídeas, uma roda de conversa com o orquidófilo, aulas de campo in loco para levantamento das orquídeas e socialização dos resultados em eventos científicos, como a Feira Pedagógica da escola e II Feira de Ciências e Tecnologias Educacionais da Mesorregião do Baixo Amazonas (FECITBA), descritas no quadro a seguir:

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ETAPAS

DETALHAMENTO

Figura 3-Elaboração de projeto de investigação

Durante essa fase de elaboração de projetos, o professor propôs aos alunos que escolhessem temas que gostariam de investigar. Em seguida, dividiu a turma em quatro grupos, de acordo com o interesse de cada um. Um dos grupos, formado por quatro estudantes, optou por trabalhar com as orquídeas. Após a escolha do tema, as estudantes elaboraram hipóteses e traçaram a metodologia, que posteriormente foi apresentada ao professor; o qual fez questionamentos e sugestões ao grupo (Figura 3).

Foto: Arquivo pessoal. Figura 4- Roda de Conversa

Na segunda etapa do projeto, um orquidófilo do município foi convidado para participar de uma Roda de conversa na qual fez uma breve apresentação sobre como se tornou um profissional na área. Em seguida, mostrou alguns exemplares de orquídeas que trouxe, dialogou com os estudantes sobre a classificação biológica e distribuição das mesmas. Além de falar sobre a importância econômica e ecológica das orquídeas (Figura 4).

Foto: Josy Pontes. Figura 5- Aula de campo

Em outro momento, foi proposto aulas de campo, nas quais os estudantes puderam fazer visitas ao orquidário da cidade. Durante a visita realizada, o orquidófilo recepcionou a turma toda do Clube e os guiou pelo orquidário (Figura 5). Os estudantes observaram as plantas existentes no orquidário e ao longo da atividade, foram feitos registros de imagens com o uso de aparelho celular e registros escritos para compor o diário de bordo.

Foto: Arquivo pessoal. Figura 6- Levantamento das orquídeas

Ainda como parte das aulas de campo, as estudantes do grupo revisitaram o orquidário várias vezes para que realizassem a identificação das orquídeas por gênero e espécie contando com auxílio do orquidófilo e do professororientador (Figura 6). Porém, considerando somente aquelas que fossem nativas da Amazônia. Para isso, utilizaram livros especializados da área como os de (KOCK, 2012; SILVA e SILVA, 2010; SILVA,1998). Ao final identificaram 99 espécies distribuídas em 48 gêneros.

Foto: Arquivo pessoal.

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Figura 7- Socialização do projeto à comunidade

Como etapa final do trabalho, as estudantes clubistas tiveram a oportunidade de participar da Feira Pedagógica da Escola e da II FECITBA a fim de socializar o trabalho que desenvolveram. Para isso confeccionaram um banner com a ajuda do professor-orientador e trouxeram também amostras de orquídeas que foram gentilmente cedidas pelo orquidófilo. (Figura 7). Também submeteram e aprovaram um resumo nos anais do 70º Congresso Nacional de Botânica em 2019 (PEREIRA et al. 2019b).

Foto: Arquivo pessoal.

Para ajudar a compor o relato foram utilizados questionários como instrumento de coleta, para o qual foram elaboradas questões que remetiam as propostas de investigação deste estudo, tais como: Etapas de elaboração do projeto, roda de conversa, aula de campo e socialização. Os sujeitos envolvidos nesta investigação foram; uma estudante clubista do terceiro ano do ensino médio de uma escola pública, para a qual será atribuído o pseudônimo de ESTUDANTE, cuja escolha se deu em função do destaque de suas opiniões e frequência nas atividades do Clube de Ciências, além de sua participação ao longo dos três anos de projeto. Um administrador, proprietário do orquidário, que será chamado de ORQUIDÓFILO, um professor de Biologia lotado no laboratório multidisciplinar da escola que atua como professor-orientador do Clube de Ciências escolar, aqui chamado de PROFESSOR e a gestora da escola, identificada como DIRETORA. Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre Esclarecido e autorização de imagens.

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3 RESULTADOS E DISCUSSÃO Os resultados dos questionários aplicados aos sujeitos da pesquisa estão no quadro a seguir. ETAPAS

Elaboração de projeto de investigação

EXCERTOS Eu achei formidável o nosso projeto, mesmo que no começo a gente não compreendesse muito, mas o professor e o orquidófilo estavam sempre lá dispostos a tirar nossas dúvidas e ajudar com seus complementos. ESTUDANTE Os estudantes escolheram o tema/problema, elaboraram hipóteses, definiram a metodologia. Nesse formato o estudante é protagonista e o professor tem função de mediador. PROFESSOR Essas atividades levaram os alunos ao contato com as orquidáceas, e por certo, foi um processo enriquecedor para os estudantes do Clube de Ciências. ORQUIDÓFILO O projeto tem sua relevância primeiramente por possibilitar que os alunos conheçam os tipos de orquídeas, seus nomes científicos, habitat, seu cultivo, sua exploração econômica e sustentabilidade. DIRETORA. O orquidófilo, compartilhou todo seu amplo conhecimento conosco, pudemos esclarecer dúvidas e nos mostrou exemplares de orquídeas para nos ajudar na pesquisa. ESTUDANTE Foi um momento de interação entre o orquidófilo e os estudantes, eles esclareceram dúvidas, também surgiram novos questionamentos e ideias. PROFESSOR

Roda de Conversa

A troca de ideias através da participação dos alunos esclarecendo dúvidas leva os estudantes a se interessarem por um conhecimento que lhes será útil na vida futura. ORQUIDÓFILO A roda de conversa é uma dinâmica admirável na escola, pois possibilita a troca entre pares, tira as dúvidas e sana curiosidades. E, conversar sobre determinado assunto, no caso orquídeas, contribui para alargar os horizontes de conhecimento. DIRETORA. Foi excelente! Ele nos recebeu super bem, procurei ir em todas as visitas, ele nos emprestou livros para fazermos o levantamento. É preciso vários anos estudando e pesquisando sobre as orquídeas para ser especialista no assunto. ESTUDANTE

Aula de campo e Levantamento das orquídeas

A aula de campo é um dos momentos que eles mais gostam; eles observam, registram a atividade através de caderno de campo, fotografias que irão compor o diário de bordo comparando com a literatura e revisitando quando necessário. PROFESSOR O contato visual e as informações sobre o cultivo das orquídeas quando vista ‘in loco’ despertou o interesse e acrescenta conhecimentos aos estudantes. ORQUIDÓFILO Foi momento ímpar na vida dos alunos, pois fazer visitas a um orquidário é ver de perto o que tinham visto apenas na teoria. DIRETORA

Socialização do projeto à comunidade

A socialização foi boa! Cada um pode contar sua experiência com o projeto, o que conseguiu aprender. Conseguimos passar o que queríamos a importância do orquidário, a quantidade de orquídeas que se encontravam lá. Trouxemos fatos que muitos desconheciam como a descoberta de novas espécies de orquídeas em Oriximiná, o que impressionou bastante as pessoas. Foi tudo muito bom! ESTUDANTE Momento de compartilhar conhecimento adquirido com a comunidade escolar, desenvolver a habilidades, saber comunicar, argumentar, ouvir sugestões para melhoria do projeto e desenvolvimento pessoal. PROFESSOR Muito importante! O conhecimento só tem sentido quando socializado com outras pessoas. ORQUIDÓFILO Socializar experiência além de acrescentar aquilo que não se percebeu durante uma visita de um estudo, é o momento de aprofundar o conhecimento, pois quando se socializa, organiza todo um arcabouço de conhecimentos que são reiterados por todos os envolvidos. É o momento de ser o autor dos próprios conhecimentos. DIRETORA

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Nos excertos explicitados no quadro 2, chama atenção a opinião da ESTUDANTE sobre a metodologia ativa utilizada pelo PROFESSOR, que a princípio lhe causou estranhamento, evidenciando que o ensino que ela havia experienciado é o ensino tradicional, onde o aluno é um ser passivo. Já o professor apresenta uma postura mais progressista, ao colocar o estudante como protagonista da sua própria aprendizagem e ele como mediador do conhecimento. Revela também a importância do acompanhamento e interação do professor-orientador, bem como do especialista. Essa contextualização, conforme afirma o ORQUIDÓFILO torna esse conhecimento mais significativo e enriquecedor. Segundo Lamim-Guedes (2017, p. 252): Os professores de Ciências e educadores ambientais podem usar as perspectivas da alfabetização científica e as metodologias ativas para buscar um ensino mais crítico, contextualizado, que permitindo a formação de cidadãos mais informados e participantes.

Para a DIRETORA, o tipo de projeto que foi desenvolvido contribuirá para um maior conhecimento não só da Biologia das orquídeas, mas também da sua importância econômica e social, visando a sustentabilidade. A Roda de Conversa é um instrumento eficaz para o estabelecimento de um espaço de diálogo e interação (MELO e CRUZ, 2014). No caso do Clube de Ciências, foi consenso por parte dos entrevistados, de que a Roda de conversa sobre as orquídeas trouxe uma maior aproximação com o especialista, permitindo o esclarecimento de dúvidas e ampliação do conhecimento abordado. A aula de campo foi considerada por todos os envolvidos uma atividade excelente, por proporcionar ao estudante o contato direto com o objeto do conhecimento. Para o PROFESSOR, é importante que o estudante tenha consciência de que a aula de campo não é um entretenimento, mas é uma atividade na qual o estudante desenvolve habilidades e que contribuirá para sua alfabetização científica. Para Sasseron e Carvalho (2011) trabalhar a alfabetização científica é importante para formar cidadãos críticos e atuantes na sociedade. Em relação ao levantamento das orquídeas, a ESTUDANTE relatou dificuldades e ressaltou que demandaria muito tempo para identificar todas as espécies, como de fato ocorreu, pois foram necessários três anos para que as alunas pudessem concluir o levantamento. Acerca da socialização do trabalho, os estudantes participaram da Feira Pedagógica da Escola e a II FECITBA promovida pela UFOPA em Santarém, evento de caráter estadual. Também submeteram um resumo ao 70º Congresso de Botânica, apresentado por uma professora do Campus da UFOPA em Maceió- AL. Sobre a socialização ocorrida nesse evento em particular, todos consideraram muito importante, pois se constituiu em um momento de compartilhar conhecimentos, divulgar o trabalho feito para a comunidade, bem como no desenvolvimento de habilidades que contribuirão para aquisição da liberdade de pensamento dos estudantes. CONSIDERAÇÕES FINAIS A atividade promovida pelo Clube de Ciências no orquidário foi considerada uma experiência exitosa pelos participantes, pois fez com que os estudantes clubistas desenvolvessem habilidades associadas ao fazer científico, gerando conhecimento que pôde ser compartilhado com a comunidade escolar acerca do valor das orquídeas e da importância de sua conservação para o equilíbrio do bioma amazônico. Além de servir de incentivo para que outros educadores realizem atividades de iniciação científica com seus alunos (a)s em espaços não-formais de educação. Revista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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REFERÊNCIAS CARDOSO, J.C.; ISRAEL, M. Levantamento de espécies da família Orchidaceae em Águas de Sta. Bárbara (SP) e seu cultivo. Horticultura Brasileira, Brasília, v.23, n.2, p.169-173, abr-jun 2005. IBGE. Informações sobre a Cidade de Oriximiná-PA. 2020. Disponível em: <https:// www.ibge.gov.br/cidades-e-estados/pa/oriximina.html>. Acesso em: 15ago.2020. FLORA DO BRASIL. Orchidaceae in Flora do Brasil 2020 em construção. Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Disponível em: <http://floradobrasil.jbrj.gov.br/reflora/floradobrasil/FB179>. Acesso em: 13 out. 2020. KOCH, Ana Kelly. Orquídeas nativas de Mato Grosso. Cuiabá: Carlini & Caniato Editorial, 2012.112p. KUMARIA S.; TANDON P. (2001). Orchids: The most wonderful plants in the world. In: Pathak P, Sehgal R.N.; Shekhar N.; Sharma M; Sood A. (eds) Orchids: Science and Commerce. Bishen Singh Mahendra Pal Singh, Índia, pp. 17-28. LAMIN- GUEDES, V. Alfabetização científica, contextualização e metodologias ativas no ensino de ciências e educação ambiental. Revista Eletrônica Ensino, Saúde e Ambiente – V10, p. 238-256, 2017. MEZZALIRA, F. K.; KUHN, B.C. O Prestígio da Família Orchidaceae para o Mundo: Artigo de Revisão. Pleiade, 13(29): 58-68, Jul./Dez., 2019. MELO, M. C. H.; CRUZ, G. C. Roda de conversa: uma proposta metodológica para a construção de um espaço de diálogo no ensino médio. Imagens da Educação, v. 4, n. 2, p. 31-39, 2014. PELUZIO, L. E.; SOARES, M. N. Orquídeas: porta aberta para a Educação Ambiental. 2008. Disponível em: <http://www.coluni.ufv.br/ revista-antiga/docs/volume01 /orquideas.pdf>. Acesso em: 20ago.2020. PEREIRA, D. F. B.; PEREIRA, J. P. Q.; SARDINHA, T. Q. Primeiros passos de um clube de ciências escolar no município de Oriximiná- PA. In: II Encontro Regional Norte de Biologia. Anais [...] Santarém(PA): Universidade Federal do Oeste do Pará, 2019. p. 110-117. PEREIRA, D. F. B. SARDINHA, T. Q.; TAVARES, J. C.P. FREITAS; A. V.; SILVA, E. S.; SILVA, D. F.; FERREIRA, Z. F.; TALGATTI, D. M. Inventário de orquídeas nativas da Amazônia realizado por estudantes secundaristas em um orquidário particular no município de Oriximiná (Oeste do Pará, Brasil). In: 70º Congresso Nacional de Botânica. Anais [...] Maceió(AL), Brasil; UFAL: 2019. Disponível em: <https://70cnbot.botanica.org.br/wp-content/uploads/2019/11/Livro-70% C2%BA-Congresso-Nacional-de-Bot%C3%A2nica..pdf>. Acesso em: 20ago2020. p.484. PETROVSKA, B. B. Historical review of medicinal plants’ usage. Pharmacognosy Reviewes, v. 6, n. 11, p. 1–6, 2012. ROCHA, A. E. S. Conhecendo as orquídeas do Pará / Antônio Elielson Sousa da Silva. Belém: MPEG, 2019. SANTOS, J. D.; FERNANDES, A. M.; CASTRO, M. D. L. O orquidário como ferramenta para educação ambiental no parque municipal Anhanguera na cidade de São Paulo, Brasil. In: XV Congresso de Iniciação Científica, Mogi das Cruzes: UMC, 2012. Disponível em: <http:// www.umc.br/_imgs/XV_congresso/artigos/Jaciara%20Dias%20dos%20Santos.pdf>. Acesso em 20ago2020. SASSERON, L. H.; CARVALHO, A. M. P. de. Alfabetização científica: uma revisão bibliográfica. Investigações em Ensino de Ciências – V16(1), pp. 59-77, 2011. SILVA, J. B. F. Orquídeas nativas da Amazônia Brasileira (Gênero: Catasetum L.C. Rich e Kunth). Belém: MPEG, 1998.121p. SILVA, M. F. F. da; SILVA, J. B. F. da. Orquídeas nativas da Amazônia Brasileira II. Manoela F. F. da Silva, João Batista F. da Silva. – 2. ed. Rev. Belém: Museu Paraense Emílio Goeldi, 2010. 518p. SOUZA-FILHO, E. A.; MORAES, M. S.; YAMAGUCHI, K. K. L. Orquidário: uma abordagem para promover a Aprendizagem significativa no ensino de Ciências e sensibilizar sobre a educação Ambiental. Revista conexão UEPG, Ponta Grossa, Paraná- Brasil, v. 16, 2020. Disponível em: <www.revistas2.uepg.br/index.php/conexao/article/view/14469>. Acesso em:20ago.2020. Revista “Informação” - Vol. VI, Nº 8 (Dez.2020)

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USO DO IMC NA CONSTRUÇÃO E INTERPRETAÇÃO DE TABELAS E GRÁFICOS NAS AULAS DE CIÊNCIAS Claudeth de Souza Pinto1 Alex Corrêa da Silva2 RESUMO A utilização de gráficos perpassa por todas as disciplinas que associam a estatística nas análises de dados. Incentivar nos alunos a leitura de gráficos e tabelas permitirá futuras interpretações, avaliações e inferências sobre as informações contidas em diferentes recursos estatísticos que aparecem diariamente em livros, informativos e nos diversos meios de comunicação como recomenda o Documento Curricular para Educação Infantil e Ensino fundamental do Estado do Pará, embasado na BNCC, em seus quatro eixos estruturantes: Espaço/Tempo e suas Transformações, Linguagem e suas Formas Comunicativas, Valores à Vida Social e Cultura e Identidade. Esses eixos funcionam como um universo a ser explorado por toda comunidade escolar no processo de produção de conhecimentos. O presente estudo é um relato de experiência sobre uma atividade desenvolvida com alunos do 8º ano de uma escola da rede estadual de ensino do Pará, visando estimular o raciocínio estatístico-matemático durante as aulas de ciência através da construção e interpretação de tabelas e gráficos utilizando o índice de massa corporal (IMC) dos próprios educandos. O estudo foi dividido em três etapas: 1- Coleta de dados, cálculo e tabulação dos resultados, 2Interpretação de tabelas, confecção e interpretação de gráficos e, 3- Questionário avaliativo. Os estudantes apresentaram dificuldade na realização de cálculos matemáticos, por outro lado mostraram-se muito interessados em aprender com a dinâmica utilizada. A maioria dos grupos conseguiu, sem muita dificuldade, interpretar os resultados presentes na tabela de dados, construir e interpretar os gráficos por eles desenvolvidos. 78 alunos realizaram todas etapas da atividade e, consideraram a forma como a mesma foi conduzida mais fácil de aprender. Palavras-chaves: Ensino de Ciências. Interpretação gráfica, interdisciplinaridade.

INTRODUÇÃO A utilização de gráficos não está contida apenas nas aulas de matemática, mas em todas as disciplinas que associam a estatística nas análises de dados. Os gráficos se apresentam como uma ferramenta capaz de ampliar a capacidade humana de sistematizar dados e estabelecer relações entre os mesmos (VYGOTSKY, 1994). A capacidade de ler e também de construir gráficos e tabelas, faz parte do que é chamado alfabetização matemática e está presente em nosso cotidiano (SÁ, 2005). Conforme disposto na Base Nacional Curricular Comum (BNCC), no 8º ano do ensino fundamental, área de Matemática, o aluno deve ser capaz de utilizar as linguagens numérica e algébrica, em diferentes representações, para elaboração e resolução de problemas (PARÁ, 2018; BRASIL, 2020).

1

Licenciada em Ciência biológicas (UFPA); Mestre em Zoologia (UFPA/MPEG); doutoranda em Biologia Parasitária na Amazônia (UEPA); professora de Ciências e Biologia na rede estadual de educação do estado do Pará (SEDUC-PA). E-mail. dethsp@yahoo.com.br. Fone: (91) 98893-4804

2

Licenciado em Biologia (IFPA); Mestre em Ciências Ambientais (UEPA). Professor de Biologia na rede estadual de educação do estado do Pará (SEDUC-PA). E-mail. bioaprendizz@hotmail.com. Fone: (91) 980332899

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O Índice de massa corpórea (IMC) é uma medida adotada pela organização mundial de saúde para verificar se uma pessoa está com o peso ideal de acordo com sua altura. Para se chegar ao valor do IMC há a necessidade da realização do cálculo matemático: peso (em kg) dividido pela altura (em metro) elevado ao quadrado. A resolução de problemas que envolvam cálculos, utilizando as propriedades das operações é uma habilidade que deve ser estimulada nos alunos do ensino fundamental na área de matemática (PARÁ, 2018; BRASIL, 2020). O IMC tem ganhado relevância por possibilitar a classificação do estado antropométrico e monitoramento do excesso de peso populacional. O peso excessivo e a obesidade exercem um impacto significativo sobre a saúde pública (CHOR; COUTINHO; LAURENTI, 2006; PEIXOTO; BENICIO; JARDIM, 2006). Identificar os cuidados básicos de saúde, alimentação e higiene é uma habilidade a ser estimulada tanto durante as aulas de educação física quanto de ciências (PARÁ, 2018; BRASIL, 2020). No ensino de ciências não se pode falar de nutrição e deixar de lado temas embutidos como desnutrição, obesidade, prática de atividade física e seus indicadores em saúde como por exemplo, o IMC. Falar sobre esses assuntos requer mostrar dados relevantes da população que em sua maioria encontram-se organizados em tabelas e gráficos. Portanto, a interpretação e compreensão desses componentes pelos alunos é de fundamental importância para um bom entendimento do conteúdo ministrado. Interpretar as condições de saúde da comunidade, cidade ou estado, com base na análise e comparação de indicadores de saúde é uma habilidade contida no subeixo “Dignidade humana, corpo e saúde” para o ensino de ciências da natureza (PARÁ, 2018; BRASIL, 2020). A dificuldade de ler, interpretar e fazer inferências de informações que aparecem em tabelas e gráficos é uma realidade apresentada por alunos dos ensinos fundamental e médio não somente nas escolas públicas (SANTOS; COQUEIRO, 2009; LIMA; SELVA, 2013). Incentivar nos alunos a leitura de gráficos e tabelas permitirá com que os mesmos possam também interpretar, avaliar e inferir sobre as informações contidas em diferentes recursos estatísticos que aparecem diariamente nos livros didáticos, jornais, revista, outdoor, internet e diversos outros meios de comunicação, de forma fácil e prática. De acordo com a BNCC, articular o verbal com os esquemas, infográficos e imagens variadas é uma habilidade a ser estimulada na área de linguagens em todos os anos do ensino fundamental (PARÁ, 2018; BRASIL, 2020). Desse modo, o presente estudo teve como objetivo estimular o raciocínio estatísticomatemático durante as aulas de ciência, em alunos do 8º ano do ensino fundamental da Escola Estadual Prof . Palmira Gabriel através da construção e interpretação de tabelas e gráficos utilizando dados de índice de massa corporal (IMC) dos próprios educandos. a

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS O estudo foi realizado no ano de 2019 na E.E.E.F.M. Profa. Palmira Gabriel, Belém, Pará, a qual atende alunos do ensino fundamental maior (6º ao 9º ano) e ensino Médio (1º ao 3º ano) em três turnos (Manhã, tarde e noite). O espaço escolar conta com salas de aula regulares, biblioteca, auditório, quadra de esportes, uma área coberta para exposições e, um laboratório multidisciplinar onde são realizadas as aulas práticas de ciências, biologia, química e física. Alunos de quatro turmas do 8º ano do ensino fundamental, com idade entre 13 e 16 anos, participaram da atividade, sendo três turmas do turno da manhã e uma do turno da tarde. Após participarem das aulas teóricas sobre “nutrição” cada turma foi dividida em grupos de 4 ou 5 alunos para realização da atividade prática, desenvolvida em três etapas, uma em cada semana de aula:

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1ª Etapa - Coleta de dados, cálculo matemático e tabulação dos resultados Esta etapa foi realizada no laboratório multidisciplinar da escola onde foi medida a altura dos alunos e, com o uso de uma balança, foi verificado a massa corpórea. Na atividade considerou-se “massa corpórea” como “peso” para facilitar a compreensão pelos estudantes. Os dados por eles obtidos foram registrados em uma tabela (Figura 1). Posteriormente, com ou sem auxílio de calculadora, cada grupo calculou o IMC de cada integrante da equipe, utilizando a seguinte fórmula [IMC = peso/(altura) ]. As médias das alturas e dos pesos de cada grupo também foi calculada. Todas as informações foram tabuladas para posterior interpretação. De acordo com a Organização Mundial de Saúde o IMC<18,5Kg/m significa que o indivíduo está abaixo do peso; 18,5 Kg/m <IMC>24,9 Kg/m corresponde ao peso ideal; IMC >25 até 29,9 Kg/m indica sobrepeso; e >30 Kg/m é indicativo de obesidade (OMS, 1995). No presente estudo, para facilitar a interpretação dos dados gráficos pelos alunos, considerou-se: IMC<18= Baixo; 18<IMC>25 = ideal; IMC>25 =alto (sobrepeso). 2

2

2

2

2

2

Figura 1: Tabela utilizado pelos alunos para anotação dos dados obtidos em laboratório.

2ª Etapa - Interpretação de tabela, confecção e interpretação de gráficos. Esta etapa foi desenvolvida em sala de aula, a partir dos resultados obtidos em laboratório. Cada grupo, com auxílio das informações registradas na tabela de dados, realizou a interpretação dos mesmos e a construção gráfica do IMC do grupo (Figura 2).

Figura 2 - Interpretação dos resultados anotados nas tabelas e construção do gráfico de IMC de cada grupo.

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Com os dados de IMC colhidos de cada grupo foi realizada uma contagem geral do número de alunos que estavam com IMC<18, 18<IMC>25 e IMC>25 em cada turma. A partir dessa contagem cada grupo confeccionou o gráfico de IMC referente à sua turma. 3ª Etapa – Questionário avaliativo Essa etapa, realizada em sala de aula, teve como propósito avaliar as aulas realizadas e identificar as principais dificuldades da turma nas etapas da atividade proposta. Para isso, os alunos responderam a um questionário (Figura 3) contendo sete questões sobre o que aprenderam, facilidades e dificuldades encontradas. Nessa etapa os alunos não precisaram se identificar.

Figura 3 - Questionário utilizado na avaliação da atividade proposta.

RESULTADOS E DISCUSSÃO O ensino de ciências pode se processar em diferentes contextos educacionais e espaciais. Atividades quando realizadas fora da sala de aula tornam-se mais interessante aos alunos permitindo uma compreensão mais eficiente dos conhecimentos (MOREIRA; MASINI, 2006). A aula no laboratório multidisciplinar da Escola Palmira Gabriel é sempre um ambiente de muita expectativa pelos alunos, especialmente do ensino fundamental, os mesmos se mostram mais atentos e interessados, o que contribui com o aprendizado, enfatizando a importância deste espaço no âmbito encolar. Durante a realização da 1ª etapa da atividade os alunos mostraram-se bastante ansiosos em conhecer a dinâmica de pesagem e verificação da altura. Cada grupo recebeu um roteiro da atividade a ser realizada, nele estava contido a tabela de registro de cada item medido ou calculado, além de espaço para anotação da interpretação dos resultados obtidos. Em cada grupo (de 4 ou 5 alunos) foi realizado a medição de altura e peso, os quais eram anotados na referida tabela. Com esses dados os alunos calcularam o IMC e, média de altura e peso do grupo. Observou-se uma grande dificuldade na realização dos cálculos, mesmo com a utilização de calculadora por alguns grupos, demonstrando não somente a dificuldade de domínio matemático, mas também de utilização de recurso tecnológico (calculadora).

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De acordo com a Base Nacional Curricular Comum (BNCC), alunos do 8º ano do ensino fundamental devem ser capazes de resolver problemas que envolvam cálculo do valor numérico de expressões algébricas, utilizando as propriedades das operações (BRASIL, 2020), o que vai de encontro ao observado durante as etapas do presente estudo. Havendo, portanto, a necessidade de atividades diferenciadas que estimule e melhore essa habilidade nos educandos nesse nível de ensino. Por outro lado, essa primeira etapa da atividade teve uma importância significativa quando apresenta aos alunos a ciência como disciplina que conversa com outras disciplinas para ser compreendida, nesse caso a matemática, através dos cálculos que os alunos precisaram realizar para dar continuidade à dinâmica da atividade e possibilitar a interpretação dos resultados. Na segunda etapa da atividade realizada que envolveu inicialmente a interpretação dos dados obtidos e calculados registrados em tabela. Verificou-se facilidade pela maioria dos grupos na interpretação dos dados tabulados (Figura 4), demonstrando a compreensão do conteúdo ministrado nas aulas teóricas e na prática em laboratório e, também a capacidade de transformar o conteúdo apresentado na tabela, em texto discursivo. Habilidade que deve ser estimulada desde o 6º ano do ensino fundamental de acordo com a BNCC (PARÁ, 2018; BRASIL, 2020).

Figura 4 – Interpretação das informações presente na tabela de dados pelos alunos do 8 º ano do ensino fundamental.

A realização da atividade em equipe, a partir das informações colhidas pelos alunos no laboratório, facilitou a construção e interpretação das tabelas e gráficos. Todas as equipes conseguiram construir os gráficos com os dados apenas do seu grupo (Figura 5).

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Quando as equipes tiveram que analisar os dados gerais de IMC da turma, houve divergências nas construções gráficas, muito mais relacionada a não atenção dos grupos com relação aos dados gerais informados do que necessariamente problemas de interpretação.

Figura 5 - Gráficos de barra confeccionados pelos alunos do 8º ano (A e B – 802 Manhã; C e D – 801 manhã) da Escola Palmira Gabriel.

Um grupo em específico chamou a atenção ao construir o gráfico de barras corretamente, com legenda em cores também de forma correta, entretanto não conseguiu repassar por escrito o que de fato o gráfico mostrava (Figura 6). O que pode significar que a parte textual que o gráfico representa, para esse grupo, não estava claro e, consequentemente uma deficiência na habilidade de articulação do esquema gráfico com a linguagem verbal/textual.

Figura 6 - Gráfico de barra apresentado por um grupo de alunos do 8º ano.

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Ao todo 78 alunos, com idade entre 13 e 16 anos, participaram de todas as etapas da atividade e, portanto, responderam ao questionário. Ao final da atividade 81% dos alunos já sabiam o significado de IMC, levando-se em consideração que mais de 70% nunca tinha ouvido falar sobre o assunto. 97% dos alunos classificaram a aula entre ótima ou boa, esse mesmo percentual considerou mais fácil o aprendizado da forma empregada (Figura 7).

Figura 7 - Respostas apresentada pelos alunos referentes às questões de 1 a 4.

Quando questionados sobre a maior dificuldade encontrada, 78% responderam ser a realização dos cálculos matemáticos, o que mostra a fragilidade dos alunos nessa área (Figura 8). A questão 6 do questionário envolveu a realização do cálculo de IMC, a partir de dados fornecidos. O objetivo nessa questão era estimular o raciocínio não somente para a realização do cálculo, mas também para a interpretação dos resultados. Dos 78 alunos, 46% conseguiram resolver a questão corretamente, 51% resolveram, porém, o cálculo matemático estava incorreto e 2% não responderam (Figura 8). O que comprova a dificuldade apresentada pelos mesmos na realização de cálculos. Dos 46%, o que corresponde a 36 alunos, que resolveram corretamente, 32 também realizaram a interpretaram dos dados de forma correta.

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Figura 8 - Respostas apresentada pelos alunos referentes às questões de 5 e 6.

Quando questionados sobre a importância de se conhecer o IMC de uma pessoa, 79% responderam corretamente e fizeram associação com temas relacionados como: obesidade, deficiências nutricionais, alimentação incorreta e prática de atividade física. 13% não souberam explicar a importância e 8% responderam corretamente, porém sem fazer associação a temas relacionados (Figura 9).

Figura 9 - Respostas apresentada pelos alunos referentes à questão 7.

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CONSIDERAÇÕES Os alunos das diferentes turmas de 8º anos demonstraram interesse e participaram de forma ativa das atividades relacionadas. Mesmo com as dificuldades apresentadas pelos alunos na realização de cálculos matemáticos para a confecção das tabelas/gráficos, a interpretação se tornou mais simples pois, os mesmos, foram os protagonistas na coleta de dados, tabulação e construção gráfica. Da mesma forma a atuação em grupo foi um potencializados da atividade possibilitando a discussão entre os alunos afim de se chegar ao resultado final. Uma limitação no desenvolvimento da atividade foi a não realização em parceria com as disciplinas de matemática, língua portuguesa e educação física, as quais seriam de grande relevância na compreensão e enriquecimento intelectual dos alunos.

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