Páginas Volantes nr. 12- Rómulo de Carvalho 2

30 minutos a ler VII Comemorar as Bibliotecas Escolares Páginas volantes -- 12 Rómulo de Carvalho, A Física no Dia-a-Dia - 2

Rómulo de Carvalho (Lisboa, 1906-1997), professor de Ciências Físico-Químicas (para muita gente, mais conhecido por António Gedeão, o poeta de “Pedra Filosofal”), é um símbolo inigualável da cultura científica em Portugal.

Além de professor de ciências e de poeta, juntando na mesma pessoa duas sensibilidades diferentes, foi um notável divulgador científico e um historiador da ciência, da pedagogia e, em geral, da cultura portuguesa.

Recebeu a Medalha de Mérito Cultural em 1996.

Adaptado de: Rómulo de Carvalho - RÓMULO Centro Ciência Viva da Universidade de Coimbra - Universidade de Coimbra (uc.pt) (acedido a 12/10/2021)

Palavras-chave: ímanes; pilha seca; prego; eletricidade.

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17.Vou ensinar o meu amigo a fazer um íman sem ser por meio da fricção com outro íman.?

Entre as coisas que o meu amigo ficou sabendo ao ler as páginas anteriores foi como se pode magnetizar uma agulha de coser ou qualquer outro pequeno objeto feito de aço. Lembrase? Roça-se a agulha por um íman ou então passa-se o íman por ela, o que vem a dar na mesma. O que é preciso é fazer como lhe disse: passar sempre no mesmo sentido e nunca para lá e para cá.

Se o meu amigo estiver a pensar que os ímanes que existem foram magnetizados desta maneira, levanta-se-lhe uma grande dificuldade parecida com a da galinha e do ovo. O que é que apareceu primeiro no mundo: foi a galinha ou foi o ovo?

Se o ovo tem que ser posto pela galinha e a galinha tem de nascer de um ovo, não se atina com a resposta.

E aqui, como é que resolve a dificuldade? Para magnetizar um íman precisa de já ter outro com que o há-de friccionar. E esse outro, como foi magnetizado? Recorrendo a outro. E este outro? Parece que deveria ter começado por existir um íman que não tivesse sido magnetizado daquela maneira e que dele descendessem todos os outros. Não é bem assim, mas é parecido.

Existe na Natureza uma pedra, escura e muito rija, que é magnética. Se se lhe aproximar um prego, a pedra atrai-o e prende-o a si. Chama-se a essa pedra magnetite ou pedra-íman, e tem ferro na sua composição, como não podia deixar de ser.

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Quando se fricciona um objeto de aço, uma agulha, uma lâmina de barbear, o que quiser (desde que seja de aço), com essa pedra, o objeto fica magnetizado. Talvez lhe interesse saber se a magnetite existe em Portugal. Existe, sim senhor, e bastante, na serra do Marão, lá para Trás-os-Montes.

Ao princípio todos os ímanes que existiam eram feitos a partir dessa pedra, por fricção, ou então a partir de outros ímanes já feitos pelo mesmo processo. Sucedeu porém que um belo dia se descobriu outra maneira de magnetizar e essa, por sinal, muito interessante porque não é preciso nenhum íman!

Isso não pode ser! – dirá o meu amigo. Pois pode, digolhe eu. Vou ensinar-lhe como se faz e o meu amigo vai fazer um íman por esse processo.

Para isso é indispensável arranjar uma pilha seca. Sabe o que é? Então não havia de saber? Toda a gente sabe o que é uma pilha seca. Quem não conhece as lâmpadas elétricas de bolso que trabalham com uma pilha ou os aparelhos de rádio com pilhas? Se não tem nenhuma, terá de ir comprá-la porque vai precisar dela para várias experiências. Peça na loja uma pilha de 4 volts e meio. Não se importe em querer saber o que isso significa. Peça assim.

A pilha seca, vista por fora, é uma caixa um pouco parecida, no feitio, com um maço de cigarros, ou então é redonda. Prefiro que compre uma que não seja redonda porque ajeita melhor ao que irá fazer (fig.61) .

Na parte de cima da pilha há duas lâminas metálicas, de latão. Como deve saber, Página 3 de 7

é aí que se vão ligar os fios elétricos, que também são de metal, quando se quer utilizar a corrente elétrica que a pilha dá.

Para trabalharmos mais à vontade assentemos a nossa pilha numa tábua conforme se representa na fig.62. A tábua pode ser retangular e medir 21 centímetros de comprimento por 13 de largura. São as medidas da que eu tenho aqui ao pé de mim enquanto escrevo estas linhas.

Para que a pilha fique segura espete alguns pregos pequenos na tábua, como a figura mostra, sem os dobrar, de maneira a poder colocar ou retirar a pilha quando lhe apetece.

Junto das lâminas espete também dois pregos de modo que fiquem encostados a elas com certo esforço. Deste modo quando quiser ligar os fios elétricos, enrola-os nos pregos, o que lhe dá mais jeito do que enrolá-los nas próprias lâminas.

Agora vamos aos tais fios elétricos. Estes fios são de cobre (são os de cobre que nos interessam), vendem-se em rolos e há-os mais finos e mais grossos. Do que precisamos nesta ocasião é de um fio vulgar, de cobertura de plástico, que não seja muito fino, de tal modo que se estender um pedaço dele do tamanho de um palmo, o possa manter direito na mão, preso por uma ponta, sem se dobrar por si, o que sucederia se fosse muito fino.

Compre uma porção dele, que é barato, e corte, por agora, aí uns 60 centímetros de comprimento. Com um canivete retirelhe a cobertura de plástico das extremidades, deixando a

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descoberto cerca de 2 centímetros de fio metálico, que é para depois fazer por aí o contacto com as lâminas da pilha.

Agora vai arranjar um prego grosso, que não seja pequeno, suponhamos com 7 ou 8 centímetros de comprimento, como este que aqui tenho na mão e que o meu amigo não esta a ver mas de que me sirvo para fazer a experiência à medida que lhe vou escrevendo. Agora enrole o seu fio de cobre em torno do prego, apertando-o bem sobre ele e juntando as espiras à medida que as for fazendo. Deixe ficar duas pontas compridas do fio, mais ou menos iguais (fig.63).

Se o meu amigo tocar com as extremidades do fio nas lâminas da pilha (cada extremidade numa das lâminas) a corrente elétrica fornecida por ela percorrerá o fio todo e, portanto, também a parte que está enrolada à volta do prego.

Pelo próprio prego é que não passa porque o plástico do fio não deixa passar a corrente para o prego.

Então agora vai fazer isso mesmo que lhe disse. Vai tocar com as extremidades do fio nas lâminas da pilha e verificar que…o prego ficou magnetizado! Como há de verificar?

Pondo-lhe uns preguinhos pequenos ao pé para ver se os atrai.

Faça e veja que o resultado é esse. O prego fica magnetizado quando a corrente elétrica passa no fio.

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Para lhe facilitar o trabalho pode o meu amigo dobrar a ponta de um dos fios (fig.63) e entalá-la junto de uma das lâminas da pilha conforme está representado na figura 64. Depois pegará, por exemplo, no prego grande com uma das mãos enquanto toca na outra lâmina com a ponta do fio restante segura na outra mão. Assim poderá apreciar bem o poder de atração do prego grande para os pregos pequenos.

(Não tenha a pilha muito tempo ligada que é para não gastar depressa.)

Para verificar que o prego ficou magnetizado também poderia aproximá-lo dos pólos da agulha magnética da bússola.

Se tiver alguma, experimente mas, quer a tenha quer não, estou interessado em que trabalhe com a bússola que o meu amigo fez, ou seja, com a agulha de coser enfiada na cortiça.

Ponha esta sua agulha a flutuar na água de um pires, ligue as extremidades do fio, que enrolou no prego grande, às lâminas da pilha e aproxime uma ponta do prego do bordo do pires (fig.65). Veja bem o que se sucede. A agulha roda, dirige-se para o prego e agarra-se a ele! Experimente a ver se essa ponta do prego também atrai a outra ponta da agulha. Verá que a repele. Agora vire o prego e trabalhe com a outra extremidade.

Verá que tudo se passa ao contrário.

Em resumo: a cabeça do prego atrai uma extremidade da agulha de coser e repele a outra; a ponta do prego atrai a extremidade que a cabeça repele, e repele a que atrai.

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Como vê, não só o prego está magnetizado como tem, num extremo, um pólo norte e no outro um pólo sul.

Esta magnetização não foi conseguida por fricção do prego num íman.

Foi conseguida por meio da corrente elétrica. É assim, por meio da corrente elétrica, que se fazem os ímanes que se vendem nas lojas e se utilizam nos vários aparelhos. E fazem-se assim ímanes tão fortes que o meu amigo nem imagina.

Nunca se obteria nada que se parecesse com isso por meio da fricção. Pense no carril de ferro de um comboio. Que íman seria preciso para se lhe agarrar e ser capaz de levantá-lo do chão, a grande altura? Talvez isto lhe pareça impossível, mas fazem-se ímanes desses por meio da corrente elétrica, conforme acabou de fazer com o prego grande. Usa-se este processo, por exemplo, para descarregar um navio que transporte carris ou barras de ferro. Aproxima-se delas um íman suspenso de um guindaste, liga-se a corrente elétrica para magnetizar o íman que então agarra as barras, e o guindaste eleva-as e põe-nas em terra. É importante, não é? Então já agora fique sabendo que os ímanes constituídos por um núcleo de ferro em torno do qual se encontra enrolado um fio condutor elétrico se chamam eletroímanes ou eletromagnetes.

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