Estremoz , História de Mulheres - Coleção História de Cidades

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ESTREMOZ quela lápida branca mostra-nos a heráIdica da cidade. É dos mais belos monumentos deste género que existem no nosso país. Vem já do século XIV, da época do rei D. Diniz. Os emblemas esculpidos são o sol e a lua, as estrelas, duas torres de castelos e uma grande planta, que dizem ser o tremoceiro. Porque há-de estar o tremoceiro na pedra municipal? Há uma velha Ienda, mas não sei se foi a lenda que inspÍrou a pedra, se a pedra que fez nascer a lenda. Vindos de longe, chegaram aqui forasteiros que se sentiam escaldar sob o sol alentejano. Para os cobrir, só a lua e as estrelas. Então encontraram um tremoceiro frondoso, e debaixo lele tiveram o primeiro abrigo. v Mas há muitas outras propostas para este estranho nome de Estrerlroz. Doze soluções já foram dadas, mas a palavra continua por adivinhar.

HISTÓRIAS DE CIDADES gal deveria casar com uma princesa da Casa de Aragão. A Península Ibérica dividia-se então em vários reinos, e o Aragão era dos mais poderosos. A aliança com a monarquia aragonesa era portanto um reforço para a independência de Portugal. O casamento f.ez-se ern 7282 e logo desde o início do reinado a sua vida foi uma constante defesa da paz. A primeira das suas intervenções é na Guerra de Portalegre, de que já falámos nestes programas. O In-

T TRÊS HISTÓRIAS FEMININAS A impressão que se tem ao chegar a Estremoz é a de uma cidade destinada à,, guerra. Venha-se de que lado se vier, encontram-se sempre muralhas, poÍtas fortificadas, baluartes. É uma grande praça de armas, e ao Ìongo da História foi sempre uma das chaves estratégicas para a defesa da fronteira. Contar o seu passado é evocar uma sequência de violências, cercos, assaltos, concentraçõs de exércitos, rmbates, explosões, chacinas de r-Trisioneiros, brutalidades. Dizia a RaÍnha Santa Isabel que a guerra é um jogo em que o prazer é sempre para os soberbos, o dano sempÍe paÍa os humildosos. Não grostava de ouvir falar de guerras, a Rainha Santa. E faço-lhe a vontade. Na Òidade de Santa Isabel vamos esquecer as memórias da violência. Em vez disso, recordaremos três histórias femininas, todas elas relacionadas com Estremoz: a primeira será precisamente Santa Isabel de Aragão, rainha de Portugal. A segunda, outra rainha: Leonor Teles, vítima da guerra. A terceira nem sei sequer se existiu: um mito, um símbolo? Simples frase desgarrada?

r A LUTA PELA PAZ Foi aqui em Estremoz que ficou decidido que o jovem rei de Portu-

fante D. Afonso opunha-se ao rei, e apaz foi possível pela intervenção do rei do Aragão, alcançada por meio do pedido da rainha. Anos depois, é ela, com D. Diniz, a medianeira na guerra que opunha os reis de Castela e do Aragão. Mas as horas mais difíceis foram;;aq que

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viveu durante a guer{a entre pai e fithoj.siue D. DinifAe o futuro

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ESTREMOZ

HISTÓRIAS DE CIDADES morreu, ainda na sua função de rainha da paz. Estava em Coimbra quando chegaram as notícias de que o rei de Portugal concentrava tropas em Estremoz Pata invadir Castela. Estava-se na força do Verão, e a rainha eta jâ de grande idade. Mas não houve conselhos que a demovessem e aí vem, Pelas charnecas ardentes, para fazer o seu supremo apelo de Paz. Chegou a tempo de fazer a sua suPlica, e morreu dias depois, cumPrida essa úItima missão. Leonor Teles pouco tempo sobreviveu ao Andeiro. E uma coisa é ceÍta'. ela não estava do lado castelhano. provocou duas O patriotismo reacções: uma popular e burguesa, que o Mestre de Aviz encabeçou, outra senhorial, e legitimista, chefiada por Leonor Teles. Ambos se opunham às pretensões castelhanas. Por isso o rei de Castela, ao chegar a Santarém, aprisionou Leonor Teles, que ficou guardada por duzentas Ìanças. E todas estas mulheres estão Iigadas a Estremoz ou à sua região.

r os PAços NOIVA

DA SEMPRE

Foi dama da casa de Leonor Teles e o seu nome era Beatríz de castro. Era filha do conde D. Álvaro Pires de Castro, aquela que está no túmulo de Alcobaça. A rainha D. Inês passara por ser a mais formosa muIher do seu tempo; Pois dizia-se que aquela sobrinha era ainda mais bela que a tia. Mas a auréola que tem à sua volta não é de beleza, mas de sinistro fulgor. Estamos na herdade da SemPre Noiva, aquelas ruínas são quanto hoje resta dos paços da SemPre Noiva. Sabemos quem os construiu: um D. Afonso de Portugal, Pai do primeiro conde do Vimioso e Pai também de uma jovem de destino trrste, que nunca casou, e que Por isso se julgou ter dado aquele melancóIico nome ao palácio. Chegou a inventar-se uma complicada história: ela estava noiva de um fidalgo de Castela. Certa vez, quando os dois passeavam na herdade, surgriu um toiro tresmalhado e furioso. O fidalgo .fugiu, mas um rnaioral apaixonado que de longe via tudo acudiu atempo e salvou a beldade. O resto adivinha:se: ela também se apaixonou pelo maioral mas a desigualdade social impediu o casamento. A verdade é que quando /o

D. Afonso de Portugal mandou construir os paços, já o lugar se chamava, desde há muito, a SemPre Noiva.

r coNsPrRAçÃo E ROMANCE Muito antes de se D. Afonso viveu Beatriz de Castro, que também está ligada a este lugar. O Pai era conde de Arraiolos, que é a cabeça desta comarca. Ela, desde menina, andava na casa da rainha e quando a conhecemos, em 1384, está noiva de um jovem fidalgo esPanhol, Afonso Henriques de Trastâmara, primo direito do rei de Castela, e irmão do Conde D. Pedro, que viera com o rei invasor. Leonor Teles está praticamente prisioneira, e a jovem namorada inventa um Plano Para a libertar: diz ao noivo que convença o irmão conde a assassinar o rei, durante um rebate militar que os conspiradores vão preparar. Depois casará com Leonor Teles, e ambos reinarão em Portugal. Se o


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HISTÓRAS DE CIDADES O conde de Maiorgas é atingido pela peste e morre pouco depois do casamento. A própria rainha de Castela é contagiada e o exército retira com um longo cortejo de esquifes. Beatriz de Castro vai refu.giar-se em Alenquer, vila que permanecia fiel à sua rainha, que entretanto estava já no cativeiro de Tordesilhas'. r

jovem conseguir isto, ela, Beatriz, de boamente lhe concederia todos os favores que ele lhe pedisse. O jovem convenceu o irmão conde, a conspiração pôs-se em marcha, mas nas vésperas um frade descobriu o segredo a um judeu e o judeu contou-o ao rei de Castela. Descobertos, os conspiradores fugtiram como puderam: o conde D. Pedro acolheu-se ao Porto, Beatriz e o namorado vieram para Lisboa, e aí estavam quando a cidade foi cercada por mar e por terra pelas forças do rei de Castela. Durante o cerco o rei decide casar a jovem com um dos seus capitães: o conde de Maiorgas. Fernão Lopes conta o episódio com Pormenores inesperados: o próprio Mestre de Aviz tomou parLe na festa, e levava mula branca que conduzia a noiva pela rédea. Os lisboetas, assistiam, com desespero e assombro, àquela festa de grandes no meio de uma cidade em que se morria de fome. Mas também o desespero domina o arraial castelhano. Os soldados morrem às centenas em cada dia.

NOVOS LANCES NA TRAGÉDIA

Livre dos castelhanos em Lisboa, o Mestre de Aviz vai com as suas forças cercar Alenquer. Com ele vai o jovem apaixonado Afonso Henriques e todos vêem que, na hora do ataque, é ele quem mais se aproSma das muralhas. Ouer ver a mulher que ama, queÍ que ela o veja sem sombra de medo. Num dia em que a luta é mais encarniçada chega a pensar-se que chegou a hora do assalto final. Afonso Heniques diz ao Mestre que ele próprio deve estar presente na luta. Mas é Dezembro, faz um frio que gela. O Mestre diz{he que não, que vá ele se quiser, e até lhe empresta as armas para isso. O jovem veste a magnífica armadura do Mestre de Aviz, toda estoÍada de seda verde e corre até tocar com a ponta da espada na vila cercada. Os defensores acreditam que é o próprio chefe da revolução que está ali, temerariamente, ao alcance dos seus tiros e esmagam-no sobre as enormes pedradas que atiram do alto dos muros. Bealríz de Castro vê assim morrer, só para que ela o visse, o seu segundo noivo. Estamos em Arraiolos, Convento dos Loios, no lugar que já se chamou Ouinta do Paço porque era aqui o paço do conde D. Pedro de Castro. Foi, portanto, aqui que a jovem Beatriz passou uma parte da sua juventude. E talvez aqui regressasse se tivesse de encontrar um reÍúgio. I

NOIVAS DO CONDESTÁVEL

Estamos em 1387 e o Mestre de Avíz é agora o rei de Portugal. Beatriz de Castro resignou-se a viver na sua corte, onde é, depois da rai4ha, a primeira, dama. a casará Oj.irèi prometeu-Ihe:Que com quern a merecer. O Condestável D. Nuno Alvares Pereira acaba de enviuvar. A muÌher, Leonor de Alvirrr.".i morreu de parto. Ele está na flol da vida: vinte e sete anos,


ESTREMOZ

HISTÓRIASDE CIDADES

uma fortuna imensa. e é conde de três condados (um deles o de Ar. raiolos, que fora confiscado ao pai de Beatriz). O rei vê ali uma forma de resolver, de uma vez, vários problemas. O pai de Beatriz foi o primeiro condestável do reino, numa época em que os cargos eram hereditários. Tudo ficará certo se a filha casar com o segundo condestável. Chama-se a ambos a Braga, e tenta casá-Ios à viva força. Mas o Condestável tem a alma cheia das lembranças de Galaaz. Acredita sinceramente na pureza dos cavaleiros, e vê, naquela viuvez prematura, o dedo de Deus a afastá-lo de corpo de mulher. Nega-se a casar. Foge de Braga e vem para o Alentejo. Fica aqui em Estremoz, a construir esta lgreja dos Mártires, .. consagrada, como todas as outras fez levantar no Alentejo, a co$Uue is rnemorar a ajuda de Deus numa *;.hsra de perigo. t t f

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Beatriz continua a residir nA corte mas resolve tomar nas mão$o seu destino.. Anda no paço um delo ra,7 8

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paz, Fernande Afonso, homem de bom corpo e grande prol, diz Fernão Lopes, o que significa rapagão de boa fortuna. Era muito amigo do rei. O cronista Fernão Lopes escreve que o rei gostava tanto dele que o proibiu de ter amores com mulheres. Já houve entendimentos maliciosos, mas isto representa apenas cfue o rei se considerava no direito de casar os seus protegidos, e por isso lhes proibia aventuras que nunca se sabia como acabavam. Foi por Fernando Afonso que Beatriz se apaixonou. O rei soube, zangou-se, mas o rapaz mostrou muito arrependimento e até pediu licença para ir em romaria em penitência ao santuário de Guadalupe em Castela. E nessa noite viram-no sair, cheio de desgosto, caminho de fronteira. Mas também houve quem visse que saÍa por uma porta e entrava por outra, e se foi fechar na casa de Beatriz de Castro onde ficou todo o tempo que devia demorar a romaria. Ouando o rei soube. mandou prender o jovem e fez acender no Rocio uma fogueira para o queimar. NingnrÉm acreditava que fosse mais

que um grande susto que lhe queria pregar, porque a fogueira era perfeitamente abrurda: queimar porquê, se tudo eram voltas de namorados? Mas o rei obstinava-se, e Fernando Afonso acabou por ter de dizer a verdade: Beatríz não era já sua noiva, era a esposa legítima. Casara com ela em segredo, por palavras de presente. Ela correu a confirmar tudo o que ele dizia: eram marido e mulher, viviam juntos, onde estava o pecado? O rei a nada cedeu. Nem aos rogos da rainha nem aos dos seus conselheiros. Espantada, a população viu queimar vivo no Rocio, Fernando Afonso, o último noivo de Beatriz de Castro. Eìa, aturdida, perguntou ao rei se também devia morrer. Não, para vingança, disse o rei, bastava ter sido barregã daquele plebeu Fernando Afonso. Vingança de quê? Talvez de uma paixão estrangulada. Mas então perde-se o rasto da Sempre Noiva. Eu pelo menos não lho sei. Houve quem dissesse gue foi para Castela. Ouem pode jurar que nãò veio aqui procurar a paz na solidão destas charnecas?



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