Anderson Lima - Campo do Riso

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CAMPO DO RISO

com os seus alunos a questão do rir para quê? Lida com este assunto no sentido da pedagogia do palhaço? PEPE - Tem outro lado também, o ético daqueles que não aparecem: os técnicos de luz, de palco, programadores. Por exemplo, na minha escola os alunos limpavam banheiro, faziam a luz, manutenção do espaço. Eu passo minhas experiências de vida, de respeitar os técnicos, de ser igual, de valorizar as pessoas que facilitam o teu trabalho por uma questão de inteligência, de coração, de generosidade, porque o palhaço tem que ser generoso, sim! Não só na cena tem que estar aberto a se entregar, escutar, dar espaço. Reconhecer e valorizar o trabalho dos técnicos, programadores, anjos e administrativos é importante. Sozinhos não somos nada, não conseguimos trabalhar. O artista que esnoba um técnico hoje, poderá não voltar ao espaço amanhã. Vou contar uma situação que vivi por volta de 2005. Eram os primeiros anos do espetáculo “De Malas Prontas” e apresentamos quatro vezes no Sesc São Paulo (SP). Foi o único espetáculo que fez a viagem inteira através do Sesc. Tínhamos chegado às 8h da manhã ao teatro, naquela época éramos em dois técnicos: o Luiz Otávio, que fez a cenografia, e eu. A apresentação era às 20h. Pela manhã mexemos com a cenografia e a luz, era muito trabalho para ficar perfeito. Saímos para almoçar, falamos besteira. Quando eu estava programando a mesa, meu filho Lucas, com 2 aninhos, estava em um colchão dormindo no chão. Fiz uma piada e o Luiz Otávio me repreendeu, “Pepe Nuñez, Pepe Nuñez...”. Foi então que o técnico-chefe do teatro olhou para mim e disse, “tu és Pepe Nuñez?”, respondi que sim e ele me pediu um abraço. Foi um abraço muito sentido. Tanto que perguntei o porquê daquilo. De imediato ele falou, “porque tu és gente como a gente”. Ele não podia entender que aquele artista que estava lá subindo escada, contando piadas, fosse o autor e diretor de um espetáculo tão renomado como aquele. O técnico estava acostumado com gente de outro trato e me ver deste modo me encheu de orgulho e por quê? Pelo fato de quando a gente retorna ao Sesc, sabe o que acontece? A luz do espetáculo está pronta. Guardaram os mapas do “Bom Apetite” e do “De Malas Prontas”. Então, aquilo que ia levar quatro ou cinco horas já está montado. Somos recebidos com carinho. Ele quer estar com a gente batendo papo. Aquele profissional contou vários casos de diretores que não respeitaram o espaço, até me mostrou um formulário que com as informações de cada companhia, que é repassado à diretoria. Se o grupo não trata bem o equipamento e os profissionais do Sesc, nunca mais retorna. Lembro de uma vez, creio que no interior do Ceará, na turnê para o Palco Giratório, chegamos em um lugar com o “De Malas Prontas” e tínhamos quatro refletores de jardim, enquanto o nosso mapa exigia 52. E o que a gente fez? Adaptamos tudo e foi maravilhoso. É uma atitude que precisa ser tomada. Quando se vê um problema, é necessário pensar na solução. Depois pode vir uma crítica na organização dizendo, “olha, essas coisas não devem ser assim”.

Eu ensinava os alunos a limpar um refletor, a montar uma luz, afinar o som, a 29


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