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APRESENTAÇÃO
O ano de 2020 foi marcado pela catástrofe sanitária provocada pela COVID-19. Pessoas do mundo todo foram obrigadas a mudarem suas rotinas, seus hábitos de relacionamentos e adequarem seus trabalhos aos sistemas de combate à expansão do vírus adotados pelas políticas locais. Para além da economia, a pandemia gerou crise nos diversos setores sociais, culturais e político.
Entre os seguimentos mais afetados, sobretudo pela exigência de isolamento e distanciamento social, principais medidas para combater o avanço do vírus, artistas e profissionais de espetáculos se viram numa situação de desespero na medida em que o tempo passava. A tristeza por conta das variações crescentes nos números de óbitos, a impossibilidade de voltar ao trabalho e pelo fantasma da dificuldade financeira que se tornava aparente.
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Neste quadro duro que tingia a realidade com tristezas e incertezas, se criou uma forte mobilização nacional, onde artistas e profissionais das artes e da cadeia produtiva da cultura se uniram em ações conjuntas, construindo uma articulação envolvendo a sociedade civil e o poder público, e costuraram uma lei emergencial para atender estes trabalhadores. Uma luta dura, uma vez que o representante máximo da nação brasileira se colocou como um entrave ao desenvolvimento pleno da lei como foi criada, demorando para dar a sansão presidencial e apresentando vetos que dificultaram a implementação da lei pelos estados e municípios.
E assim, caminhando para o final do ano a lei se tornou realidade: a Lei Aldir Blanc (LAB). Lei que leva o nome de Aldir Blanc, artista das canções, um poeta singular da música brasileira que se tornou vítima do vírus e recebeu a justa homenagem.
Esta breve explanação sobre a conjuntura brasileira se faz necessária para dar luz ao contexto em que nasceu este material, este livro de entrevista que investiga o universo da palhaçaria, colocando uma lupa no pensamento destes mestres e mestras do riso, apresentando suas visões, conceitos, técnica, estética e ética acerca deste ofício.
Foi com a tranquilidade que a Lei Aldir Blanc proporcionou ao garantir alimento na mesa dos meus filhos, que pude ter o tempo necessário para pensar em propor algo adequado às medidas de segurança que pudesse ser executado.
Nos primeiros meses da pandemia, apliquei-me a criar números para as mídias sociais, a cabeça precisava se ocupar. A criatividade carecia em se manter acesa, pois é ela o combustível da alma do artista. Porém, acostumado com as ruas, com os palcos, com a plateia respirando junto, o trabalho virtual necessitava de um calor na medida justa que pudesse aquecer ainda mais o espírito.
Mas como? Aquecimento e calor humano em tempo de uma pandemia feroz como a do Covid-19 parece algo muito paradoxo para um artista que tem a rua como principal lugar de ação.
E assim, neste contexto, num determinado dia comecei ler “Trabalho de Voz e Corpo” de Zygmunt Molik – O legado de Jerzy Grotowski, livro resultado de uma entrevista de Giuliano Campo com Molik. A leitura me caiu como uma semente que germinou a ideia e fez brotar este livro.
Como o tempo me impedia de executar meu trabalho e me privava do convívio social, falar sobre o meu trabalho, escutar artistas que são referências e que impulsionam o ofício da palhaçaria, me pareceu uma maneira de buscar o “tal” aquecimento, o calor para o espírito. Talvez no futuro, alguém que pegue essas palavras para ler, possa entendêlas como um certo exagero simbólico, mas um clichê define o que foram estes tempos: “quem viveu viu”.
Consequentemente, as lives transcritas resultaram neste material, o Campo do Riso, onde tentei me colocar em um lugar que, com o mínimo de perguntas, conseguisse provocar o máximo de resposta para tentar conseguir criar um local de escuta, formar um campo aberto e generoso para conhecermos a trajetórias destes artistas. Para refletirmos mais sobre o riso provocado pela palhaçaria, o Campo do Riso, um campo de afeto que brote inspiração.
A mim, essas entrevistas chegaram, sim, como um cobertor de sutilezas, acolhimento e afeto, sentimentos estes que espero adentrar aos leitores. E, por que Campo do Riso? Não faço a menor ideia, precisava dar um nome. Boa leitura!