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Benefícios da Lei de Informática para o Pólo Industrial de Manaus

Foto: Divulgação

BENEFÍCIOS DA LEI DE INFORMÁTICA PARA O PÓLO INDUSTRIAL DE MANAUS

Antônio Sérgio Martins de Mello é economista, formado pela Universidade do Rio de Janeiro, e especialista em administração financeira, pela Fundação Getúlio Vargas, e gerência de programas e projetos, pelo Instituto de Administração da USP. Atualmente, exerce o cargo de secretário do desenvolvimento da produção, do MDIC (Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior), e também é presidente do CAPDA (Comitê das Atividades de Pesquisa e Desenvolvimento na Amazônia), responsável por estabelecer as normas e diretrizes para apresentação de projetos de P&D, definir o plano plurianual de investimentos e os programas e projetos a serem contemplados com recursos do FNDCT/CT-Amazônia (Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), dentre outras importantes funções. Em entrevista à Revista T&C Amazônia, Mello falou sobre os benefícios trazidos pela Lei de Informática ao Pólo Industrial de Manaus, e como o CAPDA acompanha os resultados e o desenvolvimento de Programas Prioritários, tais como TV Digital Interativa, Desenvolvimento de Software,

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Benefícios da Lei de Informática para o Pólo Industrial de Manaus

Microeletrônica e Microssistemas, Tecnologia Industrial Básica, Desenvolvimento Energético, Rede Estadual de Ensino e Pesquisa e Desenvolvimento de Bioindústrias.

Revista T&C - Como o senhor avalia os benefícios proporcionados ao Pólo Industrial de Manaus (PIM) através dos recursos advindos da Lei de Informática? Antônio Sérgio - As ações implementadas no PIM pelas empresas sujeitas aos investimentos em P&D estão vinculadas à Política Nacional de Informática (PNI). De um certo modo, o evento da PNI para a ZFM tem conotações bem distintas, podendo ser classificada em dois momentos: o primeiro, que cobre o período de 1996 a 2001, e que culminou com a edição da Lei nº 10.176; e o segundo, que é a atual fase. Dessa forma, se comparada a competitividade entre as empresas industriais aqui estabelecidas em relação às demais instaladas fora do PIM, a Lei de Informática, no primeiro momento, permitiu a implantação e certificação das empresas de informática no Sistema da Qualidade NBR ISO 9000, uma vez que os gastos aplicados nessa área eram válidos como investimento em P&D. Cabe salientar que esse direcionamento era exclusivo das empresas do PIM, pois os investimentos em P&D das empresas fabricantes de bens de informática localizadas fora da ZFM não previam tal aplicação. Outro ponto importante ocorrido nesse período foi, sem dúvida, a aproximação entre o setor empresarial e a academia em virtude das aplicações em convênio. Tal iniciativa não se constituía uma prática comum no PIM. Além disso, naquela época, as instituições públicas, para tornar o processo mais ágil, tiveram que se valer das fundações de apoio como uma forma de atender mais rapidamente às demandas do setor. No presente momento, percebo esse tema como sendo um processo de aprendizagem, que

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está em constante evolução. Entretanto, destaco dois pontos específicos que se complementam e que são necessários, tanto para ações empenhadas pelas políticas públicas quanto para as decorrentes da própria iniciativa privada: a formação de recursos humanos e consolidação de agentes de C&T. Para tanto, os esforços do CAPDA estão focados em dois Programas Estruturantes, o PROGP (Programa para Desenvolvimento de Grupos de Pesquisa) e o PROINFRA (Programa Institucional de Infra-estrutura para Pesquisa e Pósgraduação), sempre por meio dos editais no âmbito do Fundo CT-AMAZÔNIA. Atualmente, já foram contemplados 470 projetos de P&D (período 2002 ~ 2004). Acredito assim, no muito particular, que muitas razões depõem favoravelmente à existência da Lei de Informática no PIM, tais como: o surgimento de alguns centros e institutos de P&D e o envolvimento das fundações de apoio às organizações públicas, a criação de um fórum apropriado para tratar dessas questões, ou seja, o CAPDA, o fortalecimento de estruturas já existentes anteriormente, como, por exemplo, os núcleos e grupos de pesquisas, a inclusão da Amazônia no âmbito de outros fóruns nacionais - por intermédio do CT-Amazônia -, a participação do CAPDA nas discussões nacionais com o Comitê de Coordenação dos Fundos Setoriais do MCT - no sentido de definir as Ações Transversais, a criação da Secretaria Estadual de Ciência e Tecnologia do Amazonas e sua Fundação de Amparo à Pesquisa - FAPEAM.

Revista T&C - Em Manaus, a Lei de Informática tem efetivamente contribuído para incentivar projetos de pesquisa e desenvolvimento na área tecnológica? Como isso acontece? Antônio Sérgio - Sem dúvida alguma. Podemos citar, como um bom exemplo, os prêmios FINEP de Inovação Tecnológica recebidos pelos institutos e empresas. Em 2004, teve o Genius Instituto, como melhor “Instituição de Pesquisa”, e a

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Siemens Eletroeletrônica/AM, na categoria de “Produto” com um Processamento 3D para Meta-Realidade, aplicativo que viabiliza animação tridimensional de figuras em aparelhos celulares. Recentemente, em 2005, a Fundação Paulo Feitoza (FPF) arrematou o terceiro lugar na categoria de “Instituição de Ciência e Tecnologia”, uma vez que vem se dedicando a projetos inovadores de grande alcance tecnológico nas áreas de desenvolvimento de software, de hardware, de produtos, de biotecnologia, de biodiversidade e de capacitação tecnológica, com resultados de impacto à sociedade.

Revista T&C – As empresas do Pólo Industrial de Manaus têm respondido satisfatoriamente com relação à destinação e aplicação dos incentivos em P&D gerados a partir da Lei de Informática? Antônio Sérgio - Os investimentos em P&D irão completar uma década, pois remontam à edição da sua primeira regulação através do Decreto nº 1.885, de 1996. Grande parte das empresas atende o que está disposto na legislação, salvo raras exceções. A questão não é somente desincumbência por parte das empresas das obrigações estabelecidas na Lei, mas o que se pretende é que os recursos sejam bem aplicados e que gerem resultados efetivamente voltados para uma maior competitividade do setor em termos tecnológicos e econômicos. Dessa forma, é um processo de aprendizado, a cada ano estamos avançando e realizando esforços para aperfeiçoar os mecanismos de interação entre os agentes públicos, a SUFRAMA e a Secretaria de Política Tecnológica do MCT, e abrindo frentes quanto à premência de sinergia entre academia (pública e privada) e setor produtivo.

pelo CAPDA? Como o Comitê avalia o desenvolvimento e os resultados desses programas? Antônio Sérgio - O CAPDA aprovou 7 Programas Prioritários, quais sejam: o Programa Rede Estadual de Ensino e Pesquisa do Amazonas (REPAM); o Programa de Desenvolvimento Energético Amazônico (PRODEAM); o Programa TV Digital Interativa; o Programa Tecnologia Industrial Básica (TIB); o Programa de Desenvolvimento de Software na Amazônia (AMAZONSOFT); o Programa de Microeletrônica e Microsistemas da Amazônia (PMMA); e o Programa para o Desenvolvimento de Bioindústrias na Amazônia (PRODEBIO-AM). Esses programas estão sendo coordenados pela FAPEAM, o CT-PIM e a UNI-SOL. Estamos realizando ainda uma consulta à Procuradoria Jurídica da SUFRAMA para formalizar todos os procedimentos operacionais, inclusive de acompanhamento dos recursos destinados aos projetos a serem executados nos Programas Prioritários. Para o desenvolvimento dos programas, o passo inicial foi submeter à SUFRAMA o Plano de Utilização de Recursos (PUR), correspondente aos projetos a serem implementados em cada programa. A partir da aprovação dos PUR é que os Programas podem ser considerados “aptos” a receber recursos da Lei de Informática. Considerando que essa etapa foi concluída no final do ano passado, a partir de 2006 é que poderemos avaliar o desempenho de cada um deles. Para acompanhar o desenvolvimento dos Programas, o CAPDA deverá votar proposta (em sua próxima reunião ordinária) de constituir mini-comitês para cada área a que estão voltados (software; microeletrônica; biotecnologia etc), formado por pessoas de notório conhecimento nessas áreas. Esses mini-comitês (3 especialistas) teriam atribuição para deliberar sobre os recursos captados no âmbito do programa, acompanhar o desempenho destes, além de propor as atualizações de caráter evolutivo, entre outras.

Revista T&C - Quais são os programas prioritários na área de P&D e que são acompanhados

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Revista T&C - O que o CAPDA espera para a evolução e expansão de projetos de P&D relacionados ao Pólo Industrial de Manaus? Antônio Sérgio - O Comitê terá uma função relevante no conjunto dos órgãos que hoje constituem o sistema tecnológico do Amazonas. Por contar com a participação de representantes do Pólo Industrial de Manaus, do governo do Amazonas, das universidades e de vários órgãos de fomento do governo federal, continuará desempenhando papel importante na alocação de recursos em áreas prioritárias que contribuirão para o fortalecimento da base intelectual da região. O Comitê Executivo do CAPDA definiu suas prioridades e tem dado continuidade a suas políticas de acordo com essas prioridades. Esta ação programática tem permitido o crescimento de importantes centros tecnológicos nos diversos setores do conhecimento. Isso representa um fortalecimento de toda cadeia tecnológica, a fim de viabilizar respostas efetivas a demandas cada vez maiores de tecnologia para o desenvolvimento do Pólo Industrial de Manaus. Há uma preocupação de valorizar a vocação regional, especialmente nas áreas de biodiversidade com foco nos insumos regionais. Um exemplo do protagonismo desse processo é o Centro de Biotecnologia da Amazônia que, em dezembro, deu um passo importante com a criação da Associação de Biotecnologia do Amazonas (ABA).

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Lei de Informática: Poderoso Instrumento de Política Industrial

LEI DE INFORMÁTICA: PODEROSO INSTRUMENTO DE POLÍTICA INDUSTRIAL

* Luiz Mariano Julio ** Cristiane Eliza Barbosa de Souza

Ao final dos anos 80, o modelo desenvolvimentista de substituição de importações estava esgotado, com nítido movimento das economias emergentes da época em busca de uma inserção competitiva no mercado mundial. Nessa direção, surgiram no Brasil o PBQP (Programa Brasileiro de Qualidade e Produtividade), o PACTI (Programa de Apoio à Capacitação Tecnológica da Indústria) e o PACE (Programa de Apoio ao Comércio Exterior). Inovar constitui-se na aplicação do conhecimento na solução de problemas concretos enfrentados pela sociedade. Inovações são determinantes do aumento da produtividade e da geração de novas oportunidades de negócios. Portanto, inovação é elemento fundamental para o crescimento da sociedade em direção a uma redução das desigualdades sociais. O conceito de Sistemas Nacionais de Inovação (SNI) foi desenvolvido em meados de 1980, com destaque aos trabalhos de Freeman, Lundvall e Nelson. A partir daí, tornou-se ainda mais evidente a necessidade de articulação entre os atores componentes de um SNI, “que interagem e se relacionam na produção, difusão e uso do conhecimento” (LASTRES & CASSIOLATO, 2004), consistindo a inovação em um processo sistêmico e interativo. Muitos têm sido os esforços governamentais no desenvolvimento de políticas públicas efetivas no incentivo e na promoção da boa articulação dos atores constituintes do nosso Sistema Nacional de Inovação.

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A Lei de Informática surgiu em 1991 constituindo por muito tempo instrumento praticamente isolado de política tecnológica e industrial na área de Tecnologia de Informação, nisso abrangidas com destaque as áreas de telecomunicações, automação industrial e software. Com a publicação das Diretrizes de Política Industrial Tecnológica e de Comércio Exterior de 26 de novembro de 2003, tornou-se um dos elementos-chave da política pública de desenvolvimento econômico, parte integrante da política macroeconômica de desenvolvimento e retomada do crescimento econômico brasileiro. Dentre as principais medidas da PITCE, destaca-se a (tentativa de) criação de um ambiente institucional público estável e propício aos investimentos privados, especialmente através de marcos regulatórios dos setores de infra-estrutura. A Lei de Informática é um marco regulatório inserido em uma proposta de programa de âmbito nacional de capacitação e competitividade tecnológica das indústrias de computação, automação, telecomunicações, microeletrônica, software e serviços técnicos, estimulando a atividade de Ciência, Tecnologia e Inovação no país, visando com isso ao desenvolvimento social e ao progresso econômico. Emitida originalmente em 1991, passou por duas fortes revisões - a versão atual é a Lei 11.077, de 30 de dezembro de 2004, com vigência até 2023 para a Zona Franca de Manaus e até 2019 para o restante do país. Estamos falando de um programa de décadas de investimentos em capacitação e competitividade, o que nos faz refletir sobre os propósitos desta política e o progresso econômico efetivamente alcançado ao longo deste período. Diversos exemplos de sucesso em políticas públicas de incentivo ao crescimento econômico são estudados pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que atesta em suas recomendações aos países-membros a importância do desenvolvimento e da difusão da tecnologia para o crescimento e desenvolvimento social de cada país, sendo enfáticos ao evidenciarem que “o crescimento econômico e o desenvol-

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vimento social de todos os países dependem mais do que nunca de avanços no conhecimento científico e tecnológico (...)”. O sucesso industrial tecnológico de países como o Japão é fruto de um programa de estruturação de 30 anos, capaz de criar um sistema nacional de inovação baseado na constante articulação das atividades de P&D, desenvolvimento, produção, administração, comercialização e outras, aumentando a flexibilidade e permitindo o estabelecimento de um enfoque integrado. Dentre as principais economias de industrialização recente do leste asiático, destaque para as políticas industriais da Coréia do Sul e de Taiwan que, de economias pobres e tecnologicamente atrasadas, transformaram-se em economias eficientes e modernas graças a uma administração macro, estímulo à exportação e altos índices de investimento em P&D. Nestas, o foco inicial foi nas aptidões de difusão da tecnologia mais que propriamente na criação destas, sucedido pela criação quando as tecnologias transferidas chegaram à fronteira tecnológica e tornava-se necessário desbravar sozinho o próximo passo. Em Taiwan, por exemplo, as políticas baseiam-se em redes para estimular a difusão da tecnologia. Estudos revelam um aumento gradativo do comprometimento em P&D como percentagem do PIB nesses países. No Brasil, o grande desafio às políticas públicas brasileiras tem sido a reorganização das ações, integrando-as nas diversas estâncias do Estado, dando corpo a uma estratégia de planejamento a longo prazo, fugindo de casuísmos políticos, com uma continuidade que até então não se observava. Os muitos anos de incentivos à Ciência, Tecnologia e Inovação ensejados pela Lei de Informática vão ao encontro dos preceitos de PC&T vivenciados pelos países mais desenvolvidos.

A LEI DE INFORMÁTICA COMO INSTRUMENTO DA PITCE A Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE) constitui uma ação conjunta

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com a participação de diversas frentes do governo, com o propósito de aumentar a eficiência econômica, bem como o desenvolvimento e a difusão de tecnologias com maior potencial de indução do nível de atividade e de competição no comércio internacional, facilitando a participação do Brasil exportador no mercado mundial. A PITCE faz parte de um conjunto de ações do governo alinhadas com a estratégia de Crescimento Sustentável, Emprego e Inclusão Social. Neste sentido, “política apóia programas de investimentos das empresas com vistas à construção e/ou reforço de infraestrutura em pesquisa, desenvolvimento e engenharia. Vai-se buscar facilitar o relacionamento entre os centros de pesquisa, as empresas e o sistema de comercialização (...). É necessário articular medidas e instrumentos horizontais de promoção da eficiência e do bom desempenho da atividade produtiva com ações seletivas que concentrem esforços(...)” (Diretrizes da PITCE – MCT). Desta forma, observa-se que as métricas de investimentos em Pesquisa & Desenvolvimento evidenciados no texto da Lei de Informática correspondem aos propósitos estratégicos da PITCE. Opcionalmente, as empresas podem destinar seus investimentos para projetos de interesse público, designados como Projetos Prioritários: RNP

- Rede Nacional Avançada para comunicação e colaboração em ensino e pesquisa no Brasil; SOFTEX - Programa para Promoção de Excelência do Software Brasileiro; Protem - CC - Programa Temática Multinstitucional em Ciência da Computação; RDC TIC - Programa Rede de Desenvolvimento de Competência em Tecnologias da Informação e Comunicação; PNM Design - Programa Nacional de Microeletrônica. Cabe observar que é preciso um maior alinhamento entre as considerações do governo na gestão dos programas prioritários e a estratégia de P&D do setor privado, que efetivamente disponibiliza os recursos financeiros a serem investidos. Esse melhor alinhamento poderia ser conseguido com um aumento da representatividade do segmento industrial nos comitês que regem a alocação desses recursos. A história do desenvolvimento econômico está repleta de intervenções bem intencionadas, mas ineficientes (KIM e NELSON, 2000). Deve haver o direcionamento estratégico por parte do governo, mas sem uma coordenação dos investimentos com o setor produtivo corre-se o risco de construir castelos de areia. Há que se integrar os propósitos de desenvolvimento do governo com a realidade do parque tecnológico e industrial local e com as necessidades presentes e futuras para atender ao mercado

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globalizado. Boas propostas têm sido apresentadas nos editais da FINEP, que através do CT INFO vem financiando programas de tecnologia como software livre, software para segmentos emergentes e estímulo a incubadoras de empresas do setor de tecnologia da informação. São ações efetivas bem coordenadas com as estratégias das empresas, integradas com a realidade do mercado brasileiro e as demais ações governamentais. No que diz respeito ao estímulo à industrialização do setor de Tecnologia da Informação, a Lei de Informática concede a redução do Imposto Sobre Produtos Industrializados (IPI) para os Bens de Informática produzidos de acordo com o Processo Produtivo Básico descrito na legislação. Entende-se por Processo Produtivo Básico “o conjunto mínimo de operações, no estabelecimento fabril, que caracteriza a efetiva industrialização de determinado produto”. Em contrapartida ao benefício as empresas devem atender um valor agregado local mínimo para cada produto fabricado, o que por sua vez cria a necessidade do estabelecimento de uma indústria de bens intermediários, partes, peças e componentes, adensando a cadeia produtiva e com isso contribuindo para a elevação do nível de emprego no país. Porém, muitas vezes a exigência da utilização de um insumo específico implica em desvantagem competitiva para os produtos fabricados localmente, devido à pouca diversificação e ao alto custo da indústria local desse insumo específico, protegida por uma reser-

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va de mercado. Deve ser dado estímulo à fabricação competitiva de insumos no país, não simplesmente à fabricação, pois ao se pretender estimular um ramo ineficiente da cadeia de valor podese estar colocando em risco toda a cadeia. A intervenção governamental precisa ser seletiva, pois a substituição indiscriminada das importações sem medidas compensatórias, posicionando o país no mercado mundial, cria grandes áreas de ineficiências e de indolências tecnológicas (KIM e NELSON, 2000). Quando se fala de mercado interno todos os concorrentes estão expostos à mesma exigência, existindo um nivelamento de custo e no final da cadeia o custo da ineficiência: acaba sendo repassado ao consumidor. Porém, no mercado de exportação o que vale é a eficiência e sem as barreiras de mercado o produto submetido a essa exigência artificial acaba por ficar inviável. Coréia do Sul e Taiwan intervieram significativamente no comércio exterior, mas compensaram as intervenções por meio de fortes incentivos às exportações. Como segunda e importante contrapartida à renúncia fiscal, os beneficiários assumem a obrigação de investir parte do seu faturamento em atividades de Pesquisa & Desenvolvimento, reforçando com isso o Sistema Nacional de Inovação. Não é exagerado dizer que grande parte dos maiores fabricantes mundiais de bens de informática e automação estabeleceram-se no Brasil em função da redução da carga tributária local (e conseqüente aumento de competitividade) advinda

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dos benefícios da Lei de Informática. O benefício de redução do IPI destina-se a uma lista de produtos especificados em legislação, o que permite ao governo uma política de estímulo seletivo à atividade industrial no setor de Tecnologia da Informação, uma vez que elege a indústria como “componente essencial do desenvolvimento sustentado da economia. Diversificada, a indústria brasileira é uma das maiores e mais importantes dentre os países em desenvolvimento” e alia sua estratégia industrial e tecnológica à exportação, alegando que “o Brasil é um dos poucos países em desenvolvimento que possui firmas com responsabilidade de obter ganhos de escala e viabilizar o crescimento da inserção internacional de bens manufaturados de maior intensidade tecnológica”. (Diretrizes da PITCE).

RESULTADOS DA LEI Segundo dados do MCT, o retrato que se tinha da indústria de Bens de Informática e Automação em 1993 era um faturamento de US$ 8,4 bilhões, exportação de US$ 0,2 bilhões e 32,5 mil empregos diretos. Em 2002, 10 anos de Lei de Informática, o que se tinha era US$ 16 bilhões de faturamento, exportação de US$ 1,0 bilhão e 35 mil empregos diretos proporcionados (2,5 mil novos empregos criados). O MCT relata o número de Pesquisa e Desenvolvimento credenciadas pelo CATI (Comitê da Área de Tecnologia da Informação) e CAPDA (Comitê de Atividades de Pesquisa e Desenvolvimento da Amazônia). Sob a Lei 8.248/91 foram investidos cerca de R$ 530 milhões em 2005. O setor de Tecnologia da Informação ocupa lugar de destaque nas estratégias governamentais de cres-

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cimento econômico, especialmente pela sua significativa representatividade no PIB do país. Os segmentos de Hardware, Software e Serviços Técnicos de Informática movimentam US$ 15 bilhões anuais, cerca de 2,5% do PIB e cresceram a uma taxa anual média de 13%, de 93 a 99. Em 2002, a participação registrada foi de 3,5% do PIB brasileiro. (MCT, 2003) Os benefícios concedidos pelo programa de estímulo à região da Zona Franca de Manaus são maiores em valores (R$2,7 bilhões em 1999. Fonte: “Orçamento e Renúncias Fiscais e subsídios da União” – MF, dezembro 2000), mas os impactos trazidos pela Lei de Informática são mais significativos, uma vez que dentre todas as indústrias presentes na Zona Franca de Manaus, a de bens de informática ocupa grande destaque, liderando o ranking de faturamento com US$ 9,81 bilhões e crescimento de 34,65% em relação ao período de janeiro a outubro de 2004 (dados SUFRAMA). A migração de muitos dos grandes fabricantes de equipamentos eletrônicos para a ZFM deve-se aos benefícios concedidos pela Lei de Informática, como os exemplos da PROCOMP, PROMON, SONY, TCE e PHILIPS, com produção inicial no Estado de São Paulo e posterior transferência da operação para a ZFM. Com os mesmos fatores motivadores, a NOKIA e a Divisão de Telefones Celulares da SIEMENS, hoje BenQ, instalaram fábricas na ZFM em função de uma associação de vantagens que combina incentivos fiscais especí-

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ficos da região e os benefícios advindos da Lei de Informática. De momento, uma conjunção de fatores que associa as dificuldades de logística com o aperfeiçoamento dos incentivos fiscais em outros Estados do país, notadamente São Paulo, tem reduzido de forma significativa e preocupante as vantagens competitivas da região para esse segmento.Os investimentos em Pesquisa & Desenvolvimento feitos na Zona Franca de Manaus, exclusivamente, somam R$ 594.725.416,76 nos anos de 2002 a 2004, dos quais R$371.874.346,86 foram destinados a convênios entre as empresas beneficiadas, as universidades e centros de pesquisa do Amazonas, enquanto R$222.851.069,90 foram investidos em projetos internos às empresas (dados SUFRAMA). Mas os principais resultados advindos da Lei de Informática não repousam nos números correspondentes aos investimentos realizados, mas sim nos efeitos positivos de integração e cooperação entre os atores envolvidos nas relações de investimento, sobretudo empresa e universidade. Não há como negar o papel incentivador da boa integração da rede de TI desempenhado pela Lei de Informática. Até mesmo a comprovação dos resultados dos investimentos em P&D realizados pela empresa representa um instrumento de articulação entre os atores (as empresas possuem a obrigação de prestar contas ao governo sobre a adequação dos investimentos aos critérios de P&D descritos na legislação, os institutos de P&D e univer-

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sidades, por sua vez, precisam observar tais critérios na execução das atividades para fazer jus ao credenciamento. E o governo, na ponta da cadeia, precisa alinhar as expectativas da Política Industrial e Tecnológica com o P&D que está sendo realizado na prática). A integração entre os atores do SNI brasileiro fomentada pela Lei de Informática, possui sua maior expressão nos termos do §1º do Art.11, que estabelece a obrigatoriedade de investimentos mínimos através de convênios com centros ou institutos de pesquisa ou universidades, credenciados. Fruto do trabalho de mais de quatrocentos colaboradores, dentre eles, cientistas, professores, empresários e técnicos do governo, o “Livro Verde da Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação”, uma publicação do Ministério da Ciência e Tecnologia - MCT, aponta no Capítulo 6 – “Desafios Institucionais” que as “mudanças nas políticas

de CT&I envolvem movimentos de múltiplas direções: universidades, institutos de pesquisa e agências atuando no espaço do mercado de pesquisa; empresas articulando-se com as organizações públicas; novos requisitos de capacitação e aprendizagem gerencial; criação de instrumentos voltados à articulação de atores e ao aprendizado coletivo (redes, arranjos produtivos, consórcios, plataformas)”. Evidentemente, a inovação não é um evento de ocorrência isolada, independente e desarticulada. Ao contrário disto, é resultado de arranjos dinâmicos, articulados, com contribuições provenientes de diversos atores que fazem parte do Sistema Nacional de Inovação de um país, ou ainda de Sistemas de Inovação globalizados. Pela própria definição, vê-se que um Sistema de Inovação é constituído por elementos que se “relacionam e se interligam na produção, difusão e uso do conhecimento” (LUNDVALL, 1992), a fim de se ob-

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ter, como resultado de tal interação, a inovação. A Lei de Informática é um caso de sucesso de marco regulatório impulsionando uma política científica e tecnológica com foco desenvolvimentista e de crescimento social. Existem pontos em que precisa ser aperfeiçoada, e os últimos doze meses têm sido de intensa discussão nos círculos específicos buscando corrigir algumas de suas falhas e melhor orientar sua aplicação. No entanto, ainda existe quem a veja, erroneamente, como simples instrumento de renúncia fiscal, desconsiderando os grandes ganhos de competitividade que tem alavancado para o país, em ordens de grandeza superiores à renúncia. Nos últimos anos, muitas vozes têm se levantado contra ela, como se fosse

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uma distorção terceiro-mundista e esquecendo que todos os países conseqüentes do mundo tem políticas de CT&I que buscam gerar oportunidades para a iniciativa nacional, em alguns casos muito mais ousados que nossa própria legislação. A enorme luta que tem sido necessária para impedir que a área de TI seja definitivamente expurgada da Lei de Inovação demonstra claramente essa visão distorcida. A expectativa é que o bom-senso prevaleça, e a ação conjunta da comunidade científica e empresarial consigam demonstrar aos legisladores que temos uma excelente arma nas mãos, indubitavelmente uma das melhores que já se criou nesse país – precisamos de mais algumas, não de abdicar da que temos.

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BIBLIOGRAFIA CASSIOLATO, José Eduardo & LASTRES, Helena M.M (1999). “Globalização e Inovação Localizada: Experiências de Sistemas Locais no Mercosul. Editores José Eduardo Cassiolato e Helena Maria Martins Lastres - Brasília: IBICT/MCT. Ciência e Tecnologia no Brasil – Pesquisa - FAPESP. Edição nº 116 - Outubro de 2005.São Paulo. Brasil. KIM, Linsu & NELSON, Richard R (2000). “Tecnologia, aprendizado e inovação: as experiências das economias de industrialização recente. ” University of Cambridge. Traduzido Editora Unicamp, 2005. LUNDVALL, Bengt-Ake (1992). “National Systems of Innovation.” New York: Printer Publishers. MCT - SEPIN (2003). “Resultados da Lei de Informática – Uma Avaliação”.

* Luiz Mariano Julio, diretor de Tecnologia & Inovação, BenQ Eletroeletrônica Ltda. ** Cristiane Eliza Barbosa de Souza, consultora de Política Tecnológica, BenQ Eletroeletrônica Ltda.

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AVALIAÇÃO DAS ATIVIDADES DE PESQUISA, DESENVOLVIMENTO E INOVAÇÃO REALIZADAS PELO CENTRO DE TECNOLOGIA ELETRÔNICA E DA INFORMAÇÃO – CETELI/UFAM, COM RECURSOS DA LEI DE INFORMÁTICA NO BIÊNIO 2003-2004

* Cícero Ferreira Fernandes Costa Filho

** Marly Guimarães Fernandes Costa

INTRODUÇÃO O objetivo desse artigo é mostrar os resultados das atividades de P&D desenvolvidas pelo CETELI, no biênio 2003-2004, com recursos captados através da lei de informática. Demonstra-se como a utilização desses recursos incrementou a formação discente, melhorou a infra-estrutura laboratorial do CETELI e contribuiu para o aumento de produtividade e de qualidade dos processos das indústrias parceiras. Serão apresentados os projetos desenvolvidos nesse período, destacando-se a área de aplicação e as principais características dos mesmos, bem como os principais impactos desses investimentos. As conclusões oferecem uma comparação do montante dos recursos da lei de informática disponíveis para investimento na região e aqueles investidos na UFAM em anos recentes e aponta opções para a continuidade e expansão desses investimentos. A Universidade Federal do Amazonas (UFAM) tem realizado um esforço considerável no sentido de melhorar a titulação do seu quadro docente. Como demonstração dessa ação, cita-se o incremento de 386% no número de doutores ao longo dos últimos 10 anos. Em 1996, a instituição pos-

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suía somente 68 doutores e, atualmente, o número de docentes com esta titulação é de 263. Esse número representa 39,5% de todos os doutores existentes no Estado do Amazonas [UFAM, 2005]. Essa melhoria no quadro docente teve reflexos positivos, tanto nas condições dos cursos de graduação quanto na maior oferta de cursos de pósgraduação stricto sensu e nos indicadores da área de pesquisa. Em relação à graduação, o programa de iniciação científica da UFAM, no período 2004/ 2005, contou com 247 alunos, sendo hoje um dos maiores programas em número de alunos no Estado do Amazonas. O número de cursos de pósgraduação stricto sensu existentes na UFAM é de 19 (dois de doutorado e 17 de mestrado). O número de grupos de pesquisa passou de 14, em 1996, para 175, em 2005. A produção científica desses grupos de pesquisa, no ano de 2004, resultou em um total de 1263 artigos publicados no país e 701 no exterior. Neste contexto, a UFAM detém 60% da capacidade de pesquisa instalada no Estado, constituindo-se assim numa das principais, senão a principal instituição de pesquisa do Amazonas, mesmo quando se considera a diversidade de áreas de conhecimento nas quais atuam seus pesquisadores. Paralelamente a esse esforço para a melhoria da titulação do seu quadro docente, a atual gestão da UFAM tem apoiado iniciativas de criação de núcleos e centros multidisciplinares, que congregam grupos de professores com interesses de pesquisa comuns. Esses núcleos e centros caracterizam-se por uma captação agressiva de recursos, tanto de órgãos públicos de fomento à pesquisa como da iniciativa privada, e por uma maior agilidade na prestação de serviços para a sociedade. Essa realidade é mais visível na área tecnológica, onde, por exemplo, encontra-se o Centro de Tecnologia Eletrônica e da Informação, CETELI. Criado com a missão de “promover a pesquisa, o desenvolvimento científico e tecnológico e a formação de recursos humanos na Amazônia, buscando a excelência nas áreas de Tecnologia Eletrônica, da Informação e Automação”, o CETELI é

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formado por professores da UFAM e por professores associados de outras Instituições de Ensino e Pesquisa do Estado. Atualmente conta com 6 professores da UFAM, sendo 5 doutores e 1 mestre. Abriga ainda nos seus quadros outros pesquisadores, com nível de doutorado, mestrado e especialização, contratados através da Fundação de Apoio Institucional Rio Solimões e com algumas dezenas de acadêmicos dos cursos de engenharia elétrica e engenharia de computação, na qualidade de bolsistas.

PRINCIPAIS PROJETOS Os principais projetos desenvolvidos no CETELI no biênio 2003-2004, utilizando recursos da lei de informática, concentraram-se nas seguintes áreas de aplicação: automação industrial, software embarcado para celulares, capacitação de recursos humanos, melhoria de processos industriais e implantação de infra-estrutura laboratorial. Nesse biênio, as empresas que financiaram atividades de P&D no CETELI foram a Phillips MDS, a Trópico Sistemas de Telecomunicações e o Instituto Nokia de Tecnologia (INdT). Um resumo dos principais projetos desenvolvidos é mostrado na Tabela 1. Com o objetivo de melhor ilustrar as atividades desenvolvidas no CETELI, selecionou-se quatro desses projetos, em áreas de aplicação distintas, que serão descritos com mais detalhes a seguir.

SISTEMAS DE TESTE UNIFICADO (STU) PARA DISPLAYS DE CELULARES Uma das empresas parceiras confecciona modelos de displays de cristal líquido utilizados na fabricação de celulares. Em visita inicial à empresa identificou-se a possibilidade de melhoria dos sistemas de testes utilizados na fabricação desses displays. Verificou-se que os sistemas de testes existentes operavam de forma autônoma, mas offline, o que exigia passos manuais para a totalização

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Tabela 1: Projetos de P&D desenvolvidos no CETELI com recursos da lei de informática

dos defeitos. Para cada display existia também um sistema de testes específico. Como conseqüência, cada vez que se encerrava a fabricação de um modelo de display, os sistemas utilizados para testá-lo eram armazenados no almoxarifado e um

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novo sistema de teste deveria ser desenvolvido e implantado. Com o objetivo de superar essas deficiências, propôs-se a essa empresa o projeto de novos sistemas de testes, com as seguintes características: possibilidade de comunicação atra-

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vés de uma rede ethernet; e multifuncionalidade, caracterizada pela realização de testes funcionais elétricos de vários modelos de displays em um mesmo sistema. A utilização de microprocessadores de última geração possibilitou a capacidade de comunicação através de uma rede ethernet. O sistema de teste projetado funciona como um ponto de uma rede interna, isolada da rede da fábrica através de um servidor dedicado. Outra funcionalidade do sistema é a capacidade de funcionar como um servidor de Web, permitindo a programação através de linguagem HTML. Assim sendo, é possível informar, através de uma página Web, os resultados dos testes, que podem ser consultados através da internet. A comunicação através de um rede ethernet abriu a possibilidade de envio dos resultados dos testes para um servidor concentrador de dados. Em outro projeto desenvolvido para a empresa, confeccionou-se um complexo sistema de informação que permitiu: o gerenciamento de uma rede formada por esses novos sistemas de testes; a coleta das informações dos testes realizados pelos mesmos; o envio dessas informações para uma base de dados e a apresentação desses dados, através de buscas estatísticas pré-definidas. O acompanhamento on-line da produção minimizou os erros de operação e possibilitou ações imediatas frente a possíveis problemas na produção. A característica de multifuncionalidade foi alcançada através de um projeto engenhoso, que inovou do ponto de vista de projeto mecânico, de hardware e de software. A multifuncionalidade foi obtida: do ponto de vista mecânico, mantendo-se a base do sistema fixa e trocando-se os adaptadores que suportam diretamente o encaixe dos displays; do ponto de vista de hardware, através de um projeto que possibilita a geração de uma ampla faixa de correntes e tensões, necessárias para o teste de vários modelos de displays; do ponto de vista de software, por meio de um sistema flexível, onde o firmware necessário para o teste de cada modelo de display é carregado a partir da

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rede, através da seleção em um menu com múltiplas opções. A utilização de microprocessadores de última geração possibilitou também um ganho significativo de produtividade, ao reduzir o tempo dos testes funcionais elétricos pela metade em relação ao tempo dispendido pelos sistemas de testes que eram utilizados pela empresa. O equipamento desenvolvido é constituído por quatro módulos: fonte de alimentação, interface com o usuário, unidade de controle e unidade mecânica. Na Figura 1(a) mostra-se esses quatro módulos. Na Figura 1(b) mostra-se detalhe das placas de circuito impresso do módulo de controle.

EQUIPAMENTO PARA TRANSPORTE EFICIENTE DE MATERIAIS O transporte dos displays de celulares entre uma das empresas citadas e seus clientes era realizado através de um processo convencional de embalagens, utilizando cartelas plásticas, com capacidade para cerca de 30 unidades de displays cada. As cartelas eram agrupadas em conjuntos de 10 ou 12 unidades, embaladas em caixas e paletizadas. O processo de embalagem em caixas e a paletização danificavam as cartelas durante o transporte das mesmas para os clientes. Figura 1 - (a) módulos do sistema de teste unificado;

Na busca de um processo mais eficiente e econômico, técnicos do CETELI e da empresa parcei-

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Avaliação das Atividades de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação Realizadas pelo Centro de Tecnologia Eletrônica... Figura 1 - (b) detalhes das placas de circuito impresso do módulo de controle.

vante foi a simplificação da logística de embarque e desembarque dos displays, no fabricante e nos clientes, respectivamente. Com a disponibilidade de unidades móveis de transporte, dispensou-se a utilização de empilhadeiras. Por fim, ocorreu uma diminuição do espaço necessário no almoxarifado, para armazenamento dos displays. A Figura 2 mostra fotos desse equipamento. Figura 2 - Unidade de transporte: (a) vista frontal;

ra trabalharam em uma solução conjunta de uma Unidade Eficiente para Transporte de Materiais, denominada de PUSH-CAR. O projeto dessa unidade priorizou aspectos relativos a segurança, baixo peso, ergonomia e disponibilidade de espaço interno. As seguintes características do projeto da unidade de transporte revelam a preocupação com esses aspectos: estrutura rígida, durável e de baixo peso, construída com tubos e barras chatas de aço; inclusão de um cabo de aterramento na parte inferior do carro, para eliminar os riscos de descargas eletrostáticas; utilização de rodízios com amortecimento para eliminação de impactos para a estrutura, a fim de evitar possíveis danos para os displays; inclusão de travas nos rodízios traseiros, permitindo um transporte seguro da unidade; inclusão de uma barra em uma das laterais, a uma altura confortável para um operador de estatura média e amplo espaço interno, adequadamete projetado para acomodar 180 cartelas de displays. A utilização de uma unidade de transporte de displays com essas caracaterísticas trouxe uma série de conseqüências positivas para o processo produtivo. A mais importante delas foi a economia de 3% no gasto com matérias-primas utilizadas no processo produtivo. A inovação de processo implantada tornou desnecessária a utilização das caixas de embalagem e possibilitou o reaproveitamento das cartelas plásticas, devido a um melhor acondicionamento no transporte. Com isso, obteve-se um processo com menos resíduos de matérias plásticas e de papel. Outro aspecto rele-

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Figura 2 - (b) detalhes do amortecimento e travas.

CAPACITAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DE TALENTOS EM JAVA® E TECNOLOGIAS ASSOCIADAS PARA APLICAÇÕES DE TELEFONIA CELULAR Os objetivos desse projeto foram a especificação e construção de uma infra-estrutura mínima para o desenvolvimento de aplicativos para sistemas embarcados baseados em J2ME®, bem como a utilização dessa infra-estrutura para capacitação de professores e alunos dos cursos de engenharia elétrica, ciência da computação e enge-

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nharia da computação, em desenvolvimento de aplicativos para telefones celulares. O laboratório montado reúne ferramentas de programação, computadores desktop e sistemas de hardware (modelos de telefones celulares da Nokia) para simulações e testes. A capacitação envolveu 20 alunos e 6 professores e consistiu de um treinamento e da realização de um projeto. No treinamento, foram ofertados os seguintes cursos do currículo oficial da Sun®: Análise e Modelagem Orientada a Objetos, Java® SE e J2ME®. Além disso, incluiu-se o treinamento em uma ferramenta de desenvolvimento integrada, o JBuilders da Borland®. Com o término do treinamento, alunos e professores, seguindo orientação da empresa financiadora, realizaram o teste de certificação da SUN® em Java® SE. Após essa fase inicial, os alunos dividiram-se em cinco grupos e, sob a orientação de um dos professores, realizaram projetos com aplicação real para telefones celulares Nokia. Ao final, os grupos apresentaram os projetos desenvolvidos para avaliadores da empresa e, através de uma feira tecnológica promovida pelo CETELI, apresentaram esses projetos para alunos e professores da UFAM e para o público em geral. A duração total do projeto foi de 8 meses. Além das atividades anteriormente descritas, programaram-se também palestras conferidas por especialistas convidados do INdT e da Nokia, e por professores de outras regiões do Brasil. Procurou-se também atualizar o conhecimento dos professores envolvidos, propiciando a participação dos mesmos em eventos mundiais reconhecidamente importantes, onde o assunto Java e produção de software para celulares tinham destaque. Atividade semelhante de capacitação de alunos foi desenvolvida em anos anteriores com a empresa Trópico Sistemas de Telecomunicações, onde, através de um programa denominado “Jovens Potenciais”, foi ministrada formação específica na área de telefonia para um grupo de 16 alunos, seguida de estágio na empresa. Atualmente, uma nova edição desse programa está sendo ini-

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ciada. Desta feita, o programa “Jovens Potenciais” proverá a capacitação de um grupo de 10 alunos.

SISTEMAS DE TESTE PARA A CENTRAL TRÓPICO A Central Trópico, um sistema destinado a gerenciar o tráfego telefônico, é constituída por dezenas de placas de circuito impresso, muitas delas contendo microprocessadores, que trabalham em paralelo. Inicialmente projetada como Trópico R, evoluiu para a Trópico RA e tem a sua versão mais atual materializada na Trópico NGN. Nesse processo evolutivo novas placas são projetadas, placas antigas são atualizadas e faz-se necessário o desenvolvimento de novos sistemas de testes, exigindo um trabalho ininterrupto de engenheiros e técnicos com habilidades em desenvolvimento de hardware, software e firmware. Os seguintes desenvolvimentos foram realizados no biênio 20042005 com a empresa Trópico: Desenvolvimento de um sistema de testes baseado na plataforma Cablescan Serie 90, para testar, em ambiente fabril, os painéis traseiros dos sub-bastidores SBQD-10 e SBGC, utilizados nas Centrais Trópico RA e Vectura Softswitch; Projeto de um Sistema de Energia para a Central de Integração em Larga Escala; Desenvolvimento de equipamento de testes das placas IFT, EDF/ EDF-S, DEF e FPA da central telefônica Trópico-RA e Vectura Softswicht; Desenvolvimento de nova Placa de Circuito Impresso para substituição da placa RITA.

RESULTADOS Destaca-se, inicialmente, que a equipe técnica

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do CETELI sempre conseguiu alcançar os resultados propostos nas especificações dos projetos, no tempo pré-estabelecido pelas indústrias. A maioria dos projetos desenvolvidos conseguiu prover ganhos para as empresas. Como exemplo, cita-se: o Sistema de Teste Unificado, que redundou em ganhos de produtividade para a empresa e permitiu a reutilização de equipamentos para o teste de novos modelos de displays; o PUSH-CAR, que resultou na redução dos custos de fabricação dos displays e possibilitou um processo de fabricação mais limpo; o projeto da Sala Limpa, através do controle das condições ambientais, resultou em melhoria da qualidade dos produtos fabricados e na economia de gastos com energia elétrica; os sistemas de teste para a Central Trópico conferiram uma maior qualidade ao processo produtivo da mesma. Os projetos tiveram também um forte impacto institucional, que pode ser aquilatado através dos seguintes itens: Um total de 49 alunos beneficiados através de programas de capacitação e por estágios nos projetos desenvolvidos, provenientes dos cursos de Engenharia Elétrica, Ciência da Computação e Engenharia da Computação; Atualização profissional propiciada à equipe técnica envolvida nos projetos, através de curso de curta duração e participação em congressos e feiras, dentre os quais destacam-se: o Javaone, na área de software, o COMDEX SUCESU, na área de automação industrial, e a Feira da Platshow, na área mecânica. Um total de aproximadamente vinte cursos de atualização foi ofertado nesse período; Equiparação de laboratórios de P&D, destacando-se o laboratório de visão computacional, o laboratório de desenvolvimento de sistemas wireless e o laboratório de prototipagem rápida de placas de circuito impresso. Os projetos desenvolvidos ao longo desse biênio foram temas de duas dissertações de

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mestrado na área de telecomunicações, Melo (2005) e Cavalcante (2005), e uma dissertação de mestrado na área de automação industrial, Souza (2005), no programa de mestrado interinstitucional promovido pelo CETELI, em parceria com a COPPE/UFRJ, com apoio financeiro da SUFRAMA e, ainda, na submissão de três artigos para publicação em congressos nacionais e internacionais. O projeto da Unidade Eficiente de Transporte – PUSH CAR propiciou uma gama de resultados importantes. Esse projeto obteve a primeira colocação na versão local do evento Quality Improvement Competition – QIC, da Philips, e na versão internacional do mesmo, realizada em San Diego, Califórnia, EUA, no período de 03 a 05 de fevereiro de 2004, com a participação das 06 empresas do grupo de semicondutores da Philips existentes nas Américas. Além disso, também foi premiado em segundo lugar no Prêmio Finep de Inovação Tecnológica, versão 2005, na categoria Processos.

CONCLUSÃO Ao observar o tema dos projetos apresentados, nota-se uma predominância de projetos de desenvolvimento tecnológico, com ênfase na melhoria de processos. Entende-se que esse fato não seja fruto do acaso, mas sim uma conseqüência do modelo industrial aqui instalado, que não estimulou o desenvolvimento de novos produtos na própria região. Acredita-se que a captação de recursos da lei de informática pela UFAM é ainda irrelevante, face ao montante disponível para investimento. Como exemplo, no ano de 2003, os investimentos externos das empresas em P&D, utilizando recursos da lei de informática, no Estado do Amazonas, totalizaram R$ 143,89 milhões, de acordo com dados apresentados pela SUFRAMA, na Conferência Regional de CT&I [Suframa, 2005]. Nesse mesmo ano, a captação da UFAM totalizou R$ 3 milhões, o que corresponde a 2% do total, e no ano seguinte atingiu a cifra de R$ 4 milhões. Conside-

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rando a capacidade de produção científica da UFAM, destacada na introdução desse trabalho, esses valores de investimento ainda são considerados tímidos. Realidade semelhante é vivida pela Universidade Federal do Paraná [UFPR, 2003]. Os projetos que atenderam a demandas específicas da empresa, conforme mostrado no capítulo de resultados, apresentaram ganhos significativos para as mesmas. O retorno institucional foi de extrema relevância, destacando-se a complementação da formação discente, haja vista seu aproveitamento como mão-de-obra especializada pelas próprias empresas do PIM. Em vista desses resultados positivos, novas parcerias estão sendo firmadas pelo CETELI. No contato com as indústrias, os professores vinculados ao CETELI encontram uma maior receptividade para o desenvolvimento de projetos na área de automação industrial (melhoria de processos) e software embarcado para celulares (produto). Produtos para o setor eletroeletrônico, que envolvam o desenvolvimento de hardware e software, um dos ramos dominantes da indústria local, ainda não foram demandados. Para continuidade dos investimentos das empresas no CETELI/UFAM, utilizando recursos da lei de informática, propõe-se o fortalecimento de parcerias em áreas de desenvolvimento em que a UFAM já demonstrou possuir grupos de excelência, como as áreas de automação industrial e de desenvolvimento de novos produtos de software. Destaca-se também como de grande relevância a manutenção e expansão dos investimentos em capacitação dos alunos dos cursos de graduação, através de programas de extensão específicos para algumas áreas do saber tecnológico. O que a Universidade pode oferecer de mais pujante, no entanto, os resultados das pesquisas dos cursos de pós-graduação locais, ainda não foram explorados nessas parcerias. Nesse sentido, propõe-se que sejam financiados projetos de pesquisa vinculados a cursos de pós-graduação da área tecnológica. O viés da pesquisa pode não ser o caminho mais curto para obtenção de resultados imediatos, po-

rém é o mais promissor no sentido de buscar um caminho alternativo para a cultura de importação de produtos aqui implantada. O investimento de recursos da lei de informática em pesquisa tem sido realizado com sucesso em outras universidades do país, a exemplo da UNB [2003] e UFPB [2003].

BIBLIOGRAFIA CAVALCANTE, André Luiz Duarte. Uma Arquitetura Aberta para Integração de Dados do Ambiente Fabril com os Níveis Superiores da Empresa. Dissertação (Mestrado em Telecomunicações), Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2005. MELO, Orlens da Silva. Um Sistema de Comunicação sem Fio para a Aquisição de Dados de Produção em Ambiente Fabril. Dissertação (Mestrado em Telecomunicações), Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2005. SOUZA, Franklin Silva. Sistema Embarcado de Aquisição de Dados Integrado com a Web. Dissertação (Mestrado em Automação Industrial), Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2005. SUFRAMA, Inovar para inovação: papel do gestor público. Disponível em: http://www.abipti.org.br/ cr/norte/norteconferencia.htm. Acesso em 03 de novembro de 2005. UFAM, Formulário para elaboração de diagnóstico, Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação, Universidade Federal do Amazonas, 2005. UFPB, Resultados da Lei de Informática - Uma Avaliação Parte 2 - Ações nas Universidades, Universidade Federal da Paraíba. I Seminário Resultados da Lei de informática. Brasília, dez/2003. Disponível em http:// www.mct.gov.br/temas/info/. Acesso em 03 de novembro de 2005. UFPR, Resultados da Lei de Informática - Uma

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Avaliação Parte 2 - Ações nas Universidades, Universidade Federal do Paraná. I Seminário Resultados da Lei de informática. Brasília, dez/2003. Disponível em http:// www.mct.gov.br/temas/info/. Acesso em 03 de novembro de 2005. UNB, Resultados da Lei de Informática - Uma Avaliação Parte 2 - Ações nas Universidades, Universidade Federal de Brasília. I Seminário Resultados da Lei de informática. Brasília, dez/2003. Disponível em http:// www.mct.gov.br/temas/info/. Acesso em 03 de novembro de 2005.

* Cícero Ferreira Fernandes Costa Filho é professor da Universidade Federal do Amazonas UFAM e Diretor do Centro de Tecnologia Eletrônica e da Informação – CETELI. É graduado em Engenharia Elétrica pela UFPE/1982, mestre em Microeletrônica pela Unicamp/1988 e doutor em Automação Industrial pela Unicamp/1996. Atua no Programa de Pós-Graduação em Engenharia Elétrica da UFAM, nas áreas de automação industrial e engenharia biomédica. ** Marly Guimarães Fernandes Costa é professora da Universidade Federal do Amazonas UFAM e membro do Centro de Tecnologia Eletrônica e da Informação - CETELI. É graduada em Engenharia Elétrica pela UFAM/1983, mestre em Microeletrônica pela Unicamp/1988 e doutora em Automação Industrial pela Unicamp/1996. Foi Secretária Executiva Adjunta de Ciência e Tecnologia do Estado do Amazonas, no período de março de 2003 a outubro de 2005. Atua no Programa de PósGraduação em Engenharia Elétrica da UFAM, na área de engenharia biomédica.

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Projetos de Pesquisa e Desenvolvimento pela Lei de Informática – A experiência da FUCAPI

PROJETOS DE PESQUISA E DESENVOLVIMENTO PELA LEI DE INFORMÁTICA – A EXPERIÊNCIA DA FUCAPI

* Rogério Azevedo Pereira

Este artigo apresenta um conjunto de considerações a respeito dos resultados obtidos através das atividades de Pesquisa e Desenvolvimento da Fundação Centro de Análise, Pesquisa e Inovação Tecnológica (FUCAPI), a partir das oportunidades criadas com o advento da Lei de Informática.

INTRODUÇÃO A Lei de Informática, em suas edições - Leis 8.248/91, 10.176/01, 10.664/03 e 11.077/04 - tem se traduzido, ao longo dos últimos anos, em um interessante instrumento de política de desenvolvimento industrial - por atrair empresas para esse segmento industrial - e tecnológico - por ainda viabilizar o investimento de parte dos recursos da renúncia fiscal em atividades de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D). O artigo relata alguns projetos e seus resultados conforme desenvolvidos pela Fundação Centro de Análise, Pesquisa e Inovação Tecnológica (FUCAPI).

LEIS DE INFORMÁTICA Com a implementação da Lei 8.248/91, as atividades relacionadas à informática passaram a contar com uma política de incentivos fiscais vinculados à realização de esforços de P&D no Brasil. Esta lei permitia às empresas localizadas fora da Zona Franca de Manaus gozarem de incentivos fiscais, obtidos pela isenção do IPI (da ordem de 15% para a maioria dos produtos incentivados). Como contrapartida, exigia a realização de inves-

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timentos equivalentes a 5% do faturamento bruto das empresas em pesquisa e desenvolvimento no país, observando ainda as diretrizes do Processo Produtivo Básico (PPB), que determinam as etapas mínimas do processo produtivo a serem realizadas no Brasil. A aplicação desta legislação, bem como sua aceitação pelas empresas fabricantes de bens de informática, resultou em significativos valores investidos em P&D durante sua vigência. Esse tipo de política era bastante diferente da que caracterizava o período da reserva de mercado em informática. Os instrumentos de estímulo e contrapartida, que compunham esta legislação, estavam em sintonia com o novo ambiente competitivo de economia aberta e com a intensificação das relações comerciais internacionais, pois o novo modelo não apresentava os mesmos objetivos de substituição de importações do período anterior. Por outro lado, não fez recair sobre o consumo os custos do esforço tecnológico exigido.

A LEI 10.176/01 Com o fim da vigência da Lei 8.248/91, elaborou-se, após um intenso debate entre os parlamentares e outros grupos políticos, uma nova legislação pertinente ao tema de informática, a Lei 10.176/ 01, aprovada em 27 de dezembro de 2000 e sancionada no dia 11 de janeiro de 2001. Este instrumento baseia-se na concessão de estímulos fiscais mediante o atendimento de obrigações relativas à realização de investimentos internos em P&D. Segundo Garcia e Roselino (2003), a “nova Lei de Informática” estendeu os benefícios até o ano de 2009, melhorando alguns aspectos da legislação anterior, a partir do momento em que instituiu a obrigatoriedade de credenciamento das instituições habilitadas a realizar convênios com as empresas beneficiadas, bem como uma política de desenvolvimento regional, que estabelece critérios geográficos para a destinação de parcela dos recursos investidos.

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Para gozar de forma plena dos benefícios previstos nesta lei, a empresa deve investir, no mínimo, 5% de sua receita bruta em P&D, obedecendo à seguinte distribuição: a empresa pode investir internamente 2,7% de seu faturamento. O restante (2,3%) deve ser alocado em centros ou institutos de pesquisa ou educação (1%), sendo, uma parte, obrigatoriamente, nas regiões Nordeste, Amazônica ou no Centro-Oeste (0,8%) e parte, depositado no Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT). Por esta divisão de recursos apresentada, fica evidenciada a preocupação do Governo Federal em não apenas estimular as atividades de P&D nas empresas beneficiadas, mas também vincular os incentivos a formas de cooperação entre estas e as universidades e institutos de pesquisa, numa forma de fortalecer os esforços de desenvolvimento tecnológico e provocar uma multiplicação do conhecimento tecnológico associado aos investimentos. As edições da Lei 10.664/03 e 11.077/04 apresentaram novos pontos relativos à questão de incentivos fiscais.

A PARCERIA EMPRESA-INSTITUTO DE PESQUISA Mesmo que o tema da cooperação entre as empresas e os institutos de pesquisa pareça um assunto novo e atual, sua discussão já vem de longa data. Esta relação entre os ambientes de pesquisa e empresarial começou a se desenvolver nos Estados Unidos por volta da década de 30, mas o seu incremento aconteceu a partir dos anos 70, quando o interesse de ambas as partes, bem como dos governos, aumentou de forma significativa. O atual momento de globalização influencia significativamente esse processo de cooperação, pois, não sendo ainda algo tão difundido em ambos os meios (empresarial e de pesquisa), as empresas e os institutos o vêem como uma forma de se destacar no mercado em que atuam. Entre os poucos consensos estabelecidos no

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debate sobre globalização, encontra - se o de que inovação e conhecimento são os principais fatores que atualmente definem a competitividade. É neste consenso relativo à globalização que as empresas e os institutos de pesquisa praticantes da cooperação estão se apegando e cada vez mais incrementando suas diversas formas de cooperar. Segundo Serra (1987), as principais motivações para as empresas procurarem os institutos de pesquisa são, em ordem decrescente de importância: a) adquirir novos conhecimentos e estar a par de novas descobertas; b) ter acesso à inovação; c) obter opiniões independentes e diferentes; d) melhorar a imagem e o prestígio da empresa aos olhos dos clientes; e) obter apoio técnico para a solução de problemas; f) reduzir os custos de investigação e g) ter acesso aos laboratórios e equipamentos. Serra (1987) destaca, ainda, que as principais barreiras consideradas pela empresa quanto ao processo de cooperação com o instituto de pesquisa são: a reduzida aplicação prática dos trabalhos de pesquisa; a falta de um órgão de gestão do processo e a complexidade dos contratos; a necessidade de confidencialidade; a inexistência de canais adequados para a interação; a falta de uma estratégia dos institutos para as relações com a empresa e vice-versa. Serra (1987) ressalta que, para se estabelecer uma parceria eficaz entre o instituto e a empresa, é necessário passar por três fases: de conhecimento, de confiança e de consolidação. A primeira consiste nos mecanismos de aproximação, ou seja, o conhecimento mútuo entre ambas as instituições. A segunda refere-se aos mecanismos de interação entre as partes a fim de estabelecer confiança mútua. E a última está relacionada aos mecanismos de integração por meio de projetos regidos por contrato ou em conjunto, em que é feita a consolidação efetiva da parceria.

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OS PROJETOS DE P&D DESENVOLVIDOS PELA FUCAPI, A PARTIR DAS OPORTUNIDADES CRIADAS PELA LEI DE INFORMÁTICA Nestes anos de vigência da Lei de Informática, a FUCAPI desenvolveu vários projetos em conjunto com o setor produtivo, mais especificamente com empresas situadas no Pólo Industrial de Manaus (PIM). As experiências relatadas a seguir ilustram alguns dos resultados obtidos:

A) SISTEMA MODULAR PARA TESTE DE CAIXAS ELETRÔNICOS (MODATM) Um dos produtos gerados a partir de parcerias entre a FUCAPI e empresas fabricantes de bens de informática foi o MODATM - Sistema Modular para Teste de Caixas Eletrônicos (ATMs). O MODATM é um software cuja execução é orientada por um script que contém informações sobre os testes a serem realizados em máquinas ATM (Máquinas de Auto-Atendimento Bancário - Auto Teller Machines). O sistema tem como principais características: modularidade, utilização de script, log de operações e controle das etapas de teste. A FUCAPI idealizou o MODATM no final de 1998 e sua primeira versão foi implantada no primeiro trimestre de 1999. O sistema foi concebido para substituir aplicativos de teste que eram utilizados anteriormente pela empresa. O MODATM disponibilizou novos serviços que tornaram o processo de teste dos ATM’s mais robusto e seguro. A principal vantagem do MODATM é a utilização de scripts de teste. O script possibilita a inclusão de informações sobre as interfaces de comunicação dos periféricos - permitindo a configuração automática dos componentes de hardware e software necessários ao seu funcionamento – e a definição antecipada dos testes que serão executados. Com isto, evita-se que o usuário tenha o controle sobre o conteúdo dos testes e elimina-se a necessidade de procura em menus pelos testes de cada dispositivo – o que nos aplicativos anteriores ocasionava, freqüentemente,

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aumento no tempo de realização dos testes, devido, principalmente, a erros na escolha de periféricos, placas eletrônicas, interfaces de hardware e outras configurações. Além disso, o uso de script garante que nenhum teste será excluído (esquecido) pelo operador, visto que a execução do sistema somente será finalizada após o cumprimento de toda a seqüência de testes programada. O MODATM é hoje utilizado em vários setores estratégicos da empresa parceira, fabricante de ATMs. Sua aplicação se dá desde o setor de projetos, passa pelo processo de produção e, já há algum tempo, é a grande ferramenta de diagnóstico utilizada pelas filiais da assistência técnica do fabricante em todo o país. Os benefícios trazidos com o produto, para a FUCAPI, foram:

Estreitamento da parceria com a empresa, refletindo diretamente no investimento em novos projetos;

Formação de equipe especializada em terminais de auto-atendimento, periféricos e hardware de computador;

Aumento na competência de desenvolvimento de software básico e interfaces de software (APIs);

Criação de competências na programação no nível de sistemas (BIOS, device drivers, kernel);

Melhorias no processo interno utilizado para desenvolvimento de software;

Equipe capacitada para resolução de proble-

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mas críticos.

B) URNA ELETRÔNICA PARA AS ELEIÇÕES DE 2000 A participação da FUCAPI no projeto compreendeu três etapas: desenvolvimento dos softwares sistema de teste fabril e sistema do voto cantado; realização do treinamento dos multiplicadores dos TRE´s – Tribunais Regionais Eleitorais e TSE – Tribunal Superior Eleitoral, além dos supervisores e gerentes das equipes de suporte; elaboração da documentação técnica do projeto e manuais de treinamento. O sistema de teste fabril consistia no sistema de testes da urna UE-2000 durante a produção, a fim de garantir a qualidade do produto nas fases de: integração, amaciamento e controle de saída. Os objetivos específicos deste sistema foram: aumentar a produtividade através da automatização do processo de teste; identificar possíveis defeitos; fornecer informações para a base de dados; gerar o arquivo de log de teste e emitir o relatório de teste. O sistema de voto cantado teve por objetivo informatizar o processo de apuração das tradicionais cédulas de voto empregadas em eleições convencionais e uniformizar os relatórios dos boletins de urna para os casos de contingências: apuração de cédulas, apuração mista (cédulas convencionais e votação eletrônica) e recuperação de dados a partir dos boletins de urna impressos. No desenvolvimento do sistema de voto cantado, foram criadas três variantes do mesmo aplicativo que tinham a mesma finalidade principal, porém com restrições de segurança diferentes para atender a necessidades específicas de treinamento, simulação e apuração oficial. O desenvolvimento da documentação técnica constou da elaboração de manuais de referência para usuários, manuais de referência técnica de projeto e manuais de treinamento. O treinamento dos agentes multiplicadores foi feito para difundir

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o conhecimento sobre operação, instalação, procedimentos de contingência durante as eleições, utilização dos Softwares de Eleição (Eleição 1º Turno, Eleição 2º Turno, Voto Cantado, Auditoria, Treinamento de Mesários, Treinamento de Eleitores e Simulação), bem como do Gerador de Mídias e Utilitários (Extrator de Dados, Ajuste de Data e Hora e Diagnóstico). O balanço sobre as ocorrências técnicas, em nível nacional, divulgado pelo TSE no dia seguinte às votações do primeiro turno, informou que, em todo o país, foram necessárias 2.300 substituições de urnas eletrônicas pelas urnas de contingência, o que representou 0,7% do total. Segundo a Secretaria de Informática do TSE, este índice foi bastante inferior ao registrado nas eleições de 1998, que foi de 2,2%. Somente 95 urnas precisaram ser substituídas pelo voto manual, o que significa 0,02% da totalidade. Em 1998, este percentual atingiu 0,07%. Diante do sucesso e dos resultados obtidos, pode-se afirmar que os objetivos dos treinamentos ministrados e dos sistemas desenvolvidos e implantados foram alcançados. O software de teste fabril desenvolvido pela FUCAPI assegurou a garantia da qualidade das urnas eletrônicas nas eleições 2000 e também ficou comprovada a eficácia do sistema de voto cantado na apuração das seções que enfrentaram problemas técnicos e tiveram que concluir a eleição manualmente. O êxito dos manuais de treinamento, vídeo e plano de curso também foi comprovado pelas cartas de elogios de vários TRE´s que foram enviadas à empresa parceira durante o treinamento e as consultas técnicas que ocorreram quando o treinamento foi replicado pelos TRE´s e pelos supervisores aos técnicos de suporte.

C) EQUIPAMENTO PARA TESTE DE QUEDA EM TELEFONES CELULARES – DROP TESTER A possibilidade de danos com as quedas dos aparelhos celulares é um problema que os usuários dos telefones enfrentam no dia-a-dia e, por isso, as empresas estão cada vez mais aprimorando os testes de robustez dos modelos que lançam no mercado. Os testes permitem aos projetistas identificar os pontos das placas eletrônicas dos aparelhos que precisam ser reforçados, aumentando, assim, a durabilidade e a eficiência do produto. O equipamento, desenvolvido pela FUCAPI em parceria com um fabricante de telefones celulares, representou uma solução para que tais testes fossem realizados. As etapas no desenvolvimento do produto foram: concepção, projeto preliminar, modelagem em CAD 3D, projeto detalhado, acompanhamento da fabricação, montagem e homologação de equipamento de teste de queda em telefones celulares. Embora tenham sido desenvolvidos outros equipamentos de teste de queda semelhantes, o diferencial inovador apresentado pelo Drop Tester foi a precisão do teste na operação de queda. O telefone celular em teste pode ser lançado de qualquer ângulo ou posição possível no espaço, não mudando de posição durante a trajetória da queda, o que permite obter dados mais confiáveis sobre o modelo testado. Com os testes, o fabricante de celular é capaz de determinar as providências a serem tomadas para projetar um produto mais robusto e com vida útil mais longa, o que pode significar alterações no projeto das áreas do aparelho mais danificadas ou atingidas nos testes. O projeto começou a ser desenvolvido em fevereiro de 2002 e o primeiro protótipo foi concluído em outubro daquele ano, encontrando-se em pleno funcionamento. Outros exemplares do Drop Tester foram montados pela FUCAPI e enviados para unidades da empresa parceira nos Estados Unidos, Alemanha e Finlândia. Entre os benefícios advindos do projeto, podese citar: o domínio do desenvolvimento de equipa-

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mentos para testes; a experiência de ter desenvolvido projetos de grande valor agregado para a empresa parceira; o intercâmbio de informações com centros de pesquisa do cliente nos Estados Unidos, Alemanha e Finlândia; o desenvolvimento de uma equipe de projetistas de produto na Região Norte, capaz de propiciar a geração de projetos mecânicos locais. D) SISTEMA RASTRO O relacionamento com uma empresa fabricante de equipamentos receptores de sinais digitais de televisão por satélite ocorreu através do desenvolvimento do Sistema RASTRO, cujo objetivo foi prover informações para garantir a rastreabilidade de componentes e produtos manufaturados em suas linhas de produção. Os requisitos específicos deste sistema foram: Controle da inspeção no recebimento: Capturar os dados por hand helds RF com leitores de código de barras; registrar a consistência de informações entre pedido de compra e a nota fiscal (invoice) recebida; permitir a comparação entre os códigos de barras de identificação do produto provenientes do fornecedor e do exportador – unidade da empresa no México, registrando diferenças de produtos, equivalências entre produtos alternativos ou incompatibilidade de produtos; verificar a consistência entre o código de barras de identificação do produto e o respectivo componente recebido, registrando as diferenças detectadas, equivalências entre componentes alternativos ou incompatibilidades; emitir etiquetas de códigos de barras para identificar produtos, imprimindo uma etiqueta com o código, a fim de permitir a correta identificação nos casos de inconsistência entre códigos de barras e produtos;

Rastreabilidade na Produção: Programar a produção de produto/modelos, por linha de produção; comparar componentes com feeders das máquinas de inserção automática de acordo com o produto/modelo em produção; registrar as PCI produzidas, incluindo números de série e da hora efeti-

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va de produção; vincular o número de série da PCI com o código de barras de identificação do produto; Sistema de Levantamento de Inventário: Sistema desenvolvido em Java, com API SuperWaba, em ambiente Palm OS integrado ao sistema corporativo RM. Permite o upload para Palm da relação dos bens patrimoniais sob responsabilidade de cada setor, para levantamento do inventário. A captura de número de tombamento é feita por leitura de código de barras, sendo registrados o estado de conservação e a localização atual do bem, possibilitando transferências, baixas de carga e atualização dos termos de responsabilidades. Ao término do inventário são emitidos relatórios gerenciais e feita a exportação para o RM, atualizando a base de dados do patrimônio.

CONCLUSÕES De uma forma geral, alguns dos benefícios advindos das experiências adquiridas através de projetos de Pesquisa e Desenvolvimento, realizados em parcerias com empresas fabricantes de bens de informática, podem ser listados a seguir:

1. Formação de equipes de projetistas, analistas e engenheiros com alto nível de capacitação em projetos de pesquisa tecnológica;

2. Oportunidade de mostrar às empresas as competências do instituto, iniciando uma aproximação, inexistente antes do advento da Lei de Informática, que possibilitou o desenvolvimento de parcerias para projetos de P&D significativos;

3. Desenvolvimento da capacidade de gestão de projetos por parte do instituto, a partir do atendimento aos requisitos dos clientes, os quais, qua-

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se sempre, criaram restrições de recursos que necessitavam de um acompanhamento constante no andamento das atividades dos projetos.

BIBLIOGRAFIA SERRA, N. Tecnologia e Desenvolvimento Econômico no Brasil: Considerações sobre o Papel dos Institutos de Pesquisas, São Paulo,1987. 108 p. Dissertação (Mestrado), Faculdade de Economia e Administração, Universidade de São Paulo. GARCIA, R. e ROSELINO, J.E. Uma Avaliação da Lei de Informática e de seus resultados como instrumento indutor de Desenvolvimento Tecnológico e Industrial, Revista Gestão &Produção, São Paulo, Mai-Ago 2004. 10 p.

* Rogério Azevedo Pereira é engenheiro mecânico, mestrando do curso de engenharia de produção da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) e coordenador do Centro de Desenvolvimento Tecnológico Industrial (CDTI)/ FUCAPI.

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A Lei de Informática para a Zona Franca de Manaus (ZFM): Institucionalidade e Alguns Impactos na Amazônia Ocidental

A LEI DE INFORMÁTICA1 PARA A ZONA FRANCA DE MANAUS (ZFM): INSTITUCIONALIDADE E ALGUNS IMPACTOS NA AMAZÔNIA OCIDENTAL

* DSc José Alberto da Costa Machado ** MSc José Roberto Ferretti *** MSc Aristides Oliveira **** Marcos Lima de Souza

RESUMO O artigo aborda considerações a respeito da edição, regulamentação e posteriores alterações do marco regulatório acerca da atividade de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) na Zona Franca de Manaus, a Lei nº 8.387/91, conhecida por “Lei de Informática”. Desenvolve um breve histórico onde contextualiza a evolução do tema, fazendo um paralelo singelo com a lei de informática que abrange outras regiões do país fora a ZFM. A partir da lei, apresenta os incentivos previstos, o modelo de investimento e alguns impactos de sua vigência. Introduz o Comitê de Atividades de P&D da Amazônia (CAPDA) suas finalidades e resultados de sua gestão. Por fim, expõe ferramentas financeiras que servem de apoio às ações ligadas à P&D na Amazônia.

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A Lei de Informática para a Zona Franca de Manaus aqui é entendida de forma ampla, abrangendo a norma inicial – Lei 8.387/91 -, bem como as suas alterações: Lei 10.176/01, Lei 11.077/04, e os Decretos que vieram para regulamentá-la: Decreto 1.885/96, Decreto 4.401/02, Decreto 4.944/03, Decreto 5.343/05.

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A Lei de Informática para a Zona Franca de Manaus (ZFM): Institucionalidade e Alguns Impactos na Amazônia Ocidental

INTRODUÇÃO O atual cenário do setor de bens e serviços de informática no Brasil é uma conseqüência da elaboração de diversas políticas, por parte do poder público, para a regulação desse setor. Constata-se que esse processo de elaboração de políticas se iniciou por volta de 1972, sendo marcado por uma série de fatos importantes ao longo dos anos, dentre os quais podemos destacar: 1972: Criação da Comissão das Atividades de Processamento Eletrônico – CAPRE; 1979: Extinção da CAPRE, criação da Secretaria Especial de Informática – SEI e início da comercialização de computadores brasileiros; 1984: Aprovação da Lei nº 7.232, que dispõe sobre a reserva de mercado; 1985: Criação do Conselho Nacional de Informática e Automação – CONIN; 1986: I Plano Nacional de Informática e Automação – I PLANIN; 1987: Aprovação da Lei nº 7.646, que dispõe sobre a proteção intelectual de softwares e sua comercialização no país; 1990: Extinção da SEI e criação do Departamento de Política de Informática e Automação – DEPIN; 1991: Aprovação do II Plano Nacional de Informática e Automação – II PLANIN e o fim da reserva de mercado;

Decreto-Lei n° 288/67 (Criação da Zona Franca de Manaus). Em outubro de 1984, foi aprovada a Lei nº 7.232, tratando da Política Nacional de Informática e da reserva de mercado para o setor e legitimando prática que teve início em 1976, com a Resolução 01/ 76 do CAPRE. Durante esse período de reserva, a importação de bens de informática (assim como outros diversos tipos de bens) ficou proibida ou dificultada através de diversos instrumentos legais, incluindo decretos, portarias e outros. O tempo de duração dessa reserva foi determinado em oito anos, sob o argumento de proteger a indústria nacional de informática, de tal sorte que a mesma pudesse amadurecer e se colocar em igualdade de competitividade com as grandes empresas do setor no cenário internacional. Após o término da reserva de mercado, por volta de 1991, a indústria nacional, em especial a de informática, não estava pronta para a concorrência externa e, portanto, sofreu os impactos da abertura econômica, entre os quais o desaparecimento de um alto número de empresas em virtude do nãopreparo para a concorrência externa. Entre as que sobreviveram, muitas se tornaram robustas e passaram à condição de atores importantes nos dias atuais. De tais atores, o presente ambiente exige uma robusta capacidade inovativa, mormente, das empresas que têm por core competence tecnologias nas áreas de Informação e Telecomunicações.

1991: Aprovação da Lei nº 8.387, que dá nova redação ao § 1°, do art. 3º, e aos arts. 7º e 9º do

AS LEIS DE INFORMÁTICA Em outubro de 1991, foi aprovada a Lei nº 8.248, que dispõe sobre o setor de informática no país, com exceção da área abrangida pela ZFM. Esta Lei, que ficou conhecida como Lei de Informática, instituiu incentivos fiscais para as empresas do segmento de informática instaladas fora da ZFM, centrados na alteração do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para as empresas do setor. Em um primeiro momento,foi con-

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1991: Aprovação da Lei nº 8.248, que dispõe sobre a capacitação e competitividade do setor de informática e automação;


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cedida a isenção total do IPI e, posteriormente, essa isenção foi convertida em redução de alíquota. A contrapartida por parte das empresas para usufruírem desses incentivos foi, e ainda é, a obrigatoriedade de aplicação de recursos em P&D em Tecnologia de Informação (TI). Essa Lei, entretanto, acabou afetando a lógica central dos incentivos da ZFM. Estes, consoante o Decreto-Lei nº 288, de 28 de fevereiro de 1967, são de natureza regional ou geográfica, isto é, são concedidos para qualquer segmento industrial e não apenas para setores ou produtos determinados. Como a lei estabeleceu, para o resto do Brasil, incentivos para produtos (informática) que também eram concedidos na ZFM, a competitividade desta, em relação a esses produtos, ficou afetada. Nesse contexto, e visando minimizar os efeitos nocivos da Lei nº 8.248 para a ZFM, é que surge a chamada Lei de Informática da ZFM, a Lei nº 8.387, de dezembro de 1991. A alteração mais profunda em relação ao definido pelo Decreto-Lei 288/67 foi a mudança na fórmula de redução da alíquota do Imposto de Importação (II), para as empresas do setor de informática instaladas na ZFM. Antes da alteração do Decreto-Lei, a alíquota de redução do II era de 88%2 para qualquer segmento industrial instalado no Pólo Industrial de Manaus. Com a alteração dessa lei, a redução da alíquota do II para o segmento de informática passou a ter um novo valor, condicionado pela quantidade de insumos nacionais agregados ao produto. Essa fórmula, conhecida como Coeficiente de Redução de Alíquota (CRA), está prevista no art. 7º, §1º, do Decreto Lei nº 288/67, com a redação dada pela Lei nº 8.387/91. Ademais, as empresas do segmento de informática ficaram obrigadas a aplicar em P&D o percentual de 5% incidente sobre o seu faturamento bruto na comercialização de produtos no mercado interno (produtos enquadrados pela Lei), deduzidos os tributos correspondentes a tais comercializações,

como PIS-PASEP e COFINS. Assim, o atual cenário que se tem para o país é o de duas leis para o setor de informática, sendo a Lei nº 8.387/91 direcionada para a ZFM e a Lei nº 8.248/91, para o restante do país. Como as regiões abrangidas apresentam suas peculiaridades, é natural que haja diferenças entre as mesmas.

INCENTIVOS CONCEDIDOS Do ponto de vista dos incentivos concedidos, tem-se um tratamento particular para a questão sob a ótica das duas leis, uma vez que enquanto a Lei nº 8.248/91 estabelece como incentivo o IPI, a Lei nº 8.387/91 estabelece como incentivo o II. Nesse ponto, reside um fato particular que é o de que ambos os incentivos já eram contemplados pelo Decreto Lei nº 288/67 que beneficiava somente a ZFM, sendo que após a aprovação da Lei nº 8.387/ 91 houve uma mudança no tratamento do II para as empresas do setor de informática instaladas na ZFM. Sob o enfoque da Lei nº 8.387/91, os incentivos concedidos eram os mesmos constantes na Lei nº 8.248/91, observada a alteração na cobrança do II para as empresas do setor de informática instaladas na ZFM. Outro fato a ser notado é a continuidade da isenção do IPI para as empresas de qualquer segmento instaladas na área de influência da ZFM, garantida quando esta foi prorrogada até 2003, mesmo após o término da isenção para as empresas do segmento de informática instaladas no restante do Brasil. Em resumo, a questão dos incentivos para bens de informática na ZFM tem os seguintes aspectos:

Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) - Isenção do IPI. Benefício este já concedido

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Este fator foi instituído em substituição aos “índices mínimos de nacionalização”, política industrial vigente para a ZFM até a abertura econômica.

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por meio do Decreto-Lei nº 288/67 para qualquer segmento industrial instalado na ZFM. Continuidade da isenção até 2023 em paralelo com a vigência do modelo ZFM, após sua prorrogação em 2002.

Imposto sobre Importação (II) - Modificação na forma do cálculo da alíquota do II, que antes era de 88% para qualquer segmento industrial instalado na ZFM e que passou a ser definido em função da proporção de insumos nacionais agregados ao produto, através de fórmula conhecida como Coeficiente de Redução de Alíquota (CRA), para as empresas do segmento de informática instaladas na ZFM. É necessário observar que as empresas dos demais segmentos continuam usufruindo o valor de 88% de redução da alíquota do II.

PERCENTUAIS DE APLICAÇÃO EM P&D

Uma característica interessante da Lei nº 8.387/ 91 é que os percentuais de investimentos em P&D são mantidos constantes no decorrer do tempo, diferentemente da Lei nº 8.248/91 onde os percentuais de investimento em P&D serão reduzidos ao longo do tempo. A partir de então, o equilíbrio da competitividade dos produtos de informática fabricados na ZFM e fora dela estará rompido. Assim, se por um lado a manutenção das fontes de recursos para P&D na ZFM é condição fundamental para fortalecimento de seu sistema local de C&T, por outro haverá que se buscar alguma forma de compensar tal diferenciação para o tratamento dado às empresas de fora da ZFM. Outro aspecto relacionado a este tema, os percentuais, é o fato da Lei nº 8.387/91 referir-se à pesquisa e desenvolvimento em qualquer área do conhecimento, enquanto que a Lei nº 8.248/91 abrange somente aquela realizada na área de Tecnologia da Informação (TI). Tal é assim, porque a Amazônia Ocidental (ou a área de influência

Figura 1

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A Lei de Informática para a Zona Franca de Manaus (ZFM): Institucionalidade e Alguns Impactos na Amazônia Ocidental

da Suframa) se constitui de especificidades distintas dos grandes centros do sul e, por tal razão, carecem de um tratamento relativo à P&D distinto do restante do país. Isto é, regionalmente, as carências em C&T são gerais e, portanto, não seria adequado limitar as áreas apenas em TI. Os percentuais de investimento em P&D, segundo a Lei nº 8.387/91, fixos ao longo do tempo, possuem a divisão e destinações expostas na figura 1. As aplicações externas são aquelas executadas fora da empresa, quando, por meio de convênios, pesquisas e desenvolvimento, são implementados com instituições de pesquisa sediadas na Amazônia, bem como os depósitos no FNDCT/CTAmazônia, fundo que será tratado a seguir. As aplicações internas são as que ocorrem dentro da empresa. Atendidos os mínimos a serem aplicados na modalidade externa, há que se alertar quanto à parcela de 0,8% (restante). Tal valor, de aplicação obrigatória, pode ser somado (integral ou parceladamente) tanto na modalidade convênio, que já possui um mínimo de 1%, como ao já determinado mínimo de 0,5% do FNDCT/CT-Amazônia. Dessa forma, para exemplificar, poder-se-ía ter 1,4% para convênios e 0,9% para o Fundo, caso se desejasse repartir igualmente os 0,8% entre os dois destinos. Outra forma de destinação seria a de se plicar integralmente o percentual de 0,8. Novamente, como exemplo: aos convênios, 1,8% e ao Fundo, 0,5%. Importa, fundamentalmente, que se aplique nesta modalidade – externa – o total de 2,3%.

AS EMPRESAS DE BENS DE INFORMÁTICA E OS INVESTIMENTOS O número de empresas produtoras de bens de informática permanece sem grandes oscilações

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(Tabela 1). Esta “estabilidade”, ao ser tida como uma possível resultante da adoção de um firme marco regulatório, pode conferir aos gestores do modelo ZFM e de estruturas alinhadas com a questão da aplicação dos recursos de P&D (CAPDA, SLI3) a possibilidade de planejamento de políticas públicas referentes ao emprego estratégico destes recursos. Visando medir, de forma mais quantitativa, os impactos da Lei de Informática, pode-se utilizar vários indicadores. Fontes da literatura (CHESNAIS, 2005, p. 161) afirmam que a disponibilidade de financiamento não apenas para P&D, stricto sensu, mas também para investimento em longo prazo em equipamentos, infra-estrutura e treinamento de empregados pelas empresas, universidades e institutos de pesquisa, afetam o sucesso dos sistemas locais e regionais de inovação e determinam a sua coesão e longevidade. Assim, analisando-se os valores relativos às obrigações em P&D, aplicados pelas empresas, e categorizandoos segundo suas finalidades, locus de aplicação e outros tem-se o resultado da tabela 2. Com a criação do CAPDA e a necessidade de se apresentar resultados à sociedade, acompanhamentos de caráter qualitativo tomaram lugar e propiciaram um novo viés de análise frente aos números relativos às aplicações em P&D. Alguns pontos merecem ser destacados no biênio 2003-2004. Percebe-se um incremento bastante relevante na área de software, motivado por duas grandes razões: a produção chinesa de hardware, fazendo com que se apontasse uma enorme dificuldade de competição neste campo, e a vocação do país para a pesquisa e desenvolvimento de novos softwares. No item “Laboratórios”, nota-se um aumento dos valores empregados, corroborando com a tendência em compreender P&D como política empresarial e institucional capaz de trazer o diferencial com-

Sistema Local de Inovação.

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A Lei de Informática para a Zona Franca de Manaus (ZFM): Institucionalidade e Alguns Impactos na Amazônia Ocidental Tabela 1: Quantitativo de empresas produtoras de bens de informática

Tabela 2: Destinação dos gastos aplicados em P&D (2002-2004)

*valores em análise, passíveis de glosa.

petitivo ordenado pela ambiência tecnológica. Outro ponto de vulto é o expressivo volume carreado aos convênios, o que aproxima o PIM a um modelo mais europeizado em detrimento ao norte-americano que estimula P&D no âmbito empresarial.

UMA ESTRUTURA ESTRATÉGICA: O CAPDA O CAPDA - Comitê de Atividades de P&D da Amazônia, criado pelo Decreto nº 4.401, de 2002, é composto por representantes do Ministério do

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Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (01), que o coordenará; do Ministério da Ciência e Tecnologia (01); da SUFRAMA (01), que exercerá as funções de Secretário do Comitê; do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq (01); do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social - BNDES (01); da Financiadora de Estudos e Projetos – FINEP (01); do Banco da Amazônia S.A. (01); do Governo do Estado do Amazonas (01); do Pólo Industrial de Manaus (02), que exerçam os cargos de presidente ou equivalente em suas empresas; e da comunidade científica da Amazônia Ociden-

Conforme previsão legal (inciso IX, do art. 8º, do Decreto nº. 4.401/2002), o campo ‘‘Outros’’ pode abrigar dispêndios correlatos às atividades de P&D. Como exemplo, citamos: taxa de administração e consultorias.

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tal (02). Suas finalidades principais, todas relacionadas com a gestão, acesso e controle dos recursos oriundos da Lei de Informática e a serem aplicados em P&D, são: definir as normas e diretrizes para apresentação e julgamento dos projetos de pesquisa e desenvolvimento a serem submetidos ao FNDCT/CTAmazônia; definir os critérios utilizados para credenciar e descredenciar os centros ou institutos de pesquisa ou entidades brasileiras de ensino, oficiais ou reconhecidas, bem como as incubadoras, para os fins de enquadramento como potenciais beneficiários desses recursos; definir o plano plurianual de investimentos e os programas e projetos a serem contemplados com recursos destinados ao FNDCT/CT-Amazônia; aprovar a consolidação dos relatórios relativos à aplicação desses recursos pelas empresas, resguardadas as informações sigilosas envolvidas; indicar os programas e projetos de pesquisa e desenvolvimento que serão considerados prioritários; avaliar os resultados dos programas desenvolvidos. A visão do legislador para este Comitê é a de ser esta uma outra disposição sistêmica delineada para criar novos programas destinados a necessidades que anteriormente nunca tinham sido encontradas, pois a inovação exige uma configuração que seja capaz de fundir peritos tirados de diferentes especialidades. (MINTZBERG, 1995). Por meio deste Comitê, hoje5 estão credenciadas a receber recursos 24 instituições públicas

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e 19 privadas no Estado do Amazonas; cinco públicas e uma privada no Estado do Acre; três públicas e uma privada no Estado de Rondônia; seis públicas no Estado de Roraima; perfazendo um volume de 38 instituições públicas e 21 privadas, totalizando 59 instituições de pesquisa na Amazônia Ocidental.

FERRAMENTAS FINANCEIRAS FUNDOS SETORIAIS Os Fundos de Apoio ao Desenvolvimento Cientifico e Tecnológico, também denominados Fundos Setoriais, criados a partir de 1999, constituem um mecanismo inovador de estímulo ao fortalecimento do sistema de Ciência e Tecnologia, C&T, nacional. Os fundos surgiram na esteira do processo de privatização de alguns setores da economia nacional, como petróleo, telecomunicações e energia. Objetivam garantir a ampliação e a estabilidade do financiamento para a área de C&T e, em simultâneo, a criação de um novo modelo de gestão, fundado na participação de vários segmentos sociais, no estabelecimento de estratégias de longo prazo, na definição de prioridades e com foco nos resultados. Além disso, busca orientar e apontar ações que possam estimular o desenvolvimento científico e tecnológico nos setores considerados, mediante o apoio financeiro a programas de pesquisa científica e tecnológica cooperativa entre universidades, centros de pesquisa e centros tecnológicos.

AS AÇÕES VERTICAIS E AÇÕES TRANSVERSAIS As ações que obedecem aos requisitos de determinado fundo, como o CT-Amazônia, por exem-

Levantamento realizado em 07.nov.2005.

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plo, são tratadas por Ações Verticais e utilizam recursos de um fundo setorial específico. Essas ações são orientadas a programas definidos pelos seus respectivos fundos setoriais de origem. Quando as ações são orientadas para os programas estratégicos do MCT, como, por exemplo, na Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE) do Governo Federal, são chamadas de Ações Transversais 6 (http://www.finep.gov.br/fundos_setoriais/acao_transversal/ acao_transversal_ini.asp). Tais ações utilizam recursos de diversos fundos setoriais para uma mesma ação. Neste caso, os Comitês gestores dos fundos são orientados a fazerem os aportes definidos pelo governo. No caso do CT-Amazônia, o CAPDA recebe tal comunicação.

CT-AMAZÔNIA O apoio financeiro para sustentar as ações, programas e projetos de desenvolvimento científico e tecnológico do CAPDA provém de um dos fundos setoriais, o CT-Amazônia, abrigado no Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT). O CT-Amazônia tem por finalidade fomentar atividades de pesquisa e desenvolvimento na Amazônia, conforme projeto elaborado pelas empresas brasileiras do setor de informática instaladas na Zona Franca de Manaus. Os recursos que constituem este fundo são provenientes, segundo a Lei de Informática para a ZFM, da aplicação mínima de meio por cento (0,5%) do faturamento bruto das empresas que tenham como finalidade a produção de bens e serviços de informática industrializados na Zona Franca de Manaus7. O comitê gestor desse fundo é o Comitê das Atividades de Pesquisa e Desenvolvimento na Amazônia (CAPDA8). Esse fundo setorial tem como executores a Financiadora de Estudos e Projetos - FINEP e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Cien6 7 8

tífico e Tecnológico (CNPq). PROGRAMAS ESTRUTURANTES DO CAPDA Os recursos do CT-Amazônia, por orientação do CAPDA, abastecem uma qualidade de programas que, como traduz o seu nome, têm por finalidade precípua a estruturação de bases para P&D. Os programas estruturantes adotados são:

ProGP - Programa para Desenvolvimento de Grupos de Pesquisa;

ProInfra - Programa Institucional de Infraestrutura para Pesquisa e Pós-graduação.

CHAMADAS PÚBLICAS No processo de seleção pública de projetos para os programas nacionais que incluem tanto as ações propostas diretamente pelos fundos – Ações Verticais -, como as de seu interesse – Ações Transversais - o governo utiliza-se de chamadas públicas. Desde 2004, o CAPDA, gestor dos recursos advindos da Lei de Informática (0,5%), lança mão desse instrumento para oferecer recursos a projetos ligados à P&D. Foram lançadas: Em 2004: Ações verticais (recursos integrais do CTAmazônia) ProInfra – a Chamada Pública MCT/FINEP/ CT-Amazônia 01/2004. Apoio financeiro à execução de projetos institucionais de implantação de infra-estrutura física para pesquisa e pós-graduação.

As ações transversais foram definidas em julho de 2004, pelo Comitê de Coordenação dos Fundos Setoriais. Ver organograma de aplicação em ‘Percentual de Aplicação em P&D’. Ver ‘Uma Estrutura Estratégia: CAPDA’.

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Em 2005: Ações verticais ProGP - o Edital MCT/CNPq/CT-Amazônia 27/2005 – Apoio às atividades de pesquisa científica, tecnológica e de inovação nas áreas de Biotecnologia, Microeletrônica, Software, Engenharia de Telecomunicações, Tecnologias Industriais Básicas e Energia.

ProInfra - a Chamada Pública MCT/FINEP/ CT-Amazônia Infra-estrutura - 01/2005 - Apoio financeiro à execução de projetos institucionais de implantação de infra-estrutura física para pesquisa e pós-graduação.

§ 3º, do art. 8º, do Decreto 4.401/02 prevê programas e projetos prioritários aos interesses da região amazônica. Tais programas9 foram definidos pelo CAPDA e encontram-se em fase de formatação de sua estrutura legal, a fim de receber aportes de empresas interessadas. São eles:

Programa Rede Estadual de Ensino e Pesquisa do Amazonas (REPAM), em execução sob a coordenação da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas - FAPEAM.

Programa de Desenvolvimento Energético Amazônico - PRODEAM, em execução sob a coordenação da Fundação de Apoio Institucional Rio Solimões (UNI-SOL).

Ações transversais (recursos parciais do CTAmazônia)

Edital MCT/CNPq/CT-Petro/CT-Amazônia/CTInfo/CT-Aquaviário - nº 32/2005. Estímulo à interatividade e à fixação de recursos humanos qualificados na região amazônica, visando ao desenvolvimento tecnológico e à execução de estudos e pesquisas em temas prioritários para a região.

Chamada Pública MCT/FINEP/CT-Amazônia/ CT-Agro/CT-Biotec/CT-Energ/CT-Infra/CT-Mineral/ CT-Petro/CT-Saúde - nº 08/2005 - Implementação de Projetos Estruturantes dos Sistemas Estaduais de C, T&I.

PROGRAMAS PRIORITÁRIOS Além dos programas estruturantes e possibilidade de se lançar mão das Ações Transversais, o

Programa TV Digital Interativa, em execução sob a coordenação da Unidade de Gestão Estratégica - UGE, do Centro de Ciência, Tecnologia e Inovação do Pólo Industrial de Manaus (CT-PIM).

Programa Tecnologia Industrial Básica TIB, em execução sob a coordenação da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (FAPEAM).

Programa de Desenvolvimento de Software na Amazônia - AMAZONSOFT, em execução sob a coordenação da Unidade de Gestão Estratégica (UGE), do Centro de Ciência, Tecnologia e Inovação do Pólo Industrial de Manaus (CT-PIM).

Programa de Microeletrônica e Microssistemas da Amazônia - PMMA, em execução sob a

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Resolução nº 02, de 12 de março de 2002, do CAPDA. Acessível em www.suframa.gov.br

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A Lei de Informática para a Zona Franca de Manaus (ZFM): Institucionalidade e Alguns Impactos na Amazônia Ocidental

coordenação da Unidade de Gestão Estratégica (UGE), do Centro de Ciência, Tecnologia e Inovação do Pólo Industrial de Manaus (CT-PIM).

CONCLUSÃO Houve, de fato, a partir da entrada em vigor da chamada Lei de Informática, um fluxo financeiro e a geração de produtos e serviços relacionados a P&D na área da ZFM. Ressalta-se que com a regulamentação, em 1996, por meio do Decreto 1.885, foi dado início a um processo que ainda requer ajustes. Com a criação do CAPDA e o fato de este Comitê poder dar unidade e sistematização à heterogeneidade de interesses que perpassam as atividades de P&D na ZFM e na Amazônia Ocidental como um todo, a condução das ações ganhou relevo e, de fato, avançou bastante nos últimos tempos. Os editais lançados a partir de 2004 e os respectivos resultados, a eleição dos programas prioritários, bem como o número de instituições credenciadas a manusear recursos públicos são a prova deste êxito. É relevante destacar que se encontra em elaboração o Decreto que irá regulamentar a última lei que compõe o conjunto de normas referentes à Lei de Informática para a ZFM: a Lei 11.077/04. Na minuta de tal instrumento, prevê-se a inserção de indicadores de resultados, tais como: patentes depositadas no Brasil e no exterior, concessão de co-titularidade ou de participação nos resultados da pesquisa e desenvolvimento às instituições convenentes parceiras; protótipos, processos, programas de computador e produtos que incorporem inovação científica ou tecnológica; publicações científicas e tecnológicas em periódicos ou eventos

científicos com revisão pelos pares; dissertações e teses defendidas; profissionais formados ou capacitados. Tais indicadores poderão facilitar o acompanhamento das políticas públicas relativas ao tema P&D. À guisa de conclusão, aponta-se quantitativamente o considerável volume - R$ 600 milhões no período considerado (2002 a 2004) - aplicado em P&D, em contrapartida ao regime de benefícios concedidos às empresas produtoras de bens de informática. De forma qualitativa, ressalta-se os investimentos em hardware, software, processo produtivo e capacitação/treinamento, com volumes respectivos na ordem de R$ 75, R$ 147, R$ 69 e R$ 28 milhões, dentro do mesmo período. Como decorrência do aumento das vendas nacionais das empresas produtoras de bens de informática e da conseqüente elevação de seus faturamentos, cresce o volume de recursos a serem aplicados em P&D. Tal tendência vai ao encontro das visões que se recebe dos dirigentes do PIM, quando reforçam a idéia da importância do investimento em P&D, deixando tal rubrica de ter a conotação de dispêndio. Este acréscimo amplia, consolida e fortalece as bases do sistema regional de inovação, possibilitando cada vez mais a sua melhor estruturação dentro do locus geográfico amazônico. Espraia-se o credenciamento de instituições de pesquisa pela Amazônia, sinalizando o nascimento de novas demandas por P&D fora do PIM, embora alimentadas por parte dos recursos deste pólo. Esse pujante sistema atraiu reconhecidos centros de P&D, tais como Instituto Certi, Fiocruz, Atech, entre outros e estimula novas possíveis entradas, como a do Centro de Estudos e Sistemas Avançados do Recife (CESAR). Lança nacional e internacionalmente outros, do porte dos Institutos Genius, Nokia, Samsung e Paulo Feitoza. Dá robustez e maturidade ao sistema, ampliando as possibilidades de instituições como a Fucapi e os departamentos tecnológicos das universidades federal e estadual.

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Programa para o Desenvolvimento de Bioindústrias na Amazônia - PRODEBIO-AM, em execução sob a coordenação da Fundação de Apoio Institucional Rio Solimões (UNI-SOL).


A Lei de Informática para a Zona Franca de Manaus (ZFM): Institucionalidade e Alguns Impactos na Amazônia Ocidental

Contribui, assim, o conjunto de normas em questão para a indução na formação de um sistema de C,T&I regional capaz de dar prosseguimento e estimular novas e importantes direções estratégicas que atendam de forma sistêmica interesses multivariados, podendo, desta forma, mitigar os visíveis desequilíbrios sócio-econômicos locais, regionais e nacionais. Este artigo, por meio de um breve relato, procurou assinalar pontos que possam servir de referenciais para o acompanhamento do ambiente de desenvolvimento tecnológico a partir da ótica legal e suas conseqüências.

BIBLIOGRAFIA CHESNAIS, François. O financiamento da inovação no regime global de acumulação dominado pelo capital financeiro. In LASTRES, CASSIOLATO & ARROIO. Conhecimento, sistemas de inovação e desenvolvimento. Rio de Janeiro: UFRJ; Contraponto, 2005. DECRETO nº 4.401, de 01 de dezembro de 2002. DECRETO nº 4944, de 30 de dezembro de 2003. DECRETO-LEI nº 719, de 30 de julho de 1969. DECRETO-LEI nº 288, de 28 de fevereiro de 1967. Financiadora de Estudos e Projetos – FINEP: www.finep.gov.br LEI nº 8.172, de 18 de janeiro de 1991. LEI nº 8.387, de 23 de outubro de 1991. LEI nº 10.176, de 11 de janeiro de 2001. LEI nº 11.077, de 30 de dezembro de 2004. Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior - MDIC: www.mct.gov.br Ministério de Ciência e Tecnologia - MCT: www.mct.gov.br MATTOS, João Roberto Loureiro de. Gestão da Tecnologia e Inovação. São Paulo: Saraiva, 2005. MINTZBERG, Henry. Criando Organizações Eficazes. São Paulo: Atlas, 1995. Superintendência da Zona Franca de Manaus – Suframa: www.suframa.gov.br

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* José Alberto da Costa Machado é doutor em Desenvolvimento Sócio-Ambiental (NAEAUFPA); coordenador-geral de Estudos Econômicos e Empresariais da Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa) e professor do Departamento de Economia & Análise da Universidade Federal do Amazonas (Ufam). ** José Roberto Ferretti é mestre em Gestão Pública e Empresarial (Ebape-FGV) e coordenador de Políticas Tecnológicas da Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa). *** Aristides Oliveira é mestre em Gestão Pública e Empresarial (Ebape-FGV), assessor Técnico do Gabinete da Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa) e professor do Departamento de Administração da Universidade Federal do Amazonas (Ufam). **** Marcos Lima de Souza é analista da Coordenação de Políticas Tecnológicas da Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa) e professor substituto do Departamento de Eletrônica e Telecomunicações da Universidade Federal do Amazonas (Ufam).

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A Lei de Informática e o Desenvolvimento Regional

A LEI DE INFORMÁTICA E O DESENVOLVIMENTO REGIONAL

* Alexandre Lisbôa da Cunha

Manaus já experimentou alguns períodos de grande destaque em sua história. A fase da borracha no século dezenove, a do comércio de importados até a primeira metade da década passada e a de crescimento acelerado da indústria nos últimos dez anos. Mais recentemente, uma nova fase se iniciou, impulsionada pela lei de informática: a da pesquisa e desenvolvimento (P&D). Como as anteriores, esta também tem contribuído para o desenvolvimento regional. Mas as dificuldades logísticas da região naturalmente fragilizam a capacidade de manter atividades deste tipo. Temos que mapeálas e eliminá-las, se pretendemos desenvolver Manaus como um pólo nacional para P&D. Aqui visitaremos algumas das principais dificuldades para a sobrevivência da atividade de P&D em Manaus. Não é uma análise exaustiva e representa o pensamento do autor após cinco anos atuando como Gerente de P&D em uma das mais conceituadas empresas do ramo, na cidade e no país.

INTRODUÇÃO Segundo o IBGE, Manaus é o quarto maior PIB do país (dados de 2002), com R$ 20,4 bilhões, superado apenas por São Paulo (R$ 140,7 bilhões), Rio de Janeiro (R$ 62,9 bilhões) e Brasília (R$ 35,7 bilhões). Infelizmente, grande parte desta riqueza migra para os grandes centros do sul, onde estão as sedes das indústrias aqui instaladas. Mas, nos últimos anos, mecanismos criados com a Lei de

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A Lei de Informática e o Desenvolvimento Regional

Informática têm contribuído para que uma maior parcela destes recursos fique por aqui. Esta lei incentiva as indústrias a aplicarem parte do seu faturamento em projetos de desenvolvimento na própria região, o que possibilitou o nascimento de inúmeras novas empresas privadas de um segmento até então inexistente em Manaus: o da pesquisa e desenvolvimento. A primeira destas empresas com destaque foi o Genius Instituto de Tecnologia. O sucesso deste primeiro empreendimento atraiu mais alguns, como INdT (Nokia), Siemens, Samsung, além de possibilitar o crescimento de outros que já atuavam timidamente antes, como Fundação Paulo Feitosa e Fucapi.

mico quanto social. Este bom momento pode ser sentido nas altas taxas de crescimento da cidade, acima das demais capitais brasileiras. O crescimento industrial tem sido de 2 dígitos nos últimos dezoito meses e o PIB per capita ultrapassou o de cidades como Belo Horizonte. Entretanto, a lei não deve ser vista como um benefício perene, mas sim como a catalisadora para se alcançar um novo patamar. A conquista deste novo patamar exige que sejam trabalhadas e consolidadas as condições de auto-sustentação, para quando a lei não mais existir. A atividade de pesquisa e desenvolvimento, em Manaus, ainda não conquistou esta condição.

GENIUS INSTITUTO DE TECNOLOGIA A Lei de Informática tem, portanto, contribuído para este que é um dos melhores momentos da história de Manaus, tanto do ponto de vista econô-

DESENVOLVIMENTO Quando o Genius instalou-se em Manaus, cinco anos atrás, o primeiro problema a ser enfrentado foi a escassez de recursos humanos. A cidade

Genius Instituto de Tecnologia

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A Lei de Informática e o Desenvolvimento Regional

já possuía boas faculdades nas áreas técnicas ligadas à eletrônica e informática. Mas o foco da formação era para a atividade de manufatura, iniciada aqui cerca de 30 anos antes. A alternativa foi trazer profissionais de fora. Na época, quatorze outros Estados do sul, sudeste e nordeste contribuíram para os quadros da empresa, além de alguns estrangeiros vindos de países como França, Bélgica e Estados Unidos. As demais empresas de P&D que aqui se instalaram experimentaram situação idêntica e também importaram seus pesquisadores. Este grande fluxo de mão-de-obra especializada foi (e tem sido) muito benéfico para a região. Entretanto, Manaus, como cidade, ainda não desenvolveu condições suficientemente atrativas para manter grande parte destes pesquisadores por um longo período de tempo. Muitos desejam voltar para o sul após alguns anos e necessitam ser substituídos. Trazer pessoal especializado de tão longe e ainda ter que lidar com uma taxa elevada de turnover é caro demais para as empresas. Manter esta condição por um período demasiadamente longo pode inviabilizar o negócio. Encontramos, então, o primeiro e talvez mais importante fator para a estabilização da atividade de P&D na região: a formação local de recursos humanos. Quando aqui se instalaram as primeiras indústrias do Pólo Industrial de Manaus, situação semelhante aconteceu. Hoje, as universidades locais estão perfeitamente aptas a atender à demanda deste segmento. Mas a formação de recursos humanos para a atividade de P&D é mais longa e complexa. Cursos de extensão e especialização são normalmente necessários e exige-se maior capacitação dos instrutores. As mudanças tecnológicas ocorrem em velocidade muito maior, exigindo atualização constante e maior conexão com o mundo externo. Percebemos algumas iniciativas tímidas para evoluir na questão da formação de mão-de-obra local. O próprio Genius ajudou a Universidade Federal do Amazonas (Ufam) a montar o primeiro

mestrado em informática da Região Norte do País, cedendo instrutores e financiando o laboratório. A Siemens financiou e orientou a Universidade Estadual do Amazonas (UEA) na montagem de cursos de especialização. A Fucapi tem feito esforços em reorientar seus cursos. Todas estas ações são válidas, mas sem um esforço estadual ou mesmo federal mais concentrado na mudança (ou complementação) do perfil de formação nas universidades, os resultados podem não vir no tempo necessário. Há muito ainda por se fazer. Adicionalmente à questão dos recursos humanos, outro problema ameaça as condições de funcionamento das atividades de P&D em Manaus: a movimentação de materiais e protótipos. Por ser uma zona franca, Manaus oferece uma série de vantagens fiscais às operações aqui instaladas. Materiais e equipamentos podem ser importados com isenção e/ou redução de vários impostos, aumentando assim a competitividade das fábricas e compensando desvantagens geográficas e logísticas da região. Para evitar abusos e desvios das intenções da lei, mecanismos de controle tornam-se necessários. Basicamente, toda a matéria-prima que sai deve ter sua origem comprovada. Para tal, as fábricas contam com caros e complexos sistemas de controle conhecidos com MRP (Material Requirement Planning). Toda a cadeia de produção é controlada por este sistema, automatizando a geração das informações exigidas pelo fisco para a movimentação de materiais e produtos. Uma empresa de desenvolvimento não trabalha desta forma. Ao contrário de uma fábrica, lidase com poucos componentes e, proporcionalmente, com altas perdas. Os componentes mais caros são, normalmente, amostras enviadas em pequenas quantidades e, freqüentemente, sem custo. Muitas vezes são trazidos “em mãos” pelos próprios representantes. Um sistema de controle rígido de materiais não se justifica e normalmente nem mesmo é possível. Conseqüentemente, não há como comprovar a origem dos componentes e, por conseguinte, a saída de protótipos.

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A Lei de Informática e o Desenvolvimento Regional

Quando falamos de equipamentos, a movimentação é bem mais fácil, porém extremamente demorada. Normalmente, tirar um equipamento temporariamente de Manaus requer uma grande burocracia e uma internação do mesmo na Receita Federal por até duas semanas, para inspeção. Isso significa deixar o equipamento parado por um tempo nem sempre suportável para a operação. A atividade de P&D é muito mais dinâmica e imprevisível do que a de fabricação. Os mecanismos que funcionam para um não necessariamente funcionam a contento para o outro. Este fato merece a atenção das autoridades para uma revisão dos processos, de forma a adequá-los às necessidades das empresas de P&D. Finalmente, analisemos a eficácia da utilização dos recursos da lei de informática. Obviamente, o interesse é obter-se o máximo (para a sociedade) de resultado por real aplicado. Queremos que os investimentos do governo (mesmo que indiretos, através das empresas) tenham efeitos concretos e duradouros. Quem deve garantir isso? As indústrias? Certamente elas têm um importante papel nisso. Mas as indústrias nacionais não possuem uma cultura de investimentos a longo prazo e estão mais preocupadas em sobreviver, frente à concorrência global. As que são elegíveis aos benefícios da lei de informática normalmente não sabem como aplicar os recursos de P&D e acabam buscando o caminho mais fácil possível, que exija menor esforço de controle e risco. As multinacionais, por outro lado, entendem a importância da atividade de pesquisa para a empresa mas, por várias razões, não têm interesse em estabelecer mais um laboratório no Brasil. A prova disso é que quase a totalidade delas possui unidades que não são nem mesmo consideradas laboratórios por suas matrizes. Se a lei de informática acabar, estas unidades estão, portanto, destinadas a desaparecer. Elas, então, aplicam em pequenos projetos de curto prazo, considerados não-críticos pelas matrizes. Este comportamento das empresas conspira contra os resultados esperados. Dessa forma, concluímos que não basta criar condições para a exis-

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tência de recursos de P&D. O governo deve também criar mecanismos que canalizem este dinheiro para os interesses da região e do país. Em outras palavras, definir áreas de foco, evitando a dispersão das iniciativas e aumentando a eficácia da utilização dos recursos. Criar estas condições é bem mais difícil porque devemos, primeiramente, saber quais são as áreas de foco e depois montar programas de longo prazo, de dez, quinze anos. Não estamos acostumados a isso. Temos até algumas iniciativas, como os “programas prioritários” do governo. Mas os resultados têm sido, no mínimo, questionáveis. Precisamos de programas de país, que extrapolem governos e envolvam a sociedade como um todo.

CONCLUSÃO Na era da informação global em que vivemos, não há espaço no mundo desenvolvido para empresas e países que ignoram a importância de participar do desenvolvimento tecnológico. A lei de informática é, portanto, um instrumento para alavancar o progresso e tem contribuído para o desenvolvimento social e econômico de Manaus. Mas o objetivo da lei é ajudar as empresas a estabelecerem pólos tecnológicos duradouros que façam sentido para elas e motivem a aplicação de recursos próprios. Em nossa região, temos vivenciado o esforço da criação de um destes pólos, mas ainda estamos longe de conseguir as condições mínimas de continuidade. Este é um trabalho difícil e de longo prazo, mas necessário para que os últimos cinco anos e os que virão não sejam perdidos. Formação local de recursos humanos adequados à atividade de P&D, revisão dos processos para movimentação de materiais para empresas do setor e definição de algumas poucas áreas de foco são algumas das ações que contribuirão para o desenvolvimento da região e do país.

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A Lei de Informática e o Desenvolvimento Regional

* Alexandre Lisbôa da Cunha é engenheiro eletrônico formado pelo Instituto Militar de Engenharia (IME), com especialização em redes pela Unicamp e administração pela FGV, além de MBA pela Ohio University. Trabalhou em empresas como Cobra Computadores, IBM e Solectron. Atualmente é gerente de pesquisa e desenvolvimento no Genius Instituto de Tecnologia, onde atua há cinco anos, desde a sua fundação, em Manaus.

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A Importância da Atividade de P&D para o PIM

A IMPORTÂNCIA DA ATIVIDADE DE P&D PARA O PIM

* Marco Antônio Giágio

Desde a sua criação, a ZFM proporcionou intenso processo de integração da Região Norte ao restante do país, gerando significativo crescimento econômico. Hoje o PIM é responsável por mais de 80% do PIB do Estado do Amazonas, que é o maior arrecadador de impostos de sua região. Os indicadores do conjunto de indústrias instaladas no PIM fazem de 2005 um ano de recordes positivos, porém é necessária uma ampla e constante ação em prol da manutenção da competitividade das empresas geradoras da atual realidade. Ciência e tecnologia são criticamente importantes para melhorar as condições de vida nos países pobres ou em desenvolvimento. Em uma economia baseada no conhecimento, líderes e governos necessitam cada vez mais de conselheiros científicos para fazer um uso efetivo das tecnologias emergentes. O relatório ‘‘Inovação: Aplicando Conhecimento ao Desenvolvimento”, foi elaborado pela Força Tarefa em Ciência, Tecnologia e Inovação, que faz parte do Projeto Millennium da ONU (http://www.unmillenniumproject.org/ reports/index_overview.htm). Elaborado em três anos, o relatório da Força Tarefa afirma que a ciência, a tecnologia e a inovação ajudaram a eliminar em larga escala a pobreza e a fome e a sustentar um forte crescimento econômico. O relatório afirma ainda que o papel potencial da ciência e da tecnologia na redução da pobreza e da fome em regiões em desenvolvimento está sendo subestimado. Mesmo nos países em desenvolvimento muitos consideram a ciência e a tecnologia irrelevantes para as necessidades imediatas ou têm uma

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apreensão incorreta de que o progresso tecnológico causará perda de empregos. O relatório recomenda aos países: Criar e ampliar instituições de aconselhamento em ciência e tecnologia em níveis nacionais e internacionais;

Utilizar instituições avançadas de ensino públicas e privadas, como as universidades e institutos de pesquisa públicos e privados diretamente a serviço do desenvolvimento da comunidade;

Reforçar os programas nacionais que tenham por objetivo promover o desenvolvimento de negócios;

Criar projetos de infra-estrutura como uma forma de promover a inovação tecnológica. Em um plano mais estratégico, há três grandes ondas da tecnologia recomendadas pelo relatório: tecnologia da informação e comunicação, genômica e biotecnologia e nanotecnologia. Estas tecnologias devem cada vez mais ser utilizadas pelos países em desenvolvimento na geração de ganhos sociais e econômicos. Se conhecimento é poder, tecnologia é a chave para o desenvolvimento. O não investimento em empreendimentos que coloquem iniciativa pública e privada, institutos de pesquisa públicos e privados e IES públicas e privadas dentro de uma política pública explícita de cooperação, voltada para um plano prioritário comum, impossibilitará a transformação das descobertas nos laboratórios em produtos comercializáveis, inviabilizando para a Região Amazônica a geração de recursos, a criação de novas competências e a exportação de produtos de alto valor agregado que dependam da mão-de-obra qualificada e

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especializada. Dentre os gargalos e demandas recentemente identificadas em estudos disponibilizados pela SUFRAMA, destacam-se os fatores tecnológicos que determinam a competitividade das cadeias produtivas dos setores eletro-eletrônico e de informática, responsáveis por mais de 60% do faturamento do PIM, que em 2005 bateu nos US$ 18 bilhões. Considerando o tipo de indústria e os mercados disputados pelos produtos aqui manufaturados, o processo de desenvolvimento do PIM deve estar fundamentado na formação e ampliação de competências tecnológicas locais, com o objetivo de criar vantagens competitivas sustentáveis ao longo do tempo. Porém há muitos aspectos que dificultam o desenvolvimento tecnológico local, cujos principais são:

Baixa integração entre empresas, universidades e centros de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (P&D&I);

Insuficiente disponibilidade de mão-se-obra qualificada, especialmente com formação superior (graduação e pós-graduação) na área de ciências exatas, envolvendo eletrônica, telecomunicações, computação entre outras da convergência digital;

Insuficiente infra-estrutura de alta tecnologia disponível na região, desestimulando especialistas e técnicos em atividades de desenvolvimento e engenharia, e acadêmicos na pesquisa científica, por falta de laboratórios adequados;

Baixa capacidade de atrair e desenvolver talentos empreendedores, o que torna Manaus muito dependente tecnologicamente de outros centros de tecnologia nacionais e mundiais, bem como de

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A Importância da Atividade de P&D para o PIM

fornecedores de componentes e serviços especializados. A partir da aplicação dos recursos originados pela Lei de Informática, as competências de P&D&I locais foram significativamente ampliadas, tanto em centros de P&D privados e de universidades já existentes, quanto pela criação de novas instituições voltadas para esta finalidade. Pode-se afirmar que o conjunto das competências hoje disponíveis em Manaus já é considerável, porém é indispensável e urgente suprir a deficiência local na formação de profissionais de alto nível, necessários tanto para as instituições quanto para as indústrias, que também estruturaram internamente suas competências de P&D. A baixa capacidade atual de formação local desta mão-de-obra prejudica diretamente os mais representativos setores do PIM, tais como eletroeletrônica, informática, telecomunicações e outros que juntos somam mais de 70% do faturamento do PIM. Como exemplo dos impactos da aplicação dos recursos da Lei de Informática na ampliação da capacidade local de P&D pode-se destacar o Instituto CERTI Amazônia (ICA), instalado em Manaus como uma entidade sem fins lucrativos. O ICA gera soluções de impacto regional e nacional no desenvolvimento científico e tecnológico para a inovação de produtos e processos nas áreas da tecnologia da informação e comunicação. Além de aplicações em sistemas industriais de produção e soluções que empregam os modernos conceitos de economia da experiência. Para contribuir no processo de inovação tecnológica das empresas do Pólo Industrial, o Instituto CERTI Amazônia consolidou sua experiência em processos produtivos e sistemas de garantia da qualidade, e ampliou sua capacitação em tecnologias de ponta como TV digital, redes wireless e desenvolvimento de software. Estes objetivos foram alcançados mediante o estabelecimento de parcerias estratégicas nacionais e internacionais. As atividades do Instituto vão desde a identificação de oportunidades em novos mercados, incluindo a análise de produtos, novas tecno-

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logias e oportunidades de otimização em processo produtivos (análise, diagnóstico e plano de ação para redução de perdas) até projetos de pesquisa e desenvolvimento de produtos mecaopto-eletrônicos e convergência digital (informática, telecomunicações e conteúdo), chegando a projetos para ampliar a competitividade em processos industriais. O Instituto CERTI Amazônia também atua como parceiro em projetos internacionais de grande porte, como o Projeto INSTINCT, um consórcio europeu liderado pela Universidadade de Brunel (UK), que visa o desenvolvimento de serviços prestados através da combinação de redes celulares, Internet e redes abertas de TV digital. O INSTINCT definirá uma nova plataforma interativa para prestação de serviços de convergência digital através da operação integrada de redes sem fio e redes de broadcast de TV. O foco deste projeto é viabilizar, num prazo de seis anos, uma base de provimento comercial de serviços móveis e fixos, criando serviços populares a serem prestados através da TV Digital e da 3a e 4a geração de telefonia celular. Este projeto irá prover mais acessos à rede de rádio, assim como serviços mais seguros, atrativos e econômicos para o usuário final. Permitirá acesso não discriminatório a todos os usuários e atenderá à demanda, com níveis adequados de qualidade para aplicações multimídia. Também no Brasil permitirá criar a base comercial para a cooperação de serviços de mobilidade entre telefonia móvel e fixa, com TV Digital, para pessoas em movimento. Ao todo este projeto conta com 27 parceiros, incluindo empresas privadas, universidades e institutos de pesquisas da Inglaterra, França, Alemanha, Itália, Espanha, Brasil e Israel. Alguns dos parceiros são: a Brunel University, France Telecom, Motorola, Phillips, Siemens, RAI, RBB, Tele Diffusion de France, TU – Braunschweig, Universidad del Catalunia e Universidad Politécnica de Madri. É notória a crescente demanda do mercado por novas tecnologias na área de comunicação e entretenimento, onde significativa parcela dos pro-

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dutos oriundos do PIM se insere. Portanto, seja em função da maior complexidade de seus produtos, ou em função da necessidade de mais segurança, rapidez no processamento de informações e menores custos dos produtos finais deste segmento, as indústrias do PIM continuarão a exigir crescente evolução das competências locais nestas tecnologias. Para isso é necessário que as instituições também busquem outras fontes de financiamento hoje disponíveis para se desenvolver, como os fundos setoriais, que oferecem oportunidades para realização de projetos alinhados com as diretrizes do governo federal. Neste contexto, os institutos de Manaus já estão agindo de forma integrada, propondo diversos projetos compartilhados de grande interesse estratégico para os setores já mencionados, bem como do interesse comum de grupos de instituições de ensino e de P&D. Com isso podese minimizar as dificuldades de formação de recursos humanos, pois esta forma de atuação se propõe a gerar como resultados:

Apoio direto de atividades de cursos de mestrado, inicialmente das universidades públicas do AM; Apoio direto à ministração de novas disciplinas e novos cursos mestrado;

tunidades para o desenvolvimento de ações regionais visando ao alinhamento dos esforços para ampliar as competências em pesquisa e desenvolvimento dos institutos de Manaus. A enorme carência de mão-de-obra especializada, infra-estrutura e subsídios tecnológicos locais para as atividades relacionadas à área impedem que sejam obtidos êxitos em ações que agreguem valor às tecnologias, inviabilizando o desenvolvimento de produtos e serviços que se adequem técnica e economicamente às necessidades do mercado, especialmente o brasileiro, que se caracteriza por baixo poder aquisitivo, porém muito receptivo às novidades tecnológicas.

* Marco Antônio Giágio é engenheiro mecânico pela UFSC - Universidade Federal de Santa Catarina (1992), com pós-graduação em Organização, Sistemas e Métodos pela FEPESE/UFSC (1992). Obteve o título de Mestre em Metrologia Científica e Industrial pela UFSC em 2002. Atualmente é Diretor Executivo do Instituto CERTI Amazônia, responsável pela execução de projetos de Desenvolvimento e Inovação para empresas do setor eletro-eletrônico e informática do Pólo Industrial de Manaus.

Realização de pesquisa aplicada visando ao desenvolvimento de produtos e serviços; Ampliação da capacidade de execução local de projetos de P&D complexos; Fomento ao desenvolvimento de inovações e incentivo à diferenciação de produtos; Desenvolvimento de ações visando à transferência e à absorção de tecnologia e conhecimento com o reforço do binômio empresa - universidade. Neste contexto, há enormes demandas e opor-

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A lei de Informática e o Desenvolvimento Regional

A LEI DE INFORMÁTICA E O DESENVOLVIMENTO REGIONAL

* Roberto Lavôr

CONTEXTUALIZAÇÃO A questão do desenvolvimento regional, ao longo de décadas, tem sido objeto de dissertações e teses por parte da academia brasileira, dispensando maiores conceituações e análises. Entretanto, esse fato não tem ecoado junto aos poderes constituídos da República, de sorte a ser tratado com a seriedade e responsabilidade que necessita. Esse é o retrato fiel do não cumprimento dos fundamentos dispostos no Título I (Dos Princípios Fundamentais) da Constituição da República Federativa do Brasil, com destaque para o “Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I. construir uma sociedade livre, justa e solidária; II. garantir o desenvolvimento nacional; III. erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV. promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.” Dezessete anos após a promulgação da Constituição de 1988, ainda temos: • Uma sociedade injusta; • Um desenvolvimento nacional que prestigia a

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A lei de Informática e o Desenvolvimento Regional

região sul-sudeste; • Pobreza, marginalização e graves desigualdades sociais e regionais; • Preconceitos das regiões mais desenvolvidas com relação às menos desenvolvidas. Reorganizar e orientar as relações entre educação, ciência e tecnologia e o setor demandante (Indústria, Comercio e Serviços) tem sido, há anos, o desafio no Brasil; e em nossa região não foi diferente. Diante desse cenário, identificam-se claramente alguns óbices oriundos da ausência de um Projeto de Nação, politicamente alinhavado, que coloque em prática a essência de uma República Federativa, tais como:

GUERRA FISCAL Estados e municípios utilizam-se de mecanismo previsto no Código Tributário Nacional para a promoção do desenvolvimento de regiões menos desenvolvidas, com o objetivo de atrair novos investimentos e gerar emprego. Esse verdadeiro canibalismo, como se diz no jargão da Engenharia de Manutenção, não promove geração e sim movimentação de empregos, criando, nas regiões, vácuos pela movimentação do capital em busca de maior rentabilidade.

DESPERDÍCIOS As perdas provocadas pelo processo de corrupção e incompetência de gestão nos poderes da República e o desperdício provocado por: - Duplicidade de ações; - Falta de comprometimento com resultados, em relação aos recursos aplicados, medido com eficiência e eficácia na iniciativa privada. Aurélio não poderia ter sido mais feliz na concei-

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tuação de Educação, em seu dicionário: ‘’O processo de desenvolvimento da capacidade física, intelectual e moral da criança e do ser humano em geral.” Baseado nesse conceito, podemos inferir que reside aí a falta de prioridade e vontade política com relação a: Educação, Ciência e Tecnologia no Brasil. Se, por um lado, essa constatação é um fato, por outro passa a ser uma oportunidade a ser explorada por poucos dirigentes que priorizem esse fosso lamentável que impede a formação de cidadãos brasileiros na essência. Os recursos oriundos da lei de informática têm sido decisivos para a ainda insuficiente, mas decisiva, mudança de postura do Estado do Amazonas com relação à ciência e tecnologia. Através da criação e implantação da Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia e da Fundação de Amparo à Pesquisa, o Amazonas começa a virar uma página nada dignificante para quem abriga a maior biodiversidade do planeta. A Lei de Informática, portanto, tem promovido efeitos positivos para o desenvolvimento regional que, entretanto, poderiam ser mais eficazes.

EDUCAÇÃO, C&T, SETOR PRODUTIVO Há décadas o Brasil padece da necessidade de interseção entre as políticas de Educação, Ciência e Tecnologia e o setor demandante (Indústria, Comércio e Serviços). Definidas por três diferentes ministérios, o país se ressente de um objetivo comum, orientado por um Projeto de Nação, onde essas políticas se apoiem mutuamente, gerando sinergia para o desenvolvimento auto-sustentado. Exemplo local disso é a performance do pólo de duas rodas do PIM e as ainda tímidas ações para a formação de RH no setor de engenharia mecânica. Eis as questões: • Onde queremos e podemos ser componentes?

T&C Amazônia, Ano IV, Número 8, Março de 2006


A lei de Informática e o Desenvolvimento Regional

• O que fazer para assumir uma posição de destaque nos setores eleitos? • Quais são os participantes que compõem esse sistema e como cada um pode concorrer para a auto-sustentabilidade dos setores eleitos? • Quanto vai custar e quem vai pagar? Isso posto, o Estado do Amazonas e, por extensão, a Região Amazônica podem e devem discutir com a sociedade em que setores da economia serão os melhores e mais produtivos, a fim de que sejam traçadas políticas que envolvam todas as instituições, através de um planejamento estratégico para o povo e não para governos. Após décadas de tantos levantamentos de potencialidades regionais e muito dinheiro gasto, podemos identificar algumas competências em que podemos ser líderes tais como: • Turismo ecológico; • Produção de alimentos (piscicultura); • Produção de ciência e tecnologia. Sobre o turismo ecológico, diversos empreen-

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dedores podem discorrer sobre o tema com mais propriedade.

PRODUÇÃO DE ALIMENTOS O cenário mundial de aumento da demanda por alimentos, longe de ser apenas uma ameaça, pode e deve ser visto sob a ótica de oportunidade. A criação, o abate e a comercialização de gado no Amazonas, com exceção de algumas regiões, onde destaca-se o município de Boca do Acre com o maior rebanho bovino do Amazonas, têm suas limitações quando falamos de escala. A bacia hidrográfica do Amazonas, entretanto, apresenta-se como imenso potencial para a criação de peixe em cativeiro, não apenas para o consumo da população local mas, principalmente, para exportação. Para tanto, faz-se necessária a agregação de valor ao pescado, o que irá ocorrer através da produção científica e tecnológica do setor. Como exemplo da situação atual, tem-se que o processo de salga do pirarucu ainda é utilizado na região como forma de conservação. A industrialização do pescado permitirá geração de emprego e renda em escalas superiores às

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praticadas no Pólo Industrial de Manaus. Ressalta-se que essa afirmativa não se contrapõe ao modelo ZFM e sim amplia o espectro de diversificações da geração de emprego e renda. A produção de alimentos no setor de piscicultura demandará um significativo avanço: • Na produção de embarcações apropriadas para a conservação do pescado capturado, recolocando no cenário produtivo o setor que já foi o segundo pólo naval do Brasil; • Na produção de ciência e tecnologia de alimentos, que possuem o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA) e a Universidade Federal do Amazonas com significativa produção de C&T, à espera do setor produtivo para utilização e aplicação; • Na produção de peixe em cativeiro, promovendo, de fato, a fixação do homem amazônico em seu habitat. Essas são apenas algumas das oportunidades geradas pelo aumento da demanda de alimentos no mundo. O Brasil, que já possui o maior rebanho bovino, pode tornar-se líder na produção de pescado.

A LEI DE INFORMÁTICA E O DESENVOLVIMENTO REGIONAL A Lei de Informática, sem entrar no mérito da sua criação, tem produzido resultados inexpressivos no âmbito nacional. Na região amazônica, o CAPDA (Comitê das Atividades de Pesquisa e Desenvolvimento na Amazônia) promoveu meritoriamente, entre outros, uma melhor ordenação, através de critérios definidos, das instituições habilitadas a receber aporte dos recursos de P&D oriundos da Lei de Informática. A eleição de Programas Prioritários permitiu a sinalização, aos investidores, de quais os se-

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tores da C&T são vistos como tal. Entretanto, apesar da consciência nacional sobre o estado de penúria porque passa a ciência e tecnologia brasileira, o governo federal comete o desatino de realizar superávit primário com recursos gerados e transferidos pelo setor industrial com o objetivo de alavancar a ciência e tecnologia nacional. Ciência e tecnologia na Amazônia, estrategicamente, devem ser encaradas como um SETOR PRODUTIVO. Diferente, com peculiaridades que têm na mão-de-obra qualificada o seu mais valoroso insumo. Produzir C&T na Amazônia é um desafio e, ao mesmo tempo, a única saída para o desenvolvimento auto-sustentado de nossa região.

“GENTE QUE FAZ É GENTE QUE PENSA” Ainda são tímidas as ações dos governos dos Estados da Amazônia, que deveriam colocar 100% de suas habilidades para traçar políticas regionais que priorizem o desenvolvimento regional. Um projeto ambicioso que, a despeito da ausência de um Projeto de Nação, construa um Projeto de Região. Dessa forma, podemos sair da condição de almoxarifado do mundo, onde nem sequer somos o almoxarife, ou moeda de troca do governo brasileiro, no âmbito internacional, a uma região desenvolvida e auto-sustentada. Com ciência e tecnologia aplicadas a nossa biodiversidade, somos competitivos e não necessitaremos de incentivos fiscais, fadados ao desaparecimento, no âmbito da globalização. Sem uma visão simplista da questão, mas com o pragmatismo que a função empresarial exige, podemos sintetizar sugerindo, em vez de apenas criticar:

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O que fazer? PRIORIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO A priorização da educação fundamental e média marcará qualquer administração pública estadual e/ou municipal. Canalizar os recursos do FTI, que em 2005 totalizaram R$ 66.712.782,03, agregados aos R$ 156.717.737,72 arrecadados para UEA, superando em mais de 50% o seu orçamento e permitindo uma ação eficiente e eficaz ao já significativo esforço que os governos do Estado do Amazonas empreenderam no setor educacional ao longo dos últimos anos. Apenas os recursos da UEA, sem considerar a correção monetária e aumento da arrecadação, ao longo de oito ininterruptos anos representariam cerca de R$ 1.776.000.000,00, aproximadamente, e seriam de boa monta para a educação. Essa atitude seria significativa e a mais importante coluna de sustentabilidade do desenvolvimento. Agregado ao recém-aprovado Fundo de Desenvolvimento de Ensino Básico, o governo do Estado estará fadado a fincar um marco de referência para o País e, principalmente, para a sociedade amazonense. Esses recursos financeiros, agregados aos recursos humanos dessa histórica e decisiva atitude denominada UEA são, com absoluta certeza, garantia de sucesso da educação no Estado do Amazonas.

CIÊNCIA E TECNOLOGIA Albergada em um grande projeto regional de definição das áreas de excelência, as ações relativas à ciência e tecnologia em ação no Amazonas produzirão os efeitos necessários. Ao sincronizá-las com a política educacional, estaremos gerando a infra-estrutura necessária ao desenvolvimento auto-sustentado.

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EMPREENDEDORISMO As potencialidades regionais, agregadas a RH qualificado e tecnologia disponível, são os ingredientes apropriados para a geração de emprego e renda. A criação de um curso pós-médio que desenvolva as habilidades e forneça os conhecimentos necessários para a gestão de pequenos negócios apresenta-se como uma excelente oportunidade de integração às três políticas. A educação formando cidadãos qualificados, competentes para atuar nos setores, com ciência e tecnologia aplicada, previamente priorizada, disponibilizando-se para o setor demandante de ambas, a indústria, o comércio e serviços. Esse projeto, que denominamos ludicamente como a Faculdade do Empresário, precisa ter características próprias, onde a grade curricular seja constituída de tópicos que auxiliem o potencial empresário, desde a montagem do seu simples plano de negócio até a gestão do mesmo. O Estado e os municípios dispõem de recursos humanos, materiais e financeiros, quais sejam: as instalações da UEA e UFAM distribuídas no interior; RH, professores da UEA e UFAM; e recursos financeiros da AFICAM/FTI/UEA. Há somente a necessidade da formatação do projeto e da atitude de implementá-lo, com a garantia de ter edificado as bases sólidas de uma sociedade justa e plural que se assemelhará, em pujança, às dimensões físicas do próprio Estado do Amazonas.

* Roberto Lavôr é engenheiro, professor da UFAM e empresário.

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