Revista Rumos 301

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#301 SETEMBRO/OUTUBRO

2018

AGENDA VERDE A Rumos acompanhou as celebrações pelo primeiro aniversário do Laboratório de Inovação Financeira e detalha as ações para fazer com que o Brasil seja uma liderança na pauta do desenvolvimento sustentável REPORTAGEM

LIVROS

SEMINÁRIO

Fórum do Desenvolvimento debate as perspectivas políticas e econômicas para o país

Em sua nova obra, o economista Luiz Carlos Bresser-Pereira defende a renovação do desenvolvimentismo

Desafios e potenciais da região Nordeste são tema de encontro em Fortaleza



Especialistas em pequenos negรณcios / 0800 570 0800 / sebrae.com.br


SUMÁRIO

SETEMBRO/OUTUBRO 2018

#301

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ARTIGO

Vinicius Lages

Economia da longevidade

OPINIÃO | Antonio Delfim

Netto

Triste coincidência

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PRÊMIO ABDE-BID

Debate sobre o Brasil

ARTIGO

Frederico Rocha

A fragilidade financeira das empresas Latino-Americanas REPORTAGEM

Compromisso global

ARTIGO

Macroimpacto e o microcrédito

18 CAPA |

Reportagem

Um laboratório para a inovação

30 A relevância da regulação ARTIGO

Daniela Magalhães Prates

financeira

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ARTIGO

Karla Silva e Josimara Almeida

Relatório de sustentabilidade como ferramenta de gestão LIVROS

Marco Antonio A. de Araujo Lima e Andrej Slivnik

Desenvolvimentismo renovado 4

Charles Damasceno

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DESTAQUES

Noel Joaquim Faiad

A edição de Setembro/Outubro da Rumos, construída em meio ao conturbado período eleitoral brasileiro, tem os olhos no presente, mas também mira o futuro: a agenda da sustentabilidade é inescapável e o Brasil deve estar preparado para exercer o papel de protagonista que lhe cabe no cenário internacional. Esse é o tema de nossa reportagem de capa, que recorda as discussões do evento que comemorou o primeiro aniversário do Laboratório de Inovação Financeira (LAB), iniciativa pioneira da Associação Brasileira de Desenvolvimento (ABDE), em parceria com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que tem buscado construir alternativas para o financiamento verde no país. Também de olho no futuro, apresentamos a cobertura do Fórum do Desenvolvimento, que reuniu especialistas e acadêmicos, incluindo um assessor econômico do presidente eleito do Brasil, para traçar as perspectivas para o país a partir de 2019. O Fórum também rendeu homenagens aos vencedores do Prêmio ABDE-BID, cujos resumos dos artigos são mais uma vez publicados nesta edição. Confira, ainda, nesta edição, uma reportagem com a última etapa do Ciclo de Seminários Regionais, desta vez com os inúmeros potenciais econômicos da região Nordeste, e com artigos dos economistas Vinicius Lage, Frederico Rocha, Daniela Prates e Antônio Delfim Netto, sobre temas diversos e importantes da pauta brasileira e latino-americana. Boa leitura!

NESTA EDIÇÃO

Júlho Serra/BNB

AO LEITOR

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REPORTAGEM

Mar de oportunidades

34 EXPEDIENTE

SETEMBRO | OUTUBRO 2018


ARTIGO

Economia da longevidade

RUMOS

dialmente, como o finlandês Teemu Kautonen, autor de estudos sobre o empreendedorismo na terceira idade, acreditamos que esse pode ser o caminho que, a um só tempo, apresenta soluções para os graves problemas enfrentados por esse segmento da população: desde os elevados níveis de desemprego à falta de sustentabilidade econômica dos sistemas de seguridade social, bem como a necessidade de valorização e inclusão. No caso do Brasil, os estudos feitos pelo Sebrae mostram que o empreendedor sênior é predominantemente movido pela necessidade. Em decorrência disso, ele ainda apresenta um baixo nível de mentalidade empreendedora e baixa qualificação para gerir um negócio. Nesse contexto, consideramos fundamental e urgente a formulação de políticas públicas que incentivem as pessoas que ingressam na terceira idade a enxergar o empreendedorismo como opção à aposentadoria. Isso passa, necessariamente, pela construção de um marco legal que elimine obstáculos ao acesso das pessoas maduras aos negócios, pela oferta de orientação que as ajudem a identificar suas potencialidades e pelo mapeamento dos mercados mais propícios a esse perfil.

VINICIUS LAGES Charles Damasceno

O Brasil é o país do futuro! Por quantas décadas nos acostumamos a ouvir essa profecia? Tanto que chegamos a acreditar que, por algum desígnio divino, o tempo estava a nosso favor. Não havia por que nos preocuparmos, o futuro sempre estaria lá, a esperar por nós, com promessas de fartura, saúde e felicidade. Entretanto, o futuro chegou. E chegou com pressa. Em um curto espaço de tempo, assistimos a uma drástica mudança no nosso perfil demográfico. Em apenas oito décadas, a expectativa de vida da população saltou dos 45 para os 75 anos e as projeções são de que, em 2050, um em cada três brasileiros será idoso (em 2010 essa proporção era de um idoso em cada 10 brasileiros). Inclusive nesse futuro, as pessoas com mais de 60 anos vão empreender e continuar aprendendo, sobretudo com a inclusão digital, pois a maioria das oportunidades de aprendizagem e de negócios vai estar acessível na palma da mão. E o que isso significa? Quais são os desafios de um país que vê a sua população envelhecer em uma velocidade além das previsões? O envelhecimento dos brasileiros nos obriga a repensar toda a organização da sociedade. Desde o sistema de saúde, que precisa considerar o aumento da demanda por atendimento de doenças típicas da terceira idade, até as empresas, que terão de levar em conta especificidades desse público consumidor, cada vez mais representativo. Mas o principal impacto dessa transformação deve se dar no mercado de trabalho. Se as pessoas vão viver mais, será fundamental assegurar-lhes a subsistência por um período maior. Nesse contexto, como prover a elas os recursos necessários, uma vez que a previdência, os fundos de investimentos ou poupança não serão suficientes? Assim, seja por necessidade financeira ou porque os idosos vão buscar no trabalho uma forma de se manterem ativos e inseridos na sociedade, o antigo modelo do ciclo de vida profissional, em que as pessoas dedicavam, em média, 15 anos aos estudos, 30 ao trabalho e depois se aposentavam, deixará de existir. Em lugar dele, passaremos a viver uma nova realidade, que os especialistas chamam de learning lifelong process, em que as pessoas não param de estudar e, desde que tenham saúde, trabalham até idades avançadas. Nós, do Sebrae, ao lado de especialistas renomados mun-

Diretor de Administração e Finanças do Sebrae

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Charles Damasceno

PRÊMIO ABDE-BID 2018

Debate sobre o Brasil Reunidos em Brasília para o Fórum do Desenvolvimento, especialistas discutem o cenário político e econômico brasileiro e apontam as perspectivas para o país nos próximos anos. POR SARAH BARROS A edição de 2018 do Fórum do Desenvolvimento reuniu em Brasília acadêmicos, profissionais e executivos do Sistema Nacional de Fomento para discutir o atual momento político e econômico brasileiro e os impactos das propostas em disputa para a atuação das instituições financeiras de desenvolvimento no futuro. Os painéis e debates apresentados no evento, promovido pela Associação Brasileira de Desenvolvimento (ABDE), em parceria com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e a Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), no dia 17 de outubro, indicaram que, em tempos de incertezas, torna-se mais importante refletir sobre as perspectivas de consolidação de avanços conquistados e as oportunidades que tempos de mudança trazem para o crescimento e o desenvolvimento. A abertura do Fórum foi conduzida pelos presidentes da ABDE, Marco Crocco, e do Sebrae, Guilherme Afif Domingos, que foi o anfitrião do evento; pela especialista-líder do BID, Maria Netto; e pela gerente geral da OCB, Tânia Zanella. Em sua palestra, Marco Crocco destacou o papel das bancos 6

de desenvolvimento e agências de fomento como mecanismos para suprir falhas no mercado e a influência das condições macroeconômicas do país para o bom desempenho dessa função. Segundo ele, a crise econômica mundial de 2008 é um marco que evidencia a importância da ação anticíclica dessas instituições para atender a demandas financeiras e econômicas nos momentos em que as organizações privadas não podem fazê-lo. “Com a crise, abriu-se a discussão sobre o papel dos bancos de desenvolvimento na economia. Essa discussão levou ao consenso de que essas instituições atuam em falhas do mercado que o setor financeiro privado não consegue atuar”, afirmou Crocco, lembrando que esse papel foi reconhecideo por organizações como o Banco Mundial, que declarou o sucesso dessas instituições no processo de superação da crise nos países desenvolvidos, devido à capacidade de atrair o setor privado para investir em projetos que efetivamente promovam o desenvolvimento. Com isso, afirmou o economista, que também preside o Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG) e é esSETEMBRO | OUTUBRO 2018


pecialista em desenvolvimento regional, já não se discute a necessidade de existirem bancos de desenvolvimento, mas sim a de determinar a forma como essas instituições devem atuar na economia. No caso brasileiro, um aspecto a considerar é o processo de desindustrialização enfrentado pelo país nas últimas décadas. Outras questões relevantes são a promoção da inovação, a inclusão financeira, a sustentabilidade e o financiamento de investimentos em infraestrutura, além do combate às desigualdades. “A desigualdade provocada pelo forte processo de empobrecimento e de piora das condições de vida da população mundial impõe desafios a serem considerados pelos bancos de desenvolvimento”, afirmou. POLÍTICA E DESENVOLVIMENTO O painel Dilemas Nacionais foi aberto pelo sociólogo José Maurício Domingues, professor e pesquisador no Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IESP-UERJ). Ele apresentou o contexto mundial e os caminhos percorridos pelo Brasil até chegar ao momento político atual, fruto da crise política colapsada em 2013, quando, a despeito do bom momento da economia, a sociedade irrompeu em desagrado com o sistema político vigente. Porém, teve como resposta maior fechamento desse sistema a mudanças, com a reforma eleitoral aprovada no Congresso Nacional dois anos depois. “Em 2014, o sistema político de democratização instaurado desde 1974 se desintegrou”, avaliou. Para Domingues, 2018 marca o início de um novo ciclo político no Brasil de contornos ainda incertos. Diferentemente do cenário de 1974, a sociedade brasileira hoje é mais fluida, plural e sem representação no sistema político. “Diante da enorme incerteza que vivemos, temos a expectativa de que os mecanismos democráticos atuem no sentido de garantir os princípios democráticos de alternância de poder, limite de poder e manutenção das instituições fundamentais”, resumiu. No contexto mundial, a realidade é de um crescente processo de regressão democrática, com exemplos dessa realidade nos Estados Unidos, desde o início do governo de Donald Trump, e na Europa, com o aumento do nível de burocracia em contraposição à democratização, e o regime turco, que, embora mantenha um sistema eleitoral, apresenta restrições crescentes ao funcionamento da democracia. Já a professora da Universidade de Brasília (UnB) Maria de Lourdes Rollemberg Mollo apresentou estudos que indicam o foco no estímulo à demanda interna RUMOS

A desigualdade provocada pelo forte processo de empobrecimento e de piora das condições de vida da população mundial impõe desafios a serem considerados pelos bancos de desenvolvimento Marco Crocco, ABDE

como o melhor caminho para a promoção do desenvolvimento no Brasil, com maior impacto distributivo e potencial de inclusão social. Um dos estudos apresentados foi o que demonstrou que o estímulo ao investimento, medido pela Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), é o mais favorável ao desenvolvimento, com melhor resultado do ponto de vista da distribuição da renda quando analisado o impacto sobre a produção, o emprego e as remunerações, incluídos os salários, os lucros e a remuneração de autônomos. Isto, comparado a estímulos sobre o consumo e sobre as exportações. “É mais uma razão para o estímulo à demanda interna, porque o investimento amplia o emprego, os salários e aumenta o consumo que amplia os lucros dos empresários”, explicou. Ela destacou ainda o maior potencial de efeitos de encadeamento no setor industrial, seja pelo aumento de demanda da indústria por insumos de outros setores, seja pelo fornecimento, ela própria, de insumos a outras indústrias. “Isso causa mais preocupação quanto ao cenário de desindustrialização que o Brasil está vivendo, não porque os outros setores, de serviços e agrícola, não devam ser estimulados, mas porque a indústria tem um papel chave não só na parte tecnológica, mas também na geração de empregos de qualidade e no impacto distributivo desses efeitos de encadeamento”, afirmou. Neste contexto a acadêmica enfatizou a necessidade, na política monetária, de maior queda de juros no Brasil e a manutenção desses patamares para que incertezas sobre os rumos da economia não inibam o investimento privado. Na política fiscal, o setor público precisa investir para aumentar de forma multiplicada a renda e o emprego e, com isso, estimular o investimento privado. “Isso é o oposto da austeridade que vem sendo implementada”, disse. PROPOSTAS Na última etapa do Fórum, os debatedores se voltaram para o futuro próximo, com análise das propostas em disputa no segundo turno das eleições presidenciais. Para o economista Paulo Nogueira Batista Jr., o grande mérito das eleições de 2018 foi a maior exposição dos candidatos sobre propostas para a área econômica, com ideias específicas e apresentadas em campanha e 7


ta também defendeu a realização da Reforma da Previdência, mas de forma “negociada, justa e equilibrada”. Outra promessa foi melhorar o ambiente de negócios, com redução de impostos e das obrigações acessórias impostas pelo sistema tributário atual e combater a instabilidade jurídica nos projetos desenvolvidos no país. Ele apresentou ainda intenções de investir em capital humano por meio do Plano Nacional de Qualificação de Capital Humano. A ideia é redistribuir recursos de inovação, hoje majoritariamente aplicados na área acadêmica, para ampliar investimentos nas empresas. PRÊMIO ABDE-BID O Fórum de Desenvolvimento da ABDE foi encerrado com a entrega do Prêmio ABDE-BID, que mais uma vez foi promovido em parceria com a OCB. Os vencedores da premiação receberam o reconhecimento de sua contribuição para o debate sobre a importância das políticas de desenvolvimento para o país. Neste ano, foram produzidos trabalhos sobre os temas: “Desenvolvimento em Debate”, “Parcerias Público-Privadas: Desafios e Soluções” e “Desenvolvimento e cooperativismo de crédito”. Ao todo 49 participantes apresentaram trabalhos, totalizando 152 artigos submetidos a análise desde a primeira edição do projeto. Entre os premiados de 2018, dois artigos foram produzidos por estudiosos estrangeiros. Todos eles estão publicados em livro que pode ser acessado no site www.abde.org.br. Nas próximas páginas, a Rumos dá seguimento à publicação de artigos com resumos dos trabalhos mais bem classificados nessa edição do prêmio. Charles Damasceno

não apenas no plano de governo registrado na Justiça Eleitoral. “As campanhas, em maioria, trataram de problemas, como o fiscal e o tributário, e há propostas defensáveis, como a tributação de dividendos e o consenso de que hoje no Brasil se tributa mais quem tem menos, mas também houve temas negligenciados, como a Reforma Tributária propriamente dita”, pontuou Batista Jr. Sobre a carga tributária brasileira, ele vê viabilidade de implementação de ações que não dependem do Congresso Nacional. Por outro lado, considerou improvisação as propostas de alíquota única para o imposto de renda e de isenção do imposto para quem recebe até cinco salários. Batista Jr. foi vice-presidente do Novo Banco de Desenvolvimento, estabelecido pelos Brics em Xangai, e diretor-executivo no FMI pelo Brasil e mais dez países. Ao se apresentar ao público do Fórum de Desenvolvimento, ponderou que não participou formalmente da elaboração de nenhuma das propostas apresentadas pelos presidenciáveis, mas esteve próximo das ideias de Ciro Gomes (PDT) e Fernando Haddad (PT). O ex-diretor do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e assessor econômico da campanha de Jair Bolsonaro (PSL), Carlos Da Costa, falou ao público por meio de videoconferência, a partir de Genebra. Com ênfase sobre a necessidade de recuperar o crescimento da produtividade, Costa atribuiu ao crescimento disfuncional do Estado as reiteradas quedas de produtividade na economia brasileira. Segundo Costa, tal disfunção tornou o Brasil uma presa de grupos de interesse contrários à população. “As tentativas de escapar deste problema se deram pela oferta de juros subsidiados e por meio de desonerações”, afirmou. Costa apresentou linhas gerais da estratégia defendida pelo então candidato, posteriormente eleito presidente, para atacar o problema, citando a realização de ajuste fiscal para reduzir dívida pública e, para isso, também promover privatizações. O economis-

Vencedores do Prêmio ABDE-BID 2018 foram homenageados durante o evento.

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SETEMBRO | OUTUBRO 2018


PRÊMIO ABDE-BID 2018 – SEGUNDO COLOCADO DA CATEGORIA 1

Padrões setoriais de inovação e importância do BNDES

RUMOS

crescimento das inovações, ou seja, o aumento do volume de recursos emprestados pelo BNDES conduz ao aumento da inovação em produto ou processo, seja em relação ao número de empresas que inovaram no ano de 2014, seja em relação ao volume financeiro dispensado para inovar. Além disso, os recursos do banco são positivamente relacionados com os gastos em Pesquisa e Desenvolvimento, seja no número de empresas e no volume financeiro total gasto por setor. A relação positiva ainda pode ser confirmada com o número de trabalhadores dedicados às atividades de P&D e com pós-graduação. Estes trabalhadores são os responsáveis pelo processo de inovação nas empresas. O papel do banco está voltado para fornecer recursos financeiros para as empresas, mas indiretamente estas empresas são as responsáveis pela inovação, ou mesmo elas geram um ambiente mais competitivo, que culmina com a adoção de estratégias de inovação nos setores econômicos. Aqui se pode concluir que a aplicação de recursos financeiros é uma condição necessária para a promoção das inovações e o banco de desenvolvimento é primordial para o sucesso desta política via investimentos.

RONIVALDO STEINGRABER Acervo Pessoal

A inovação é influenciada por características do setor ao qual a empresa pertence. O ambiente mais competitivo ou menos competitivo determina o ritmo de introdução das inovações e dos investimentos em pesquisa e desenvolvimento, tornando o processo de inovação sistêmico, portanto, dependente do ambiente. O conceito de Sistema Setorial de Inovação (SSI) abrange justamente os atores envolvidos no ambiente setorial e que são fundamentais para viabilizar o processo de inovação nas empresas. Entre os atores importantes no SSI destacam-se universidades, laboratórios e centros de pesquisa, agentes governamentais (governo, autarquias etc.), empresas concorrentes, fornecedores, distribuidores, financiadores, empresas de consultoria, entre outros. No rol de agentes financiadores, destacam-se os bancos de financiamento de longo prazo. No caso do Brasil, este papel é desempenhado principalmente pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). A pergunta que surge é: o BNDES, ao financiar a expansão econômica de longo prazo do país, promove o crescimento das inovações? Em outras palavras, os setores com maior aporte de recursos do BNDES são mais inovadores ou não? Os resultados encontrados confirmam a hipótese apresentada anteriormente. Os desembolsos do BNDES estão relacionados com as inovações nos setores econômicos do país. As inovações consideradas são o número de empresas inovadoras e o valor total despendido em inovações, sejam elas em produto ou processo e organizacionais e mercadológicas (de marketing), além do número de empresas com gastos em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) e o valor gasto nestas atividades. Ainda, a presença de mão de obra com ensino superior e com dedicação às atividades de P&D é maior nos setores com maior presença do BNDES. Os resultados estimados permitem afirmar que o BNDES é um dos principais agentes de apoio à inovação nos setores econômicos no país. As variáveis de inovação apresentaram sinal estimado positivo em relação aos desembolsos totais e desembolsos médios do banco, além do número relativo de empresas tomadoras de empréstimos. Estes resultados confirmam a importância do banco de desenvolvimento para o

Professor do Departamento de Economia e Relações Internacionais da UFSC.

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PRÊMIO ABDE-BID 2018 – SEGUNDA COLOCADA DA CATEGORIA 2

Pagamento de PPPs na Bahia

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faturas enviadas, já que elas estão respaldadas pelo verificador independente ou equivalente. A questão colocada só se faz importante de fato se houver conflito entre as partes. Com o Mecanismo de Pagamento, o estado da Bahia se dá a prerrogativa de fazer prevalecer o seu entendimento até que o conflito seja solucionado. O item mais controverso observado se refere à questão da bancabilidade que o instrumento concede ao projeto. Duas concessionárias apresentaram isso como vantagem, e outras duas, como desvantagem. Sobre o tema, a pergunta é: o Mecanismo de Pagamento confere bancabilidade aos projetos? Uma resposta precisa exige pesquisa própria. Apesar de as PPPs baianas terem conseguido se financiar, o tema permanece carente de análise apartada, ficando como sugestão para novas incursões. Aspectos ainda levantados são os aprimoramentos, a exemplo da falta de previsão de substituição de fonte de recurso. Enfim, se o instrumento é um case de sucesso, funciona continuamente há quase uma década, ainda é cabível se pensar em aperfeiçoamentos.

ADELAIDE MOTTA DE LIMA Acervo Pessoal

Garantia pública é um tema relevante para o sucesso de Parceria Público-Privada (PPP) no Brasil, em razão da insegurança que o setor público inspira junto ao privado. Na Bahia, a administração estadual desenvolveu um instrumento para o pagamento de suas obrigações contraídas em PPPs, denominado de Mecanismo de Pagamento. O instrumento é operado há nove anos e os cinco contratos celebrados pela administração direta até então contam com os benefícios do mecanismo para o recebimento das contraprestações. Abreviadamente, o Mecanismo se constitui em uma segregação de recursos do Fundo de Participação dos Estados (FPE) e um fluxo processual de informações e ações que envolve o órgão contratante, a Secretaria de Fazenda, a Agência de Fomento do Estado da Bahia (Desenbahia) e o Banco do Brasil. Do ponto de vista teórico, o instrumento não se constitui em uma garantia stricto sensu, por não se tratar de um veículo adicional que assegure a honra das obrigações do estado. Na prática, porém, ele é apresentado como garantia pública formal, como se nota nas cláusulas dos contratos de PPP firmados. Ou seja, no mundo real, o Mecanismo se constitui numa garantia pública aceita pelo mercado. Acatar o Mecanismo de Pagamento como meio de pagamento e garantia pública não exime as concessionárias de visão crítica sobre o mesmo. Questionadas sobre as vantagens e desvantagens do instrumento, percebe-se que as concessionárias não se preocupam se ele se apresenta como uma garantia stricto ou lato sensu. Afinal, à medida que viabiliza conjunção de papéis num só processo, ele permite maior eficiência do estado na gestão dos recursos. As maiores vantagens apontadas residem no fato de o instrumento operar com ativos líquidos e assegurar regularidade e pontualidade nos pagamentos. Apenas uma contratada apontou como desvantagem a inflexibilidade do instrumento em relação às datas de pagamento. Duas entrevistadas também indicaram como vantagem a independência do instrumento em relação à situação fiscal do estado. Dentre as desvantagens, o aspecto apontado pela maioria foi o risco de interferência política no fluxo estruturado, uma vez que a informação sobre o valor a ser pago transita por alguns órgãos até chegar ao Banco do Brasil. Pelas contratadas, o estado não deveria pagar valor diferente do apresentado nas

Doutora em Administração e Mestre em Economia, ambos pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), professora de Ciências Econômicas na Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS) e analista econômico-financeira da Desenbahia. SETEMBRO | OUTUBRO 2018


PRÊMIO ABDE-BID 2018 – SEGUNDO COLOCADO DA CATEGORIA 3

Competências em cooperativas de crédito

RUMOS

uma abordagem metodológica nova para a integração semântica e o refinamento de modelos qualitativos para fenômenos processuais emergentes. Nesses dois estudos de caso, rastreou-se a trajetória dos processos interorganizacionais para a combinação de recursos idiossincráticos e o intercâmbio de informações e conhecimento, que ocorrem nos relacionamentos entre os atores do sistema socioeconômico de modo subjacente ao processo de desenvolvimento de competências sistêmicas nas firmas. Desta forma, foram testadas as proposições do modelo teórico da pesquisa. Os achados corroboram resultados de estudos anteriores que propõem a existência de dimensões econômicas e organizacionais no fenômeno da competitividade. Também desvendam a dinâmica das relações de cooperação e contribuição que a firma estabelece com os parceiros e as estruturas sociais dos entornos organizacional e ambiental em prol da competitividade sistêmica.

BRUNO DA ROCHA BRAGA Acervo Pessoal

A competitividade é definida como os níveis de habilidade e desempenho de firmas, setores da indústria ou regiões político-administrativas para a exploração de fatores de produção e o suprimento de bens e serviços ao mercado. Dependente de fatores além das condições estruturais e fronteiras organizacionais, a competitividade é também um resultado da colaboração entre empresas e instituições de apoio à indústria, governo e sociedade civil. A partir da literatura sobre a competitividade baseada na cooperação, com um foco nas teorias da competitividade com base em competências, relacional e sistêmica, o estudo inquiriu as lacunas da abordagem multidimensional e sistêmica para o desempenho da firma, que reconhece a sua contribuição em prol da competitividade do sistema socioeconômico; e a cooperação entre atores de diferentes níveis do sistema, que interagem na busca por soluções para problemas competitivos não tratáveis por meio dos mecanismos de mercado e de intervenção estatal, que são denominados problemas sistêmicos. Escolheu-se o cooperativismo de crédito, um setor caracterizado como uma indústria-rede, em um mercado regulado pelo Estado, como o domínio empírico adequado para a elucidação das lacunas levantadas. Neste sentido, a pesquisa propôs descrever a dinâmica dos relacionamentos da cooperativa de crédito singular com as outras entidades do sistema socioeconômico, que resulta na criação de recursos e desenvolvimento de competências que contribuem com a competitividade sistêmica. Foi realizada uma pesquisa exploratória e descritiva, como um estudo de múltiplos casos de natureza qualitativa e com dados longitudinais, usando o método do rastreamento de processo, para a caracterização dos construtos e o refinamento do modelo teórico que foi elaborado para a pesquisa. A coleta de dados foi feita em fontes primárias e secundárias, por meio de uma pesquisa documental em arquivos e bases de dados e entrevistas não estruturadas com os gestores das duas cooperativas de crédito selecionadas como objeto de estudo. As técnicas de análise de conteúdo e de sequências foram usadas no processamento dos dados coletados com base em um modelo matemático discreto fundamentado em regras de decisão determinísticas que foi deduzido da Teoria das Categorias e da Teoria das Gramáticas Gerativas. Trata-se de

Doutor em Administração, com ênfase em Estratégia e Inovação, pela Universidade de Brasília (UnB). Atualmente, é analista do Banco Central e docente no Instituto Federal de Brasília (IFB). 11


OPINIÃO

Triste coincidência

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físicas que condicionam todas as economias, aprisionou o país numa armadilha. Os números fiscais mostram por que não podemos recorrer ao aumento da dívida pública para suprir as deficiências da demanda global. Os pequenos sinais de melhora recente da economia nesse final de governo que se despede se devem à paciência na coordenação política e à insistência nas reformas que o Brasil vai precisar para retornar ao leito do desenvolvimento mais sustentável e, principalmente, mais equânime. Não nos esqueçamos, porém: a saída é a recuperação do crescimento que depende de três fatores: 1) aumento dos investimentos em infraestrutura, o que exige uma nova inteligência dos governos para diminuir os riscos implícitos em contratos com duração de 20 e 30 anos; 2) aumento dos investimentos privados que precisam de alguma expectativa de crescimento, taxa de juro real razoável e de uma expansão do crédito; e 3) aumento das exportações, o que exige uma taxa de câmbio relativamente estável e competitiva para o setor industrial, que foi destruído e está ocioso por uma política que, há trinta anos, por sugestão de “cientistas”, tem usado a taxa de câmbio como instrumento de combate à inflação.

ANTONIO DELFIM NETTO Marcelo Correa

Dificilmente a economia brasileira enfrentou uma situação dramática como a que ora estamos vivendo, em meio a crises de natureza política que alimentam a tragédia nas famílias de doze milhões de brasileiros expulsos do mercado de trabalho nos últimos cinco anos. O desemprego é o mais cruel desperdício de recursos de uma sociedade civilizada. Afinal o trabalho é o único intercurso do homem com a natureza da qual ele faz parte e da qual – ainda que a cadeia que o leve ao recurso natural seja muito longa – ele extrai a sua subsistência. A interdição ao trabalho pela falta de demanda da sua atividade retira do homem o sentido de pertencer à sociedade, destrói a sua identidade, corrói a estrutura familiar que lhe dá conforto e – dependendo do tempo do desemprego – rouba-lhe as qualificações. Alienado de seu trabalho, não tem como reconciliar-se com “o ganhar a vida com dignidade”. Na segunda metade do século passado, o mercado de trabalho no Brasil se beneficiou de períodos de expansão da economia global pós Segunda Grande Guerra e com os programas de desenvolvimento nos anos 1955/1975, até voltar a sofrer as consequências de mais uma crise mundial com a elevação dos preços do petróleo nos anos 1970/80. Até o final do século 20, nossa economia não retomou o dinamismo, porém. A recuperação de níveis robustos do emprego só voltou entre 2003 e 2010, quando o PIB brasileiro cresceu à média anual de 4,1% – ajudado pela melhoria das relações de troca – praticamente no nível mundial (4,2%). A condução da política econômica no governo Lula favoreceu a expansão dos níveis de emprego e dos padrões de consumo das classes mais pobres, o que permitiu atravessar o período da crise dos títulos hipotecários nos EUA em 2008/2009, que levou o pânico aos mercados financeiros com profunda repercussão no comércio internacional, no crescimento econômico e consequentemente nos níveis de emprego em escala mundial. Nos três anos que se seguiram, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) anotou a perda de 30 milhões de postos de trabalho em todos os continentes. Foi a partir de 2012 (governo Dilma Rousseff ) que se iniciou o pior quinquênio da economia brasileira, com o PIB crescendo 0,4% em média, contra 3,6% do mundo. Do segundo trimestre de 2014 ao quarto trimestre de 2016 nosso PIB per capita caiu mais de 9%. Uma política voluntarista com a melhor das intenções, mas absoluto desrespeito às restrições

Professor emérito da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA-USP), ex-ministro da Fazenda, da Agricultura e do Planejamento. SETEMBRO | OUTUBRO 2018


ARTIGO

A fragilidade financeira das empresas LatinoAmericanas

1 http://www.levyinstitute.org/publications/corporate-debt-in-latin-america-and-its-macroeconomic-implications.

RUMOS

nas o suficiente para o pagamento de juros), e Ponzi (que arrecadam menos do que o requerido para o pagamento dos juros). Por conseguinte, variações positivas na receita podem não ter efeitos positivos sobre o investimento, como suporiam aqueles que adotam mecanismos de acelerador, mas todo o contrário, o investimento pode ser insensível ou mesmo reduzir frente a aumentos da receita. A apresentação de Perez-Caldentey deixa importantes lições. Inicialmente, ressalta-se a importância de se avaliar o comportamento das variáveis por setor institucional e não somente pelo agregado da economia, análise raramente presente nos estudos que guiam a política econômica. Em segundo lugar, alguma reflexão deve ser realizada sobre a recente instabilidade externa de alguns países latino-americanos a partir do fluxo de recursos com a finalidade de cobrir dívidas no exterior. Em terceiro lugar, surge um novo e pouco analisado canal externo de transmissão de crises para nossas economias.

FREDERICO ROCHA

Divulgação

O III Encontro Nacional de Economia Industrial e da Inovação teve lugar em Uberlândia, entre 18 e 20 de setembro, e apresentou algumas novidades que devem servir de alerta para estudiosos das economias latino-americanas e formuladores de política econômica. Esse foi o caso da palestra de Esteban Pérez-Caldentey da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), que apresentou trabalho intitulado Corporate Debt in Latin America and its Macroeconomic Implications, escrito em conjunto com Nicole Favreau-Negront e Luis Méndez Lobos.1 Usando uma base de dados da Bloomberg Data Services, Pérez-Candentey e seus amigos fazem uma análise do comportamento financeiro das 2.241 empresas não-financeiras latino-americanas (1.281 brasileiras) listadas em bolsas de valores, diferenciando-as de acordo com um importante critério: a emissão de títulos de dívida no exterior. Do total de empresas, apenas 110 emitiram títulos de dívida no exterior, sendo 28 brasileiras. No entanto, essas empresas representam parte substantiva do total de ativos (33,9%) e do investimento (40,8%) de seus países de origem. Enquanto a dívida externa da América Latina e do Caribe se manteve estável, ao redor de 18% do PIB, entre 2007 e 2015, a sua composição por setor institucional se alterou substancialmente. As empresas não-financeiras, que representavam apenas 14,8% da dívida global, passaram a responder por 32,9% desse montante, saindo de US$ 49 bilhões, em 2007, para US$ 289 bilhões, ou seja, um terço do endividamento externo de suas economias, em 2017. A fragilidade financeira das empresas endividadas no exterior cresceu substancialmente. O seu índice médio de liquidez imediata caiu de 1,15 para 0,99, o índice de cobertura dos juros desceu de 2,39 para 1,93, enquanto a razão entre o endividamento e o capital total subiu de 69% para 80%. Pelo lado da rentabilidade, a razão lucro pelo capital total se reduziu de 12,73% para 8,59%, e as margens de lucro, de 9,5% para 4%. Como consequência, aumentou a proporção empresas em situação especulativa de endividamento (que arrecadam ape-

Professor do Instituto de Economia da UFRJ.

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Divulgação

REPORTAGEM

Compromisso global Programa de Produção e Consumo Sustentáveis do BRDE é reconhecido pela ONU como modelo no setor financeiro brasileiro; desde 2015 já foram investidos mais de R$ 1 bilhão nos três estados atendidos. POR DANILE REBOUÇAS Mais do que uma pauta, o tema da sustentabilidade tem avançado em sua integração com as rotinas operacionais do Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE). Prova disso é o reconhecimento do Programa PCS – Produção e Consumo Sustentáveis como modelo no setor financeiro brasileiro, pela Rede Brasil do Pacto Global da Organização das Nações Unidas (ONU), em parceria com o Observatório Mundial e a PwC. No dia 26 de setembro, o banco, representado pelo diretor de Planejamento e Financeiro, Luiz Corrêa Noronha, apresentou o programa no evento “SDGs in Brazil – The Role of the Private Sector” (ODS no Brasil – O Papel do Setor Privado), em Nova York, em paralelo à 73ª Sessão da Assembleia Geral da ONU. “Ganhamos uma visibilidade que o banco não tinha. Não foi um prêmio, foi uma distinção pelo que estamos fazendo”, avaliou o diretor Luiz Noronha. Cerca de 83% dos projetos financiados pelo BRDE possuem aderência a, no mínimo, um dos 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS). Os ODS compõem, junto com 169 metas, a agenda mundial adotada durante a Cúpula das 14

Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável, em 2015, para serem atingidos até 2030. O coordenador da responsabilidade socioambiental do banco, Eduardo Grijó, acredita que o resultado positivo decorre da vocação que o BRDE possui para abrigar projetos inovadores e em sintonia com as necessidades da sociedade. “A nossa participação no evento da ONU confere visibilidade ao nosso esforço e abre portas importantes para novas parcerias”, diz. O diretor Luiz Noronha atribui a escolha do BRDE pelo Pacto Global da ONU ao fato de a instituição trabalhar com o fomento a iniciativas socioambientais, o que difere das demais empresas escolhidas, que são executoras de projetos. “Com o PCS, reduzimos o spread e aumentamos os prazos para fomentar ações socioambientais. Acho que isso chamou atenção dos jurados”, pontua. “Estávamos ao lado de grandes empresas brasileiras, seguramente éramos a menor de

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todas. Em geral, são os grandes que investem mais em projetos com preocupação socioambiental”, acrescenta Luiz Noronha. Os investimentos do BRDE voltados para ações sustentáveis são crescentes, com o Programa PCS buscando constantemente novas formas de financiamento e parcerias institucionais. O banco também realiza outras ações, como a parceria com o Ministério do Desenvolvimento Social, para projetos de redução de perdas e desperdícios de alimentos, oficializado com o Edital 05/2018, publicado no dia seguinte à apresentação na ONU (27 de setembro). No dia 28 de setembro, o BRDE assinou contrato com o Banco Europeu de Investimento (BEI) para operação de repasse de até 80 milhões de euros para projetos com foco em energia renovável, eficiência energética e mobilidade urbana. Esta é a segunda parceria internacional firmada em 2018. Em março, a instituição contratou 50 milhões de euros com a Agência Francesa de Desenvolvimento (AFD), para crédito a projetos enquadráveis no Programa PCS. “O BRDE avança em seu objetivo estratégico de diversificação de fundings, ampliando as alternativas ao Sistema BNDES, e reafirma o seu compromisso com desenvolvimento econômico e socioambiental sustentável”, afirma o diretorpresidente da instituição, Orlando Pessuti. Eduardo Grijó relata que o banco ainda finalizou junto ao BID a organização institucional do Programa de Eficiência Energética Assegurada, que deverá oferecer, ainda este ano, instrumentos novos de seguro performance, aliado ao financiamento de projetos de eficiência energética para empresas que aderirem ao programa. Já em iniciativa da Associação Brasileira de Desenvolvimento (ABDE), o BRDE será capacitado, junto com o Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG), como instituição piloto do Programa de Green Finance do Prosperity Fund, do governo do Reino Unido. O objetivo é ampliar a captação de recursos para financiamento a projetos que promovam o crescimento sustentável e o aprimoramento do mercado de finanças verdes no Brasil, alinhados aos ODS e ao Acordo de Paris. O BRDE e o BMDG compartilharão a experiência de pilotos com as demais instituições filiadas da associação, em 2019, quando serão identificados projetos de captação de recursos no Reino Unido para aplicação no Brasil. ODS Ao avaliar a atuação do banco em relação aos ODS, Luiz Noronha e Eduardo Grijó reconhecem que é preciso avançar mais, uma vez que tem pouco tempo que o tema passou a ser uma preocupação formal na instituição. O diretor destaca que o BRDE já tem parcerias com o PNUD, o Pacto Global, AFD e a Secretaria Nacional dos ODS, voltadas para o desenvolvimento desta metodologia. Eduardo Grijó acrescenta que há uma expectativa de até o final deste ano entregar um produto, que possa ser replicado, para qualquer instituição de fomento que se preocupe com o tema da sustentabilidade, para avaliar a sua contribuição com os ODS e os compromissos assumidos pelo Brasil. “O BRDE espera cumprir

RUMOS

sua missão institucional da maneira mais adequada e atualizada possível. Miramos ser um banco dos ODS. Acreditamos que esse será o futuro de todas as instituições de fomento do Brasil”, diz o coordenador. O Programa BRDE PCS viabiliza empreendimentos nas áreas do agronegócio, indústria, comércio e serviços, e está estruturado em cinco subprogramas integrados: energias limpas e renováveis; uso racional e eficiente da água; gestão de resíduos e reciclagem; agronegócio sustentável; e cidades sustentáveis. Do segundo semestre de 2015, quando começou a ser operado, até o final de 2017, já foram investidos mais de um R$ 1 bilhão, nos três estados de atuação do banco: Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. Entre os projetos beneficiados está o da empresa de logística portuária Itazém, no Porto de Itajaí (SC). O sistema de energia solar fotovoltaico implantado, com 4.394 painéis, para gerar 4.394 Kwh, proporciona autossuficiência energética para câmaras frigoríficas de produtos para exportação, em área de aproximadamente 15 mil/m2. A Rio Bonito Embalagens, em Boa Ventura do São Roque (PR), é outro exemplo. A empresa investiu R$ 5,7 milhões na modernização de estrutura e equipamentos, sendo R$ 4,3 milhões financiados pelo BRDE. A Rio Bonito produz embalagens para ovos com reciclagem de aparas de papel e papelão. O projeto permite a redução de custos com a produção. O projeto de reciclagem e o beneficiamento de sucata de metal da Tecnova, de Farroupilha (RS), mereceu o crédito de R$ 728 mil do banco por seu ganho ao meio ambiente. Com o investimento, foi adquirido equipamento para que os resíduos de ferro e inox recolhidos de diversas indústrias sejam prensados em blocos de 60 kg, em pallets e envolvidos em plástico strech, evitando a oxidação durante a estocagem, até a venda para fundições e siderúrgicas no Brasil ou nos Estados Unidos, Holanda, Israel, Indonésia, Índia e China. Grijó explica que o BRDE PCS foi constituído como resposta à regulação do Banco Central, em 2014, que passou a exigir das instituições financeiras que desenvolvessem Políticas de Responsabilidade Socioambiental. “A iniciativa visava, portanto, ao alinhamento do BRDE às mais recentes e importantes preocupações com o desenvolvimento sustentável e dela não se esperava mais do que sua efetividade e as contribuições que tínhamos a dar. O que vemos é que o programa permanentemente evolui, criando e adequando as condições do crédito ao mercado de bens e serviços sustentáveis”, afirma. 15


ARTIGO

Macroimpacto e o microcrédito Como muitas soluções que acabam se tornando negócios bem-sucedidos, o microcrédito nasceu como resposta a uma dor latente e ignorada por muitas pessoas no mundo. Por outro lado, diferentemente de outras trajetórias de destaque do mercado, essa história nasceu em um país asiático, menos convencional, Bangladesh. O ano era 1976, e o cenário, a cidade de Chitagongue, centro industrial e uma das maiores cidades da nação, mostrava uma grande dificuldade da população em adquirir crédito, em especial, para as pessoas de menor classe social. A dificuldade era tão relevante a ponto de a agiotagem desse extrato da sociedade perpassar o contexto financeiro, de modo que tomadores de recursos estavam sujeitos a chantagens que acabavam por direcionar várias decisões de suas vidas. Nesse sentido, a vantagem do empréstimo acabava se tornando um infortúnio. Foi pensando nesse público que Muhammad Yunus, naquele momento professor de Economia da Universidade de Chitagongue, decidiu combater esse problema com a ajuda de seus alunos. Primeiro, concedeu empréstimos de US$ 27,00 para um grupo de 42 pessoas de baixo poder aquisitivo, com a ideia de provar que o problema de inadimplência e, sobretudo, desconfiança com esse público era infundado. O resultado dessa experiência foi expressivo de tal forma que, auxiliado por bancos privados e internacionais, impulsionou a criação do primeiro banco direcionado a operações de microcrédito do mundo: o Grameen Bank. Entretanto, diferentemente das operações de concessão de crédito conhecidas atualmente, essa instituição passou a fornecer dinheiro com base em dois pilares que compõem a metodologia Grameen, dos quais o segundo é referência para operações semelhantes no Brasil: 16

1. os recursos emprestados devem passar por um aval solidário, baseado em um grupo formado pela comunidade atendida, que se responsabiliza pelos empréstimos concedidos; 2. deve haver um acompanhamento de cada cliente tomador de crédito feito por um profissional capacitado, o agente de crédito. Atualmente, esse projeto – que em dezembro de 2017 possuía 8,3 milhões de tomadores de microcrédito, dos quais 97% eram mulheres – está presente em mais de 80 mil vilas do país, totalizando também 97% do total da população bengali. Apesar de a história amplamente considerar a experiência de Bangladesh como a fundadora do microcrédito e do conceito de negócios sociais no mundo, no Brasil, as atividades de concessão de crédito para impulsionamento da população de baixa renda já estavam em andamento em Pernambuco e na Bahia no ano de 1973, fazendo do país um dos primeiros a se preocupar com essa questão. Nesse momento, por meio do programa UNO (União Nordestina de Assistência a Pequenas Organizações), financiado inicialmente por doações internacionais, o conceito do microcrédito começava a se estabelecer em terras brasileiras. Por 18 anos, período em que a ONG estava ativa, muitas iniciativas de caráter produtivo, como associações de artesãos, foram criadas. Em especial, esse período foi marcado pela formação de várias cooperativas locais de produção. Desde então, vários outros empreendimentos foram surgindo no sentido de promover essa possibilidade de captação de recursos. Na década de 1980, foi constituído o Centro de Apoio aos Pequenos Empreendimentos Ana Terra (CEAPE/RS) e o Banco da Mulher – que primeiramente atuava incentivando recursos para o público feminino e posteriormente abriu para o público em geral. Por outro lado, foi só na década seguinte que as primeiras iniciativas públicas de cunho nacional passaram a incentivar a disponibilização de crédito para pessoas de baixa renda, tendo em vista o crescente interesse público e privado desse projeto. O propósito inicial era incentivar ainda mais esse tipo de crédito e criar uma rede institucional com o intuito de potencializar a geração de ocupação e renda, especialmente para pequenos empreendedores formais e informais. Como destaque desse período, em 1996, o Banco Nacional de SETEMBRO | OUTUBRO 2018


Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) criou o Programa de Crédito Produtivo Popular (PCPP), idealizado para atender às organizações especializadas em microcrédito vigentes até então; e foi instituída em 1999 a Lei nº 9.790/99, que instituiu a qualificação de Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip) para organizações sem fins lucrativos. Entre outras atividades, a lei incluiu o microcrédito como um dos objetivos das Oscip, de modo que essas organizações pudessem acessar recursos públicos. Seguindo a estratégia de incentivo aos empreendedores brasileiros, em 2001, o Sebrae deu início ao Programa de Apoio ao Segmento de Microcrédito, com o objetivo de estimular a participação dos pequenos empreendimentos no mercado, principalmente os informais. Com base nesse esforço, foi instaurada a Lei nº 10.194/2001, que organiza a sociedade de crédito ao microempreendedor. Além disso, com o propósito de institucionalizar o plano de geração de ocupação e renda da comunidade de baixa renda, o Programa Nacional de Microcrédito Produtivo e Orientado (PNMPO) foi estabelecido por meio da Lei nº 11.110/2005, com a finalidade de conceder microcrédito produtivo orientado às atividades produtivas de pequeno porte. Importante instrumento do microcrédito, o PNMPO foi essencial para a geração de emprego e renda entre os microempreendedores, promovendo sua inclusão social e combate à pobreza. Dessa forma, o microcrédito ganhava cada vez mais espaço no mercado brasileiro como instrumento de desenvolvimento socioeconômico, fazendo com que diversas instituições, públicas e privadas, estaduais e municipais passassem a desenvolver programas direcionados ao microcrédito, movidos pelo desafio de garantir a todos o acesso ao crédito oferecido pelo sistema financeiro tradicional. Apesar de o volume de microcrédito não ultrapassar 0,4% das operações do sistema financeiro nacional brasileiro, segundo levantamento realizado em 2015 pelo Banco Central do Brasil, as cooperativas de crédito representam 73% das instituições financeiras que operam microcrédito, sendo responsáveis por 6,1% do valor total da carteira. O cooperativismo de crédito é, em sua gênese, um negócio que gera impacto social. Nesse sentido, buscando estar mais presente na vida do cooperado e RUMOS

Apesar de o volume de microcrédito não ultrapassar 0,4% das operações do sistema financeiro nacional, as cooperativas de crédito representam 73% das instituições financeiras que operam microcrédito, sendo responsáveis por 6,1% do valor total da carteira.

combatendo a escassez do microcrédito no mercado brasileiro, ao gerar soluções financeiras adequadas e sustentáveis, o Sistema de Cooperativas de Crédito do Brasil (Sicoob), empenhado em contribuir com o futuro dos negócios de seus associados, desenvolveu neste ano uma solução moderna para institucionalizar e consolidar o Sicoob Microcrédito, ainda que já atendesse essa necessidade há anos. Com linhas de crédito de capital de giro, investimento fixo e misto destinado às mais diversas necessidades econômicas dos microempreendedores, sejam elas a compra de matéria-prima e equipamentos ou mesmo a reforma de suas instalações, o Sicoob Microcrédito é rápido, sem complicação e encaixa-se perfeitamente à realidade de seus cooperados.

Superintendência de Gestão Estratégica – Suest

Banco Cooperativo do Brasil (Bancoob)

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Noel Joaquim Faiad

REPORTAGEM ESPECIAL

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Um laboratório para a inovação O primeiro ano do LAB, iniciativa pioneira que tem inspirado organizações no exterior, foi celebrado com um seminário em São Paulo, em setembro. A Rumos acompanhou o evento e traz os debates sobre os caminhos para o país entrar concretamente na agenda do desenvolvimento sustentável. POR CARMEN NERY Em seu primeiro ano de atividade, o Laboratório de Inovação Financeira (LAB) conseguiu cumprir uma agenda robusta e entregar diversos resultados e produtos. O laboratório é um projeto conjunto da Associação Brasileira de Desenvolvimento (ABDE), do Banco Interamericano do Desenvolvimento (BID) e da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Lançado em agosto de 2017, o LAB atua com um fórum de discussão multissetorial e tem por objetivo incentivar a criação de novos produtos e soluções financeiras que aumentem a participação do setor privado em soluções sustentáveis. O foco são mercados como os de energia, transporte, saneamento, agricultura e financeiro. O primeiro ano contou com a colaboração de 81 organizações, 229 participantes, tendo realizado 226 videoconferências, 36 exposições na mídia, quatro reuniões presenciais, 13 eventos nacionais, sete eventos internacionais e a colaboração de oito consultores. O LAB também inspirou outras organizações no exterior, em países como Argentina, Colômbia e Portugal. Essas e outras informações foram apresentadas no seminário “Inovar para transformar o desenvolvimento sustentável”, realizado no dia 13 de setembro, em São Paulo. No evento, foram discutidos os resultados de cada um dos grupos de trabalho em que o LAB foi dividido: Finanças Verdes; Fintechs; Instrumentos Financeiros e Investimentos de Impacto; e Títulos Verdes. “A parceria entre a ABDE, o BID e a CVM já demonstra a amplitude dessa iniciativa. No primeiro ano, passaram pelos grupos cerca de oitenta organizações as mais variadas: privadas, públicas, do terceiro setor, órgãos reguladores, órgãos públicos e ministérios. Isso é importante porque permite um diálogo em todas as dimensões e avançar na questão fundamental de discutir meio ambiente, finanças verdes e fintechs”, destacou Marco Aurélio Crocco, presidente da ABDE, na abertura do seminário. Ele observou que são temas centrais da atualidade que têm colocado grandes desafios para o mercado financeiro. Segundo Crocco, o mundo hoje, para atingir os objetivos da Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças ClimátiRUMOS

cas (COP 21) e mobilizar os recursos necessários, irá exigir o surgimento de vários instrumentos financeiros que ainda não estão consolidados. “Os produtos que começam a ser expostos aqui são uma resposta ao desafio colocado. Os quatro grupos de trabalho já identificaram os desafios para o próximo período e, daqui a um ano, teremos novos produtos e novas experiências para que os Objetivos do D esenvolvimento Sustentável (ODS) e da COP 21 sejam atingidos”, afirmou o presidente da ABDE. Hugo Flores, representante do BID, destacou que o período foi marcado por grandes transformações com inovações tecnológicas disruptivas e nesse sentido a iniciativa do LAB é relevante para toda a América Latina e o Caribe. O Brasil, como principal país da região, é o maior sócio do BID e o que mais tem tido desenvolvimento. “Estamos trabalhando intensamente para criar produtos que gerem transformações de impacto e nos permitam acompanhar um mundo que está cada vez mais acelerado”, ressaltou Flores. Marcelo Barbosa, presidente da CVM, destacou a participação dos ministérios, e de todos os órgãos reguladores, incluindo o Banco Central, a Superintendência de Seguros Privados (Susep), a Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc), além do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), B3 e da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima). Para Barbosa, muito já foi feito, mas isso mostra o quanto ainda pode ser realizado. “Educação financeira é um pilar importante para avançarmos em qualquer agenda. Transparência e informação são necessárias e a regulação tem de ser capaz de deixar claro as peculiaridades de cada tipo de investimento. O regulador também deve acompanhar a inovação. Temos de resistir à tentação de regular sem conhecer, mas também não proibir o uso sem razão”, afirmou Barbosa. Alexandre Vasco, superintendente de proteção e orientação aos investidores da CVM, reiterou que o objetivo do LAB não é produzir paper e sim contribuir para a retomada do desenvolvimento e do estímulo ao mercado de capitais com o 19


Rafael Rodrigues

Painelistas debateram sobre a importância dos produtos discutidos no laboratório para impulsionar a participação das Instituições Financeiras de Desenvolvimento na agenda da sustentabilidade

envolvimento do Sistema Nacional de Fomento. Outro objetivo é ajudar o país a implementar os ODS, a agenda da Organização Nações Unidas (ONU) de 2030, e permitir que o Brasil desenvolva e alcance as metas com as quais se comprometeu no Acordo de Paris. “São objetivos importantes para o país e que representam uma excelente oportunidade para o mercado de capitais e para instituições financeiras atuarem no setor”, resumiu Vasco. O LABORATÓRIO Além dos trabalhos nos quatro grupos, foi realizada uma pesquisa abrangente sobre investidores e emissores e as alterações regulatórias necessárias. O Grupo de Finanças Verdes dividiu-se em três subgrupos e foram apresentados os produtos em desenvolvimento. “Esse é um grupo extremamente importante porque vai ajudar a infraestrutura brasileira a se modernizar. Cerca de 100 milhões de brasileiros não têm acesso a esgoto e 35 milhões não têm acesso a água tratada. Isso é um desafio enorme. O Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab) prevê, até 2030, cerca de R$ 300 bilhões de investimentos a uma média de R$ 20 bilhões por ano. Mas, nos últimos anos só temos investido R$ 11 bilhões, não apenas pela falta de recursos, mas também por alguns entraves”, alertou Vasco. O GT Instrumentos Financeiros de Impacto dedicou-se a estudar as formas que as Instituições Financeiras de Desenvolvimento poderiam atuar frente a três instrumentos específicos: Contrato de Impacto Social; Crowdfunding; e Fundos Rotativos Solidários. Além disso, um subgrupo de métricas 20

para avaliação do impacto social foi estruturado para estudar métodos de avaliação de impacto socioambiental e sugerir alternativas de implementação. O Grupo de Fintechs contou com três subgrupos. Um deles estuda a forma de se implementar no Brasil um Sandbox regulatório – serviço instituído pelo órgão regulador que permite às fintechs operar produtos ou serviços temporariamente sob certas regras e limites, proporcionando a estas companhias a possibilidade de testar produtos, serviços e soluções originais sob o olhar atento do supervisor. O GT está desenhando um documento que servirá de base para os reguladores que quiserem implementar, instituindo os parâmetros necessários. Outros subgrupos estudam as oportunidades e os desafios atuais do mercado e tratam das formas de cooperação que podem emergir entre as fintechs e o sistema financeiro tradicional. Maria Netto, especialista em Mercado Financeiro do BID, afirmou que, para o banco, a participação no LAB foi uma excelente oportunidade. Para ela, juntar reguladores, bancos públicos e de desenvolvimento, bancos privados e fintechs para buscar soluções conjuntas concretas foi o grande sucesso da iniciativa. “Um ponto forte foi não tentar desenvolver coisas grandiosas e sim as que podem ser implementadas a curto prazo. Em Títulos Verdes, sabemos que há muitas iniciativas no país, mas no LAB foi importante ter esse diálogo entre o público e o privado, o que pode facilitar a emissão de debêntures verdes”, ressaltou Maria Neto. Marco Antônio Lima, secretário-executivo da ABDE, observou que o Sistema Nacional de Fomento, grupo que reúne SETEMBRO | OUTUBRO 2018


as instituições financeiras de desenvolvimento brasileiras, em especial bancos de desenvolvimento, agências de fomento e bancos cooperativos, tem participado ativamente de todo o processo. Ele informou que esse trabalho se insere dentro da estratégia da direção da ABDE de mostrar que o sistema fomento é importante para o desenvolvimento no Brasil, a exemplo de outros países, como a Alemanha, o Japão e a Coreia. “Fortalecer o Sistema Nacional de Fomento é fundamental. O Brasil precisa desesperadamente crescer. Esse trabalho permitiu que conversássemos com outras instituições do governo, como o Ministério da Fazenda, e da iniciativa privada, como a Febraban. Foi uma grande experiência e acho que 2019 vai ser um ano melhor ainda”, prevê Lima.

RUMOS

Energia solar, que pode ser utilizada tanto em empresas quanto em residências Pixabay

FINANÇAS VERDES O primeiro painel do seminário, dedicado ao tema das Finanças Verdes, apresentou os quatro produtos desenvolvidos pelo grupo de trabalho que se reúne sobre essa questão: Energy Saving Insurance (ESI), Fundo de Eficiência Energética; Modelo de Análise de Risco em Projetos Fotovoltaicos; e Fundo de First Loss (primeiras perdas). O grupo se dividiu em subgrupos de garantias de seguros, veículos de investimentos e alternativas de funding. Responsável pela moderação do painel, o consultor Luiz Serrano contou que o grupo de trabalho já vinha fazendo avaliações da cadeia de energia solar fotovoltaica quando soube de um estudo da Febraban e resolveu então colaborar nesse estudo. Com base no entendimento da cadeia foram propostas alternativas de financiamento dos projetos. Identificou-se que para diferentes perfis de projetos tentava-se fazer uma alavancagem para financiá-los e não se conseguia porque os atributos dos projetos não eram levados em conta e sim os do empreendedor. Diante disso, a Febraban decidiu construir uma matriz de risco dos projetos como em Project Finance e não apenas de risco corporativo. A matriz leva em conta as garantias técnicas e financeiras que o projeto pode ofertar. “Junto com o LAB procuramos validar o conceito e de que forma a matriz poderia ser adotada pelos bancos. Fizemos entrevistas com nove bancos que demonstraram interesse. A avaliação é de que a ferramenta é viável para análise de risco de crédito das operações e há apenas necessidade de calibração da ferramenta de acordo com as políticas de cada instituição. Há uma tendência de se passar de uma análise de risco corporativa para análise de projeto”, diz Serrano. Paulo Miotto, também consultor do LAB, abordou o tema da eficiência energética e geração solar distribuída, apresentando o ESI, desenvolvido no âmbito do laboratório, cujos projetos pilotos estão a cargo do BRDE, Bandes e Goiás Fomento. Ele observou que há uma tendência no Brasil de limitar o tema à redução de custos, mas na sua opinião o motivador

deve ser a oportunidade de modernização de todo o parque industrial brasileiro. “O produto visa a trazer mais segurança e confiança ao investidor em projetos de eficiência energética e reequilibrar a percepção de riscos por meio de três elementos: contrato padrão de performance (se a performance não for boa, o cliente tende a ser protegido); seguro performance; e metodologias padronizadas de análise técnica de projetos por meio de uma entidade técnica como a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT)”, explicou Miotto. No modelo tradicional, a percepção de risco é maior porque quem toma crédito na substituição do equipamento é o cliente, que tem de confiar no funcionamento da solução. No modelo Esco (fornecedores de serviços de energia), que funciona bem no exterior, quem toma o crédito é o fornecedor que instala o equipamento e o cliente paga por performance. Mas este modelo tem alguns impeditivos no Brasil, como o fato de o fornecedor ter uma capacidade financeira limitada. Miotto explica que o programa Energy Saving Insurance busca reequilibrar a relação cliente-fornecedor. Quem vai tomar o crédito é o cliente, só que haverá um contrato de performance em que o fornecedor é o responsável. Se houver um problema de má performance, há um seguro para ressarcir o cliente pela diferença. O terceiro elemento é a entidade verificadora, no caso a ABNT, que desenvolveu uma metodologia em que avalia tecnicamente o projeto e o fornecedor. “Já existem seis projetos piloto em fase de aprovação junto às instituições financeiras”, comemora Miotto.

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Foi amplamente discutido na COP 21 que os fundos climáticos dos governos não serão suficientes para promover a transição necessária para uma economia de baixo carbono. Hoje o que já temos de recursos alocados é da ordem de bilhões de dólares, mas teria de ser da ordem de trilhões de dólares Ana Carolina Skio, CEBDS

O produto First Loss pode ser aplicado na constituição de uma carteira em Fundo de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC), com diferentes tipos de projetos e pacotes de riscos. Nesse FDIC poderiam se estabelecer diferentes categorias de cota, como as seniores, com previsibilidade de rentabilidade ajustada ao apetite dos participantes do fundo, e cotas com menor aversão ao risco. “Não é uma inovação disruptiva, mas cria uma alternativa para projetos que não têm acesso a fundos estruturados. Há possibilidade de aplicação em projetos pilotos de algumas instituições”, explicou Serrano. Rodrigo Sauaia, da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar), informou que a entidade representa profissionais, fornecedores de insumos, fabricantes de equipamentos, instaladores e instituições financeiras. Ele explicou que a energia solar é a fonte renovável com maior potencial do país, devendo ser responsável por 10% da matriz em 2030, segundo o governo, e 32% em 2040, segundo projeção da Bloomberg. “Nos próximos 20 anos, veremos uma revolução solar. Para que isso aconteça, precisamos de combustível financeiro, e o que vai fazer esse setor crescer são recursos, porque é intensivo em capital”, diz Sauaia. Ele explica que o segmento de geração distri22

buída é versátil: qualquer pessoa pode instalar um sistema fotovoltaico, assim como indústrias e governo. “Existem ainda desafios regulatórios. Uma forma de fazer a massificação dos projetos é a chamada geração compartilhada, que permite separar a atividade de geração da energia e do consumo, atendendo um ou mais consumidores”, diz Sauaia. Mário Sérgio Vasconcelos, diretor de assuntos institucionais da Febraban, destacou que o projeto de energia renovável começou há dois anos e meio com o objetivo de aumentar a participação do setor financeiro, que conhecia pouco sobre o tema, no financiamento a energias de baixo carbono. Os financiamentos eram sempre tentados pelas Escos, mas elas não conseguiam crédito para um segundo financiamento. “Percebemos que era preciso tornar os projetos atrativos para o consumidor. Mas o consumidor não confia, pois os projetos não são padronizados. Nesse aspecto a Absolar ajudou bastante para adquirirmos o entendimento do tema. Vimos que esse mercado inclui não apenas os consumidores mas também uma rede de farmácia ou um condomínio no modelo de energia compartilhada em projetos de até R$ 25 mil. Percebemos que podíamos dar um tratamento parecido com um Project Finance sem os seus custos”, diz Vasconcelos. Carlos Aparecido Ferreira, do Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica (Procel), destacou que o programa foi criado em 1985 pelo Ministério das Minas e Energia e executado e financiado pela Eletrobras. Em 2016, a Lei 13.280 deu sustentabilidade financeira ao Procel, determinando que 1% do faturamento das concessionárias seja aplicado em eficiência energética e P&D. Ele apresentou duas propostas do programa. A primeira é o diagnóstico de eficiência energética em 250 micro e pequenas indústrias. A segunda envolve projetos de eficiência energética e geração distribuída em outras 50 micro e pequenas indústrias. No âmbito do LAB, está sendo desenhada uma proposta de equalização de juros com recursos do Procel. TÍTULOS VERDES O Grupo de Trabalho Títulos Verdes discutiu o cenário atual e as tendências de mercado de títulos verdes brasileiros. Débora Masullo, da Sitawi, organização que trabalha no desenvolvimento de soluções financeiras para impacto social e na análise da performance socioambiental, apresentou os dados de uma pesquisa realizada em duas etapas. A primeira com 66 emissores e 48 investidores associados a instituições como CVM, B3, Febraban, Superintendência de Seguros Privados (Susep), Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (Abrap) e Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Ambima). A segunda entrevistou seis emissores e cinco investidores. “A pesquisa mostrou que apenas 27% dos respondentes SETEMBRO | OUTUBRO 2018


A meta da empresa é obter recursos para oito novos projetos a fim atender as concessões arrematadas em leilão. A opção por título verde se deve às características do projeto, pois os recursos serão destinados à transmissão de energias renováveis. “É mais um processo de emissão de dívida que não é simples, exige muito trabalho, muitos agentes e muita prestação de contas. O custo é irrisório. Nossa emissão foi a debênture de infraestrutura mais barata do mercado com captação de R$ 621 milhões. Há ainda a exposição positiva da marca, reconhecimento do emissor com causas verdes e sinalização aos investidores e agentes de mercado em geral de que a companhia segue padrões adequados”, destacou Silva. Ana Carolina Skio, do Conselho Empresarial para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), explicou que a instituição representa no Brasil a One Business Council, com mais de 60 conselhos espalhados em diversos países. A instituição tem o objetivo de movimentar os recursos necessários para atingir a meta de longo prazo de se conter o aquecimento global no limite aceitável de dois graus Celsius. “Foi amplamente discutido na COP 21 que os fundos climáticos dos governos não serão suficientes para promover a transição necessária para uma economia de baixo carbono. Hoje o que já temos de recursos alocados é da ordem de bilhões

Rafael Rodrigues

possuem conhecimento sobre o tema, e dos investidores, apenas 14%. Apesar de 57% dos investidores respondentes adotarem alguma prática, eles ainda não têm uma representação na carteira de títulos verdes. O que motiva os emissores pioneiros é que eles têm um forte drive de reputação. Os demais têm expectativa de preço. Parte dos investidores também estão dando ênfase à parte financeira”, esclareceu Débora. Ela destacou que o mais interessante é que todos os investidores estão dispostos a diminuir a taxa desde que haja comprovação do impacto ambiental do projeto. Os setores mais alinhados aos ODS, como energia e florestas, são os que mais atraem os investidores. “A maioria das empresas que pretendem emitir títulos verdes gostaria de fazer uma listagem em bolsa nacional. E essa é uma oportunidade para a B3”, ressaltou Débora. Thiago Lopes da Silva, da Companhia de Transmissão de Energia Elétrica Paulista (CTEEP), apresentou o case da 7ª emissão da empresa, a primeira de títulos verdes. A concessionária é uma das principais transmissoras abertas de energia do país e possui ações na B3 e ADRs [do inglês, American Depositary Receipt] na Bolsa de Nova Iorque. Atua em São Paulo, respondendo por 25% da transmissão nacional e 90% da energia consumida no estado. São 18,6 mil km de linhas, 126 subestações, 65,5 MW de capacidade e receitas de R$ 2,7 bilhões.

Os quatro grupos de trabalho que formam o LAB reúnem especialistas e executivos de 80 instituições, nacionais e internacionais.

RUMOS

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As soluções financeiras tecnológicas têm revolucionado o mercado e também estão no escopo de discussão do LAB.

O Brasil e a agenda da eficiência energética O Brasil tem experimentado mau desempenho em rankings internacionais de eficiência energética, apesar dos esforços que têm sido empreendidos, sobretudo, na etiquetagem de produtos. Uma série de distorções criadas pelo próprio mercado brasileiro tem impedido o país de avançar nessa agenda, afirmam pesquisadores do Climate Policy Initiative/Núcleo de Avaliação de Políticas Climáticas da PUC-Rio (CPI/NAPC). O relatório “Panorama e desafios da eficiência energética no Brasil”, realizado pelo CPI/NAPC e de autoria de Juliano Assunção e Amanda Schutze, examinou 106 setores da indústria extrativa e de transformação, entre os anos de 2003 e 2015, com base em duas variáveis: eficiência energética e eficiência produtiva. Os pesquisadores puderam constatar que a melhora do ambiente econômico observada para as empresas no período não se traduziu em aumento da eficiência para a indústria como um todo. Isso porque houve um crescimento da participação de firmas menos eficientes, tanto em termos energéticos quanto produtivos, o que anulou o efeito positivo sobre a indústria.

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Amanda conta que o CPI/NAPC começou a trabalhar com eficiência energética há um ano e culminou nesse relatório em que se tentou agregar uma visão econômica. A principal questão que os pesquisadores colocaram é qual a relação da eficiência energética com produtividade e investigaram se já havia algum trabalho que tivesse esse link. “Os dados que utilizamos para essa pesquisa são da Pesquisa Industrial Anual (PIA) do IBGE. Além de mostrar a situação de cada empresa, a PIA informa dados de quanto se gasta com eletricidade e capital. Entre os resultados que encontramos está o dado de que existe uma relação muito clara entre eficiência energética e produtividade na indústria brasileira. Isso é importante porque é possível pensar em várias políticas públicas que envolvam os dois temas”, diz Amanda. Ela acrescenta que durante o período observado pelo estudo, de 2003 a 2015, o indicador tanto de eficiência produtiva quanto de eficiência energética não mudou muito. Mas quando se usa a teoria econômica para separar o indicador em duas partes, descobre-se

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de dólares, mas teria de ser da ordem de trilhões de dólares”, alertou Ana Carolina. Orlando Lima, coordenador geral de sistemas da Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda, e Bruno Tuca, sócio do escritório Mattos Filho, abordaram as alterações regulatórias. Lima informou que a secretaria vem analisando junto à Parceira para o Investimento Produtivo (PPI) o potencial de alguns projetos de concessões emitirem títulos verdes. “Foram abertas três frentes de trabalho: financiamento à infraestrutura; desenvolvimento do mercado de seguros e previdência; e desenvolvimento do mercado de dívida”, informou Lima. Bruno Tuca destacou que uma das discussões no LAB foi como incentivar que os participantes de mercado tenham seus títulos classificados como verde. Uma ideia que surgiu foi dar um tratamento de prioridade semelhante aos projetos do PPI. Ele citou a alteração no Decreto 8.874, para que projetos de infraestrutura tenham prioridade na obtenção de suas portarias, especialmente na área de mobilidade urbana e energia renovável. Gustavo Pinheiro, do Instituto Clima e Sociedade (ICS), apresentou o Programa de Apoio à Estruturação de Avaliação de Títulos Verdes. Um dos objetivos é estimular as emissões

que, no período, há uma melhora na utilização dos recursos dentro das empresas, tanto em termos de eletricidade como de insumos em geral. Mas, apesar disso, aumentou a participação de mercado de empresas menos eficientes, tanto em termos energéticos quanto produtivos. “Por mais que as firmas consigam, em média, ter uma melhoria de eficiência, há condições nesse ambiente econômico que estão fazendo com que as firmas menos eficientes ganhem participação de mercado. Outro resultado que observamos é que a realocação desses insumos de produção entre as firmas menos eficientes pode gerar ganhos de produtividade muito altos. Para 2015 o percentual foi de 81%”, diz Amanda. Entre os 106 setores avaliados, os 11 com maior potencial de ganho de produtividade são os de metalurgia, abate e fabricação de produtos de carne, produto químico inorgânico, siderurgia, fabricação de produtos de material plástico, veículos automotores, cimento, extração de minério de ferro, fabricação de produtos orgânicos, tecelagem e fabricação de papel.

RUMOS

verdes de alta adicionalidade climática. Ele informou que já foram realizadas 14 emissões de títulos verdes: oito de empresas de energia eólica, quatro de papel e celulose, uma de alimentos e uma de transmissão de energia. O projeto resultou em uma publicação sobre ativos e projetos elegíveis, apresentada no evento. INVESTIMENTOS DE IMPACTO E FINTECHS A apresentação dos resultados do GT de Instrumentos Financeiros e Investimentos de Impacto foi realizada por Felipe Vignoli, que apresentou um panorama sobre os trabalhos do grupo e sobre o estudo de métricas, e metodologias de avaliação de impacto. “Investimentos de impacto, além da rentabilidade, preveem um impacto social ou ambiental. O GT contou com quatro subgrupos: estudo de métricas, crowdfunding, fundos rotativos solidários e aprendizados sobre o Contrato de Impacto Social (CIS). No caso do CIS vimos a experiência de São Paulo (educação) e Ceará (saúde), mas chegamos à conclusão que era o momento de reavaliar”, resumiu Vignoli. Cláudio Maes, coordenador de Educação Financeira da CVM, disse que a conclusão é de que neste momento ainda

“A maior parte dos gastos com eletricidade está nesses 11 setores. Isso pode estar relacionado a vários tipos de políticas equivocadas como subsídio e isenção fiscal, diferenças de acesso a crédito. Mas como fizemos um estudo com base em evidência empírica, não nos aprofundamos em nenhum segmento para identificar os melhores equipamentos. Estudamos o Brasil de forma geral e analisamos quais setores melhoraram. O próximo passo é aprofundar o estudo, naturalmente para os 106 setores e nos que apresentaram resultados mais diferentes”, sinaliza Amanda. Entre as barreiras que têm impedido o país de avançar rumo ao uso racional de eletricidade pela indústria estão: a falta de planejamento de longo prazo, a concentração de mercado, os custos elevados, além da multiplicidade de órgãos reguladores. Segundo os pesquisadores, políticas para encorajar o crescimento econômico baseadas no investimento em eficiência energética, como novos modelos de negócio, inovações tecnológicas e medidas de economia de energia podem se revelar eficazes no aumento da competitividade da produção brasileira.

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Poderíamos ter montado uma comissão da CVM e feito a regulação sandbox. Mas depois vimos que tínhamos de levar o assunto para o LAB. Um sandbox da CVM seria bom, mas não tão relevante quanto uma legislação que conseguisse congregar os demais reguladores brasileiros. É esse esforço que estamos fazendo. Antonio Berwanger, CVM não há a plataforma operacional legal para rodar essa solução de CIS no mercado. “As experiências de São Paulo e do Ceará foram estruturadas com base na Lei 8.666. É possível, mas não é o ideal, seria mais viável via Parceria Público-Privada”, justificou Maes. Rachel Andrade, da Marins Bertoldi, discorreu sobre o tema de crowdfunding como uma opção de investimento para instituições de fomento. Willian Saab, do BNDES, abordou os fundos rotativos solidários. E Beto Scretas, da Aliança pelos Investimentos e Negócios de impacto, e Fernanda Camargo, da Wright Capital, abordaram o potencial dos investimentos de impacto. O último painel do evento debateu o mercado das fintechs e a implementação de um sandbox regulatório no Brasil. Bernardo Kuel, consultor do laboratório, destacou os avanços do grupo de trabalho, formado apenas em janeiro. O GT Fintech tem três subgrupos – regulação, fomento ao ecossistema e instituições financeiras públicas e privadas – e busca identificar como as inovações financeiras aplicadas ao setor financeiro podem ser utilizadas e como os reguladores devem melhor lidar com essas inovações. “Apresentamos algumas diretrizes para o sandbox. E surgiu a oportunidade de desenvolvimento de dois projetos: um código de boas práticas para o setor; e identificar os principais gargalos para o desenvolvimento das fintechs. Também estamos criando um modelo colaborativo de contratação para o sistema de fomento poder utilizar as fintechs ou fechar parcerias”, resumiu Kruel. A consultora Sonia Colazar apresentou o cenário atual das fintechs na América Latina. Ela diz que uma característica comum a todos os países da região é que existe um gap de crédito para as 45 milhões de micro, pequenas e médias empresas da região. De acordo com o portal Finnovista, existem 703 fintechs na América Latina, das quais 32,7% estão no Brasil, 25,6% no México, 11,9% na Colômbia, 10,2% na Argentina, 9,2% no Chile, e 10,4 nos demais países. “Não são necessariamente startups, 26

são empresas há mais de cinco anos no mercado com 11 a 50 funcionários”, informou a consultora do BID. Antonio Berwanger, superintendente de desenvolvimento de mercado da CVM, afirmou que há na autarquia uma visão positiva das fintechs como instrumentos de inclusão financeira e democratização de serviços financeiros. Após a criação de um hub fintech e a regulação do crowdfunding, ficou claro que seria necessário dar um passo adicional, que seria a regulação sandbox. “Já havia o exemplo de sucesso do Reino Unido. Temos competência regulatória, poderíamos ter montado uma comissão da CVM e feito a regulação sandbox. Mas depois vimos que tínhamos de levar o assunto para o LAB. Um sandbox da CVM seria bom, mas não tão relevante quanto uma legislação que conseguisse congregar os demais reguladores brasileiros como o Banco Central, a Previc, a Susep. É esse esforço que estamos fazendo”, esclareceu Berwanger. Ele explicou que há duas formas de implementar o sandbox: selecionar uma empresa para operar ou autorizar toda uma atividade, ambos com tecnologia nova ou serviço inovador. No Brasil, uma das alternativas em análise é um processo seletivo para escolher as empresas que estão mais preparadas. As salvaguardas serão analisadas caso a caso. O monitoramento será um aprendizado mútuo. A saída do sandbox poderá ser de seis meses a um ano, prorrogável por mais um. “Ao final desse período, a opção ideal é a fintech crescer e se estabelecer num regime já existente ou adaptá-la, se for necessário algum ajuste regulatório. A que não se adequou, não deu certo, ou não há ajuste a ser feito, precisamos ter algum tipo de medida pré-programada para ela sair do mercado e reembolsar algum recurso de clientes. Temos de ter um plano de saída”, resumiu Berwanger. Bruno Diniz, representante do comitê de fintechs da Associação Brasileira de Startups (ABStartup), descreveu como vem sendo desenvolvido o manual de boas práticas para as organizações. Ele informou dados mais atualizados da América Latina em que o Brasil tem 404 fintechs, seguido pelo México com 334, Argentina, 110, e Colômbia, 200. Diniz também informou sobre a criação da Aliança Ibero-América de Fintechs, no ano passado. “É o maior agrupamento sobre o tema do mundo, com 13 associações ligadas ao segmento de fintechs. O objetivo é trocar boas práticas e informações. A Aliança já publicou o Livro Branco sobre Equity Crowdfunding, O livro Branco do Sandbox e um Decálogo de Boas Práticas de Fintechs”, anunciou. A expectativa, ressaltada ao fim do seminário, é que a coordenação e o diálogo que marcaram o primeiro ano do laboratório, por meio de uma cooperação público-privada, ajudem a acelerar os resultados alcançados já alcançados. Assim, no próximo ano, ao completar seu segundo aniversário, o laboratório poderá celebrar a adoção de ações concretas para impulsionar o desenvolvimento sustentável do país. SETEMBRO | OUTUBRO 2018


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RESÍDUOS E RECICLAGEM


Júlio Serra/BNB

REPORTAGEM

Mar de oportunidades Seminário promovido pela ABDE em Fortaleza debate os desafios e as potencialidades da região Nordeste, especialmente em áreas como turismo e energia renovável. POR JADER MORAES

A quinta edição do Ciclo de Seminários Regionais, promovido pela Associação Brasileira de Desenvolvimento (ABDE), em todas as regiões brasileiras, debateu o desenvolvimento sustentável do Nordeste. Realizado com o apoio do Banco do Nordeste (BNB), na sede da instituição, em Fortaleza, no dia 31 de agosto, o encontro reuniu uma dezena de especialistas e gestores públicos e privados para discutir as oportunidades de crescimento econômico para a segunda região mais populosa do país, especialmente em áreas onde ela possui potencial de se destacar, como a energia renovável, a agricultura sustentável, o turismo e o empreendedorismo. Participaram do encontro, entre outras autoridades, os presidentes da ABDE, Marco Crocco, e do BNB, Romildo Rolim. Marco Crocco, que também preside o Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG) e é pesquisador especialista em desenvolvimento regional, afirmou em sua palestra que o sistema financeiro não é neutro, mas, ao contrário, age no sen28

tido de concentrar renda e investimento nas regiões mais desenvolvidas. Ele destacou o papel das instituições financeiras de desenvolvimento, componentes do Sistema Nacional de Fomento (SNF), que agem no sentido contrário, ao desconcentrar o crédito. “O SNF tem outra lógica, que não é a privada, que reproduz ou mesmo amplia as desigualdades regionais. Acreditamos que é impossível pensar em um modelo de desenvolvimento para o Brasil que não atue para reduzir as imensas disparidades existentes entre as regiões. Desenvolvimento regional não é um problema apenas das regiões menos desenvolvidas, mas sim uma questão que precisa ser pensada e enfrentada por todo o país”, defendeu. O professor Sergio Duarte de Castro, da Universidade Católica de Goiás, também frisou a responsabilidade nacional para solucionar as desigualdades regionais. Ele lembrou que o processo de industrialização do país, a partir da década de 1930, concen-

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trou o progresso econômico em apenas algumas regiões, com quase 80% dos projetos executados no Sudeste, sendo 60% em São Paulo. O II Plano Nacional de Desenvolvimento (PND), na década de 1970, foi o primeiro momento de inflexão nessa tendência, com um processo de desconcentração econômica que dirigiu investimentos para regiões até então desfavorecidas. Para o professor, o mundo passa por um novo momento, em que há uma janela de oportunidades aberta, especialmente em relação às mudanças climáticas e de hábitos da população. Essas oportunidades estão alinhadas a alguns ativos que o Brasil possui, especialmente o Nordeste, que contém vantagens regionais que permitem que a região se insira de modo especial nessa nova revolução industrial e econômica. Entre os segmentos destacados está o turismo, setor mais dinâmico do mundo hoje, com mais de 180 milhões de empregos gerados, e que cresce cerca de 30% ao ano desde 2010. “O Brasil está abaixo de seu potencial, mas ainda assim o setor cresceu mais de 10% no segundo semestre de 2017 no país. É um setor que está se transformando, precisando de soluções inovadoras e desenvolvimento tecnológico. Não basta apenas investir em hotéis, aeroportos e restaurantes, como antes, pois hoje as pessoas viajam e se hospedam amparados por aplicativos, por exemplo. Precisamos investir em tecnologia”, explicou. ENERGIA Castro também lembrou das mudanças no agronegócio, com valorização de produtos orgânicos e de sistemas de produção artesanal, que demandam tecnologia para a redução das perdas no campo, melhor aproveito de resíduos industriais, eliminação do contaminantes etc.; e daquela que talvez seja a principal vantagem estratégica da região: o potencial para geração de energia renovável. O conselheiro da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar), Marcio Trannin, destacou que no Nordeste a geração de energia solar e eólica já é uma realidade e, especialmente no caso da captação do vento, este pode ser um grande diferencial da região. Para ele, o principal desafio hoje é regulatório, pois o marco do setor necessita de modernização. “A energia solar pode ser captada em muitos lugares, mas na eólica o Nordeste tem um potencial único, que pode inclusive auxiliar a superar a desigualdade histórica que a região em relação a outras localidades. É essa a hora de mudar essa realidade”, frisou. O consultor da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec), Jurandir Picanço, concordou com a avaliação de que as questões regulatórias são um entrave para que o setor se desenvolva de forma mais potente na região. Ele avaliou que existe um movimento mundial de transformação das matrizes poluentes em renováveis, em que o Brasil pode ser o grande líder, mas que, por inércia, o país tem se mantido preso a outros modelos. “O Nordeste possui um grande potencial eólico, mas precisamos mudar a forma de contratação e de precificação, entre

RUMOS

outras questões. Com as dificuldades internas de hoje, estamos vendo outros países, que não possuem o recursos naturais que temos, se aproveitando melhor deste movimento. Temos que estar atentos e sermos ágeis para maximizarmos o uso da energia renovável”, alertou. O painel contou ainda com a participação do secretário-adjunto de Planejamento e Desenvolvimento Energético do Ministério de Minas e Energia, Moacir Bertol, que fez um histórico de leilões já realizados nesta área e destacou a prioridade do órgão para as energias renováveis. “É inescapável”, afirmou. No debate específico sobre a força do empreendedorismo para a economia local, o Sebrae e o Banco do Nordeste apresentaram dados que demonstram a importância dos pequenos negócios para dinamizar a região. Segundo o analista do Sebrae Nacional e doutor em economia, Giovanni Beviláqua, as micro e pequenas empresas são responsáveis por 25% do Produto Interno Bruto (PIB) nordestino. Ele criticou a baixa disponibilidade e concessão de crédito paras as empresas. O superintendente de Negócios de Varejo do Banco do Nordeste, Luiz Sergio Farias Machado, afirmou que é preciso que as diferentes políticas para o setor estejam em diálogo e reafirmou que o acesso ao crédito é de fato um problema para o segmento, pois de um lado existe a dificuldade de as empresas oferecerem garantia, e de outro, estão os juros altos cobrados pelas instituições financeiras. A QUESTÃO DA ÁGUA Um dos temas mais sensíveis para a região, que também foi debatido no seminário, diz respeito à água. Alceu de Castro, doutor em saúde pública e analista de regulação da Agência Reguladora do Estado do Ceará (Arce), apresentou dados que demonstram o fosso entre o Nordeste e o restante do país em questões como abastecimento, qualidade da água e tratamento de esgoto. “Todos os indicadores são piores”, demonstrou. As crises hídricas derivadas das mudanças climáticas são um grande desafio, mas ele apontou outras quatro questões que devem ser enfrentadas para alterar esse quadro: os problemas fundiários, o saneamento rural, o financiamento, uma vez que há esgotamento de fontes da iniciativa privada e escassez de novos investimentos, e o marco regulatório setorial. “É preciso fazer valer instrumentos como o Plano Municipal de Saneamento Básico e capacitar os municípios e também os cidadãos, para que tenhamos controle social nesta área”, observou. Um dos maiores especialistas no tema, o professor Hypérides Pereira de Macedo, mestre em hidráulica e recursos hídricos, destacou a base física heterogênea do Nordeste, com diferentes tipos de solos em cada estado, ao contrário de outras regiões brasileiras, que possuem áreas mais uniformes. Ele sugeriu que seja realizada uma “reforma aguária”, que leve em conta as condições hidrológicas de cada local. “O melhor hospital de uma cidade é uma adutora de água tratada”, garantiu.

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ARTIGO

A relevância da regulação financeira

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de situações de instabilidade financeira associadas a fatores internos e externos; (ii) contribuir para a administração dos preços-chave, que, além de estáveis devem se manter em patamares favoráveis ao processo de acumulação de capital produtivo (ou seja, taxa de câmbio competitiva e taxa de juros básica baixa); (iii) estimular o desenvolvimento de mecanismos de financiamento domésticos que viabilizem esse processo. Assim, a regulação financeira não é relevante somente para evitar riscos sistêmicos. Ela constituiu um instrumento auxiliar das políticas cambial, monetária e financeira, contribuindo para estimular a acumulação de capital produtivo e garantir autonomia da política econômica das economias emergentes no sentido de priorizar a retomada do crescimento. Essa retomada, por sua vez, é pré-condição para que o equacionamento da situação fiscal seja alcançado sem que se abra mão dos três objetivos da política econômica na perspectiva aqui adotada: crescimento com geração de emprego e equidade social, estabilidade macroeconômica e financeira, o que requer, no caso da economia brasileira, a sustentabilidade das contas externas.

DANIELA MAGALHÃES PRATES Divulgação

Nos últimos meses, o debate econômico se concentrou, como esperado, na discussão das propostas dos candidatos à presidência, com destaque para questões associadas à situação fiscal, como as reformas da previdência e tributária e o teto de gastos imposto pela Emenda Constitucional 95. Um tema essencial para se pensar as perspectivas da economia brasileira tem sido ignorado, a regulação financeira. Na perspectiva keynesiana aqui adotada, o papel do Estado nas economias capitalistas vai além da política econômica. O Estado também deve regular o ambiente no qual os agentes privados tomam suas decisões de alocação da riqueza para garantir seu direcionamento para a acumulação de capital na esfera da produção. Além disso, como as posições ativas devem ser financiadas, a decisão de investir (adquirir ativos produtivos) sempre vem acompanhada por uma decisão sobre a estrutura do passivo (forma de financiamento). Assim, o Estado deve regular tanto o lado do ativo como do passivo das decisões de alocação de portfólio dos agentes. Contudo, no caso de economias emergentes, como a brasileira, que não emitem moedas aceitas internacionalmente e são vulneráveis aos ciclos de boom-bust de fluxos de capitais característicos da globalização financeira, os desafios enfrentados pela regulação financeira são maiores do que nos países avançados. Nessas economias, a regulação financeira deve envolver um amplo conjunto de instrumentos que incida sobre as decisões de portfólio (do lado do ativo e do passivo) de agentes residentes e não-residentes, financeiros e não-financeiros, nos mercados interno e externo e nos segmentos à vista e de derivativos (liquidação diferida). Isso quer dizer que o arcabouço dessa regulação deve incluir não somente a regulação financeira prudencial que incide sobre as operações das instituições financeiras residentes, mas também a regulação dos fluxos de capitais e dos derivativos cambiais. Exatamente em função da especificidade da nossa inserção internacional, essa última regulação é necessária para evitar o crescimento de posições de não-residentes em ativos negociados no mercado financeiro brasileiro (como ações, títulos públicos e contratos futuros de dólar), bem como o endividamento de agentes residentes não-financeiros no mercado financeiro internacional. Esse arcabouço é fundamental para: (i) evitar a emergência

Professora associada do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas e diretora da Associação Keynesiana Brasileira (AKB). SETEMBRO | OUTUBRO 2018


ARTIGO

Relatório de sustentabilidade como ferramenta de gestão

RUMOS

o objetivo de levantar os temas e indicadores mais relevantes a serem reportados, a partir dos quais foi elaborada a Matriz de Materialidade. Os assuntos de maior relevância foram relatados nas temáticas: econômica (resultados financeiros e desenvolvimento regional); ambiental (ciência e tecnologia para a sustentabilidade, gerenciamento do risco socioambiental no crédito); e social (diversidade e qualidade de vida). Dessa forma, o Banco da Amazônia adota o relatório como um instrumento de gestão que auxilia a instituição a conhecer melhor suas fragilidades e seus pontos fortes relacionados à responsabilidade socioambiental. Seu processo de elaboração tem como produto uma visão clara em relação aos principais fatores para a sustentabilidade da organização, viabilizando, quando necessário, a realização de ajustes que impactem nos indicadores relatados. Portanto, é uma oportunidade para melhorar a competitividade, posicionamento de mercado, entre outros fatores, aumentando a importância da publicação do relatório de sustentabilidade.

Divulgação

KARLA SILVA Graduada em Medicina Veterinária pela Universidade Federal Rural da Amazônia, analista da Coordenadoria de Sustentabilidade, Meio Ambiente e Estudos Econômicos do Banco da Amazônia.

JOSIMARA ALMEIDA

Divulgação

A necessidade de ser transparente e comunicar suas ações, não apenas no aspecto econômico-financeiro, mas também social e ambiental, é uma das principais motivações para que, a cada dia, mais empresas foquem no relatório de sustentabilidade como instrumento de comunicação. Assim, os relatórios de sustentabilidade podem ser considerados meios de prestação de contas para o público, de maneira geral, e, em particular, para os stakeholders da organização, ao mesmo tempo que se constituem fonte de informações que contribuem para avaliar a empresa no mercado, em comparação com seus pares. Ademais, no ambiente globalizado e com preocupações ambientais crescentes, mostrar o que está sendo feito, sua gestão e operação de maneira transparente e honesta denota a responsabilidade da empresa para com a sustentabilidade. Ciente dessa importância, o Banco da Amazônia, desde 2006, publica seus relatos de sustentabilidade, num processo de aperfeiçoamento contínuo. Assim, a partir de 2009, foi adotado o padrão da Global Reporting Initiative (GRI) na elaboração do relatório, por ser amplamente reconhecido em nível nacional e internacional, e recomendado pela Federação Brasileira de Bancos (Febraban) aos seus associados. Desde 2014, os relatórios de sustentabilidade do banco passaram a ter asseguração externa, garantindo-lhe maior credibilidade quanto às informações prestadas. Nesse processo de evolução e busca pela qualidade, não apenas o formato do relatório passou por aperfeiçoamento, mas também a elaboração do relato ajudou a exibir como a própria atuação do banco evoluiu no tratamento das questões socioambientais, bem como permitiu a identificação dos pontos que ainda precisam melhorar. Além disso, o Relatório de Sustentabilidade também é a principal forma de comunicação da Política de Responsabilidade Socioambiental do Banco da Amazônia, em atendimento à Resolução nº 4.327/2014, do Conselho Monetário Nacional. O mais recente Relatório de Sustentabilidade, de 2017, apresentou informações ambientais, sociais e econômico-financeiras que abrangem todas as unidades do banco, na nova versão GRI Standards, opção “Essencial”. Seu conteúdo foi definido por meio de consulta aos principais stakeholders com

Formada em Economia pela Universidade Federal do Pará, mestre em Planejamento do Desenvolvimento, pelo Núcleo de Altos Estudos Amazônicos e coordenadora de Sustentabilidade, Meio Ambiente e Estudos Econômicos do Banco da Amazônia. 31


LIVROS

Desenvolvimentismo renovado Aos 84 anos de idade, Luiz Carlos Bresser-Pereira tem razões de sobra para ser reconhecido como influente homem público e intelectual desenvolvimentista, com vasta atuação acadêmica e política, sobretudo no campo da economia. Ministro em mais de uma oportunidade, ocupou a pasta da Fazenda em 1987, quando preparou o terreno para o Plano Brady, e o ministério da Administração e Reforma do Estado durante o primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso, sendo responsável pela reforma gerencial da Administração Federal. Além disso, o papel que desempenhou como executivo e conselheiro de grandes empresas da iniciativa privada é característica pouco conhecida de sua trajetória abrangente e enriquecedora. Como homem público engajado na vida política brasileira, Bresser sempre levantou questionamentos intelectuais a partir de suas experiências no governo. E o inverso também é verdade: muitas de suas inquietações intelectuais ajudaram na elaboração de planos e propostas para o país. Desde o debate sobre a “inflação inercial”, na década de 1980, até os trabalhos sobre a reforma do Estado, durante a década de 1990, suas contribuições são indissociáveis dos principais dilemas enfrentados pela economia brasileira. Mesmo nos anos recentes, em que esteve afastado do governo, Bresser se manteve como figura de destaque na vida pública nacional, participando ativamente de debates no campo das lideranças progressistas e dos economistas heterodoxos. As contribuições são muitas e variadas, mas convergem para o questionamento que parece organizar o essencial, no “estado da arte” de sua reflexão: quais as razões para a semiestagnação da economia brasileira desde a década de 1980? A pergunta recupera preocupação recorrente com o tema do desenvolvimento industrial, óbice decisivo na reversão do processo de “alcançamento” do padrão de vida dos países ricos. O termo é, inclusive, proposta do próprio Bresser para abrasileirar a ideia de “catching-up”. 32

Um aspecto caro aos principais autores do que chama de desenvolvimentismo clássico, mas enfrentado por Bresser a partir de visão renovada, que identifica o cerne do problema no desequilíbrio entre os “cinco preços” – juros, câmbio, salários, inflação e lucro – e propõe a elaboração de um modelo analítico macroeconômico capaz de descrever teoricamente o funcionamento da economia brasileira. O reconhecimento da necessidade de um marco teórico macroeconômico orientador para as discussões sobre o processo de desenvolvimento no Brasil é um dos muitos méritos de Bresser. Lançada em 2007, a ideia de uma “macroeconomia da estagnação” propõe o diagnóstico de que o crescimento medíocre da economia brasileira no ciclo recente se explicaria pela combinação perversa entre taxas de juros elevadas e câmbio sobreapreciado no longo prazo, o que tornaria a indústria nacional menos competitiva e desestimularia seus investimentos. A centralidade do setor industrial para o desenvolvimento é, afinal, um dos aspectos recuperados dos autores clássicos. Nos últimos dez anos, o modelo originalmente proposto por Bresser tem evoluído rumo a uma “macroeconomia do desenvolvimento”, a partir da colaboração com amplo conjunto de economistas heterodoxos que têm se denominado novo-desenvolvimentistas. Em termos de política econômica, o modelo que têm elaborado recomenda aos formuladores a adoção de três princípios fundamentais: i. rejeitar a política de crescimento com endividamento externo; ii. rejeitar a utilização da taxa de câmbio como âncora para controle inflacionário; e iii. controlar a entrada de capitais. Onde estão as principais resistências às proposições teóricas de Bresser? Espera-se que uma desvalorização cambial reduza, no curto prazo, a remuneração dos capitalistas rentistas e o salário dos trabalhadores. É neste ponto específico que se iniciam as divergências com dois outros grupos importantes: os economistas liberais e os social-desenvolvimentistas. Na contenda com os liberais, a crítica principal de Bresser se dirige ao rentismo, alimentado pelas altas taxas de juros, e ao que chama de “populismo cambial”, decorrência dos efeitos da sobrevalorização do real no consumo das elites e da classe média. Com os liberais, parece haver convergência no que diz respeito ao ajuste fiscal, também defendido pelos novo-desenvolvimentistas, ainda que Bresser faça significativo esforço para diferenciar políticas de ajuste favoráveis ao desenvolvimento de medidas neoliberais de austeridade, que amarrariam os investimentos públicos necessários para o processo de “alcançamento” dos países ricos. Se a preocupação com o rentismo é comum a ambos os desenvolviSETEMBRO | OUTUBRO 2018


RUMOS

Noel Joaquim Faiad

Em busca do desenvolvimento perdido Luiz Carlos Bresser-Pereira FGV Editora, 2018, 168 p.

Noel Joaquim Faiad

mentistas, o impacto das medidas propostas pelo novo-desenvolvimentismo sobre a renda dos trabalhadores é objeto de grandes divergências. Bresser considera injustificadas as críticas que recebe no campo heterodoxo: reconhecendo que uma depreciação cambial causaria queda no valor real dos salários, no curto prazo, argumenta que este efeito negativo inicial seria mais do que compensado pelo aumento no nível de emprego e na produtividade, com correspondente recuperação do poder aquisitivo dos trabalhadores, “um pouco mais adiante”. Quanto tempo significa “um pouco mais adiante” parece ser a questão central na economia política desta divergência. A persistente desigualdade, marca estruturante da sociedade brasileira, como observa o próprio Bresser, não deixa de justificar a apreensão de seus críticos. Como garantir que o processo de desenvolvimento beneficie a todos, num país onde os ganhos foram historicamente apropriados de modo desigual? É precisamente neste ponto que Em busca do desenvolvimento perdido se coloca como leitura obrigatória. A resposta de Bresser aos questionamentos dos social-desenvolvimentistas não está exclusivamente em seu modelo macroeconômico, mas em sua instigante reflexão em outros campos. Bresser insiste, acertadamente, na necessidade de que economistas heterodoxos avancem na construção de modelos teóricos que deem sustentação a seus argumentos e tem, de fato, colaborado muito neste sentido. No entanto, este seu último livro destaca um importante aspecto da teoria que propõe: a íntima conexão com uma visão histórica da economia política do processo de desenvolvimento brasileiro, associada à intuição de um homem público que compreende a dinâmica dos interesses em jogo. Na melhor tradição dos economistas do desenvolvimentismo clássico, Bresser fundamenta muitos de seus mais incisivos argumentos numa visão consolidada da história do capitalismo e das particularidades de sua manifestação no Brasil. Uma leitura crítica ao projeto liberal da década de 1990, que não permitiu um crescimento sustentável da economia, apesar de ter controlado a inflação. Como diz em livro anterior, o Brasil é “uma nação que rejeita o Estado liberal, mas não logrou ainda reconstruir e renovar o Estado desenvolvimentista”. Aos 84 anos de idade, Bresser mira os jovens e olha para o futuro, sem se esquecer de suas tradições intelectuais e das lições do passado. “São os jovens que se mostram mais interessados e capazes de inovar”, diz a certa altura. Seguramente, desenvolvimentistas de todas as idades aprendemos com o jovem Bresser que é preciso rejuvenescer uma velha ideia dos clássicos: a construção de um projeto nacional, em torno do qual seja possível articular uma coalizão de classes favorável ao desenvolvimento.

MARCO ANTONIO A. DE ARAUJO LIMA Engenheiro Civil pela PUC-Rio, com mestrado em Ciências Sociais pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. Ocupou diversos cargos executivos no BNDES. É Secretário-Executivo da ABDE.

ANDREJ SLIVNIK Economista, formado pela Universidade de Campinas (Unicamp), e mestre em História pela mesma instituição. Atua como técnico da Gerência de Estudos Econômicos da ABDE.

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EXPEDIENTE

Sede: SCN – Qd. 2 - Lote D, Torre A Salas 431 a 434 Centro Empresarial Liberty Mall - Brasília - DF - CEP 70712-903 Telefone: (61) 2109.6500 E-mail: abde@abde.org.br Escritório: Avenida Nilo Peçanha, 50 – 11º andar Grupo 1109 - Rio de Janeiro - RJ - CEP 20020-906 Telefone: (21) 2109.6000 E-mail: gecom@abde.org.br CONSELHO DOS ASSOCIADOS Presidente: Dyogo Oliveira DIRETORIA Presidente: Marco Aurélio Crocco Afonso 1º Vice-Presidente: Perpétuo do Socorro Cajazeiras 2a Vice-Presidente: Jeanette Halmenschlager Lontra Diretores: Antônio Gil Padilha B. Silveira, Aroldo Natal Silva Filho, João Pinto Rabelo Júnior, Luiz Corrêa Noronha, Valdecir Tose e Weberson Reis Pessoa. Secretário-Executivo: Marco Antonio A. de Araujo Lima

INSTITUIÇÕES ASSOCIADAS À ABDE

AFAP – Agência de Fomento do Estado do Amapá S.A. AFEAM – Agência de Fomento do Estado do Amazonas S.A. AGEFEPE – Agência de Fomento do Estado de Pernambuco AGÊNCIA DE FOMENTO DO ESTADO DE TOCANTINS AGERIO – Agência Estadual de Fomento AGN – Agência de Fomento do Rio Grande do Norte S.A. BADESC – Agência de Fomento do Estado de Santa Catarina S.A. BADESUL – Badesul Desenvolvimento S.A. – Agência de Fomento BANCO DA AMAZÔNIA – Banco da Amazônia S.A. BANCO SICREDI – Banco Cooperativo Sicredi S.A. BANCOOB – Banco Cooperativo do Brasil S.A. BANDES – Banco de Desenvolvimento do Espírito Santo S.A. BANPARÁ – Banco do Estado do Pará S.A. BB – Banco do Brasil S.A. BDMG – Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais S.A. BNB – Banco do Nordeste S.A. BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social BRDE – Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul BRB – Banco de Brasília CAIXA – Caixa Econômica Federal CRESOL - Cresol Confederação DESENBAHIA – Agência de Fomento do Estado da Bahia S.A. DESENVOLVE – Agência de Fomento de Alagoas S.A. DESENVOLVE MT – Agência de Fomento do Estado de Mato Grosso S.A. DESENVOLVE RR – Agência de Desenvolvimento de Roraima S.A. DESENVOLVE SP – Agência de Desenvolvimento Paulista FINEP – Inovação e Pesquisa FOMENTO PARANÁ – Agência de Fomento do Paraná S.A. GOIÁSFOMENTO – Agência de Fomento de Goiás S.A. PIAUÍ FOMENTO – Agência de Fomento e Desenvolvimento do Estado do Piauí S.A. SEBRAE – Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas

Redação e Administração Avenida Nilo Peçanha, 50, 11º andar Grupo 1109 Rio de Janeiro RJ CEP: 20020-906 Telefone: (21) 2109.6041 E-mail: rumos@abde.org.br

Gerente de Comunicação & Editora Thais Sena Schettino Equipe Jader Moraes, Livia Marques Pimentel, Noel Joaquim Faiad, Joyce Ponteiro (estagiária)

Revisão Mariana e Renato R. Carvalho

Distribuição Powerlog Serviços e Manipulação

Capa Pixabay/Noel Joaquim Faiad

Publicação bimestral ISSN 1415-4722

Impressão e CTP J. Sholna Reproduções Gráficas

Ano 41 - nº 301 - Setembro/Outubro 2018 Tiragem: 5.000 exemplares

As matérias assinadas são de responsabilidade de seus autores, não refletindo, necessariamente, a opinião da ABDE. Sua reprodução é livre em qualquer outro veículo de comunicação, desde que citada a fonte.

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SETEMBRO | OUTUBRO 2018


A ABDE nasceu para fazer ecoar o ideal dos agentes que representa. Unir esforços, conhecimentos e recursos. Potencializar o desenvolvimento de um país com dimensões continentais. Agora, tem novos desa�os� a partir www.abde.org.br de uma nova visão estratégica, se prepara para se tornar mais forte. Conciliando diferentes facebook.com/abdeoficial saberes, realidades e twitter.com/abde_oficial experiências. linkedin.com/company/abde



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