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MEMÓRIAS DE TERESINA E SEUS REFLEXOS HOJE
Yara Lays & Juliene Santos
Teresina é terra de muitas histórias, encantos e surpresas. E como não se surpreender com a beleza oculta do centro de nossa capital do sol?
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Casarões imensos, mas abandonados. O passado e o presente estão de mãos dadas, mas ainda não percebemos (ou sabemos) as histórias que existem em cada parede, rua e fotos.
Alguns anos atrás, aprendendo a história da minha família, conheci a seguinte frase: “Descobrimos algo sobre nós mesmos quando aprendemos sobre nossos antepassados.” (Thomas Spencer Monson)
Enquanto abria pesados envelopes carregados de fotos, em sua maioria tamanho 10x15, em uma sala superior do Arquivo Público do Piauí, nós conhecemos a Teresina das décadas de 70, 80 e 90. Conhecemos um pouco mais da amada terra do sol, que embora não seja minha terra natal, a reconheço como meu lugar. Foi como se eu já tivesse encontrado aquelas pessoas, passado por aquelas praças e ruas. Foi como se eu conhecesse um pouco mais de mim. Um pouco de cada teresinense.
Ao conhecer as histórias através das imagens, viajamos fundo na memória do que já foi um momento, uma vivência, uma experiência em cada lar que hoje tornou-se desconhecido. Um lar de momentos diversos, abrigo de vivências únicas.
A memória esquecida. Confuso, afinal, como algo que lembramos pode ser ao mesmo tempo esquecido? É isso que se tornou viver de Teresina, o que tem sido viver de momentos, logo serão trazidos à tona apenas como memórias, mas esquecidos das experiências nos dias atuais.
Durante uma aula de campo no início de setembro, vimos de perto o abandono e descaso que nós, como população teresinense, temos em relação à nossa Teresina de antes, nosso passado.
Inúmeros casarões abandonados formam a imagem da Teresina de hoje. Casarões que abrigaram experiências que agora estão esquecidas. Momentos, segredos, amores e tudo o que pode ter acontecido, ficam agora apenas em memórias. Ou nem isso.
A cultura do novo, de ter tudo novo e esquecer o antigo fez com que histórias e lembranças fossem deixadas de lado, dentro dessas belíssimas casas que passamos a vista por onde andamos.
Sem contar na arte esquecida! Cada uma dessas residências é arte pura, em seu estado de conservação ou não. Uma arte material, que podemos ver e tocar, mas não vivenciar, apenas imaginar o que teria acontecido em cada lar. A arte deu lugar ao vazio, e vemos isso sempre que passamos o olhar para dentro do que já foi um lar.
Dos costumes do teresinense, o de substituir a sua cultura é o que mais me intriga. E não se trata apenas dos belos casarões abandonados, não. Há muito em Teresina que foi deixado de lado e trazê-los a memória se torna apenas um aconchego nos corações dos que já puderam viver desses momentos. com fontes e até peixes... ah! Me deixa com saudade do que eu nem vivi.
“Pois ‘bora’ conversar logo, porque dessa hora em diante só fica aqui bandido”, disse o senhor ‘Zé’ Wilson, sapateiro de uma tradicional sapataria na praça Rio Branco, por volta das 17h, enquanto eu, Yara, explicava sobre a pauta.
E não é que ele, infelizmente, ele está certo?! Durante as 3 horas que estive no centro a procura de fontes, eu era um olho no peixe e outro no gato! Meus olhos e meu cérebro já estavam lotados com a preocupação de “encontrar um idoso lúcido para me falar sobre a antiga Teresina”, mas ainda precisava de cuidados com meus pertences na mochila, ao mesmo tempo que observava minha moto, que estava estacionada de uma forma não muito segura no canteiro da praça.
Com muita agilidade em organizar as ferramentas de trabalho, o senhor José Wilson também falou, com muito carinho, sobre os tempos de menino, quando ia para a sapataria Os Três Irmãos com o pai, e lá trabalhava. Falou da fonte que “esfriava a praça”, da calmaria das pessoas e segurança no lugar:
“Há 44 anos que com conserto de sapatos, bola, chuteira. Meu pai trabalhou mais de 60 anos aqui. Ele foi pioneiro na praça Rio Branco. [...] A praça era mais bonita do que é hoje. Tinha um
pureto ali, uma fonte luminosa. Uma hora dessa a praça ‘tava’ fria, porque ligava a fonte. Ficava tudo ‘friinho’. Eu trabalho desde criança aqui, a minha vida é aqui.”
Com muito orgulho ele também contou do sucesso familiar na educação, em sua esposa ser formada em pedagogia, seu irmão em engenharia e sua filha estar estudando arquitetura.
Enquanto aquele ágil senhor relembrava o passado, minha mente vagava entre sua descrição e detalhes do presente, com perguntas como “e será se ele comia os peixes que pescava na fonte?”, “Mas onde será que estão os outros dois irmãos? Ou será se não são os irmãos dele, mas do pai, falecido?”. Infelizmente não tínhamos mais tempo para concluir a agradável conversa e, enfim, esclarecer minhas dúvidas. Mas combinamos de eu levar umas sandálias para ele consertar, e aí farei todas as minhas perguntas.
Quando falamos dessa história, dos costumes, não podemos esquecer dos momentos inesquecíveis que tornou Teresina a cidade que é hoje. De costume à cultura, a cidade sempre foi palco para as convivências sociais, dentre elas, os eventos costumeiros em praças, o que formou parte da sua história.
“O museu do Piauí - a casa de Odilon Nunes - tem uma importância muito grande para a história do Piauí, a história do nosso povo! Grande parte da história está aqui representada por esses objetos, que retratam momentos importantes da história do Piauí e nossa gestão tem essa preocupação em estar sempre dinamizando a casa para o povo em geral, em especial para o público

estudantil. Sempre estamos com uma atividade educativa. Sempre a gente tem uma novidade.”
Percebi o amor que Dora Medeiros, diretora do Museu do Piauí, tem pelo Piauí e sua história, quando reservou seu horário de almoço para conversar comigo. O sorriso no seu rosto, brilho nos olhos ao olhar para as janelas, piso e teto, revelam sua dedicação à função.
“Acho que não é só Teresina não isso acontece, mas em nível de Brasil, com raríssimas exceções, que com o passar dos tempos as pessoas não estão tendo aquele cuidado de louvar o passado. O patrimônio histórico (o centro histórico da cidade) [...] deve ser preservado.”
Entre encontros marcados, namoricos, apenas prosear e curtir os locais públicos como um segundo lar, podemos destacar que esse costume era o prazer vivido pelas gerações passadas. Agora a história fica gravada eternamente, apenas em fotografias ou na memória. O que antes era considerado prazeroso para se curtir, hoje é perigoso e nem mesmo a empolgação de antes consegue se sobressair aos males que tais costumes podem trazer agora. A falta de segurança, a distância entre os demais, as comunicações curtas (…) vivenciar tudo hoje não tem mais o mesmo gosto.
Conhecer pessoas se tornou mais fácil, mesmo que superficialmente. A vontade é de manter o celular por perto e de se manter o mais distante possível das gentes. Os mais velhos se reviram vendo essa nova cultura do distanciamento. Nunca estivemos tão perto e tão longe ao mesmo tempo.
