6 minute read

2.4 Desigualdades de Gênero

Sabíamos, por experiência própria, que, como mulheres, fomos socializadas pelo pensamento patriarcal para enxergar a nós mesmas como pessoas inferiores aos homens, para nos ver, sempre e somente. Competindo uma com as outras pela aprovação patriarcal, para olhar uma as outras com inveja, medo e ódio. (HOOKS, 2018, p. 23).

Podemos observar que a estrutura do machismo está em todos os aspectos que construíram os sistemas, valores e morais do mundo no qual vivemos. Está na política, na cultura, na sociedade, na economia, está dentro de nós. Por mais avanços que obtivemos ao longo da história, o patriarcalismo ainda não completamente foi abalado, porém, atualmente estamos bem norteados, sabemos que caminho devemos seguir. Para acabar com o machismo estrutural devemos construir uma nova consciência humanista, baseada no respeito, na igualdade e na justiça.

Advertisement

2.4. Desigualdade de Gênero

É impossível falar sobre feminismo sem falar sobre a desigualdade de gênero, um dos principais temas desse movimento social. É na hierarquização dos sexos que entendemos como a questão é mais inflamada do que já imaginávamos. Não se trata unicamente da luta por direitos iguais, mas sim da luta por direitos básicos, como de ir e vir. A desigualdade de gênero apresenta um leque de preconceitos e problemáticas que absurdamente move o mundo, e durante muitos anos, em silêncio. Uma metáfora que nos ajuda a compreender essa complexidade do machismo e a distinção de gênero, é a do guarda-chuva. O guarda chuva é o machismo e a desigualdade. O que ele encobre são o sexismo, a misoginia, a opressão, o preconceito e violência. Adichie explica que a questão de gênero deve ser falada, pois existem situações que acontecem com a mulher apenas por ser do sexo oposto:

Uma vez estava falando sobre questão de gênero e um homem me perguntou porque eu me via como uma mulher e não como ser humano. É o tipo de pergunta que funciona para silenciar a experiência especifica de uma pessoa. Lógico que sou um ser humano, mas há questões particulares que acontecem comigo no mundo porque sou mulher. (ADICHIE, 2014, p.54).

O sexismo objetifica a mulher, procura definir seus gostos, gestos, sentimentos e vestimentas, e controla rudemente a sua vida sexual. Uma pessoa sexista discrimina o gênero feminino impondo-lhe um padrão, ou seja, colocam as mulheres em “caixinhas estreitas”, para que possam manipulá-las com facilidade. Nivelam os valores femininos de acordo com as suas expectativas. Uma mulher nunca pode ser ousada demais, muito

pelo contrário, precisa ser recatada e respeitosa para com o seu cônjuge. Deve ser modesta, feminina e obedecer às regras impostas sobre o seu corpo, de ser o adorno que encanta aos homens, contudo, sem exageros vulgares. A mulher ideal, no olhar sexista, é aquela que sabe cumprir tudo que fora mandando pelo machismo, sem questionar, que constrói sua identidade nele. Segundos Hooks (2018, p. 13) a sociedade não compreende o que de fato é o sexismo e os seus males “a maioria das pessoas não entende o sexismo, ou, se entende, pensa que ele não é um problema”.

Assim como o sexismo, a misoginia também faz parte da desigualdade de gênero. A misoginia é o sentimento de ódio contra mulher, onde se tem uma necessidade de lhe causar sofrimento - a diminuindo, a excluindo e a depreciando constantemente. Apesar da raiva assustadora das pessoas misóginas pelo sexo feminino, o discurso de ódio nem sempre aparece de modo grosseiro e perturbador, e sim através piadas e frases prontas. Essa aceitação de um machismo velado, imaturo e “cômico” é sem dúvidas um dos assuntos mais importantes levantados pelo movimento feminista. Não é porque soa simpático e consegue arrancar risadas de muitas pessoas, que deixa de ser um ataque sexista, misógino e machista contra as mulheres. É importante saber que os conceitos que sustentam a desigualdade de gêneros estão cristalizados na sociedade, e se adaptam as mudanças de pensamentos, adotando assim um tom menos agressivo. Segundo Hooks (2018, p. 10), “a maioria dos homens fica perturbada pelo ódio e pelo medo de mulher”.

O machismo arrasta consigo muitas caraterísticas preocupantes da sociedade, que o tempo, infelizmente, não conseguiu apagar. A opressão é um exemplo claro do enorme controle social que o machismo institucionalizado tem no mundo. Uma estratégia do patriarcalismo para continuar no poder, pacificamente. Uma mulher oprimida é uma voz silenciada, e quando não há barulho não há incomodo. Manter mais da metade da humanidade, que no caso é feminina, sobre o domínio de um sistema patriarcal, é uma projeção de perpetuidade. É uma forma ardilosa de uma ditatura não ser percebida, e assim ser tolerada. De acordo com Hooks (2018, p, 19) “somente com discussão e desarcado poderíamos começar a encontrar um ponto de vista realista sobre exploração e opressão de gênero”.

Existem várias formas de se oprimir uma mulher, mas a violência é um dos artifícios mais cruelmente usados. Usar da violência física, psicológica, emocional e

patrimonial é o modo de tentar fazer com que a mulher concorde que é melhor viver com a dor da inferioridade do que morrer para se desvencilhar dela. Hooks (2018, p.88) observa que a sociedade, e mesmo a mídia de massa que levanta a questão da violência contra mulher em seus conteúdos, não a conecta com o pensamento do patriarcado o que dificulta a erradicação.

Hoje em dia, o preconceito contra a mulher já não é mais tão facilmente tolerado como era nos séculos passados, porém, está muito longe de se tornaruma questão obsoleta na sociedade. A mulher ainda é desprezada pelo seu gênero. Continua sofrendo com a diferença salarial, com a violência doméstica e sistêmica e com as cobranças culturais. Existe um progresso, é indiscutível que sim, mas o movimento feminista alerta que o machismo não deve ser submetido a reparos: ele precisa ser extinto. Segundo Hooks (2018, P. 89) pensar e agir como uma feminista, dentro de um sistema patriarcal, não faz a vida da mulher ficar mais fácil, e sim mais complicada.

O feminismo é um pensamento e um ato de revolução, o que definitivamente consterna o patriarcalismo. Uma mudança que tem como propósito a igualdade e a equiparidade dos gêneros não é uma reivindicação razoável, pois para o machismo isso significaria conceder forças aos seus oprimidos, atitude que despertaria radicalmente a sede de justiça das mulheres, que já acumulam conquistas femininas ao longo dos anos. Logo, a rotulação torna-se o caminho mais simples e eficaz para não ceder a militância. Segundo Adichie (2014, p. 9) ser feminista é ser taxada como uma mulher infeliz:

Em 2003, escrevi um romance chamado Hibisco roxo, sobre um homem que, entre outras coisas batia na mulher, e sua história não acaba lá muito bem. Enquanto divulgava o livro na Nigéria, um jornalista, um homem bemintencionado, veio me dar um conselho (talvez vocês saibam que nigerinos estão sempre prontos a dar conselhos que ninguém pediu). Ele comentou que as pessoas estavam dizendo que meu livro era feminista. Seu conselho – disse, balançando a cabeça com um ar consternado – era que eu nunca me intitulasse feminista, já que as feministas são mulheres infelizes que não conseguem arranjar marido. Então decidir me definir como “feminista feliz”. (ADICHIE, 2014, p. 9)

É incoerente como a desigualdade de gênero consegue fazer com que a sociedade aprenda a lidar racionalmente com situações ilógicas. Ao mesmo tempo que identificamos todos os males que o machismo propaga, culpamos as mulheres feministas de serem personagens antagônicas, frustradas e de perfis avinagrados.

This article is from: