51 Lá em cima daquele Morrinho ninguém podia morrinhar Morrinho, de gente simples com cadeiras na calçada Se ‘a vida é a arte do encontro’ no ‘ojo a ojo, cara a cara’, no almoço do meio-dia quem pelo Morrinho transitava, ou a caminho do trabalho bem cedinho de madrugada, enfim em qualquer hora do dia quem por ali passava, cumprimentava seu vizinho que gentilmente lhe saudava. Todo mundo se conhecia, portas e janelas jamais cerradas, no portão sempre um sorriso, gente simples com cadeiras na calçada. Ali, gente humilde se encontrava ouvindo Ângela Maria*. Lá em cima daquele Morrinho quase tudo se sabia. Morrinho da alpina vila, íngreme e custoso para quem debaixo subia, pero fausto e prazeroso para aquele que lá de cima descia. Não lhe deram um nome público, de um político ou data comemorativa, pois fora batizado pelo costume da gente humilde antiga, que emprega a fala simples em tudo aquilo que tem carinho. - Então, ficou Morrinho! (*) No rádio, com Altemar Dutra: Gente humilde.
“As pastorinhas pra consolo da lua, vão cantando na rua...” Na cantilena antiga, contente a criança entoava: - “Lá em cima daquele morro, passa boi passa boiada...”. No Morrinho daquela época, D. Maria também passava, entoando um canto caprino em procissão diária; nos campos da alpina vila, pastoreava suas cabras. Bel, atrevido, agarrou os chifres de um cabrito, que saltando espantado aplicou-lhe uma chifrada; bem doída cabeçada na altura do umbigo. Curvado, o menino rolou soltando doído grito. E a pastora avexada lhe aplicou tremendo pito.
Centopeia desengonçada. Carpe diem! Meninos de rua A ladeira convidava a uma bela escorregada. E era isso o que fazia aquela inquieta molecada. Carrinhos de rolimã, como centopeia montados, num grande empurrão pelo Morrinho despencavam. Na jubilosa gritaria, os moleques se esbaldavam, e se estrepavam. Quando numa pedra batia a centopeia desengonçava, espalhando a gurizada em rebuliçosa agonia: entre joelho e dedo esfolados, bunda ralada que muito ardia. 72
Histórias restauradas de um tempo perdido