Histórias restauradas de um tempo perdido (Versão digital) rev. 2022

Page 77

51 Lá em cima daquele Morrinho ninguém podia morrinhar Morrinho, de gente simples com cadeiras na calçada Se ‘a vida é a arte do encontro’ no ‘ojo a ojo, cara a cara’, no almoço do meio-dia quem pelo Morrinho transitava, ou a caminho do trabalho bem cedinho de madrugada, enfim em qualquer hora do dia quem por ali passava, cumprimentava seu vizinho que gentilmente lhe saudava. Todo mundo se conhecia, portas e janelas jamais cerradas, no portão sempre um sorriso, gente simples com cadeiras na calçada. Ali, gente humilde se encontrava ouvindo Ângela Maria*. Lá em cima daquele Morrinho quase tudo se sabia. Morrinho da alpina vila, íngreme e custoso para quem debaixo subia, pero fausto e prazeroso para aquele que lá de cima descia. Não lhe deram um nome público, de um político ou data comemorativa, pois fora batizado pelo costume da gente humilde antiga, que emprega a fala simples em tudo aquilo que tem carinho. - Então, ficou Morrinho! (*) No rádio, com Altemar Dutra: Gente humilde.

“As pastorinhas pra consolo da lua, vão cantando na rua...” Na cantilena antiga, contente a criança entoava: - “Lá em cima daquele morro, passa boi passa boiada...”. No Morrinho daquela época, D. Maria também passava, entoando um canto caprino em procissão diária; nos campos da alpina vila, pastoreava suas cabras. Bel, atrevido, agarrou os chifres de um cabrito, que saltando espantado aplicou-lhe uma chifrada; bem doída cabeçada na altura do umbigo. Curvado, o menino rolou soltando doído grito. E a pastora avexada lhe aplicou tremendo pito.

Centopeia desengonçada. Carpe diem! Meninos de rua A ladeira convidava a uma bela escorregada. E era isso o que fazia aquela inquieta molecada. Carrinhos de rolimã, como centopeia montados, num grande empurrão pelo Morrinho despencavam. Na jubilosa gritaria, os moleques se esbaldavam, e se estrepavam. Quando numa pedra batia a centopeia desengonçava, espalhando a gurizada em rebuliçosa agonia: entre joelho e dedo esfolados, bunda ralada que muito ardia. 72

Histórias restauradas de um tempo perdido


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook

Articles inside

Histórias restauradas de um tempo perdido (Versão digital) rev. 2022

34min
pages 2-5, 8-15

Histórias restauradas de um tempo perdido (Versão digital) rev. 2022

1min
pages 2, 12-15

Histórias restauradas de um tempo perdido (Versão digital) rev. 2022

1min
pages 46-47, 59-60

‘Chega de Saudade’: é a vez da Bossa Nova

4min
page 84

Imagens de uma época da infância de Bel (cont

2min
page 82

Homenagem ao poeta João Cabral de Melo Neto e Lasar Segall

2min
page 83

50. De médico e de louco todo mundo tem um pouco (poesia

4min
pages 75-76

Mensagem Final (2015

1min
page 81

51. Lá em cima daquele Morrinho ninguém podia morrinhar (poesia

3min
pages 77-79

Referências e Mensagem aos leitores

2min
page 80

49. Brincadeiras de rua, coisas de criança feliz (poesia

1min
page 74

47. Sete é o número predileto de Deus

3min
page 72

48. A culpa é da Nestlé /Sentimento latente se tornando explícito (poesia

1min
page 73

42. Herdeira da compaixão

2min
page 64

45. Revolução do cravo, na mocidade

4min
pages 69-70

46. Pra não dizer que não falei das flores

3min
page 71

43. Ao mestre, com carinho

4min
pages 65-66

44. Profissões reconhecidas publicamente

5min
pages 67-68

41. O quintal da Tita, onde todos brincavam

4min
pages 62-63

40. As pessoas já eram o que deveriam ser

3min
page 61

35. Índia negra e poderosa

3min
page 58

30. História para Boris Karloff dormir: A Múmia

2min
page 52

33. Enseada de São Sebastião: nunca mais, camarão

5min
pages 55-56

34. Ouviram do Ipiranga numa vil calçada

3min
page 57

29. Sessão de cinema encerrada com pizza e pedrada

3min
page 51

31. Monstro da Lagoa Negra: a Bela e a Fera, da pauliceia

2min
page 53

32. Parque Shangai, o Playcenter dos anos 1950

3min
page 54
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.
Histórias restauradas de um tempo perdido (Versão digital) rev. 2022 by N. Gilber - Issuu