Histórias restauradas de um tempo perdido (Versão digital) rev. 2022

Page 58

35 Índia negra e poderosa Índia poderosa, negra, metálica e voluptuosa nas curvas, que nas suas mil cilindradas por onde passava inveja e desejo suscitava. Mas, naquela época (1957) na sua idade avançada Índia mais parecia o que hoje no cinema é mostrado por Walter Salles (2004) no filme Diário de Motocicleta, dublado: ‘Em 1952, o futuro líder da Revolução Cubana Che Guevara era um jovem estudante de medicina. Ele e seu amigo Alberto Granado viajam pela América do Sul em uma velha moto, arranjando caronas e fazendo longas caminhadas’ (Sinopse do filme)*. “Índia seus cabelos nos ombros caídos, negros como a noite que não tem luar”. Assim a rapaziada eloquente entoava nas serestas paulistanas, de Cascatinha e Inhana no Jardim da Luz ou no Parque Trianon da Paulista. São Paulo quatrocentona, ‘terra da garoa’, nos tempos de Saudosa Maloca, do Samba¹ do Arnesto que morava no Braz de Adoniran Barbosa, de Altemar Dutra e de Nelson Gonçalves. José Alani, ou Inspetor, também era um primitivo revolucionário. Sua ousadia e originalidade destacavam sua personalidade. Queria vencer na vida, custasse o que custasse, porém sua dignidade manteria e a exemplar integridade. Já Euclydes, o irmão artista (aquele da donzela do Ipiranga, Cap. 34), elegante e afeiçoado, ex-pugilista se espelhava em Eder Jofre e Cassius Clay (campeão em 1964), não ousava revolucionar. Euclydes companheiro fiel, abençoado pela voz e talento artístico, nasceu para cantar. A vida juntou os dois paladinos em momento ordinário viajando com a Índia aventuras inesperadas, aproveitando a liberdade, pois não dependiam de salário. Em seguida numa Kombi2 VW ‘Pão Pullman’, que lhes servia de morada. Pela Argentina se aventuraram onde seu pai Antônio na época de Libertad Lamarque morara, pois nascera em Buenos Aires na terra de Che Guevara³. Mas por lá não encontraram o revolucionário famigerado. Nas milongas arruaceiras ao violão dedilhado entoaram Caminito, Madreselva, Mano a Mano... aonde o tango fora criado. Na cidade de ‘Mi Buenos Aires Querido’, imitando a Gardel com todo sotaque paterno ali adequado. Todavia, a melancólica cadência do tango portenho pela muchachada embalado logo suscitou 'recuerdos' de entes queridos deixados. Assim, ao som de Adiós Muchachos empreenderam a retirada, saudosos ansiando por sua terra querida, logo retornaram. Abandonando a vida boêmia, empreendedores se transformaram: um bemsucedido industrial do calçado, e o outro seu manager devotado. Constituíram família e venceram na vida ao seu modo e ao que Deus permitia. 'De los recuerdos' dos muchachos que bem pouco aqui ficou gravado muito mais e ricamente poder-se-ia ter contado. Dizem que recordar é viver, pois é! A vida continua para aqueles que por aqui ficaram. < Eder Jofre: Ex-pugilista brasileiro, é considerado por especialistas internacionais como o maior pesogalo do boxe na era moderna, tendo ficado conhecido pelo apelido "Galinho de Ouro”. Eder conseguiu manter o seu título mundial até 1965, ganhando todas as lutas por nocaute. Rose Volante: Primeira campeã mundial do boxe brasileiro, título da categoria leve (até 61 kg) da OMB (Organização Mundial de Boxe) em dezembro de 2017.

> ¹Samba paulistano agora é patrimônio da cidade: a origem do samba paulistano se deu em Pirapora do Bom Jesus, na Grande São Paulo, no final do século 19. http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2013/11/13 ²A VW Kombi foi o primeiro veículo fabricado pela Volkswagen no Brasil, e também o primeiro feito pela empresa fora da Alemanha. A produção nacional começou em 1957. A Kombi deixou de ser produzida no fim do mês de dezembro de 2013; modelo mantém recorde de carro mais longevo já feito no Brasil. *Alberto Granado: livro “El Che” 1958: Sierra Maestra... Revolucionários... Fidel Castro... Cuba.

53

Histórias restauradas de um tempo perdido


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook

Articles inside

Histórias restauradas de um tempo perdido (Versão digital) rev. 2022

34min
pages 2-5, 8-15

Histórias restauradas de um tempo perdido (Versão digital) rev. 2022

1min
pages 2, 12-15

Histórias restauradas de um tempo perdido (Versão digital) rev. 2022

1min
pages 46-47, 59-60

‘Chega de Saudade’: é a vez da Bossa Nova

4min
page 84

Imagens de uma época da infância de Bel (cont

2min
page 82

Homenagem ao poeta João Cabral de Melo Neto e Lasar Segall

2min
page 83

50. De médico e de louco todo mundo tem um pouco (poesia

4min
pages 75-76

Mensagem Final (2015

1min
page 81

51. Lá em cima daquele Morrinho ninguém podia morrinhar (poesia

3min
pages 77-79

Referências e Mensagem aos leitores

2min
page 80

49. Brincadeiras de rua, coisas de criança feliz (poesia

1min
page 74

47. Sete é o número predileto de Deus

3min
page 72

48. A culpa é da Nestlé /Sentimento latente se tornando explícito (poesia

1min
page 73

42. Herdeira da compaixão

2min
page 64

45. Revolução do cravo, na mocidade

4min
pages 69-70

46. Pra não dizer que não falei das flores

3min
page 71

43. Ao mestre, com carinho

4min
pages 65-66

44. Profissões reconhecidas publicamente

5min
pages 67-68

41. O quintal da Tita, onde todos brincavam

4min
pages 62-63

40. As pessoas já eram o que deveriam ser

3min
page 61

35. Índia negra e poderosa

3min
page 58

30. História para Boris Karloff dormir: A Múmia

2min
page 52

33. Enseada de São Sebastião: nunca mais, camarão

5min
pages 55-56

34. Ouviram do Ipiranga numa vil calçada

3min
page 57

29. Sessão de cinema encerrada com pizza e pedrada

3min
page 51

31. Monstro da Lagoa Negra: a Bela e a Fera, da pauliceia

2min
page 53

32. Parque Shangai, o Playcenter dos anos 1950

3min
page 54
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.
Histórias restauradas de um tempo perdido (Versão digital) rev. 2022 by N. Gilber - Issuu