Revista Mercadizar | 7ª Edição

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11 EDIÇÃO 007 OUTUBRO 22

SOBRE

O PMKT 11 marca um momento especial na história da premiação e do Mercadizar: a realização da primeira edição para todo o Norte. Para representar esse novo desafio, foi necessário criar uma revista nunca vista antes e que mostrasse todo o potencial nortista. Foi com esse pensamento que nasceu a sétima edição da Revista Mercadizar, que tem diagramação e capa assinadas pela designer Jéssica Pinheiro.

Pela primeira vez, a capa, que nas edições anteriores era multicolorida e ilustrada, vem quase que em branco. Apesar do aparente “vazio” no que pode ser considerado a “vitrine” da revista, a ideia é justamente despertar uma sensação de incômodo e inquietação no leitor. O significado da capa, no entanto, caberá à interpretação de cada um, explica Jéssica.

“A capa pode ser interpretada de muitas maneiras por ser minimalista. Eu deixo em aberto para as pessoas interpretarem com o conhecimento empírico delas. Eu acho que é legal as pessoas traduzirem do jeito que elas se sentem confortáveis, de acordo com o que conhecem.”

Metaverso:

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diagramação da revista, no geral, apresenta uma estética minimalista e clean, com foco principal nos textos, bem divididos entre as páginas. Há um destaque para o uso de imagens, escolhidas a dedo para ilustrar as matérias. De acordo com Jéssica, a ideia central é explorar o conteúdo apresentado por meio de imagens que fogem do óbvio e do literal, para instigar o leitor e seu senso crítico sobre o que está sendo dito nos textos.

“Essas imagens foram escolhidas justamente para ter um impacto visual e trazer o leitor para se sentir mais interessado pela leitura. A cada folha que virar, ele vai ver uma imagem que não é comum. Isso gera curiosidade.

O processo de criação, conta Jéssica, partiu de um briefing bem consolidado sobre a proposta desta sétima edição: “Nós conseguimos dar pra essa edição da revista o tom que queríamos, o de mudança”.

ÍNDICE
os vários lados de um mundo virtual
debate sobre o Brazilcore: tendência ou apropriação cultural?
nova era para o trabalho: presencial, híbrido ou remoto?
espetáculo construído pelas mãos de mulheres Desigualdade e falta de inclusão em festivais de música PMKT11 62 72 48 34 20 4
A REVISTA A

“Desculpe, mas essa pauta não rende para nós”, disse a jornalista do veículo que afirma cobrir o mercado de comunicação brasileiro. Esse não foi o primeiro, nem será o último comentário que vamos ouvir ao buscar visibilidade nacional para os projetos nortistas. Eu sei. Mas a gente também não vai parar.

Como alguém que nasceu no interior de São Paulo e se criou e se formou profissionalmente em Manaus, posso afirmar que o ego do sudestino deveria ser encapsulado. Perdi a conta de quantos comentários ouvi desde que me mudei, ou dos olhares de curiosidade sobre o imaginário de uma realidade exótica e irreal.

O Norte é predominantemente associado apenas à Amazônia, mas ele também respira arte e cultura urbana, tecnologia e criatividade. O Norte produz comunicação, publicidade e música. De todos os gêneros, por todos os gêneros.

O PMKT existe e resiste há mais de uma década e busca visibilizar cada vez mais, a cada edição, profissionais ignorados. O Mercadizar tem o mesmo propósito; afinal, é papel dos veículos de comunicação, das produtoras audiovisuais, dos festivais de música e da publicidade mostrar o Brasil real. E o Brasil não é o eixo RJ-SP.

Nesta revista, trazemos questões diversas sobre perspectivas plurais, e convidamos todos a mergulhar na leitura e interpretação das imagens.

Se você chegou até aqui, e se assim como eu (mulher cisgênero e branca) tem privilégios, reflita sobre o seu papel para um Brasil mais inclusivo. Use sua voz, sua imagem, suas oportunidades.

C ONS um A, CON h Eç A, VISITE, CONTRATE, INC lu A E O lh E pARA

O N ORTE.

O S Vá RIOS l ADOS DO mu NDO VIRT u A l

Em 1992, o estadunidense Neal Stephenson lançava SnowCrash , clássico da literatura de ficção científica que criou o termo “metaverso”. De lá para cá, o desenvolvimento de novas tecnologias e as ambições das diferentes corporações que as produzem fizeram com que os mundos virtuais saíssem do campo da ficção para se tornarem realidade.

pARA INÍCIO DE CONVERSA, O qu E é um m ETAVERSO?

Para além da literatura de Stephenson, e em momentos mais recentes, vêm se popularizando diferentes conceitos e definições de metaverso. As tentativas de descrever o que seria o metaverso se cruzam ao tentarem caracterizá-lo como uma forma de internet social, completamente imersiva, que integra diferentes tecnologias, como as realidades virtual, aumentada e mista, ou a realidade estendida, guarda-chuva que abraça todos esses termos, também conhecida como XR. É uma “internet palpável”, na qual seria possível fazer tudo em um espaço virtual. Tudo isso a partir de outro objeto popularizado por causa de SnowCrash : os avatares, que são representações virtuais de nós mesmos, capazes de interagir com outros avatares, ferramentas, espaços e muito mais dentro do metaverso.

Nos últimos anos, grandes empresas de tecnologia, como a Microsoft, vêm explorando e investindo no desenvolvimento de realidades virtuais. Mas o metaverso ganhou maior notoriedade quando, em outubro de 2021, Mark Zuckerberg, fundador do Facebook, anunciou a mudança de nome da empresa para Meta, com o objetivo de ser reconhecida como a empresa do metaverso. A Meta se organizaria em dois diferentes segmentos: um para aplicativos, como o Instagram e o WhatsApp, e outro voltado às “plataformas do futuro”, colocando o metaverso como o principal foco da empresa.

Em um anúncio de mais de uma hora de duração, um avatar bastante realista de Zuckerberg explica as características do metaverso no qual sua equipe de desenvolvedores está trabalhando. O que é prometido é a experiência de uma imersão completa, sensação de presença e a possibilidade de se viver em uma realidade inovadora. Segundo ele, no futuro do metaverso será possível “reunir-se com amigos e família, trabalhar, aprender, brincar, comprar e criar, além de categorias inteiramente novas que não se encaixam na visão que temos de computadores ou celulares hoje”.

Não precisamos pensar em um contexto futurístico para entender as vantagens oferecidas pelo metaverso. A necessidade de se ter um meio de desenvolver diversas atividades virtualmente foi imposta pelo distanciamento social causado pela pandemia de covid-19. Desde 2020, nossas rotinas passaram a ter home office , videochamadas, compras on-line , estudo a distância, teleconsultas médicas e muito mais. Atividades estas que foram adaptadas à força, e muitas vezes de maneira não eficiente, a exemplo do cansaço mental atribuído à quantidade de tempo que ficamos expostos às telas.

Com o metaverso, os meios para se colocar em prática todas essas ações estão sendo desenvolvidos lentamente, considerando que a expectativa é que ainda teremos que aguardar cerca de dez anos para ter acesso completo à nova realidade virtual.

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ACESSÍVE l pARA qu E m?

Dentre tudo o que chama a atenção em relação ao metaverso, se destacam as tecnologias necessárias para que ele realmente seja acessado em grande escala por diferentes usuários. Serão necessários novos tipos de hardwares , ou equipamentos, compatíveis com a tecnologia do metaverso, como os óculos de realidade virtual Quest 2, produzidos pela própria Meta. No site oficial da empresa, um Quest 2, que acompanha os óculos e dois controles de mão, é oferecido por cerca de US$ 400, o equivalente a cerca de R$ 2.100. Fazendo uma pesquisa rápida na internet, é fácil achar opções vendidas no Brasil por preços que variam de R$ 3.000 a R$ 5.000.

Outra opção é o HoloLens, os óculos desenvolvidos pela Microsoft e que permitem acesso ao Mesh, um dos aplicativos do metaverso em desenvolvimento pela empresa.

O preço do aparelho no site oficial é de US$ 3.500, cerca de R$ 19.000, mas que em mercado brasileiro pode apresentar valores ainda maiores.

m NOVO mu NDO

Tecnologias que sequer existem também serão necessárias para o acesso em massa ao metaverso. Segundo Mark Zuckerberg, para uma experiência mais imersiva seria necessário que os óculos tivessem em sua estrutura projetores, baterias, rádios, chips de silicone, câmeras, alto-falantes, sensores de mapeamento e muito mais.

Michael Abrash, cientista de tecnologias da Meta, afirma que “serão necessários grandes avanços tecnológicos para o metaverso da próxima geração. São displays , áudio, dados, tecnologia de toque, posicionamento de mãos e olhos, realidade mista, sensores, gráficos, visão computacional, avatares, ciência perceptiva, inteligência artificial e mais”.

Além desses, seria também necessário o acesso contínuo à internet, que, claro, é a peça-chave para entrar no metaverso. Observando os parâmetros atuais de acesso à internet no Brasil, é simples perceber a deficiência que o país tem nesta área.

De acordo como a pesquisa “O abismo digital no Brasil”, publicada em 2021 pela PwC e o Instituto Locomotiva, 81% da população com 10 anos ou mais usam a internet, mas somente 20% têm acesso de qualidade à rede. Ao analisar o índice de privação on-line , a pesquisa mostra que a diferença de classes afeta diretamente o acesso à internet: apenas 8% dos internautas plenamente conectados pertencem às classes DE, enquanto 60% estão entre os desconectados.

Outro dado alarmante é apresentado pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua - Tecnologia da Informação e Comunicação (Pnad Contínua TIC) de 2018, que foi divulgada em 2020 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

A pesquisa mostra que um em cada quatro brasileiros não têm acesso à internet, o que representa cerca de 46 milhões de pessoas desconectadas.

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A pesquisa da PwC indica ainda que 25% dos brasileiros subconectados (o equivalente a 41,8 milhões de pessoas) têm como característica predominante serem das regiões Norte e Nordeste do Brasil.

A Região Norte possui os piores indicadores de uso da internet no país. Conforme relatório do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), a falta de infraestrutura, a baixa qualidade da conexão, a cobertura limitada e os altos preços são as principais características do acesso à internet na região. “Em partes da região, sequer há provisão de acesso à internet, e, quando há, a velocidade de conexão é insuficiente e instável, interferindo no gozo de inúmeros direitos pelos cidadãos nortistas. Quando há internet, a média de preços é demasiadamente mais alta em comparação ao resto do país”, destaca o Idec.

Dentre os domicílios nortistas, 73% não possuem acesso à internet devido ao alto preço do serviço, sendo esse o principal motivo para a falta de conexão. Outro motivo é a indisponibilidade de internet na região, afetando 43% dos domicílios. O acesso a dispositivos e equipamentos também é fator que pode impor restrições à usabilidade do usuário. Dos usuários de internet no Norte, 65% usam apenas o celular como meio de acesso.

Tais dados servem de passo inicial para o levantamento de questionamentos ainda pouco feitos a respeito dos desafios tecnológicos para a adoção em massa do metaverso.

m ETAVERSO E SEgu RAN ç A

Já citamos aqui algumas vantagens que poderão ser oferecidas pelo metaverso. As infinitas possibilidades são inimagináveis, mas apontam em direção a facilidades relacionadas a trabalho, entretenimento, desenvolvimento criativo e econômico, entre outros.

Ainda assim, a realidade virtual preocupa especialistas quando o assunto são os riscos e as consequências da imersão digital. São indicados como fatores preocupantes a ampliação da vigilância, a coleta de um número maior de dados dos usuários – incluindo dados de caráter pessoal, levando em conta o modo de uso e interação com o metaverso – e a falta de transparência sobre quem será o detentor desses dados e como eles poderão ser usados ou protegidos.

O uso de dados pelas grandes corporações de tecnologia já causa polêmica na internet do jeito que ela é hoje, e está na lista de ameaças feita pela empresa de cibersegurança Trend Micro. Para o metaverso, a expectativa não é otimista. Privacidade e rastreamento serão mais extremos, até que legislações sejam aplicadas.

Por meio das ferramentas adotadas pelos usuários, como os óculos de realidade aumentada, será possível registrar dados pessoais, como identidade do usuário, biometria, dados de localização, credenciais, informações de pagamentos, dados do avatar e muito mais, que, segundo a Trend Micro, “serão armazenados localmente nos terminais do usuário, tornando-os um lucrativo alvo de hackers”.

O que se espera também é que os desenvolvedores do metaverso tenham controle de todos os aspectos relacionados à vasta quantidade de dados, podendo monetizar essas informações. Um fato que manchou a reputação da Meta, quando ainda era chamada Facebook, foi o escândalo de vazamento de dados de usuários da rede social que veio a público em 2018.

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O primeiro é o de crimes cibernéticos puros, que ocorrem quando o ataque é direcionado ao sistema de informática de um terceiro, como um softwareou um banco de dados.

O segundo é composto pelos crimes cibernéticos impuros, nos quais a internet é utilizada como meio de execução de crime tipificado na legislação penal, como, por exemplo, a divulgação de fotografias pornográficas de crianças e adolescentes, tipificada no Art. 241 do Estatuto da Criança e do Adolescente.

No metaverso, as dimensões tecnológicas oferecidas podem contribuir para estes e outros tipos de crimes. No relatório “Metaverse:anothercesspooloftoxic content”, produzido pela organização SumOfUs, são listados diversos casos de assédio sexual, estupro, discurso de ódio e racismo.

Segundo o relatório, pesquisadores da SumOfUs que entraram no metaverso ficaram surpresos com a rapidez com que sofreram assédio sexual. Em cerca de uma hora de uso da plataforma Horizon Worlds, da Meta, uma pesquisadora foi conduzida a um quarto privado em uma festa onde foi estuprada.

Outro crime presente no relatório é o caso no qual uma usuário-teste para a Horizon Worlds apresentou uma reclamação afirmando que seu avatar havia sofrido assédio de um estranho dentro da plataforma.

No entanto, após receber a reclamação e a sugestão de melhores mecanismos para prevenir e denunciar o assédio, a Meta “não só falhou em tomar medidas contra o agressor, mas na verdade culpou a testadora beta pelo uso inadequado de recursos de segurança pessoal”, afirma o relatório.

Na mídia, o caso que ganhou maior repercuss ão foi o crime contra a pesquisadora Nina Jane Patel. Ela relata que, “dentro de 60 segundos depois de entrar na Horizon”, foi agredida verbal e sexualmente. “Três ou quatro avatares masculinos, com vozes masculinas, estupraram meu avatar e tiraram fotos.” Patel afirma ainda que os avatares masculinos proferiram palavras violentas, e que a situação a deixou em choque.

Para a SumOfUs, a moderação mínima no metaverso permite que o comportamento tóxico prospere, “normalizando o assédio sexual, especialmente para avatares com aparência e som femininos”.

E a variedade de crimes cibernéticos no metaverso não para por aí. No Brasil, de acordo com o Ministério da Justiça e Segurança Pública, em junho de 2022 aconteceram as primeiras ações de busca e apreensão no metaverso. A quarta edição da chamada Operação 404 teve como foco a repressão de crimes praticados contra a propriedade intelectual na internet. Na edição da operação, alguns dos alvos atuavam na pirataria audiovisual e em canais que transmitiam ilegalmente streamingde músicas. O resultado foi a remoção de 266 sites no Brasil e a exclusão de 15 perfis que atraíam consumidores para conteúdos ilegais.

O qu E fA l A m AS ES pECIA l ISTAS

A construção do metaverso e seus lados positivos e negativos são diversos, merecendo um olhar crítico e atento. Seu desenvolvimento engloba diversas áreas do conhecimento, envolvendo empresas de tecnologia, criadores e profissionais como designers de projetos voltados ao metaverso.

Jéssica Pinheiro é designer de produto digital e trabalha com pesquisa e desenvolvimento de tecnologias emergentes, como softwarese aplicações para experiências imersivas. Ela afirma considerar mais lados positivos do que negativos em relação ao metaverso, dando como exemplos o uso de novas funcionalidades, o aumento da produtividade, a maior integração e conexão entre pessoas e a falta de limitações geográficas. Para a especialista, “existem variantes positivas, como produtividade, otimização e performances do tempo de trabalho, ou usar [a realidade estendida], por exemplo, para fazer atividades físicas, ou para assistir a uma série com amigos”.

Jéssica, porém, chama a atenção para o chamado motionsickness , espécie de desconforto físico que pode ocorrer durante o uso de dispositivos e ambientes digitais, o que limita o tempo de uso dos óculos de realidade virtual, por exemplo. Outro contraponto, em sua visão, pode ser o isolamento social trazido pela imersividade e a possibilidade de agir virtualmente, gerando “desconexão com o presencial ”.

Já para Alice Santos, designer que trabalha com tecnologias emergentes (como o metaverso) e desenvolve soluções para aplicações em dispositivos vestíveis de realidade estendida, a consolidação do metaverso poderá render “mais insumos para que mais estudos possam ser realizados, e com isso projetar experiências cada vez mais adequadas à sua audiência”. A designer afirma que, para quem atua nessa área como projetista, o metaverso seria nada menos que enriquecedor, e considera difícil prever se o futuro no metaverso será danoso ou não, mas discute criticamente questões como segurança e privacidade dos usuários.

“Existem grandes questões que envolvemessa ‘vida virtual’, mas penso que segurança de dados, isolamento social, saúde mental e privacidade são as principais. Contudo, falar de ‘privacidade’,ou melhor, a falta dela, já é algo que nos acompanha rotineiramente desde meadosde 2007 (ano de lançamento do primeiro smartphone). O uso cada vez mais invasivo das plataformas de comunicação, sites decompras ou qualquer meio que faça uso denossos dados nos faz reféns de uma rede de troca de informações pessoais absurda”,destaca a profissional.

Esse uso mais invasivo, e imersivo, das plataformas digitais também tem ligação direta com o modo como nos comportamos e interagimos nas mesmas. Conforme abordado, a experiência feminina no metaverso já foi afetada negativamente por violências digitais, o que torna necessário o debate sobre o assunto.

Alice Santos destaca que o tema de violência contra mulheres não é um problema presente somente na plataforma, “mas um problema estrutural de cunho social e cultural. Todavia, ao se expor em um ambiente que ainda está em processo prematuro de construção, sem leis estabelecidas, regras de conduta ou qualquer vigilância, nós mulheres ficamos sempre mais vulneráveis a sofrer abusos”.

A presença feminina nas equipes, assim como a representatividade desta minoria de forma geral, é importante para um avanço virtual (e presencial) mais seguro.

Alice Santos reforça que “mesmo que haja um avanço na presença feminina nas equipes de tecnologia, ainda falta uma tomada de consciência generalizada, independente do gênero, para que juntos possamos construir um ambiente mais seguro, levando em consideração todos os tipos de situações de risco, dos mais sutis aos mais críticos”.

A designer destaca ainda a importância de considerar que, além do público feminino, existem também outros mais vulneráveis, como crianças e adolescentes, que têm contato com o mundo virtual cada vez mais cedo. “O efeito desse uso sem cautela pode repercutir na saúde mental dessa geração, que já nasce imersa em meio a uma exposição desenfreada”, afirma. Em concordância, Jéssica dá como exemplo a plataforma de jogos Roblox, que é usada por crianças e oferece a possibilidade de interação com adultos desconhecidos.

Brazilcore
Brazilcore

Em alta em redes sociais como TikTok, Instagram e Pinterest, o termo “ Brazilcore” — ou “ Brazilaesthetic” — tem chamado a atenção de quem transita pelas plataformas. Apesar do nome em inglês, o Brazilcorenada mais é do que um estilo de se vestir que usa o nome, a bandeira e as cores amarelo, verde e azul do Brasil em peças de roupa e acessórios, e vem sendo popularizado por influenciadoras, principalmente mulheres cis brancas e magras, por meio de fotos e vídeos.

O Brazilcorevem dando um nó na cabeça de quem o descobre, já que a bandeira do Brasil foi apropriada pela extrema direita com tamanha eficiência que aqueles com receio de se associar ao governo já a evitam há quatro anos. Mas, afinal, por que estamos apostando em uma “estética” relacionada a dois elementos que parecem, na superfície, distantes do mundo da moda: a política brasileira e o futebol?

B RAZI lCORE E AS EST é TICAS DE REDES SOCIAIS

A moda mudou muito com a chegada da internet, e mais ainda com a popularização das redes sociais. Nesta nova era on-line, não basta se vestir bem ou vestir o que gosta; para as gerações Y e Z interessadas em moda, a ordem é se associar constantemente a novas “estéticas” e, de certa forma, criar as próprias tendências. “É uma geração mais autêntica, que pode mostrar o que quer e principalmente o que não quer, atitude que influencia diretamente na moda”, afirma a consultora de marketing e visualmerchandiserMaria Cecília Silva.

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O maior exemplo disso é a influência do TikTok no mundo da moda. Atualmente, o aplicativo tem tanta importância que chegou a mudar a forma como as grandes marcas pensam suas coleções , como afirmam Bruna Furlan e Izabella Ricciardi no artigo “Fenômeno TikTok revoluciona mundo da moda na pandemia”, da LabJor FAAP:

“Com a explosão de popularidade do TikTok, o ciclo da moda teve sua ordem invertida. O público passou a procurar por estilos específicos apresentados na plataforma, e a alta moda se viu na obrigação comercial de incluí-los em suas coleções apresentadas nas semanas de moda”.

Alguns estilos de fato se destacam e vão parar nas semanas de moda, mas a principal característica do TikTok é a postagem incessante de novos conteúdos, o que, ao falar de moda, significa criar o ciclo de tendências mais acelerado que já se viu na história. Em uma rede social que entrega algo novo a cada segundo, os criadores estão sempre buscando formas para se destacarem, e no chamado Fashion TikTok uma das melhores estratégias é criar ou aderir a uma nova “estética”.

E-girl:Com grande influência dos estilos emo e gótico dos anos 2000, a estética e-girlfoi uma das primeiras a bombar com o TikTok. Roupas pretas, sobreposição de camisetas de manga curta e longa, cabelo colorido e tênis Converse são algumas de suas principais características.

Oldmoney:Em tradução literal, significa “dinheiro velho”. É uma estética americana que remete ao modo como a classe alta dos Estados Unidos se veste, principalmente no leste do país. Faz referência à aristocracia, a famílias com grandes heranças e a universidades de elite, e se traduz pelo uso de peças consideradas elegantes, como conjuntos de blazer e saia, camisas sociais, suéteres e mais, além de esportes da elite, como tênis e polo. As cores são mais claras: branco, nudee tons pastéis.

Barbiecore:Mais recente, a estética Barbiecoretem relação justamente com a boneca Barbie e seu uso do rosa: um look Barbiecoreé rosa dos pés à cabeça, geralmente misturando diferentes tons, e é considerado extremamente feminino. As peças geralmente são vestidos, saias, tops e o famoso salto alto, além de acessórios mais delicados.

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pARA I lu STRAR, A lgu NS E x E mpl OS DE EST é TICAS qu E SE pO pul ARIZARA m NA INTERNET RECENTE m ENTE INC lu E m:

Criadas e popularizadas principalmente pelos falantes do inglês, várias dessas estéticas usam o termo “core” em sua terminologia – palavra que significa “núcleo” em inglês –, e cada uma vem com uma lista de itens que devem ser usados em conjunto para que o lookcompleto seja “validado”. Todos esses nomes e regras são úteis de um ponto de vista mercadológico, porque facilitam tanto a popularização de conteúdos em redes sociais quanto a compra de peças no vasto mundo digital. Afinal, é sempre mais fácil encontrar algo que tenha nome.

O Brazilcore , por exemplo, é definido pelo uso de camisetas, jaquetas ou bonés com a palavra “Brasil” estampada, muitas vezes acompanhados de outras peças em amarelo, verde e azul, um par de óculos “Juliet” ou as famosas Havaianas. Mas não basta combinar essas peças – aqui, elas devem ser interpretadas pela ótica da moda dos anos 2000, ou Y2K (que é uma estética por si só).

Mas, diferentemente de outras estéticas popularizadas recentemente, que parecem surgir “sem motivo”, só para alimentar o algoritmo do TikTok, o Brazilcorenão pode ser analisado fora do contexto de dois grandes eventos: a Copa do Mundo e as eleições de 2022.

A ‘DES pO l ITIZA çã O’ DA CA m ISETA DO B RASI l

O maior motivo para a ascensão do Brazilcorena segunda metade de 2022 é a Copa do Mundo do Catar, com início em meados de novembro. A expectativa pelo evento, somada ao fato de o Brasil ser o maior campeão da competição e estar há tanto tempo buscando o hexa, restabeleceu a vontade dos brasileiros de vestir a camiseta do Brasil que há quatro anos está associada à extrema direita.

O tema e a estética ‘Brasil’ sempre se venderam muito bem, vide a empolgação dos gringos quando chegam no nosso país e se deparam com Havaianas, caipirinha e samba. Mas isso não é unanimidade para os próprios brasileiros – desde 2018 nossas cores, e principalmente a bandeira, estiveram ligadas a um lado político de extrema intolerância, trazendo até uma certa vergonha em usar o símbolo. Creio que o boomdo Brazilcorenas redes sociais se deve ao fato da proximidade da Copa do Mundo e pelas nossas eleições. É um momento único para tentar resgatar cores e símbolos que nos foram tirados ”, diz Maria Cecília Silva.

Para tentar fazer esse resgate do uniforme do Brasil antes da chegada da Copa, algumas pessoas correram para associar a bandeira a movimentos contrários ao governo de Bolsonaro – durante o movimento Frente Ampla pela Democracia, realizado nacionalmente no dia 11/8, o uso das cores do Brasil foi bastante presente, por exemplo. Outros grupos, mais “isentos”, voltaram a pregar que futebol é futebol e política é política, e que a camiseta do Brasil não deve ser associada a nenhuma vertente ideológica ou personalidade política.

Nos palcos, diversos músicos também retomaram as cores da seleção para mandar uma mensagem clara ao público. Um dos casos que mais chamou a atenção foi o do rapper Djonga, que vestiu a “amarelinha” em um show no Mineirão e declarou: “Com essa camisa aqui é mais gostoso de ouvir vocês gritando, porque os caras acham que tudo é deles; eles se apropriam do tema família, eles se apropriam do nosso hino, eles se apropriam de tudo, mas é o seguinte: é tudo nosso, e nada deles”.

O ato foi bem recebido, e a Nike, uma das empresas juntando forças para levar a despolitização da camiseta do Brasil ao público geral – principalmente por motivos financeiros, já que é a responsável pelas vestes da seleção na Copa do Mundo de 2022 –, aproveitou para chamar Djonga para a campanha de divulgação dos novos uniformes, bem como outros nomes da música e do futebol. A ideia é mostrar que a camiseta do Brasil é um bem nacional que deve ser usado por todos. “É coletivo. Representa mais de 210 milhões de brasileiros. É a nossa garra”, foi o pronunciamento da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) no lançamento dos uniformes.

A (TARDIA) RE l A çã O DO fu TEBO l E DA m ODA

Além do desejo de torcer pelo Brasil em verde e amarelo à vontade, movimentações recentes no mundo da moda também explicam por que o Brazilcorevem coletando aderentes. A primeira é que, sendo cíclica, a moda retoma estilos constantemente, e agora passamos por uma releitura dos anos 2000. Assim, é possível traçar uma relação entre a estética Y2K e o fato de o penta brasileiro ter ocorrido em 2002, por exemplo.

Mas, mais que isso, há o fato de as camisetas de futebol recentemente terem começado a ser consideradas fashion . Mesmo sendo peças comuns no guarda-roupa de milhões de pessoas, a cultura “raiz” do futebol e a indústria da moda por muito tempo pareceram dois mundos distantes, até mesmo opostos, e, considerando seu longo histórico de flerte com diferentes tipos de uniforme, as grandes marcas de fato demoraram bastante tempo para levar em conta o esporte mais famoso do mundo. Foi só em 2020, por exemplo, que a Balenciaga desfilou camisetas de time de futebol que valiam US$ 780, e em 2022 a Gucci lançou luvas de goleiro em uma colaboração com a Adidas.

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Ainda que tenha demorado para acontecer, a chegada do futebol às passarelas agora tem se traduzido em massa no streetstylede pessoas que nunca antes se associaram ao esporte. No artigo “Parece que o jogo virou”, da revista “Elle”, Lelê Santhana afirma: “O que vem sendo observado agora são as camisas de futebol ganhando o status similar ao das camisetas de banda. É um movimento já observado antes, ainda que não exatamente no mainstream.Usadas muitas vezes por pessoas que não conhecem uma música sequer daquele grupo, elas se tornam desejadas por fatores majoritariamente visuais e, com as de futebol, o fenômeno parece ser semelhante.”

O B RAZI lCORE E A A p RO p RIA çã O DA C ulT u RA pERI fé RICA

Na superfície, o Brazilcorepode ser visto como uma tendência divertida e até mesmo bem-vinda, sendo o “empurrãozinho final” para voltarmos a usar símbolos e cores brasileiras sem medo. Além disso, como qualquer tendência de redes sociais, rende bons conteúdos para criadores e seguidores, ajudando também na venda de várias marcas. Mas antes de enaltecer influenciadoras brancas e magras – e, algumas vezes, nem mesmo brasileiras – por transformar o Brasil em tendência, é preciso entender que esse movimento já vem acontecendo há décadas na periferia, sem ganhar a mesma atenção que algumas hashtagsvêm tendo nos últimos meses.

Se a indústria tradicional da moda demorou para olhar para o futebol, a realidade sempre foi outra em comunidades marginalizadas. Não é novidade que a maior parte dos nomes do futebol brasileiro vem de favelas, onde o esporte “é uma porta de esperança, e não um mero circo de distração e alienação no mundo, ainda que sendo comandado pelas elites do mundo”, como afirma Denner Eduardo Aves dos Santos no artigo “Futebol na Periferia: relações sociais e política na Baixada Fluminense - século XX e XXI”. Para quem mora na favela, o sonho de ser jogador é um dos mais comuns, porque é uma forma real de ascender socialmente, e um dos poucos espaços onde há verdadeira representatividade de pessoas pretas. Nesse contexto, o esporte é representatividade, esperança, educação e muito mais, e sua relação com a moda vai além da periodicidade da Copa do Mundo e do feeddo Instagram.

Esse também é o motivo pelo qual devemos considerar que a despolitização da camiseta da seleção brasileira começa na periferia, que nunca deixou de adotar o Brasil como moda, e não com a nova campanha de marketing da Nike, por exemplo. Como nota o professor de marketing esportivo da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), Ivan Marinho, em entrevista ao jornal “O Globo”, “do ponto de vista mercadológico, a associação [da camiseta do Brasil à direita] não interessa à fabricante [Nike]. Por razões óbvias. Fazer isso significa limitar o número de compras possíveis”. Mas, na periferia, a despolitização não é um movimento que visa o lucro, e sim a realidade do dia a dia.

“Falando de tendência, a gente sabe que a estética Brazilcore já se faz presente por aqui há muito tempo. Nas favelas e nos subúrbios brasileiros o que mais vemos são a cores verde e amarelo, além da presença de chinelo, bermudas e um visual mais ‘despojado’, sempre muito honrado nas favelas cariocas e por marcas menores ou comandadas por pessoas negras”, diz Maria Cecília Silva.

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O que o Brazilcorefaz é criar duas interpretações diferentes para a estética do Brasil, dependendo do corpo que a usa e de onde esse corpo se encontra. A camiseta do Brasil passa a ser “tendência” e “core” quando aparece no feedda elite, mas continua “brega” nas ruas da favela.

Em um post no Instagram intitulado “Entre o patrimônio cultural e as tendências passageiras: racismo e elitismo”, o perfil @fashion_rev_brasil explica como e por que a apropriação cultural teve início: “No período colonial, a destruição dos povos originários dos países americanos e africanos passava, também, pela destruição daquela cultura. As religiões, tecnologias e vestimentas desses povos foram (e ainda são) diminuídas e ridicularizadas, como parte de um projeto de extermínio de tudo que não é branco-europeu. Na moda, esse sistema segue em prática através da apropriação cultural, que acontece quando elementos de uma cultura são deslocados do seu contexto e sentido. Assim, peças de roupas ou acessórios consideradas bregas, feias ou vulgares em corpos não brancos viram tendência quando vestidas por pessoas brancas.”

Infelizmente, isso já é lugar-comum na moda brasileira, principalmente nos últimos anos, com a popularização da cultura do rap e do funk. Música e moda sempre andaram de mãos dadas, e o fato de esses estilos estarem no topo das paradas convida grupos que não têm qualquer noção do contexto social atrelado a eles a se vestirem como os artistas de que gostam, o que também inclui as camisetas de futebol.

O que vemos com o Brazilcore , portanto, não é inédito, e sim mais um exemplo de algo que acontece frequentemente: a elite recriando a moda da periferia, mas sem dar o devido crédito ou a devida visibilidade àqueles que a criaram. Dessa vez, estamos usando um termo em inglês para promover uma estética completamente brasileira que já ocorre há anos, mas que sempre foi ignorada por causa do lugar de onde veio.

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DEVE SER ‘CANCE l ADO’?

Em números, o Brazilcore– como tendência on-line , e não como expressão de estilo de grupos periféricos – nem é tão grande assim, na verdade. O termo se tornou popular nas redes sociais porque estamos falando sobre ele, e não porque estamos engajando com a estética proposta em massa.

Mas, por incrível que pareça, só estamos falando sobre Brazilcoreporque algumas – e, realmente, apenas algumas – influenciadoras de fora do país postaram fotos com camisetas do Brasil (provavelmente focando no grande engajamento dos brasileiros em redes sociais), o que foi o catalisador para que brasileiras começassem a adotar e de fato popularizar a estética. Isso significa que, embora seja apropriado da periferia, o Brazilcoresó começou a ser reproduzido no país depois de passar pelo feedde europeias, como um filtro que “purifica” a moda para quem não é pobre. É como se quiséssemos uma desculpa para vestir a camiseta do Brasil, mas primeiro precisássemos da aprovação de estrangeiras magras para isso.

“Algo a se levar em consideração é que, quando buscamos pela tendência nas redes sociais, encontramos (até a data desta matéria) mais conteúdos de criadores explicando a possível tendência do que exemplos dela acontecendo, de fato, na prática. […] Em apuração para esta matéria, 15 das fotos mais utilizadas em que foi possível encontrar a fonte de origem, 10 eram publicações de brasileiras, enquanto as 5 restantes eram gringas”, apurou o site FFW em uma matéria de 19 de agosto.

O cerne da questão, portanto, não é que o Brazilcorepor si só é um grande problema e deve ser cancelado, e sim o que a popularização da estética revela sobre o Brasil e sua relação com a moda – e com outras formas de expressão artísticas e culturais.

“Todo e qualquer tipo de arte acaba se tornando referência na moda, na música ou no cinema porque tudo está interligado. A grande questão é que só se valoriza o que vem do branco, padrão e heteronormativo. A favela e o subúrbio do Brasil gritam cultura e arte a todo tempo e são ignorados. O que sai na capa de revista e ganha reconhecimento e audiência é o que veste um corpo padrão, ou seja, o que o negro favelado e o indígena têm a mostrar sempre passa pelo aval de outras pessoas para, aí sim, ser considerado tendência ou válido”, diz Maria Cecília.

32 O B RAZI lCORE

Nesse ciclo vicioso, e cuidadosamente mantido, de tomar o que é dos mais pobres e repaginar como algo novo, a impressão que fica é a de que apenas as classes sociais mais altas têm a capacidade e a criatividade para ditar tendências – e o direito de lucrar com elas –, quando, na verdade, o streetstyletem sido revolucionado há anos por grupos que a moda tradicional prefere manter afastados, dentro e fora da indústria, usando-os como inspiração apenas quando é conveniente, mas sempre mantendo-os à margem.

Para Maria Cecília Silva, “o que falta pra mídia num geral é olhar pra dentro; tantos profissionais de moda incríveis, jornalistas, pesquisadores e estilistas que já falam sobre tendência há um tempo e não tem voz, nem vez. Agora é uma ótima oportunidade pra gente valorizar o que é nosso, sem medo de ser.”

p RESENCIA l, h ÍBRIDO O u RE m OTO? PorIsabellaBotelho

Frente ao avanço preocupante do coronavírus, o retorno ao presencial definitivo era uma realidade cada vez mais distante e, em meses, o até então inédito homeofficefoi abraçado – ao menos por grande parte das empresas com atividades que permitiam realização remota. Apesar das dificuldades de implementação e adequação sentidas inicialmente, o modelo mostrou seus benefícios, entre os quais a flexibilidade e a possibilidade de otimizar o trabalho, além da redução de gastos como o transporte, por exemplo – o que chamou a atenção de ambos os lados, vale ressaltar.

Por outro lado, desvantagens do home officetambém transpareceram: era necessário que a equipe tivesse sincronia e compromisso em manter uma boa comunicação e um bom fluxo de trabalho, pois qualquer descompasso poderia gerar problemas e consequências. Além disso, com o tempo, cresceu a dificuldade de separar o horário de trabalho do horário de descanso. No mais, para muitos, tornou-se solitário trabalhar em casa.

Essas mudanças abruptas na rotina de profissionais e o isolamento contribuíram para um menor convívio social, como aponta reportagem da CNN Brasil ao apresentar um compilado de pesquisas sobre o tema. De acordo com um levantamento feito pelo LinkedIn em 2021, 62% dos respondentes afirmaram sentir-se mais ansiosos e estressados com o trabalho em comparação com o período anterior à introdução do homeoffice .

Esse dado demonstra como o Brasil, que antes da pandemia já ranqueava entre os países com maiores índices de ansiedade e depressão do mundo, viu esses números aumentarem ainda mais, principalmente entre os trabalhadores. Falando especificamente da saúde mental ligada ao trabalho, a Síndrome do Burnout (SIB) também figurou entre as doenças mais diagnosticadas em profissionais no período. Descrita como uma “combustão”, a SIB é o último estágio do estresse e do esgotamento físico e mental causados pelo labor. Em janeiro de 2022, passou a ser considerada uma doença ocupacional pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

Entre os fatores que contribuíram para este adoecimento, junto à solidão, estão o aumento da jornada, a transformação do lar num local de trabalho, a conciliação com atividades domésticas e a sobrecarga emocional causada pelo medo do coronavírus.

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D ESDOBRA m ENTOS DO hOmE OffICE

Com o surgimento e a aplicação das primeiras vacinas, os casos de covid-19 começaram a diminuir. Medidas menos restritivas foram anunciadas, e era hora de escolher entre uma lenta retomada ao presencial e a manutenção do homeoffice de forma integral. Assim, novas opções de formato de trabalho, que já existiam antes da pandemia, passaram a ser consideradas e mais aceitas por empresas: o trabalho remoto, que pode ser feito de qualquer lugar, seja de um café ou de um avião, por exemplo; e o trabalho híbrido, que mescla o presencial e o remoto. Mas como escolher o que seria melhor para a saúde mental e física dos funcionários, sem deixar de lado a necessidade de atender às demandas das empresas?

Enquanto o homeofficepode ser entendido como o conceito de trabalhar em dias ou situações específicas de casa, o trabalho remoto, completamente on-line , permite que um profissional trabalhe a distância, de qualquer lugar em que estiver, contanto que esteja conectado. Entre os diversos benefícios de implementar o modelo estão a flexibilidade e a liberdade concedidas ao funcionário, que pode escolher de onde cumprirá seu expediente, permitindo deslocamentos, aumento da produtividade e a possibilidade de contratação de pessoas de diferentes cidades, estados e países.

Para alguns, o modelo remoto deixa a desejar quando trata-se de interação com a equipe de trabalho. A tecnologia, ainda que abra portas para outros mercados e oportunidades, ainda não consegue suprir totalmente a necessidade da convivência pessoal, algo que o trabalho híbrido pode oferecer.

No trabalho híbrido, há um acordo entre empresa e funcionário para que as atividades sejam realizadas nas modalidades presencial e remota. Este formato dá a flexibilidade do remoto enquanto reforça a importância da rotina e da interação dos escritórios no dia a dia do trabalhador. É considerado por muitos como “o melhor dos dois mundos”, possibilitando um equilíbrio entre vida pessoal e profissional.

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Em 2021, o formato já era considerado por profissionais como a melhor opção. O estudo “O Futuro do Trabalho no Brasil”, feito pelo Google Workspace em parceria com a consultoria IDC Brasil e divulgado em janeiro do mesmo ano, apontou que 59% dos entrevistados sugeriam a adoção do trabalho híbrido às empresas no póspandemia. De acordo com a segunda edição do estudo, divulgada em setembro de 2022, o trabalho híbrido já é o modelo mais utilizado no país atualmente, adotado em 56% das organizações brasileiras , um aumento de 12 pontos em relação ao panorama anterior.

A pesquisa mais recente, que entrevistou 1.258 colaboradores de diferentes empresas nacionais entre abril e junho, demonstra ainda como o formato híbrido tem sido bem visto entre os profissionais:

afirmam que o modelo aumenta a capacidade de adaptação às mudanças de rotina

afirmam ter mais bem-estar e saúde mental

o consideram como o melhor formato de trabalho para si e para a empresa

se sentem muito produtivas

De tendência, o trabalho híbrido passou a ser uma realidade no mercado de trabalho nacional e objetivo de muitos profissionais que atuam em outros formatos. Prova disso é que 65% dos colaboradores que atualmente estão no modelo presencial e 54% que estão em formato remoto trocariam seus empregos para trabalhar de forma híbrida.

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Fonte: O Futuro do Trabalho no Brasil
81% 75% 73% 58%

Entre as principais razões para se optar pelo trabalho híbrido está uma das mudanças mais marcantes ocasionadas pela pandemia do coronavírus: as pessoas, em sua maioria, repensaram a forma como querem trabalhar e, sobretudo, suas prioridades profissionais e pessoais. Agora, há uma valorização, entre outros pontos, de fatores como um menor tempo de deslocamento até o escritório, uma rotina mais participativa com as pessoas com quem mora, a saúde mental e a flexibilidade de horários.

Este último ponto, inclusive, tem sido a peça decisiva para que o profissional moderno leve em consideração uma vaga de emprego – o poder de escolha, inclusive, pode ser entendido como uma manifestação de liberdade.

Um estudo global realizado pela Microsoft apontou essa mudança de comportamento dos colaboradores: 53% dos entrevistados priorizam a saúde e o bem-estar em vez do trabalho, comparado a antes da pandemia, e 47% preferem priorizar a família e a vida pessoal ao trabalho.

No entanto, esses fatores, como já apresentado, não alteram a demanda de que o profissional vá ao escritório algumas vezes por semana ou mês, principalmente pela necessidade humana de manter relações pessoais e sociais com os colegas de trabalho, elemento que tem influência direta na forma como a equipe trabalha.

Acompanhando essas mudanças, empresas e organizações entenderam que o foco deve ser a produtividade, a entrega do profissional e seu desempenho para atingir os resultados desejados.

Da mesma forma que o modelo remoto, o trabalho híbrido também tem suas desvantagens, ou melhor, desafios. Embora esteja se consolidando no mercado, o formato exige preparação para ser implementado, tanto dos profissionais quanto das empresas. Com boa parte das tarefas sendo realizadas de maneira on-line , a comunicação fica restrita às plataformas de conversa e videochamada, o que requer habilidade no gerenciamento da comunicação interna para que esta esteja sempre alinhada. Para isso, lideranças e gestores devem estar prontos para administrar, acompanhar, controlar atividades e lidar com possíveis falhas na comunicação e imprevistos. A comunicação e a colaboração são as bases do trabalho híbrido.

Mais importante ainda, as empresas devem entender o contexto e a realidade de cada funcionário e, acima de tudo, que eles são únicos. Logo, é indispensável que haja uma análise social neste processo de implementação do trabalho híbrido. Desta forma, é possível entender as necessidades de cada um e desenvolver possibilidades para que os funcionários possam, de maneira igual, trabalhar. Sem levar esse fator em consideração, é provável que os funcionários se sintam deslocados e desmotivados, o que impacta diretamente no que é entregue.

E quando falamos em criar oportunidades aos colaboradores, não se trata apenas de fornecer tecnologia e aparelhos como notebookse celulares (essenciais), mas estabelecer políticas organizacionais que possibilitem que todos se sintam à vontade e confiantes para falar e serem ouvidos, seja num expediente de casa, do café ou do escritório. Dar as mesmas condições aos colaboradores torna o trabalho mais eficiente.

Outros desafios detectados pela pesquisa encabeçada pelo Google Workspace são: abraçar as particularidades de cada geração para que todos vivam a mesma experiência; criar valor para os dias de ida ao escritório, deixando a ida menos protocolar e mais atrativa; integrar quem está chegando com quem já está na empresa; e definir estratégias claras, mas que não tirem a autonomia das pessoas.

O TRABA lh O p RESENCIA l f ICO u NO pASSADO?

A resposta é não. Para alguns profissionais, pessoalmente, o que mais se adequa é trabalhar no escritório todos os dias. De acordo com o estudo do Google Workspace, em 2022, 25% das empresas brasileiras mantêm o modelo presencial.

É o caso da profissional de mídia amazonense Luana Cavalcante. Mesmo trabalhando em uma agência de marketing e publicidade que adota o modelo híbrido, ela opta por ir ao escritório todos os dias. Em entrevista à Mercadizar, Luana explicou que a escolha se dá por ser o formato com o qual ela se sente mais confortável para trabalhar.

“Para mim, sempre funcionou melhor presencialmente. Reconheço os benefícios de estar remoto ou híbrido, mas vejo o presencial prático para se resolver situações que podem surgir entre a equipe de forma rápida e eficiente. Acredito também que melhora a integração dos funcionários como um todo, faz com que as atividades fiquem muito mais alinhadas e desenvolve o viver em comunidade, tendo uma troca de experiência e aprendizado.”

q u A l DOS m ODE l OS

Essa é uma pergunta que paira na organização de muitas empresas, mas é necessário entender que não há um modelo melhor que o outro, há o que se adequa melhor às necessidades da empresa e de seus funcionários. Por isso, o recomendado é que esta decisão seja tomada em comum acordo, para que ambas as partes sejam beneficiadas. Somente assim poderão ser criadas relações de trabalho saudáveis.

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ESCO lh ER?
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umESpETáCulOCONSTRuÍDOpElASmãOSDEmulhERES PorTuaneSilva

Durante três noites, em uma arena chamada de Bumbódromo, o festival conta a história dos bois Caprichoso e Garantido, os mais queridos de suas fazendas. Diz a lenda que o boi é morto por Pai Francisco a fim de saciar o desejo de sua mulher grávida, Mãe Catirina, de comer língua de boi. Pai Francisco e Mãe Catirina são trabalhadores do Amo do Boi, dono da fazenda. Com medo da punição, Pai Francisco busca um pajé para ressuscitar o animal, dando início a um ritual indígena que culmina na reencarnação do boi, celebrada com uma grande festa.

Antes de o Festival de Parintins se tornar grandioso e receber um palco próprio, ele acontecia nas ruas da cidade: de casa em casa os brincantes festejavam o boi-bumbá. De acordo com o estudo “O Boi-Bumbá de Parintins, Amazonas: breve história e etnografia da festa”, da pesquisadora Maria Laura Cavalcanti, a manifestação popular em Parintins iniciou-se por volta de 1913, com a fundação dos boi-bumbás Caprichoso (boi preto com estrela na testa) e Garantido (boi branco com coração na testa). A brincadeira do boi de rua foi crescendo, assim como a rivalidade entre Caprichoso e Garantido, até que os dois dividiram a Ilha Tupinambarana – como é conhecida Parintins – ao meio nas cores azul e vermelho.

Segundo o artigo, os bois brincavam em terreiros e saíam nas ruas, onde confrontavam-se com desafios e inevitáveis brigas, pois, quando se encontravam, nenhum queria deixar o outro passar ou voltar para trás. Raimundo Muniz, ao ser entrevistado em 1999, ressalta que “era brutal mesmo, era assim, não tinha meio termo: encontrou e iam para a briga. Dava prisão, o delegado mandava prender quem puxou a briga”.

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O boi-bumbá, então, alcançou o nível de festival por conta da mobilização da cidade, e no decorrer do tempo é possível notar que incorporou mais as culturas indígena, cabocla, ribeirinha, negra e ambiental em seu contexto.

O primeiro festival no formato de disputa ocorreu em 1966, com o critério de vitória ficando pelos aplausos do público. Atualmente, para decidir qual dos bois será o campeão, uma comissão de jurados de diferentes estados do Brasil, que não sejam da Região Norte, são convocados para avaliar cada noite do evento. Os itens individuais e coletivos, que podem ser entendidos como os personagens da lenda e até mesmo a torcida, são avaliados e recebem notas.

A competitividade entre as duas agremiações levou à eleição a dedo de pessoas que pudessem encarnar esses itens e representar o mix de elementos que é a cultura popular amazônica. As mulheres entraram em cena no Bumbódromo, inicialmente, para dar vida a Sinhazinha da Fazenda (filha do Amo do Boi), Cunhã-Poranga (indígena guerreira), Porta Estandarte (quem carrega o estandarte da agremiação) e Rainha do Folclore (representante das lendas). Todas devem ter algo em comum: a beleza amazônica, a mistura perfeita do indígena e do caboclo, e a delicadeza e garra ao defender o seu boi amado na arena. Mas a presença feminina no festival não é limitada aos itens.

q u ER CON h ECER OS ITENS DOS BOIS DE pARINTINS?

A CESSE O q R CODE:

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A pARTICI pA çã O f E m ININA NA CONSTR uçã O DA BRINCADEIRA DE BOI

As roupas usadas por todos os brincantes, as alegorias e o som que vem da marujada e da batucada têm o envolvimento de mulheres. Vê-las participando do boi-bumbá atualmente é muito comum e não causa estranhamento, afinal, as mulheres são mais da metade da população. Mas para chegar até esse ponto não foi tão simples, como conta a artesã Maria Andrade, primeira mulher a trabalhar em um galpão de boi, em entrevista ao portal A Crítica no ano de 2018: no início, os próprios bois não permitiam que mulheres participassem das brincadeiras de rua. O pai de Maria, um cearense conservador, seguia a mesma linha dos bumbás e não a deixava brincar de boi.

Outro relato que soma à fala de Maria é do Sr. Manoel Ribeiro. Em trecho retirado do artigo “A Representação da Mulher no Festival Folclórico de Parintins”, ele conta: “Nos anos de 1968 e 1969 eu comecei a brincar no boi. A mulher entrou no boi nessa época; no Garantido começou com a rainha da fazenda, que na época era a Malra. No Caprichoso, a primeira rainha foi a Rosita, filha dos donos do boi naquela época. Mas tudo isso começou a mudar as figuras. Pra mulher brincar no boi, tinha que pedir, e tinha pai que não deixava. Ainda tem outro detalhe que muita gente não sabe: a mulher, pra ser item no boi como miss, rainha da fazenda ou alguma coisa assim, não podia ser falada. Entende o que é falada? Ela tinha que ser moça, tinha que ser virgem”.

Nessa época, seu irmão tinha um “boizinho de quintal”, para o qual ela fazia roupinhas. Aos 13 anos, surgiu seu interesse por corte e costura: “Fiz cursos na área, coloquei pra aprender mesmo. Aos meus 16 anos já sabia fazer roupa, e não parei mais. Entrei no boi com 21 anos. Desde lá até hoje sou costureira do Caprichoso”.

Cleunice, também costureira do Caprichoso, destaca o amor e o comprometimento com a produção de indumentárias: “Eu me sinto muito feliz em ver os brincantes vestidos com as roupas que eu faço, fico emocionada”. Quando se trata da produção de alegorias, que podem chegar a mais de 20 metros de altura, a presença feminina também não passa despercebida. Clara, artesã do Garantido, destaca a força da mulher na função e sua valorização: “Nós podemos mostrar que somos capazes de fazer o que um homem faz. Eu faço o mesmo trabalho de homem dentro dos grupos; não só eu, como outra mulher que trabalha lá também”.

O trabalho dessas mulheres ultrapassa, inclusive, as barreiras regionais. Quando a temporada do boi termina, muitas prestam serviços para escolas de samba do Rio de Janeiro e de São Paulo, confeccionando fantasias, indumentárias, alegorias e carros alegóricos para os carnavais das duas cidades. O conhecimento e a criatividade parintinense são destacados pelo comentarista de Carnaval Milton Cunha, nascido no Marajó, Pará, pela tecnologia das grandes alegorias com movimento, a pintura realista e a excelente arte plástica produzida por artistas parintinenses.

Da mesma forma que a bateria é a alma das escolas de samba no Carnaval, no boi-bumbá de Parintins a marujada do Caprichoso e a batucada do Garantido dão o ritmo da festa. Mas a predominância masculina na área não afugentou as mulheres de integrarem estes grupos.

Em 1993, Edssandra participou do festival pela primeira vez como torcedora e saiu de lá uma perreché, como são chamados os torcedores do Garantido. O amor foi tanto que ser torcedora, ela conta, não foi o suficiente: em 2007, Edssandra entrou para a batucada. Hoje, é coordenadora do setor de naipe rocar, instrumento musical similar ao chocalho, composto por vários pratos que soam ao serem sacudidos.

À Mercadizar, ela falou sobre a presença da mulher na área: “Essa é a melhor parte do festival: todos podem participar – inclusive nós, mulheres, podemos atuar em várias áreas. Estamos na história do boi-bumbá como presença forte e aguerrida. Temos vários nomes femininos fortes e atuantes nesse legado”.

Na arena as mulheres viraram itens, participaram do corpo de dança e ingressaram na marujada e na batucada, mas também conquistaram cargos de liderança na parte administrativa e de direção das agremiações, como destaca Carla. Atualmente marujeira do Boi Caprichoso, ela já foi diretora do galpão de fantasias.

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“Mulheres não são somente costureiras e artesãs. Temos mulheres que trabalham administrando; eu mesma, no ano de 2019, fui diretora do galpão de fantasias. Eu organizava, controlava a entrada e saída de pessoas e materiais, e também controlava os ajudantes que compunham as equipes dos artistas. Também temos mulheres trabalhando com pastelagem nas alegorias”.

A possibilidade de mulheres assumirem liderança e terem reconhecimento pelo trabalho exercido ainda não é uma situação recorrente no dia a dia. Por isso, quando isso acontece, é motivo de satisfação ver a história tomando outro curso, como aconteceu com Rafaela, artista de ponta do Garantido e a primeira mulher do boi a assinar um contrato e entrar para o quadro de figurinista do boi-bumbá.

“Hoje em dia eu sinto que o festival está mais inclusivo. Por exemplo, em 2020 fui convidada para fazer parte do quadro de figurinistas do boi-bumbá Garantido, onde até então sempre existiram mulheres fazendo parte, mas sempre nos bastidores, e nunca valorizadas como artistas.”

Em muitas situações a mulher é vista como mão de obra para dar vida às ideias de artistas homens. Rafaela destaca que sempre viu mulheres importantes para a história do boi-bumbá não terem seu devido reconhecimento, ou não ocuparem cargos de liderança nas agremiações.

Quando fui chamada para fazer parte do quadro de artistas [do boi Garantido], que até então era predominantemente [formado] por homens, só se via homens no quadro de artistas. Tanto figurinistas como artistas de ponta de alegorias sempre foram homens; até então nunca teve uma mulher artista de alegoria. Eu creio que esse quadro vai mudar, que em breve teremos mulheres escultoras, pintoras. Eu vou ficar muito orgulhosa em ver isso.”

O

ON ã O RO mpE m A TRADIçã

No Festival Folclórico de 2022, vimos um novo expoente para as mulheres. No Garantido, pela primeira vez, três mulheres entraram na arena como tuxauas, que são os líderes da tribo indígena, geralmente homens. A profissional de educação física Leiliane Silva, a fisiculturista Carol Alves e a jornalista Grace Soares foram recepcionadas ao som da voz da primeira levantadora de toadas da história, Márcia Siqueira. Do lado do Caprichoso, Hudmila Beltrão e Tayla Cabral estiveram no pedestal de pedras, assumindo o posto de maestras da Marujada pela primeira vez.

Apesar dos progressos, ainda existem avanços pendentes, como o caso de Daniela Tapajós, ex-porta estandarte do Garantido, que poucos dias após o fim do festival denunciou “terrorismo psicológico” em seu perfil pessoal do Instagram; ou a estigmatização machista das itens mulheres, como a associação à prosituição, fato denunciado em 2018 pela Cunhã-Poranga do Garantido, Isabelle Nogueira, ao portal A Crítica. Estereótipos como este surgem devido aos trajes usados na arena, que remetem à cultura indígena e à sexualização dessa imagem da mulher amazônica.

No passado, como resistência, mulheres abriram caminhos para que hoje pudessem fazer parte do boi-bumbá, mas ainda vivemos em uma sociedade que reproduz o machismo e a misoginia em diversas ações rotineiras. Por isso, a mudança é essencial para manter viva a melhor parte da cultura do boi: a manifestação folclórica que exalta os povos indígenas, o caboclo, as lendas amazônicas, a beleza do festival e o trabalho de cada integrante das agremiações.

E mudar não significa acabar com a tradição. Ao longo dos anos, foram diversas as mudanças: a inserção das mulheres, o fim do uso do blackfacepara a representação da população indígena e do caboclo, e a exaltação do povo. Mudanças como essas devem partir dos três pilares que sustentam o boi-bumbá: das agremiações que coordenam e estão à frente dos bois Caprichoso e Garantido, de empresas privadas e órgãos públicos que patrocinam o festival e dos brincantes que vivem o boi-bumbá o ano inteiro.

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S ARES DA mu DAN ç A
PorThaísAndrade D ESIgu A l DADE E fA lTA DE INC lu S ã O E m f ESTIVAIS DE música i

A música está em todos os lugares. Para alguns estudiosos, é considerada um dos principais meios de comunicação desenvolvidos pela humanidade. Onde há vida social, há música. Uma linguagem universal, que em festivais vira protagonista em grandes proporções.

E é nesse tipo de festival que acontece o encontro de diferentes gêneros musicais (em casos de festivais multigênero) e de artistas de diferentes nacionalidades, em palcos enormes com produções bem elaboradas, público de milhares de pessoas, e altos investimentos financeiros. Mas, apesar da celebração promovida por esses encontros, é comum que a diversidade de gênero fique do lado de fora da festa.

Não é novidade que a indústria da música é formada predominantemente por homens, que ocupam a maioria dos cargos de liderança em gravadoras e produtoras. Mas um outro lado da moeda muitas vezes passa despercebido: ao olharmos para os line-upsde festivais de música, fica explícito o desequilíbrio entre a quantidade de atrações masculinas e femininas.

ESIgu A l DADE E m N úm EROS

Em um artigo intitulado “A presença feminina nos festivais brasileiros de 2016 a 2018”, a pesquisadora Thabata Arruda detalha a representatividade em 76 festivais multigêneros – ou seja, aqueles que levam ao público diferentes gêneros musicais a partir de diferentes atrações – que ocorrem no Brasil.

Para calcular a participação feminina por festival, foi feito o levantamento de 1.972 bandas e artistas, categorizadas entre mulheres solistas ou bandas compostas somente por mulheres; homens solistas ou bandas compostas somente por homens; e bandas mistas (nas quais há pelo menos uma mulher na formação). Durante o período analisado, a participação de mulheres solistas ou bandas completamente femininas chegou somente à marca máxima de 20% em 2018, sendo que, anteriormente, nos anos de 2016 e 2017, a porcentagem máxima foi de 15% em ambos.

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D

Dentre os cinco festivais com maior presença feminina em 2018, o primeiro lugar, com 44%, foi para o Popload Festival, que ocorre em São Paulo. No Norte do país, e em quinto lugar no rankingda pesquisa, o festival paraense Se Rasgum alcançou a marca de 35%. O alarmante é que nenhum dos festivais brasileiros conseguiu o equilíbrio de 50% de representatividade.

Outra pesquisa, realizada pelo site especializado Pitchfork, também levantou dados sobre a falta de mulheres em line-ups . Foram analisados mil artistas contratados para os vinte maiores festivais estadunidenses multigênero de 2018. Comparando festivais de 2017 e 2018, o site afirma que a presença feminina entre os dois anos aumentou somente de 14% para 19%, o que significa que sete de cada dez artistas são homens ou bandas completamente masculinas. A análise chegou também à conclusão de que, em 2017, nenhum festival alcançou a marca de 50%, enquanto em 2018 somente os festivais FYF, Pitchfork e Panorama alcançaram esse número.

Ambas as pesquisas mostram que, em festivais de gêneros musicais específicos, a presença das mulheres tem tendência a ser menor. O exemplo que se repete nas duas pesquisas é o de festivais de rock, onde a presença de atrações femininas é quase nula. Thabata Arruda destaca que um dos casos mais explícitos de falta de representatividade feminina nos line-ups brasileiros ocorreu em 2017, quando a cantora Pitty foi a única mulher a fazer parte da lista de atrações do festival João Rock. Outro fato que também chama a atenção é Anitta ter sido a única mulher a se apresentar na edição do Planeta Atlântida do mesmo ano.

Em 2019, Thabata Arruda deu continuidade às análises, fazendo o diagnóstico de 844 atrações de 24 festivais. Desta vez, o número de solistas mulheres e bandas formadas somente por mulheres chegou a 23,5%. Ou seja, em quatro anos consecutivos de pesquisa, de 2016 a 2019, o aumento feminino nos line-upssequer chegou a 10%.

Porém, na análise das 844 atrações, mais uma desigualdade foi percebida: no recorte racial, a proporção “foi de uma mulher negra para cada 14,1 homens (brancos e negros), e uma artista negra para cada 2,4 artistas mulheres brancas”.

Artistas pretos, indígenas e que fazem parte da comunidade LGBTQIAP+ também são deixados de lado durante a curadoria dos principais festivais de música que ocorrem no Brasil. E os motivos são enraizados socialmente: racismo, preconceito, LGBTfobia, preconceito musical e outros. A solução não seria apenas incluir mulheres nos line-ups,e sim aumentar a representatividade de maneira geral. Ter como atrações somente homens – em sua maioria brancos – não reflete a realidade da população brasileira.

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PorThaísAndrade

Enquanto espetáculos midiáticos, principalmente se tratando dos festivais de notoriedade nacional, esses eventos têm importantíssimo papel social e abrangência de público, o que significa que debates e discussões pertinentes poderiam fazer parte dos festivais de música de maneira mais efetiva. Em 2019, segundo Thabata Arruda, na lista dos seis festivais com menos mulheres solistas, o Lollapalooza Brasil ficou em sexto lugar, com somente 10,6% de atrações desse tipo. Isso mostra o quão negativo é este cenário, considerando que o Lollapalooza é um dos maiores festivais do país.

A RETO m ADA DOS f ESTIVAIS DE mú SICA

Com os números de casos de covid-19 diminuindo no Brasil, e com o avanço da imunização, os festivais de música voltaram a fazer parte do circuito cultural das grandes cidades. Para esta matéria, a Mercadizar analisou o line-updo Lollapalooza 2022, primeira edição do festival a ocorrer depois da flexibilização da pandemia, e os dados não são animadores quando comparados a 2019.

Das 70 atrações que se apresentaram nos três dias de Lollapalooza, somente 15 são mulheres solistas, ou seja, cerca de 21% de todo o line-up . Apesar da edição de 2022 levar aos palcos alguns poucos artistas LGBTQIAP+ e negros – com cerca de 20% de representatividade de cada grupo –, nenhuma atração do festival é natural da Região Norte do Brasil, que aparentemente continua invisível para a curadoria de festivais de fora da região.

A Mercadizar analisou também os artistas que se apresentaram em 2022 no Rock In Rio (RIR), considerado o maior festival de música realizado no Brasil, e que também retornou após a crise sanitária de covid-19.

Neste caso a desproporcionalidade também fica nítida. No Palco Mundo, principal palco da Cidade do Rock, se apresentaram 21 atrações masculinas, enquanto somente sete mulheres solistas conseguiram entrar no line-up,sendo somente duas delas brasileiras. Um detalhe que chama a atenção é que quatro dos sete dias de festival receberam somente homens no Palco Mundo, enquanto, no último dia de apresentação, somente mulheres se apresentaram no local.

O segundo palco mais importante do RIR é o Palco Sunset, que também passou por análise. Das 26 atrações anunciadas, 17 eram masculinas, enquanto as mulheres solistas, apenas nove. Algumas outras mulheres também se apresentaram em participação, a convite dos artistas anunciados como atrações. Mayara Andrade, Mc Carol, Drik Brabosa, Priscila Alcântara, Marina Sena e Luedji Luna foram as que subiram no palco como convidadas.

Do ponto de vista financeiro, os festivais têm como objetivo o lucro – é claro –, o que significa que o alcance de público de determinados artistas é interessante para a venda de ingressos. Porém, quando olhamos de perto as prioridades dadas a artistas masculinos e femininos, o argumento de engajamento de público e número de ouvintes não parece ser levado tão em conta assim na hora de montar o line-up .

Prova disso é que algumas mulheres escaladas para se apresentarem no Palco Sunset do Rock In Rio têm milhões de ouvintes a mais no Spotify que artistas homens que se apresentaram no Palco Mundo. A partir de dados do Spotify, maior serviço de streamingde música do mundo, é possível verificar que Avril Lavigne, por exemplo, com seus mais de 15 milhões de ouvintes mensais, tem muito mais notoriedade entre o público que a banda Iron Maiden, que tocou no Palco Mundo e tem cerca de 7 milhões de ouvintes mensais.

Outros nomes do Palco Sunset, como Jessie J (com mais de 13 milhões) e a cantora brasileira Ludmilla (8 milhões), superam com facilidade artistas como Gojira (1 milhão), Sepultura (1 milhão), Jota Quest (2 milhões) e Billy Idol (8 milhões), que se apresentaram no Palco Mundo.

A curadoria do Até o Tucupi, festival que ocorre na cidade de Manaus, passou por um processo até levar em consideração diversos tipos musicais e a presença de mulheres, pessoas LGBTQIAP+ e negras. O resultado do esforço, segundo Elisa, foi um festival com curadoria intencional que valoriza e, de fato, põe em prática a diversidade. “Levamos em consideração o trabalho que o artista vem desenvolvendo e o potencial de mobilização de público que esse artista tem, mas a premissa da representação legítima da sociedade amazônica, uma sociedade que é negra e indígena, a gente coloca com fundamental, e faz essa conexão também com artistas que vêm de fora”, detalha. “O palco do Até o Tucupi faz música para, de alguma forma, também debater política, representatividade e outras causas.”

Para Elisa, uma importante ação a ser tomada é pensar sobre a paridade de gênero, não só nos palcos, mas também na diversidade de atividades e na formação das equipes de produção e gestão do festival. Um exemplo é o Psica, de Belém, no Pará, “que é um festival gerido por pessoas negras e tem uma narrativa periférica, uma narrativa de pessoas negras, e da periferia de Belém”.

Os exemplos desses dois festivais locais de pequeno e médio porte condizem com o que afirmam as pesquisas de Thabata Arruda: festivais menores têm maior presença de mulheres, e de diversidade, em suas programações.

Quando analisamos festivais de grande porte que ocorrem em Manaus, maior cidade da Região Norte, a desigualdade de gênero volta a aparecer. Na mais recente edição do festival Samba Manaus, nove atrações foram anunciadas, todas elas exclusivamente formadas por homens. No cartaz de divulgação do evento, 19 homens que fazem parte dos grupos anunciados estampam a falta de diversidade. Outro exemplo é o Sou Manaus Passo a Paço – o maior festival de música da cidade, que também é público e gratuito –, que, na edição de 2022, teve cerca de 77% de atrações masculinas, contra 23% femininas, em análise que não engloba as atrações infantis.

Os festivais de grande porte da cidade até conseguem incluir em seus line-ups artistas de outras regiões, mas o problema é que o contrário ainda não acontece.

“Os festivais pelo resto do país não se sentem obrigados a ter uma representação de artistas da Amazônia. No entanto, vários deles estão levantando pautas relacionadas à sustentabilidade, ao meio ambiente e a questões climáticas, mas sem estar ocupando espaço nesses eventos”, destaca Elisa Maia.

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O pA pE l SOCIA l DOS f ESTIVAIS

Segundo análise feita pelo Pitchfork, a presença de mulheres nos palcos dos festivais vem aumentando nos anos analisados, porém em passos muito curtos e lentos, o que dá a perspectiva de que a igualdade de gênero nesta área possa até ser alcançada, mas somente em um futuro distante.

Conforme descreve Eric Hobsbawm no livro “Tempos Fraturados”, no capítulo “Por que realizar festivais no século XXI?”, festivais de música estão relacionados a culturas jovens. Para o autor, a principal característica dos festivais é “a descoberta de formas em desenvolvimento de comunicação artística e experiência estética, quase sempre pelo surgimento de novos grupos de público que se organizam por conta própria”. Além disso, para Audi Arruda, “o propósito do festival não é só gerar lucro. O propósito do festival é mostrar novos talentos, novos estilos musicais e novas possibilidades para o público”.

Se essa comunicação artística é influenciada por novos grupos, é de se esperar que a indústria da música acompanhe a juventude; afinal, esse é o principal público de interesse dos festivais. O comportamento contestador e crítico em relação a debates sociais como machismo, racismo e LGBTfobia já é característico de gerações mais jovens, mas continua invisível nos line-upse na organização dos grandes festivais.

Segundo Hobsbawm, “os festivais, velhos e novos, que se mantiverem abertos em novas direções podem desempenhar um papel mais importante na vida cultural do nosso mundo globalizado, em seu estado de contínua sublevação, do que no século passado”.

Ou seja, a importância de os festivais de música serem mais inclusivos e terem mais diversidade vai além da adaptação dos lineups. Para o autor, os festivais são parte de uma experiência cultural e social, e estão – ou deveriam estar – ao lado do que a arte se propõe a fazer enquanto objeto de expressão e contestação. Ainda que tenham encontrado no século XXI seu apogeu, os maiores eventos desse tipo ainda pecam quando o assunto é cumprir com seu papel social inclusivo.

Os levantamentos feitos pelo Pitchfork indicam que as principais mudanças em relação às escolhas e melhorias dos line-ups devem começar com os maiores festivais do mercado musical, pois são eles que podem correr mais riscos, já que a popularidade faz seus ingressos esgotarem mesmo antes do anúncio oficial das atrações. Tal tomada de riscos e a mudança na dinâmica de escolha dos line-upspoderia, segundo o site, influenciar os festivais de médio porte a adotar outro sistema de escolha, tendo em vista que, enquanto alguns deles “desenvolvem seu próprio caráter único, muitos outros imitam os líderes da indústria ou são operados por promotores compartilhados, criando ‘mini-Coachellas’ regionais que carregam ou amplificam vieses sistêmicos”.

A mudança, então, tem que acontecer a partir dos líderes do mercado. E não basta somente reestruturar o modelo de escolha e os critérios de curadoria dos festivais de música de maior apelo midiático. A principal questão que envolve o problema de desequilíbrio de gênero na área da música é a mesma que afeta todos os âmbitos sociais – LGBTfobia, racismo, machismo estrutural e sociedade historicamente patriarcal –, o que, por sua vez, implica na mudança a longo prazo de um sistema culturalmente complexo.

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q u E m O lh A p RO N ORTE?

Há dez anos o PMKT acredita na valorização e no reconhecimento dos profissionais que criam com mínimos recursos e sem visibilidade.

A bússola sempre aponta para o norte. Mas quem realmente olha para o Norte? Quem conta a história do Norte? Quem contrata o Norte?

A comunicação, o entretenimento e a cultura do nosso país são centrados no eixo RJ-SP. Quantos nortistas são referências na comunicação, cultura e arte do Brasil?

É necessário abrir o caminho para que as histórias sejam contadas também por quem as vive.

Foi com este manifesto que o PMKT, em sua 11ª edição, sendo a segunda sob o comando do Mercadizar, expandiu seus horizontes para contemplar todo o Norte. A premiação, nascida e criada no Amazonas, pela primeira vez esteve disponível para que empresas, profissionais, estudantes e artistas dos outros seis estados nortistas concorressem aos troféus, dando vida ao sonho de sua criadora, Eulália Ribeiro: “fazer com que a região seja reconhecida e que o Prêmio seja um grande encontro de profissionais”.

Para fortalecer também a cultura nortista, outra novidade da edição ficou por conta da inclusão de um troféu dedicado à música.

O Troféu MDZ, com as categorias “Música do Ano”, “Clipe do Ano” e “Artista do Ano”, se somou aos já conhecidos e também reestruturados Troféu Criação Publicitária, Troféu Profissionais, Troféu Top Marketing e Troféu Acadêmico Victor Ribeiro.

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Para avaliar os trabalhos inscritos, foram convidados mais de 40 profissionais das áreas de comunicação e criatividade brasileiras. Conheça cada um deles:

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Entendendo que a troca de experiências é fundamental, como forma de aproximar ainda mais comunicadores e criativos brasileiros de forma democrática, além da premiação, o PMKT 11 também conta uma programação presencial inédita com palestras e painéis voltados à comunicação e à criatividade, com a participação de Vinícius Magalhães, do Twitter; Alice Rosas, da Converse Brasil; Tony Aiex, do Tenho Mais Discos Que Amigos!; Yheuriet Kalil, da agência Mosaico; Vanessa Queiroz, do Colletivo de Design e agência Moonstro; Felipe Silva, da agência GANA e Escola Rua; e Chay Santos, da agência Mangarataia.

No palco Música by Converse, o evento contempla shows das nortistas Beatriz Procópio e Rafa Militão.

Quer conferir conteúdos exclusivos, conhecer os vencedores e ter acesso à transmissão da premiação?

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A B ú SSO l A SE mp RE A pONTA pARA O N ORTE

O Mercadizar é uma plataforma de comunicação e de transformação. Nosso propósito é ser instrumento de incentivo e valorização para a Região Norte.

Acesse as edições anteriores:

Para propostas comerciais, parcerias, sugestões de pautas, reclamações ou dúvidas: contato@mercadizar.com

CEO Eulália Ribeiro

Direção & Edição Executiva Mariana Moreira

Jornalista Responsável & Planejamento Isabella Botelho MTB 1395/AM

Repórteres

Thaís Andrade Tuane Silva Mariá Moritz Tomazoni

Direção de Criação Mariana Moreira

Design & Diagramação

Jéssica Pinheiro

Revisão Mariá Moritz Tomazoni

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Capa

Jéssica Pinheiro

Colaboradores

Cauê Paciornik Rodrigo Cordeiro

Crédito de Imagens Pexels

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