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OPINIÃO

O crescimento de Moçambique no pós-Pandemia

Bruno Dias • EY Partner | Business Consulting

Élícito dizer que moçambique se encontra em fase de recuperação após a terceira vaga de casos de covid-19, que atingiu, no seu pico, cerca de 1900 casos diários de infectados. Devido às restrições impostas pelo Governo e às campanhas de vacinação da população, o número de casos diários reduziu para cerca de 50. Os valores da população vacinada são ainda baixos, mas o Governo planeia vacinar 6,4 milhões de pessoas (20 % da população) até Dezembro de 2022.

Como se a pandemia não bastasse, foi necessário lidar com outros problemas do passado próximo, como a destruição causada pelos ciclones Idai e Kenneth, a insurgência na

Província de Cabo Delgado e a suspensão dos megaprojectos de gás natural. É caso para dizer… que mais irá acontecer?

De facto, a economia moçambicana foi afectada significativamente em 2020 devido ao impacto da pandemia, instabilidade política e desastres naturais e contraiu pela primeira vez desde 1992. Adicionalmente, entre Março de 2020 e Janeiro de 2021 houve grandes oscilações de câmbio em relação ao USD.

O Governo de Moçambique tomou várias medidas sociais para conter o impacto da pandemia, como a redução do número de pessoas em ajuntamentos, a redução de horários de funcionamento e o recolher obrigatório. Contudo, aqui, como a nível Global, estas medidas de mitigação têm levado a custos e perdas económicas significativas.

Um estudo recente da CTA indica, sem surpresas, que o sector da Hotelaria e Turismo foi o mais afectado, tendo registado uma retracção do nível de actividade em mais de 75%. O nível de actividade empresarial reduziu em cerca de 65% no primeiro semestre de 2020 e contribuiu para a redução do rendimento dos agregados familiares, particularmente ao nível das zonas rurais.

Como sabemos, foram implementadas um conjunto de medidas fiscais e de política monetária ou financeira com o objectivo de minimizar este impacto. São de destacar as isenções fiscais temporárias e direccionadas para apoiar as famílias e o sector da saúde, a disponibilização de uma Linha de Crédito para os bancos (US$ 500 M), por um período de nove meses, e a abertura no BNI de uma linha de crédito à tesouraria e investimentos para as Micro, Pequenas e Médias Empresas. Estas medidas foram as possíveis e são de louvar, mas constituem um paliativo face ao impacto previamente referido. Moçambique joga um campeonato diferente quando comparado com economias desenvolvidas, que injectaram muita liquidez através de vários pacotes de estímulos económicos e pagamentos directos aos indivíduos. A título de exemplo, o Governo dos EUA aprovou três fases de financiamento de emergência para combater o coronavírus e os seus impactos. A primeira fase totalizou US$ 8,3 Mil M, a maioria dos quais foram para suprimentos médicos e P&D, mas US$ 1,25 Mil M foram para medidas de estabilização económica, como empréstimos para pequenas empresas. A segunda fase totalizou US$ 100 Mil M e destinou-se ao financiamento de licenças remuneradas obrigatórias, programas de assistência alimentar e pagamentos relacionados com desemprego. A terceira fase totalizou US$ 2,2B e incluiu pagamentos directos de até $ 1200 a indivíduos, aumento dos benefícios de desemprego, US$ 350 Mil M em empréstimos para pequenas empresas e U$ 500 Mil M em fundos de empréstimo para apoiar grandes empresas ($ 25 Mil M para companhias aéreas). Estamos a falar de uma resposta de outra capacidade e magnitude (!)… mas não desesperemos. Existem alguns factos que contribuem para um panorama económico de melhoria para Moçambique e que nos devem manter optimistas. Se não vejamos: No contexto interno, a situação em Cabo Delgado parece estar mais controlada e já se começa a falar da retoma

Em primeiro lugar, a vacinação da população é chave para a retoma “do normal” e as empresas conseguirem atingir o volume de receitas pré-pandemia. Este facto terá de ser garantido por via de financiamento público, privado, cooperações, multilaterais, etc.

Com o controlo do conflito em Cabo Delgado, renasce a esperança da retoma dos projectos de gás

dos megaprojectos de Oil & Gas. Houve recentemente uma visita a Moçambique de elementos da gestão de topo da Exxon, que reafirmaram o empenho no projecto. É também de salientar que Moçambique aprovou, no primeiro semestre de 2021, um total de investimentos no valor de US$ 753 milhões destacando-se o sector da Energia. No contexto externo, é notório que economias fortes mostram sinais de recuperação e de volta “ao normal”. Isto é relevante para Moçambique no contexto da balança de exportações e tendo em conta que é fortemente dependente de doações e fluxos de capitais de investimentos estrangeiros. Mas há muitos riscos e diversos factores a ter em conta para garantir o crescimento da economia. Em primeiro lugar, a vacinação da população é a chave para a retoma “do normal” e as empresas conseguirem atingir o volume de receitas pré-pandemia. Este facto terá de ser garantido por via de financiamento público, privado, cooperações, multilaterais, etc. Em segundo lugar, aumentar o consumo interno é de importância capital no curto prazo e pode ser dinamizado com subsídios ou medidas de fomento ao emprego e programas de protecção social que garantam assistência alimentar e apoios ao tecido informal, que é altamente relevante na economia. Em terceiro lugar, é fundamental diversificar a economia e diminuir a dependência do actual modelo de crescimento assente nos megaprojectos e continuar a senda da melhoria das infra-estruturas e do tecido primário. E, por último, é prioritário garantir sustentabilidade fiscal que será apenas possível com esforços de eficiência da mobilização de receitas e aumento da eficiência na despesa pública. Eu, como “Jazz Lover”, lembro-me sempre, a propósito destes temas, de um clássico – o “Pick yourself up” - cujo refrão tem a receita necessária: “Pick yourself up, dust yourself off and start all over again”. Vale a pena ouvir a versão da Ella Fitzgerald que tem um swing bem-disposto e o beat que é necessário neste contexto. É esta a mensagem de optimismo que gostaria que prevalecesse. É um facto que Moçambique tem tido, nas últimas décadas, vários ciclos de aparente crescimento forte que foram interrompidos, e que este passado recente foi complexo e desafiante, mas como a maioria dos gestores sabem, e particularmente os mais empreendedores, os ciclos económicos são isto mesmo e a resiliência é chave.