Profissões da nossa Terra: Taxista

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Jornal

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quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

VILACONDENSE

Sociedade Ainda não faz uma década que está no mundo dos táxis, mas já afirma que “é a profissão que mais gostei”. O desemprego e as obrigatoriedades da vida fizeram-no enveredar por um caminho profissional diferente. Abriu uma vaga na Câmara Municipal de Vila do Conde e comprou a licença de motorista de táxi a um antigo colega. “A Câmara Municipal tem que limitar o número de licenças porque já somos muitos”, afirma Hernâni Maciel. Recorre aos seus papéis que guarda religiosamente no táxi e constata que “hoje temos 22 taxistas na cidade de Vila do Conde. Com os taxistas das freguesias somos um total de 53”. Os dias de um táxi já foram mais gloriosos, com maior rentabilidade e rotações dos motores. A somar ao excessivo número de taxistas, existem ainda “carros privados na clandestinidade”, um problema que o taxista afirma ser complicado de solucionar. “Todos os dias temos menos trabalho!”, exclama. Os paradigmas atuais alteraram a realidade do negócio dos táxis. O Metro do Porto facilitou as deslocações entre Vila do Conde e a cidade Invicta e os serviços reduzidos do hospital reduziram em grande escala as rotas que se faziam para trazer e levar os doentes. “Depois vieram as malas de rodinhas e as pessoas já não precisam de um táxi para as levar ao metro ou ao aeroporto”, afirma Hernâni Maciel. O desemprego é, ainda, um obstáculo para os taxistas. “Também nos tira trabalho. Quando a mãe ou a avó querem sair e têm o filho ou marido em casa no desemprego, acabam por não precisar de um táxi”, explica. À conversa com o taxista Hernâni Maciel num solarengo sábado à tarde o desânimo pela falta de trabalho é evidente. “Neste sábado não fiz nada. Estou cá desde as nove horas e até agora, às cinco da tarde, não fiz um único serviço. Daqui a nada vou para casa”, confessa. Hernâni não define o trabalho de um taxista como “pesado, por vezes até é leve demais. Torna-se pesado não fazer nada. Cansa-nos mais estar parados na praça de táxis do que estar a trabalhar”. Quando começou a conduzir um táxi ainda trabalhava à noite. Esperava

“Profissões da nossa terra”

Taxista Hernâni Maciel: “Cansa-nos mais estar parados na praça de táxis do que estar a trabalhar” Taxista em Vila do Conde, Hernâni Maciel já viu dias melhores. Dias em que os táxis entravam e saíam das praças a um ritmo rápido. Gosta de ser taxista, de transportar pessoas e ouvir os seus desabafos.

“O mais pobre e o mais rico merecem o mesmo tratamento. Pode ser a pessoa mais pobre, mais mendiga, mas quando entra no carro merece respeito”, refere Hernani Maciel.

que lhe batessem à janela do táxi para requisitar um serviço. Hoje, o esforço já não compensa. O táxi é uma espécie de “confessionário”, como apelida Hernâni Maciel. Quando longas, as viagens são espaços de muita conversa e desabafo. “Os clientes fazem de nós mais do que taxistas. Por vezes dizem-me que não são pessoas que costumam confiar e falar com ninguém, mas que aqui se sentem à vontade para falar. O que se conta aqui, não se conta lá fora”, conclui com o esboçar

de uma risada. Os dias do taxista Maciel começam cedo, às oito da manhã já tem o carro estacionado numa praça de táxis da cidade, e terminam às oito da noite. Em Vila do Conde, o táxi de Hernâni costuma estar aberto aos clientes na Praça São João, no Tribunal, no Centro de Saúde ou próximo da paragem de Metro. Já viveu um pouco de tudo dentro do seu táxi. Assegura que gosta da profissão que escolheu, mas verifica que os perigos inerentes são muitos. Nunca foi assaltado, mas tal

já ocorreu com colegas seus. “O nosso grande problema são os clientes que não nos pagam”, sustenta. Relembra três situações de insegurança e que marcaram de alguma forma a sua postura. No primeiro ano de trabalho transportou um cliente que lhe pagou com um cheque roubado, o qual Hernâni teve que devolver imediatamente à polícia para se salvaguardar de possíveis implicações com a sua atividade. “No dia 23 de Dezembro de um ano levei um jovem de Vila do Conde até à Ribeira do Porto. Não gostei muito do

ar dele, era muito frio. Fiquei com medo e estava na dúvida se deveria ativar o alarme da polícia. Quando chegamos ao Porto, perto da Câmara Municipal, comecei a abrandar perto dos semáforos e ele saltou com o carro em andamento”, relembra. Nunca sofreu qualquer dano pessoal ou material, mas já foi ameaçado com uma arma. “Um cliente estava a ser mal educado dentro do meu táxi e eu mandei-o sair”. Já fora do carro, o cliente mostroulhe uma arma e disse que lhe daria dois tiros. “Nessa altura eu fui ao carro para ativar o alarme da polícia e ele pensou que eu tinha uma arma também e fugiu, por pouco não foi atropelado”, recorda. Apesar de todos os contratempos inseparáveis da sua profissão, Hernâni Maciel não se arrepende de ter enveredado pela condução de um táxi. “Ando sempre a pensar que tudo ficará melhor”, exclama. A seu ver, um bom taxista tem que ser respeitador. “O mais pobre e o mais rico merecem o mesmo tratamento. Pode ser a pessoa mais pobre, mais mendiga, mas quando entra no carro merece respeito. Costumo dizer que não transportamos areia e cimento”, ratifica. Os ingredientes para captar a simpatia de um cliente são o respeito, a boa postura, a apresentação pessoal e “ter o carro sempre limpo”, confirma. Por agora, os seus dias atrás do volante vão continuar. A rentabilidade de um táxi está dependente da conjuntura económica atual que, pelas perspetivas, não parece desaparecer num curto espaço de tempo. Mariana Catarino


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