Mares de Sesimbra nº 34

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MARES de SESIMBRA

Director: João Augusto Aldeia

Foto: João Augusto Aldeia

16 de Julho de 2016, nº 34

A Informação que conta Administrador: José Gabriel

António José Dionísio Silva começou a trabalhar na pesca quando era ainda uma criança, ao mesmo tempo que frequentava a escola pri-

mária. Nesse tempo ainda o aparelho de anzol era feito de algodão, e uma das suas tarefas era a da lavagem do aparelho, na borda d'água.

An tón i o S i l va

O trabalho no mar, come- cargo de mestre, trabaçou por ser feito a bordo de lhando, até hoje, na pesca uma aiola, com o pai, pas- artesanal. sando depois para barcas de Página 2 aparelho, onde ascendeu ao

P a rti d o S oci a l i sta a g i ta -se com os p ri m e i ros " ca d i d a tos a ca n d i d a tos" Dois influentes membros do Partido Socialista – Cristóvão Rodrigues e Alarcão Batos – tornaram pública a proposta de candidatura de Carlos Vicente Silva para encabeçar a lista do PS à Câmara Municipal de Sesimbra às eleições autárquicas do próximo ano. Carlos Silva, que é formado em Direito e quadro supe-

rior da Câmara de Sesimbra, tem integrado as listas de candidatos do Partido Socialista, e é também conhecido pelos sesimbrenses pelo desempenho do personagem "Evaristo", nas peças do grupo de teatro "De Vez em Quando". Manuel José Pereira, presidente da concelhia do PS, considera a iniciativa como

normal, e até mesmo um "sinal de vitalidade", mas tudo indica que se trata duma reacção de um importante sector do PS local contra a possibilidade da candidatura de Américo Gegaloto, o qual não escondeu o incómodo pela forma como surgiu esta iniciativa. Página 6


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An tón i o S i l va Nasceu em que zona da vila?

Nasci ali por trás do estaleiro do Burgau. Eu conheci o seu avô, o João Aldeia, era mandador de terra do Burgau, conheci muito bem, assim como conheci o Guarda-jóias, que era mandador de terra do Ilháu, e outros, mais tarde também. Ali, onde nasceu, já era zo­ na de pescadores?

Ali era tudo zona de pescadore E de lojas de companha?

Era. Até a casa em que eu morava, tinha sido uma loja de companha. E por traz, o Duque, mais tarde foi também lojas de companha. E era a fábrica de conservas do Amadeu, também foi tudo para lojas de companha. Essa fábrica do Amadeu, a fábrica "do Burro", ficava mais acima da sua casa.

Pois, ali ao lado do Plínio Mesquita. Então cresceu nesse ambi­ ente, e começou a trabalhar como moço de terra?

Ajudante. Andava na escola e ajudava. Naquele tempo o aparelho era de algodão, e nós, os rapazes pequenos, andávamos na escola e íamos lavar o aparelho à praia, esfregar com os pés para tirar a gordura do aparelho, porque aquilo apodrecia o aparelho, tinha que ser o aparelho muito bem lavado, e

tinha que ser estendido nos tendais, para enxugar, depois para passar o aparelho. Eu não passava, eu era daqueles que empatava o anzol ao arame, e que lavava o aparelho, ainda não tinha idade para passar o aparelho. Essa operação de passar era o quê?

Eles antigamente era assim: tiravam da cana e metiam o anzol no meio do aparelho, desenferrava mesmo o anzol no aparelho, depois fazia uma boneca, o aparelho estava assim estendido, fazia uma boneca com a ponta do aparelho e fazia assim, podia-se atirar água ao chão e tudo, que não se desmanchava. E aquela operação de safar o aparelho, também se fazia? Também vinha emachuchado?

lho.

Pois, safava-se o apare-

Isso era a primeira coisa?

Não. A primeira coisa era safar as machuchas, safavase as machuchas. Ia-se para a mão, safava-se as machuchas. Mesmo para lavar o aparelho, lavava-se, a safar para a mão, lavava-se também na borda d’água assim colhido na mão, já safo da machucha. Então assistiu à mudança do aparelho de algodão pa­ ra a pita? Chamaram logo pita quando apareceu o fio

de nylon?

EraS

Embora fosse um fio de nylon…

Era um fio de nylon, mas pusemos o nome de pita, pronto. Começou a vir esse nylon, mas o nylon tem um princípio: o nylon veio dos colares das mulheres. O nylon fininho, as mulheres compravam os colares, e tinham aquela pita fininha. Andávamos às lulas e então um pescador despertou a atenção do colar ter aquele fio, e foi experimentar a ver se era valente, e era bastante valente! E então começou a ir às lulas com aquele fio, e daí é que começou a aparecer a pita. Quem fazia esse fio, devia ter feito depois a pita mais grossa, começaram a engrossar. A primeira pita que apareceu, que pusemos no aparelho, a madre era de algodão e o estrovo é que era de pita. Depois, mais tarde, começámos a desistir do algodão e a pôr tudo pita. Aquilo empachava-se com facilidade. Depois começou-se a apanhar o jeito, aquilo já se safava melhor do que o algodão.

a largar, e estava muita xaputa, e largavam dos dois lados, dum lado e doutro [da barca], e as embarcações com menos gente largavam só de um lado, colhiam por aquele lado, aquilo era colher à mão, e o aparelho vinha direito, vinha sempre direito. Quando era, por exemplo, quando era excesso de peixe, quando dava algum peixe grande, alguma albacora ou alguma tintureira, juntava, aí é que empachava o aparelho. Depois, tinha que se cortar ao anzóis e safar ali o aparelho, como era costume fazer. Estava na escola e fazia esse trabalho de ajudante. E depois?

Andei três anos na 2ª classe, por embirração dos professores, não me passaram de classe três anos. Andei um ano na 1 ª, três na 2ª, um na 3ª e outro na 4ª, saí da escola já com 1 3 anos. No dia que saí da escola, fui para a loja passar o aparelho, era moço no barco do Zé Neves, e os meus colegas andavam a passear, a comer sorvetes, e eu tive que ir para a loja ensarremar o aparelho. Nessa altura já Emaranhava­se mais, mas era moço e já ganhava meia safava­se também com fa­ parte, só não chamava era a cilidade? companha de noite: como ia Safava-se também com para a escola de manhã, de facilidade. Quer dizer: havia uma maneira de se empachar com mais facilidade, era quando as embarcações iam


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noite não podia chamar a companha. E ainda não ia ao mar?

Depois que saí da escola, comecei a ir ao mar dentro da aiola com o meu pai. Comecei a andar com ele dentro da aiola, aos 1 3 anos. Andavam ao quê?

Nessa altura andávamos aos chocos, e já andávamos à zagaia na barca do António da Olímpia, no “Amor ao Ofí­ cio”, com as aiolas, essa barca andava com as aiolas – e mais barcas, não andava só o “Amor ao Ofício”; naquele tempo talvez andassem aí uma dez barcas, ou quinze, Barca "Nossa Fé" no porto de Sesimbra. com aiolas: uns à zagaia e outros ao correcão, naquele tempo as aiolas não largavam o aparelho, uns anos depois é Esteve então muitos anos ra largar os correcções. De- muito aparelho? que foi o aparelho; andavam nessas artes, a bordo da pois mais tarde começou-se Eram duas selhas. Cada em pé ao goraz, e andava-se aiola? a mudar, já não a largar os selha levava trinta talas, larà zagaia, e ia-se para a costa Antigamente as aio- correcções, já era a largar à gava algumas sessenta talas, da Galé também aos chocos las, Era. e a seguir os botes, era moda do aparelho, com o al- dava ali mil anzóis, ou mil e e às lulas. E era assim. o princípio dos grandes godão, já se largava à moda duzentos anzóis. Quando damestres de Sesimbra. Os do aparelho, que era mais fá- va a xaputa às vezes até tiCom a zagaia apanhava­se grandes mestres de Sesim- cil, porque as bóias dos cor- nham que ir duas vezes a peixe­espada? os grandes arrais dos recções, tinha que se andar à bordo da barca levar as xaA zagaia veio mais para o bra, barcos, começou tudo dentro procura, às vezes desanda- putas, a barca é que era a peixe-espada, mas já se ia ao de aiolas. veio o vam umas do pé das outras, carga que trazia as aiolas. Cabo Espichel, já se apanha- bote, vinhamE osdepois botes, era e aquilo naquele tempo não Até se misturava a xaputa [de vam corvinas, robalos, par- uma embarcação com jámais havia muitas popas das aio- diferentes aiolas], e depois gos, com a zagaia. Havia dois metros que uma aiola, las, agora é que há e é para quando chegasse aqui a teruma altura que era com a za- já dava para três ou quatro andar aos chocos, todas as ra, cada qual tirava a sua gaia, quando estava muita camaradas, e apanhavam aiolas têm motores, eram quantidade que tinha apamaresia, era com a zagaia. muita xaputa, não é? Apa- dois homens em cada aiola, nhado. Quando o mar estava raso, nhavam muita xaputa e eram os quatro remos, pronera a pesca com pelado, com aquilo era um perigo vir den- to, a defesa eram os quatro Então e mudança para a anzol com pelado, a isca era tro duma aiola, carregada de remos. As aiolas nos barcos barca, consigo, como é que pelado . e então começaram não usavam velas, só quem ocorreu? Foi assim que começou a xaputa, usava velas eram as embarAos dezassete anos coma adaptar os botes. minha vida. Depois, aos cacações que andavam aqui na prámos a primeira barca, até, Mais tarde começaram a torze anos, tirei cédula, mas aparecer estas barcas com borda d’água e que iam ali por sinal, ao avô do Salta-àainda fomos interceptados sete metros, oito metros, para o norte do Cabo Espi- Vara, que era uma barca com pela canhoeira, que andáva- (com) estes motores, pelo chel, para a Lagoa, ao roba- um Buck de 1 0 cavalos, uma mos ali na Costa da Galé por menos foi uma boa máquina lo, ao pargo, à corvina, que barca com 7 metros ou 7 mecima da pedra, e os setuba- que apareceu para o pesca- havia bastante nesse tempo, tros e meio, e tinha um Buck lões tinham lá os covos, e o dor, foi o Buck de 1 0 cavalos e governava-se muito com de 1 0 cavalos. Comprou o dono dos covos foi fazer quei- . Ainda havia outros motores essas embarcações assim. meu pai essa barca. A barca xa à Capitania de Setúbal, mais antigos, mas eram moMas quando apanhavam até foi 25 contos. que as embarcações mexiam tores de pouca duração. calma era uma carga de traDepois fui para a tropa, nos covos. balhos. Quando vinha assim por acaso até tive sorte de Quem safou Sesimbra foram Ele mandou os barcos paBucks de 1 0 cavalos, ao noroeste, vinham para a não ir para fora, estive algura Setúbal, algunsS eramos esses os Listers de 21 , e Bour­ terra, de noroeste, vinham mas vezes mobilizado mas talvez cinco, e eu e um cole- douins também, 24 ca- bem, andavam bem com ve- não fui – mas o meu irmão ga meu [que] não tínhamos valos. Foram os demotores la. Eu ainda apanhei uma foi, o meu irmão é que foi pacédula ainda, estivemos es- [com] que depois veio a pro- ponta da vela. E depois vi- ra fora. Quando vim da tropa condidos no porão do barco, gredir aqui a pesca de Se- nham aqueles calmeiros é fomos aqui à Casa dos Pesaté resolverem o problema. simbra; e noutros lados que era pior, tinha que se re- cadores, ali ao Mário Águas, Depois eles mandaram a gen- também. mar da Alagoa até à terra. Ou eu por acaso até tinha cote embora e no outro dia fodo Cabo Espichel. Era um nhecimento com o Mário ram lá os homens a Setúbal, Nas aiolas, para que mares bocado longe. Mas remava- Águas, que eu fui muitos o meu pai e o arrais da barca é que costumavam ir? se! anos da Mocidade Portugue– o meu pai, sei eu que pasa, e o Mário Águas pertencia Íamos com as aiolas cogou cinquenta melréis de mul- mo íamos para os chocos, A mudança do correcão à Mocidade Portuguesa, e ta. depois lá fui mais o meu pai, íamos com as aiolas dentro para o aparelho, ainda foi lá à Junta Central, que emda barca, ali para o Canto com aiolas, ou já foi com Era uma multa grande… prestou dinheiro para mandar d´Agua, para o Mar Novo. barcas? Era, cinquenta melréis na- Chegávamos ao mar, eram Não, ainda foi nas aiolas. fazer uma barca nova. quele tempo dava para uma ali 4, 6 aiolas em cada em- As barcas grandes é que já... Quem fez a barca foi o semana com uma casa de barcação, deitávamos as aicinco filhos, como o meu pai olas ao mar e depois cada Mas uma aiola não tinha tinha. qual procurava um canto pa- muito espaço para meter


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João Bezerro, uma barca nova, um motor novo, também um Buck mas era de 1 5 cavalos, e pagámos essa barca – a barca foi tudo, posta no mar, tudo novo, 1 00 contos, emprestou a Junta Central – e pagámos essa barca em três anos e meio, a deixar lá os 1 0% sobre a pesca. Pagámos 11 0 contos, a barca foi 1 00 contos. Qual era o tamanho da barca?

Esta, já tinha ali oito metros. Com a mudança para a vossa barca, passaram a ir pescar mais longe?

Começámos, começámos a ir mais longe, começámos a ir ao Regueirão, começámos a ir à Malha Grande que é aqui talvez uma lonjura, deixe lá ver, aí de vinte milhas, aqui de Sesimbra deve dar umas vinte a vinte e cinco milhas. Começámos a ir lá porque está lá aquela pedra que está muito tempo sem ninguém pescar ali, e então aquela pedra estava cheia de pargos, tinha muitos pargos. Até estendíamos os pargos ali na rampa, ao pé da Fortaleza, era cá de cima até lá abaixo, era, a rampa cheia, quatro contos. Era fácil encontrar esses mares?

Era fácil, era. Era fácil, porque era assim: a gente não tínhamos sonda nessa altura, tínhamos uma pesca de polvos, e então arrastávamos a pesca de polvos, até prender. Sabíamos por portas e travessas que havia pedra ali na borda d’água, naquela área, então a gente arrastávamos a pesca de polvos e depois, aonde é que prendia, emboiava-se. Ou seja: onde o fundo fosse de areia,

A pesca deslizava. Onde fosse pedra – a pesca tinha ali 8 ou 1 0 anzóis – onde fosse pedra, prendia. Naquele tempo não havia mais artes nenhumas, o mar estava limpo de artes e então, onde é que prendia, era pedra. E então a gente marcava, marcava-se pela rocha, marcava-se assim por terra, marcava-se pelo sueste, marcava-se o leste-oeste por terra, e o norte-sul marcava-se assim pelo sueste. Porque o norte-sul, para marcar por norte, as

marcas ficavam muito longe, que era aqui a serra da Arrábida. Aí é que se marca muita vez o norte-sul, só que era muito longe, e então marcava-se pelo Regueirão, havia ali uma parte que a gente chamava o Regueirão e marcava-se por ali. Com umas árvores ou com uma coisa qualquer, marcava-se. Como é que chamava a barca que já foi com empréstimo? Era a Gaudina, era o

me da minha irmã. E a primeira?

no-

A primeira chamava-se Depois os meus primos compraram o barco ao pai do Salta-à-Vara, os meus primos que nós estávamos no mesmo armazém, éramos todos parentes, então eles compraram um barco ao avô do Santa-à-Vara, e ao Martinho, e eles disseram assim: é pá, esta barca é que era boa para vocês, como nós andávamos longe, e então comprámos a barca a eles, a barca foi 300 contos, já tinha 1 0 metros e trinta, e tinha um Buck de 60 cavalos, já era um bocado desenxovalhada. E pronto, depois começámos a fazer a mesma vida nos mesmos lugares, e até houve uma vez que apanhámos seiscentas albacoras. As albacoras, atirava-se para o porão, não fazia jeito estar cá em cima, para podermos trabalhar, mas depois, quando Deus nos Abençoe.

vínhamos pelo caminho, tiráEu devia ter aí uns treze mos cá para cima, foi a bar- anos. ca toda por cima, cheia da proa até à popa. Mas o porto também Com barcas maiores, aumentava o número de selhas com aparelho?

Já se levava mais quantidade. Já tinha mais companha, tanto faz no mar como em terra. Mas chegou uma altura em que o peixe começou a dar sinal de que estava a acabar?

Quando começaram a aparecer as barcas maiores ao peixe-espada branco, e quando começou a evolução do peixe-espada branco, começaram a mandar fazer barcos maiores, e começouse a apanhar um excesso de peixe-espada. E onde o peixe-espada era mais ovado, era em Bombaldes. As barcas iam lá, vinham carregadas de peixe-espada, vinham com quatro e cinco selhas cheias de ovas de peixe-espada, aquilo depois começou a faltar, não é? Foi faltando e as embarcações foram sempre aumentando, no tamanho, até que começaram a ir para Sines, depois começaram a ir para o Algarve – ao peixe-espada – e depois, de resto, foram para Marrocos. Aí foi onde o peixe-espada, para a gente, acabou. Entretanto foram as obras do porto, no final da década de 1940.

permitiu que os barcos fossem maiores.

Quando fizeram o primeiro porto, começou logo a aparecer mais embarcações, isso foi logo. Depois fizeram a lota na doca, que ainda beneficiou mais o pescador: logo aí foi meio caminho andado. Eu cheguei a ver o meu pai com os peixes-espadas enfiados nos remos, da doca até aqui às Sentinas [Largo da Marinha] para vender o peixe-espada. Não havia transporte, depois é que começou a aparecer as carroças, e começou depois a aparecer duas ou três camionetas, aí é que aliviou o pescador. Mas onde é que aliviou mais foi quando passaram a lota para a doca. Mas o facto de se ter feito o porto, também ajudou a aumentar a pesca: mais barcos, mais dias de pesca…

É mesmo natural, tinha que ser mesmo. Ajudou à pesca, e é preciso ver: é que cá em Sesimbra não havia mais nada. Se não se fosse sapateiro ou barbeiro – e não podia ser toda a gente – só havia era a pesca. Ia tudo para a pesca, co-


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ções que andavam cá em É com o aparelho! Eu Sesimbra ao anzol. nunca andei às redes.

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com o mestre da Beatriz Paulo, que disse: “É pá, já estou aqui há duas horas e Então aquela pesca que não dou fé de nada.” E ele era a tradição de disse para o outro: “Então, meçou tudo a desenvolver- Já não se usa pescar com Sesimbra, está a morrer? não dás fé de nada, vou-me se. Os rapazes saiam da es- anzol, à linha? Pois. É só a nossa barca. embora para a terra. O que No outro tempo, como hacola – e muitos até nem faziam a 4ª classe – para irem via bastante peixe, pescava- Era o Amor ao Ofício, que já é que eu vou fazer para aí?" E nisto virou o barco papara a pesca, aquelas famíli- se. A gente, geralmente, nas desistiu, e eramos a gente, e as grandes, o caso de as pri- aiolas, pescávamos muito ao era o Fenda na Muralha, que ra Sesimbra. A traineira fifoi agora vendido, que tam- cou logo proa com proa com meira a vir eram as pargo, com pelado. bém anda só ao anzol, tam- a minha. Se desse a barca, raparigas, as raparigas nesbém não tem licença para apanhava com a proa pelo se tempo não iam para a E já está reformado? Eu tenho licença de meio, e eu ia dentro da casa pesca, nem tinham empreJá. Já estou reformado. redes. gos, andavam a coser, ga- Mas continuo na pesca na alcatruzes, mas os alcatru- de leme, com a barca, para nhavam cinco tostões por mesma. Até perdi dez anos zes agora, os covos acaba- o fundo. O que é que eu faço? dia, como ganhavam as mi- de reforma para conseguir ter ram com os alcatruzes. Pensei em andar à ré [para] nhas irmãs – andaram a co- os documentos para andar ao matar a força; a barca a anser ali na Júlia Marta. E mar na mesma, eu e o meu A licença de alcatruzes dar à ré, matava a força que depois os rapazes quando irmão. Reformámo-nos aos não dá para andar aos trazia a traineira direito à vinham a seguirS As famíli- 65 anos, para podermos an- covos? Não. Nem sequer eles barca, e ainda a apanhou as em que vinham primeiro dar ao mar na mesma. trocam. Se eu fosse lá para assim, por estibordo. os rapazes, começavam loeles trocarem, não. Não há Fez um grande buraco go a viver melhor, que os ra- E agora o peixe já está a ordem disso. E as licenças na proa da barca, mas eu pazes, já se sabe, estabilizar, ou continua a dos barcos que andam com não desembraiei o motor, eu começavam logo a trabalhar diminuir? as aiolas, que só a minha saí logo pela janela da casa com nove e dez anos, não não tem tendên- agora que anda, e acabando de leme e a barca, com o ganhavam uma parte, mas cia Odepeixe melhoras, isso não a minha já não dão mais li- andar à ré, faz isto, e vem ganhavam 25 tostões, 5 es- tem. Já há mesmo peixes em cenças de embarcações ne- bater, mesmo já metade no cudos, ajudava muito. E ga- vias de extinção e, para mim, nhumas, para levar as fundo, com a popa contra a nhavam sempre uma xaputa, isto não tem melhoras. O que aiolas. borda da traineira. ou metade de um peixe-es- está a dar, são embarcações Eles, como tinham ali a pada, e começavam assim. têm excesso de tráfegos. No seu caso, pesca retenida, que é uma corda Depois, quando foi o por- que por exemplo quatro ou também dentro do Parque, muito valente, passaram to de abrigo maior, começou Têm, mil covos dentro de ou é fora do parque? aos cunhos da barca, prona aparecer as redes, os bar- cinco têm 200 redes, ou 1 50, Aqui na nossa costa, eu to, não deixaram a barca ir cos às redes, primeiro apa- água; tamboris; e ainda vão fazia muitos lances quando para baixo. E a barca tinha receu os barcos da Azoia ao aos a rede com um pano, às não era Parque. Íamos para oito meses de arranjada, do limo, e depois daí começou com Têm essas três a Costa da Galé, depois caía cinturão para cima, os cua desenvolver, [como] o limo pescadas. a funcionar todas as se- aquelas nortadas, vínhamos nhos estava tudo novo, se era só no Verão, eles tinham artes E eu não: é só o an- arribados, chegávamos aqui fosse os cunhos antigos, se os barcos, começaram a an- manas. mais nada. debaixo da serra, que ficava calhar, não aguentava, mas dar às redes, e daí começou zol, Ee ainda tem outra coisa: a calma, trabalhávamos ali até como os cunhos eram noa força das redes, começa- minha pesca é tão radical, à uma hora, duas da tarde. vos, aguentaram a barca. ram esses barcos. Porque o que quando está da Ganhávamos alguma coisa. Veio a reboque aqui até à pescador do anzol, manteve barca, está o mar dentro safo para Foi proibido. A minha barca doca. sempre o anzol, mesmo mui- qualquer indústria que pa- nem pode pescar dentro. As Quer dizer, portas e tratos anos. O último pescador ra o mar trabalhar. Da vá aiolas ainda podem pescar vessas, a traineira trouxe a cá de Sesimbra que foi para parte não está lá nadaminha [no em certos pontos da nossa barca a reboque, veio assim o anzol, que eu me lembre, mar] a empachar ninguém. foi o Manuel da Loja, foi do Enquanto que há outras in- costa, agora a minha barca é com a popa no ar, e quando anzol para as redes, foi o úl- dústrias que estão numa pes- que não pode pescar de ma- chegou ali ao cais, arriou, timo pescador. Os outros co- ca, e têm outras pescas que nheira nenhuma aqui na depois foi mesmo toda para meçaram a andar logo às estão a prejudicar outros pes- nossa costa. Todos os anos o fundo. A barca ainda chevenho arribado, no Inverno, gou, desde o Cabo Afonso redes. Foi daí que se come- cadores. com certos tempos venho ar- até à entrada da doca, com çou a destruir a pesca. A fiscalização é assim: só ribado, tenho que vir para a as luzes acesas, mesmo no controla o que está por cima doca. Aonde é que eu aqui fundo, a reboque da traineiE ainda teve mais barcos? água. O que está por de- debaixo da serra, safava ra, ainda com as luzes aceNão. Só tenho o actual, de de água, não controla. sempre o dia. sas. este é a Nossa Fé, uma bar- baixo 90% das embarcações que No fim, deu o seguro, ca que tem 1 0 metros e Eandam estão todas Chegou a apanhar algum cinco mil contos, foram 300 meio, e que tinha um Buck ilegais. àÉ pesca, preciso ver: 90% susto com os temporais? contos para arranjar os mode 60 cavalos, agora tem um das embarcações que andam Com temporal, poucos tores das aiolas, que estivePenta Volvo de 1 00 cavalos. à pesca, estão todas ilegais. sustos. O maior susto que ram no fundo, dentro da As embarcações que estão apanhei foi aqui há cinco ou barca, e foi para arranjar allegais são estas que andam seis anos, foi a traineira que guma aiola que se partiu, e E pesca com que artes? Agora, estamos no Inver- na pesca aos chocos, que abalroou-me, o Luís Adrião. foi 4.700 contos para a genno, no tempo dos chocos, embrulham a pesca [e] está o Mas salvou-se a barca. Foi te, mas eu ainda tive que andamos aos chocos e às mar safo, são estas embarca- assim: o barco vinha de Se- pôr três mil contos da minha lulas. E depois, assim como ções que andam só ao anzol, simbra, de volta comigo, pa- algibeira e ainda tive quatro acabou agora o tempo dos e já são até muito poucas ra a Costa. Ele ia para uma meses sem ir ao mar. chocos, que acabou em porque o Bolota desistiu, já pesca e eu ia para a minha Maio, vamos para o anzol, no princípio deste ano, e ou- pesca. E o barco passou aspara o safio, para a raia, pa- tra embarcação, que eram os sim ao meu lado. E o que é ra o pargo, esses peixes as- filhos do Jacinto, que também que acontece? Conta o mes João Augusto Aldeia desistiu já, eram as embarca- Então, ia para o sul e falou sim. Mas é com aparelho?


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Partido Socialista agita-se com os primeiros "candidatos a candidatos" As eleições autárquicas ainda estão a alguma distância – terão lugar em Setembro ou Outubro do próximo ano – mas já se começam a agitar algumas águas. Com alguma surpresa, surgiu durante a semana passada uma nota de imprensa, subscrita por militantes do Partido Socialista, propondo o nome da Carlos Vicente Silva para candidato daquele partido, por ser, na sua opinião, "o candidato que dispõe de melhores condições para junto do eleitorado poder ser eleito para Presidente da Camara Municipal." Os militantes do PS que dão a cara pela candidatura de Carlos Vicente Silva são Cristóvão Rodrigues e Miguel Alarcão Bastos, membros socialistas da Assembleia Municipal de Sesimbra. Cristóvão Rodrigues já foi vereador pelo PS, na câmara socialista do presidente Amadeu Penim, e Alarcão Bastos já foi presidente da Assembleia Municipal, eleito por uma coligação dirigida pelo Partido Comunista. A iniciativa supreende pelo facto de ser a primeira vez que um "candidato a candidato" do PS se apresenta a público, sem que o assunto da escolha tenha sido debatido dentro do próprio partido. Em eleições anteriores, ou a escolha foi feita entre candidaturas concorrentes – como aconteceu em 2009, entre João Capitulo e Américo Gegaloto, com vitória deste último – ou através de um processo de angariação interna de apoios, como ocorreu em 201 3, sendo também seleccionado Américo Gegaloto, actual vereador municipal. Na última convenção autárquica do PS, realizada há poucos meses, Américo Gegaloto declarou mesmo que continuava disponível para ser o cabeça de lista da candidatura autárquica do PS, e é muito provável que

a iniciativa de propor Carlos Vicente Silva seja uma resposta à declaração de Gegaloto o qual, segundo Carlos Vicente Silva, já estaria no terreno a angariar apoios. Manuel J. Pereira: "sinal de vitalidade" O presidente da concelhia sesimbrense do PS, em declarações ao nosso jornal, considera a iniciativa daqueles que propõem Carlos Silva, como normal, e até mesmo como "um sinal de vitalidade e de força para o combate autárquico que se avizinha", da parte do PS. Segundo Manuel José Pereira, o facto de Augusto Pólvora não se poder recandidatar, " obriga o PS a apresentar um conjunto de candidatos aos vários órgãos e um Programa, o qual deve ser amplamente discutido e participado pela população, que constituam um verdadeiro projeto ganhador e que pugne pelo desenvolvimento do nosso município e das suas freguesias."

Américo Gegaloto: "mantenho toda a disponibilidade" Contactado pelo nosso jornal, Américo Gegaloto não escondeu o incómodo perante a iniciativa de quem avançou desta forma com o nome de Carlos Vicente Silva, particularmente por não ter sido seguido o usual processo de debate interno dentro do Partido.

Carlos Vicente Silva caracterizou a iniciativa da sua candidatura como "um movimento que se constituiu para que a população se possa manifestar. A questão que me foi colocada é se eu estaria disponível – e eu, depois de ponderar muito disse: sim senhor, eu estou disponível se assim o PS enter que seja o candidato, caso contrário, se o PS entender que existe uma pessoa mais bem colocada para ser o candidato, que não eu, muito bem." "A ideia – adiantou Carlos Vicente Silva – foi mesmo tentar perceber se de facto eu estaria disponiveL para me candidatar, se o Partido Socialista assim o entendesse. Eles quiseram tornar isso público, eu até fui assim um bocado apanhado de surpresa quando saiu na comunicação social." Questionado sobre se o PS já teria em curso algum processo de escolha de candidatos, disse-nos que "Deve estar a decorrer, mas neste momento ainda não há nomes, a única pessoa que me parece que já se posicionou a dizer que estaria disponível, seria o actual vereador Américo Gegaloto. Só que o Partido não lhe disse que sim nem que não e tamSegundo o verador do PS, "a escolha dos candidatos à Câmara, Assembleia Municipal e de Freguesia devem ser processos discretos, ponderados e transparentes, marcados num primeiro momento essencialmente pela reflexão e discussão interna, para numa segunda fase e em momento próprio o Partido Socialista apresentar publicamente os seus candidatos aos diversos órgãos autárquicos, sem precipitações, equívocos ou hesitações.”

bém não disse a mais ninguém." Respondendo à questão sobre a sua candidatuar já tem algum programa, respondeu: "Nós temos várias áreas de intevenção e o Concelho também está carente de uma série de coisas, estando nós tão perto do mar, relativamente à questão das pescas, do turismo e da cultura... "A Quinta do Conde é uma área com uma grande capacidade de investimento, tem ali muito trabalho para se fazer, tal como a zona do campo. "Mas não entrámos ainda em pormenor sobre programas, porque era prematuro começar a traçar ideias, uma vez que isto é só uma pessoa dizer que está disponível para encabeçar uma lista pelo PS e depois terá que ser um trabalho em equipa sobre o programa que o Partido quer para o Concelho." Américo Gegalogo reafirmou ainda a disponibilidade já para dirigir a candidatura socialista à Câmara, por continuar a "considerar que se encontram reunidos um conjunto de pressupostos que legitimam a minha candidatura a candidato, no sentido de vir a ser o próximo Presidente da Câmara Municipal de Sesimbra, em particular, pelo facto de a minha candidatura reunir um amplo leque de apoios e consensos ao nível interno e externo."


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