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EDITORIAL Este é o primeiro número das novas Cores do Amor, a segunda iniciativa de trazer a público a voz da comunidade homossexual e bissexual de Moçambique. A primeira foi há 7 anos, quando um grupo de amigos resolveu unir esforços e lançar um boletim com o nome de “As Cores do Amor”. Passados sete anos, os objectivos mantêm-se: educar e informar a comunidade homossexual e bissexual sobre assuntos e acontecimentos que os afectam, educar e informar o público em geral sobre o que nós somos, pensamos e fazemos e como vivemos e, acima de tudo, contribuir para quebrar as barreiras do preconceito e promover o conhecimento, a compreensão, a tolerância, o respeito e a convivência dentro da comunidade e entre a comunidade e o resto da sociedade moçambicana. Nós temos uma orientação sexual diferente, não por opção, mas por natureza. Alguns de nós escolheram manifestar essa orientação sexual através de uma opção de vida que em nada difere da de todos os outros membros da sociedade, que é amar, viver esse amor livremente, ser feliz e, em muitos casos, constituir uma família estável, carinhosa e saudável. A única diferença é o que fazemos e com quem o fazemos, na privacidade

dos nossos espaços pessoais, como adultos conscientes e responsáveis. Porque em nada somos fundamentalmente diferentes de todos os outros nossos concidadãos, ninguém deve ter que abdicar de expressar a sua sexualidade através de um estilo de vida saudável só por causa do preconceito, da ignorância e da intolerância. Moçambique é uma nação de muitos cores, um povo de muitos ritmos, um país de muitas riquezas. Nós somos parte dessa diversidade e dessa riqueza. Habitamos todas as classes sociais, transportamos todas as pigmentações, existimos em todos os cantos, produzimos em todos os campos, vivemos todas as idades. Somos pais, filhos, irmãos, tios, cunhados, afilhados, colegas… Mas somos sobretudo cidadãos íntegros e integrais deste país pelo qual, com muito orgulho, já vertemos sangue, suor e lágrimas. Como cidadãos pedimos apenas que nos respeitem os direitos e nos dêem a liberdade que alimentam a alegria que nos vai na alma ao dizermos: acima de tudo somos Moçambicanos!

• • ag. 2) • O Mito... (p .4) trabalho (pag • Nova lei do entre is problemas • Os principa (pag.5) homens gays reasdoenças vené • Lésbicas e ) Parte I (pag.6

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o Mito

“Real Africans are exclusively heterosexuals by nature...” [“Os verdadeiros Africanos são exclusivamente heterossexuais por natureza”] [Marc Epprecht, 1998:199] É frequente ouvir dizer que em África não existem homossexuais, ou que a homossexualidade não faz parte da cultura africana. Talvez recuemos um pouco no tempo, para verificar a veracidade destas afirmações. Serão realmente os povos africanos exclusivamente heterossexuais? Eis a questão. Dynes (1983) traçou a origem do mito sobre a heterosexualidade exclusiva dos povos Africanos, que o levou ao 94° capitulo do livro de Edward Gibbon (Decline and fall of the Roman Empire1781). Gibbon escreveu, “acredito e tenho esperanças que os negros em suas terras estão isentos desta pestilência moral”, obviamente, as esperanças de Gibbon não se basearam nenhum inquérito ou pesquisa aprofundada. Sir Richard Burton, um século depois “inadvertidamente” ajudou a reforçar este mito desenhando os limites do seu “sodatic zone”, onde a homossexualidade era amplamente praticada e aceite nas regiões de influência Árabe de modo a exclui-los do resto das regiões africanas, Dynes (1983:20),estava pessoalmente familiarizado com a homossexualidade masculina na sociedade Árabe dentro da sua zona, mas não pesquisou o tópico nas regiões centrais e do sul de África onde existiam caçadores “primitivos” e complexas formações de sociedade antes da chegada dos Europeus. Antigos antropólogos e pesquisadores, cegos pela homofobia Victoriana, tentaram negar ou minimizar a homossexualidade em África, dentre eles, o pastor Henrique A. Junod, da missão Suíça da África do Sul (1905), que ratificava a mesma presunção para

a região de Lourenço Marques ( Maputo), “O paganismo grego conhecia esta imoralidade [pederastia], e praticou-a, mas o paganismo bantu, pelo menos na nossa tribo, qualquer que seja a sua corrupção, não a conheceu. E mesmo hoje, embora se pretenda que esta forma de vicio penetrou em certas partes do território por onde a tribo [Tonga], a povoação indígena tem-lhe o verdadeiro horror ( Usos e costumes dos Bantu. Lourenço Marques, Imprensa Nacional de Moçambique, 1944, p.499). Hrdy (1987:1113) afirmou categoricamente “A homossexualidade não faz parte da tradição Africana”, depois de ter inquerido alguns chefes tribais acerca do assunto, Gerfand (1979:201) escreveu que “a tradição Shona ( Zimbabwe) não tem nenhuns problemas associados a homossexualidade ( então) obviamente eles devem ter uma valioso método de educação dos seus filhos, especialmente no que se refere as relações normais, desta forma evitando esta anomalia tão frequente nas sociedades ocidentais” Com a ausência de manuscritos indígenas antes no final do século. XIX, não existe nenhuma análise sobre a estrutura social das sociedades africanas antes do contacto com os colonizadores. O que hoje é descrito como “Cultura tradicional Africana”, foi escrito por europeus que pouco entendiam sobre a verdadeira cultura Africana e que por serem católicos, tinham já os seus preconceitos. Desta forma ficamos reféns de seus pontos de vista. Em África, especialmente nas regiões com influências ( notavelmente o Cristianismo e o Marxismo) ocidentais, existe a crença de que a homossexualidade é decadente, uma inovação da burguesia ocidental forçada na África colonial pelo homem branco, ou,

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pelos mercadores de escravos Árabes. Pelo mundo as pessoas vêem a homossexualidade como um vicio de outros povos. Desta forma os Britânicos afirmam que os conquistadores da Normandia introduziram a homossexualidade nas ilhas Britânicas. Vários Franceses vêem a homossexualidade como Italiana, Búlgara ou do Norte de África. Os Búlgaros atribuíram a origem da mesma aos Albaneses, e os Albaneses por sua vez aos Turcos. Similarmente os Bantu orientais clamam que a pederastia foi importada pelos Núbios (Schneider 1885:295-6). Sudaneses acusam os saqueadores Turcos (Weine 1848:120), etc. esses pontos de vista (opiniões) dizem-nos algo acerca de aparentes fronteiras étnicas, mas nada sobre as origens ou a transmissão histórica de ameaças culturais. A crença de muitos Africanos de que a homossexualidade exógena à história de seus povos, é uma crença com consequências sociais em particular a estigmatização daqueles vive a sua homossexualidade. Esta crença não é baseada em nenhuma pesquisa seria, histórica ou algo semelhante Todos os argumentos dados contra os homossexuais em África, são baseados ou na Bíblia ou no Alcorão. A pergunta é; porquê que os descendentes africanos baseiam suas vidas e seu futuro no Alcorão ou na Bíblia? O Alcorão não é um artefacto da cultura Africana. É Árabe. E, a Bíblia foi nos dada pelos comerciantes de escravos brancos. Europeus e Árabes escravizaram a África. Desta forma porquê somos servis de seus livros? Existem pelo menos 33 culturas diferentes em África ( desde os Yoruba no norte da Nigéria e os Barenda do norte do Transval, até os Kamba da África oriental) em que casamentos entre mulheres são reconhecidos. Os académicos rapidamente negam que o lesbianismo tenha algum

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papel em tais arranjos matrimoniais apesar das evidências provarem o contrário. Em estudo sobre a homossexualidade em África indica que 78 culturas, como pouco contacto com o ocidente, 49 aprovam ou pelo menos toleram a homossexualidade. Isto só indica que a HOMOFOBIA ( NÃO a homossexualidade) é uma importação colonial. É verdade que algumas tribos africanas não condenam a homossexualidade. Mas é igualmente verdade que algumas tribos africanas realmente condenam a homossexualidade. Esta variante sexual é tão antiga e universal. Sendo África o berço da humanidade, é elementar que o primeiro homossexual tenha sido africano. O pastor H.A. Junod, em Janeiro de 1905, ao visitar as casernas de operários nas minas de Joanesburgo, confirma ter encontrado muitos jovens, que se vestiam de mulher, usando inclusive seios esculpidos em madeira, e que serviam de esposas para os outros homens. Esta prática era conhecida por buncontchana ou bukhontxana, “Tornada uma instituição regular nas casernas dos menores indígenas. Ncontchana é o rapaz que um outro homem emprega para satisfazer a sua paixão, e o homem é mesmo chamado o marido dele. Quando um bando de novos trabalhadores chega a uma caserna, os policiais indígenas vem fazer propostas aos mais novos, não só aos rapazinhos, mas também aos rapazes de vinte anos e mais. Se estes rapazes consentem em se tornarem buncontchana, são tratados com mais indulgências que os outros. Os seus maridos dão-lhes 10 xelins para se casarem com eles e escolhemse as ocupações fáceis, como varrer os dormitórios, enquanto os outros vão para o penoso trabalho subterrâneo. O marido não só deve ficar noivo desta nsati ( mulher), deve também lobolá-la, celebrando por vezes festejam que põem no chão25 libra, matam uma cabra e fazem um contrato pelo qual o ncontchana fica ligado ao seu patrão para todo o tempo que fique nas minas. O irmão mais novo do rapaz recebe o dinheiro nesta desprezível parodia do casamento bantu...como a palavra ncontchana vem do Bilene, a terra de origem dos Machanganas, poderse-á pensar que esse vício era conhecido e

praticado pelos indígenas antes de tomar o imenso desenvolvimento que constatamos nos dormitórios... . Não há nenhum remédio contra este mal terrível? O que torna a situação tão grave, é que a imensa maioria dos próprios indígenas não considera que este acto tenha a menor importância. Falam dele sorrindo. Asseguraramme que a lei o interdiz severamente e quem quer que for achado a praticar o buncontchana é condenado a dez meses de prisão. Mas é exactamente difícil obter testemunho necessário a um julgamento deste género. Os indunas e os policiais indígenas praticam a este respeito a conspiração do silêncio... Felizmente as missões combatem este flagelo tão energicamente quanto lhes é possível, fornecendo dormitórios separados onde um certo numero de rapazes pode encontrar refúgio contra a contaminação. Algumas centenas ou alguns milhares escapam assim. A proibição do uso de cortinados em volta das camas e a transformação da organização actual dos dormitórios são algumas medidas se quiser extirpar verdadeiramente este flagelo. A conclusão que se impõe quando se estuda este doloroso assunto é a de que, como a civilização branca é responsável pela introdução de desenvolvimento do flagelo que é uma iniquidade que ameaça a própria vida da tribo sul-africana” (Junod, op.cit 1944, p500)

young adolescents included the practices of external coitus, or penetration between the thighs (inter-crural sex)” (Harries, Patrick. Work, Culture and Identity, migrant laborer in Mozambique and South Africa, c. 1960-1910, Cape Town, UCT). Na Suazilândia, o casamento entre duas mulheres é válido. De acordo com a tradição Swazi, duas mulheres podem contrair matrimónio desde que seus pais o consintam, e a mulher que paga o lobolo pode delegar um homem para conceber a sua “esposa” por sua conta. Por trás do mito da inexistência da homossexualidade na África précolonial estão outros mitos não menos preconceituosos: a naturalização da sexualidade dos negros, que movidos pelo instinto animalesco, desconheceriam os “vícios” anti-naturais dos brancos, e a superioridade física do primitivo africano, avesso à efeminação própria do mundo civilizado. (Continua na próxima edição) Fontes: Luis Mott ( Raízes Históricas da homossexualidade na atlântico lusófono negro) Stephen O. Murray (Homosexuality in “Traditional” Sub-Saharan Africa and Contemporary South Africa”

No Zimbabwe, na região de Mashonaland, quando se instituíram em 1892 as primeiras cortes coloniais, 1.5% dos casos julgados referiam-se a crimes envolvendo actos homo eróticos entre nativos, catalogados como unnatural offenses. Surpreendentemente não se registou então nenhum caso de bestianismo, rapto, assalto indecente ou crimen injuria. Entre 1892-1923, os magistrados julgaram aproximadamente trezentos casos de crimes homossexuais, 90% dos casos envolvendo africanos. Destes, 19% provinham de diferentes etnias de Moçambique ( Epprecht,203). Em 1904, “the head of C.I.D on the Witwatersrand reported that ‘unnatural offences are very prevalente on the mines among the natives’, particularly the Shangaan. In Southern Mozambique,

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Nova Lei do Trabalho inclui protecção de trabalhadores contra a discriminação na base da orientação sexual, mas...! A nova Lei do Trabalho, aprovoda recentemente pela Assembleia da República e já promulgada pelo Presidente da República, no seu artigo 4, estabelece o princípio da não discriminação em razão da orientação sexual na interpretação e aplicação das normas desta Lei. Isto significa que todos os trabalhadores cobertos por esta Lei, independentemente de serem homossexuais, bissexuais ou heterossexuais, beneficiam dela de forma igual. No entanto, o número 1 do artigo 54, sobre os Direitos do trabalhador, já não inclui a orientação sexual no rol das categorias que não podem ser usadas na determinação da igualdade de direitos no trabalho. Estão lá as outras todas habituais, como a origem étnica, língua, raça, sexo, estado civil, etc., menos a orientação sexual! Vai ser interessante ver como o aparente

Eu vivi... por Carmen Elsa

Eu sou a Carmen e vivo em Maputo. Hoje vou contar-vos a minha experiência como lésbica de tantas histórias da minha vida. Lembro-me muito bem que desde pequena sempre gostei de fazer actividades que exigissem mais esforço físico, as actividades que denominam masculinas. Sempre gostei de jogar a bola, subir em árvores, andar de rolamento e bicicleta, skate enfim, já da para notar que sempre fui uma tom boy (“Maria rapaz”). Passei a fase da infância com este meu lado muito mais acentuado que o meu lado feminino, pelo que a minha adolescência passou sem que eu tivesse vestido uma saia ou vestido. Tive o meu primeiro contacto homossexual, o meu primeiro amor feminino, aos 24 anos. Tudo começou como uma curiosidade que se transformou em um prazer que de início era uma luta entre o que eu estava a viver e o que os outros a minha volta queriam que eu vivesse. Vivi 3 anos escondendo o meu amor do mundo, chamava-a de “minha melhor amiga”. O mais estranho disso é que essa melhor amiga estava em todo o sítio que eu estava e dormia sempre comigo. Toda gente falava nas minhas costas sobre a suspeita de nossa relação amorosa e eu

desfasamento entre estes dois artigos será tratado, se um caso de discriminação no âmbito dos direitos laboral com base na orientação sexual for levado aos tribunais! Há mais dois artigos desta Lei que são de interesse e importância para a protecção de trabalhadores homossexuais ou bissexuais, nomeadamente o artigo 5, sobre o Direito à privacidade, que afirma que “o empregador obriga-se a respeitar os direitos de personalidade do trabalhador, em especial o direito à reserva da intimidade da vida privada” e que “o direito à privacidade diz respeito ao acesso e divulgação de aspectos relacionados com a vida íntima e pessoal do trabalhador, tais como os atinentes à vida familiar, afectiva, sexual...”, e o nunca confirmava com medo do que os outros pensariam de mim. Como se as outras pessoas vivessem a minha vida por mim. Lembro-me de ter tido grande confronto interno pelo que cresci acreditando, o que vivia e o que o mundo queria que eu vivesse. Eu ia aos convívios familiares com a “minha melhor amiga” (no momento) e como sempre antes de qualquer refeição tinhamos de fazer oração de benção em tudo. No meio da oração havia sempre passagens de pedido de perdão à Deus pelos pecadores que não sabiam o que estavam a fazer e listavam esses pecadores: os ladrões, os assassinos, os gays, as lésbicas, os mentirosos e a lista proceguia. Quando a oração acabava todos os olhos dos presentes voltavam-se para nós duas. Eu chorava e pedia com o coração aberto a Deus que me mostrasse o caminho certo e, se eu estava errada que me corrigisse porque eu aprendi que o lugar de quem anda contra Deus é no inferno. Para não vos contar também da situação que o meu irmão teve de passar por ter uma irmã lésbica... contou-me ele que sempre que chegasse em lugares em que seus amigos estivessem, havia um congelamento de conversa e ele não entendia o porquê até que um dia um dos amigos decidiu contar-lhe que todos se calavam porque o tópico do papo era eu, a irmã lésbica... enfim, ele é meu irmão querido e amigo que acabou aceitando e ultrapassando o contragimento que previamente sentia quando falavam de mim.

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artigo 6, sobre a Protecção de dados pessoais, que diz que “o empregador não pode exigir ao trabalhador, no acto de contratação ou na execução do contrato de trabalho, a prestação de informações relativas à sua vida privada, excepto quando particulares exigências inerentes à natureza da actividade profissional o exijam, por força de lei ou dos usos de cada profissão, e seja previamente fornecida, por escrito, a respectiva fundamentação”. No entanto, a frase: “excepto quando particulares exigências inerentes à natureza da actividade profissional o exijam, por força...dos usos de cada profissão” é muito subjectiva e aberta às mais diversas interpretações e abusos subsequentes

Tudo mudou no dia em que acordei e pufff... descobri que a minha vida pertence apenas a mim, ninguem a viverá melhor se eu não fizer por mim mesma. Apartir desse dia saí da máscara, assumi e amei por viver abertamente o que sou e o que quero ser. Um dia cruzei-me com uns amigos que já não via a muito tempo e no meio do papo, e em tom de gozo, eles me agruparam a uma outra mulher da cidade falada lésbica a mais tempo que eu. Eu confirmei que sou e que o facto de ser não afectaria o meu jeito de ser. Eu não me tranformaria em outra Carmen por ser lésbica. Aí eles quiseram se justificar porque pensaram que eu fosse desmintir ou fugir da minha realidade. Outras foram as situações com a minha irmã e primas mas, graças a Deus hoje vivo numa família que, apesar de ser super Cristã, Religiosa e Crente, me aceita do jeito que sou pois acabaram descobrindo que a minha opção em orientação sexual não afecta e nem muda o meu ser. Eu sou a Carmen mulher abençoada por Deus, a irmã, a mãe de duas meninas lindas, a trabalhadora e feliz.

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Os problemos mais comuns entre homens gays Alguns problemas de saúde são mais comuns entre homens gays do que entre a população hétero. Naturalmente todos - gays e héteros - têm os mesmos riscos, mas vida sexual, noite, drogas, depressão, além de outros fatores como o culto ao corpo, aumentam a incidência de certos males entre gays. É bom conhecê-los para serem evitados. É comum também o indivíduo não procurar ajuda médica por ter vergonha em assumir que fez sexo com outro homem, no caso de ter uma doença venérea. A saída costuma ser a auto-medicação, que pode ter conseqüências ainda mais sérias.

Corpo & Mente

A eficácia do sexo seguro em reduzir a taxa da infecção de HIV é uma das histórias de grandes sucesso da comunidade gay. Mas nos últimos poucos anos observouse o retorno de muitas práticas inseguras de sexo, como a crescente prática do barebacking. O sexo seguro continua sendo a única forma para evitar o HIV, o uso do coquetel não cura, tampouco é confortável.

A depressão e a ansiedade parecem afetar homens gays em uma taxa mais elevada do que na população geral. A probabilidade delas aparecerem parece ser maior, talvez pela opressão da sociedade, os problemas na família e a necessidade de se esconder que muitos de nós encontramos. Adolescentes e jovens também têm maiores riscos, provocados pela crise sexual e de identidade, comum a essa fase.

4.Depressao

7. Hepatite

2. DTSs

5. Cancro anal

8.Cancro da próstata ou testicular

1. HIV-SIDA

Mais uma vez, quanto mais a pessoa fizer sexo com um número maior de parceiros, maiores serão as chances de contrair uma doença sexualmente transmissível. Gonorréia, sífilis, chato,hpv ... São perigosos e de difícil tratamento. A gonorréia também pode atingir o ânus. Nesses casos o tratamento é mais severo.

O vírus HPV é o maior causador do câncer de cólo de útero em mulheres. Transmitido pelo pênis, ele também pode infectar o ânus em homens e causar cancro anal. Alguns profissionais de saúde recomendam exames para gays com a mesma periodicidade que nas mulheres: todo ano.

3. Álcool

6. Tabaco

Os índices de dependência do álcool entre gays é superior ao número encontrado na população hétero, apesar do uso ser equivalente. Os motivos são os mesmos que explicam o uso das drogas ilícitas.

Em algumas pesquisas recentes, o uso de cigarro entre gays atinge 50 % da população gay, número assustador. O uso dessa substância causa problemas sérios, como cancro de pulmão, aumento da pressão arterial, problemas no coração, entre outros.

Quem faz muito sexo tem muitas chances de ser infectado pelo vírus da hepatite. Ele causa sérios danos ao fígado e pode evoluir para um cirrose ou câncer. É fatal e dois dos três tipos mais comuns de vírus tem tratamento eficaz. Mesmo assim é necessário descobrir a doença em estágios iniciais. Mais uma vez, sexo seguro é importante, e para evitar a hepatite também o sexo oral deve ser protegido.

é lenda a história que gays tem menos chances de desenvolver cancro de próstata ou nos testículos por “usarem” bastante. Isso afasta gays do consultório para a realização do exame recomendável a partir dos 35 anos. A indicação médica para esses casos é igual tanto para gays quanto para héteros.

9. Vigorexia ( doença do culto ao corpo)

Os problemas com a imagem do corpo são comuns entre homens gays. Na verdade, a incidência de vigorexia, anorexia ou bulimia entre homens hétero é quase nula. O exercício regular é muito bom para a saúde cardiovascular e para outras áreas, o exagero é prejudicial. Associados ao culto do corpo, é comum aparecer o uso de esteróides e suplementos prejudiciais à saúde. Isto pode causar um grande número de problemas de saúde: diabetes, a pressão elevada e a doença de coração.

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LÉSBICAS E DOENÇAS VENÉREAS (Parte i) Uma coisa que as mulheres lésbicas de forma geral não imaginam, é que elas podem sim ter várias doenças sexualmente transmissíveis, algumas delas até em maior número e com mais complicações do que em heterossexuais ou bissexuais. Isso se dá por falta de alguns cuidados e informação adequada. Nesta e próximas e edições iremos falar sobre as principais delas e ver de modo que você informe-se sobre elas.

Corpo & Mente

As DTSs As DTSs podem ser entendidas como qualquer doença que seja transmitida através de relações sexuais, que podem variar desde um beijo até um ato sexual propriamente dito. Também são conhecidas como DOENÇAS VENÉREAS, uma associação com a deusa Vénus da mitologia grega, responsável pelo amor e sexo. Na grande parte das vezes a pessoa que está infectada transmite à outra através da relação sexual, mas também pode ser durante o beijo, sexo oral, brincadeiras com dedos, brinquedos, uso de roupas íntimas, enfim tudo que proporcione o contacto do vírus ou da bactéria de uma pessoa com a outra. Entre as lésbicas o número de transmissão do HIV (vírus que provoca a SIDA) são bem baixos, mas outras DTSs apresentam índices altos.

Principais sinais e sintomas das DTSs em mulheres

1. Aparecimento de feridas (úlceras) em regiões como a vagina, grandes lábios, interior da boca, perto do ânus. 2. Corrimento: o corrimento da mulher é maior quando ela está no período de ovulação, mas é um corrimento claro e sem cheiro. Se o corrimento mudar de cor, ficar com um cheiro forte, manchar a calcinha ou tiver um sabor diferente, indica fortemente alguma alteração na flora da vagina e a presença de uma DTS. 3. Verrugas nas regiões vaginal e anal são forte indício de DTSs, especialmente o HPV. 4. Ardência ou comichão, mais sentidas quando vai se urinar ou no início ou fim da relação sexual. Algumas mulheres podem sentir as duas coisas juntas, ou separadas, ou sentir só de vez em quando. 5. Dor ou mal estar, geralmente uma dorzinha incómoda abaixo do umbigo, na parte baixa da barriga, quando se urina, evacua ou nas relações sexuais.

A melhor forma de prevenir o contágio é através da camisinha, mas entre lésbicas isso só é válido no caso de uso de vibradores, objectos, não dá para usar a camisinha, ainda que seja a feminina. O ideal então é que se tenha o máximo de higiene e cuidados com a saúde possíveis. As DTSs, e aqui não vamos falar do HIV-SIDA que merece um capítulo especial, podem levar a sérias complicações como disfunções sexuais, dor durante o acto sexual, esterilidade, aborto, alguns tipos de cancro e até morte. Como saber se contraiu uma DTS? Existem vários sintomas que podem indicar a presença de uma DST, mas muitas delas não têm sintomas e só podem ser diagnosticadas através de consultas ao ginecologista e exames.

A Sífilis A sífilis é uma DTS causada por bactéria que pode ou não ter um período de incubação e até não apresentar sintomas, isso pode variar entre 15 dias até 3 meses. Os sintomas são muito variados, mas geralmente há o aparecimento de gânglios, que são os órgãos responsáveis pela defesa do organismo, conhecidos como ínguas. Esse gânglios vão estar aumentados e dolorosos e aparecem geralmente na virilha. Nesta fase inicial podem aparecer também algumas feridas arredondadas que não doem, nem coçam. E aí aparece um corrimento amarelado pela vagina. Como nesta fase já pode tem as bactérias circulando pelo organismo, podem surgir outros sintomas como febre, mal-estar, cansaço, dores nas juntas. E mesmo antes do aparecimento dos sintomas, a bactéria já está presente no sangue e nas secreções e é possível ser transmitida. A sífilis é especialmente perigosa em mulheres grávidas, pois pode causar malformações nos fetos. É uma doença muito séria, mas que tem um tratamento rápido, seguro, barato e eficaz se for descoberta a tempo. Por isso se você tem algum destes sintomas,é muito importante que procure um ginecologista.

A Gonorreia A gonorreia também é uma doença causada por bactéria e as formas de transmissão são muito parecidas com as da sífilis, ou seja: sexo oral, vaginal, anal, beijos, dedos, brinquedos. Além deste nome feio, a gonorreia tem um período de incubação menor do que o da sífilis, entre dois e sete dias, e homens e mulheres tem sintomas um pouco diferentes. Sintomas na mulher • Corrimento vaginal • Dor no canal da vagina com irritação • Alterações intestinais O tratamento também é rápido e eficaz, mas deve ser feito com rapidez.

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Homossexualidade é uma doença? A APA (Associação Americana de Psiquiatria) retirou a homossexualidade do seu “Manual de Diagnóstico e Estatística de Distúrbios Mentais” (DSM) em 1973, depois de rever estudos e provas que revelavam que a homossexualidade não se enquadra nos critérios utilizados na categorização de doenças mentais. A homossexualidade é, portanto, uma forma de orientação sexual. Em 1991, a Organização Mundial da Saúde passa a não considerar a homossexualidade como doença.

O que é a homossexualidade?

sociadas a doenças. Por isso, hoje não se usa mais a palavra homossexualismo. O correcto é usar homossexualidade ou homoafectividade, esta última para não dar a conotação meramente sexual.

ua o”? lism

É a orientação do desejo (paixões e fantasias sexuais) para a pessoa do mesmo sexo. No caso do homossexual seu objeto de desejo é uma pessoa do mesmo sexo. Na natureza encontramos dois tipos de identidade de gênero; o masculino e o feminino. Porém, existem mais de dois tipos de orientação sexual. A grande maioria das pessoas tem a orientação sexual heterossexual, mas encontramos outras com a orientação homossexual ou mesmo bissexual. Isto ocorre por conta da diversidade da natureza.

r oo termo “H o usaNão, v e D sufixo “ismo” é usado omos ex para terminologia de palavras as-

Homossexualidade é uma opção que a pessoa faz na vida ou uma orientação sexual que é independente da vontade da pessoa?

Hoje já se sabe que ser gay ou ser lésbica não é uma opção. Este é mais um mito: as pessoas são gays por opção! Optar significa escolher em ser ou não ser gay. Assim como o heterossexual não escolhe em ser ou não ser heterossexual, o mesmo acontece com o homossexual. Existem vários factores que determinam esta orientação, que é independe da vontade das pessoas, por isto não é uma opção. A ciência, os psicólogos e os médicos não chegaram ainda a uma conclusão. Acredita-se que factores genéticos, culturais e sociais influenciam na fixação da orientação. A questão encontra-se em aberto.

ualmente empregue • GAY - Termo us ens atraídos para descrever hom mente e ica amorosamente, fis tros homens. Gays ou r po te espiritualmen is o experiências sexua não precisam ter tid o s. Na verdade, nã com outros homen alquer experiência qu o precisam ter tid ys. tificarem como ga sexual para se iden m pode ser usado nu O termo também ra descrever toda a pa , sentido coletivo . (consultar termo) comunidade GLBT r que é atraída • LESBICA- Mulhe icamente e amorosamente, fis . r outras mulheres espiritualmente po o sam ter tid Lésbicas não preci heres. is com outras mul ua sex s ia experiênc ecisam ter tido Na verdade, não pr ia sexual para se nc riê qualquer expe o lésbicas. identificarem com

ente, divíduo amorosam • BISSEXUAL-In o íd ra at te tualmen fisicamente e espiri . res he ul m r po to quan tanto por homens ecisam ter tido Bissexuais não pr m is equivalentes co ua experiências sex o nã e, ad rd . Na ve homens e mulheres alquer experiência qu o tid ter m sa preci tificarem como sexual para se iden bissexuais. UAL- Indivíduo • HETEROSSEX icamente e amorosamente, fis raído por pessoas do espiritualmente at m sexuais não precisa sexo oposto. Heteros s oa ss pe m co is ua s sex ter tido experiência m sa verdade, não preci do outro sexo. Na para experiência sexual er ter tido qualqu is. ua sex os ter mo he se identificarem co Termo originado do • NO ARMÁRIOe um indivíduo qu inglês que denota le ua sex o çã ta en ori não divulga sua tras esforça para que ou frequentemente se . la áest a at pessoas não venham

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coisas da vida das manas... Quadro I O Sol estava quente, a praia cheia, como em qualquer Domingo de Verão em Maputo, e eu deitado na areia, à sombra, sozinho, a curtir a ressaca da festa da noite anterior. Fora uma festa como eu já não via há muito tempo – apesar de se terem distribuído apenas cerca de cem convites, tinham aparecido pelo menos trezentas pessoas, ou melhor dizendo, trezentos homens! Meu Deus, que enchente! Nunca tinha visto tanto homem junto num sítio tão pequeno, homens de todas as idades, de todos os estilos, de todos os tamanhos… E tanta cara nova! Não consigo deixar de pensar no Belmiro. Aquela cara de puto malandro, olhar provocador e um sorriso de derreter qualquer coração…E o estúpido do José António que não largava o miúdo, sempre a empatar-me o jogo! Pelo menos consegui passar-lhe o meu número de telefone quando o José António estava distraído a olhar para o novo namorado da “Antonieta”, aquela bicha barulhenta e escandalosa! Só espero que o puto me telefone ainda hoje…Oh, meu Deus, o que é aquilo que vem aí? Pela areia da praia vem caminhando uma autêntica escultura. Que pernas, santo Deus! Hmmm, peito musculoso! Deixa-me pôr os óculos escuros para o poder observar à vontade, sem ser notado…e como ginga a andar, filho-da-mãe! O tipo sabe que é bom! Olha para o atrevido, a olhar para mim! Deixa-me tirar os óculos e ensaiar um sorriso…isso mesmo, filho, abranda o passo e vem ter com o papá. Não querem ver que ele vem mesmo! - “Alô, tudo bem?!”, pergunta-me numa voz que me fez tremer até ao fundo do coração. O tom da voz dele é ao mesmo tempo forte, aveludado e meio rouco… Fico sem palavras. A custo respondo: “Ya, tudo numa boa. O que fazes? A passear?” - “Ya, a ver se encontro alguma coisa interessante para fazer.” - “Como o quê?”, pergunto em tom um pouco provocador (seja o que Deus quiser!) - “Bater um papo com uma pessoa como tu.” - “Como eu? O que é que eu tenho de especial?” - “Não sei, pareces um gajo porreiro. Acho que vai dar para sermos amigos. Não gostarias?” E brinda-me com um sorriso irresistível. O meu coração já não aguenta de bater com tanta força. “Ya, acho que seria uma cena nice.” -“Como é, estás aqui sózinho?” - “Ya, a tentar curar as lazeiras de ontem à noite.” - “Devias tomar uma cerveja.” Concordo. Chamo um dos miúdos que andam pela praia a vender cerveja e, enquanto o puto se aproxima a correr, aproveito para perguntar como ele se chama. “Júlio”, responde sem hesitações e a sorrir. - “Eu chamo-me Beto.” E apertamos a mão. Noto que ele agarrou a minha mão um pouco mais demoradamente do que seria normal. - “Também queres uma cerveja?”, pergunto-lhe. - “Ya, pode ser. Uma 2M.”

Compro as cervejas, brindamos à nossa nova amizade e continuamos a conversar. É estudante, tem 19 anos e vive em casa dos pais no Alto-Maé. Tem uma namorada, mas é uma chata e, por isso, ele quer acabar com o namoro. “Agora, não quero mais pitas, só enchem o juízo dum gajo!” Pergunta-me se eu namoro e eu respondo que não. “Não estou interessado em mulheres. São uma dor de cabeça!” Sorri-me com um sorriso cúmplice e pergunta-me: “O que vais fazer mais logo?” Respondo que vou ficar em casa e ele quer saber se a sua visita será bem-vinda. Sem hesitar, respondo que sim, que pelo menos assim terei alguma companhia. Indico-lhe onde vivo e ele promete aparecer às 20 horas. Agradece a cerveja, levanta-se e arranca. Ai, meu Deus, não acredito! Tudo aquilo é a bundinha dele?! Quadro 2 O Toni acordou com uma dor-de-cabeça monumental. Até parecia que um muro tinha desabado em cima dele. De repente, lembrou-se da noite anterior, olhou para o lado e o espaço à sua esquerda na cama estava vazio. - “Onde é que o gajo está?”, interrogou-se em voz alta. Segundos depois, já mais desperto, saltou da cama num pulo, deu uma vista de olhos a correr pelo pequeno apartamento e correu a verificar os bolsos das jeans que usara na noite anterior. A carteira ainda estava lá, mas vazia de dinheiro. Oitocentos contos tinham voado. - “Porra! Mas que queca cara! Ainda por cima nem curti nada por causa daquela bebida toda que despejei na festa!”, barafustou sozinho. Sentou-se na beira da cama, deu um suspiro profundo, voltou a levantar-se e foi lavar-se. A água quente do chuveiro a bater-lhe na cara e nas costas relaxou-o um pouco. Meia hora depois apenas encolhia os ombros como quem diz: “Ossos do ofício!” Não era a primeira vez que isso acontecia. Depois de tomar o matabicho, enfiou um fato-de-banho e olhou-se ao espelho. O ginásio estava a fazer-lhe bem. O six-pack estava a ficar bem definido, o peito também. Assim, pelo menos tentava disfarçar o rolar dos anos que não pára e compensava o pouco que a Mãe-Natureza lhe tinha dado entre as pernas. Acabou de se vestir, meteu-se no carro e foi para a praia à procura de outras “manas”. Um pouco antes da Costa do Sol, viu o Beto junto à água e parou para ir ter com ele. Quadro 3 - “Lá vem aquela bicha inglesa, com aquela barriga de cerveja pendurada. Nem tem vergonha. Não se cuida, anda sempre mal-vestida. Que horror. E ainda insiste em ter algo connosco! Julga que somos dessas “crianças” que ele apanha aí nas esquinas ou na Feira!”, disse o Toni para o Beto, ao verem o Andrew a aproximar-se. - “Olá. Estão bons?”, perguntou o inglês, com aquele seu sotaque torcido, que nem parece estar em Moçambique há mais de três anos. - “Estamos porreiros. Apenas um pouco cansados. E tu? Não ‘tás com boa cara! O que é que se passa?”

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Conto do mês - Coidas da vida das manas...

- “Tenho uma problema. Não sei se vocês me podem conselhar um pouco.” - “Na sexta-feira foi ao “Missanga” e encontrei lá um jovem que pediu para eu lhe comprar uma cerveja. Eu comprei a cerveja e depois ele sentou-se na minha mesa e começou a apalpar minha perna e meu sexo. Depois perguntou se podiamos ir para a casa juntos. Fomos para a casa, dormimos juntos e na manhã ele foi embora porque disse que tinha que ir visitar a avó no Bairro do Benfica. Pediu-me dinheiro para chapa e para comprar uma garrafa de vinho para a avó e eu dei. Ontem à noite apareceu outra vez com um papel da polícia a dizer que eu tenho que ir na esquadra, porque eu violei a ele. Se não quiser ir na esquadra, tenho que pagar três milhões para ele. Estou muito aflito. O que é que vou fazer?” - “Não paga nada!”, respondeu imediatamente o Beto. “Esses gajos têm que aprender que não podem brincar connosco dessa maneira. Vocês fizeram alguma coisa?” - “Fizemos, mas ele é que me…”, respondeu o Andrew, meio envergonhado. “Sem-vergonha, seu inglês dum raio. É bem-feito! Tens a mania que carregas toda a porcaria para tua casa! Agora é que te queixas”, disse o Beto para si mesmo. “Então, ele não tem como provar nada!”, disse depois em voz alta. “Para além disso, sexo entre homens não é crime em Moçambique”, acrescentou em tom firme. “Que idade é que ele tinha?”, perguntou. - “Acho que já tinha 22 ou 23”, respondeu o inglês. “Pelo menos desta vez não pegaste num desses molwenes da rua como é teu hábito”, pensou o Beto. - “O meu problema é se ele vai no meu serviço. Pode ser um escândalo. Os meus colegas sabem da minha vida, mas eu gosto de ser discreto. Se ele faz escândalo, pode ser o meu contrato não vai ser renovado quando terminar daqui a seis meses”, lamentou-se o Andrew (Andy para os íntimos e Adriana na lista de alcunhas da comunidade). - “Então é melhor dares qualquer coisa para ele calar a boca”, disse o Toni. - “Acho que vou fazer isso. Eu não quero deixar Moçambique. Aqui tem rapazinhos muito bonitos”, respondeu a bicha inglesa, com um ar resignado, mas ao mesmo tempo com um sorriso deliciado nos lábios. Quadro 4 - “Vamos, amor, está a ficar tarde.” - “Já estou pronto. Vamos!” O casal saíu de casa, em roupas de Verão, com ar feliz, depois de uma noite super-calma e agradável. Tinha começado com um jantar no Gaivota, à beira-mar e à luz de velas, com o som das ondas e de velhos êxitos de música disco dos anos setenta, misturados, a fazerem-lhes companhia. Depois foram tomar um copo ao Burako Loko: um gin tonic duplo para o Pedro e uma caipirinha para o Saíde. Dali foram para casa, onde se seguiu uma longa sessão de massagens mútuas e depois… o inevitável! De manhã, tinham acordado relaxados e bemdispostos. O Saíde levantara-se primeiro para comprar o jornal e pão e depois preparara o matabicho, que foi servido na cama,

como é hábito aos domingos. Em seguida, o outro ritual dominical: ir à praia. - “Achas que a festa de ontem animou?”, perguntou o Saíde. - “Sei lá. Já estou farto dessas festinhas, sempre com as mesmas pessoas, as mesmas conversas, a mesma música e que acabam sempre com os mesmos engates e figuras tristes”, respondeu o Pedro, com o seu habitual sarcasmo, encolhendo os ombros. - “Acho que fizemos bem em não ir. Pelo menos aproveitámos a noite a fazer coisas bem mais excitantes!”, retorquiu o Saíde. Os dois viviam juntos há dois anos, depois de um curto namoro de três meses. Ambos sabiam o que queriam e estavam cansados das aventuras de uma noite só e por isso tinham decidido fazer a vida a dois. A prática tinha demonstrado que fora a opção certa. Quando chegaram à Costa do Sol já passava das 12H30. O Pedro já pensava nas amêijoas deliciosas que ia comer. Sentaram-se na varanda do Restaurante, pediram uma garrafa de vinho branco – Boschendal Blanc de Blanc 1999 - e mariscos e puseram-se a observar a praia. À distância, reconheceram o Toni, o Beto, o Andrew e mais duas “manas” dengosas do bairro do Aeroporto – a “Chica” e a “Zeza”, de fio dental e uns tops curtíssimos. O Saíde riu-se e chamou a atenção do Pedro. - “Deixa lá, Saíde. É por isso que eu não gosto de ir lá para baixo. Ainda nos confundem com aquelas malucas!”, disse o Pedro. - “É isso, Pedro. Afinal, somos todos Gays, mas somos todos diferentes!”, sentenciou o Saíde. Entretanto chegaram as amêijoas e deleitaram-se a comêlas, acompanhadas pelo Boschendal bem gelado. Quadro 5 A campaínha tocou. O Beto abriu a porta e era o Júlio. A roupa justa ficava-lhe tão bem quanto o fato de banho. Entrou e foram para a sala. Sentaram-se a conversar e beber. As mãos do Beto começaram a subir pelas pernas do Júlio. A seguir foram para o quarto. Trinta minutos depois voltaram para a sala. O Beto estava desiludido. A garrafa era, sem dúvida, excelente, mas o conteúdo parecia soda sem gás. Apesar de todos os esforços do Beto, o Júlio não tinha conseguido nem “aquecer” um pouco. Desculapara-se que estava nervoso e que era a primeira vez com outro homem. Ao despedir-se disse que tinha visto uns sapatos nices e gostaria de os comprar, mas faltavam-lhe trezentos paus e perguntou se o Beto lhos poderia emprestar. O Beto franziu a testa, já a ver o jogo. Respondeu-lhe que não tinha dinheiro em casa, mas por fim acabou por lhe dar 50 contos “para umas cervejas”. Depois do Júlio sair, atirou-se para cima do sofá e deixou rolar uma lágrima. Com um suspiro, disse em voz alta: “Coisas da vida das manas!” - Thando M.

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