Já a segunda parte do questionário voltou-se para questões relacionadas ao envolvimento do entrevistado com o objeto de estudo. Das 09 questões formuladas para a segunda bateria do questionário, duas delas são espaços para relatos pessoais de vivências e experiências com a cidade, focando na memória e impressões de cada um sobre o espaço urbano. A primeira questão pertencente à segunda parte diz respeito sobre o indivíduo morar ou não no município. Vale ressaltar que a parcela enquadrada como não-morador ainda possui algum tipo de relação com o município, seja no presente ou no passado. Como resposta, temos que, a partir da Figura 13, 77,1% dos entrevistados moram na cidade de São Bernardo do Campo.
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Fonte: Autoria própria.
Figura 12 - Gráfico de atividade exercida
Em seguida, temos como questão complementar, se o entrevistado exerce ou não alguma atividade frequente no município. Assim, a partir da Figura 14, temos que 40,0% das pessoas não exercem nenhuma atividade frequente dentro da área de estudo. Correlacionando com a questão sobre o tipo de atividade exercida, podemos deduzir que parte dos entrevistados tem relação com a cidade apenas para moradia, exercendo ou não seus trabalhos em outras regiões vizinhas.
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Fonte: Autoria própria.
Figura 13 - Gráfico sobre moradia
Partindo para as questões sobre as impressões das pessoas com o objeto de estudo, fizemos uma questão livre para os entrevistados escreverem sobre seus incômodos a respeito da cidade de São Bernardo do Campo. Ao quantificarmos, o padrão de repetição sobre as temáticas descritas nos fizeram separar as respostas em 6 grupos diferentes, são eles: respostas sobre questões envolvendo mobilidade urbana; segurança pública; infraestrutura/zeladoria; desigualdade urbana; políticas públicas e outros (respostas que fugiram do universo da pergunta ou que não havia incômodo algum.)
Assim, ao tabelarmos essas respostas conforme Figura 15, obtivemos a maioria dos relatos de incômodos sobre a cidade relacionados à mobilidade urbana, com 40,0% das respostas explicitando o descontentamento com a quantidade de engarrafamento que há na cidade, falta de variedade de modais e falta de ciclovia.
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Fonte: Autoria própria.
Figura 14 - Gráfico sobre atividades exercidas dentro do município
Para entender melhor a relação dos entrevistados com o centro de São Bernardo do Campo, perguntamos em nosso questionário se eles conheciam essa parte da cidade. Como demonstrado na Figura 16, temos que 98,6% conhece/tem relação com a região central.
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Fonte: Autoria própria.
Figura 15 - Gráfico sobre os incômodos
Ainda relacionada à região central da cidade, a questão seguinte pedia para que os entrevistados citassem, de forma livre, construções e/ ou ruas que remetessem ao centro de São Bernardo do Campo. Assim, quantificamos as respostas por vezes que o item foi mencionado, conforme Figura 17, tendo, nas 3 primeiras posições, ruas e avenidas pertencentes à região, são elas: Rua Marechal Deodoro, com 51 citações; Avenida Jurubatuba, com 31 citações; Avenida Brig. Faria Lima, com 20 citações. A construção arquitetônica mais citada, classificada em quarta posição, é a Igreja Matriz, com 16 citações. Os locais e edifícios que foram citados duas vezes ou menos foram classificados como “outros”.
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Fonte: Autoria própria.
Figura 16 - Gráfico sobre o centro
Perguntamos em seguida, também de forma livre, se os entrevistados consideravam que a cidade tem algum marco arquitetônico, dessa vez livre para considera-lo em outra localidade fora do centro de São Bernardo do Campo. Também quantificamos as respostas por vezes que item foi mencionado. Assim, conforme Figura 18, temos as duas primeiras posições ocupadas por construções localizadas no centro de São Bernardo do Campo, sendo elas: Paço Municipal, mencionado 18 vezes, e a Igreja Matriz, mencionada 11 vezes. Em terceira posição, temos o edifício da Antiga Companhia Cinematográfica Vera Cruz, mencionada 7 vezes.
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Fonte: Autoria própria.
Figura 17 - Gráfico de citações sobre o centro
E como última questão possível de quantificar a partir da quantidade de vezes que foram citados, questionamos aos entrevistados se eles conheciam algum Patrimônio Cultural de São Bernardo do Campo, afim de entender a relação das pessoas com parte do conhecimento histórico do município. A partir da Figura 19, vemos que o patrimônio tombado mais conhecido é a Antiga Companhia Cinematográfica Vera Cruz, citada 16 vezes. Em seguida, temos a Chácara Silvestre, localizada no bairro Nova Petrópolis e citada 15 vezes. Em terceira posição, a Igreja Santa Filomena é o patrimônio localizado no centro da cidade mais citado, com 9 ocorrências.
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Fonte: Autoria própria.
Figura 18 - Gráfico de marco arquitetônico
As últimas duas questões, como já explicitado, são de caráter mais subjetivos, sendo um espaço livre para que os entrevistados relatassem suas memórias e impressões sobre a cidade de São Bernardo do Campo. Na primeira delas, pedimos para que eles descrevessem a cidade a partir do ponto de vista pessoal. Como respostas, obtivemos mais da metade das pessoas descrevendo de forma positiva, onde os entrevistados comentaram coisas como “Uma cidade completa.”; “Bem estruturada e evoluindo.”; “Uma cidade agradável para morar.”. No entanto, a outra parcela dos comentários foi mais crítica, deixando comentários como “Infelizmente a cidade está suja, largada e perigosa.”; “Não planejada para atender a população periférica.”; “Uma cidade grande que perdeu muito com a saída em massa da indústria e que tem muitos problemas com infraestrutura e transportes.”.
Para a última questão, também subjetiva, pedimos que os entrevistados descrevessem uma memória pessoal que envolvesse a cidade. Assim, obtivemos muitos comentários saudosistas e lembranças se referindo à ci-
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Fonte: Autoria própria.
Figura 19 - Gráfico sobre Patrimônios Culturais
dade com carinho. Para preservar a identidade de cada um, identificaremos pelo número correspondente. O entrevistado 69 trouxe a seguinte memória:
“Fim dos anos 80 início dos 90,pista de skate,rachas de carros e motos na Kennedy no jardim do mar e na Kennedy do assunção nas madrugadas de sábado,as danceterias,tanto no sábado a noite e as matines dos domingos,o futebol de campo onde todos bairros tinha seu time ,calux,vila euro,vila ferreira ,vila vivalde, Paulicéia,Taboão,baeta,orquídeas,Jd do lago,vila São José,vila Marques,Nazareth inclusive tinha um campo de futebol inesquecível bem na chegada ,na estrada Samuel azemberg,Jd santo Ignácio,orquídeas represa os casas e mais alguns que não veio aqui na memoria no momento,futebol que agitava todos os domingos tanto na hora dos jogos quanto depois com a resenha nos bares e até durante a semana gerava conversas no trabalho de tão badalado que era ,o futebol foi um encanto recheado de muitas alegrias pra nós que trabalhava a ,semana toda na esperança de chegar inteiro e inspirado no jogo,bons tempos!” (Entrevistado 69, Questionário da Pesquisa para monografia, 2023)
Assim como o entrevistado 69, outros comentaram lembranças que demonstram a relação do indivíduo com o espaço. O entrevistado 29, por exemplo, descreveu em seu depoimento:
“As memórias de São Bernardo estão relacionadas ao meu trabalho. A construção de Centro de Formação para o Magistério foi no começo de minha carreira. Teve um ou dois anos de oferecimento de cursos e depois perdeu a lógica. As enchentes no Paço Municipal e o sofrimento da população sempre ficaram nas minhas memórias. Os parques Salvador Arena, Raphael Lazzuri e Parque da Juventude me trazem memórias de bons passeios. As bibliotecas me trazem também boas memórias. Fiz pesquisas e leituras pela rede de bibliotecas.” (Entrevistado 29, Questionário da Pesquisa para monografia, 2023)
A partir dessas lembranças e de todo o restante da pesquisa, é possível compreender qual a visão que as pessoas possuem do município, além também do nível de envolvimento de cada um com o espaço urbano. Além dos comentários transcritos como forma de exemplificar, muitos outros vieram carregados de memórias, com afeto e saudosismo.
4.3 análise dos resultados obtidos
A partir da pesquisa realizada em março, buscamos articular as questões sobre memória e vivências sobre a cidade. Esta associação nos permitiu compreender o espaço de análise e obter um diagnóstico da forma como este relaciona-se com as pessoas e sobre sua importância na formação de uma lembrança. Passamos, então, a quantificar e entender de forma mais criteriosa as respostas obtidas. Assim como já explicita-
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do, o público atingido, em sua maioria, dentro da amostra das 70 pessoas participantes da entrevista são: mulheres, acima dos 45 anos, não participantes do regime CLT e moradores de São Bernardo do Campo. Dentro das respostas obtidas, principalmente nas questões que envolviam o entendimento do entrevistado sobre o município, passamos a delinear o imaginário de cada um. Foi possível compreender que o Centro desempenha uma posição de destaque os relatos recolhidos, corroborando com a escolha da área de estudo. Assim como a região central ocupa um lugar de destaque, alguns trechos e edifícios pertencentes ao bairro ficaram em maior evidência, como é o caso da Rua Marechal Deodoro e da Av. Jurubatuba, da Igreja Matriz, da Igreja Santa Filomena e da área do Paço Municipal. A arquitetura e a história local estão presentes em diversos dos pontos levantados, tendo sido citadas tanto nas percepções, quanto sensações, quanto referenciadas nas questões abordadas. Ao pedirmos para que os entrevistados descrevessem a cidade, obtivemos uma variedade de palavras utilizadas para definir o mesmo espaço, ficando evidente a diversidade de visões sobre o mesmo objeto, enfatizando que diferentes observadores percebem o espaço de diferentes formas. Entretanto, todas elas auxiliam no processo de entender um imaginário coletivo. Ainda que houve diversos comentários positivos e calorosos a respeito do município, fica indispensável não ressaltar aqueles que trouxeram considerações sobre alguns dos incômodos que também tabelamos, focando, principalmente na mobilidade urbana, na segurança pública e na infraestrutura/zeladoria. Dentre os relatos classificados no tópico de mobilidade urbana, podemos ressaltar as críticas a respeito do engarrafamento na cidade, da pouca variedade de modais disponíveis para a população e também a falta de ciclovias. Para o tópico de segurança pública, o destaque ficou para os comentários sobre violência nas ruas, onde alguns relataram ser impeditivo para participar do espaço urbano de forma ativa. Entre os comentários classificados como infraestrutura/zeladoria, podemos ressaltar aqueles que desaprovam a atual manutenção do sistema viário e da limpeza urbana. Alguns dos comentários se referiam, em particular, ao estado de conservação e descaracterização da área central.
Mesmo destacando os incômodos citados pelos entrevistados, enfatizamos como cada um deles se referiu a cidade de forma agradável e, muitas vezes, saudosista, destacando sempre o afeto que possuem com o espaço urbano em questão. Dessa forma, conseguimos entender a importância de uma metodologia que leva em consideração a leitura popular
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aplicada ao planejamento urbano, servindo como base portanto para a construção das diretrizes de manutenção desse espaço. Assim, alinhando as percepções dos autores Gordon Cullen (1996) e Kevin Lynch (1997), para que haja a compreensão do meio, é necessário que ocorra uma leitura articulada e com interação entre espaços-pessoas, atraindo o observador a participar da paisagem urbana com suas vivências e individualidade.
memória e gestão 57
experiêcias de planejamento urbano no mundo
5
memória e gestão
5.1 planejamento e qualidade de vida
A qualidade de vida, em sua essência, abrange diferentes aspectos que influenciam a satisfação e o bem-estar das pessoas em suas vidas cotidianas. Na medicina, por exemplo, a qualidade de vida é frequentemente relacionada à saúde física e mental, envolvendo indicadores como a expectativa de vida, a prevalência de doenças e o acesso a serviços de saúde. No entanto, para compreender a qualidade de vida em seu sentido mais amplo, é necessário considerar também outros fatores que vão além da esfera da saúde individual. No campo do urbanismo, a qualidade de vida é entendida como uma medida do nível de satisfação e bem-estar das pessoas em relação ao ambiente urbano em que vivem. Nesse contexto, o espaço físico desempenha um papel central na determinação da qualidade de vida urbana. A qualidade do ambiente construído, a acessibilidade a infraestruturas básicas, a disponibilidade de áreas verdes, a segurança pública e a qualidade do transporte público são apenas alguns dos elementos que podem impactar significativamente o bem-estar dos cidadãos. Uma cidade que busca promover a qualidade de vida deve oferecer espaços públicos adequados, que permitam o convívio social e o lazer, além de garantir a segurança dos seus habitantes. A presença de parques, praças, ciclovias e áreas de recreação contribui para a promoção de um estilo de vida saudável e ativo. Além disso, uma infraestrutura urbana eficiente, que facilite o acesso a serviços essenciais, como saúde, educação e transporte, é fundamental para melhorar a qualidade de vida dos moradores.
A qualidade do espaço urbano também está intrinsecamente ligada à sustentabilidade ambiental. Cidades com políticas de planejamento que incentivam o desenvolvimento sustentável, com redução da poluição, preservação de áreas verdes e uso eficiente dos recursos naturais, tendem a oferecer uma melhor qualidade de vida para seus habitantes. A relação entre o ambiente urbano e a qualidade de vida vai além da esfera individual, impactando também a coletividade e as futuras gerações.
A qualidade de vida urbana está intrinsecamente vinculada à qualidade do espaço em que as pessoas vivem. A promoção de uma boa qualidade de vida nas cidades requer a criação de ambientes que atendam às necessidades físicas e sociais da população.
No entanto, o espaço urbano é muito mais do que meras estruturas físicas e geográficas. Ele é um palco onde inúmeras histórias se entrelaçam e se desenvolvem, representando um mosaico de experiências hu-
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manas. O espaço é uma simultaneidade de histórias mal acabadas, uma interseção de diferentes trajetórias que se desdobram e se entrecruzam.
Nesse contexto, ao trabalhar com a cidade, é essencial resgatar a dimensão temporal, pois o tempo desempenha um papel fundamental na relação com o espaço. A cidade é um organismo vivo, constantemente em transformação e evolução. A dimensão temporal refere-se à dinâmica da cidade, à sua capacidade de se adaptar, de se reinventar e de se renovar ao longo do tempo. É um processo contínuo de troca, mudança e renovação.
Por outro lado, a dimensão espacial é a manifestação concreta dessa multiplicidade contemporânea. O espaço, quando percebido como lugar, adquire significado social. Ele se torna o palco onde as interações humanas acontecem, onde as relações sociais são construídas e onde a identidade coletiva se manifesta. O espaço urbano é o ponto de encontro das pessoas, dos diferentes grupos sociais e culturais, e é nele que se dá a expressão da vida urbana em todas as suas dimensões.
Ao considerar a cidade como representação, compreendemos que ela vai além de sua dimensão física. A cidade é uma construção social, um reflexo das dinâmicas e das relações humanas. Ela é um conjunto de símbolos, valores, práticas e significados compartilhados pela comunidade que a habita. A cidade é o resultado da interação entre o espaço físico e as pessoas que o ocupam, é a representação concreta das aspirações, necessidades e identidades coletivas.
Portanto, ao trabalhar com a cidade, é essencial reconhecer a interdependência entre tempo e espaço. É preciso compreender a cidade como um organismo vivo e em constante transformação, onde as histórias individuais e coletivas se entrelaçam e se entrelaçam em um tecido social complexo. A cidade, enquanto representação, é o reflexo dessa dinâmica, é o cenário onde as múltiplas narrativas se encontram e se entrelaçam, formando a identidade e a cultura urbana. Compreender essa relação entre tempo, espaço e cidade é fundamental para o planejamento urbano, pois permite a criação de espaços que atendam às necessidades das pessoas, promovam a inclusão social, valorizem a diversidade e construam uma urbanidade significativa e enriquecedora para todos. Nesse contexto, as memórias sociais representam as experiências compartilhadas por uma comunidade ao longo do tempo. Elas são um patrimônio coletivo que reflete a identidade, a cultura e a história de um local. Assim, a incorporação dessas memórias no planejamento é essencial para criar uma conexão entre os moradores e o espaço urbano em que vivem. Ao considerar as memórias sociais no planejamento urba-
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memória e gestão
memória e gestão
no, é possível valorizar e preservar o legado cultural de uma comunidade. A requalificação de espaços urbanos históricos, a preservação de patrimônios arquitetônicos e a revitalização de áreas degradadas podem ser feitas de maneira a preservar as memórias sociais e fortalecer o sentimento de pertencimento dos moradores.
Além disso, a incorporação das memórias sociais contribui para a construção de uma cidade mais inclusiva e participativa. Ao envolver os moradores no processo de planejamento, permitindo que expressem suas memórias, desejos e necessidades, é possível criar espaços urbanos mais adaptados às demandas locais. Essa abordagem colaborativa fortalece os laços comunitários, promove o diálogo e a coesão social, fatores essenciais para uma boa qualidade de vida nas cidades.
Outro aspecto relevante é a valorização da memória como recurso para o desenvolvimento sustentável. A história de um local e suas memórias podem fornecer insights valiosos para a preservação ambiental, o uso adequado do espaço e a criação de políticas públicas eficientes. Através do conhecimento das práticas tradicionais, da relação com a natureza e das soluções encontradas no passado, é possível buscar alternativas mais sustentáveis e resilientes para o desenvolvimento urbano.
A incorporação das memórias sociais no planejamento urbano também auxilia na construção de uma cidade mais humanizada. Ao reconhecer a importância das narrativas individuais e coletivas, é possível criar espaços que promovam o bem-estar emocional e a qualidade de vida dos moradores. A preservação de lugares de significado cultural, a criação de locais de memória e a promoção de eventos culturais fortalecem a identidade local, enriquecem o tecido social e contribuem para uma cidade mais acolhedora.
A partir desta reflexão a cerca do planejamento urbano prezando a qualidade de vida, apresentaremos 3 estudos de casos como referência no debate sobre medidas trabalhadas em escala urbana. O primeiro deles, trataremos sobre a cidade de Chicago, localizada no estado de Illinois, Estados Unidos. Neste exemplo, podemos entender, além de outros fatores, como se desenvolveu o setor industrial e compará-la com nosso objeto de estudo. Em uma segunda análise, trataremos de Vancouver, na Colúmbia Britânica do Canadá, nos apoiando no entendimento da forte imigração que ocorreu na cidade, além de formas que a gestão encontrou para envolver a população em decisões urbanas. Por último, falaremos sobre a cidade de Medellín, em Antioquia, na Colômbia, onde iremos refletir sobre os problemas urbanos e as soluções adotadas que se aproximam melhor da nossa realidade latino-americana.
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5.2
experiência em chicago - illinois, eua: chicago go to 2040
Chicago, Illinois | EUA
Área do Município: 607,4 km²
População: 2,7 milhões
PIB per capita (US$): US$ 67.268
A cidade de Chicago, utilizada como estudo de caso, está localizada no estado de Illinois, nos Estados Unidos. Geograficamente, a cidade está situada na costa sudoeste do Lago Michigan, um dos Grandes Lagos da América do Norte e é dividida em 10 distritos, conforme Figura 21. Sua localização estratégica no centro dos Estados Uni-
64 memória e gestão
Fonte: Autoria própria.
Figura 20- Mapa de situação | Chicago
dos, combinada com uma infraestrutura robusta, contribui para tornar a cidade um dos mais relevantes hubs logísticos e de distribuição.
Figura 21- Distritos de Chicago
A cidade é reconhecida como um dos principais centros econômicos globais, abrigando um conjunto diversificado de setores e indústrias. O mercado financeiro de Chicago é renomado, com a presença de instituições financeiras de renome internacional, bolsas de valores e empresas de investimento. Além disso, a cidade é um importante polo de negócios, com uma ampla gama de empresas líderes em diversos setores, como tecnologia, manufatura, transporte e logística. A influência de Chicago transcende as fronteiras nacionais, desempenhando um papel significativo nos mercados globais e servindo como um centro de inovação e empreendedorismo. Em suma, a relevância financeira e a influência de Chicago são fundamentais tanto na econo-
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Fonte: We Will Chicago - City of Chicago.
mia nacional quanto no cenário internacional, solidificando sua posição como uma das cidades mais importantes e dinâmicas do mundo. Dito isso, cidade enfrenta uma série de desafios urbanos relacionados à industrialização e outros fatores. Como uma cidade que experimentou um rápido crescimento industrial no final do século XIX e início do século XX, Chicago enfrenta os legados da poluição industrial e degradação ambiental. A presença de antigas fábricas e instalações industriais abandonadas representa desafios em termos de reabilitação de terrenos contaminados e revitalização de áreas urbanas deterioradas. Além disso, a industrialização passada contribuiu para a segregação socioeconômica e racial, com a formação de bairros empobrecidos e negligenciados. Esses bairros enfrentam dificuldades em termos de acesso a serviços básicos, empregos de qualidade e oportunidades de desenvolvimento. A desigualdade socioeconômica e a segregação residencial são desafios significativos para a cidade. Além disso, Chicago também lida com problemas relacionados à infraestrutura, como o envelhecimento do sistema de transporte público, a necessidade de investimentos em infraestrutura viária e a escassez de moradias acessíveis. Esses desafios urbanos exigem abordagens integradas e políticas públicas eficazes para promover o desenvolvimento sustentável, reduzir as disparidades socioeconômicas e melhorar a qualidade de vida para todos os residentes. Por isso, a Agência Metropolitana para o Planejamento de Chicago (CMAP), passou a auxiliar na reestruturação local ao implementar o plano “Go to 2040”, lançado em 2010 e atualizado em 2015. O plano nada mais é do que uma série de diretrizes com o objetivo de promover o desenvolvimento a longo prazo de toda a Região Metropolitana de Chicago, visando a sustentabilidade, a participação social e a equidade.
O Plano é baseado em quatro eixos principais, que são diretrizes urbanas fundamentais para orientar o crescimento e o desenvolvimento da região. Esses eixos fornecem recomendações e ações específicas para abordar os desafios urbanos e alcançar uma cidade mais habitável, socialmente engajada, com boa governança e mobilidade eficiente.
O primeiro eixo, “Comunidades habitáveis - criando o senso de local”, concentra-se na criação de comunidades sustentáveis e habitáveis. Isso envolve o planejamento adequado do uso do solo e da habitação, garantindo que haja uma mistura adequada de usos residenciais, comerciais e de lazer. Também é importante gerir e conservar os recursos hídricos e energéticos, promovendo práticas de conservação e sustentabilidade. Além disso, o plano busca expandir e melhorar parques e espaços abertos para oferecer áreas verdes acessíveis à população. A promoção de uma alimentação
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e
memória
gestão
sustentável, incluindo a produção local de alimentos, também é uma prioridade para garantir a segurança alimentar e a saúde das comunidades.
O segundo eixo, “Capital social - aprendendo, trabalhando e informando”, concentra-se na melhoria da educação e no desenvolvimento da força de trabalho. O plano busca melhorar a qualidade e o acesso à educação em todos os níveis, desde a primeira infância até o ensino superior, para garantir que os residentes tenham as habilidades necessárias para prosperar em um ambiente econômico em constante evolução. Além disso, o plano busca promover a aprendizagem contínua e o desenvolvimento profissional ao longo da vida. A disponibilidade de oportunidades de emprego de qualidade também é uma preocupação, com ênfase no desenvolvimento econômico inclusivo e na criação de empregos bem remunerados para todos os residentes. O terceiro eixo, “Governança eficiente - alcançando a transparência”, concentra-se na reforma do governo e na melhoria da transparência e responsabilidade. Isso envolve a revisão dos sistemas estaduais e impostos locais para torná-los mais eficientes e justos. Além disso, o plano busca melhorar o acesso à informação e a participação dos cidadãos no processo de tomada de decisão. A coordenação de investimentos entre diferentes agências governamentais também é uma prioridade para garantir a eficiência e maximizar os recursos disponíveis. Por fim, o quarto eixo, “Mobilidade regional - locomoção”, concentra-se na melhoria do transporte e da mobilidade na região metropolitana de Chicago. Isso inclui investimentos estratégicos em infraestrutura de transporte, como estradas, pontes e trilhos, para melhorar a conectividade e reduzir o congestionamento. Além disso, o plano promove um compromisso contínuo com o transporte público eficiente, incluindo a expansão e modernização das redes de metrô, ônibus e trem. O objetivo é criar uma rede de transporte integrada e acessível, que atenda às necessidades de todos os residentes, baseando-se no princípio de Cidade de 15 minutos.
Em suma, o Plano Chicago Go to 2040 é uma estratégia abrangente que visa orientar o crescimento e o desenvolvimento da região metropolitana de Chicago de forma sustentável, equitativa e inclusiva. Ao estabelecer diretrizes e metas claras, o plano busca abordar os desafios urbanos enfrentados pela cidade, proporcionando qualidade de vida para seus habitantes. Trazendo como comparativo para o objeto de estudo, Chicago e São Bernardo do Campo são duas cidades que enfrentaram desafios urbanos significativos relacionados ao seu histórico de industrialização. Embora tenham passado por processos de industrialização em perío-
memória e gestão 67
dos diferentes, ambos os locais tiveram que lidar com os impactos socioeconômicos, ambientais e estruturais resultantes dessa transformação. Apesar desses desafios compartilhados, é importante reconhecer que Chicago e São Bernardo do Campo possuem diferentes contextos e níveis de desenvolvimento. Chicago é uma cidade globalmente influente, com uma economia diversificada e recursos consideráveis para enfrentar seus desafios urbanos. São Bernardo do Campo, por sua vez, é uma cidade industrializada no Brasil, enfrentando desafios em um contexto de desenvolvimento emergente. É importante adaptar as soluções para cada contexto específico, levando em consideração os recursos disponíveis, as particularidades locais e as necessidades da população. Os problemas relacionados à infraestrutura, desigualdade social e pressões ambientais são comuns a ambas as cidades e o enfrentamento desses desafios requer uma abordagem integrada, envolvendo políticas públicas eficazes, participação cidadã e cooperação entre os setores público e privado.
68 memória e gestão
5.3 experiência em vancouver - colúmbia britânica, can: “vancouverismo”
Vancouver, Colúmbia Britânica | CAN Área do Município: 114,94 km²
População: 675.218
PIB per capita (US$): US$ 44.337
Utilizada como estudo de caso, a cidade de Vancouver, no Canadá, está situada na costa oeste do país, na Península Burrard, dentro da província da Colúmbia Britânica, demostrada na Figura 23. Vancouver é amplamente reconhecida como uma das cidades mais habitáveis e bem planejadas do mundo, possuindo um planejamento urbano que reflete
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Fonte: Autoria própria.
Figura 22- Mapa de situação | Vancouver
os valores de sustentabilidade, inclusão social, preservação do meio ambiente e promoção de uma alta qualidade de vida para seus residentes.
A cidade enfrentou desafios comuns a muitas áreas urbanas, como crescimento populacional devido à imigração, aumento da densidade e demandas por infraestrutura. Com o aumento da densidade populacional, houve a demanda por habitação acessível. O mercado imobiliário aquecido e a especulação imobiliária têm levado a aumentos significativos nos preços das moradias, tornando difícil para muitos moradores encontrar opções de moradia adequadas e acessíveis. Além disso, a pressão sobre as infraestruturas existentes, como transporte, saneamento e serviços públicos, tem sido uma preocupação constante. Outro desafio importante é a busca pela sustentabilidade ambiental, com a necessidade de reduzir as emissões de carbono, proteger espaços verdes e recursos naturais, e promover práticas de construção sustentável. Mas, apesar dos desafios, a cidade soube contornar essas questões de maneira inovadora e eficiente.
O planejamento urbano tem sido fundamental para encontrar soluções criativas e inovadoras para enfrentar esses desafios, envolvendo
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Fonte: Vancouver Plan, 2022.
Figura 23 - Mapa Vancouver
a participação da comunidade, o estabelecimento de políticas progressistas e o investimento em projetos de infraestrutura e desenvolvimento urbano sustentável. Uma das características mais marcantes desse planejamento urbano, é o conceito do “Vancouverismo”. Esse termo descreve uma abordagem de planejamento que enfatiza a densificação moderada, a mistura de usos do solo, o desenvolvimento orientado para o transporte público e a criação de espaços públicos de alta qualidade, além de uma série de outros pontos marcantes, buscando criar uma cidade sustentável, com alta qualidade de vida e foco na densidade populacional equilibrada.
Apoiado no conceito de Vancouverismo, a Câmara Municipal da cidade aprovou em julho de 2022 o “Plano de Vancouver”, uma série de diretrizes que orientam o crescimento de longo prazo da cidade de forma eficiente, esclarecendo o crescimento e as mudanças que ocorrerão pelos próximos 30 anos, baseando sua fundamentação nos seguintes princípios: Reconciliação; Equidade e Resiliência.
O plano dividiu-se em 05 fases, que incluiu uma etapa inicial de ampla participação popular através de pesquisas digitais, reuniões comunitárias, sessões de diálogo, entrevistas e divulgação presenciais, para criar uma rede de contribuição e parceria para que os resultados do planejamento fossem mais responsivos, inclusivos e acolhedores. Além disso, para embasar o conceito adotado, o plano contém 11 capítulos de políticas que cobrem os principais tópicos de construção da cidade. São eles: Habitação; Economia; Clima; Ecologia; Transporte; Creche; Infraestrutura Comunitária; Artes, Cultura e Patrimônio; Espaços Públicos; Bacias Hidrográficas e Recursos Hídricos e Sistemas Alimentares.
O principal foco do Plano é a Estratégia de Uso do Solo, que, primeiramente, visa direcionar novas opções de moradia para áreas residenciais de baixa densidade, que são ricas em amenidades e atualmente carecem de serviços adequados. Isso permitirá não apenas uma melhor distribuição das opções de moradia, mas também adicionará oportunidades para o estabelecimento de novas infraestruturas nessas áreas. Além disso, o plano visa fortalecer o papel de Vancouver como centro cultural e econômico da região, ao mesmo tempo em que gerencia o crescimento de forma a priorizar a saúde, a felicidade e o bem-estar dos residentes. Isso significa equilibrar o desenvolvimento econômico com a qualidade de vida, promovendo um ambiente urbano que seja vibrante, inclusivo e que atenda às necessidades de seus habitantes. Outro objetivo importante é incentivar uma vida urbana mais sustentável e inclusiva. Isso implica em promover a cria-
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ção de habitações e empregos acessíveis em áreas que possam ser facilmente alcançadas a pé ou por meio de transporte público. Dessa forma, busca-se reduzir a dependência do automóvel, melhorar a mobilidade urbana e contribuir para a redução das emissões de carbono.
A estratégia também busca fortalecer os centros existentes e apoiar o desenvolvimento de novos bairros. Isso é alcançado por meio da incorporação de habitação do tipo “Missing Middle” em aglomerados de lojas locais, espaços de trabalho flexíveis, creches, espaços públicos e locais de arte e cultura. A ideia é criar comunidades vibrantes, onde as pessoas possam viver, trabalhar e desfrutar de uma variedade de serviços e atividades em seu próprio bairro. Adicionalmente, a estratégia enfatiza a criação de uma rede integrada de espaços públicos, corredores ecológicos, vias verdes e incentiva o uso de modos ativos de deslocamento, como caminhar, rolar e andar de bicicleta, baseando-se no conceito de Cidade de 15 minutos. Essa abordagem visa promover um estilo de vida saudável, melhorar a conectividade e proporcionar uma experiência urbana agradável para os cidadãos. Por fim, a estratégia de uso da terra em Vancouver também valoriza a ecologia e a sustentabilidade ambiental. Busca-se permitir que a ecologia funcione em todo o espaço urbano, integrando soluções de infraestrutura verde em locais, bairros e em toda a cidade. Isso inclui a preservação de áreas naturais, a promoção da biodiversidade e a adoção de práticas de construção e desenvolvimento sustentáveis.
É possível observar o plano macro da Estratégia de Uso do Solo a partir do mapa iconográfico elaborado pelos idealizadores do projeto, na Figura 24.
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Fonte: Vancouver Plan, 2022.
Figura 24 - Plano de Estratégia de Uso do Solo em Vancouver
A partir da implementação desse plano único, baseado no vancouverismo, a cidade tem como objetivo final até 2050 tornar-se ainda mais sustentável, inclusiva e com qualidade de vida para os seus habitantes. Essa abordagem busca equilibrar o crescimento urbano com a preservação do meio ambiente, promovendo o uso eficiente do espaço, a proteção das áreas naturais e a redução das emissões de carbono. Além disso, visa criar comunidades vibrantes e diversificadas, onde as pessoas possam viver, trabalhar e desfrutar de uma variedade de serviços e amenidades em seu próprio bairro, reduzindo a dependência do automóvel e incentivando o uso de modos de transporte sustentáveis. Outro objetivo é garantir a acessibilidade à moradia e empregos, promovendo a criação de habitações e oportunidades de trabalho próximas umas das outras, facilitando o deslocamento a pé ou por transporte público. O plano também busca fortalecer a identidade cultural e econômica da cidade, incentivando a criação de espaços públicos, áreas verdes e locais de arte e cultura. No geral, o objetivo final é construir uma cidade mais equitativa, saudável e próspera, onde as necessidades e aspirações da comunidade sejam atendidas de forma sustentável e inclusiva. Comparando o estudo de caso com o objeto deste trabalho, vemos que, embora os desafios urbanos enfrentados por Vancouver e São Bernardo do Campo sejam diferentes em escala e contexto, ambos compartilham a necessidade de planejamento urbano estratégico para enfrentar essas questões. O rápido crescimento populacional, o aumento da demanda por novas infraestruturas e o histórico de imigração aproximam os dois municípios na necessidade de compartilhar boas práticas para contribuir com o desenvolvimento urbano eficiente e equitativo.
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5.4 experiência em medellín - antioquia, col: projecto urbano integral
Medellín, Antíoquia | COL Área do Município: 382 km²
População: 2,5 milhões
PIB per capita (US$): US$ 3.794
Medellín é uma cidade colombiana localizada às margens do rio Medellín e atualmente é a segunda cidade mais populosa da Colômbia, depois de Bogotá. Está situada no centro geográfico do Vale de Aburrá, na cordilheira central dos Andes. A cidade se divide em seis zonas, divididas por sua vez em comunas, como demonstrado na Figura 26.
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Fonte: Autoria própria.
Figura 25 - Mapa de situação | Medellín
A cidade latino-americana implementou uma série de estratégias de transformação urbana a partir da iniciativa do Projeto Urbano Integral (UPI), encomendado pela empresa EDU (Empresa de Desarrollo Urbano). O projeto teve como objetivo principal melhorar as condições de vida dos residentes, promover a inclusão social e reduzir as desigualdades por meio de intervenções urbanas abrangentes. O UPI foi implementado em várias áreas da cidade, com foco em bairros historicamente marginalizados e afetados por problemas sociais e econômicos. O projeto envolveu o desenvolvimento de infraestrutura, espaços públicos, habitação, transporte, educação e serviços sociais. Por meio de ações estratégicas e inovadoras, a gestão local conseguiu fomentar o desenvolvimento econômico e proporcionar alternativas de financiamento para os grupos mais vulneráveis da cidade. Essas medidas não apenas apoiaram a geração de renda, mas também romperam o ciclo da pobreza, promovendo uma maior inclusão social. Uma das principais forças impulsionadoras desse processo foi a ênfase na inovação, que estimulou a implementação de soluções criativas para os desafios enfrentados pela cidade. Ao adotar abordagens
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Fonte: Escuela del Habitat - CEHAP - Facultad de Arquitectura - UNAL.
Figura 26 - Comunas de Medellín
inovadoras para o desenvolvimento econômico, Medellín abriu caminho para novas oportunidades, incentivando a criação de negócios sustentáveis e o crescimento de setores promissores. Essa abordagem ajudou a diversificar a economia local e reduzir a dependência de setores tradicionais, gerando mais resiliência e estabilidade para a cidade. Além disso, o UPI reconheceu a importância da participação cidadã como uma ferramenta essencial durante momentos de mudanças sociais tão intensas. A EDU e outras entidades envolvidas no projeto buscaram envolver os residentes locais em todas as fases do processo, desde a concepção até a implementação das intervenções. Através de espaços de diálogo e consulta, a população foi convidada a fazer parte ativa das decisões e ações que moldaram o futuro de Medellín. Essa abordagem fortaleceu o sentimento de pertencimento e engajamento da comunidade, estabelecendo uma nova cultura de desenvolvimento baseada na participação e no interesse pelo bem comum. Os cidadãos passaram a se envolver ativamente na gestão pública e a contribuir com ideias e soluções inovadoras, promovendo um senso de responsabilidade coletiva pelo futuro da cidade. Como parâmetros quantitativos, um dos resultados mais expressivos do projeto é a queda acentuada na taxa de homicídios. Segundo o Programa de Cidades Sustentáveis, entre 1991 e 2010, houve uma redução de quase 80% nesse índice. Entre 2010 e 2011, especificamente, a taxa de homicídios diminuiu em 19,4%, atingindo 69,9 mortes por 100 mil habitantes. Essa redução significativa na violência tem sido fundamental para promover a sensação de segurança e melhorar a qualidade de vida dos cidadãos.
O projeto também obteve resultados positivos na área socioeconômica. A linha de pobreza, no período entre 2002 e 2010, diminuiu em 39%, passando de 36,1% para 22%. Da mesma forma, a indigência também registrou uma redução de 29%, de 7,9% para 5,6%, embora em uma proporção menor. Esses números indicam uma melhoria significativa nas condições de vida da população, contribuindo para a redução da desigualdade social.
Outro resultado quantitativo relevante é o investimento decidido pelos cidadãos, que corresponde a 5% do orçamento municipal. Essa medida demonstra o compromisso com a participação democrática e a transparência na gestão pública, permitindo que os cidadãos contribuam ativamente nas decisões e prioridades do desenvolvimento da cidade.
A implementação do projeto trouxe benefícios significativos para a cidade de Medellín. O planejamento urbano incorporou elementos como espaços verdes, ciclovias, transporte público eficiente e acessível, além de infraestruturas adaptadas para pessoas com mobilidade reduzi-
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da. A construção de novas escolas, bibliotecas, espaços verdes, espaços culturais e centros de conhecimento contribuiu para a melhoria da qualidade de vida dos cidadãos. Essas novas infraestruturas oferecem oportunidades educacionais, culturais e de lazer, promovendo a inclusão social e contribuindo para a redução da criminalidade e do desemprego. Fazendo um comparativo com o objeto de estudo deste trabalho, Medellín e São Bernardo do Campo compartilham algumas características sociais comuns e o laço latino-americano. Ambas as cidades possuem uma diversidade étnica e cultural significativa, resultado da migração interna e externa. No entanto, Medellín enfrentou um histórico de violência e conflitos relacionados ao narcotráfico, enquanto São Bernardo do Campo se desenvolveu como um polo industrial, com forte presença de sindicatos e movimentos trabalhistas. Em termos de desenvolvimento urbano, Medellín enfrentou desafios significativos devido à topografia montanhosa da região. No entanto, a cidade adotou medidas ousadas para melhorar a mobilidade urbana, como a construção do sistema de metrô, teleféricos e escadas rolantes nas comunidades mais inclinadas. Essas iniciativas transformaram Medellín em uma referência global em termos de mobilidade sustentável e acessibilidade.
São Bernardo do Campo, por sua vez, desenvolveu-se como uma cidade industrial, com grande concentração de empresas e indústrias. No entanto, a expansão urbana desordenada e a falta de investimentos em transporte público resultaram em problemas de mobilidade, congestionamentos e poluição. A cidade está investindo em melhorias na infraestrutura de transporte, como a ampliação do sistema de transporte público, para enfrentar esses desafios. Além disso, São Bernardo do Campo tem promovido projetos de revitalização urbana, como a requalificação de áreas degradadas e a criação de espaços públicos para o lazer e convívio da população. Essas ações visam melhorar a qualidade de vida e promover a sustentabilidade urbana na cidade. Medellín se tornou um exemplo de modelo sustentável para outras cidades ao redor do mundo. Sua abordagem integrada, que combina desenvolvimento econômico, inclusão social, participação cidadã e planejamento urbano voltado para as pessoas, demonstra que é possível conciliar crescimento econômico com proteção ambiental e justiça social. Essa abordagem inspiradora não apenas melhorou a qualidade de vida dos habitantes de Medellín, mas também serviu como referência para outras cidades que buscam soluções sustentáveis para os desafios urbanos.
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a memória social construindo diretrizes para o planejamento urbano de sbc
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6.1 análise de diretrizes do plano diretor
Entender as diretrizes do plano diretor após conhecer a história da cidade de São Bernardo do Campo/SP é fundamental para embasar novas diretrizes mais eficientes e adequadas ao contexto local. A história de uma cidade carrega consigo uma série de elementos que influenciaram o seu desenvolvimento ao longo do tempo, e compreender esses aspectos históricos permite uma análise mais profunda das necessidades e potenciais do município.
Primeiramente, ao estudar a história de São Bernardo do Campo, é possível identificar os principais marcos e eventos que moldaram a cidade. Desde sua origem como um pequeno povoado, passando pelo desenvolvimento industrial durante o século XX até os desafios e transformações enfrentados nos dias atuais, a história da cidade reflete a dinâmica de seu crescimento, as mudanças socioeconômicas e as relações com o ambiente natural.
Ao compreender a evolução urbana de São Bernardo do Campo, é possível identificar os erros e acertos do passado, considerando o impacto das decisões tomadas em termos de planejamento e desenvolvimento urbano. Analisar os resultados das políticas anteriores, entender os desafios enfrentados e reconhecer as demandas da população ao longo do tempo são aspectos cruciais para embasar novas diretrizes mais adequadas às necessidades e aspirações da comunidade. Outro aspecto relevante é a compreensão dos desafios e problemas enfrentados pela cidade ao longo de sua história. Questões como crescimento desordenado, falta de infraestrutura adequada, problemas ambientais, mobilidade urbana e desigualdades socioeconômicas são recorrentes em muitas cidades, e São Bernardo do Campo, como vimos, não é uma exceção. Ao analisar os erros e dificuldades passados, é possível aprender com essas experiências e traçar diretrizes mais eficientes, que abordem de forma mais eficaz os problemas e desafios contemporâneos. Além disso, ao conhecer a história da cidade e agrega-la à memória social, é possível identificar os elementos de identidade e patrimônio que devem ser preservados e valorizados. São Bernardo do Campo possui uma rica herança cultural, com locais históricos, monumentos, áreas verdes e uma diversidade cultural presente em sua população. Ao incorporar esses elementos na formulação das diretrizes do plano diretor, é possível garantir a preservação do legado histórico e cultural da cidade, promovendo um senso de pertencimento e identidade para os seus habitantes.
Dessa forma, iremos analisar partes do último Plano Diretor apro-
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vado para a cidade de São Bernardo do Campo, o Plano Diretor Estratégico (PDE), instituído pela Lei Municipal nº 6.184/2011 (SÃO BERNARDO DO CAMPO, 2011), mas que passou por atualizações ao longo dos anos. Atualmente, ele é o documento de referência para o planejamento urbano, norteando a atuação do poder público e orientando as ações e intervenções no território municipal. Em seus objetivos principais, ele visa assegurar um crescimento ordenado e sustentável, buscando conciliar o desenvolvimento econômico com a qualidade de vida da população e a preservação do meio ambiente e do patrimônio cultural. Na época em que estava em processo de aprovação, ele foi resultado de um amplo processo de participação popular e discussão com diversos setores da sociedade civil, órgãos públicos e especialistas. Durante esse processo, foram realizadas audiências públicas, consultas populares e debates para envolver a comunidade e incorporar suas demandas e perspectivas. Analisando o PDE (SÃO BERNARDO DO CAMPO, 2011), vigente com base nos 3 itens que mais obtivemos relatos, sendo eles mobilidade urbana, segurança pública e infraestrutura/zeladoria, podemos assimilar a partir dos objetivos descritos no Capítulo V – Dos Objetivos e Diretrizes da Política Municipal de Saneamento Básico e no Capítulo VI –Dos Objetivos e Diretrizes da Política Municipal de Mobilidade Urbana. Assim, o Capítulo V do Plano Diretor Estratégico instituído pela LM 6.184, de 21 de Dezembro de 2011, delineia como objetivos relacionados à saneamento básico os seguintes itens:
Art. 20. São objetivos da Política de Saneamento Básico:
I - universalizar o acesso ao saneamento básico, de forma adequada à saúde pública e à segurança da vida;
II - assegurar a integralidade, compreendida como o conjunto de todas as atividades e componentes de cada um dos diversos serviços de saneamento básico, propiciando à população o acesso na conformidade de suas necessidades e maximizando a eficácia das ações e resultados; e
III - garantir a eficiência e a sustentabilidade econômica na prestação dos serviços, tanto os que estão sob responsabilidade direta do Município, quanto os serviços concedidos, garantindo segurança, qualidade e regularidade. (SÃO BERNARDO DO CAMPO, 2011, p. 09)
Fica entendido, dessa forma, que o município propõem como objetivo geral o abastecimento de água potável, o esgotamento sanitário, a limpeza urbana e manejo dos resíduos sólidos e a drenagem e manejo das águas pluviais urbanas, englobado todo o conjuntos de serviços, infraestruturas e instalações compreendidas como saneamento básico. Para o Capítulo VI do mesmo PDE, também instituído pela LM
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6.184, de 21 de Dezembro de 2011, os objetivos relacionados à política de mobilidade urbana
são:
Art. 23. São objetivos da Política Municipal de Mobilidade Urbana:
I - aperfeiçoar os sistemas intra e interurbanos de circulação e transportes para que atendam às necessidades da população em geral, assegurando conforto, segurança e rapidez;
II - tornar mais homogênea a acessibilidade em toda a área urbanizada do Município, ampliando o acesso da população de baixa renda ao sistema de mobilidade;
III - otimizar a distribuição de bens e serviços, o abastecimento e o escoamento da produção municipal de forma articulada ao transporte e movimentação de pessoas;
IV - priorizar a circulação do transporte coletivo e do modo a pé sobre o transporte individual motorizado na ordenação do sistema viário;
V - garantir condições de segurança, regularidade, continuidade e desobstrução do espaço viário destinado à circulação do pedestre;
VI - priorizar a acessibilidade das pessoas com deficiência e mobilidade reduzida;
VII - reduzir a emissão de poluentes pelos veículos motorizados, respeitando-se os índices de qualidade ambiental definidos pela legislação competente;
VIII - ampliar e aperfeiçoar a participação da sociedade na gestão, fiscalização e controle do sistema de transporte, mantendo canais de informação e de participação da sociedade para garantir o aprimoramento do sistema; e
IX - articular o sistema de mobilidade urbana com o metropolitano e o estadual, existente e plane- jado. (SÃO BERNARDO DO CAMPO, 2011, p. 10-11)
Como explicitado nos objetivos gerais, o PDE (SÃO BERNARDO DO CAMPO, 2011) prevê itens entendidos como essenciais na busca de cidades mais resilientes, inclusivas e sustentáveis: a priorização do transporte coletivo, a redução de emissão de poluentes, a integração de modais, além de enfatizar a participação popular na gestão. Temos, assim, que o Plano Diretor Estratégico é um instrumento vivo e dinâmico, que precisa ser constantemente revisado e atualizado para se adequar às demandas e transformações da cidade ao longo do tempo. Apesar de contar em seus objetivos tópicos fundamentais para uma cidade que proporcione qualidade de vida, o município alvo desta pesquisa necessita exercer de forma mais ampla as ações que possibilitem a concretização de cada uma dessas questões. Ao trazermos em questão o conceito de “Cidade de 15 Minutos”, conceito desenvolvido por Carlos Moreno que visa criar cidades mais sustentáveis, equitativas e voltadas para as necessidades dos moradores locais, vemos que, ao compararmos os 3 municípios escolhidos como estudo de caso, com a cidade de São Bernardo do Campo, ambas as 03 baseiam-se nessa
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estrutura de planejamento, mas isso não ocorre com o alvo dessa pesquisa.
Ao tratarmos de ações para preservação de cultura e patrimônio, São Bernardo do Campo possuí muitos objetivos ligados ao tema, fortalecendo a preservação histórica da região. Mas ainda nessa temática, novas diretrizes poderiam auxiliar ainda mais.
Já quando trazemos em questão a participação social, podemos de fato considerar que há um espaço para envolvimento popular nas diretrizes de gestão urbana. Entretanto, esse espaço poderia ser ampliado com envolvimento e a colaboração ativa dos cidadãos na tomada de decisões e na definição de políticas e ações relacionadas ao desenvolvimento e planejamento das cidades, principalmente com o aumento de audiências e consultas públicas, criação de conselhos e comitês, parcerias com organizações da sociedade civil e mais transparência na gestão. Estendendo os tópicos abordados em todas as análises comparativas com os estudos de casos, elaboramos um quadro comparativo dos quatro município, demonstrado na Figura 27, com a área de cada um deles, PIB per capita, população total, atividade econômica predominante e o principal desafio a ser contornado no planejamento urbano. Apesar das semelhanças já apontadas, podemos perceber que os municípios divergem em alguns aspectos e enfrentam diferentes questões.
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Fonte: Autoria própria.
Figura 27 - Tabela Comparativa
São Bernardo do Campo necessita desenvolver sua infraestrutura de forma que englobe todo o município. A cidade de Chicago enfrente diversos desafios relacionados à habitação, os principais deles dados pela densidade populacional e pela precariedade da habitação para a população mais pobre. Já Vancouver e Medellín, entre outras questões, precisam enfrentar a barreira das conexões. A cidade canadense, é relacionada as conexões das pessoas, dado o número de imigrantes, já a cidade colombiana enfrenta o desafio de conectar espaços de forma ampla. Mesmo com a espacialidade, economia e desafios diferentes, todos os municípios em questão buscam soluções por meio do envolvimento da população na gestão urbana.
Por fim, fica claro que o conhecimento da história da cidade combinado com o envolvimento da memória social permite uma visão mais ampla e contextualizada do presente. Compreender as transformações ocorridas ao longo do tempo e as necessidades atuais auxilia na identificação de tendências e na projeção de cenários futuros. A análise dos problemas atuais em relação às estratégias e políticas adotadas no passado possibilita uma visão crítica e embasada para a elaboração de novas diretrizes que sejam mais adequadas às necessidades e aspirações da cidade e de sua população.
6.1 memória social como instrumento: possíveis caminhos
Ao longo dos capítulos, vimos como a memória social se faz presente quando relacionamos o indivíduo com o espaço urbano. Referenciando as abordagens dos autores Kevin Lynch (1997) e Gordon Cullen (1996), ambos destacam a importância da experiência subjetiva do indivíduo no espaço urbano. E essa experiência, como resultado, é transformada em memória. Assim, entendemos que o espaço urbano é muito mais do que meramente um ambiente físico, é também um lugar de vivências, encontros, histórias e memórias que moldam a forma como nos relacionamos com ele. As memórias geradas a partir das interações do indivíduo com o espaço urbano desempenham um papel fundamental na maneira como percebemos, interpretamos e nos apropriamos desse ambiente. Essas memórias são construídas a partir de experiências sensoriais, emocionais e sociais que ocorrem nos diversos locais da cidade. Cullen (1996) ressalta a importância de uma paisagem urbana esteticamente atraente, que estimule as emoções positivas e a identificação afetiva dos indivíduos com o ambiente urbano, sendo possível de se concretizar apenas com experiências ativas.
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Assim, as memórias geradas a partir das interações do indivíduo com o espaço urbano podem afetar diretamente a forma como o espaço é percebido, utilizado e cuidado. Se as memórias forem positivas, os indivíduos tendem a sentir-se mais conectados e comprometidos com a cidade, buscando preservar e melhorar o ambiente em que vivem. Por outro lado, se as memórias forem negativas, isso pode levar ao distanciamento e à desvalorização do espaço urbano, resultando em falta de cuidado, deterioração e exclusão social, com o abandono de áreas urbanas, ao enfraquecimento da coesão social e à perda de identidade local.
Considerar as memórias sociais como parte integrante do planejamento urbano é fundamental para criar espaços que promovam memórias positivas e fortaleçam a identidade e a coesão social. Ao valorizar a história, a cultura e as vivências dos habitantes locais, é possível criar ambientes que sejam significativos e acolhedores, gerando memórias positivas e estimulando uma maior interação e apropriação do espaço urbano pela população. Por isso é necessário considera-las, uma vez que estas desempenham um papel fundamental na criação de novas diretrizes dentro do planejamento urbano, especialmente em São Bernardo do Campo. Percebemos, com as entrevistas realizadas, que muitos depoimentos continham afeto e saudosismo, evidenciando que as memórias sociais positivas abrem margem para ações de valorização e de resgate de histórias e experiências coletivas. Sendo possível, assim, estabelecer uma conexão profunda com a população, promovendo a participação ativa e efetiva dos cidadãos na gestão urbana. Essa participação social é essencial para a construção de uma cidade mais inclusiva, onde as necessidades e desejos da população são levados em consideração, garantindo que todos os grupos sociais sejam representados e beneficiados pelas políticas urbanas. Assim, a partir dos conceitos teorizados por Jaime Lerner (2003) de acupuntura urbana, iremos incorporar caminhos para os incômodos relatados nas memórias sociais dos participantes da pesquisa nos tópicos de mobilidade urbana, segurança pública, infraestrutura/zeladoria dentro da região central de São Bernardo do Campo. No que se refere à mobilidade urbana, a acupuntura urbana poderia ser aplicada por meio da criação de corredores de transporte sustentável, como ciclovias e faixas exclusivas para ônibus, conectando pontos-chaves do centro da cidade e concentrando as mudanças ao longo da Rua Marechal Deodoro e Rua Jurubatuba. Essas intervenções melhorariam a fluidez do trânsito, incentivariam o uso de meios de transporte alternativos e contribuiriam para reduzir os conges-
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tionamentos. Além disso, a criação de áreas de convivência e pedestres, com calçadas largas e arborizadas, promoveria a circulação a pé, tornando o centro mais acessível e agradável para os cidadãos. No âmbito da segurança pública, aliado aos conceitos de Lerner, é possível incorporar o conceito de “olhos da rua”, de Jane Jacobs (2000), incentivando ao uso e ocupação mista dos espaços do centro. Ao promover a diversidade de usos, e não apenas o uso comercial e de serviços que há hoje, é possível criar um fluxo contínuo de pessoas ao longo do dia, tornando as ruas mais movimentadas e contribuindo para a sensação de segurança. Associada as ações de infraestrutura e zeladora, a requalificação dos espaços públicos degradados, como a Praça da Matriz, estimularia a presença de pessoas. Novas áreas de convivência poderiam ser implantadas ao longo do centro, com a instalação de mobiliário urbano, iluminação adequada, paisagismo e serviços de limpeza e manutenção regular. Essas intervenções promoveriam o uso e apropriação dos espaços públicos pela comunidade, incentivando atividades sociais, culturais e de lazer. Muito além dos tópicos tratados, a memória social coletada também poderia desempenhar um papel significativo na construção de uma cidade mais sustentável em São Bernardo do Campo, resgatando e valorizando práticas sustentáveis tradicionais, incorporar esse conhecimento ancestral no planejamento urbano e promovendo a preservação ambiental e o uso consciente dos recursos naturais. Além disso, utilizar a memória social para aumentar a preservação do patrimônio histórico e cultural da cidade, estimulando a caracterização dos espaços urbanos relevantes, promovendo a requalificação e a revitalização de áreas de valor histórico e arquitetônico e estimulando a identidade cultural da região. Dessa forma, vimos como o uso da memória social desempenha um papel crucial na construção de uma cidade mais humana, onde a qualidade de vida e o bem-estar dos cidadãos são priorizados. Ao envolver a população no processo decisório do planejamento urbano, por meio da participação social, é possível identificar as demandas e necessidades locais, garantindo que as políticas urbanas atendam às aspirações e desejos da população. Além disso, a valorização da memória social contribui para a formação de uma identidade local forte, promovendo o senso de pertencimento e fortalecendo os laços comunitários. Ao vincular a participação social na gestão urbana por meio da memória social, São Bernardo do Campo tem a oportunidade de se tornar uma cidade mais inclusiva, sustentável e humana. A participação ativa da população no planejamento urbano garante que todas as vozes sejam ou-
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vidas e consideradas, promovendo a equidade e a justiça social. Dessa forma, a memória social se torna um caminho valioso para criar diretrizes que atendam às necessidades e desejos da população local, promovendo uma cidade que preza pela qualidade de vida dos moradores.
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considerações finais
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Ao tratarmos de memória social, passamos a compreende-la como um processo coletivo. Do ponto de vista de Maurice Halbwachs (1990), a memória coletiva é um processo vivo e em constantes transformações. Ela é construída e compartilhada por meio da interação entre as pessoas e o ambiente físico em que vivem. Assim com o autor Milton Santos (1991) descreve, o espaço não é simplesmente um recipiente passivo onde os eventos ocorrem, mas sim um produto da ação humana, que é moldado por fatores sociais, culturais, políticos e econômicos. Assim, ao entendermos como se desenvolve a memória social, é fundamental entender o histórico da cidade de São Bernardo do Campo. Dessa forma, é possível compreender as raízes e os valores que moldaram a identidade da cidade, suas transformações ao longo do tempo e os desafios enfrentados pela comunidade. Para atingir nossos objetivos quanto ao uso da memória, coletamos entrevistas de pessoas que possuíam envolvimento com a cidade de São Bernardo do Campo para entendermos como é o imaginário que está vinculado à essa região. Essa abordagem possibilita uma compreensão mais ampla das necessidades e desejos da comunidade local, permitindo que a gestão urbana seja direcionada de forma mais efetiva e inclusiva. Além desse entendimento proporcionado, as entrevistas e depoimentos coletados junto à população permitem a participação ativa dos cidadãos no processo de gestão urbana. Ao ouvir suas histórias, experiências e perspectivas, foi possível identificar as principais necessidades e aspirações da população local. Essa abordagem participativa promove um sentimento de pertencimento e empoderamento dos cidadãos, uma vez que suas vozes são ouvidas e consideradas na tomada de decisões.
A inclusão da população na gestão urbana é uma prática adotada por cidades como Chicago, Vancouver e Medellín. Essas cidades têm se destacado ao envolver os cidadãos em processos participativos que valorizam a memória coletiva e promovem uma gestão urbana mais eficiente e inclusiva. Chicago, nos Estados Unidos, tem investido em programas de participação cidadã, como consultas públicas e reuniões comunitárias, para envolver os moradores na tomada de decisões sobre políticas e projetos urbanos. A cidade também utiliza tecnologias digitais para facilitar o acesso às informações e promover a transparência na gestão. Vancouver, no Canadá, é conhecida por sua abordagem inclusiva e sustentável na gestão urbana. A cidade valoriza a participação da população por meio de comitês consultivos, pesquisas e workshops comunitários. Além disso, Vancouver tem se esforçado para preservar e
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valorizar a história e cultura local, por exemplo, por meio da revitalização de bairros históricos e da preservação de edifícios emblemáticos.
Medellín, na Colômbia, passou por uma transformação significativa nos últimos anos, utilizando a memória social como um guia para a reconstrução social e urbana. A cidade adotou uma abordagem inclusiva e participativa, envolvendo os cidadãos em processos de planejamento e tomada de decisões. Essa abordagem resultou em projetos inovadores, como a construção de bibliotecas em áreas vulneráveis e o desenvolvimento de sistemas de transporte público eficientes e acessíveis.
Em comparação com essas cidades, a inclusão da população na gestão urbana em São Bernardo do Campo pode seguir um caminho semelhante. Ao entender o histórico da cidade e analisar os depoimentos da população, é possível envolver os cidadãos em processos participativos, por meio de consultas públicas, audiências, grupos de trabalho e espaços de diálogo. Essa abordagem permite que os moradores se sintam parte ativa da construção e transformação da cidade, garantindo que as necessidades e aspirações da comunidade sejam atendidas, valorizando a identidade histórica e cultural do município. Por fim, vemos que as vivências e experiências estão relacionadas aos espaços urbanos e às edificações presentes no cotidiano, que interferem diretamente na memória, modelam as identidades dos indivíduos e grupos sociais, de modo que o ato de narrar tais memórias possibilita reinterpretar os espaços urbanos e a arquitetura das cidades. Portanto, ao considerar a memória social na gestão urbana de São Bernardo do Campo, temos a oportunidade de compreender profundamente as necessidades, desejos e expectativas da população local. Através do resgate da identidade histórica, da participação ativa dos cidadãos e do combate às desigualdades, é possível promover uma gestão urbana mais inclusiva, responsiva e voltada para o bem-estar da comunidade. Ao valorizar a memória social, a cidade de São Bernardo do Campo poderá se desenvolver de forma mais sustentável, atendendo às demandas da população e construindo um futuro que respeite e preserve sua rica história.
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