O SÃO PAULO - 3113

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12 | JMJ - Reportagem |

3 a 9 de agosto de 2016 | www.arquisp.org.br

Unidade, gratidão e misericórdia JOVENS DE VÁRIOS PAÍSES COMPARTILHARAM COM O SÃO PAULO O QUE LEVAM DA JMJ DE CRACÓVIA ALEXANDRE GONÇALVES ESPECIAL PARA O SÃO PAULO, EM CRACÓVIA (POLÔNIA)

“Diversidade de culturas, unidade de fé.” É assim que o brasileiro Josenilson Araujo, 25, define a Jornada Mundial da Juventude (JMJ). Em 2013, ele participou do evento no Rio de Janeiro como voluntário. A experiência foi tão transformadora que os discursos do Papa na ocasião tornaram-se seu livro de cabeceira. Já na época, formulou o propósito de vir a Cracóvia para estar de novo com o Papa e com 2 milhões de jovens de todo o mundo. As inúmeras bandeiras que cobriam o Campus Misericordiae, em Błonia, eram uma prova palpável das palavras de Araujo: um testemunho vivo da universalidade e da unidade da Igreja. A freira ganesa Dorothy Kporyi, 33, não esconde o assombro ao ver tanta harmonia entre pessoas tão diversas. Ela recorda que em seu País há 37 línguas e a unidade é sempre um desafio. “Na JMJ, os jovens falam diferentes idiomas, mas não têm qualquer dificuldade para se comunicar”, afirma Irmã Dorothy. “Às vezes, basta um sorriso para que o outro entenda você perfeitamente.” De certa forma, é uma repetição do milagre de Pentecostes, quando a confusão de Babel foi superada pela comunhão no Espírito Santo. Para muitas pessoas, o encontro revela a vitalidade, às vezes oculta, da Igreja. Mary-Pauline Tamakbe, 40, também de Gana, estava acostumada a ouvir que a fé na Europa estava morta. Ela sentiu uma

enorme alegria ao ver multidões de italianos, franceses, espanhóis, portugueses e alemães que cantavam, rezavam e se divertiam nas ruas de Cracóvia: “Quando voltar para a África, preciso contar a todos: ‘A fé na Europa está viva… ela está renascendo!’” O jovem francês Louis-Marie Le Roux, 19, concorda. Para ele, tem havido uma reação ao processo de secularização que varreu o Velho Continente no século XX. “Os jovens percebem que foi um erro deixar Deus de lado e que a religião traz respostas essenciais para a existência humana.” Os filhos da “geração de 1968” redescobrem a contribuição singular da fé cristã na construção de um mundo menos cruel. “Após os trágicos eventos dos últimos meses [os três atentados terroristas que chocaram a França], muitas pessoas tornaram-se mais abertas à mensagem do Evangelho”, pondera Gauthier Le Jemtel, outro jovem francês de 19 anos. “É uma fonte de esperança e um norte para o futuro que não podemos deixar de lado.”

SEGURANÇA E GRATIDÃO

Ao caminhar pelas ruas de Cracóvia, era comum ver moradores da cidade agitarem as bandeiras da Polônia e do Vaticano nas sacadas dos prédios para homenagear os peregrinos, que respondiam com gritos de “Polska!” (Polônia, em polonês). Marcin Glab, um polonês de 28 anos, conversou com policiais encarregados da segurança da JMJ. Ele conta que duas coisas impressionaram os oficiais. Em primeiro lugar, a ausência de incidentes graves, algo incomum em uma aglomeração tão grande. Em segundo lugar, a gratidão que os peregrinos manifestavam pelo trabalho das pessoas que cuidavam da segurança do evento.

“Muita gente fazia questão de agradecer os policiais pelos serviços prestados”, recorda Glab. Já a polonesa Andjelika Leja, 35, recorda que seus conterrâneos estavam com medo. “Medo de um atentado terrorista, de que o sistema de transporte ficaria um caos, de acolher peregrinos nas suas casas… Mas foi um evento único, maravilhoso”, afirma Andjelika. “O Papa disse na noite da vigília que precisamos ser corajosos. De algum modo, a própria Jornada mostra que vale a pena vencer o medo.”

A JORNADA DA MISERICÓRDIA

Essa JMJ certamente entrará para a história como a Jornada da Misericórdia. A brasiliense Luísa Carvalho, 21, entendeu o recado: “Deus quer os meus pecados para me libertar deles, mas Ele não exige perfeição. Ele me abraça como eu sou.” Cada um a seu modo descobriu a libertadora realidade da misericórdia divina. O liberiano Jones Flomo, 24, conheceu um norte-americano durante a ViaSacra, na sexta-feira, 29, que lhe presenteou com um Terço e um pedido: “Reza por mim, para que meu coração seja puro, porque ele ainda não é.” Flomo ficou comovido com a humildade e a simplicidade do norte-americano. “Essa é a principal mensagem da Jornada: graças à misericórdia de Deus, não precisamos fingir. Deus não quer isso de nós. Podemos ser sinceros e contar com a ajuda dos demais”, reflete Flomo. Católicos de regiões devastadas pela violência também recebiam manifestações de apoio e de afeto. Nawar Waheeda, 27, caminhava entre os demais peregrinos com uma bandeira iraquiana. “Muitas pessoas vêm conversar comigo e dizem que estão rezando pelo Iraque”, afirma Waheeda, com um sorriso. Origi-

nalmente de Bagdá, ele vive hoje na cidade de Erbil. Ao contrário de muitos cristãos caldeus, decidiu permanecer no País e talvez colaborar para sua reconstrução caso o grupo terrorista Estado Islâmico seja derrotado. Os jovens palestinos Christine Mansour e Tamer Dabit, de 21 e 18 anos, também caminhavam com uma enorme bandeira e atraíam peregrinos que queriam conhecer os desafios que eles enfrentam todos os dias. Christine estava especialmente feliz, pois esteve perto do Papa Francisco durante a vigília. Para Tamer, a mensagem do Papa possui um grande poder de transformação. “O mundo precisa ouvir o que ele diz e aprender a compartilhar”, pondera Tamer. “Boa parte do conflito na Palestina e em outros lugares nasce de uma grande dificuldade em compartilhar.” A mensagem da misericórdia é especialmente importante em nações que ainda carregam cicatrizes de um passado relativamente recente. Zef Marku, um albanês de 21 anos, afirma que a Igreja no seu País ainda está tentando se levantar do seu recente calvário. Durante o regime do ditador comunista Enver Hoxha, todas as religiões foram banidas oficialmente pelo Estado albanês. Padres e outros líderes religiosos foram assassinados aos milhares. Porém, a luz brilha com mais força na escuridão. Jona Dracini, uma estudante albanesa de 24 anos que recebeu o Batismo na Vigília Pascal este ano, sublinha a misteriosa relação entre misericórdia e esperança: “É impossível negar tanta dor e injustiça…, mas a mensagem da Jornada é que a batalha já foi vencida. Só precisamos ser fiéis à missão que Deus nos confia por meio do Papa Francisco. A Misericórdia de Deus penetra todas as realidades humanas”.


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