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CAPA | BOB WOLFENSON
from Cultcom #5
O FANTÁSTICO MUNDO DE BOB WOLFENSON
O fotógrafo compartilha os momentos mais marcantes da carreira, dá dicas para os iniciantes e diz que a boa fotografia é aquela que toca as pessoas
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_ POR JOYCE MOTA E MARIANA LIRA
Foto Divulgação
COM MAIS DE 50 anos de carreira, o fotógrafo paulistano Bob Wolfenson sempre teve habilidade para transitar entre a arte e a publicidade, e tornouse referência na fotografia de nu, moda e retrato. É dele trabalhos que eternizaram revistas, jornais, capas de discos e livros, que hoje compõem um material iconográfico singular, um mundo fantástico a partir de seu olhar.
Tal sensibilidade para retratar personalidades das mais diversas áreas, como política, esporte e cultura, vem sendo desenvolvida desde os 16 anos, quando Wolfenson iniciou a carreira como assistente de fotografia no estúdio da Editora Abril. Foi no final da década de 1970 que montou seu primeiro estúdio. “Na época, eu cursava Ciências Sociais na USP [Universidade de São Paulo], mas não cheguei a concluir, pois percebi que a fotografia era minha verdadeira vocação”, lembra.
Após quatro anos na Abril, Wolfenson mudou-se para os Estados Unidos para trabalhar como assistente do fotógrafo Bill King (1927-2005), contrariando aqueles que disseram que ele deu um passo para trás. “Esse foi um movimento fundamental na minha carreria. Entrou no repertório e ficou alojado em algum lugar da minha experiência, da emoção e do conhecimento, e é acionado quando estou fotografando”, conta. De volta ao Brasil, com uma nova bagagem cultural e status, ele começa a fazer editoriais para diversas revistas e ganhar espaço no mercado da moda.
Wolfenson assinou editoriais de revistas como Elle, Vogue e Maria Claire, além de publicações como Rolling Stone e Playboy, este último sendo o grande destaque em sua trajetória na fotografia de nu. “Teve um momento no qual os anseios da revista se confundiam com os meus, queríamos as mesmas coisas, ou seja, não há lugar melhor para se trabalhar onde você pode exercer seu ofício em sua plenitude”, comenta.
O fotógrafo conta que para cada sessão de fotos da Playboy criava uma
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história, a realizava e paginava, e a revista fornecia os meio para publicar. “Alguns dos meus melhores trabalhos foram com as atrizes Maitê Proença, na Sicília, Vera Fischer, em Paris, Alessandra Negrini, no Rio de Janeiro, e Nanda Costa, em Cuba”, lembra.
O fotógarfo tem em seu currículo imagens ícônicas de personalidades como Fernanda Montenegro, Caetano Veloso, Marília Gabriel, Lázaro Ramos, Anitta, Laerte, João Cabral de Melo Neto (1920-1999) e Pelé, entre outros. No minidoc “Bob Wolfenson: Retratos” (2018), o fotógrafo fala de seu processo de criação para a fotografia de retrato. “Tem retratos muito silenciosos, que são muito de observação, muito desenhados, detalhados e que você está lá quase que contemplando a pessoa num processo de captação puro e simples”, diz. “Tem outros em que sou muito interferente, que promovo um certo gestual, uma coreografia minha ou do retratado. Há uma movimentação no estúdio”.
Em 2018, quatro décadas do trabalho do fotógrafo pôde ser contemplado na mostra “Bob Wolfenson: Retratos”, com curadoria de Rodrigo Villela, no Espaço Cultural Porto Seguro, em São Paulo. “Com sua empatia e disponibilidade para o outro, Bob sabe transformar os encontros em momentos únicos”, diz Villela. “Ele é um dos fotógrafos mais representativos do Brasil e um dos mais profícuos – da moda e da publicidade à paisagem e aos nus”, finaliza.
Na exposição, em meio a diversos retratos em preto e branco, o de Rita Lee é um dos que chamam a atenção por ser colorido. “Fotografar em cores é mais complicado e desafiador. A fotografia em preto e branco, além de carregar a ideia do clássico, fascina ainda mais por não ser real, já que algo muito realista nos afasta de uma fruição mais sonhante”, comenta Wolfenson.
Mesmo se tornando uma referência como retratista, fotógrafo de moda e de nu, ele revela que tem facilidade na transição dos diferentes seguimentos, tanto comercial como artístico. “É tranquilo, passo de um pro outro com desenvoltura, embora haja certa torção de nariz de algumas partes por esse trânsito”, comenta. “A fotografia não tem essa capacidade de captação de uma verdade, de uma essência profunda de alguém. Ela é só um momento, retrato daquele momento e das intenções de todos os lados, de um campo de força que paira sobre o set fotográfico com vários desejos ali”, disse ao minidoc.
Wolfenson tem refletido sobre o mundo saturado, com uma abundância de fotógrafos e de imagens que se espalham nas redes sociais. “Hoje fica difícil discriminar o quê e quem é bom”, mas aos jovens fotógrafos que querem se destacadar digo para que exercitem o cérebro e o olho, que eles lhe retribuirão com o encontro de um estilo e com desenvolvimento pessoal e técnico”, diz. “A boa fotografia é aquela que toca as pessoas de alguma forma e que tenha todos os elementos que a expliquem dentro dela mesmo, sem precisar de muita legenda”, finaliza. c
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Diálogo entre a vida e a morte
Exposição “Limbus”, do MIS, retratra a realidade de milhares de pessoas nos cemitérios da capital filipina
_ POR DAIANE CREMA _ FOTOS GUSTAVO GUSMÃO

NOS ÚLTIMOS MESES, o Museu da Imagem e do Som (MIS), em São Paulo, recebeu a exposição “Limbus”, do fotógrafo Gustavo Gusmão. Composta por 19 fotografias, a mostra é um projeto realizado nas Filipinas sobre pessoas que moram nos cemitérios de Manila.
Curiosos e tristes ao mesmo tempo, os cemitérios são grandes comunidades à margem da sociedade. Com sua própria estrutura e funcionamento, esses lugares comportam pequenas moradias, escolinhas, mercadinhos, botecos e muitos barracos, em situação de extrema pobreza. “São várias faces do mesmo lugar. Na mostra, trouxe de tudo um pouco, desde as coisas mais difíceis até o que tem vida. O cemitério não é só tragédia e pobreza, também tem vida. Não quis focar apenas a tristeza, mas os dois lados da história”, reflete Gusmão. “Limbus é muito mais que a margem da sociedade, o descaso, o abandono sobre uma certa parcela da população, é a destruição dos valores morais de um país, uma luta diária de uma superpopulação sobre o espaço físico dividido entre vivos e mortos”.
Apelidados de skeletons, zombies ou cemitery people, acredita-se que no maior deles, o North Manila Cemitery, moram aproximadamente duas mil pessoas. “O lugar é de extrema pobreza. Tem enterro de pessoas, tem ossos humanos, mas também tem gente vivendo ali. A mensagem de tentar mostrar o que acontece nesse lugar e denunciar de alguma forma é o mais importante”, diz Gusmão.
Para a sócia-diretora da DOC Galeria Monica Maia, que foi convidada pelo MIS para a curadoria da exposição, “Limbus” torna visível uma realidade. “As fotografias refletem o estranhamento da convivência harmônica entre vida e morte. Assim, as pessoas que se tornaram invisíveis para a população e governos se transformam em comunidades que sobrevivem em um mundo à parte”, diz. “Era um ambiente muito pesado, onde tinha vida também tinha morte, mas foi possível passar a mensagem, que de certa forma, é uma denúncia”, complementa Gusmão. c