O Berro Edição 2021.2

PUBLICAÇÃO DO CURSO DE JORNALISMO DA UNICAP • EDIÇÃO 2021.2

Tecnologia uso das redes sociais impacta mercado de trabalho e chama atenção para o racismo .

Saúde Saúde mental dos jovens foi impctada com a pandemia de Covid-19

Sexo Educação sexual e a importância de falar sobre sexo dentro de casa

Booktok

Memes

Beleza

Tend ência das redes sociais viraliza entre os jovens e incentiva a leitura

Os memes se tornaram uma forma de se comunicar através da ironia

A influência da mídia e os impactos na autoestima dos jovens

EDITORIAL

Prazer, geração Z. O material que segue foi feito com carinho para que todas as outras gerações entendam quem nós somos. Nesta edição, temos um conteúdo que é a nossa cara. Se somos a geração que nasceu no Orkut e hoje faz dancinhas e trends no tiktok, não poderia faltar temáticas que nos interessa.

De conteúdos leves a conversas um pouco mais serias, abordamos temas como sexo, racismo algoritmo, memes e muito mais. Nesta versão da O Berro, resolvermos destacar as características, pensamentos, sentimentos e desafios dessa nossa geração. Sendo assim, se sinta livre para ler o que produzimos nas páginas a seguir. Lembrando que os conteúdos também estão presentes no nosso site e nas nossas redes sociais.

Com carinho, Ana Carolina, Lara Félix e Ricardo Bezerra

Página 0 4

É hora de falar sobre sexo, bb

Página 06

Booktok: a tendência das redes

Página 08

Meme como forma de linguagem

Página 10

Profissões do futuro

Página 12

Racismo algorítmico: redes sociais e representatividade

Página 14

Fora das redes não estamos bem

Página 16

Descortinando a beleza

6 10 12 16 20 24 26

É hora de falar sobre sexo, bb Por Caroline Cardilane e Mariana Mota Ahhh o sexo… às vezes tratado como “conversa de gente

A série é um ótimo exemplo de como falar sobre sexo com jo-

grande”, às vezes relacionado a algo malicioso. Porém (pasme!)

vens, trazendo temas que parecem batidos ou irrelevantes, até

educação sexual não se trata de falar pornografia, mas de es-

os mais “pesados” e polêmicos. Sex Education também provoca

clarecer questões sobre o corpo, comportamento e até mesmo

debates que vão além do sexo em si, abordando o conhecimen-

sentimentos. sentimentos. Apesar de ser um tema polemizado

to do próprio corpo e como essas descobertas podem afetar a

pelos conservadores, o assunto desperta interesse em grande

autoestima e, consequentemente, a saúde mental do jovem.

parte da população. Tanto é que a série ‘Sex Education’ (Educação Sexual, no bom português) foi, durante um bom tempo, a

A sexóloga Thaisa Alice explica a importância de conversar so-

mais assistida da Netflix.

bre os temas que envolvem a sexualidade desde a infância. “O papel da escola é importante na colocação de como cada gênero se identifica, sua anatomia, a função do seu corpo, sua transformação e cada fase que o menino ou a menina vai vivenciar ao longo da vida com essas mudanças”, afirma. A estudante de psicologia Maria Cecília Lyra, de 21 anos, não teve acesso à educação sexual e, como o tema nunca foi abordado pela família, ela precisou recorrer à internet e às aulas de biologia como fontes de informação. “Acredito que, com educação sexual, muitas coisas poderiam ter sido mais fáceis de aprender logo cedo, eu poderia ter tido acesso a informações de uma forma mais segura e confiável”, conta.

Tentando educar e orientar os filhos sobre o assunto, a professora Mieja Chang conta que sempre se sentiu confortável ao falar de sexo com os três filhos, e que tenta abordar o tópico

pag. 4

“O que eu mais me preocupo é em falar sobre os métodos contraceptivos, e não por medo que meus filhos engravidem alguém, mas para protegê-los das doenças sexualmente transmissíveis” - Mieja Chang

Com a falta de debate e políticas públi-

estupro. De acordo com a UNICEF, de

Falar sobre educação parece não ter

cas de saúde sexual, muitos jovens

2017 a 2020, 180 mil crianças e adoles-

fim! São diversos aspectos e diretrizes

recorrem às produções midiáticas como

centes sofreram violência sexual, uma

que fazem parte do dia a dia de todos,

fonte de informação, o que pode gerar o

média de 45 mil casos por ano. Essa

mesmo que algumas pessoas ainda

processo inverso, já que esses produtos

é mais uma estatística assustadora e

considerem tabu. Hoje, com a facilidade

não têm a obrigação de educar e podem

preocupante. Quando falamos sobre

de acesso às mídias, a exposição pode

difundir ideias distorcidas sobre a sexu-

educação sexual, orientamos os jovens

ser muito precoce. Existem vários pon-

alidade. “O grande problema, além da

a entender sobre seu próprio corpo, e

tos que precisamos concordar. Um deles

exposição sexual gratuita, é a maneira

saber em que momento eles podem es-

é que, partir do momento que o jovem

que isso é explorado sem pudor e, na

tar sendo assediados ou violetados.

‘descobre’ o sexo, dúvidas surgem e os

maioria das vezes, nunca abordam o

familiares e escolas devem estar alinha-

lado ruim, as consequências que po-

Thaisa Alice explica a necessidade da

dos para responder aos questionamen-

dem levar certas relações sexuais. Isso

educação sexual voltada para crianças.

tos de forma adequada para cada idade.

faz com que as pessoas não tenham

Tanto a família quanto a escola possuem

um senso de responsabilidade sobre o

um papel fundamental em abordar

A educação sexual deve ser apresentada

sexo, elas acham que podem fazer tudo

assuntos dentro da sexualidade, falan-

como um assunto natural que faz parte

e nada acontece” declara Thaisa Alice.

do sobre cuidados com sinais de abuso

da formação do indivíduo. Até porque,

infantil, ensinando a criança a perceber

como já dito, sexo todo mundo já fez,

Há um ponto extremamente importante

quando isso ocorre, sobre entender o

faz, ou vai fazer! Se quiser, claro.

que também precisa ser mencionado

desenho de seu corpo o que é de meni-

neste debate: a importância de identifi-

no e de menina anatomicamente e sa-

car se um ato sexual foi consentido ou

ber que não se pode qualquer pessoa

não. Ou seja, saber diferenciar relação

tocá-la”, relembra Alice.

sexual de estupro. pag. 5

Booktok: a tendência das redes Por Lara Félix Se você gosta de ler deve conhecer

Certo, mas e o booktok? Você deve bem

história da pessoa que conta (o que é

blogs, canais literários no youtube ou

saber que vídeos na plataforma variam

isso? uma fanfic?) mas ela apenas está

influencers no instagram com conteú-

de 15 a 60 segundos, que consumi-

resumindo o livro. São essas e várias

dos voltados para o hábito de leitura.

mos sem precisar de muito, mas o que

outras maneiras de influenciar o outro

Mas hoje viemos falar do Tiktok, aplicati-

realmente se destaca é a forma como

usuário a começar ou continuar com o

vo que bombou na pandemia, com mais

são feitos. Pesquisando nas hashtags

hábito de leitura, basta apenas usar a

de 2 bilhões de downloads em todo

#booktok ou #booktokbrasil é possível

criatividade, que convenhamos, a ger-

mundo, segundo a pesquisa do Kantar

encontrar uma infinidade de vídeos em

ação Z tem de sobra.

Ibope. Ok, não é necessariamente sobre

vários formatos.

ele que vamos falar mas sobre uma tag dentro dele: o booktok.

O booktok tem grande influência quanTem maratonas literárias (aquelas em

do o assunto é iniciar o hábito de leitura

que o pessoal grava lendo um livro in-

mas, para quem já é apaixonado por liv-

Assim que entramos no tiktok, ao rolar

teiro em 24 horas ou até mesmo quan-

ros e relaxou um um pouco, também é

a for you page começamos a definir os

tos livros conseguir nesse tempo, tem

um meio de apresentar outros autores,

conteúdos que gostaríamos de ver mais

os vídeos que te convencem a ler um

novos títulos e estilos literários. Eman-

vezes e os que não queremos ver nova-

livro através do aesthetic (esse eu acho

uella Amaral, de 22 anos, comenta que

mente. O algoritmo do aplicativo não

incrível, sou facilmente convencida). em

tinha deixado de ler , mas graças ao

falha, e é uma das maneiras que ele tem

também as fofocas literárias, que sem-

booktok voltou a se interessar. “Quando

de nos prender.

pre me fazem pensar que é alguma

criei uma conta em janeiro, começaram

pag. 6

Segundo a pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, divulgada em novembro do ano passado, o país perdeu nos últimos quatro anos mais de 4,6 milhões de leitores. O estudo ainda revelou que os brasileiros lêem em média cinco livros por ano, considerando que uma média de 2,4 desses livros são lidos apenas até a metade.

a aparecer muitos livros interessantes

cerca de 600% nas vendas da editora

e a maior parte dos que li até agora foi

Intrínseca. Aproveitando esse sucesso,

graças ao booktok.” Emanuella leu 34

várias livrarias do mundo todo, como a

livros só no ano de 2021 e, entre seus es-

famosinha Barnes & Nobles, nos Estados

tilos literários favoritos, estão romances

Unidos, já até adicionaram mais uma

LGBTQIA+, young adult e ficção.

seção entre as prateleiras e no site, a do Tik Tok. Se liga aqui.

O booktok tem seus livros “queridinhos”,

A pergunta que não quer calar: Quem

entre eles os que mais fazem sucesso

são esses influenciadores do booktok?

são: romance, fantasia, ficção e young

Eles são chamados de booktokers e

adult. . Graças a todo esse hype, vocês

nos deixam tão curiosos a ponto de ir

acreditam que títulos lançados há uns

atrás para querer descobrir mais sobre

anos voltaram a fazer sucesso? Pois é, o

a obra. Aliás, quem não gosta de uma

New York Times publicou uma matéria

boa história que nos tire dessa realidade

em que as editoras listam os livros que

tediosa que vem sendo a pandemia?

voltaram a ser os mais vendidos, entre

Conversei com duas booktokers: Gabri-

eles clássicos infanto-juvenis como Per-

ela Rainá (@gabrielaraina) e Beatriz Kall-

cy Jackson, por exemplo, cresceram

meyer (@booksbybea).

Ambas começaram falando sobre livros e nunca mais pararam. “Acho incrível poder levar livros que talvez as pessoas não conheçam e até conseguir ‘hypar’ um desses. Na minha opinião, o melhor é conseguir fazer um livro nacional ter reconhecimento no booktok”, destaca Gabriela. Já Beatriz, que lê desde criança, diz que ama a ideia de conhecer outros mundos por meio das palavras.

“Um dos meus objetivos era mostrar que a leitura pode ser muito legal. E, hoje, quando recebo mensagens das pessoas me contando que inspirei elas a criarem a própria conta de livros ou que começaram a ler depois de algum vídeo meu, sinto que consegui atingir essa meta”, comemora. pag. 7

Meme como forma de linguagem

Por Isabella Ferreira e Luiz Libonati

Ponto chave da cibercultura, a cultura

A palavra meme vem da abreviação do

“O meme é um dispositivo criativo que

da colaboração desde sempre marca

grego para “imitação” (mimeme) e soa

permite, dentro de uma dinâmica cria-

a presença das pessoas no mundo vir-

ligeiramente como “gene”, motivos pelo

tiva coletiva, porque ele é compartilha-

tual. Produtos autorais como as fanfics

qual foi batizado. Dando origem à sua

do, você ter uma troca, um jogo, uma

são impulsionadas a partir do feedback

definição inicial, o biólogo evolutivo e

formação de um determinado proces-

de leitores e publicações online, onde

etólogo Richard Dawkins aplicou o con-

so que se repete e, ao mesmo tempo,

são complementadas por debates nas

ceito da seleção natural de Darwin ao

se renova a cada versão que as pes-

seções de comentários -além da partic-

seu próprio entendimento de como, de

soas produzem”, comenta o professor e

ipação dos podcasts- que moldam par-

forma semelhante, aconteceria entre os

pesquisador em Comunicação Fernan-

cerias através de propostas emergentes

elementos da nossa cultura.

do Fontanella.

Mas, hoje, é o meme que ilustra o pro-

O meme ganha força a partir do seu com-

Um ponto importante para entender a

duto que melhor expõe o caráter coop-

partilhamento. É formado de uma ideia

grande particularidade do meme em

erativo inerente às relações sociais na

que se difunde e se replica através de

relação à antiga piada, além da forma

internet. Apareça como for -em imagem,

dois elementos essenciais: um de con-

de abordagem, são as possibilidades do

vídeo ou som- o meme se tornou pre-

stância e outro de variabilidade. Sendo

seu alcance, assim afirma a professora

sente nas conversas de qualquer pessoa

assim, resulta na criação de uma brinca-

e coordenadora do grupo de pesquisa

que esteja conectada com as redes so-

deira, piada -sempre se repetindo-, e um

Jornalismo e Humor, do Departamento

ciais. Em sua lógica comunicativa, uma

elemento qualquer disso, variável, que

de Comunicação Social da Universidade

ideia pode ser expressa com rapidez e

qualquer pessoa pode tomar, repensar

Federal de Pernambuco, Adriana Santa-

simplicidade.

e transformar.

na.

que vão de debates a narrativas de storytelling.

pag. 8

A ex-cantora Gretchen, famosa nos anos setenta e oitenta e que, sendo extremamente compartilhada por novas gerações, chegou a estrelar lyric video da cantora norte-americana Katy Perry em 2017 e, hoje, é quem provavelmente melhor exemplifica esse fenômeno.

A partir disso, os memes disparam pela internet em uma circun-

soldados passavam. O meme, para além do riso, expõe novas

stância que é própria da atualidade e suas tecnologias: a veloci-

práticas de consumo e participação popular. Desde os anos 40,

dade de compartilhamento. Ao mesmo tempo em que herdam

na criação do computador, até a reta final do século 20, com sua

as finalidades humorística e crítica da piada, a existência da

chegada aos lares, a tecnologia foi incentivada como extensão

conexão virtual entre as pessoas permite que eles se façam úni-

do trabalho e essa relação foi sofrendo mudanças com o passar

cos ao romper a barreira de tempo e espaço geográfico, fator

dos anos.

indispensável para sua capacidade transmissiva viral.

Entre os resultados mais notáveis disso, com a variedade mul-

“O meme é um dos principais fenômenos culturais que ajudam

timídia dessa linguagem, está o que podemos entender como

a gente a explicar como é que ferramentas tecnológicas, que

um intercâmbio cultural incessante de elementos diversos, em

foram criadas para a eficiência do trabalho, são desviadas e vi-

meio a trocas de traduções e explicações que contextualizam,

ram brinquedo. Isso é uma coisa que permeia toda a história

dentro e fora de grupos de nicho.

da tecnologia digital e da própria internet”, defende Fontanella.

“Digamos que o meme é uma atualização de algo que já é quase

Os elementos convidativos nos memes são muitos, como o hu-

inato ao ser humano, que é essa capacidade do do riso”, define

mor e a crítica, tão íntimos da clássica piada. Mas o fator-chave

a pesquisadora. Não foi apenas no mundo digital que o meme

para que eles engatem no riso e compartilhamento das pessoas

entrou no cotidiano do ser humano. Mensagens antigas, coloca-

é a relação com o cotidiano. Às vezes, essas são pessoas que

das muitas vezes como grafites de rua, por exemplo, á se faziam

já estão caídas no esquecimento e, também às vezes, algo que

presentes apenas em locais específicos. Forte ilustração é o Kil-

surge como brincadeira coletiva na internet termina por ofere-

roy was here (“Kilroy esteve aqui”), frase acompanhada de um

cer a elas um renascimento midiático e, ainda melhor, uma in-

boneco que soldados da 2ª Guerra Mundial desenhavam. Surgi-

trodução para novos públicos.

do nos Estados Unidos, era reproduzido em muros por onde os pag. 9

Profissões do futuro Por Hugo Galli Você já parou para pensar quais são as possíveis profissões

utilização da automação de processos e decisões tomadas

que existirão nos próximos 5 ou 10 anos? É comum imaginar al-

baseadas em dados. Sobre essas mudanças no mercado de

gum trabalho que esteja ligado à área tecnológica, certo? Não

trabalho, o design lead e futurista Dan Queirolo ressalta a im-

necessariamente! O mercado de trabalho é um espaço fluido e

portância da capacitação para exercer novas profissões. “O mer-

crescente, onde novos modelos de negócios surgem e outros se

cado de trabalho é um oceano enorme. Tudo muda o tempo

reinventam. Segundo Graeme Codrington, futurista e contribui-

todo, então é difícil dizer algo com precisão. O que posso dizer

dor da revista Tomorrow Today, as profissões do futuro terão

é que emprego não vai faltar, mas os brasileiros terão dificul-

sim uma influência tecnológica, mas também passarão a exigir

dade em conseguir estes trabalhos.”, afirma Queirolo. Além do

a presença de um profissional com habilidades interpessoais,

despreparo do sistema educacional, os brasileiros precisarão se

conhecidas como “soft skills”, que incluem a comunicação, per-

adaptar ao trabalho associado à tecnologia.

suasão e inteligência emocional, por exemplo.

Segundo uma pesquisa realizada no ano de 2019 pela TIC

Afinal, este é um recurso que está presente na nossa rotina e em

Domicílios, cerca de 70% da população brasileira tem acesso à

áreas como fisioterapia, educação, medicina e até na arte. A mu-

internet. Como consequência, há uma exploração do mercado

dança será tão profunda que já é possível considerar o desapa-

de trabalho por meios digitais. Essa mudança digital no merca-

recimento de profissões como contador e advogado -e estas são

do de trabalho gera insumos práticos e palpáveis no ecossiste-

apenas algumas que vão sumir nos próximos 10 anos. Apesar

ma de ofícios. Para entender o resultado na prática, basta olhar

de reportagens serem feitas sobre o tema, ainda é comum ver

em volta e notar que a maioria das empresas investe no meio

estudantes ingressando em cursos tradicionais, como Direito e

digital, seja utilizando estratégias de marketing, partindo para

Contabilidade. “O fato é que muitos perderão seus trabalhos

os canais de comunicação -como redes sociais-, ou até na

mas, a cada trabalho perdido, surgirão outros dois.

pag. 10

Esse será um esforço coletivo entre iniciativa privada, terceiro setor e governos.”- Dan Queirolo “

Falando em profissionais do futuro, Lorrane Oliveira, 23, tra-

Tendo isso em vista, é possível observar que já existem políticas

balha como cientista de dados na empresa EY, uma das maiores

públicas e projetos voltadas para a área, como o de Política de

instituições de contabilidade do mercado mundial. Lorrane ex-

Inovação Educacional Conectada (Piec), que tem por finalidade

plicou sobre a função de uma cientista de dados e comentou

garantir o acesso à internet de alta velocidade em instituições

sobre suas expectativas para o futuro do mercado de trabalho.

básicas de ensino, mas esses tipos de projetos não são tratados como prioridade no cenário político atual. O desafio será

“O papel prático de um ou uma cientista de dados é ter uma

capacitar grande parte da população nacional, já que a maioria

visão analítica sobre dados de uma respectiva área, pesquisa ou

ainda não consegue ter acesso à educação ou saúde básica de

projeto. A partir disso, podemos construir previsões para próx-

qualidade.

imos passos. É uma profissão que não existia há muito tempo e cada vez mais se torna um importante pilar, já que minimizar

Ao ser questionado sobre a profissão que pretende seguir ao

erros e custos sempre vai ser interessante. Sobre profissões que

completar o ensino médio, o estudante Diego Sousa, de 17

o futuro pode esperar, acredito que o mercado vai afunilar e só

anos, falou sobre a afinidade que encontrou na área de tecno-

os bem capacitados e versáteis se darão bem. O estudo e inter-

logia. “Queria trabalhar com robôs, drones ou algo relacionado

esse são energias que movem os profissionais. Sem isso, a mão

com tecnologia. Meus pais são donos de uma empresa que

de obra seguirá majoritariamente desqualificada.”

oferece cursos de computação e eu cresci aprendendo sobre tecnologia. Atualmente, penso em alguns cursos de graduação relacionados com a área, como engenharia mecatrônica ou en-

Entendendo o panorama digital, é importante destacar que a

genharia da computação.”

desigualdade social no Brasil é um fator preocupante para as instituições federais. Os planos e desafios incluem conseguir

Mas e você? já tinha pensado sobre como serão as profissões do

investimentos e ampliar a inserção dos jovens em situações de

futuro? No final, conseguimos entender que o futuro é misterio-

vulnerabilidade no mercado de trabalho futurístico.

so, mas minimamente previsível. pag. 11

Racismo algorítmico: redes sociais e representatividade Por Emerson Saboia

O racismo algorítmico é um dispositivo inserido nas redes sociais que prioriza o compartilhamento de imagens de pessoas brancas no lugar de pessoas negras. Os riscos são claros: redução da pluralidade de pessoas e ideias. Esse tipo de filtro que o algoritmo “introduz aos usuários carrega um prejuízo de ordem política e pode naturalizar a violência contra as pessoas negras, por exemplo”, afirma o professor doutor em Sociologia e pesquisador Luiz Carlos Pinto.

O que acontece nessas plataformas

para estampar a miniatura da postagem,

é que o algoritmo - responsável por

quando mais de uma foto era publica-

grande parte do funcionamento de uma

da. A descoberta revoltou os usuários

rede social - automatizou o ranço estru-

da plataforma dando origem a hashtag

tural do racismo nas sociedades moder-

#AlgoritmoRacista, usada pelos usuários

nas. Neste cenário, o Brasil não fica de

nas postagens que testavam o funciona-

fora. Entre os exemplos mais comuns

mento da plataforma. Um levantamento

estão o reconhecimento facial de negros

feito pela revista Exame com base em

em filtros do instagram para primatas,

dados divulgados pelas principais em-

a redução do engajamento de pessoas

presas de tecnologia do mundo -Face-

não-brancas nas redes sociais, e espe-

book (agora, Meta), Twitter, Google,

cificamente no caso do Twitter, a ocul-

Apple e Microsoft- mostrou que apenas

tação dos rostos negros nas miniaturas

23% dos funcionários são negros.

das imagens compartilhadas no feed.

O estudo foi feito em comparação ao

pag. 12

No ano passado, o tema do racismo

ano de 2020. Os números assustam mais

algorítmico ganhou os trending topics

ainda quando comparados às outras

mundiais do Twitter. Os usuários desco-

etnias. Apenas 1% dos funcionários são

briram um comportamento racista da

indígenas, juntando todas essas empre-

plataforma, quando a foto de uma pes-

sas. No caso do Facebook, o volume de

soa negra era postada no feed da rede.

colaboradores é tão grande que os indí-

O Twitter ocultava o rosto negro e dava

genas mostram menos de 1% na pesqui-

preferencia a pessoa branca na imagem

sa.

Outro dado que espanta é a presença e latinos. Por mais que essas big techs estejam baseadas em países com população hispânica/latina expressiva, a que possui a maior quantidade é a Apple, com 11%, seis pontos percentuais a mais que os segundos lugares, a Microsoft e o Google. “Assim como o mercado financeiro é regulado pelo poder público, os algoritmos também podem”, sugere o professor Luiz, como uma saída para o cenário. A palavra utilizada foi “regularizar”, mas o educador valoriza as pesquisas acadêmicas como uma alternativa “vigilante” ao processo de funcionamento das redes. A intenção, como ele descreve, é produzir conhecimento e cada vez mais elucidar o usuário da realidade por trás de onde navegamos.

No primeiro filme da trilogia Matrix (1999) o personagem principal, Neo, precisa escolher entre duas pílulas. A azul deixa ele no mundo dominado pela matrix, dentro da ilusão que ele sempre viveu. Já a vermelha mostra a verdade, o que está de fato situado no mundo real. O algoritmo pode funcionar com uma pílula azul. Coloca o usuário em uma bolha de interesses próprios de uma espécie de ecossistema alimentado pela ignorância materializada no feed das suas redes. Claro, os algoritmos não são só vilões. Eles personalizam a nossa experiência com as redes e afinam nossa passagem diária pela internet, tornando-a prática e inteligente.

A questão é o algoritmo com um segregador programado para ler a cor do usuário e ditar a forma que seu conteúdo atravessa a plataforma. Nesse caso, “uma pílula vermelha, por favor”.

pag. 13

Fora das redes... ...não estamos bem Por Ana Carolina e Ricardo Bezerra O isolamento social, como forma de conter a infecção pelo vírus da Covid-19, e a suspensão das atividades presenciais trouxe à tona fragilidades e receio pelo bem estar de amigos e familiares.

O estudante de jornalismo Gabriel Neukranz, de 20 anos, revelou os impactos

A estudante de comunicação Maria

Para a psicóloga Chay Camaroti, a

Luna, de 22 anos, contou que a ex-

mudança da rotina e a interrupção

periência de interação virtual foi difícil

das atividades, acadêmicas ou de

e solitária, mesmo que estivesse acom-

lazer, demandou um curto inter-

panhada pelos amigos ou colegas de

valo de adaptação para os

turma através das chamadas de vídeo e aulas online.

da pandemia na sua vida pessoal.

“Meu

entretenimento

pré-pandemia

era simples: eu saía com os amigos para conversar, assistir jogos, ver minha namorada, conhecer a cidade. A pandemia afetou a minha rotina com a faculdade porque eu fiquei meses sem ter aula. Eu vim de um ensino médio turbulento, repeti o primeiro ano, não gostava de estudar e me sentia desestimulado.

Eu tenho um medo abissal da morte.

Não da minha, mas das pessoas que eu gosto. Fiquei muito preocupado com os meus avós e com pessoas próximas a mim”. pag. 14

jovens.

“Foi uma situação que pediu alguns “Eu fiquei um bom tempo sem ver os

assentamentos, algumas estratégias de

meus amigos, só voltei a encontrar com

forma muito rápida. Quando se atraves-

eles no dia 2 de setembro de 2020 e foi

sa uma situação como a pandemia, há

de longe porque só fui entregar um bolo

uma interrupção significativa porque faz

para outro amigo que estava fazendo

com que o adolescente faça um camin-

aniversário Com a faculdade também

ho contrário ao fluxo natural do desen-

foi complicado porque eu sou uma pes-

volvimento”, pontua a especialista. De

soa que gosta de estar na sala de aula,

acordo com uma pesquisa divulgada em

então ficar em casa, no meu quarto,

outubro de 2021 pela UNICEF em parce-

sozinha, olhando para uma tela, foi uma

ria com a Gallup, 22% dos adolescentes

sensação agridoce. Só em pensar no

e jovens brasileiros, com idade entre 15

retorno da aula presencial, em contato

e 24 anos, informaram que -durante a

com os professores, amigos, para mim já

pandemia-, muitas vezes se sentem de-

é uma felicidade imensa”.

primidos ou têm pouco interesse

“A gente pode pontuar como principais dificuldades o rompimento abrupto do cotidiano, das atividades e sobretudo do convívio com as pessoas, da rotina de estudos, das festas, relações amorosas e tantas outras atividades comuns dessa fase. ” - Chay Camaroti

em fazer qualquer atividade. Em termos globais, um em cada cinco adolescentes e jovens (19%) se sentem da mesma forma.

Com a ausência da formação dos círculos sociais, uma nova dinâmica familiar foi instituída para os jovens. “A gente pode pontuar como principais dificuldades o rompimento abrupto do cotidiano, das atividades e sobretudo do convívio com as pessoas, da rotina de estudos, das festas, relações amorosas e tantas outras atividades comuns dessa fase. Todas as atividades do ambiente doméstico precisaram ser organizadas para que todo mundo contribuísse. É daí que começam os conflitos familiares, sem contar com aqueles que já poderiam estar existindo”, afirma Chay.

Para além da aproximação de idade e de curso, Maria Luna e Gabriel Neukranz também compartilham uma disfunção na saúde. Ambos sofrem com a ansiedade. Mas, com o acompanhamento terapêutico, os estudantes atravessam a pandemia um dia de cada vez.

“Eu era uma pessoa mais resguardada na escola. Desde de 2019 vinha evoluindo, conhecendo novas pessoas, novos círculos sociais. É difícil falar sobre futuro porque pelo fato de ter ansiedade, eu trabalho toda semana com a minha psicóloga para tentar focar no momento. O que dá para falar é: depois de viver isso, eu aproveito cada momento”, afirma Gabriel.

Malu, como costuma ser chamada, revelou como o impacto das notícias no início da pandemia e pressão da por produtividade interferiram na sua saúde mental. “A gente estava vivendo um ciclo em que só ouvíamos notícias ruins todos os dias e você tinha que continuar trabalhando, estudando, vendo se seus amigos e familiares estavam bem. Eram muitos problemas e eu não conseguia absorver. pag. 15

Descortinando a beleza Por Luma Lima Nasci em 2001, ano em que Anne Hatha-

Devido a uma busca incessante pela

Portanto, é uma etapa da vida na qual o

way fazia as sobrancelhas e alisava o ca-

beleza, eu vivia em guerra com o espe-

impacto da indústria midiática é muito

belo para se adequar à realeza no filme

lho, a balança, a comida, meu corpo e

forte. “É preciso se reconhecer no que se

O Diário da Princesa. Confesso que até

minha aparência. A tristeza e a angús-

vê. Tanto se reconhecer no outro quan-

meus 15 anos, genuinamente guardava

tia não tinham mais origem no fato de

to no produto midiático consumido

viva dentro de mim a utópica esperança

que não faria parte da realeza mas, sim,

porque é nesse consumo dos desenhos,

de que a minha avó, Rainha de Genóvia,

em passar horas encarando o espelho e

filmes e séries que passamos a entend-

iria aparecer e me transformar em uma

percebendo que não parecia com Anne

er o mundo e a nós mesmas. Por isso a

princesa.

Hathaway.

importância da mídia refletir a realidade

Porém, aos 15 anos, a realidade foi as-

Mais do que isso, apesar de ser uma

sustadoramente diferente. Além de

garota branca e magra (verdade que só

Apesar de nós, garotas da Geração Z,

ter perdido a minha avó naquele ano,

consigo ter consciência hoje), não pare-

sermos figuras de transição e da mu-

quando me olhava no espelho, meu

cia com as meninas que tanto admirei e

dança de século – sobretudo por termos

reflexo mostrava um cabelo cacheado

cresci me inspirando. Definitivamente,

herdado conquistas das gerações ante-

indomável, sobrancelhas marcadas e

não parecia com quem via nas telas. A

riores (afinal de contas, não precisamos

expressivas e não, eu não tinha os ossos

jornalista e especialista em represen-

mais nos preocupar com a intensidade

da clavícula tão aparentes quanto os de

tação da imagem feminina na mídia Laís

das opressões relacionadas à materni-

Mia Thermopolis.

Ferreira explica que a infância é uma fase

dade, vida doméstica, necessidade de

de construção da identidade coletiva.

castidade e a importância do

trazendo a representatividade”, explica.

pag. 16

comportamento passivo tal

George — que ilustravam

qual nossas avós e mães) –

a jovem magra e de beleza

ainda estamos aprisionadas

ocidental como exemplos

ao ideal de perfeição. Cresc-

da imagem feminina de per-

emos roboticamente en-

feição, sucesso e autocon-

sinadas a buscar a perfeição

trole. A jornalista Laís Ferrei-

física. Aprendemos que não,

ra afirma que, há décadas,

não precisamos mais ser re-

a mulher era designada ao

catadas e do lar, mas ainda

âmbito doméstico e teve o

precisamos ser belas.

corpo objetificado.

E eu, nascida e criada nos

“Os objetos midiáticos –

anos 2000, sou um exemp-

novelas, filmes, revistas e

lo disso. Cresci tendo como

propagandas – retratavam a

referência as modelos de

mulher bem sucedida como

alta moda, atrizes, cantoras

uma mulher casada, com

e personagens do cinema

filhos e dona de casa. A mul-

- como Gisele Bündchen,

her, além de ser colocada

Paris Hilton, Lindsay Lohan,

dentro do padrão de “bela,

Anne Hathaway, Regina

recatada e do lar”, não era

entendida como um ser pensante, mas era olhada apenas como um objeto, como um corpo”. Apesar de novas mudanças serem necessárias, é preciso reconhecer que houve uma evolução na representação feminina nos meios midiáticos.

Hoje, conseguimos contemplar mais diversidade do que tínhamos décadas atrás. Porém, ainda temos um longo caminho a percorrer. Como, por exemplo, a inclusão de mulheres trans em papéis de destaque.

Em suma, a Luma da infância e da adolescência pode, sim, ter crescido acreditando não ser boa o suficiente por não se parecer com Anne Hathaway. E, assim como diversas outras garotas, passou a vida comparando os seus bastidores com os palcos alheios.

Mas, a Luma do presente fica muito feliz em perceber que a nossa geração está cada vez mais rasgando as cortinas e trazendo os holofotes para o que é real e genuíno. pag. 17