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Mulheres relatam rotina em ambiente hostil na Petrobras
from JORNAL DE FATO
a na f lávia Pilar o globo / Rio de Janeiro
Em 2011, A. teve vídeos íntimos compartilhados em e-mails corporativos de funcionários da Petrobras, quando trabalhava na Bacia de Campos. A técnica de segurança do trabalho, hoje com 42 anos, soube do vazamento por uma amiga, que ligou dizendo que ela aparecia em uma série de sites de conteúdo adulto. Depoimentos como esse, ouvidos pelo GLOBO, revelam que os casos de assédio sexual na Petrobras já acontecem há mais de uma década, e a cultura corporativa da empresa pouco mudou nos anos mais recentes.
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Há relatos sobre funcionários homens que ligam de dentro da plataforma para as mulheres enquanto se masturbam, enviam mensagens de teor sexual nas redes sociais e tentam beijar à força trabalhadoras, além de constrangimentos no dia a dia, que configuram assédio moral.
As primeiras denúncias surgiram na imprensa quando o colunista Ancelmo Gois, do GLOBO, revelou mensagens enviadas por funcionárias da Petrobras em um grupo no WhatsApp. Algumas delas diziam que a Ouvidoria da estatal não toma medidas eficazes para coibir os abusos, limitando-se a transferir o assediador ou a vítima de setor.
Os relatos foram confirmados por oito pessoas ouvidas pela reportagem, entre funcionários e exempregados da Petrobras ou de terceirizadas, que descrevem um ambiente de trabalho hostil às mulheres.
I Ndeniza O
A. conta que teve um
Mulheres são apenas
16,9% dos empregados barcada porque não é permitido trancar a porta do camarote.
Segundo o último relatório da Petrobras, de 2021, as mulheres são apenas 16,9% entre os 38.694 empregados. A petroleira conta ainda com 92.401 trabalhadores terceirizados, dos quais 14% são mulheres.
- Meu gerente falou que não gosta de trabalhar com mulher. Você acha que ele está preparado para lidar com uma denúncia de assédio? Ele vai achar que o problema é a mulher — disse B., funcionária da Petrobras há 14 anos.
— Eu tranquei. Uma homarada me olhando daquele jeito, como se fossem caçadores na floresta — contou.
Ten TaT iva de beijo à força caso com um dos gerentes da plataforma depois de semanas sendo pressionada por ele. Ela costumava “andar sozinha” durante o embarque, sem amigos, porque o chefe perseguia aqueles que se aproximavam.
O vazamento das imagens, gravadas em momentos privados do casal, aconteceu depois de uma inspeção no celular e computador corporativo do gerente. Ao Ministério Público, ele argumentou que o material foi compartilhado pelo técnico que realizou o procedimento.
Mesmo assim, a Justiça o condenou a pagar uma indenização. A funcionária também registrou uma denúncia contra a empresa terceirizada onde trabalhava, conforme apuração do GLOBO. Logo depois do episódio, A. foi afastada pelo INSS porque se sentia mal no ambiente de trabalho.
Ao retornar, o órgão determinou que ela teria um ano de estabilidade, mas a funcionária foi demitida em seis meses. Como a prestadora de serviços entrou em recuperação judicial, a ação mirou a Petrobras como responsável subsidiária.
Em agosto de 2019, o Ministério Público do Trabalho (MPT) determinou o pagamento de uma indeni - zação. O trauma foi tanto que A. usou parte do dinheiro para começar outra carreira e está concluindo a faculdade de medicina, mais de dez anos depois: — Passei a dormir de macacão e bota. Morria de medo de entrarem no meu quarto. Até para arrumar emprego depois foi difícil. Sempre tinha um que ouviu falar.
O caso de A. levou um colega de trabalho a registrar uma denúncia na Ouvidoria da empresa em 2016 com 33 arquivos anexados como prova. O órgão informou ter encaminhado a acusação para a “área responsável” e perguntou se havia testemunhas.