Cultura e comportamento
As novas faces do aprendizado diante da Covid-19
Como as mudanças educacionais e comunicacionais trouxeram discussões sobre a importância da acessibilidade digital Por Isabela Mendes Dos Santos, Julia d’Avila Delfino e Letícia Galatro Alves
Março/Abril 2021
Consultor de Acessibilidade da Secretaria Municipal da Pessoa com Deficiência. Ademais, o especialista chama atenção para a expansão das tecnologias e sua abrangência nos meios de ensino: “As ferramentas de reuniões virtuais ficaram mais populares [...] as pessoas passaram a utilizar e aprender seus recursos, além de melhorarem sua performance. Isso, consequentemente, trouxe acessibilidade digital e a oportunidade de participação das pessoas em geral e de pessoas com deficiências também”. Contudo, houveram também desvantagens. A falta de comunicação presencial figura como uma barreira interativa para esse segmento: “para que uma criança com deficiência se sinta pertencente é preciso haver a socialização”, informa Tobias. No caso de crianças com deficiências intelectuais, o processo pode se tornar mais complexo, uma vez que a ausência da linguagem corporal pode dificultar a compreensão do aluno juntamente com os obstáculos decorrentes da nova forma de absorver o conhecimento. Para que haja um aumento da acessibilidade, há a necessidade de uma plataforma compatível com o software e o leitor de tela para alunos cegos. Já no caso dos surdos, os oralizados precisam de uma aula com legendas ativadas, enquanto os não oralizados necessitam de intérpretes de LIBRAS presentes. Porém, na maioria das vezes, os programas utilizados não apresentam esses recursos e nada é feito a respeito deste imbróglio. A ausência da adaptação das plataformas cibernéticas para crianças e jovens com deficiência usufruírem de um bom aprendizado equivale a um agravamento do capacitismo, isto é, a discriminação do indivíduo em virtude de sua deficiência, o que contraria o artigo 27 da Lei Brasileira de Inclusão: “A educação constitui direito da pessoa com deficiência, assegurados sistema educacional inclusivo em todos os níveis e aprendizado ao longo de toda a vida, de forma a alcançar o máximo desenvolvimento possível de seus talentos e habilidades físicas, sensoriais, intelectuais e sociais, segundo suas características, interesses e necessidades de aprendizagem”. © Letícia Galatro Alves
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comunicação é um processo que Quanto aos impasses de alfabetizar envolve a troca de informações en- online, Mariana menciona a utilização tre os indivíduos por meio de signos de todos os métodos possíveis, dentre os e regras semióticas mutuamente enten- quais se destacam os jogos virtuais, que díveis. Trata-se de um processo social pri- fizeram toda a tensão e preocupação do mário, que permite a socialização e pode contexto serem deixadas de lado por um se apresentar de diversas formas. momento. Essa metodologia foi pensada Comunicar consiste na compreensão, tendo em vista o prazer que as crianças emissão, transmissão e recepção de uma encontram em aprender com soluções lúmensagem por métodos convencionais ou dicas e divertidas, tornando o cenário mais não, seja por meio da fala ou da escrita, leve e descontraído para ambas as partes. por sinais ou símbolos. A linguagem utili- Todavia, a professora ressalta que se trazada para a comunicação pode ser verbal, ta de uma questão individual e não geral como ocorre de forma rotineira entre as quando o assunto é a defasagem dos alupessoas, em leituras de jornais, revistas nos alfabetizados pela internet em relação e artigos diversos, em discursos ou pales- àqueles alfabetizados presencialmente, tras, ou em qualquer conversação. visto que alguns responderam muito bem Existe também um código com os mo- ou até melhor às estratégias adotadas na vimentos faciais e corporais, além do uso de educação remota do que àquelas explorasímbolos que indicam a intenção comunica- das no sistema de educação regular. tiva. Os gestos denunciam enquanto determinados movimentos comunicam. Uma linguagem 100% eficaz mistura essas duas formas de integração para se tornar mais completa. Porém, a pandemia do Coronavírus juntamente com a necessidade de lockdown impactou e mudou radicalmente o âmbito comunicacional. Aparatos tecnológicos se mostraram essenciais para a manutenção da interação entre os indivíduos nesse momento, tanto na vida social como na profissional. No entanto, essa tecnologia pode ser vista como uma ameaça à máxima eficiência da comunicação, uma vez que limita o acesso aos recursos não verbais da linguagem. Dessa forma, a alfabetização foi duramente afetada durante o períLucca Martins, de 6 anos, participando de aulas de odo de isolamento. Sem a estrutura alfabetização à distância necessária, os professores tiveram que se adaptar ao ensino remoto da A adoção de métodos de ensino à dismaneira que puderam, fazendo da escassez de recursos a oficina da criatividade. tância levantou, também, questões acerPara Mariana*, professora da rede particu- ca da acessibilidade, especialmente para lar de ensino infantil, no início, houve uma pessoas com deficiência. Em meio a esse certa dificuldade de adequação às aulas contexto, o espaço virtual trouxe vantaonline: “Eu ficava preocupada se o que eu gem ao permitir a presença de todos os preparei seria o suficiente, se eu conse- alunos. Indivíduos com deficiência física guiria atingir os objetivos”. Os alunos tam- sentiram-se estimulados a estudar pela bém passaram por um processo o qual possibilidade de ficarem em casa e não ela caracteriza como ‘delicado’ na hora de se preocuparem com a falta de acessibiaprender através dos meios digitais, já que lidade arquitetônica para locomoção. “A eles demonstravam querer falar e partici- condução pode ser difícil, então o ensino a par da aula freneticamente e, consequen- distância facilita isso, porque o aluno com temente, era exigida uma atenção maior comprometimento físico consegue estar do que os limites do ensino à distância per- presente em uma aula em EaD – coisa que mitiam, tanto por parte dela quanto por às vezes é difícil ou quase impossível em uma aula presencial”, diz Sidney Tobias, parte deles.
* O nome Mariana foi utilizado visando a preservação da identidade da fonte.
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