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Do físico ao digital: a influência dos streamings no comércio musical

Do fí sico ao digital: a infl uência dos streamings no comércio musical

Como as lojas de discos sobreviveram durante a pandemia e os desafi os impostos por novas formas de se consumir canções

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Por Esther Ursulino, Ramon de Paschoa e Tabitha Ramalho

Sabemos que a música evoluiu ao longo dos anos, desde os concertos clássicos com violinos até chegar ao pop e outros ritmos atuais. Não foi diferente com os objetos e espaços de propagação musical: antes, era preciso ir a recitais ou eventos com orquestra. Depois, em lanchonetes com as famosas jukebox. Hoje, temos redes como Spotify, Deezer ou Amazon Music.

Devido ao surgimento da internet e ao sucesso das plataformas digitais, explorar novas composições e artistas deixou de ser algo caro e restrito. A chance de ter contato com produções do outro lado do mundo, acessar raridades, armazená-las sem ocupar espaço fí sico e escutá-las a qualquer hora são conquistas que ajudaram a democratizar o acesso à música em todo o planeta.

Grupos clássicos do rock se deram bem com a alta dos vinis. Os Beatles venderam cerca de 300 mil discos em 2018. Queen, Pink Floyd e David Bowie mais de 100 mil, segundo a revista de música Rolling Stone.

Com as atualizações da Billboard, a maior parada musical do mundo, alguns artistas tiveram que pensar em uma nova estratégia para vender suas canções.

Por exemplo, cantoras como a Taylor Swift não abandonam as mídias fí sicas, produzindo versões alternativas do álbum, cada uma delas contendo uma música exclusiva, assim como Justin Bieber e Demi Lovato. Lojas como a Target passaram a vender itens como revistas contando bastidores do projeto, fazendo com que mais fãs comprassem para colecionar.

Dunia Hany, fã e colecionadora, conta que seus CDs – muitos até autografados – a fazem se sentir mais próxima de seus ídolos. Ela diz que muitos deles vêm acompanhados de brindes como fotos e pôsteres, o que a estimula ainda mais a consumi-los.

Outro fator que exigiu uma nova estratégia foi a pandemia, que trouxe como consequência o fechamento dos comércios não essenciais. As lojas de CDs e Vinis foram um dos muitos setores afetados que, para superar essa limitação, apostaram no comércio via internet.

Edvaldo Silva, dono da loja “Made in quebrada”, reforçou as vendas on-line durante a crise sanitária: “isto está mantendo a loja muito bem, porém sentimos falta da interação com as pessoas em eventos e na loja fí sica”.

Daniel Nunes, dono da “A Loja de Discos”, acrescenta que as difi culdades já existiam desde a falta de pontos de venda pelo país e a quebra das livrarias. “Nosso e-commerce, que já era forte, cresceu muito mais exatamente por termos investido nas vendas on-line há 5 anos. Estamos sobrevivendo às consequências da pandemia”.

Mesmo durante o primeiro semestre de 2020, as vendas de discos fí sicos totalizaram US$232 milhões. No entanto, essa quantia não compõe nem 10% dos lucros, visto que os streamings geram um lucro exponencialmente maior e, dessa forma, a mídia digital nesse mesmo período lucrou quase 5 bilhões de dólares.

Todavia, o sucesso dessas plataformas não simbolizou uma ameaça: “já convivíamos com a pirataria, foi mais um canal de divulgação musical como rádio, tv e imprensa”. Para Nunes, os streamings não anulam as plataformas fí sicas e, portanto, ele não pensa em interromper sua comercialização: “Nunca pensamos em parar com o fí sico pois sabemos que o artista não pode virar um átomo. Ele precisa existir fi sicamente de alguma forma, seja nas mídias, merchandising ou qualquer outro produto fí sico e também porque sabemos que a qualidade dos streamings não agrada todos os ouvidos, incluindo o meu”.

Edvaldo concorda: “Ao contrário do que se pensa, acredito e percebo que cada vez que se populariza o digital, mais se fortalece a necessidade de uma parcela das pessoas terem contato com algo fí sico e material”. Em conssonância, o consumidor Tomás Santana diz que, com o formato fí sico, a música se torna “algo palpável”, que estimula os sentidos e contribui para construção de uma memória afetiva.

Dentre as vantagens e desvantagens das plataformas, Daniel conta que o mercado fí sico se transformou em um nicho, enquanto o digital se propaga cada vez mais abundantemente: “a mídia fí sica tem a magia que a digital nunca terá. Além da qualidade de áudio superior, existe a parte gráfi ca, a criatividade da capa, informações técnicas, letras e o fato das pessoas continuarem a ouvir a obra inteira do artista, não apenas singles”.

Assim como Nunes, o colecionador Juan Gustavo diz que uma vantagem é o ritual de segurar o encarte e colocar o lançamento para ser tocado enquanto o som é passado. “Isso estabelece uma conexão maior do ouvinte com a obra, coisa que a mídia digital não oferece”.

© Acervo Pessoal

Edvaldo Silva organizando discos de vinil

© Acervo Pessoal

Coleção de Juan Gustavo

Os lojistas afi rmam que o principal obstáculo das pessoas não consumirem vinis no Brasil está no valor do produto. Daniel diz que o processo fabril é caro, desde a matéria prima, técnicos e máquinas, até corte e masterização, e comenta que existem apenas 2 opções de fábrica no país.

Edvaldo complementa: “Nossos salários são muito baixos. O Valor do disco no Brasil acompanha o valor mundial, considerando que boa parte dos insumos para a produção são importados”.

Mesmo com esses obstáculos, os colecionadores contam o porquê de ainda valer a pena cultivar esse hábito. Para Juan, os streamings instigam as pessoas a ouvirem música enquanto realizam outras tarefas, o que difi culta a concentração. Segundo ele, o disco material, em contraposição, tende a prender a atenção do ouvinte.

Gostando ou não, as plataformas de streaming vieram para fi car. Porém, como relatado pelos lojistas e consumidores, o produto fí sico tem seu valor, seja pelo sentimento nostálgico ou pelo gosto pessoal. Como disse o colecionador Jedias Hertz: “colecionar é guardar pedacinhos da história da música”.

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