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SER MOTORISTA
from O Carreteiro 551
by GGMídia
PROFISSÃO SOB AMEAÇA
e O CARRETEIRO SHUTTERSTOCK, ARQUIVO PESSOAL Fotos
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PROFISSÃO SOB AMEAÇA

Alta do diesel, valor do frete, insegurança, falta de valorização profissional e ganhos insuficientes para uma vida digna estão entre os principais fatores que têm contribuido para que caminhoneiros em atividade acabem desistindo da atividade. O desinteresse pela profissão, inclusive pelos jovens, tem sido cada vez maior e resultado caminhões parados por falta de condutores e de motoristas capacitados
DANIELA GIOPATO
Atuar como caminhoneiro hoje é bem diferente de alguns anos atrás. O romantismo pela profissão que levou milhares de jovens a desejarem ser motorista de caminhão foi perdendo espaço para as inúmeras exigências por parte de embarcadores e transportadores. Por um lado essas mudanças trouxeram certos benefícios, entre eles maior profissionalização do setor de transporte de cargas. Entretanto, os caminhoneiros continuaram a sentir a

Formado em ciências biológicas e pósgraduado em gestão ambiental, Ernanio Carlos afirmou que só está na profissão porque gosta de caminhão e de viajar
falta de valorização e a perder interesse pela profissão. Como consequência muitos profissionais já sairam a profissão, outros falam em abandonar, enquanto jovens optam por outras atividades. Atualmente, a falta de motorista é um problema enfrentado no Brasil e também em outras partes do mundo. A paixão pela estrada, o desejo de viajar, conhecer novos lugares e pessoas, além de conviver com a liberdade de ir e vir já não são mais suficientes para superar pontos negativos da profissão como preço do diesel, valor do frete, insegurança, falta de infraestrutura adequada, baixa remuneração etc. Pesquisa com mil caminhoneiros espalhados por cinco pontos no Brasil, realizada pela Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos (CNTA), sobre a realidade do autônomo, mostrou que o motorista trabalha em média 13 horas por dia e 23 dias por mês para receber cerca de R$ 4 mil. Mostrou também que a idade média do veículo do TAC é de 14 anos. Outro ponto que chamou atenção é a preocupação desses profissionais é em relação à segurança. Isso porque, 59,7% dos entrevistados responderam que nunca se sentem seguros nas rodovias e 43,4% já foram vítimas de roubo de carga. Quanto ao perfil social da categoria, 52% dos entrevistados estudaram até o ensino médio e possuem 19 anos de profissão em média. Ernanio Carlos de Almeida, de Caratinga/MG, tem 40 anos de idade,seis de
Eu vejo a molecada nova tentando entrar na profissão, mas trabalham por pouco tempo e desistem, pois não aguentam a pressão, comentou Anderson Zamperlini
profissão como autônomo e faz a rota Sudeste e Nordeste. Ele é formado em ciências biológicas, pósgraduado em gestão ambiental e vem de uma família de três gerações de caminhoneiros autônomos. Antes já trabalhou como funcionário público, biólogo e professor, porém a vontade de seguir como caminhoneiro falou mais alto. “Estou na profissão por paixão. Amo o que faço, gosto de viajar e de ter caminhão e o compromisso com a carga, de fazêla chegar ao cliente. Mas hoje, mesmo gostando de caminhão o jovem informado sobre a profissão analisa todos os pontos negativos e acaba optando por outra área”, afirmou.
Pelo fato de ter vivido na estrada acompanhando várias gerações de sua família, Ernanio percebe diferenças em ser autônomo hoje em dia e no passado. “Uma das coisas que me desanimam é a falta de união. Lembro de quando meu pai viajava e eu ia junto, ele seguia sempre em comboio, um ajudando o outro. Hoje isso é uma raridade”, lamentou.
Na sua opinião existem vários fatores que afastam os jovens da profissão. A humilhação na hora de carregar é uma delas. Como exemplo ele cita uma situação vivida por ele. “Cheguei na empresa para carregar ao meiodia, os documentos e o manifesto foram aprovados as 13h30, porém só consegui entrar na empresa para carregar às dez e meia da noite. Encostei na doca uma e meia da madrugada e só me chamaram as três da manhã e terminei de carregar às 6h00 horas. Isso é humilhante. Passar o dia e a noite inteira carregando e de manhã ter de sair e viajar. Que jovem quer passar por isso? ”, questionou. Em sua opinião, a realidade do autônomos piorou muito depois da greve de 2018, acrescentando que a categoria já vinha sofrendo com constantes aumentos do diesel. “A greve só aconteceu porque teve apoio de grandes empresas. Na época se estabeleceu a tabela com o piso mínimo de frete, com isso as empresas se beneficiaram pois passaram a cobrar das transportadoras os valores tabelados. Porém, esse valor não era repassanossa classe fosse ficando em uma situação econômica cada vez pior. Outro problema citado por ele é a falta de incentivo para o autônomo atualizar o caminhão. “Trabalho com um MercedesBenz 1620, ano 2009 avaliado em

Dificuldades enfrentadas nas estradas e tempo longe de casa também contribuem para tornar a profissão menos atrativa
R$ 200 mil reais. Se eu quiser trocar por um zero não conseguiria pois teria que desembolsar quase R$ 300 mil reais. Então, a tendência é a frota do autônomo estar sempre velha”, opinou. Ele acredita que única solução seja as empresas entenderem a real importância do caminhoneiro e incorporar ações que valorizem esse profissional oferecendo um valor digno de frete e condições adequadas para trabalhar. “Um motorista bem pago e com tranquilidade para trabalhar cuida melhor do equipamento. Hoje, um conjunto com cavalo mecânico e carreta é avaliado em quase um milhão de reais. A empresa investe esse dinheiro e entrega a carreta nas mãos de um caminhoneiro e paga para ele R$ 2 mil mais alguns benefícios, totalizando no máximo R$ 4 mil. Não tem muita lógica, é preciso valorizar mais essa mão de obra”, finalizou. Para Anderson Cleber Zamperlini, de Arapongas/PR, 46 anos de idade e 26 de profissão, dos quais 10 como autônomo, o jovem que decide ser caminhoneiro hoje tem de ter muita coragem. “Está bastante complicado viver do caminhão. As empresas conseguem cobrar o valor cheio de seus clientes porém para nós esse valor nunca é repassado. E isso deixa o nosso dia a dia cada vez mais difícil, pois por outro lado, o preço do diesel não baixa e assim o caminhoneiro segue segurando as pontas do Brasil. Já gostei muito dessa profissão, mas apesar de querer sair da estrada não tenho alternativas pois só sei dirigir. Mesmo assim estou estudando outras possibilidades”, disse. Anderson acredita que será tarefa bem difícil fazer os jovens voltarem a se interessar pela profissão como era anti-


Hoje 60% do frete vai para o diesel e só com 40% fica difícil fazer a manutenção do caminhão e sustentar a família, destacou Casemiro Júnior, lembrando que um pneu novo custa quase R$ 3 mil e para arrumar um motor se gasta outros R$ 50 mil
gamente. “Eles conhecem a realidade do caminhoneiro e não querem vivenciála. Eu vejo a molecada nova tentando entrar na área do caminhão, mas trabalham por pouco tempo e desistem, pois não aguentam a pressão. Então, só vai trabalhar com caminhão aqueles motoristas que têm paixão de verdade pela profissão ou que não têm outra opção”, concluiu. Autonômo desde 2008, Casemiro Wolski Júnior, de Palmeira/PR, diz que para seguir na profissão tem de acontecer duas coisas: baixar o preço do diesel e aumentar o valor do frete, mas acredita que será difícil qualquer uma dessas opções vir a acontecer. "Hoje, 60% do frete vai para o diesel e só com 40% é difícil fazer a manutenção do caminhão e sustentar a família. Eu estou nesse ramo ainda porque não tenho estudo, mas às vezes penso em abandonar. Talvez seja melhor trabalhar como empregado, mas aí esbarra no problema de ficar muitos dias longe de casa. Como autônomo consigo estar em casa no final de semana para ficar com a família”, pontuou. Casemiro acredita que o retorno financeiro deve ser mais atrativo para os jovens voltarem a se interessar pela profissão. “Tudo que envolve o caminhão está muito caro. Um pneu está quase R$ 3 mil; para arrumar um motor se gasta R$ 50 mil e para recuperar esse dinheiro vai muito tempo. E isso não muda muito se o jovem opta em ser empregado pois vai receber um salário fixo que gira em torno de R$ 1.800,00 mais uns 8%. Por isso acho muito difícil os jovens optarem pela área de caminhão nessas condições. E assim vai faltar mão de obra cada vez mais”, finalizou.
FALTA DE ATRATIVOS E
e ARQUIVO O CARRETEIRO SHUTTERSTOCK, DIVULGAÇÃO Fotos

FALTA DE ATRATIVOS E DE INCENTIVOS
Além de dificuldades enfrentadas pelo caminhoneiro no dia a dia, como insegurança, baixo valor do frete e a falta de incentivos para melhorar suas condições de trabalho, a desvalorização da profissão tem causado abandono e o desinteresse de jovens a ingressar na profissão. O resultado são caminhões parados por falta de mão de obra

DANIELA GIOPATO
Afalta de valorização da profissão tem se tornado uma das principais queixas por parte dos caminhoneiros, empatando inclusive com a alta do diesel, valor baixo do frete e insegurança. A importância desses profissionais para manter o abastecimento das cidades e manter funcionando hospitais, mercados, farmácias, aeroportos e postos de combustível, assim como o escoamento de tudo o que é produzido, ficou claro para todos os brasileiros durante a greve dos caminhoneiros em 2018 e, recentemente, com a pandemia da Covid-19. Os veículos pesados se mostraram parte fundamental na circulação de todo tipo de mercadoria no País, comprovando que sem os caminhões a rotina das pessoas se tornaria um caos. Entretanto, apesar de toda essa importância, os motoristas se dizem cada vez mais desmotivados a permanecerem na profissão, justamente pela falta de ações para melhorar o dia a dia na estrada além do descaso de empresas, embarcadores e governo quanto à segurança e

Estamos em constante conversa com o governo para achar soluções positivas para o caminhoneiro, disse Bruno Batista, da CNT. Mais segurança é desejo da categoria
falta de infraestrutura. Pesquisa realizada pela CNT – Confederação Nacional dos Transportadores – traçou o perfil dos caminhoneiros e apontou que entre os pontos negativos da profissão constam o fato de ela ser perigosa/insegura (65,1%) e desgastante (31,4%) e de comprometer o convívio familiar (28,9%). Os assaltos e roubos também aparecem na lista de pelo menos 64,6% dos caminhoneiros entrevistados. Cerca de 7% relataram que já tiveram o veículo roubado ao menos uma vez nos últimos dois anos. Além disso, 49,5% desses profissionais já recusaram a viagem por conta do risco de roubo ou assalto durante o trajeto. Os motoristas também destacaram o baixo ganho (50,4%), a baixa qualidade da infraestrutura (20,9%) e a ausência de qualificação profissional adequada (15,6%) como ameaças à profissão. O custo do combustível aparece como o segundo maior entrave vivenciado pelos motoristas (35,9%) e a queda do pre-

ço continua a ser o item mais pretendido pelos profissionais do volante, em especial os autônomos. No total, 51,3% consideram ser essa a maior demanda da categoria. Em segundo lugar aparece a necessidade de mais segurança nas rodovias (38,3%), seguida de financiamentos oficiais a juros mais baixos para a compra de caminhão (27,4%) e do aumento do valor do frete (26,2%). “A pesquisa nos mostrou que boa parte das dificuldades e pontos negativos citados pelos caminhoneiros estão relacionados com a própria dinâmica do País. Roubos e assaltos têm relação com a segurança pública, enquanto alta do diesel e o valor de frete estão diretamente ligados a questões econômicas. Todos os entraves citados precisam de ações junto ao governo para serem solucionadas. Estamos em constante conversa com o governo para achar soluções positivas para o caminhoneiro, inclusive em relação ao financiamento para dar aos motoristas a chance de trocar de caminhão e ter melhores oportunidades”, disse o diretor executivo da Confederação Nacional do Transporte, Bruno Batista. Entretanto, ele ressalta que a pesquisa mostrou também que mesmo diante de todas as dificuldades inerentes à atividade, o caminhoneiro é um profissional orgulhoso de sua profissão. O trabalho também mostrou características da própria dinâmica da profissão, tais como possibilidade de conhecer pessoas e lugares e horário flexível. Apesar da paixão pela profissão, Batista lembra que a escassez de mão de obra de motoristas no Brasil e em outras partes do mundo é preocupante. “É um problema que pode comprometer a eco-

Falta de infraestrutura nas rodovias se destaca como um dos motivos causadores de desinteresse pela profissão

Valorizar o caminhoneiro é essencial por várias razões, pois é o fator humano que grarante o transporte, diz Salete Argenton
nomia do País se nada for feito. Porém acredito que essa escassez esteja ligada também à própria mudança de perfil do caminhoneiro. Hoje, o mercado busca um profissional que tenha conhecimento em tecnologia, até mesmo porque os caminhões estão cada vez mais modernos. Mas é preciso entender que é uma situação positiva para o profissional, pois a medida que ele se capacita consegue melhores fretes e salários”, acrescentou. Batista ressalta também ser importante o motorista buscar cursos e treinamentos, bem como reforça que o Sest Senat oferece cursos gratuitos e alguns online. “Eu vejo um futuro positivo e de crescimento para a profissão. O caminhoneiro tem hoje diversas ferramentas disponíveis com preços acessíveis, gratuitas e remotas para se aprimorar e conseguir tirar vantagem dessa profissão que é tão importante e essencial para o nosso País. Eu vejo o caminhoneiro daqui uns anos sendo um especialista em comunicação instantânea, tecnologia e um relações públicas da empresa ou do seu próprio negócio”, opinou. Para a gerente da Fabet, Salete Marisa Argenton, valorizar o caminhoneiro é essencial por diversas razões. Ela acredita que por mais que os veículos estejam cada vez mais tecnológicos, é o fator humano que garante o transporte. “Uma empresa de transporte somente se consolida à medida que disponibiliza uma frota de veículos adequada, associada a motoristas preparados, engajados e que conduzam com segurança e economia.



Cada vez mais as transportadoras precisam criar ações que transformem os ambientes de trabalho em espaços mais positivos, respeitosos, saudáveis e seguros, e que sejam estendidos aos embarcadores, pontos de apoio e demais organismos envolvidos e responsáveis por toda a logística do negócio”, acrescentou. Na opinião da gerente da Fabet, a escassez de bons profissionais do volante deve servir de alerta para o setor tomar medidas necessárias para garantir minimamente que os profissionais permaneçam na profissão e sejam capacitados para entenderem e atenderem as mudanças do setor e as exigências do mercado. “O setor muda muito rapidamente por conta dos avanços tecnológicos e nossos motoristas precisam ser estimulados para avançarem na mesma proporção e não desistirem”, completou. Sobre as ações necessárias para estimular jovens a ingressarem na profissão, e também evitar a desistência por parte dos que estão em atividade, Salete Argenton ressalta a importância de empresas apoiarem e darem condições para os motoristas realizarem treinamento técnico e especializado, que desenvolvam as habilidades e competências comportamentais e técnicas para se tornarem profissionais seguros e eficientes. “Tecnologias embarcadas e agregadas já são elementos que estimulam jovens a ingressarem na profissão. Muitos jovens e adultos têm o desejo de se tornarem bons condutores, entretanto percebemos o baixo investimento das empresas
Mulheres treinadas e preparadas para atuar como motoristas já dirigem caminhões em várias regiões do Brasil

Adriano Depentor, do Setcesp, alerta sobre a queda no número de profissionais habilitados para dirigir caminhão
para apoiarem esse público”, explicou. Sobre a falta de motoristas, ela cita que milhares de veículos já estão parados nos pátios por conta da falta de profissionais e outros tantos estão com idade próxima da aposentadoria e em breve também estarão ausentes da atividade. De acordo com ela, como consequência tem empresas contratando motoristas sem o preparo suficiente e colocando em risco a vida de pessoas, enquanto outras buscam soluções caseiras de treinamentos ineficientes, sem metodologia adequada, sem embasamento educacional. “Entendemos que a solução passa por diversas etapas que precisam ser desenvolvidas com seriedade, profissionalismo e, sobretudo, com os investimentos necessários. O processo de recrutamento, seleção, contratação, integração, treinamento e retenção da forma correta, ética e respeitosa, são os primeiros movimentos para solucionar a escassez e a falta de qualidade da mão de obra”, complementou. Outras soluções propostas pela gerente da Fabet é o estímulo junto a transportadores e embarcadores para o apadrinhamento de jovens e adultos inexperientes para que participem dos cursos especializados de formação e a partir do bom desempenho dar a oportunidade de ingresso na atividade. “Estamos em uma época de tanta transformação no setor que não podemos mais basear nossos critérios de contratações em experiências profissionais anteriores, mas sim conseguir avaliar quais habilida-


Motoristas precisam ser estimulados a acompanhar os avanços das tecnologias do setor de transporte

des o indivíduo tem a partir da formação e do estudo e quais precisam ainda de aperfeiçoamento e plano de ação para o desenvolvimento contínuo”, explicou. A importância de ações para inserção de mulheres condutoras também é destacada, mas para isso é importante que as empresas invistam na preparação, formação e educação de mulheres para a atividade. “Precisamos urgente de investimentos sérios e oportunidades para as mulheres mostrarem o talento e competência na arte de conduzir veículos modernos e tecnológicos, seja para operações urbanas, rodoviárias, off road ou internacional”, disse. Ela destacou que ex-alunas da Fabet estão espalhadas pelo Brasil e em diversos perfis de transporte, comprovando a qualidade de seu trabalho. “Portanto, a solução é conhecida e simples: investir em educação profissional, dar oportunidades e respeitar/valorizar a profissão e quem a exerce”, concluiu. O presidente do conselho superior e de administração do Setcesp (Sindicato das Empresas de Transportes de Carga de São Paulo e Região), Adriano Depentor, destacou que desde 2015 o número de motoristas habilitados para dirigir caminhão (categoria C e complementares) vem diminuindo no País. Conforme disse, até então o crescimento era modesto (cerca de 1,4% ao ano) porém, nos últimos anos tem caído a taxas de até -5,9% ao ano. As quedas mais acentuadas estão em São Paulo, chegando a registrar uma redução de -8,9% de motoristas habilitados entre 2017 e 2018. A queda de registros de habilitados “C” já chega a 7,45% ao ano nos municípios da base do Setcesp, com quedas


mensais constantes na casa dos 0,65%. Além disso, o perfil de idade dos motoristas também mudou muito nos últimos 10 anos: em 2010, a grande maioria se encontrava na faixa de 41-50 anos de idade, enquanto em 2020 houve um envelhecimento, passando para a faixa entre 51-60 anos. O número de novos motoristas na primeira faixa 18-21 anos caiu 64,1%, mesma proporção da faixa 22-25 anos (63,7%). Depentor disse que a falta de interesse gera a não qualificação da mão de obra e por mais que se tenha meios de melhorar essa qualificação, e as empresas estejam investindo para isso dentro de suas dependências, a falta de interesse ainda é muito grande e decorrente da desvalorização do setor como um todo. “Devido a desvalorização, desde a infraestrutura (assistência nas estradas, ponto de parada e segurança) até a remuneração, e o mercado como um todo, (isso inclui governo, empresa, embarcadores, recebedores), o jovem não tem interesse na profissão, pois ele busca dinamismo, reconhecimento e mais agilidade. Então, o setor deve ser reestruturado para que a qualidade cresça ainda mais e com isso novos perfis voltem a fazer parte do segmento”, complementou. Em sua opinião, para reduzir a escassez de mão de obra no Brasil o primeiro ponto deve ser a valorização da classe, proporcionando boa remuneração, seguida por uma infraestrutura adequada, segurança, capacitação e melhor qualidade de trabalho para todos os profissionais. “Se nada for feito, o principal problema será o comprometimento do crescimento do País, trazendo um gargalo ou até mesmo um apagão logístico. Isso vai expandir com a falta de profissionais e trazer atraso no crescimento. Vale ressaltar que o motorista é personagem principal do transporte. Mesmo com o avanço da tecnologia os caminhões autônomos estão distantes, então a mão de obra ainda irá perdurar por muitos anos neste segmento”, opinou. Marlon Maues, executivo da Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos (CNTA), acrescentou que a profissão de caminhoneiro não tem nenhum atrativo, além de oferecer vários riscos. Pesquisa realizada pela Confederação mostrou que a remuneração baixa é um dos fatores de dificuldades para exercer e continuar na profissão. “O sistema que foi criado transformou o cami-
O sistema criado transformou o motorista em um escravo sobre rodas, refém da profissão, disse Marlon Maues, da CNTA
nhoneiro em um “escravo sobre rodas”, um refém da própria profissão. Sendo colocado em uma situação onde leis, regulamentações e condições de trabalho o deixaram em condição insustentável. “Na pesquisa percebemos que profissionais com 19 anos de estrada são muito fieis à profissão, sendo a paixão a maior justificativa para se manterem na atividade. Além disso, o nível de escolaridade é médio e muitos deles não concluíram o nível superior, pois tiveram de optar entre a cabine do caminhão e o banco da escola”, observou. Outro dado da pesquisa mostrou que os caminhoneiros trabalham em média 23 dias por mês, nos outros sete geralmente estão à espera da carga ou servindo de depósito. “Somente metade dos entrevistados conhece a lei do piso mínimo do frete, lei que existe e é de direito do profissional, mas não conseguem exigir porque correm o risco de perder o frete para outro motorista. O mesmo raciocínio se aplica para a lei da estadia e pedágio, entre outras. E isso acontece pelo excesso de mão de obra nem sempre qualificada”, explicou. Na opinião de Marlon Maues, todo esse ecossistema do transporte rodoviário de cargas e essas dificuldades motivam os jovens a buscarem outras profissões. “O jovem entende que o caminhoneiro fica fora de casa por quase 30 dias, ganha uma receita líquida de quatro mil reais, percebe a insegurança e a falta de conservação nas estradas. Quem vai arriscar a trabalhar em uma profissão com tantos fatores negativos? Diante desse cenário, a consequência é a falta de mão de obra não somente no Brasil, mas em várias partes do mundo”, finalizou.

Pesquisa apontou que caminhoneiros desconhecem leis e não conseguem exigir direitos por medo de perder o frete
