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O Impacte da Metodologia Problem Based Learning na Aprendizagem de Patologia do Curso de Licenciatura em Enfermagem

Paulo Marques ‡

‡ Escola Superior de Enfermagem do Porto, NursId – CINTESIS paulomarques@esenf.pt Resumo

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O ensino de enfermagem tem vindo progressivamente a adaptar-se às novas realidades, nomeadamente ao facto dos estudantes terem, na atualidade, acesso a um conjunto alargado de informação, sendo necessário desenvolver estratégias de motivação que os façam envolver-se e assimilar o conhecimento baseado na melhor evidência disponível. Desta forma, tendo em conta a necessidade de melhorar a relação dos estudantes do Curso de licenciatura em Enfermagem, com uma disciplina nuclear, que muito importa dominarem, a Patologia, implementou-se um modelo centrado na metodologia Problem-Based Learning, com a introdução dos Case of The Week. Essa mudança produziu de imediato resultados significativos, na aprendizagem, na satisfação e nos dados quantitativos, tendose revelado uma aposta ganha, que foi estabilizando ao longo dos anos.

Palavras-Chave: Problem-Based Learning, Pathology, Nursing Education.

1. Contextualização

A disciplina de Patologia, da área do conhecimento médico, é central para a aquisição de informações sobre as doenças e o seu enquadramento dos estudantes de enfermagem, nas diversas relações, sendo que na Escola Superior de Enfermagem do Porto (ESEP) encontrase alocada ao 2º ano do curso, dividida em duas unidades curriculares (UC), uma com 6 ECTS e a segunda com 3 ECTS. A partir de 2012, com a alteração na coordenação da UC, decidiu-se empreender uma reflexão profunda acerca da adequação dos conteúdos e das estratégias de ensino aos desafios que se colocavam e, por maioria de razão, se colocam hoje aos estudantes de enfermagem, com acesso facilitado a diversas fontes do saber, sobretudo por via tecnológica. E assim, foi possível perceber uma elevada dificuldade em relacionar os conceitos lecionados nas aulas de tipologia teórica, nos ambientes clínicos. Essa constatação resultou de dados obtidos diretamente dos estudantes, dos docentes e sobretudo dos supervisores clínicos que com eles iam interagindo.

Nessa fase, a lecionação das diferentes matérias estava estruturada num modelo de ensino e aprendizagem tradicional, passivo, com pouco intervenção do estudante, cuja avaliação residia num único momento no final do semestre através de uma prova escrita. O ensino clássico está formatado para tender para uma aprendizagem superficial, pouco motivadora para o recetor, enquanto outras metodologias, como a Problem Based Learning (PBL) promove um entendimento profundo e enfatiza o significado ao invés da reprodução dos factos. A PBL procura fomentar uma aprendizagem ativa, colaborativa e autodirigida, através da promoção da utilização de cenários clínicos (Spiers et al., 2014). Na atualidade, o foco está no empoderamento da autoaprendizagem, o que é suportado por esta metodologia. Por outro lado, há o desafio e até o estímulo de disponibilizar no ensino de enfermagem estratégias de ensino inovadoras, sobretudo com recurso às tecnologias de informação, que captem a atenção e interesse do estudante, e que recorram ao seu envolvimento ativo. A evidência destaca que essas estratégias «podem ajudar os estudantes de enfermagem a melhorar o seu pensamento crítico» (Kong et al., 2014), o que é uma das competências em destaque no século XXI. O que vai favorecer a compreensão dos conteúdos lecionados, o raciocínio e o desempenho clínico, que é muito importante numa profissão com as características da enfermagem.

Nesse momento, e por diversos constrangimentos, como a tipologia de aulas e, por outro lado, defendermos transformações progressivas ao invés de radicais, optou-se pela implementação de um modelo hibrido.

2. Descrição da prática pedagógica

A alteração proposta, passou pela reformulação do modelo de lecionação tradicional com base no método expositivo e avaliação final, recorrendo a um teste único, substituindo-o por um modelo de lecionação híbrido com suporte na metodologia de aprendizagem baseada em problemas, através da introdução de testes formativo denominados COW’s, complementarmente ao modelo em uso.

2.1. Objetivos e público-alvo

O objetivo principal do modelo hibrido passa por promover uma aprendizagem contínua e um seguimento efetivo dos conteúdos da disciplina e, simultaneamente, ajudar os estudantes a assimilarem o conhecimento. O raciocínio clínico critico é estimulado, em contraponto de uma memorização dos factos (Kong et al., 2014). Assim, a mudança foi suportada na utilização da plataforma Moodle© para implementar esta metodologia (Shah et al., 2008), ferramenta que dispunha das características que se procuravam e estava em uso na ESEP.

2.2. Metodologia

Assim, surgiram os ‘Case Of the Week’, cujo acrónimo ‘COW’ passou de imediato a ser uma referência e motivo de discussão. Tratam-se de exercícios desenvolvidos para guiar os estudantes na reflexão da patofisiologia das doenças, com recurso ao uso de cenários clínicos reais, encorajando-os a encontrar a solução mais adequada. A avaliação final da disciplina passou a ser determinada pelo sucesso nos COW’s (20%) e por uma frequência teórica final (80%).

No início da disciplina, os estudantes são informados acerca das matérias que serão alvo de avaliação nos exercícios, das datas e tempo para a sua realização, sendo que ao longo dos anos tem havido alterações, interligando diversos conteúdos: cardíaco, respiratório, renal; ou mais especificamente patologias: dispneia e insuficiência respiratória. Habitualmente são realizados entre 3 a 5, iniciados com um caso clínico curto, com 10 a 12 perguntas de resposta múltipla com 4/5 alternativas e cerca de 25 minutos para a sua resolução: 5 minutos para a compreensão do cenário clínico e cerca de 2 minutos para responder a cada questão. Os estudantes acedem à plataforma através dos códigos que lhe são disponibilizados para acesso a diferentes ferramentas eletrónicas durante o curso e, na hora estipulada conseguem abrir o caso. Durante o tempo previsto, podem navegar entre as questões e alterar a opção selecionada.

2.3. Avaliação

Esta metodologia criou de início algum atrito com os estudantes. As mudanças e o medo do desconhecido condicionam sempre a aceitação do que é novo, mas os resultados rapidamente contribuíram para inverter os receios iniciais e os exercícios passaram a ser vistos como ‘amigos’ dos estudantes, promotores da sua aprendizagem e dos seus resultados. Por outro lado, os professores de outras Unidades Curriculares colocaram algumas reticências iniciais, ao se aperceberem dos comentários mais frequentes dos estudantes à UC de Patologia e no estudo que tinham de realizar, de uma forma sistemática, com receio de que isso se refletisse numa menor concentração de esforços nas outras disciplinas, sendo que não foi isso que aconteceu, antes pelo contrário.

3. Resultados, implicações e recomendações

A partir de 2012 os indicadores associados aos COW’s têm-se revelado excelentes:

• Melhoria significativa do número de estudantes com aprovação à disciplina;

• Um aumento do nível de satisfação dos estudantes com os resultados da sua aprendizagem (obtido através de um questionário online);

• Feedback positivo dos professores que realizam supervisão clínica;

• Em 2012 a percentagem de estudantes que necessitaram dos resultados dos COW’s para obterem aprovação à disciplina foi de 41,6% (n= 303); valor esse que nestes dez anos foi sendo esbatido até aos valores atuais: 2021/22 (1º semestre) – 7,8% (n=257).

As preocupações iniciais dos estudantes foram completamente ultrapassadas com o tempo e na atualidade a estratégia não levante quaisquer dúvidas, estando inclusivamente integrada no portefólio da ESEP de estratégias inovadoras de ensino. Da mesma forma, quer os professores das restantes UC teóricas, quer aqueles que acompanham os estudantes em ensino clínico, reconhecem as vantagens da metodologia para a aprendizagem dos conteúdos, mas também para uma lágica de acompanhamento das matérias, na sua globalidade, mais sistemáticas e contínuas, beneficiando o sistema de estudo e, como consequência, o conhecimento.

Se analisarmos a evolução verificada, nomeadamente para a estabilização dos resultados quantitativos, na ordem dos oito por centro, estamos em crer que isso se deve, sobretudo, à perceção que os estudantes têm, desde o início do próprio curso, de que há uma UC diferenciada em termos de estratégias, e que não pode ser acompanhada por períodos ciclicos, mas de forma contínua.

Recomenda-se que se use esta estratégia, na vesão que melhor se adeque à realidade, mas procurando implementá-la em patologias que sejam de maior dificuldade para os estudantes, porque os ajudam a assimilar melhor, refletindo mais profundamente quando as analisam integradas num cenário clínico.

4. Conclusões

O ensino de enfermagem em Portugal, tem vindo a ser alvo de profundas alterações nas últimas décadas. Para além das reformas legislativas e das subsequentes repercussões que em muito alteraram o panorama dos cursos, a própria transformação da sociedade e a evolução tecnológica contribuíram para mudanças necessárias, que tornaram o ensino mais apelativo e o estudante mais ativo no seu processo de aprendizagem. Temos como certo que, na atualidade, há uma permanente necessidade de repensar as disciplinas e as estratégias de ensino, pelo que também o temos feito com os COW’s e a própria disciplina de Patologia. Desde o momento inicial, que já foram realizadas outras alterações, em termos dos conteúdos, da sua profundidade, dos agentes que lecionam as matérias, etc, que certamente contribuíram para o que são hoje os resultados globais que apresentamos sumariamente. Em termos pedagógicos, há que estar atento aos diversos fatores que podem, direta ou indiretamente, contribuir para o sucesso dos nossos estudantes, futuros enfermeiros. A sociedade, em abstrato, agradecerá.

5. Referências Bibliográficas

Kong, L. N., Qin, B., Zhou, Y. Q., Mou, S. Y., & Gao, H. M. (2014). The effectiveness of problemabased learning on development of nursing students’ critical thinking: A systematic review and meta-analysis. International Journal of Nursing Studies, 51(3), 458-469. https://doi. org/10.1016/j.ijnurstu.2013.06.009

Shah, I. M., Walters, M. R., & McKillop, J. H. (2008). Acute medicine teaching in na undergraduate medical curriculum: A blended learning approach. Emergence Medical Journal, 25(6), 354-357. https://doi.org.10.1136/emj.2007.053082

Spiers, J. A., Williams, B., Gibson, B., Kabotoff, W., MacIlwraith, D., Sculley, A., & Richard, E. (2014). Graduate nurses’ learning trajectories and experiences of problema based learning: A focused ethnography study. International Journal of Nursing Studies, 51(11), 1462-1471. doi: 10.1016/j. ijnurstu.2014.03.002

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