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Avaliação e intervenção em gerontologia com recurso ao Project Based Learning

Raquel Gonçalves 1,2

Filipa Sousa Luz 1

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Augusta Manso 1,3

Catarina Fiúsa 1

Joana Monteiro 1,4

Patrícia Silva 1,5

Carla Faria 1,6

Alice Bastos 1,6

1 Escola Superior de Educação, Instituto Politécnico de Viana do Castelo silvafilipa@ese.ipvc.pt afiusa@ese.ipvc.pt

2 Centro de Administração e Políticas Públicas, Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa raquelg@ese.ipvc.pt

3 CEMRI - Centro de Estudos das Migrações e das Relações Interculturais augusta.manso@ese.ipvc.pt

4 Centro de Psicologia da Universidade do Porto, Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto monteirojoana@ese.ipvc.pt

5 Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade, Universidade do Minho pmariasilva@ese.ipvc.pt

6 AgeingC CINTESIS cfaria@ese.ipvc.pt abastos@ese.ipvc.pt

Os modelos de aprendizagem centrados no estudante, como é o caso do Project Based Learning (PjBL), têm demonstrado grande potencial. Para além de terem oportunidade de contactar com desafios relacionados com a prática profissional e procurar resolver situações-problema identificados ativando conhecimentos provenientes de várias unidades curriculares (UC), os estudantes podem desenvolver uma série de competências, nomeadamente liderança, relação interpessoal, colaboração, comunicação, criatividade, entre outras. Há, por isso, um reforço da relação entre docentes e estudantes, maior envolvimento e motivação, bem como maior articulação entre a teoria e a prática, dado que o PjBL permite uma aproximação ao contexto real de trabalho e o “aprender, fazendo” (learning by doing) defendido por Dewey. Assim, o presente trabalho tem como finalidade divulgar a utilização desta metodologia na UC de Iniciação à Prática Profissional III da licenciatura de Educação Social Gerontológica do Instituto Politécnico de Viana do Castelo, no ano letivo 2021/2022. O trabalho desenvolvido implicou o desenho e implementação de uma ação de intervenção no âmbito da Gerontologia, tendo envolvido dois docentes e 32 estudantes. Esta experiência pedagógica foi avaliada por 27 estudantes, maioritariamente do género feminino (92,6%) e com idades compreendidas entre os 19 e os 39 anos (M=21,88; dp=4,25) através de um questionário. Os resultados sugerem que o recurso ao PjBL contribuiu para a procura de soluções criativas para problemas reais, aumentou a motivação e potenciou a articulação entre teoria e prática, representando, por isso, uma mais-valia para a aprendizagem e a intervenção gerontológica.

Palavras-Chave: Project Based Learning, Metodologias ativas de ensino-aprendizagem, Intervenção Gerontológica.

1. Contextualização

As instituições de ensino superior têm vindo progressivamente a potenciar junto dos estudantes, quer o desenvolvimento de hard skills, isto é, conhecimento e competências técnicas associadas à área científica de formação (Vogler et al., 2018), quer o desenvolvimento de competências transversais (soft skills), tais como resolução de problemas e trabalho de equipa. Esta abordagem decorre do avanço do conhecimento que tem deixado claro que os modelos de ensino-aprendizagem (E-A) que têm associadas estratégias em que os docentes expõem os conteúdos programáticos e os estudantes assumem uma postura passiva (Alorda et al., 2011) podem ser melhorados através da criação de condições para que estes desenvolvam de uma forma mais ativa as suas competências. Assim, para além do reforço de oportunidades de desenvolvimento de competências de investigação, tem sido promovido um contexto potenciador de competências técnicas/profissionais e competências transversais/soft skills, onde os estudantes possam participar na resolução de problemas reais e na construção do conhecimento a partir de contextos profissionais autênticos. Neste sentido, as abordagens tradicionais têm vindo a ser substituídas por modelos centrados no estudante que promovem uma aprendizagem ativa, como é o caso do Project Based Learning (PjBL). O conceito de ‘Projeto’ não é recente, (Helle et al., 2006) identificam um conjunto de características do PjBL, de entre as quais se destacam: (1) capacidade de iniciativa por parte do estudante, (2) tarefas próximas da realidade profissional, (3) obtenção de um produto final (e.g., relatório, protótipo, ação) e (4) papel dos professores como facilitadores do processo de E-A. Segundo (Helle et al., 2006), a investigação demonstra de forma clara as potencialidades desta estratégia pedagógica, evidenciando-se a proximidade na relação entre docente e estudante, maior envolvimento e motivação dos estudantes e articulação teoria-prática, pois o PjBL é geralmente suportado pelo conhecimento adquirido em outras unidades curriculares (UC), a aproximação ao contexto real de trabalho e o “aprender, fazendo” (learning by doing) defendido por Dewey. É neste contexto que se apresenta de seguida a descrição da prática pedagógica associada ao processo de E-A com recurso à metodologia PjBL levada a cabo numa UC da licenciatura de Educação Social Gerontológica (ESG) da Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Viana do Castelo.

2. Descrição da prática pedagógica

2.1. Objetivos e público-alvo

O recurso à metodologia PjBL inscreveu-se numa UC do 2º ano da licenciatura de ESG, designada de “Iniciação à Prática Profissional III”, que tem como finalidade dotar os estudantes de competências nucleares em termos de avaliação e intervenção no âmbito do envelhecimento, numa perspetiva social e comunitária, baseada em modelos colaborativos. Assim, a implementação da prática pedagógica pretendeu contribuir para mais conhecimento e competências técnicas no domínio da gerontologia, bem como para o desenvolvimento de soft skills. Teve como público-alvo um grupo de 32 estudantes, sendo que 27 destes responderam ao questionário de avaliação. Este último grupo era maioritariamente constituído por elementos do sexo feminino (92,6%), com idade média de 21,88 anos (dp= 4,25), variando dos 19 aos 39 anos.

2.2. Metodologia

O PjBL, sendo um método sistemático de E-A que envolve os estudantes em tarefas complexas e reais, potencia o desenvolvimento de um produto e permite-lhes adquirir conhecimentos e competências (Barron & Darling-Hammond, 2008). Tendo como tema a Década do Envelhecimento Saudável proposta recentemente pela Organização Mundial de Saúde (2020), foi sugerido aos estudantes o desenvolvimento de uma ação de intervenção de base comunitária no âmbito da Gerontologia tomando como referência os seguintes objetivos: (1) aplicar um conjunto de procedimentos técnicos relativos à avaliação gerontológica; (2) caraterizar, numa perspetiva multidimensional, pessoas e comunidades; (3) analisar a informação recolhida na avaliação gerontológica com vista à identificação de necessidades, situações e/ou problemas individuais ou coletivos para (4) planear e implementar uma ação de intervenção em contexto de prática supervisionada; e (5) monitorizar o processo de intervenção. Este processo decorreu num ambiente colaborativo, onde os professores assumiam o papel de facilitadores, quer apoiando os grupos em termos dos recursos necessários para executar a tarefa, quer monitorizando a execução da ação. Assim, este modelo pedagógico foi desenvolvido por dois docentes junto de 32 estudantes, organizados em 9 grupos de trabalho, ao longo de um semestre.

2.3. Avaliação

No programa da UC estabelece-se como elementos de avaliação: (1) atitude e ética profissional; (2) elaboração de relatórios técnicos; e (3) apresentação e discussão oral do trabalho de campo. No final da UC, os estudantes tiveram ainda a oportunidade de apresentar o trabalho desenvolvido sob o formato de poster científico. No sentido de avaliar a implementação desta prática pedagógica, recorreu-se a um questionário on-line elaborado para o efeito e composto por questões abertas e fechadas (cuja escala de resposta estava organizada numa escala de Likert de 5 pontos, 1=Discordo totalmente e 5=Concordo totalmente) acerca dos conhecimentos e competências desenvolvidas, apreciação do uso da metodologia PjBL, avaliação do papel do professor/facilitador, autoavaliação do desempenho no grupo, bem como identificação de aspetos positivos, negativos e sugestões de melhoria relativamente à organização e funcionamento da UC. Na análise da informação recolhida foi usada estatística descritiva com recurso ao software IBM SPSS - versão 28, tendo as questões abertas sido analisadas de forma qualitativa.

3. Resultados, implicações e recomendações

Tendo em conta os resultados obtidos sobre o impacto da utilização da metodologia PjBL na organização e funcionamento da UC (Tabela 1) os estudantes consideram que esta abordagem contribuiu para a procura de soluções criativas para problemas reais (M=4,30; dp=,775) e para uma melhor articulação entre teoria e prática na resolução de problemas (M=4,37; dp=,792).

Tabela 1 do uso da metodologia PjBL

Os estudantes consideram que a utilização da metodologia PjBL contribuiu para o desenvolvimento de várias aprendizagens e competências (Tabela 2), sobretudo responsabilidade (M=4,44; dp=,801), tomada de decisão (M=4,41; dp=,797) e autonomia (M=4,37; dp=,792). Tabela e competências desenvolvidas

Relativamente ao papel dos professores/facilitadores (Tabela 3), os estudantes fazem uma apreciação muito positiva. Os resultados sugerem que os docentes foram capazes de centrar a aprendizagem no estudante e apoiar o desenvolvimento da sua autonomia (M=4,52; dp=,753), proporcionar feedback regular e útil (M=4,52; dp=,700) e promover o envolvimento e a participação ativa nas atividades (M=4,48; dp=,700).

No que diz respeito à avaliação do papel do estudante, os participantes fazem uma avaliação positiva do seu desempenho no grupo, conforme se pode observar nos extratos seguintes: “Foi bom, participei no grupo e conseguimos obter todos os nossos objetivos! Foi uma boa experiência e aprendemos muito com o projeto!” (P02); “Sinto que o meu desempenho foi bom, já que alcancei os objetivos pretendidos, assim como o resto do meu grupo.” (P19)

Da informação recolhida através das questões abertas, é de referir que a totalidade dos estudantes fez uma avaliação criteriosa dos seus pontos fortes e áreas a melhorar. Relativamente aos primeiros, apontam para uma elevada capacidade de trabalho em equipa e, no que diz respeito aos aspetos a melhorar, destacam competências relacionadas com escrita científica e com a fundamentação (teórica e técnica da ação). Por fim, relativamente à organização e funcionamento da UC, são destacados como aspetos positivos o facto de se tratar de uma UC com carácter prático que potenciou a aprendizagem em situação de vida real, bem como a interação com pessoas mais velhas e stakeholders da comunidade.

4. Conclusões

A abordagem PjBL considera que a aprendizagem é potenciada quando o estudante sente que “precisa de saber” (Lenz, Wells, & Kingston, 2015, p. 68). Organizada em função de um Projeto, cria oportunidades para ativar aprendizagens desenvolvidas em várias UC do plano de estudos, discutir diversas abordagens em grupo e apresentar o seu trabalho (Johnson et al., 2013). No presente estudo, evidencia-se que a metodologia PjBL potenciou, na ótica dos estudantes, o desenvolvimento de diversas competências (hard e soft skils). Importa realçar que esta metodologia contribuiu para o maior envolvimento e motivação, constituindo, também, uma oportunidade de aproximação entre a teoria e a prática, tal como evidenciado por Helle et al. (2006). Para além disso, foi possível verificar o desenvolvimento de competências técnicas no âmbito da avaliação e intervenção gerontológica, potenciadas pelo modelo de trabalho colaborativo inerente ao PjBL. O trabalho apresenta, no entanto, algumas limitações, nomeadamente o facto de a prática pedagógica PjBL ter sido restrita a uma UC semestral. No futuro, recomenda-se a prossecução do trabalho desenvolvido com a extensão do Projeto a UC de natureza similar. Será também pertinente avaliar de uma forma mais sistemática o desenvolvimento de competências metacognitivas, nomeadamente a capacidade de autorregulação e pensamento crítico, bem como os efeitos em termos do desempenho académico dos estudantes, uma vez que a literatura sugere efeitos positivos nestas duas dimensões (Panasan & Nuangchalerm, 2010). Apesar desta limitação, considera-se que o presente trabalho contribui para o avanço do conhecimento sobre a utilidade pedagógica de abordagens PjBL no âmbito das Ciências Sociais e do Comportamento e, em particular, da Gerontologia.

5. Referências Bibliográficas

Alorda, B., Suenaga, K., & Pons, P. (2011). Design and evaluation of a microprocessor course combining three cooperative methods: SDLA, PjBL and CnBL. Computers & Education, 57, 1876-1884. https://doi.org.10.1016/j.compedu.2011.04.004

Barron, B., & Darling-Hammond, L. (2008). How can we teach for meaningful learning? In L. DarlingHammond (Ed.), Powerful learning: What we know about teaching for understanding (pp. 1170). Jossey-Bass.

Helle, L., Tynjälä, P., & Olkinuora, E. (2006). Project-based learning in post-secondary education: Theory, practice and rubber sling shots. Higher Education, 51(2), 287-314. https://doi. org/10.1007/s10734-004- 6386-5

Johnson, D. R., Renzulli, L., Bunch, J., & Paino, M. (2013). Everyday observations developing a sociological perspective through a portfolio term project. Teaching Sociology, 41(3). https://doi. org.10.1177/0092055X13480642

Lenz, B., Wells, J., & Kingston, S. (2015). Transforming schools using project-based learning, performance assessment, and common core standards. Jossey-Bass.

Panasan, M., & Nuangchalerm, P. (2010). Learning outcomes of project-based and inquiry-based learning activities. Journal of Social Sciences, 6(2), 252-255. https://files.eric.ed.gov/fulltext/ ED509723.pdf

Vogler, J. S., Thompson, P., Davis, D., Mayfield, B., Finley, P., & Yasseri, D. (2018). The hardwork of soft skills: Augmenting the project-based learning experience with interdisciplinary teamwork. Instructional Science, 46(3), 457-488. https://doi.org.10.1007/s11251-017-9438-9

World Health Organization. (2020). Decade of healthy ageing: Baseline report https://www.who.int/ publications/i/item/9789240017900

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