Fisiopatologia da Nutrição e Dietoterapia | Carla Rosa / Helen Hermsdorff

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Co p y r i g h t©2021Ed i t o r aRu b i oL t d a .Ro s a / He r ms d o r f f .F i s i o p a t o l o g i ad aNu t r i ç ã oeDi e t o t e r a p i a .Al g u ma sp á g i n a s ,n ã os e q u e n c i a i s ,ee mb a i x ar e s o l u ç ã o .

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Fisiopatologia da Nutrição e Dietoterapia

A proporção do sexo feminino para masculino é variada, com a classificação dos estudos populacionais prospectivos de 1:3 a 1,5:1.5 A doença celíaca é agora conhecida por afetar todos os grupos etários, incluindo os idosos; mais de 70% dos novos pacientes são diagnosticados com idade acima de 20 anos.14 Os familiares de primeiro grau de pacientes celíacos compartilham fatores de risco genéticos e ambientais para doença celíaca; portanto, são os indivíduos mais suscetíveis a desenvolver essa doença. Neles, a frequência de doença celíaca é de 10 a 20 vezes maior que a da população geral.15,16 O risco é maior também em indivíduos com diabetes melito tipo 1 (DM1), doenças autoimunes, síndrome de Down e outros distúrbios asso­ciados.17

XXFisiopatologia A doença celíaca constitui-se em uma enfermidade multifatorial, envolvendo tanto componentes genéticos quanto ambientais na sua etiopatogenia. Logo, a interação desses fatores elucida o amplo espectro de alterações histológicas, sorológicas e clínicas observado nos diferentes estágios da doença.11,18 O glúten é o fator ambiental que desencadeia a doença celíaca. Alguns aspectos da ingestão do glúten podem influenciar o risco de ocorrência da doença celíaca, como a quantidade de glúten ingerida (quanto maior a quantidade, maior é o risco), a qualidade de glúten consumida (alguns grãos contêm epítopos mais tóxicos do que outros) e o padrão alimentar da criança.19 Embora a doença celíaca tenha consequências em vários órgãos, o local de maior impacto é o intestino delgado proximal, que é onde o glúten da dieta encontra pela primeira vez a mucosa do sistema imunológico.7 O epitélio intestinal é formado por uma camada de células colunares que separa o lúmen intestinal da lâmina própria subjacente. Essas células estão interligadas por complexos juncionais, também denominados tight junctions (TJ), que regulam a permeabilidade paracelular. Estas exercem a função de permitir a absorção de nutrientes e atuar como uma barreira imunológica, com a intenção de impedir a entrada de antígenos na mucosa intestinal. Em um intestino saudável, as TJ apresentam-se apertadas e intactas, funcionando como a principal barreira para a passagem de macromoléculas.19

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Na doença celíaca, a permeabilidade paracelular está aumentada e a integridade das TJ está comprometida. A regulação positiva da zonulina, um peptídio intestinal envolvido na regulação das TJ, parece ser responsável, pelo menos em parte, pelo aumento da permeabilidade do intestino característico de doença celíaca.20 As funções da zonulina ainda não estão bem esclarecidas; contudo, ela parece estar envolvida na modulação das TJ para a passagem dos fluidos, macromoléculas e leucócitos entre a corrente sanguínea e o lúmen intestinal e vice-versa, bem como na proteção contra a colonização de microrganismos patogênicos.19 O glúten é um dos potentes estímulos que pode provocar a liberação da zonulina no lúmen intestinal. Atualmente, sabe-se que a gliadina inicia o dano à mucosa intestinal envolvendo todo o processo imunológico em indivíduos geneticamente suscetíveis.21-23 Estudos levaram à identificação do receptor de quimiocina CXCR3 como um receptor intestinal alvo da gliadina. Portanto, a gliadina liga-se ao receptor CXCR3, induzindo a liberação da zonulina dependente de MyD88, o que leva ao aumento da permeabilidade intestinal a macromoléculas.24 Em relação aos fatores genéticos, praticamente todos os pacientes com doença celíaca apresentam alterações nos genes HLA da classe II (HLADQ2 e HLA-DQ8). Estas moléculas são expressas em células apresentadoras de antígenos, principalmente macrófagos, células dendríticas e células B. Dessa maneira, peptídios do glúten são apresentados por moléculas HLA da classe II e este evento leva à ativação de linfócitos T CD4 T-helper 1 (Th1), que são células efetoras com papel central na inflamação intestinal, resultando em hiperplasia das criptas e atrofia de vilosidades.11,25 No entanto, alterações nos genes HLA-DQ2 e HLA-DQ8 são expressas em 30% a 35% das populações em que a doença celíaca é predominante e apenas 2% a 5% dos portadores dessa alteração genética desenvolvem doença celíaca. Isso implica outras síndromes genéticas, bem como fatores ambientais como contribuintes para a manifestação da doença celíaca.26,27 Estudos genéticos desenvolvidos em grande número de pacientes com doença celíaca, familiares e controles pareados revelaram fatores de risco adicionais, a maioria dos quais não relacionados com a regulação das células T e inflamação. No entanto, a contribuição global desses polimorfismos genéticos foi estimada em apenas 3% a 4%

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