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Luz acesa ou apagada? por Mariana El-Fazary
by eba_pucpr
Luz acesa ou apagada?
Para algumas pessoas, é na hora de dormir que a criatividade surge. Já para outras, eliminar algumas horinhas de sono diariamente faz parte da rotina.
Atividades noturnas
Ler tarde da noite torna-se uma escolha quando não se .tem tempo durante o dia

Segundo a psicóloga Guisela Schmidt, o relógio biológico é ativado principalmente pela luz. “Há nos notívagos, por genética, meio ambiente, estilo de vida, personalidade e idade, uma combinação que o leva a ter seu relógio biológico atrasado em até seis horas”, esclarece. Com relação à criatividade, a psicóloga fala que ela depende do organismo estar livre e aberto, deixando fluir sua intuição e os seus processos internos.

“Se eu fosse escrever um livro, por exemplo, com certeza o faria nas madrugadas, pois é a hora do dia em que minha mente ‘flui’”. Essa afirmação da empresária Christiane Beling Victorino Hillesheim, proprietária de uma empresa de festas infantis, define bem como ela se sente à noite. Christiane não se considera uma pessoa produtiva fisicamente nesse período, mas muito mais criativa. Como ela depende da criatividade para vender seus produtos, precisa reinventar algo, das mais variadas formas, todos os dias. A empresária costuma dormir de seis a oito horas por dia e é à noite, com a luz apagada, as crianças dormindo e o silêncio absoluto, que as ideias chegam à sua mente. “Meu marido sempre dorme mais cedo, daí eu começo meus delírios. Na cama planejo toda e qualquer festa que eu venha a fazer nos próximos três ou quatro meses. Às vezes e, não muito raro, eu acordo no meio da noite e perco o sono imaginando alguns projetos, algumas formas, algumas ideias. Mas raramente me levanto para fazer alguma anotação. Quando isso acontece, eu acordo mais cedo, superempolgada para realizar as coisas que planejei durante a madrugada”, conta.
Segundo a profissional, a criatividade noturna é algo que vem dos tempos da escola. Já naquela época, era deitada que as ideias para o outro dia surgiam. No período da faculdade, mais corrido, ela aproveitava a madrugada para ler, fazer trabalhos ou ter alguma “ideia mirabolante”.
Quando pensa demais durante o dia, a analista de suprimentos Lilian Aparecida de Azevedo tem a tendência a não “desligar” tão cedo. Há 10 anos, Lilian tem crises criativas durante o sono. Desde então, acorda no meio da noite para escrever frases ou algo que auxilie em sua vida profissional, seja no bloco de notas do celular ou no de papel, que já fica ao seu lado, no criado mudo.
Ela relata que um dos casos mais curiosos aconteceu há pouco tempo. “Tive um problema seríssimo na empresa, há semanas não conseguia detectá-lo, inclusive chegava a sonhar com as ações que estava realizando, mas não chegava a lugar algum, eram apenas alucinações. Então decidi relaxar um pouco e saí numa sexta-feira com alguns amigos para um happy hour. Nos divertimos, dançamos, bebemos e cheguei em casa super cansada. No final das contas, acordei no outro dia com a solução escrita em palavras chaves, num papel ao lado do criado mudo”.
A médica Danielle Malaquias, otorrinolaringologista especialista em medicina do sono, explica que é dormindo que fixamos as informações que captamos do mundo durante o dia e, armazenamos essas informações nos locais cerebrais apropriados, podendo até mesmo resolver problemas. “Assim podemos dormir com um problema e acordar no outro dia com a solução”, explica. Exatamente o que aconteceu com Lilian.
Felipe Matheus Stresser, jornalista, fotógrafo e editor de vídeos freelancer, acredita que o período da noite é mais tranquilo. “Não tem ninguém chamando no Facebook, mandando
Mariana Fazary
Relógio biológico
Combinação de fatores pode levar a um atraso de até seis horas em algumas pessoas.


Se eu fosse escrever um livro, por exemplo, com certeza o faria nas madrugadas pois é a hora do dia em que minha mente ‘flui’. Christiane Beling Victorino Hillesheim, empresária.

e-mail, ligando no celular, fazendo barulho. Tudo contribuiu para uma concentração maior”, confidencia. Por isso, ele costuma editar seus vídeos à noite, quando sua produção fica melhor.
Hoje em dia é comum ver pessoas de sucesso como médicos, empresários e artistas, dando declarações de que dormem poucas horas de sono por noite. Segundo a psicóloga Guisela Schmidt, cada vez mais as pessoas abdicam de algumas horas de sono para realizarem aquilo com o qual se comprometem. E muitos podem sim, se influenciar por meio desse tipo de declaração, porque veem como modelo aquele que tem mais sucesso, às vezes até sentindo-se mal por não poderem acompanhar tal desempenho. “Inclusive, no mundo corporativo, as pessoas gabam-se das tantas horas vividas nisso ou naquilo e das poucas horas de sono”, conta.
Stresser fala que essa rotina noturna começou ainda na época da faculdade, quando dividia a casa com outras pessoas e só tinha internet discada para fazer trabalhos. Quando todos iam dormir e liberavam a linha do telefone, ele entrava em ação. Atualmente, o profissional diz que não tem uma rotina definida e, uma vez que começa um trabalho vai até o fim, para acabar o quanto antes.
Segundo a médica Danielle Malaquias, a quantidade de sono ideal por dia varia de pessoa para pessoa, podendo ser de 6 a 10 horas, em média. Para a psicóloga Guisela, é preciso que se tenha uma organização diária, para que não haja a necessidade de se sacrificar horas de sono para o cumprimento de atividades. É preciso fazer render tanto o dia quanto a noite, de forma a respeitar o ritmo biológico de cada pessoa.
Mariana D’Alberto El-Fazary
Uma vida sem teto
O drama de quem vive e sobrevive nas ruas de Curitiba

Já passa das dez da noite. É quintafeira e as luzes da Praça Rui Barbosa, uma das mais conhecidas de Curitiba, iluminam os passos das poucas pessoas que passam por ali. O frio faz com que os cães que vivem no local se escondam entre as folhas das árvores que se acumulam no chão. Junto às mesmas folhas, também tentando fugir das baixas temperaturas da noite, José Aparecido Waleski se abriga. Com 43 anos de idade, ele já vive há 12 nas ruas da capital paranaense. Moreno, com barba comprida e mal feita, olhos cansados e o cabelo grisalho, ele conta recortes de sua vida, deitado embaixo de uma árvore centenária, fazendo carinho em Lupe, seu companheiro canino. O simpático senhor poderia ser poeta, ou melhor, é um poeta ainda não descoberto.
“É engraçado, sabe? Eu estou aqui, deitado, olhando as estrelas e vendo as pessoas passarem de lá pra cá o tempo todo e fico me perguntando: Como deve ser a vida daquela pessoa? Quem será que ela é? O que faz? E, ao mesmo tempo, você se senta aqui e quer saber como é minha vida, quem eu sou, o que eu faço. A vida é engraçada. As pessoas sequer imaginam quem nós somos e o que vemos e vivemos”, diz ele, se referindo aos moradores de rua. A infância do “Seu Jô”, como prefere ser chamado, não foi fácil. Filhos de pais poloneses que chegaram ao Brasil durante a Segunda Guerra Mundial passou a infância numa cidade do interior do estado de São Paulo, que ele não lembra o nome. Seus pais trabalhavam em uma lavoura de café e logo cedo, ainda com 12 anos, José já era responsável por cuidar dos dois irmãos mais novos: João Fernando Waleski, que na época tinha 10 anos e Josenildo Waleski, de 7. Ao lembrar-se dos irmãos, as memórias apagadas pelo tempo tomam vida. “Eu me lembro pouco, não sei por quê. O João morreu quando eu tinha uns 15 anos. Ele ficou doente e naquela época não tinha hospitais, vacinas e o sítio em que morávamos era longe da cidade. Aí ele morreu. Mas já faz tempo. Sinto saudades, mas já faz muito tempo”.
Em 1988, quando o José completou 18 anos, seu pai conseguiu um emprego com um amigo polonês, que acabara de chegar ao Brasil. A família veio para Curitiba em busca de melhores condições de vida. Eram pai, mãe e dois filhos, que só tinham estudado até o 6º ano do ensino fundamental. O pai de Seu Jô passou a trabalhar como garçom e a mãe preparava petiscos em um bar da Cidade Industrial. Seu irmão mais novo, Josenildo, conseguiu um emprego como auxiliar de pedreiro e Seu Jô começou a trabalhar entregando roupas com ajuda de uma bicicleta amarela. “Era tudo muito novo, sabe? Foi uma época boa, mas eu não gosto de lembrar muito não. Você me desculpe, mas é que a lembrança dos meus pais é muito presente. Sinto vergonha, saudades. Me desculpe mesmo” diz, chorando.
Depois de dois anos na capital, trabalhando na área da construção civil, seu irmão mais novo, Josenildo con-
