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Ser ou não ser curitibano?
by eba_pucpr
Ser ou não ser curitibano? Eis a questão
Morar na Região Metropolitana algumas vezes exige mais do que a necessidade de deslocamento para a capital, mas também a aceitação da identidade de morador suburbano
Geane Godois
Curitiba tem facetas que chamam a atenção. Para alguns, ela é a capital mais fria do Brasil. Para outros, é a cidade-modelo em transporte público (mesmo que quem dele usufrua no dia a dia negue isso) e em iniciativas ecologicamente elogiáveis. Há quem diga que sua gente é discreta e até fechada, mas para muitos, o rótulo de “Cidade Sorriso” faz mais sentido. Porém, o peso maior sempre será o de ser a capital do Paraná.
Atualmente, a cidade possui mais de 1,8 milhões de habitantes, de acordo com o último levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Contudo, outro dado também aponta que, diariamente, mais de 340 mil moradores de 18 municípios da Região Metropolitana de Curitiba (RMC) vão trabalhar e/ou estudar na capital.
A condição de ser morador “suburbano”, no entanto, às vezes é motivo de negação e até mesmo de vergonha, sobretudo entre os jovens. Os motivos são variados, como explica Anderson Cirino, de 14 anos, natural e residente em Pinhais. “Para mim, não sou pinhaense e, sim, curitibano. Aqui é pequeno e faço praticamente tudo lá (na capital). Então, qual a serventia de se morar aqui? Por enquanto, fico aqui com a família, mas no futuro gostaria de me mudar”, comenta.
Para moradores mais antigos, no entanto, tal questão chega a ser irrelevante e até engraçada. As contradições de opiniões se fazem presentes dentro da mesma família, com experiências distintas de duas gerações. Jair Cirino, de 56 anos, é pai de Anderson e mora em Pinhais antes mesmo de ela ser emancipada de Piraquara, há recém-completados 23 anos. Ele vê as atitudes do filho como preconceituosas. “Fazemos a maioria das coisas em Curitiba sim, mas nem por isso precisamos renegar onde moramos. Aqui tem tudo o que tem lá, só que em menores proporções. Ser nascido ou morador de uma capital não faz alguém melhor que os demais por causa disso. É só um rótulo”, enfatiza.
As divergências são contínuas e conflitantes no que diz respeito à construção da identidade pessoal dos indivíduos. Segundo José Carlos Fernandes, jornalista e consultor do Conselho Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico
do Paraná, tal situação é compreensível e até justificável. “O orgulho e o desejo de sair, permita-me, podem ser sintomas da mesma frustração, mas manifestada em sentidos diferentes. Em tempo, lembremos que a expressão subúrbio não é negativa nos países desenvolvidos – ao contrário, é o lugar do exílio urbano, para onde muitos mudam para criar filhos, etc.”, explica.
Mas há quem não encare a denominação de suburbano como algo negativo. Luana Hrycyna tem 20 anos, estuda em Curitiba e, desde que nasceu, mora em Araucária, uma das localidades que mais possui deslocamento para a capital paranaense todos os dias. Segundo ela, apesar de algumas desvantagens existentes na RMC, como o fato de não possuir mais que uma faculdade, por exemplo, residir no subúrbio não é um problema. “Ter vergonha da sua cidade é quase como ter vergonha de seus pais. Isso não é um defeito ou motivo para se envergonhar. Tenho muito orgulho da cidade onde nasci e não escondo isso de ninguém”, afirma.
Em geral, as localidades entorno de capitais são menores e concentram menos polos de empregos e estudantis, sendo muitas vezes resumem-se a comércios e instituições de ensino básico (fundamental e médio) e, quando há a disponibilidade de cursos superiores, comumente são limitadas a áreas como engenharias, administração de empresas ou biomedicina. “As opções são bem restritas também no que diz respeito ao lazer e em variedades de lojas mais especializadas. Porém, a vantagem é que acaba sendo um lugar mais tranquilo, apesar de Araucária, assim como as demais cidades da RMC, estar crescendo visivelmente”, completa Luana. Fernandes pondera que é preciso observar as cidades ao entorno da capital com mais atenção e deixar-se influenciar menos pelo preconceito. “Penso que conhecemos pouco as cidades vizinhas, julgando-as, do mesmo jeito que fazemos com as favelas, lugares iguais, cidades dormitórios sem vida própria ou coisa assim”, comenta. Além do mais, a Região Metropolitana está em constante crescimento, tanto quanto Curitiba. É preciso reconhecer as singularidades de cada localidade, para que então, cada qual faça parte de um conjunto regional e não como excludentes uma da outra. “Fazenda Rio Grande é uma cidade emergente. São José dos Pinhais é um dos municípios mais diversos e estimulantes do país. Campo Largo, uma pequena Curitiba. Almirante Tamandaré tem aspectos culturais que extrapolam a ideia de uma periferia violenta. E o que dizer de Araucária, que teve um dos melhores ensinos básicos do país. Em resumo, elas têm identidade, nós é que não percebemos nem investigamos esses territórios”, conclui o consultor.

Com 125 anos, Araucária é um dos exemplos de cidade que tem relação direta com a capital.