Narrativas maternas na universidade: relatos das mães do CAC - UFPE

Narrativas maternas na universidade: relatos das mães do CAC - UFPE Marília Felix de Carvalho

UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO (UFPE) PRÓ-REITORIA DE EXTENSÃO E CULTURA- UFPE BOLSAS DE INCENTIVO À CRIAÇÃO CULTURAL (BICC)

Narrativas maternas na universidade: Relatos das Mães do Centro de Artes e Comunicação da Universidade Federal de Pernambuco

Bolsista BICC: Marília Felix de Carvalho Coordenadora pedagógica: Profa. Dra. Maria Collier de Mendonça Recife-PE, 2022

AGRADECIMENTOS

Quando a ideia para realizar este e-book surgiu, eu não imaginava que fosse ser tão impactada pelos relatos.

Mesmo que saibamos das dificuldades enfrentadas pelas mães, nada se compara a quando escutamos a história de vida de cada uma delas.

São esses momentos que nos fazem querer realizar trabalhos que possam exercer alguma mudança na realidade dessas mulheres. Ainda que qualquer iniciativa seja pequena comparada às inúmeras dificuldades enfrentadas, não deixa de ser um passo rumo a um futuro melhor. É com essa visão que lançamos o e-book, como um grãozinho de areia, mas que deixa a praia menos pesada. Antes disso, preciso agradecer aos que me ajudaram nessa construção.

Primeiramente, agradeço a Deus por me sustentar e me guiar quando tudo parecia difícil. Aos meus pais, pela força de sempre e compreensão nas horas de cansaço. À minha coordenadora, professora Maria Collier, pelas instruções primordiais e pelo apoio realizado nesses meses. Agradeço também à ProExc pela concessão da bolsa e pela aprovação do projeto.

Por fim, meu agradecimento especial vai para as nove mães que estão nesse e-book e àquelas que se inscreveram, mas que não puderam participar. E uma lembrança fraterna a todas as mães do mundo.

ÍNDICE

Apresentação

04

Capítulo 01

05

Capítulo 02

11

Capítulo 03

17

Capítulo 04

23

Capítulo 05

28

Capítulo 06

33

Capítulo 07

38

Capítulo 08

43

Capítulo 09

48

Considerações

54

finais

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APRESENTAÇÃO De acordo com o Instituto Semesp, em 2020, as mulheres representavam 57% do corpo discente das universidades brasileiras. E, segundo o informativo do Parent in Science, de 2021, sobre mulheres e maternidade no ensino superior brasileiro, 1 em cada 10 estudantes de graduação no ensino superior federal brasileiro possui filhos (sendo homens e mulheres).

Dessa forma, os pais precisam conciliar a criação dos filhos, o estudo, os afazeres domiciliares e, muitas vezes, o trabalho. Ao considerar a vivência numa sociedade patriarcal, todo esse esforço se torna ainda mais difícil para as mulheres.

Em especial, as mães solo representam parte significativa dessa população. De acordo com o IBGE (2014), 15,3% dos arranjos familiares no Brasil são compostos por mães solo.

Sendo assim, é importante compreender quem são as mães inseridas no espaço universitário, como também quais são os desafios enfrentados para elas permanecerem nesses locais. E, espera-se, que ações efetivas sejam tomadas para fomentar a inserção, permanência e progresso dessas mulheres na Academia.

Referência bibliográfica: PARENT IN SCIENCE. Mulheres e maternidade no ensino superior no Brasil. Informativo Parent in Science, mar. 2021. Disponível em: https://www.parentinscience.com/documentos. Acesso em: 29 abr 2022

CAPÍTULO 1

Permanência ameaçada

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CAPÍTULO 1 Permanência ameaçada Jordana da Costa é aluna do 6º período de Biblioteconomia e mãe de um filho de 1 ano e 4 meses. Equilibrando-se como uma balança, ela tem de conciliar os estudos com a maternagem e os afazeres domésticos, vivendo numa família de 5 pessoas. Além disso, precisa lidar com a pressão social e a insatisfação consigo mesma por não ter uma renda própria. Angustiada com os rumos do ensino, ela afirmou que não gostaria nem de pensar em como seria o retorno às aulas presenciais. O seu depoimento reflete o cotidiano de muitas mulheres que tentam permanecer em espaços, na verdade, excludentes para as realidades maternas delas.

Quando engravidou, Jordana não sabia que o mundo passaria por uma pandemia. Logo nos primeiros meses da gestação, as aulas foram suspensas e ela teve de permanecer em casa.

A gravidez, que antes já imaginava ser complicada por causa do deslocamento que precisaria fazer de Igarassu - cidade em que reside - até a UFPE, se transformou num momento tranquilo de espera.

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Como você não consegue comprar nem o leite para seu próprio filho?

Você que fez, você que cuide!

Nos próximos meses, tudo mudou com o nascimento do seu filho. Henry nasceu em meio à pandemia no período do ensino remoto emergencial. As aulas, que precisavam ser online, ganharam um novo aluno que clamava pela atenção da mãe a todo tempo.

Assim, o aprendizado ficou comprometido não só em função do ambiente doméstico, mas também devido aos cuidados com o filho. O computador quebrou e as aulas passaram a ser assistidas pelo celular, cuja bateria não funcionava direito.

08 O resultado se refletiu na queda do rendimento escolar. No entanto, as dificuldades para ela se desenvolver academicamente não ocorrem simplesmente pelo fato de ser mãe. Ainda que o pai da criança e mais 4 pessoas, residentes em sua casa, auxiliem nos cuidados do filho, Jordana se sente sozinha no ambiente acadêmico.

Ela sente falta de uma rede de apoio e de um olhar diferenciado da Universidade para a compreensão das necessidades das alunas mães. Os apoios que recebeu em nível acadêmico foram restritos às iniciativas individuais. É aquele professor que entendeu quando ela precisou de um prazo maior para a entrega do trabalho. É o grupo que compreendeu quando ela não pôde participar da atividade. É a falta de censura de colegas quando o seu filho aparece durante as aulas. Todas essas situações envolveram um entendimento pessoal.

Mesmo que fossem essenciais na trajetória de Jordana para permanecer no curso, as iniciativas desse nível são insuficientes para um aprendizado completo e garantia da sua permanência no ambiente universitário.

Além das dificuldades estudantis, ela ainda precisa lidar com a pressão social de não ter uma renda própria.

O pai do seu filho está desempregado e lhe ajuda financeiramente como pode. O fato de não poder comprar apenas o leite da criança a corrói por dentro e é um dos questionamentos que mais escuta dos outros.

“Você que fez, você que cuide” se transforma de uma simples frase numa sentença recorrente em todos seus dias.

Sem condições financeiras e também sem uma rede de apoio para deixar o filho enquanto ela retorna às aulas presenciais, a permanência de Jordana Biblioteconomia difícil.

no fica

curso de ainda mais

"O fato de ainda não sustentar o meu filho me incomoda muito."

09

Em virtude disso, ela continua procurando empregos em áreas bem diferentes da sua futura formação.

Como não tem poder de escolha, se o desejado emprego aparecer, o trancamento do curso será obrigatório em sua vida.

"Ou o emprego ou a faculdade!"

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CAPÍTULO 2

Uma mãe polvo

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CAPÍTULO 2 Uma mãe polvo Estudante de graduação, professora em tempo integral, mãe de um filho de 3 anos e dona de casa: Débora Nobre é tudo isso. No 8º período do curso de Letras, o horário noturno das suas aulas é o mesmo em que precisa cuidar do filho e das atividades domésticas quando chega da escola. No modelo remoto de ensino, as aulas viram podcasts. Então, a volta ao presencial soa tão complicado para inserir na sua rotina que ela até tentou mudar de universidade. As incertezas do futuro são muitas, mas Débora tem a perseverança de não abrir mão dos seus sonhos.

Quando descobriu que estava grávida, Débora cursava o 1º período de Letras - Língua Portuguesa. Com uma gestação de risco, que acarretou problemas de saúde, acabou reprovando em todas as disciplinas daquele período. No semestre seguinte, só pagou uma matéria que, para concluí-la, precisou contar com apoio do professor. A sua bolsa estourou no dia da prova final e teve que fazê-la na véspera do Ano Novo.

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Ou eu trancava ou levava ele comigo, e eu optei por levar.

No puerpério, a licença-maternidade não foi suficiente para assegurar o seu rendimento. O tipo de afastamento que recebeu foi só para aulas presenciais e, na época antes da pandemia, ficou em casa recebendo materiais das aulas enviados pelos professores. Quanto aos estudos e aprendizados, precisou se virar para fazê-los solitariamente.

14 No semestre seguinte, precisou retornar às aulas presenciais ainda no período de amamentação. Quando contava com alguém para cuidar do seu filho em casa, ela extraia o leite e deixava para o bebê tomar. Ainda assim, algumas vezes precisou levá-lo à universidade, mesmo com medo de sofrer preconceitos. Quando necessitava amamentar na sala de aula, sentia alguns olhares estranhos da turma. Mas ela afirma, categoricamente, que nunca deixaria o filho passar fome por medo do que as outras pessoas poderiam pensar. Isso sem contar as dificuldades que sentiu no prédio do CAC por não haver um fraldário disponível.

Débora conta que inúmeras vezes juntou duas carteiras e trocou o filho ali mesmo.

Ao voltar ao trabalho numa escola, em 2020, pôde acompanhar um filho mais de perto, porque ele estuda no mesmo local.

Nos dias em que trabalha em período integral, precisa correr para chegar em casa a tempo das aulas da universidade, que são noturnas. Mas, quando chega, ainda precisa conciliar as tarefas domésticas e os cuidados do filho. O resultado é que não consegue acompanhar muitas disciplinas e acaba só escutando as aulas. Quando se apresenta nas turmas, sempre explica que é mãe e que não é possível estar 100% presente.

15 A correria do seu cotidiano a convence de que trabalhos em grupo são piores. Os seus estudos são muitas vezes de madrugada e, para não ter que atrapalhar os colegas, pede aos professores para realizar as atividades individualmente.

Mas não se sente sozinha apenas nos trabalhos da faculdade. Como o marido trabalha arduamente, ele só consegue cuidar do filho à noite ou nos finais de semana.

Assim, sua rede de apoio acaba se restringindo à escola e ao marido quando pode.

"O normal é você ser mãe e abrir mão da sua vida."

16 Nem imagina como vai ser a volta às aulas presenciais.

Carente de um apoio institucional, já cogitou mudar de universidade para permanecer no curso, adotando o formato de ensino remoto.

Sem ter onde deixar o filho nos horários de aulas, sente que vai precisar levá-lo novamente às salas.

Nesse sentido, sua preocupação é muito maior, pois o bebê que levava em 2019 já é uma criança crescida e poderá incomodar outras pessoas.

Débora afirma que um local onde ela pudesse deixar o filho seria essencial para o seu aproveitamento no curso, de maneira que ela pudesse continuar a estudar.

Quando questionada sobre a visão da sociedade em relação à uma mãe universitária, ela disse que isso oscila entre o afago e a tapa.

As mesmas pessoas que a consideram “guerreira” por tentar conciliar tantas tarefas, também a criticam por continuar a estudar. Na hora de ajudar, nem aparecem!

Mas Débora persiste enquanto muito lhe pressionam para desistir. Ela sabe e luta para se sentir uma mulher profissional. E tem certeza que não desistirá dos seus sonhos.

CAPÍTULO 3

A luta pelo sonho

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CAPÍTULO 3 A luta pelo sonho Antonina Emanoela é estudante de graduação em Letras Espanhol. Embora já esteja no 8º período, a conclusão do curso ficou atrasada pelas dificuldades impostas.

Problemas esses não ocasionados pela maternidade de três filhos, mas sim pela falta de apoio que encontra para conciliar as atividades. Ela continua porque o desejo de ter um curso superior é o combustível para vencer os obstáculos.

Quando foi aprovada pela primeira vez na UFPE, a filha do meio de Antonina tinha seis meses. Pela falta de um local para deixar a filha enquanto ela ia às aulas, precisou desistir da vaga. Dois anos depois, decidiu tentar o ENEM de novo já que a filha estava mais crescida. Contudo, no momento da segunda aprovação, descobriu que estava grávida do terceiro filho. E, novamente, não ingressou no curso.

Só conseguiu entrar na graduação quando o caçula atingiu os dois anos. Ainda assim, precisou recorrer à ajuda da vizinha para ficar com o filho na hora que ela saía para a aula.

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As pessoas não entendem que o curso é a realização de um sonho.

Quando o mais velho largava, ele pegava a irmã na escola, o irmão mais novo na vizinha e levava os dois para casa até que o marido dela chegasse do trabalho. Mesmo que as aulas de Antonina começassem às 19h, ela precisava sair de casa às 16h e pegar três ônibus para chegar à UFPE. A sua rede de apoio se restringia ao filho mais velho, ao marido, às escolas das crianças mais novas e à vizinha.

20 Mesmo pequena, essa dinâmica teve uma importância fundamental para que Antonina conseguisse estudar nos primeiros anos. Nos dias que tinha algum imprevisto, no entanto, ela precisava levar uma das crianças à universidade. Geralmente, levava a filha e sempre se sentia acolhida quanto a isso. Os professores e colegas de sala foram extremamente compreensivos nessas ocasiões.

Mas, a nível da instituição, Antonina nunca sentiu alguma atenção. Os apoios foram restritos às pessoas que cruzaram o seu caminho. Devido a um problema da filha, chegou a pedir a ajuda psicológica da universidade, mas o processo foi tão burocrático e difícil que resolveu desistir. Inclusive, foi nesse mesmo período que ela pensou em trancar o curso.

Contudo, a vontade de ter um futuro melhor com condições melhores de emprego foi o que a motivou a continuar. Quando morava em Maceió e só tinha o filho mais velho, trabalhava sem carteira assinada e o período de licença maternidade não foi remunerado. Na época, precisou voltar a trabalhar antes do tempo previsto para receber salário.

Frustrada com isso, até começou a cursar Pedagogia na capital alagoana. Mas, pelos mesmos motivos de não ter com quem deixar o filho, largou o curso.

O outro momento em que Antonina pensou em trancar foi durante a pandemia. As suas condições de estudo domiciliares eram precárias.

Não tinha computador nem internet

de qualidade. O único aparelho para estudar era o celular, que precisava dividir com a filha quando o horário das aulas era o mesmo. Mesmo ao conseguir o auxílio do tablet na universidade, não conseguia acesso à internet.

"Ou retorno para trabalhar e deixo ele com a minha mãe ou não vou ter o que comer."

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O resultado foi a queda do rendimento escolar. No período passado, ela reprovou em duas disciplinas por não conseguir conciliar estudar, assistir aula remota, cuidar dos 2 filhos durante o dia e cuidar da casa. Para evitar problemas futuros, ela perguntou aos colegas de sala se alguém tinha um computador usado para lhe vender. O que apareceu foi um computador, doado por um dos estudantes, que ela utiliza para o estudo.

Com a volta presencial, não sabe como vai fazer para deixar os filhos assistidos. Sente medo e não gosta nem de pensar nas dificuldades que enfrentará. Aos olhos da sociedade, Antonina oscila entre uma mãe que poderia abrir mão dos estudos para cuidar da família ou a imagem idealizada de mulher mãe batalhadora e guerreira, um papel tão difícil de se desempenhar. Mas, na verdade, o que ela deseja são condições melhores para concluir o curso que tanto almeja.

"Eu não sou guerreira, eu sou muito sobrecarregada."

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CAPÍTULO 4

Uma intrusa no ninho

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CAPÍTULO 4 Uma intrusa no ninho Dayene é aquele exemplo visto pela sociedade como guerreira. Mãe solo de três filhos, decidiu ingressar no curso de Letras Espanhol mesmo tendo recebido olhares críticos. Entende que as dificuldades seriam inerentes ao processo, mas persiste por acreditar que a universidade pode ser sim o seu espaço e por se sentir mais que uma mãe: uma mulher com sonhos.

O espaço acadêmico sempre foi um sonho para Dayene Silva. Tornou-se mãe muito jovem e precisou se inserir rapidamente no mercado de trabalho. Quando sentiu que precisava virar “essa chave”, tentou o ENEM e conseguiu aprovação no curso desejado.

Atualmente, ela está no 3º período do curso de Letras - Espanhol. É mãe de três filhos: um de 17 anos, o do meio com 12 e a caçula tem três anos. Quando ingressou na universidade, já estava na pandemia. A adaptação à academia aconteceu mediante o modelo remoto. A sua aprovação aconteceu ao mesmo tempo em que o filho mais velho também ingressou na UFPE, no curso de Educação Física.

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A questão de frequentar a academia era bastante utópica para mim.

Mesmo que o curso de graduação representasse um passo tão sonhado na sua vida, ele acarretou outros problemas que sabia que enfrentaria. As cobranças próprias por ter que se dividir entre ser mãe e estudante universitária apareceram, enquanto ela precisava se adaptar aos novos horários. A sua filha mais nova, Flor, faz parte do espectro autista e Dayene precisa se deslocar às terapias, além de dedicar uma atenção especial quando está em casa.

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Também precisa realizar os afazeres domiciliares, mesmo que conte com a ajuda dos filhos mais velhos. A dificuldade de manter a concentração é permanente. O seu curso é noturno, mas atualmente ela está cursando disciplinas de manhã para conseguir se dedicar aos estudos, quando a filha está na escola.

Com a perspectiva da volta das aulas presenciais, outras preocupações entram em cena. Primeiramente, pensa em mudar de bairro para ficar mais próximo à universidade e conseguir uma creche pública onde consiga deixar a filha. No último ano, intensificou a procura por esses locais na Várzea.

Para conciliar a rotina domiciliar e materna com os estudos, a existência de uma rede de apoio é fundamental.

Atualmente, ela conta com a ajuda da escola e dos filhos mais velhos nesses cuidados.

Para estudar, precisa se equilibrar nos horários mais livres. À tarde, por exemplo, é complicado, pois precisa se dedicar aos exercícios da filha e acompanhá-las nas terapias.

Quando o único horário que lhe resta para estudar é a noite, tenta driblar o cansaço e a exaustão para conseguir se concentrar. Dayene sabe que, em algumas disciplinas, o aprendizado não foi completo e ressalta que precisa de tempo para se aprofundar mais nas matérias.

Quanto aos trabalhos em grupo, sempre precisa explicar a sua rotina, caso precise atrasar alguma entrega. Mesmo assim, nunca sentiu rejeição por parte dos colegas.

Dayene é mais uma mãe que luta para ser inserida num espaço universitário que não a acolhe bem.

Mais do que isso, ela quer se sentir mulher numa sociedade que tende a isolar as mães. Antes de qualquer coisa, ela é uma pessoa com sonhos e interesses. Dayene sabe do seu dever como mãe, mas persiste para não se sentir uma intrusa no ambiente universitário.

"Eu sinto na pele a anulação maternal."

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CAPÍTULO 5

A mãe que dança

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CAPÍTULO 5 A mãe que dança Íris Cláudia persiste no curso, apesar das dificuldades. Mãe de um filho com quatro anos, estudante de licenciatura em Dança, esposa e dona de casa, as responsabilidades pesam sobre os seus ombros. E sabe que vai precisar ultrapassar ainda mais barreiras para concluir a graduação que tanto almeja. A falta de apoio é algo sentido todos os dias. Esse é mais um retrato da invisibilidade materna.

Quando ingressou no curso, Íris já era mãe de Rafael (pseudônimo) e estava no processo do desmame. Como o horário das aulas era noturno, os problemas para conciliar o horário eram ainda maiores. Depois de chegar em casa tarde da noite, precisava amamentar o filho e realizar tarefas domiciliares.

A correria, no entanto, nem chegou a ser sentida completamente porque duas semanas após o início das aulas, a universidade parou devido à pandemia. Mas as dificuldades não foram interrompidas. Com a inserção do modelo remoto de ensino, precisou aprender a se dividir entre os estudos, a maternagem e as tarefas domésticas no mesmo ambiente.

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Tem dias que eu não consigo jantar por causa das aulas e dos cuidados com o meu filho quando chega da escola.

O resultado é que não consegue se dedicar a todas atividades. Na rotina diária, só tem tempo para estudar quando o filho está na escola ou após às 22h. No horário noturno das aulas, nunca alcança uma atenção efetiva. Sempre precisa arrumar Rafael quando chega, dar o seu jantar ou ficar de olho nele. O marido também é universitário e tem aulas no mesmo horário que o dela. Esse momento é difícil por causa do medo do filho se machucar pela casa sem supervisão.

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Alguns trabalhos exigidos pelo curso acabam sendo entregues com atraso. Ou ela até mesmo realiza atividades extras para compensar na nota. Na maior parte das vezes, os professores são compreensivos em relação a isso. Mas o que mais a preocupa são os trabalhos em grupo. Devido ao cotidiano atribulado, Íris tem o seu horário próprio de estudar, o que muitas vezes não coincide com o de restante do grupo. Mesmo assim, ela procura ao máximo realizar tudo dentro dos prazos.

Para realizar compromissos externos, precisa revezar com o marido os cuidados de Rafael. Com a perspectiva da volta presencial às aulas, ela não sabe como vai fazer para conciliar. O filho estuda apenas no turno da tarde e tanto ela como o marido têm que ir à universidade à noite. A sua rede de apoio é composta também pela irmã, que é chamada em alguns momentos para auxiliar na casa. No entanto, ela não tem disponibilidade para ficar com o sobrinho todos os dias.

O mais urgente para Íris hoje é um local seguro e adequado para deixar o filho à noite. Com a falta de apoio e de creches nesse horário, ela se sente perdida em relação ao que fazer.

Provavelmente, vai precisar levar Rafael às aulas dela ou às do marido. Logo, sente receio de como será a recepção dos professores e dos alunos à presença da criança na universidade, mas essas são suas únicas alternativas para continuar estudando.

A luta para permanecer no espaço universitário é diária. Mas não se restringe apenas às dificuldades cotidianas. Íris também precisa resistir para demarcar o lugar que quer ocupar na sociedade. A maior parte das opiniões que escuta é contrária à sua permanência no curso, ainda mais em Dança. Quando precisa deixar o filho com o marido, é criticada do mesmo jeito. A única alternativa é ignorar as opiniões alheias o máximo que pode. Íris Claúdia é mais uma mulher mãe que sente na pele as dificuldades de seguir com o seu sonho. Sabe que não é fácil e que isso lhe acarreta até problemas de saúde. Mas a recompensa de se sentir ativa é maior. Procura andar de cabeça erguida e persistir no caminho que lhe satisfaz.

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CAPÍTULO 6

A marca do auxílio

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CAPÍTULO 6 A marca do auxílio Adriana Dutra encontra na dança o movimento que precisa para dar forças à vida.

Desde que ingressou grávida no curso de licenciatura em Dança, precisa contornar os obstáculos que a graduação lhe impõe. As dificuldades foram desde a falta de um local adequado para deixar a filha durante as aulas até não ter dinheiro pela falta de trabalho durante a pandemia. Além do exemplo de resiliência que Adriana é, ela também demonstra como o apoio exercido pela universidade é fundamental.

Depois de duas tentativas de entrar na universidade, conseguiu ser aprovada no ENEM. Ao realizar o teste de aptidão necessário para ingressar no curso de Dança, Adriana já se encontrava grávida. Quando todas as aprovações vieram, as emoções se misturaram nos seus pensamentos. Estava nervosa e com medo mas, ao mesmo tempo, estava alegre pela aprovação no curso desejado e por estar esperando uma filha. No entanto, as pessoas que lhe conheciam a recriminavam por fazer uma graduação estando grávida.

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E agora? Como vou fazer faculdade grávida?

No final do 1º período, Adriana deu à luz. Na época, conseguiu um acompanhamento especial das disciplinas que faltavam até as férias de julho.

Ao iniciar o 2º semestre, percebeu que não podia mais contar com o auxílio da licençamaternidade, pois já estava levando faltas nas disciplinas. Mesmo morando em Igarassu, saía de lá, deixava a filha na casa da mãe, desmamava o leite necessário e corria para as aulas. Adriana ficava com o coração apertado ao precisar se separar da filha com apenas três meses.

36 Por isso, a partir do 3º período, ela decidiu pagar poucas disciplinas por semestre. Com dificuldades para deixar a filha aos cuidados de alguém cada vez maiores, para assistir às aulas noturnas precisou levála inúmeras vezes à universidade. Nos momentos em que a criança esteve em sala, as professoras foram receptivas e acolhedoras, entretanto, ela percebia olhares atravessados de alguns colegas de classe.

Com a chegada da pandemia, as dificuldades aumentaram ainda mais. Adriana perdeu os empregos “de carteira assinada” e precisou recorrer aos benefícios assistenciais dados pela universidade. A partir daí, procurou informações sobre como solicitálos e ficou sabendo do auxílio-creche, dado aos filhos das mães que recebiam o auxílio-estudantil.

Adriana ficou maravilhada com a possibilidade de conseguir os auxílios. Para o momento difícil que estava passando, a nova renda supriria suas necessidades e as da filha. Porém, em 2020, ela acabou perdendo os prazos e só conseguiu dar entrada nos pedidos novamente em 2021. Precisou passar por todas as burocracias exigidas pela universidade, como a entrega de documentos e a entrevista com a assistente social.

Meses depois, quando procurou a lista aprovação, viu o seu nome apto a receber benefícios. Não podia mensurar o tamanho alívio que sentiu até escutar a informação

de os do de

que não receberia os auxílios naquele momento, devido aos cortes no orçamento da universidade.

Então, Adriana precisou esperar mais um tempo até que, em novembro, viu o valor na sua conta. A alegria sentida por ela não pode ser explicada em palavras. Todas as emoções de meses passando sufoco vieram à tona. A mãe não sabia se chorava ou pulava de alegria. O dinheiro representou o pagamento de algumas dívidas e a garantia de uma feira todo mês.

Ela sabe que o benefício do auxílio-creche é pouco e tem data de validade, até a filha completar quatro anos, mas isso não tira a importância dos meses que recebe.

Adriana Dutra é um dos poucos exemplos que conseguem se beneficiar das políticas assistenciais da universidade para as mães. Ainda assim, foi ela que correu atrás de informações para realizar as etapas necessárias. Os impactos que os benefícios tiveram na vida de Adriana exemplificam como medidas de auxílio voltadas às mães são essenciais para a permanência desses grupos no ambiente universitário.

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CAPÍTULO 7

Persistência acadêmica

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CAPÍTULO 7 Persistência acadêmica Se a pós-graduação é complicada para a maioria dos estudantes, para Débora Santos existem ainda mais dificuldades. Precisando lidar com um filho pequeno em crescimento e as problemáticas do sistema remoto, ela persiste no doutorado porque acredita que o ambiente é menos agressivo com as mães do que o mercado de trabalho. Mesmo assim, reconhece que a falta de apoio às mães nos programas de pós-graduação é sentida de forma relevante no cotidiano.

Antes de fazer a seleção para o Doutorado em Comunicação, pelo Programa de PósGraduação em Comunicação (PPGCOM), Débora pensou em desistir da prova. Com um filho de 02 meses que necessitava de amamentação, imaginava que não seria possível realizar o exame.

Graças a uma amiga que lhe informou da possibilidade de realização com a amamentação garantida, conseguiu o contato com a coordenação do programa, que lhe garantiu uma sala especial para a prova.

Naquele dia, o seu marido a acompanhou com o filho nos braços durante toda a realização.

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A maternidade atravessa todas as esferas da vida da mulher.

Depois da aprovação nos exames de línguas, o desafio a ser enfrentado eram as entrevistas. Precisou ir acompanhada pelo filho e marido naquele dia.

O inesperado era o berreiro que o seu filho abriria no momento da prova. Os professores foram compreensivos e até sugeriram adiar a seleção, mas o marido sempre presente - conseguiu contornar a situação. No final das contas, Débora conseguiu ser aprovada no doutorado.

41 A primeira semana de aula presencial foi marcada por um esquema especial: precisou deixar o filho na creche e, como morava em Igarassu, necessitou aprender a dirigir na BR 101; além disso, fazia o desmame do leite na creche para fazer a alimentação suplementar do filho até a hora do almoço, quando voltava da universidade.

Com exceção do atendimento especial que obteve no dia da prova, Débora nunca recebeu nenhuma atenção específica da universidade por ser mãe. Além de não saber, desconhece qualquer política que exista nesse sentido. A carência de incentivo geral na pósgraduação é tanta que ela até se considera sortuda por ser uma das primeiras da turma a receber uma bolsa CAPES. Logo depois do início das aulas presenciais, a pandemia chegou e forçou todo mundo a ficar em casa. Com o modelo remoto de ensino começando em maio de 2020, a conciliação das atividades em casa foi um verdadeiro desafio.

O marido, que é professor, precisou trabalhar remotamente. Então, os cuidados com o filho precisavam ser desdobrados nas horas livres de cada um.

Antes do filho voltar à escola, Débora não conseguia se concentrar nas aulas e o seu rendimento no curso acabou comprometido. Nos dois anos de doutorado, produziu 4 artigos e, desses, 3 foram realizados em dupla. O único artigo individual que concluiu foi feito no período de férias com muita dificuldade e ela precisou entregá-lo com alguns dias de atraso. Nos momentos em que necessitou da compreensão de professores e colegas por ser mãe, não sentiu nenhum tipo de discriminação.

Mas o que Débora precisa é o mesmo de tantas outras mães que circulam no CAC. Está além da atenção de algumas pessoas. É necessário uma estrutura que as acolham e que as possibilitem levar os seus filhos quando necessário.

Se as crianças ou adolescentes não forem inseridos nesses espaços, a tendência é que as mães infelizmente sintam-se isoladas ou excluídas dos ambientes universitários. Ela explica que, quando a sociedade investe nesse público, todas as pessoas ganham e contribuem para a estruturação de ambientes mais acolhedores.

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CAPÍTULO 8

A docência materna

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CAPÍTULO 8 A docência materna Ensino, pesquisa, extensão e maternidade.

Esses são os pilares que as mães docentes precisam conciliar na sua vida profissional.

Natália Santos (pseudônimo) não é diferente da regra. Mãe de uma filha adolescente, professora e coordenadora de curso do CAC, acaba abrindo mão de atividades essenciais da carreira para dar lugar às atividades maternas. Mesmo assim, ainda precisa lidar com a culpa por não dedicar muito tempo à filha.

Natural de outro estado, já morava em Recife com a filha e o marido há algum tempo antes de se tornar professora da UFPE. Na época, a filha de Natália tinha 3 anos. O novo local de trabalho lhe deu um pouco de tranquilidade na questão financeira e de tempo em relação ao seu emprego anterior. Em contrapartida, começou a passar as noites fora de casa já que o seu horário de trabalho era noturno.

Nos 3 anos iniciais, contava com o apoio do seu marido para cuidar da filha. Após a separação e sem a presença da família, recorreu à contratação de funcionárias para permanecer em casa à noite.

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É quase uma escolha de Sofia ter que escolher entre o filho e o trabalho.

Quando algum imprevisto acontecia, contava apenas com o apoio dos estudantes para levá-la às aulas. Embora tentasse deixar a filha o mais confortável possível, era sempre um transtorno ter que voltar para casa dormindo às 10 horas da noite.

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Além disso, ainda responsabilidades da

precisa lidar com as docência. Embora realize

projetos de extensão com frequência, sempre prioriza o ensino. Atualmente, na coordenação do curso, enfrenta ainda mais desafios e sente que realizar muitas atividades ao mesmo tempo acaba precarizando todas elas. Mesmo gostando do que faz e sentindo como um compromisso político realizado, tem medo de se arrepender no futuro pelo tempo que não aproveita com a filha.

Também presencia as alunas mães nas suas turmas. Na classe atual, praticamente um terço das alunas são mães. Testemunha como essas mulheres se esforçam para continuar no curso mesmo sem apoio. As aulas se tornam difíceis de acompanhar, principalmente por serem à noite, quando elas já estão cansadas após um dia inteiro de atividades.

A carência de auxílio para elas parte não só da universidade, mas dos familiares e dos pais das crianças. E o fato dos filhos muitas vezes até preferirem ir com as mães para as universidades refletem a dedicação às crianças que essas mulheres precisam ter.

Como a política de incentivos à permanência das mães nas universidades é escassa - para não dizer inexistente - elas se sentem obrigadas a conciliar tudo.

Enquanto isso, a sociedade “vê com ingratidão” a mãe que quer se profissionalizar. Quando escolhem apenas a maternagem são criticadas por não terem emprego. Quando trabalham são criticadas por não darem atenção aos filhos. É como se a todo tempo as mães precisassem escolher algo que lhes foi imposto. As redes de apoio em que se sustentam acabam sendo majoritariamente femininas: a mãe, a avó, a tia, a irmã, a amiga, a funcionária…

Ainda assim, entre tropeços e respiros, Natália encara a educação familiar como uma missão no intuito de produzir alguma transformação social. Ela sabe e sente que sempre vai precisar escolher. A lacuna no seu Currículo Lattes reafirma tudo isso. Mas luta, persiste e não desiste para que, um dia, as mães escolham o que elas queiram.

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CAPÍTULO 9

O trabalho e os filhos

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CAPÍTULO 9 O trabalho e os filhos Júlia Andrade (pseudônimo) é professora do CAC. Mas não é só a sua ocupação que a caracteriza. Ela também é mãe de dois filhos.

Mesmo com a maternidade planejada, os desafios a encontraram de maneira tão intensa quanto difícil. As dificuldades foram desde o desmame do filho mais velho ao trabalho realizado na licença-maternidade do filho mais novo.

Júlia queria ser mãe, mas preferiu esperar o momento certo depois que conseguisse as titulações que queria e o cargo de professora da UFPE. Depois de alcançar os seus objetivos, foi mãe de Bernardo (pseudônimo).

Durante a licença-maternidade e do período seguinte, preferiu não recorrer à creche ou babá. Nos horários de trabalho, deixava o filho na casa dos sogros.

A rotina para amamentar o filho nessa época foi complicada.

Inicialmente, planejou amamentar o bebê no intervalo do almoço, mas percebeu que isso causava desconforto emocional no filho. Então, preferiu alimentálo quando terminasse todas as atividades do dia na universidade.

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Para mim, foi muito difícil ser mãe na pandemia.

Mesmo assim, a volta para a casa era estressante para todos devido aos congestionamentos que enfrentavam. O resultado era que o tempo restante no dia, para curtir a criança era reduzido ou não aproveitado.

Aos dois anos, Bernardo passou a frequentar a creche por meio período. Ainda assim, a rotina continuou a mesma. Quando tinha algum imprevisto, recorria à rede de apoio familiar para buscar o filho na creche e levá-lo para casa.

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Nas férias, no entanto, ele precisava ir à universidade com Júlia. Os colegas e os alunos sempre compreendiam essa situação e a apoiavam.

As dificuldades ficaram a cargo da estrutura do CAC. Para trocar as fraldas do filho, recorria ao banheiro privativo para os funcionários da universidade. Quando precisava desmamar, pedia o entendimento dos outros servidores para ficar na copa reservada.

O leite ficava na geladeira do setor, mesmo contra a sua vontade, por não achar higiênico.

Na pandemia, toda a sua rede de apoio foi desestruturada devido ao isolamento social. Quando o filho mais novo, Daniel (pseudônimo), nasceu, precisou passar por uma experiência completamente solitária. Nos primeiros quatro meses do filho contou apenas com ela, o marido e Bernardo. Se ficar longe dos familiares era difícil, o fato de estar perto do filho durante todo o primeiro ano dele foi algo reconfortante.

Júlia diz que conseguiu trabalhar todas as etapas do desmame e da introdução alimentar de Daniel, algo que não conseguiu com o filho mais velho. Além disso, o período remoto conseguiu ter um convívio familiar maior e mais saudável com Bernardo.

Em contrapartida, ela sentiu o aumento da carga de trabalho materna. Para dar conta das atividades acadêmicas, ela precisa trabalhar de 10 a 12 horas por dia. Mesmo na licençamaternidade do filho mais novo, já na pandemia, teve de trabalhar realizando atividades burocráticas.

Quanto à produtividade, é uma das áreas que mais sente dificuldades.

Desde o nascimento do filho mais novo, Júlia não conseguiu publicar nada de novo. Ela também não está conseguindo realizar projetos de extensão. Tudo isso a incomoda ainda mais pelo comprometimento do programa no qual está inserida.

“Nenhuma aluna minha que é mãe deixou a desejar."

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53 Ela explica que embora o Lattes inclua a licença maternidade, a pontuação do programa de pósgraduação continua correndo, o que pode ser prejudicado pela ausência de publicações. Júlia esclarece que nenhum dos colegas de trabalho a pressiona para isso, mas ela sente uma pressão interna quanto ao desempenho.

Júlia Andrade é mais uma mãe que enfrenta dificuldades diárias para conciliar a maternidade e a maternagem com o trabalho. Mesmo numa posição mais privilegiada que outras mães do CAC UFPE, que são estudantes de graduação ou pós-graduação, os empecilhos colocados pelo sistema patriarcal as atingem como um todo. De luta em luta, elas precisam nadar contra a maré para conseguirem os poucos direitos que já conquistaram atualmente.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS Depois de elucidar o cotidiano das mães graduandas, pós-graduandas e discentes do CAC, podemos perceber que, mesmo com as diferenças no modo de vida de cada uma, todas se encontram nas dificuldades.

A carência e a falta de atenção no exercício da maternagem não se restringe apenas à falta de uma rede de apoio. Mas, são colocadas à margem da sociedade quando querem ser uma voz ativa.

Dessa forma, esperamos que os relatos, aqui reunidos, tenham tocado você de alguma forma e que eles possam contribuir para a elaboração de medidas eficazes e transformadoras nas vidas e trajetórias acadêmicas dessas mães. Por um mundo mais justo e igualitário, a luta é diária.

Frases ditas pelas mães entrevistadas: "Foi uma conversa ou escuta saudável e proveitosa com uma possível chance de melhorar a comunicação entre instituição e alunas."

"Amei falar sobre a luta de ser mãe e ser dicente."

"Obrigada por dar voz a essa minoria quase que invisível!" "É uma pauta muito importante e necessária!"

"Que este e-book sirva de estímulo para as mudanças para as próximas mães que entrarão na Universidade."

MARÍLIA FELIX DE CARVALHO É aluna de graduação em jornalismo no Departamento de Comunicação Social da UFPE. Bolsista voluntária da Bolsa de Incentivo à Criação Cultural (BICC) da ProExc - UFPE. Social media no Projeto de Extensão Maternagem, Mídia e Infância, da UFPE.

MARIA COLLIER DE MENDONÇA É professora no DCOM UFPE. Publicitária (ESPMSP) e Designer (Univali, Florianópolis). Mestra e Doutora em Comunicação e Semiótica (PUC-SP). .

Realizou doutorado sanduíche na York University, Canadá, e pós-doutorado em Mídias do Conhecimento (UFSC).

Pesquisa os temas: maternidade nas mídias, cultura digital, publicidade, design thinking e semiótica da marca.

Coordena o Projeto de Extensão Maternagem, Mídia e Infância na UFPE. É pesquisadora do PHiNC (UFPE/ CNPq) e do GP Comunicação, Gênero e Desigualdades (UFSM/ CNPq).

Mãe de Mariana (estudante universitária).