Jornal O Lábaro | Diocese de Taubaté | Maio de 2021

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O LÁBARO Diocese de Taubaté - SP

Desde 1910 - Edição nº 2.195 - Maio 2021

Distribuição Gratuita

Editorial A celebração de São José Operário e do dia do trabalhador no dia 1º de maio, as dificuldades sociais atuais, são convidativas a refletir sobre o trabalho.

Os desafios de restauração das Igrejas Históricas

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Palavra de nosso Bispo O cristianismo convida a vivenciar o trabalho com espiritualidade, fazendo dele modo de oração e de construção do Reino de Deus. Pág. 3

Opinião

Cenários humanos e sociais da pandemia. Constatações e possibilidades. Qual será o nosso ‘novo normal’? Pág. 2

Diocese em Foco 58ª Assembleia Geral da CNBB aconteceu de forma virtual abordando a pandemia e diversos outros assuntos. Pág. 4

Entrevista: Trabalho e Espiritualidade O entrevistado desse mês, Franklin Rocha, partilha como vivenciar a espiritualidade no ambiente de trabalho. Pág. 9

“ O zelo por tua casa me consome” Sl 69, 10

A notícia destaque do mês de maio relata as iniciativas de trabalhos em prol da promoção e revitalização de Igrejas de valores histórico, arquitetônico e estético presentes na Diocese de Taubaté, aponta avanços e conquistas já realizadas, apresenta novos projetos em curso e relata demandas e desafios ainda presentes. Os relatos das iniciativas de restauração conscientizam acerca da complexidade dos trabalhos

de tal natureza, a importância da união de esforços institucionais múltiplos, além da importância do engajamento e participação da comunidade de fé e da sociedade civil. A fé tem história. Trabalhar para preservação da história da fé é um compromisso dos cristãos e de todos membros da sociedade civil que têm consciência da importância da história, arquitetura e da arte. Confira! Pág. 6

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A serviço da evangelização!

Editorial

São José, o pai adotivo de Jesus, foi carpinteiro, um trabalhador. Por isso, é venerado como o patrono dos trabalhadores e evocado como São José Operário, todos os anos, no dia primeiro do mês de maio. Nesse ano eclesial que o Papa Francisco dedicou a São José, o tema do trabalho toma boa parte das reflexões e debates da sociedade no contexto pandêmico. Motivam esses debates a tensão entre a defesa do distanciamento social e o embate pela abertura do comércio, e a retomada do trabalho, inciativas dosadas enquanto se administra o progresso ou regresso do índice de contágios e mortes. Debate que se acentua, quando se considera a taxa de desempregos crescentes no país, durante esse momento histórico difícil. A ocasião celebrativa de São José Operário, as realidades difíceis e relevantes acerca do trabalho, são convidativas à reflexão sobre a importância do trabalho na condição humana, que é, inclusive, tema objeto da Doutrina Social da Igreja. Além dos debates próprios das esferas públicas e civis acerca da questão, é importante manter uma visão mais ampla sobre a dignidade do trabalho, buscar enriquecer essa temática com a abertura de sua dinâmica à espiritualidade e descobrir nela um modo de promoção da dignidade humana e da construção do Reino de Deus.

Opinião

Somente Deus é imutável, tudo o mais pode ser renovado! Para abraçar a novidade é preciso romper com o passado possibilitando avançar para o futuro. Pensemos na conversão dos pagãos. Foi preciso que eles rompessem com a tradição e a cultura de sua religião anterior, o paganismo. A mesma coisa precisou fazer os que vieram da tradição judaica abraçando o cristianismo. Sem esse rompimento com o passado e a tradição não foi possível viver a novidade do cristianismo. Pensemos também na conversão pessoal, proposta pelo Evangelho. É preciso deixar morrer o homem velho para fazer renascer o homem novo (cf. Rm 6,6). Aquele é o homem prisioneiro do pecado. O outro, renovado pelo Espírito, é o homem renascido à imagem de Jesus Cristo. No Evangelho Jesus faz nítida referência a esse rompimento com o velho para um renovamento da vida a partir da novidade do seu evangelho. Como exemplo temos a parábola da roupa nova e dos odres e o vinho (cf. Lc 8,36-39). Sabemos que a conversão é uma constante exigência em nossa vida cristã, se quisermos progredir espiritualmente. Ela é também uma necessidade

constante na Igreja que está sempre em conversão, passando por mudanças buscando ser fiel ao seu Mestre e Senhor, Jesus Cristo, e constantemente renovar seu ardor evangelizador. Eis a razão das mudanças levadas a efeito pelo Concílio do Vaticano II. Eis porque desde esse Concílio o Magistério da Igreja tem exortado à renovação da Igreja e seus fiéis, dos serviços e ministérios, das associações e movimentos, para estarem sempre mais adequados para a missão de evangelizar. Dez anos após o Concílio do Vaticano II, o Papa São Paulo VI promulga a Exortação Apostólica pós Sinodal Evangelii Nutiandi deixando claro que a Igreja, e nela todo batizado, existe para evangelizar. São João Paulo II, em seu longo pontificado, insistia no tema da Nova Evangelização, a qual devia ser nova na linguagem, nova nos métodos e nos meios, mas sempre fiel ao seu conteúdo, o mesmo lembrado por Paulo VI, o Reino de Deus. O tema da Nova Evangelização esteve presente no magistério de Bento XVI Atualmente, o Papa Francisco dá continuidade ao tema das mudanças que se

fazem necessária para que a Igreja seja fiel a sua missão de evangelizar. Ele não teme em falar de mudanças para que se mantenha o frescor evangelho. Na Exortação Apostólica pós Sinodal, Evangelii Gaudium, o Papa Francisco universaliza o conceito da Conversão Pastoral já presente no Documento de Aparecida, com as conclusões da V Conferência dos bispos da América Latina, documento publicado com a aprovação de Bento XVI, Papa que abriu aquela reunião acontecida em 2007, no Brasil. Para o Papa Francisco não se deve ter medo de rever alguns costumes e tradições da Igreja “não diretamente ligados ao núcleo do Evangelho, alguns dos quais profundamente enraizados ao longo da história” (n. 43). Com efeito, nada deve ser tomado por imutável senão Jesus Cristo e a mensagem do evangelho. Nem tradições, nem costumes, nem regras ou organizações devem se tornar um absoluto na Igreja. Tudo pode ser renovado para melhor servir ao Reino de Deus e do modo mais adequado para produzir em todos, os frutos da verdadeira conversão. Pe. Silvio José Dias

Admirável mundo novo Férias estendidas. A pandemia é isso para alguns. Para outros, porém, ela é o congelamento da vida. Em sua Divina Comédia, Dante retrata o inferno como um lugar gélido, pois onde há vida há calor, mas onde há o frio cortante, aí há a morte. Sol e piscina para quem pode, inverno adiantado para os que não têm sequer o que comer. E o quadro vai se agravando: a miséria e a fome crescem, nesse país que parece nunca alcançar o Primeiro Mundo. Esperança de longo passado e de prazo indeterminado. Com a vida isolada, a demanda diminui. O consumo de bens surge das demandas, e a demanda surge do viver. O isolamento represou o viver. Some-se a isso o fechamento do comércio, mais um represamento que tem lá seus fundamentos. As pessoas não compram, os comércios não vendem, as fábricas não produzem. Além disso, adultos e crianças vão adoecendo as carências geográficas, familiares, escolares e lúdicas. Parece que isolar só gera problemas.

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Departamento de Comunicação da Diocese de Taubaté Avenida Professor Moreira, nº 327 – Centro – Taubaté/SP. CEP 12030-070

De outro lado, o freio de aglomerações continua ajudando a não proliferar o vírus. A prova disso é o movimento contrário: muitos contagiados advindos de agrupamentos irresponsáveis. A rotina de casa, para alguns, ficou confusa, porque não há mais as distinções de espaço e de tempo que o ambiente de trabalho favorece. Houve, contudo, situações de melhora na experiência de viver. Não precisar ir de um lugar a outro por causa de uma simples reunião, que poderia ser só um e-mail; ter alguma energia para um filme com a família ao fim do expediente online; acordar um pouco mais tarde etc. Preguicites que são, no fundo, a tão desejada qualidade de vida – nunca alcançada em modelos econômicos que só querem produzir muito, para o uso de poucos. É fato que a pandemia acelerou processos. Diversas profissões estão deixando de existir. Um novo quadro vai sendo pintado. Monopólios empresariais engolem

Diretor: Côn. José Luciano Matos Santana Editor: Pe. Thomás Ranieri da Silva Jornalista Responsável: Pe. Jaime Lemes MTB 62839/SP Conselho Editorial:Pe. Celso L. Longo, Pe. Marcelo Henrique de Souza, Valquiria Vieria. Diagramação e Designer: Diác. Julius Rafael Silva de Barros Lima Revisão: Ana Regina de Oliveira Impressão: Katú Editora Gráfica

tudo, pequenos empreendedores lutam, desigualmente, por seu lugar no mundo. Estilos alternativos de vida vão fermentando: vida simples; desapego dos excessos; práticas de saúde física e mental, como caminhadas e meditação; prestação de serviços mais próximos do doméstico do que do industrial. Um mundo diferente vai desabrochando. Se ele será um mundo novo, no sentido forte da palavra “novo”, dependerá mais das culturas e das mentalidades escolhidas pelas sociedades do que da noção chique, mas abstrata, de “novo normal”. Se normal é apatia social, indiferença humana, exploração predatória da natureza, religião desligada da vida, é melhor que não haja “novo normal”. Só o novo é o necessário. Pe. Marcelo Henrique Reitor do Seminário Tiragem: 5.000 | Distribuição dirigida e gratuita Site: www.diocesedetaubate.org.br email: pastoral@diocesedetaubate.org.br www.facebook.com/diocesedetaubate As matérias assinadas são de inteira responsabilidade de seus autores, não emitem necessariamente a opinião deste veículo.


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Palavra de nosso Bispo

O mês de maio inicia-se com a comemoração de São José Operário e o dia do Trabalhador. O trabalho é uma realidade que exige disposição, disciplina, empenho. Por mais que alguém trabalhe naquilo que goste, em si o trabalho é sempre exigente e desgastante. Porém, mais difícil que trabalhar é ficar sem trabalho. Sobretudo devido à pandemia, nosso País atinge os mais altos índices de desemprego, com todas as consequências pessoais e sociais que isso pode acarretar. Paradoxalmente, quando não se tem emprego percebese, mais nítida e intensamente, o quanto o trabalho é importante e realizador na vida de cada um. No dia 15 de maio de 1891, o Papa Leão XIII, publicava a encíclica social “Rerum Novarum”, que tratava das questões trabalhistas e das “realidades novas” geradas pelo processo de industrialização. Neste ano de 2021, dedicado a São José, contemplamos esse santo homem que nos inspira a realizar todo trabalho segundo a vontade de Deus. Sob este enfoque, neste artigo,

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ESPIRITUALIDADE CRISTÃ DO TRABALHO refletiremos sobre a espiritualidade do trabalho e a mística que move o cristão a realiza-lo. Marcando a comemoração do 90º aniversário da Rerum Novarum, o então papa João Paulo II, em 1981, publicava sua primeira encíclica, a Laborem Exercens, sobre o trabalho humano, de onde colhemos os principais elementos aqui apresentados. A espiritualidade do trabalho tem suas bases na Palavra de Deus. Já no livro do Gênesis (cap. 1), vemos o relato da criação como obra, ou trabalho de Deus. Para dar um cunho religioso ao ritmo da semana, o texto sagrado apresenta a obra de Deus realizada em seis dias e o descanso no sétimo. Com isso propõe-se ao ser humano que participe da obra do Criador e que esta inspire seu trabalho e seu descanso.No evangelho escrito por Marcos (6,3) Jesus é apresentado como o carpinteiro. Sendo ele um trabalhador e o anunciador do evangelho, em sua pessoa podemos contemplar o evangelho do trabalho. Muitas de suas parábolas fazem referência ao trabalho do pastor, do agricultor, do médico, do pescador, do comerciante, do servo, do feitor, do operário, etc. São Paulo, como discípulo e apóstolo do Senhor, também ensina sobre o trabalho. Na segunda carta aos Tessalonicenses (cap.3), diz que trabalha noite e dia, enfrentando um trabalho duro e penoso para não ser pesado a ninguém e para dar exemplo àqueles que vivem preguiçosamente, sem trabalhar. Completa dizendo (em outras palavras) que quem quer comer, deve trabalhar. Já na carta aos Colossenses (cap.3), Paulo nos diz que tudo o que fizermos, seja feito de coração, como que para o Senhor, segundo a vontade de

Deus e não simplesmente para atender ao chefe ou para agradar a alguém. Aqui está o essencial da mística e da espiritualidade do trabalho. Claro que realizando o trabalho segundo a vontade de Deus, melhor serviremos aos nossos semelhantes e nosso trabalho atingirá sua dimensão social, pois a atividade que procede do ser humano também para ele se destina. Todo trabalho, quer seja manual ou intelectual, tem sua cota de fadiga, de peso, de sofrimento. Assim, nosso trabalho pode ser associado ao mistério de cruz e ressurreição do Senhor Jesus. Unimos nossos sofrimentos aos de nosso Senhor em vista a criar um mundo novo e melhor para todos. Colaboramos assim, de algum modo, com Jesus, associados a Ele na obra da redenção da humanidade, levando nossa cruz de cada dia. Que nossos trabalhos sejam desenvolvidos não simplesmente com o objetivo de alcançar progresso e tornar melhor nossa vida terrena, o que certamente é importante, mas sobretudo, como cristãos, nosso trabalho seja uma maneira de colaborar para que o Reino de Deus vá se concretizando já neste tempo de nossa história, através de relações de justiça, de fraternidade, de buscar o bem para nós e para todos. Com tais disposições, iniciemos a atividade de cada dia com uma oração, oferecendo a Deus o trabalho a ser realizado segundo sua Vontade e para o bem de nossos semelhantes. O trabalho feito com essa disposição já é uma forma de oração. Dom Wilson Angotti Bispo Diocesano


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Diocese em Foco

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58ª Assembleia Geral da CNBB aconteceu de forma virtual abordando a pandemia e diversos outros assuntos Da Redação

Pela primeira vez na história da CNBB, a Assembleia Geral aconteceu de forma virtual. Cerca de 400 participantes, entre cardeais, arcebispos, bispos e convidados estiveram reunidos em uma sala on-line para a realização da 58ª Assembleia Geral da CNBB de 12 a 16 de abril. Com o tema “Casas da Palavra – Animação bíblica da vida e da pastoral nas comunidades eclesiais missionárias”, a Assembleia tratou desse e de diversos outros assuntos. O bispo diocesano, Dom Wilson

Angotti, acompanhou de Taubaté-SP a programação da Assembleia. Desse modo, ele pôde participar do primeiro encontro com o novo núncio apostólico Dom Giambattista Diquattro; conferir o relatório bienal 2019-2020, organizado pelo Presidente da CNBB; ouvir a mensagem do Santo Padre enviada à Assembleia dos bispos do Brasil; observar as análises de conjuntura eclesial e social, além de observar a programação de atividades dos anos Amoris Laetitia e de São José. A Assembleia dos bispos tratou ainda sobre a 6ª Semana Social Brasileira; o Ano Vocacional; o Fundo Nacional de Solidariedade (FNS); o balanço da CF 2021 e apresentação da CF 2022; o pacto pelo Brasil; o Congresso Eucarístico Nacional, programado para ser realizado em 2022; um estudo sobre o novo estatuto da CNBB; a criação do Regional Leste 3; a ação solidária emergencial “É tempo de cuidar”; a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) e seus impactos na Igreja no Brasil.

Os bispos participaram também de um retiro com o arcebispo de Boston, nos Estados Unidos, o cardeal Seán Patrick O’Malley. Uma mensagem ao povo brasileiro foi publicada em solidariedade às vítimas da pandemia, destacando o papel dos cristãos na defesa da vida: “Tudo o que promove ou ameaça a vida diz respeito à nossa missão de cristãos. Sempre que assumimos posicionamentos em questões sociais, econômicas e políticas, nós o fazemos por exigência do Evangelho. Não podemos nos calar quando a vida é ameaçada, os direitos desrespeitados, a justiça corrompida e a violência instaurada”, escrevem os bispos na mensagem.

No Ano de São José paróquias reinventam a festa do Patrono da Igreja

O Papa Francisco abriu em 08 de dezembro de 2020 o Ano de São José, que está sendo celebrado pela Igreja em todo o mundo até o dia 08 de dezembro de 2021. No primeiro dia do mês de maio a Igreja faz memória a São José Operário, em nossa diocese há 3 paróquias dedicadas ao santo, para festejarem o padroeiro foi necessário reinventar as comemorações.

Renovando a forma de celebrar as paróquias incluíram nas programações a realização de carreatas, com a imagem do santo em um carro aberto passavam na porta da casa dos fiéis que saudavam e manifestavam fé e devoção. Em Tremembé-SP, a paróquia São José levou a imagem do santo pelas ruas da cidade e encontrou o povo na porta de suas casas, além disso a carreata parou em frente a Basílica do Senhor Bom Jesus em um encontro de imagens, São José e Bom Jesus. Em Taubaté-SP, a Paróquia São José Operário também reuniu os fiéis em carreata, passando pela porta da paróquia todos recebiam aspersão da água, em um percurso por algumas ruas da cidade levou ao povo a visita de São José. Em Caçapava-SP, a Paróquia São José Operário saiu em carreata e transmitiu ao vivo o percurso pelas redes sociais. “Muita emoção ver São José passando na minha porta Viva São

José Operário”, comentou Nancy Munhoz nas redes sociais. No ano passado as igrejas estavam fechadas para o público devido à pandemia, esse ano as paróquias que celebraram São José puderam contar com a presença dos fiéis nas celebrações, mas sempre em número reduzido e seguindo as regras de distanciamento e uso de máscara.


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Igreja no Brasil Amado irmão, amada irmã, saúde e paz! Primeiro de maio, 2020, dia do trabalhador e trabalhadora sem grandes manifestações – com muita gente sem emprego. O número de desempregados está crescendo mais rápido em nosso país com a crise advinda da pandemia do coronavírus. Além de tantos outros que estão parados há mais de um mês e tem dificuldade para garantir o sustento para família. Aliada a crise sanitária e econômica, o Brasil ainda vive uma crise social e política. A situação é grave, precisamos de líderes éticos, humanistas, comprometidos com a saúde do povo, especialmente dos pobres e vulneráveis com a preservação de vidas competentes com a geração de empregos. “Sem trabalho não há dignidade, mas nem todos os trabalhos são dignos”, ensina o Santo padre o Papa Francisco. Por isso, neste Dia do Trabalhador, celebração de São José Operário, rezo e convido você a também dedicar preces a todos que ainda são excluídos – vivem sem trabalho digno. Cada um de nós, criados à imagem e semelhança de Deus, temos, na nossa essência, a vocação para o trabalho. Trabalhar é, pois, muito mais que simplesmente ambicionar dinheiro ou posses. Trata-se de assumir a vocação

Igreja no Mundo

Foi publicado nesta terça-feira (11) o Motu proprio “Antiquum ministerium” com o qual Francisco institui o ministério de catequista: uma necessidade urgente para a evangelização no mundo contemporâneo, a ser realizada sob forma secular, sem cair na clericalização.

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MENSAGEM DO PRESIDENTE DA CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL AOS TRABALHADORES E TRABALHADORAS DO BRASIL humana de contribuir para um bem maior – da sociedade, da Casa Comum, de toda a obra da criação. Todos merecem um trabalho digno, que garanta o próprio sustento e o bem estar da própria família. É preciso, assim, vencer as muitas formas de escravidão, que distorcem o sentido do trabalho, desconsiderando que cada ser humano é filho de Deus. Neste dia do trabalhador, os cristãos são especialmente convocados a se indignar com a submissão do trabalho a uma lógica econômica perversa, que privilegia a geração de desigualdades – poucos concentrando muito dinheiro e tantas pessoas – absoluta maioria – excluídas, desempregadas ou sem trabalho digno. O momento é de união de esforços público e privado para que ninguém seja deixado para trás. O Estado tem o dever de dar prioridade aos trabalhadores e trabalhadoras brasileiras em situação de vulnerabilidade. É fundamental que o Estado adote políticas claras na contramão dos interesses espúrios do lucro e dos privilégios excludentes, vergonhosos e injustos. É urgente uma economia que se volte para o desenvolvimento integral, preservando emprego, renda e trabalho na cidade e no campo. Aí, especialmente, não permitindo

legislações que não favoreçam o desmonte da sobrevivência do camponês. A você trabalhador que está sofrendo as consequências da crise sanitária e política: saiba que você não está sozinho. Enquanto ela persiste, Deus está do seu lado – Deus estará sempre do seu lado. A solidariedade é o grande remédio para um mundo novo, justo e fraterno. Estamos juntos nessa travessia e sairemos mais forte dela. Sejamos guiados pela esperança e pela fé. São José Operário, patrono da Igreja e protetor dos trabalhadores e trabalhadoras, a exercer com dedicação o próprio trabalho. Sensibilize o coração de todos, especialmente de políticos, empreendedores, dirigentes e gestores, sobre a necessidade de oferecer trabalho digno a cada pessoa num desenvolvimento integral para uma sociedade justa, fraterna e solidária. Contem com minhas orações, compromisso e amizade. Deus vos abençoe copiosamente. Brasília-DF, 1º de maio de 2020 Dom Walmor Oliveira de Azevedo Arcebispo de Belo Horizonte - MG Presidente da CNBB

O Papa institui o Ministério de Catequista “Fidelidade ao passado e responsabilidade pelo presente” são “as condições indispensáveis para que a Igreja possa desempenhar a sua missão no mundo”: assim escreve o Papa Francisco no Motu proprio “Antiquum ministerium” - assinado ontem, 10 de maio, memória litúrgica de São João de Ávila, presbítero e doutor da Igreja - com o qual institui o ministério de catequista. No contexto da evangelização no mundo contemporâneo e diante da “imposição de uma cultura globalizada”, de fato, “é necessário

reconhecer a presença de leigos e leigas que, em virtude de seu Batismo, se sentem chamados a colaborar no serviço da catequese”. Além disso o Pontífice enfatiza a importância de “um encontro autêntico com as gerações mais jovens”, como também “a necessidade de metodologias e instrumentos criativos que tornem o anúncio do Evangelho coerente com a transformação missionária da Igreja”. Fonte: Isabella Piro – Vatican News


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Destaque

A fé tem história. A história de fé é um patrimônio. Uma das expressões de valor da fé cristã é sua consciência histórica e sua apreciação ao valor estético. Embora, a grandeza da história da fé nunca se reduza ao aglomerado material, pois, “a fé é a certeza das coisas que não se veem” (cf. Hb 11,1), nos templos importantes e históricos temos a expressão de sua beleza. Além do mais, no zelo pelos elementos históricos da fé se vê a sintomática da sua vitalidade no presente. Cuida-se do que se ama. Dentro desse contexto, ressaltam-se alguns esforços e iniciativas atualmente presentes na Diocese de Taubaté, em vista da promoção da história da fé e do cuidado aos patrimônios eclesiais. Alguns destes patrimônios, tornados reconhecidamente de valor público geral, pelo processo

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Iniciativas paroquiais visam promover os espaços históricos da fé

de tombamento. A Basílica do Senhor Bom Jesus de Tremembé é um exemplo grato da busca dos esforços em restaurar e revitalizar os espaços históricos e significativos da vivência da fé. Os trabalhos de reforma iniciados no ano de 2010 pelo reitor da basílica, Pe. José Vicente, foi fruto de um trabalho de articulação interdisciplinar e interinstitucional. Reunindo na ocasião, prefeito e vereadores da cidade de Tremembé, membros da Associação da Indústria de Taubaté, da Associação Comercial de Tremembé, membros da comunidade civil e a fundamental parceria com a Universidade de Taubaté (por meio do projeto do Núcleo de Preservação do Patrimônio Cultural – NPPC). A partir dessa equipe de reflexão dos trabalhos, a Basílica do Senhor Bom Jesus passou pelo processo de tombamento municipal e inscreveu seu projeto no Ministério da Cultura obtendo aprovação pela Lei Rouanet, no ano de 2012. No processo de aceitação do projeto pelo Ministério da Cultura foi fundamental a manifestação pública da comunidade sobre a importância do espaço orante e cultural para a população do Vale do Paraíba. A inscrição do projeto necessitava de 3.500 assinaturas encaminhadas para entrada no processo, e a

equipe de trabalho liderada pelo Pe. José Vicente conseguiu 10.000 assinaturas na ocasião. Fato que foi levado muito em crédito pelos responsáveis competentes na análise de processos pelo Ministério da Cultura. Além da participação da comunidade eclesial que aderiu e colaborou com várias iniciativas de arrecadação financeira para o início das obras, foi importante também a contribuição empresarial na captação de recursos. Durante o processo de reforma da Basílica do Senhor Bom Jesus houve colaboração de recursos pela Lei Rouanet das empresas CESP (Companhia Energética do Brasil), Banco Itaú e Oxiteno (que tem unidade industrial em Tremembé). A Basílica do Senhor Bom Jesus, antes fechada e impedida de ter acesso de fiéis, foi reaberta em 2013. E embora já tenha se


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Destaque iniciativa de restauração que despontou foi relacionada à histórica Igreja de Nossa Senhora do Pilar, em Taubaté. O início de sua construção foi em 1725, por Timóteo Corrêa de Toledo e foi inaugurada em 1747. O pároco da Paróquia São Francisco das Chagas, e cura da Catedral de Taubaté, Pe. Roger Matheus dos Santos, assinou contrato no dia 29 de março de 2021, com os diretores da empresa Planus do Brasil, Loreny expirado o período de inscrição e Bruno Lessa, empresa que ficará do projeto de Restauro frente ao responsável por gerenciar o projeto Ministério da Cultura, o templo de restauro. continua a passar por melhorias contínuas e sistemáticas por meio da colaboração da comunidade eclesial e por tantos peregrinos, que de forma crescente realizam visitas à basílica. A parceria com a Unitau, estreitada no início do projeto apresentado ao Ministério da Cultura em 2010, continua a ser frutuoso, pois continua a ser um espaço de estudo dos alunos da ciência arquitetônica. Há uma grata satisfação às pessoas de A Igreja do Pilar, como fé, às pessoas de sensibilidade é popularmente conhecida, histórica e a futuros profissionais é tombada pelos órgãos de de arquitetura. preservação federal o IPHAN Na cidade de (Instituto de Patrimônio Histórico Pindamonhangaba, a Paróquia e Artístico Nacional) e também Nossa Senhora do Bom Sucesso, no órgão de preservação estadual, tendo como pároco o Pe. Kleber o CONDEPHAAT (Conselho de Rodrigues da Silva, inicia também Defesa do Patrimônio Histórico, sua articulação para iniciar Arqueológico, Artístico e trabalhos de restauração da Igreja Turístico). Matriz Nossa Senhora do Bom Além da assinatura do projeto Sucesso, através do “Projeto relacionado à Igreja Nossa Senhora Restauro”. Com tratativas iniciadas do Pilar, a Paróquia São Francisco em 2019, o projeto conta também das Chagas tem trabalhado na com um acordo de cooperação recuperação do órgão de tubos com a Universidade de Taubaté desde 2018. A iniciativa demarcou através do Núcleo de Preservação uma mobilização cultural na Igreja do Patrimônio Cultural (NPCC). Catedral pela promoção de eventos O Projeto já conta com musicais a fim de arrecadar recursos o levantamento fotográfico e financeiros para os trabalhos. documentação técnica conduzido Após o término da primeira por professores do Departamento fase de restauração, o instrumento já de Arquitetura e alunos, que embeleza e soleniza as celebrações permitiu elencar as prioridades litúrgicas. Ainda há demandas em de elaboração e execução dos sua restauração, que possibilitará trabalhos, divididas em quatro fases o uso de mais recursos potenciais com seus respectivos orçamentos. do instrumento. Ele é o maior Mais recentemente, outra órgão do Vale do Paraíba e marca a

história musical da região. Muitos músicos organistas nacionais e internacionais já se apresentaram com o instrumento. Na cidade de Caçapava, destaca-se o trabalho de reforma da Igreja Matriz de São João Batista, fundada em 1845 e pertencente à Paróquia Nossa Senhora D’Ajuda. A igreja histórica tem passado por um belo trabalho de restauro das estruturas e de suas particularidades artísticas. O trabalho em curso conta com o apoio de paroquianos e munícipes nas iniciativas de arrecadação financeira, e é realizado por profissionais técnicos da área, com experiência ampla em trabalhos dessa natureza. A liderança dos trabalhos conduzida pelo pároco, Pe. Leandro dos Santos, foi reconhecida pelo município de Caçapava, que por meio da Secretaria de Cultura, Esportes e Lazer, conferiu a ele o Diploma de Mérito Cultural, no dia 22 de dezembro de 2020, pela contribuição cultural e artística na cidade. Outras inciativas precisam ainda progredir, como por exemplo, a Igreja do Rosário em Taubaté e a Igreja São José em Pindamonhangaba. Os desafios do cuidado desses patrimônios são muitos, desde os financeiros, técnicos e burocráticos. Requerem, normalmente, altos investimentos, situação que em condições sociais e econômicas estáveis já é dificultosa e que se agrava ainda mais no contexto de dificuldades econômicas oriundas da pandemia (Covid-19). A conscientização da alta complexidade econômica e processual desses trabalhos deve despertar consciência de participação social, públicas e governamentais, e mover críticas proporcionais e ponderadas a partir das dificuldades reais dos trabalhos dessa natureza. Faz-se necessário, nesse contexto, reconhecer os avanços já realizados e motivar-se para os desafios ainda presentes.


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Ano Josefino

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São José: seu noivado com Maria e a paternidade legal de Jesus

José, uma figura modesta, apesar da descendência davídica, documentada pela genealogia colocada na abertura do Evangelho de Mateus (1,1-17). A esta tem de acrescentar-se um posterior dado histórico ligado ao nascimento do filho Jesus, mas muito difícil de definir na sua cronologia precisa. Trata-se de um recenseamento imperial romano imposto pelo governador da Síria, Quirino (c.51 a.C. – 21), de acordo com uma modalidade étnico-tribal e não residencial, evocado pelo Evangelho de Lucas (2,2). Concretamente, o registro devia ser feito na sede originária da ascendência do clã familiar. É, precisamente, Lucas a assinalar que “José da Galiléia, da cidade de Nazaré, teve de subir à Judeia, à cidade de Davi chamada Belém porque pertencia à linhagem e à família de Davi” (2,4). Vamos lançar um olhar antes de mais à experiência desconcertante vivida por este artesão por ocasião do nascimento do filho, ocorrida durante os dias daquele recenseamento, talvez em 7/6 a.C., num alojamento improvisado em Belém. Regressemos, por isso, ao texto de Mateus: “Assim foi gerado Jesus Cristo: a sua mãe Maria, sendo noiva de José seu esposo, dado que era um homem justo e não queria acusá-la publicamente, pensou repudiá-la em segredo. Enquanto, no entanto, estava a considerar estas coisas, eis que lhe apareceu em sonho um anjo do Senhor, e disse-lhe: José, filho de Davi, não temas tomar contigo Maria, tua esposa. Com efeito, o menino que está gerado nela vem do Espírito Santo; ela dará à luz um filho, e tu chamá-lo-ás Jesus: Ele, com efeito, salvará o seu povo dos seus pecados” (1,18-21). No antigo Israel, o casamento compreendia duas fases distintas, mas ligadas. A primeira era o noivado oficial,

cuja ratificação tinha um relevo particular para a mulher: apesar de continuar a residir na casa paterna, era considerada já esposa do futuro marido, pelo que toda a infidelidade era rubricada como adultério. A segunda fase compreendia a celebração nupcial, com a transferência para a casa do esposo, com cantos, danças e banquetes, evento evocado por uma sugestiva parábola de Cristo, a das jovens sábias e desleixadas (Mt 25, 1-13). A narrativa acima coloca-se na fase do noivado: “antes que fossem viver juntos”, a noiva-esposa Maria “encontrou-se grávida”. José está perante uma opção dramática, a do repúdio em sentido estrito, de tal maneira que Mateus usa o verbo grego “apolýsai”, o termo técnico do divórcio, com todas as consequências penais e civis dramáticas para a mulher. Por fortuna, nem sempre no judaísmo se aplicava a letra da lei bíblica, que era implacável: “Se a noiva não for encontrada em estado de virgindade, então fá-la-ão sair da entrada da casa paterna e a gente da sua cidade lapidá-la-á até à morte” (Dt 22,20-21). É fácil a referência à cena que se consumará na esplanada do templo de Jerusalém com a adúltera prestes a ser lapidada e salva por Jesus com a célebre frase: “Quem de vós está sem pecado, lance primeiro a pedra contra ela” (Jo 8,1-11). José está apaixonado por Maria e não sabe como tornar menos atroz para ela a condenação. Como “homem justo”, isto é, correto (não pode avalizar com o seu nome uma criança de pai desconhecido), mas também manso e compassivo por aquela que era já a sua mulher, opta por um repúdio secreto, sem o procedimento legal oficial, evitando a entrega formal do “libelo de repúdio”,

diminuindo assim também o eventual risco do recurso à lapidação por parte da parentela. Enquanto está interiormente ferido, a sua obscuridade interior é rasgada por um clarão de luz que se expressa através de uma forma clássica já no Antigo Testamento, uma epifania angélica. Ora, na Bíblia o anjo é sinal de uma revelação divina, e José experimentará a sua presença por várias vezes na narrativa dos dois capítulos de Mateus dedicados ao nascimento e à infância de Jesus. Trata-se, portanto, de uma forte experiência interior que o impele a uma opção diferente: ele tem de conduzir ao seu termo também a segunda fase do casamento, “tomando consigo Maria sua esposa”, porque naquela mulher aconteceu um evento único e extraordinário, uma semente divina (o próprio Espírito de Deus fecundou-a. A ele caberá a tarefa de ser o pai legal daquela criança, registrando-a com o nome de Jesus, que significa “o Senhor salva”. Uma prática, a da paternidade legal ou putativa, confirmada também noutros casos pelas Sagradas Escrituras, como para o denominado levirato (do latim levir, cunhado), assim formulado pela lei bíblica: “Quando um dos irmãos de uma família morrer sem deixar filhos, a mulher do defunto unir-se-á com um seu cunhado que a tomará como mulher... O primogênito que ela gerar terá o nome do irmão morto, para que o nome deste não se extinga em Israel” (Dt 25,5-6; leiase também em Mateus 22, 23-33, com um caso paradoxal de levirato, proposto a Jesus pelos saduceus, a corrente conservadora do judaísmo). Prof. Dr. José Pereira da Silva


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Tema Pastoral

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A Dignidade do trabalho e do trabalhador

A Revolução Industrial trouxe significativas mudanças na compreensão do trabalho. Deixando de ser artesanal, familiar e visando a subsistência, passouse à utilização de máquinas e mão de obra assalariada, buscando o lucro. Desta forma, “trabalhar” se tornou sinônimo de ir para a indústria, a fim de receber um salário. Partindo desta compreensão, entendia-se que os que ficavam em casa não eram trabalhadores. Deste modo, o trabalhador foi caracterizado como sendo aquele que atua no âmbito industrial, veste macacão, ficando de fora, além dos de casa, os professores, advogados, médicos e outros profissionais liberais. Ainda hoje é comum ouvir declarações como “somente eu trabalho, a minha esposa não”, bem como comentários de que os profissionais liberais “não pegam no pesado e têm uma vida folgada”. O trabalho é uma dimensão fundamental da pessoa, à semelhança do próprio Deus, que é apresentado trabalhando (Gn 1-2,4). No entanto, Ele não somente trabalhou na criação e foi descansar eternamente, mas a mantém constantemente pois, se desvia o seu rosto, ela volta ao pó (Sl 103,29). Por isso, Jesus afirmou que “meu Pai trabalha sempre, e eu também trabalho” (Jo 5,17). Ao lamento feito, por alguns (especialmente às segundas-feiras), dizendo “Eu queria saber quem inventou o trabalho”, a Bíblia responde, em suas primeiras páginas: foi Deus. Com essa fundamentação bíblico-teológica, a Doutrina social da Igreja afirma a dignidade do trabalho e do trabalhador. Embora exista uma tradição no Gênesis, que apresenta o trabalho como uma maldição, por causa do pecado (Gn 3,17-19), a compreensão judeu-cristã desconstruiu a sua concepção servil, tão presente na antiguidade, onde somente os escravos trabalhavam. No âmbito da Doutrina Social da Igreja, o Papa Leão XIII, em 1891, se manifestou sobre a questão operária. Na Encíclica Rerum Novarum (RN) ele definiu o trabalho como uma atividade humana, destinada a prover às necessidades da vida, especialmente a sua conservação (RN 6). Ele afirmou, ainda, que o trabalho tem uma dignidade e, por isso, não se deve ter vergonha de trabalhar, uma vez que o próprio Jesus quis ser um trabalhador (RN 15). Ele ensinou também que o trabalho é pessoal, algo próprio do ser humano, um dom recebido do Criador, bem como que o trabalho é necessário, porque a pessoa precisa dele para sobreviver. Por isso, o trabalho tem uma prioridade sobre o capital. O magistério social posterior seguiu, basicamente, estas indicações deixadas por Leão XIII. Infelizmente, em nossos dias, o trabalho e o trabalhador são submetidos às regras do mercado, no quadro de uma economia onde o dinheiro (capital) reina, ao invés de servir ao trabalho. Na Evangelii Gaudium, em 2013, o Papa Francisco disse “não” a este modelo econômico, afirmando que “esta economia mata” (EG 53). Ele entende que precisamos de outra racionalidade econômica, que esteja a serviço da vida, não do capital. Em seu discurso no Primeiro Encontro Mundial de Movimentos Populares (Roma, 28/10/2014), ele esboçou este modelo da seguinte forma: “Nenhuma família sem casa, nenhum camponês sem terra, nenhum trabalhador sem direitos, nenhuma pessoa sem a dignidade que o trabalho dá”.

Infelizmente vivemos, hoje, em uma situação de desemprego estrutural, com centenas de milhares de pessoas privadas da dignidade do trabalho. A reforma trabalhista realizada, há algum tempo, foi feita com a promessa de gerar empregos, mas isso não se verificou. Aliás, a situação piorou. Na reforma da Previdência, veio a mesma promessa, mas se agravou a situação dos pobres, dificultando sua aposentadoria e o acesso a benefícios. Porém, emprego, nada. Alardeia-se, no atual Governo, o jargão “menos direitos, para gerar mais empregos” o que sabemos, antecipadamente, que irá fragilizar os trabalhadores, aumentando a pobreza, enquanto crescerá o lucro do capital. Mas postos de trabalho, nada. Ainda temos muito a avançar para garantir justiça e dignidade para os trabalhadores e trabalhadoras. Como canta o Gonzaguinha: “E sem o seu trabalho, um homem não tem honra. E sem a sua honra, se morre, se mata. Não dá pra ser feliz”. Pe. Antonio Aparecido Alves, Doutor em Teologia pela PUC-Rio. Mestre em Ciências Sociais pela Universidade Gregoriana (Roma). Professor na Faculdade Dehoniana (Taubaté), Faculdade Católica (S. J. Campos) e Faculdade João Paulo II (Marília). Membro da assessoria do Centro Nacional Fé e Política Dom Helder Câmara (CNBB/Brasília). Presbítero na Diocese de S. J. Campos.


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Entrevista

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Espiritualidade no Trabalho Pe. Thomás Ranieri, editor

questão necessariamente submetida a alguma confissão religiosa. É verdade que, muitas vezes, entende-se espiritualidade como algo diretamente ligado à práticas religiosas, e, nesse sentido, poderia gerar conflitos internos na organização. No entanto, a prática da espiritualidade está além da religiosidade e assume um papel diferenciado: promover o bem estar no ambiente de trabalho e realização pessoal. Urge entender as diferenças entre religiosidade e espiritualidade: enquanto a religiosidade refere-se à nossa escolha, à aproximação com o Deus que escolhemos dentro de nossa formação e crença, a espiritualidade é nossa conduta no caminho do bem e da prosperidade com ética, um estado de consciência que é capaz de se relacionar com “algo ou alguém superior”, auxiliando uns aos outros, independentemente da crença.

Franklyn Rocha, 37 anos, pertence à Paróquia São Francisco das Chagas em Taubaté, anima as celebrações litúrgicas como Músico. Como profissional, exerce o trabalho de Bancário. O Lábaro - Como você percebe a importância da espiritualidade no ambiente de trabalho? Na instituição onde trabalho, por serem inúmeros os escritórios, os segmentos, as áreas internas e externas, os prédios, os complexos e os conglomerados, a questão da espiritualidade sempre foi abordada e desenvolvida conforme a gestão de cada equipe. Por isso, abordarei as questões a partir da experiência que tive nos segmentos e ambientes em que atuei e atuo. Penso que a espiritualidade no ambiente de trabalho favorece o colaborador na busca e encontro do sentido da própria vida e do próprio trabalho na Instituição, além de ser um modo eficaz para o conhecimento, a busca e o desenvolvimento das próprias virtudes. O Lábaro – Quais os benefícios concretos de um ambiente de trabalho que cultiva a abertura a espiritualidade? Tenho percebido inúmeros benefícios para um ambiente de trabalho que se abre não somente à questão da espiritualidade, mas também oferece apoio psicológico: a atuação de profissionais capazes de lidar com essas necessidades dos colaboradores da organização possibilita o desenvolvimento das dimensões de sentido de comunidade na equipe, alegria no trabalho e oportunidade para a vida interior. Muitos são os indivíduos de uma organização que buscam esse tipo de auxílio fora dela (clínicas psicológicas e instituições religiosas), e pertencer profissionalmente a uma Empresa que está aberta a estas questões, além do diferencial em relações humanas organizacionais, a organização ganhará em qualidade e produtividade. O Lábaro – Como vivenciar a espiritualidade no trabalho frente as diferenças de confissão religiosa? Penso que vivenciar a espiritualidade não seja uma

O Lábaro – Você considera que a espiritualidade no ambiente de trabalho colabora, além do bem estar dos funcionários, com a relação com os clientes? Sim e muito! Afinal, ao trabalhar a espiritualidade, a Empresa favorece que todos os colaboradores entendam sua missão e alinhem seus valores pessoais com os da organização. Consequentemente, o nível de engajamento profissional poderá aumentar e, em contrapartida, diminuirse-á o sentimento de alienação profissional (não entender o porquê de uma atividade ou atuação). Isso colaborará para que a dimensão de alinhamento do indivíduo com os valores da organização seja desenvolvida, alcançando positivamente os negócios com os clientes. O Lábaro - Quais os primeiros passos para implantar a espiritualidade no ambiente de trabalho? Diálogo é um excelente caminho para trabalhar a espiritualidade, pois nos abre e nos aproxima do outro, num movimento que pode acontecer mutuamente. Tenho percebido que os gestores das Empresas possuem papel importantes nesta hora, incentivando e favorecendo o diálogo em reuniões, treinamentos, e até mesmo em pequenos momentos de celebração e datas comemorativas. Nestas ocasiões, é importante buscar a essência do outro, criar uma conexão, coração a coração, com quem você convive diariamente no trabalho. Quando eu crio a consciência de mim e do outro e me importo com os outros, eu dou o meu melhor para resolver problemas. Ao menos eu estarei solícito para que as situações desafiadoras de trabalho possam ter boas resoluções. Levar espiritualidade para as empresas nem sempre significa levar catequese ou conceitos divinos. Significa, tão somente, estar presente. Então, a espiritualidade surge como uma aliada de cada colaborador para o equilíbrio das emoções, da maneira de ser, de pensar e de agir dentro da ética e do bem, de forma consistente. Especificamente em minha experiência, gestão, pares e parceiros sabem do meu trabalho de Evangelização e com a Música. Assim, em muitos momentos celebrativos, e até mesmo durante reuniões de estratégia, frequentemente me pedem que eu partilhe com todos uma mensagem ou cante uma canção, o que faço prontamente e sempre a partir da Boa Nova do Evangelho, incentivando ao fim que outros colegas também se expressem, para que além do caráter meramente religioso, todos naquela hora percebam e tomem consciência do aspecto ontológico e metafísico que possuímos.


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In Memoriam

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Atos da Cúria Foram 59 os documentos expedidos pela Cúria Diocesana no período de 10 de março a 05 de maio de 2021. Dentre estes destacam-se:

•Carta de Dom Wilson aos Párocos e Administradores Paroquiais, dispensando-os por seis meses do pagamento dos serviços de RH e Contabilidade como também da décima paroquial. •Autorização para ministrar os Sacramentos da Iniciação •Admissão às Ordens Sacras do Seminarista Marciano Cristã para as seguintes Paróquias: Jesus Ressuscitado, Santíssima Inácio Batista. Trindade, São Benedito de Pindamonhangaba, N. Sra. Mãe da •Declaração de Ordenação Diaconal de Julius Rafael Silva Igreja, São José Operário de Taubaté, São José de Tremembé, São de Barros Lima. Pedro Apóstolo, Paróquia N. Sra. de Fátima de Pindamonhangaba, •Declaração de Ordenação Diaconal de José Amarildo N. Sra. das Graças, N. Sra. da Assunção, São Cristóvão, e Paróquia Rangel Júnior. N. Sra. do Rosário. •Declaração de Ordenação Diaconal de Miguel Gustavo de •Concessão do Ministério Extraordinário da Sagrada Almeida. Comunhão Eucarística (MESCE) – Paróquia São José de •Decreto de Reunificação do Seminário Diocesano Santo Tremembé. Antônio. •Autorização ao Revmo. Pe. Gabriel Henrique de Castro •Nota de falecimento “In memoriam”: Mons. Joaquim para binar nos dias santos de guarda e concessão de faculdade Ferreira Xavier Júnior. para absolver apóstatas da fé, hereges e cismáticos durante o ano. •Renomeação do Pe. Silvio José Dias como Ecônomo •Autorização concedida à Paróquia N. Sra. do Bom Sucesso Diocesano. para assinar contrato com a Empresa Origem Cultural.


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MENSAGEM DA 58ª ASSEMBLEIA GERAL DA CNBB AO POVO BRASILEIRO

Esperamos novos céus e uma nova terra, onde habitará a justiça. (2Pd 3,13)

Movidos pela esperança que brota do Evangelho, nós, Bispos do Brasil, reunidos, de modo online, na 58ª Assembleia Geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil-CNBB, de 12 a 16 de abril de 2021, neste grave momento, dirigimos nossa mensagem ao povo brasileiro. Expressamos a nossa oração e a nossa solidariedade aos enfermos, às famílias que perderam seus entes queridos e a todos os que mais sofrem as consequências da Covid-19. Na certeza da Ressurreição, trazemos em nossas preces, particularmente, os falecidos. Ao mesmo tempo, manifestamos a nossa profunda gratidão aos profissionais de saúde e a todas as pessoas que têm doado a sua vida em favor dos doentes, prestado serviços essenciais e contribuído para enfrentar a pandemia. O Brasil experimenta o aprofundamento de uma grave crise sanitária, econômica, ética, social e política, intensificada pela pandemia, que nos desafia, expondo a desigualdade estrutural enraizada na sociedade brasileira. Embora todos sofram com a pandemia, suas consequências são mais devastadoras na vida dos pobres e fragilizados. Essa realidade de sofrimento deve encontrar eco no coração dos discípulos de Cristo[1]. Tudo o que promove ou ameaça a vida diz respeito à nossa missão de cristãos. Sempre que assumimos posicionamentos em questões sociais, econômicas e políticas, nós o fazemos por exigência do Evangelho. Não podemos nos calar quando a vida é ameaçada, os direitos desrespeitados, a justiça corrompida e a violência instaurada[2]. Louvamos o testemunho de nossas comunidades na incansável e anônima busca por amenizar as consequências da pandemia. Muitos irmãos e irmãs, bispos, padres, diáconos, religiosos, religiosas, cristãos leigos e leigas, movidos pelo autêntico espírito cristão, expõem suas vidas no socorro aos mais vulneráveis. Com o Papa Francisco, afirmamos que “são inseparáveis a oração a Deus e a solidariedade com os pobres e os enfermos”[3]. As iniciativas comunitárias de partilha e solidariedade devem ser sempre mais incentivadas. É Tempo de Cuidar! Somos pastores e nossa missão é cuidar. Nosso coração sofre com a restrita participação do Povo de Deus nos templos. Contudo, a sacralidade da vida humana exige de nós sensatez e responsabilidade. Por isso, nesse momento, precisamos continuar a observar as medidas sanitárias que dizem respeito às celebrações presenciais. Reconhecemos agradecidos que nossas famílias têm sido espaço privilegiado da vivência da fé e da solidariedade. Elas têm encontrado nas iniciativas de nossas comunidades, através de subsídios e celebrações online, a possibilidade de vivenciarem intensamente a Igreja doméstica. Unidos na oração e no cuidado pela vida, superaremos esse momento. Na sociedade civil, os três poderes da República têm, cada um na sua especificidade, a missão de conduzir o Brasil nos ditames da Constituição Federal, que preconiza a saúde como “direito de todos e dever do Estado”[4]. Isso exige competência e lucidez. São inaceitáveis discursos e atitudes que negam a realidade da pandemia, desprezam as medidas sanitárias e ameaçam o Estado Democrático de Direito. É necessária atenção à ciência, incentivar o uso de máscara, o distanciamento social e garantir a vacinação para todos, o mais breve possível. O auxílio emergencial, digno e pelo tempo que for necessário, é imprescindível para salvar vidas e dinamizar a economia[5], com especial atenção aos pobres e desempregados. É preciso assegurar maiores investimentos em saúde pública e a devida assistência aos enfermos, preservando e fortalecendo o Sistema Único de Saúde – SUS. São inadmissíveis as tentativas sistemáticas de desmonte da estrutura de proteção social no país. Rejeitamos energicamente qualquer iniciativa que intente desobrigar os governantes da aplicação do mínimo constitucional do orçamento na saúde e na educação. A educação, fragilizada há anos pela ausência de um eficiente projeto educativo nacional, sofre ainda mais no contexto da pandemia, com sérias consequências para o futuro do país. Além de eficazes políticas públicas de Estado, é fundamental o engajamento no Pacto Educativo Global, proposto pelo Papa Francisco[6]. Preocupa-nos também o grave problema das múltiplas formas de violência disseminada na sociedade, favorecida pelo fácil acesso às armas. A desinformação e o discurso de ódio, principalmente nas redes sociais, geram uma agressividade sem limites. Constatamos, com pesar, o uso da religião como instrumento de disputa política, justificando a violência e gerando confusão entres os fiéis e na sociedade. Merece atenção constante o cuidado com a casa comum, submetida à lógica voraz da “exploração e degradação”[7]. É urgente compreender que um bioma preservado cumpre sua função produtiva de manutenção e geração da vida no planeta, respeitando-se o justo equilíbrio entre produção e preservação. A desertificação da terra nasce da desertificação do coração humano. Acreditamos que “a liberdade humana é capaz de limitar a técnica, orientá-la e colocá-la ao serviço de outro tipo de progresso, mais saudável, mais humano, mais social, mais integral”[8]. É cada vez mais necessário superar a desigualdade social no país. Para tanto, devemos promover a melhor política[9], que não se submete aos interesses econômicos, e seja pautada pela fraternidade e pela amizade social, que implica não só a aproximação entre grupos sociais distantes, mas também a busca de um renovado encontro com os setores mais pobres e vulneráveis[10]. Fazemos um forte apelo à unidade da sociedade civil, Igrejas, entidades, movimentos sociais e todas as pessoas de boa vontade, em torno do Pacto pela Vida e pelo Brasil. Assumamos, com renovado compromisso, iniciativas concretas para a promoção da solidariedade e da partilha. A travessia rumo a um novo tempo é desafiadora, contudo, temos a oportunidade privilegiada de reconstrução da sociedade brasileira sobre os alicerces da justiça e da paz, trilhando o caminho da fraternidade e do diálogo. Como nos animou o Papa Francisco: “o anúncio Pascal é um anúncio que renova a esperança nos nossos corações: não podemos dar-nos por vencidos!”[11] Com a fé em Cristo Ressuscitado, fonte de nossa esperança, invocamos a benção de Deus sobre o povo brasileiro, pela intercessão de São José e de Nossa Senhora Aparecida, padroeira do Brasil. Brasília, 16 de abril de 2021. Dom Walmor Oliveira de Azevedo Arcebispo de Belo Horizonte – MG Presidente da CNBB

Dom Jaime Spengler, OFM Arcebispo de Porto Alegre – RS 1º Vice-Presidente

Dom Mário Antônio da Silva Bispo de Roraima – RR 2º Vice-Presidente

Dom Joel Portella Amado Bispo Auxiliar do Rio de Janeiro – RJ

Secretário-Geral da CNBB

[1] cf. Gaudium et Spes, 1. [2] cf. CNBB, Mensagem ao Povo de Deus, 2018. [3] Papa Francisco, Mensagem para o IV Dia Mundial dos Pobres, 2020. [4] Constituição Federal, art. 196. [5] cf. CNBB, OAB, C.Arn´s, ABI, ABC e SBPC, O povo não pode pagar com a própria vida,10 de março de 2021. [6] cf. Papa Francisco, Mensagem para o lançamento do Pacto Educativo Global, 12 de setembro 2019. [7] Papa Francisco, Laudato Si´, 145. [8] Papa Francisco, Laudato Si´, 112. [9] Papa Francisco, Fratelli Tutti, Cap. V. [10] cf. Papa Francisco, Fratelli Tutti, 233. [11] Papa Francisco, Mensagem 58ª. AG CNBB.

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