Edição 1125

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Diário da Cuesta

NA DEFESA DO MEIO AMBIENTE E DA CIDADANIA EM BOTUCATU ANO IV Nº 1125 SÁBADO E DOMINGO , 15 E 16 DE JUNHO DE 2024 Acompanhe as edições anteriores em: www.diariodacuesta.com.br O “pena mágica”!
de Benedito Vinício Barreiros Aloise, o “Vina” Símbolos de Botucatu. Consagrados por Vinício:
Ilustração
Revista Peabiru
Ilustrações à bico de pena... O desenho mágico de Benedicto Vinício Aloise, o Mestre!
Diário da Cuesta

A LAÇADA

O experiente fazendeiro Isaltino Pires, bem sucedido pecuarista de nossa região, embora podendo desfrutar de um completo centro de manejo para gado de corte, com instalações bem planejadas, dispondo de seringa, tronco, balança e embarcadouro, não titubeava em desprezar essas modernidades, para presenciar uma boa disputa de tiro de laço entre seus peões.

Para tanto, reuniu seus dois melhores laçadores, que aguardavam apenas uma oportunidade para demonstrarem seus inequívocos dotes de peões exímios.

João Ignácio, o peão mais velho e traquejado, compareceu ao desafio montando garbosamente sua empavonada mula tordilha, bem arreada, com lustroso porta-capela, pelego vermelho-sangue, baldrana lavrada adornada por botões metálicos e franjas. O peitoral de argolas, o freio água-choca com cabeçada bem trabalhada e o cabresto também de argolas, completavam o aparatoso conjunto. O “instrumento” principal, o laço, pendia em rodilhas pela anca do animal, roçando-o até o jarrete quando o trote tornava-se mais acelerado, balançando desde a argola até o caroço da iapa (ilhapa).

Pedro Terêncio, o outro peão, mulato

esguio, mais jovem e talvez por isso, mais arrojado, despontou trotando o pingo castanho frente-aberta, calçado das quatro patas, com os pelos dos machinhos levemente aparados, ainda um pouco cosquento, é verdade, mas fogoso e ligeiro, pronto a disparar ao menor incentivo das rosetas do ginete. O laço de doze braças, trançado com quatro tentos, pendia na anca, bem atado nos tentos, com a laçada bem aberta para facilitar o trabalho do laçador. A outra extremidade do laço, mais precisamente a presilha achava-se abotoada pela “charrua” ao potente chinchador pendente da argola do travessão de duas barrigueiras que atravessava perpendicularmente o porta-capela, alcançando, apertando e pregueando o ventre do animal. A cauda apresentava-se adornada mediante artístico nó, emplumando parcialmente os pelos da vasoura, bem a gosto do esnobe peão.

Os dois contendores aproximaram-se do velho patrão que os saudou com indisfarçada satisfação, antevendo lances de destreza, técnica, coragem e alguma pabulagem.

Isaltino, astuto e matreiro para situações como essa, demonstrava claramente sua preferência pelo peão João Ignácio, mais discreto e que era empregado da fazenda há muito mais tempo que o seu fogoso oponente.

Os dois bois, até então escondidos, seriam trazidos, um de cada vez, no momento da prova.

O tiro de laço deveria ser irrepreensível por exigência de Isaltino Pires, que aprendera a laçar com o Zico Alemãomestre na arte e sobejamente conhecido nos campos de Alambari (Piapara), Oiti, Botucatu e Mato Grosso - e caberia aos peões litigantes respeitar a técnica por ele preconizada, acarretando perda de pontos para o contendor desobediente. Vários fiscais, em pontos estratégicos deveriam conferir os detalhes da prova.

A laçada deveria cair em um plano quase paralelo ao lombo da rês, e sua extremidade (do laço) anterior, ligeiramente levantada, chegaria ajustada ao nível das pontas dos chifres, caindo sobre a frente do animal, acima do focinho.

Com todas as recomendações acertadas, o primeiro boi foi trazido para a arremetida do peão mais velho, no caso, o João Ignácio. Era um boi mestiço, fumaça, chifres ponteagudos limitando a marrafa, cupim pouco desenvolvido, barbela bem pregueada, paleta mais escura, quase negra, escorregando essa tonalidade mais forte pelos braços, antebraços, joelhos, canelas, boletos, sobre-unhas, quartelas e cascos.

Benedito Vinicio Aloise Acervo Peabiru.

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Diário da Cuesta

AGOSTINHO MINICUCCI

Deram-me uma difícil tarefa, falar do Vinício. Dele não se fala. Admira-se. Ele é tão facetado de atributos que você tem a impressão que, ao retratá-los, vai esquecer de muitos que ficam esperando na fila da memória.

Vinício foi uma criança que nasceu com os olhos bem abertos, já desenhando o ambiente na retina recém-nata.

Como criança rabiscava paredes e desenhava, nas calçadas, o distintivo do Palmeiras.

Os professores da escola de 1º Grau gostavam muito dele. Tinha letra bonita e usava lápis de cor como ninguém. Foi para o ginásio. O seu caderno de rascunho tinha mais desenhos e rabiscos que matéria de escola, principalmente ilustrações relacionadas com a vida campeira vivida no Alambari.

Um dia apareceu ele à minha sala de orientador educacional, tímido e envergonhado, com uma folha de papel na mão.

- Professor, trouxe um presente para o senhor. Era o desenho de um cavalo de pelagem luzidia, com exuberância de detalhes na imponência de garanhão fogoso. Tinha-se a impressão de vê-lo ao galope cortando as campinas.

Vi o desenho. Olhei-o. Vinício mantinha-se imóvel, os olhos de adolescente faiscando, na ânsia de uma apreciação.

- Foi você que fez, Vinício?

- Pergunte pra minha mãe.

Dali para adiante, Vinício e desenho não se separaram. Eram um conjunto matemático. Não se podia entender Vinício sem desenho ou desenho sem Vinício.

Foi para o Normal. Alguns professores o entendiam, outros, não, mas essa saga é de todo o estudante, principalmente aqueles que tem a pinta de gênio.

E ele passou a desenhar e a valorizar os meus livros. As pessoas liam o que eu escrevia e, ao final, perguntavam:

- Como desenha bem o Vinício! Quem é esse rapaz?

O Vinício é, no momento, uma cultura polimorfa. Se você conversa com ele sobre Itália, por exemplo, ele lhe desfila, numa linguagem quente, vívida e fluente, a história, a política italiana, a sua geografia e, principalmente, a culinária. Dá a impressão de que viveu por anos e anos na terra de Dante. E não se espante quando ele começa a falar no idioma de Leonardo da Vinci.

Conhece a história de Botucatu como ninguém. Cita nomes, lembra fatos e descarrega eventos.

Fala da cidade de São Paulo, de sua arquitetura, da sua história, de seus restaurantes e do seu Palestra Itália, como palmeirense convicto. Diz, com precisão, a escalação do quadro de 1923, quantos gols foram marcados, o juiz que atuou e a renda do jogo.

Parodiando Euclides da Cunha, pode-se dizer que Vinício é, antes de tudo, um botucatuense. Tem para com sua terra um Complexo de Édipo que ele faz questão de não resolver e Freud que se dane.

Tivesse ele vindo para São Paulo, como desenhista de uma revista ou de uma agência de publicidade, seria hoje um. Renome nacional ou internacional. Tem, no entanto, um vínculo botucatuense preso ao seu umbigo nascido naquela serra. Ele não apenas desenha, mas cria no processo de criação, é original, fluente, flexível.

EXPEDIENTE

NA DEFESA DO MEIO AMBIENTE E DA CIDADANIA EM BOTUCATU WEBJORNALISMO DIÁRIO

Acompanha-o sempre um senso de humor à Chico Anísio em que você precisa interpretar para entender.

Ele é um desses amigos que, com o tempo, acabam sendo irmãos com os quais vocês se vincula fraternalmente.

Discutimos e analisamos os desenhos, que vocês, vão ver, por horas sem fim num tempo célere. No convívio com Vinício a gente aprende muito, ri bastante, conhece a história e vive a estória, esquecendo, às vezes, o presente e entrando nos tempos que foram e ficaram na sua pena.

Este é um livro que vive a imagem e fala por si, na eloquência dos traços que revivem pessoas, relembram fatos e concretizam eventos.

Poder-se-ia perguntar:

- Que seria de Piapara sem o Vinício?

As imagens feitas desenho, estão, no entanto, dizendo:

- Obrigado, Vinício, por nos reviver e tornar-nos imortais.

AGOSTINHO MINICUCCI (prefácio do livro)

Diário da Cuesta

UM REGISTRO HISTÓRICO DA IMPORTÂNCIA DAS REUNIÕES DA COLÔNIA

ITALIANA EM ALAMBARI (PIAPARA)

“...Pino Filliponi, que trabalhava na chave da estrada sorocabana, animava as festas de Pietro Aloísi, com sua chorosa e romântica sanfona. Ela falava, no seu gemido, muito da saudade da Itália.

- Vamos, Pino, o sole mio...

Os italianos de Botucatu estavam chegando, eram os Martin, os Pedretti, os Delmanto, os Minicucci, os Guadanini, os Alfredi, os Tortorela, os Simonetti, os Losi, os Lunardi, os Blasi, os Bacchi, os Pompia- ni, os Molini, os Mori, os Monteferrante.

Cada encontro era saudado com gritos, palavrões, corteses gesticulações na- politanas, esbravejamentos calabreses e risadas de Campobasso.

A comida farta e generosa, regada pelo melhor vinho, esquentava os ânimos, es- parramava alegria, esfuziava gestos, ex- plodia gargalhadas. Alambari revivia a Itália.

Esses almoços em Alambari, constituíam um prolongamento dos encontros italianos na conhecida “Pensão Franchino” em Botucatu (baixada), famosa pela qualidade de suas massas e de propriedade de Francesco Aloisi, “fratello” de Pietro.

E falava-se de tudo, desde Vitório Emanuelle até Il Duce, da Revolução de 24 ao Prefeito Cardosinho de Botucatu.

Era proibido falar italiano, pois a diversidade de dialetos impedia o entendimento. Também não se podia falar o português. Mas todos se entendiam na alegria, no vinho, nos abraços e nos apetitosos quitutes de Dona Antônia e suas filhas que não paravam o dia todo na faina de bem servir.

Vado Tonin, com sua máquina fotográfica, tipo caixão, comprada no Progresso Garcia, ia imortalizando as cenas daquela província da Itália, chamada Alambari.

- Qui é la própria Itália... Qualquer giorno, o Vesúvio começa a vomitar bra- sa ali... E mostrava a Serra de Botucatu... Guarda, Dr. Aleixo, não parece próprio a nostra Itália?!?

A festa ia pela madrugada afora...”

( “As Boiadas Passam...As Lembranças Ficam...”, 1992, págs. 83/85, de Agostinho Minicucci e ilustrações de Benedito Vinício Aloise).

DIRETOR: Armando Moraes Delmanto

EDITORAÇÃO E DIAGRAMAÇÃO: Gráfica Diagrama/ Edil Gomes

Contato@diariodacuesta.com.br Tels: 14.99745.6604 - 14. 991929689

O Diário da Cuesta não se responsabiliza por ideias e conceitos emitidos em artigos ou matérias assinadas, que expressem apenas o pensamento dos autores, não representando necessariamente a opinião da direção do jornal. A publicação se reserva o direito, por motivos de espaço e clareza, de resumir cartas, artigos e ensaios.

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R T I G O Vinício
A
Aloise

CARICATURAS FEITAS POR VINÍCIO

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M. DELMANTO
ARMANDO
FRANCISCO MARINS HERNÂNI DONATO AGOSTINHO MINICUCCI JOSÉ ANTONIO SARTORI JOSÉ CELSO SOARES VIEIRA

ILUSTRAÇÕES FEITAS PARA JORNAIS DE BOTUCATU

MILTON MARIANO, OSMAR DELMANTO E ADOLPHO DINUCCI VENDITTO

DA CUESTA

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DIÁRIO MILTON MARIANO E ANTÔNIO DELMANTO

ILUSTRAÇÕES SOBRE COMITIVAS

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Revista Peabiru LIVRO DO VINICIO E SUAS ILUSTRAÇÕES PARA LIVROS

FANTASIA PARA O CORAÇÃO

A arte sempre envolve uma manifestação que nos transporta a um outro mundo, perdido mundo, onde os sonhos se tornam uma realidade tão viva que não desejamos acordar mais daquela fantasia.

Assim são os desenhos artísticos do meu amigo Vinício. A perfeição dos traços, a sutileza na criatividade dos seres ou personagens, o humor contido - mas insinuante e irônico -, a dosagem harmoniosa das cores, a contagiante comunicação que conduz ao embevecimento... tudo isso é um pouco da obra tão grandiosa deste desenhista botucatuense de Piapara.

Vinício que nos conduz a um labirinto artístico como a linha de Ariadne, me leva ao mundo encantado do faz-de-conta. Imagino-o garoto de seis anos, brincando no quintal de sua casa. Filho único, vivencia suas brincadeiras com um caminhãozinho, carregando-o de terra e transportando-o de um canto para outro, numa comprida viagem que não acaba mais. De repente, uma lanterna. Estranha lanterna.

Como viera parar ali? Curioso, pega-a, revira-a e tenta destampá-la.A tampa é dura, muito dura, para suas ainda frágeis mãozinhas de menino. Mas, súbito, se abre. Então ele nota, espantado, que da lanterna sai uma fumaça fininha a princípio, mas grossa depois. E essa fumaça toma contorno de um imenso homem gordo, bigodudo e careca, com uma trancinha atrás da cabeça. Era um gigante, o gigante da lâmpada, que há séculos esperava por seu libertador. E o fantástico ser lhe disse, em voz tonitruante:

- Meu amo e libertador. Faça três pedidos que eu te atenderei.

Atônito, o garoto disse ao gigante:

Eu quero que minha família seja feliz.

Você será muito feliz com seus pais - disse o gigante. Mas eu vou prever o teu futuro também.

Você vai se casar com uma jovem e bonita professora, de nome Lourdes. Vocês terão dois filhos: o Vina e o Eduardo. Suas noras lhes serão muito queridas. Na velhice, terão a doce alegria dos netos. Ainda lhe darei o poder de fazer amigos. Eles serão tantos que, como as incontáveis estrelas do céu, você não conseguirá contar o número deles.

Tá bom, grandão, mas vou te fazer o segundo pedido. Eu quero poder desenhar o que vejo e o que imagino. Como você tem um coração bondoso, desprendido e não pediu riquezas, vou-lhe dar o poder de encantar pessoas com a arte do desenho. Sua arte será admirada por todos que a virem. Você fará desenhos para gente famosa no Brasil. Um poeta, chamado Manuel Bandeira, vai sentir-se encantado com a ilustração de seu reino imaginário de “Vou-me embora pra Pasárgada”, ilustrado por você; Francisco Marins vai solicitar sua arte em “Verde era o

coração da montanha”; jornais e revistas terão ilustrações suas; mas será na Faculdade de Medicina de Botucatu que você vai passar a maior parte de sua existência profissional, dando vida artística a cadáveres, numa contribuição para a ciência.Na central de Recursos Humanos da CESP, ali bem pertinho da serra, onde as vozes dos duendes virão, em forma de aves, saudá-lo, nas manhãs de sol, você também vai pontuar seu trabalho com a arte dos predestinados, aposentando-se, então.

Puxa! Quanta coisa, hem grandão! Já to cansado de te ouvir. Mas vou fazer o último pedido: Eu gosto muito de futebol e já torço pro Palmeiras. Será que dá pro Palmeiras ter grandes jogadores e ser campeão pra sempre?

Pra sempre, eu nao posso fazer porque tem o corinthians, mas voce vai ver seu time predileto muitas vezes campeão. Chegará um tempo em que ele vai se tornar o campeão das cinco coroas e você ficará muito feliz. Você vai fazer um desenho do plantel do Palmeiras que será exposto na sala de troféus do time, em São Paulo. Adeus.

Como num sonho gostoso e bom, o gigante sumiu. E o Vinicio cresceu, e o Vinício casou, e o Vinício se tornou pai e avô, e o Vinício nos leva em seu tapete voador para o mundo do faz-de-conta, onde não há ódio, mas só amor e fantasia; e o Vinício continua palmeirense de coração, artesão verde que pule com arte a esperança do bem viver.

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VANGUARDA DE BOTUCATU (Albergue Noturno)

REVISTA PEABIRU (Escola Normal)

LIVRO “VERDE ÉRA O CORAÇÃO DA MONTANHA, DE FRANCISCO MARINS

DIÁRIO DA CUESTA (O Gigante Deitado)

Diário da Cuesta 9 ILUSTRAÇ Õ ES PARA A IMPRENSA

LEITURA DINÂMICA

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– Amigos e educadores de Botucatu, o prof. Agostinho Minicucci e o prof. Vinício Aloise fizeram inúmeros trabalhos juntos

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– O livro escrito por Minicucci e Vinício retrata a Botucatu rural/ ecológica, com suas comitivas, seus tropeiros e a Piapara (Alambari) que era rota do progresso...

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– Continua uma promessa o aproveitamento turístico de Piapara (Alambari). A exploração da água mineralizada de Piapara está a merecer do Poder Público o devido apoio e implantação viabilizando, assim, o grande sonho dos botucatuenses do passado.

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– Encontro literário em evento da ABL – Academia Botucatuense de Letras

– Ilustração das Três Pedras do mestre Vinício Aloise em seu livro “Uma História Desenhada”

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3
– O retrato histórico de Piapara através da pena de Vinício Aloise

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