ComunidadesUSA #17

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M pá ais gi na s

The Portuguese-American Monthly Magazine in the US

May 2009 • vol. III • nº 17 • $3

Há mais de 31 milhões de portugueses e luso-descendentes em todo o mundo

Lucília Prates

Uma mulher com uma missão

John Abraches

lembrando o último fllho do herói português Sousa Mendes

Maria João

Desiludida com Portugal, luso-americana muda-se para os EUA

Cila Santos

Nos clubes portugueses também se faz cultura

Centro de Interpretação do Vulcão dos Capelinhos Os Açores na rota do conhecimento mundial



The Portuguese-American Magazine in the United States

vol. II • nº 17 • edição dupla abr/MAY 2009 www.ComunidadesUSA.com

CAPA

CAPELINHOS

Neste número: 2 – EM FOCO – Concurso de documentários nos países de língua portuguesa; XVII Encontro de Professores de Português da APPEUC realiza-se este ano na Bermuda 3 – FALATÓRIO 4 – ACTUAL Montreal com bandeira e bancos portugueses em parque da cidade; se vai à Colômbia, leia o que aconteceu a um casal português; Uruguai vai ensinar português nas escolas públicas 5 – ACTUAL – 31.2 milhões de portugueses e luso-descendentes no mundo; remessas de emigrantes diminuem um terço; lembrando Joaquim Agostinho 25 anos depois da sua morte 11 – ESPECTÁCULOS – Taxi regressam 22 anos depais; Amália, o fado em versão pop; a música para torturar 19 – PORTUGAL – Recordando os 200 anos das invasõe sfrancesas 45 – ENGLISH – Video - Saudade

14 –Centro de Interpretação do Vulcão dos Capelinhos, Faial: os Açores na rota do conhecimento mundial

Secções 10 – RUMORES DA DIÁSPORA – Francisco Costa, por Diniz Borges 22 – NA MARGEM de CÁ – Ilha Faceira, por Lélia Nunes 27 – VINHOS – por Mariana Simões 32 – A Rosinha da Foz – por Edmundo Macedo 34 – DA AMÉRICA e das COMUNIDADES – as crónicas da Califónria, por Diniz Borges 36 – Crónica de um enófilo – Vida de Cão, de água, por Dionísio Amado 37 – PARTIDA – A odiseeia de uma família açoriana, por Adalino Cabral 40 – HISTÓRIA, por Mayone Dias 43 – AN AZOREAN in the MIDWEST – por Manuel Ponte 46 – ENGLISH – April 25, 1974 por Antópnio Simões 48 –HUMOR

24 - LUCÍLIA PRATES: uma mulher com uma missão interminável Família Cabral: a odisseia de emigração de uma família açoriana

41 - Luís ABRANCHES: desaparece o último filho do herói Aristides de Sousa Mendes

29 - MARIA JOÃO: luso-americana que se mudou para Portugal decidiu regressar desiludida com o país


EM FOCO The Portuguese-American Monthly Magazine in the USA www.ComunidadesUSA.com

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Concurso de documentários nos países de língua portuguesa Todos os cidadãos da CPLP podem concorrer independentemente de viverem ou não nos países de nacionalidade O Programa de Fomento à Produção e Teledifusão do Documentário da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (DOCTV CPLP) vai disponibilizar um milhão de euros em acções de formação, produção e difusão televisiva de projectos nos Estados-membros. O programa assenta na componente de formação de profissionais, na produção de nove projectos de documentário seleccionados - um por país - e na difusão televisiva da totalidade dos documentários, em todos os países.Tratase de um projecto pioneiro realizado simultaneamente em todos os Estados-membros da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa), centrado na promoção da língua e da cultura das populações de expressão portuguesa. O DOCTV CPLP inclui a realização de um concurso internacional para a produção de documentários, componente principal da iniciativa, cujas inscrições estão abertas a autores independentes dos países aderentes até 21 de Maio de 2009. Podem candidatar-se

todos os realizadores dos países membros da CPLP, mesmo que residam fora do seu país de origem, já que o requisito para a participação é a nacionalidade. No caso de Macau, pelas suas características, é a residência. Em cada país será criada uma comissão nacional de selecção para escolher um projecto de documentário. O seleccionado receberá 50 mil euros para a produção do projecto, que deverá ser concretizado em seis meses. O concurso internacional “será sediado em Portugal, que receberá as candidaturas, mas cada país fará a sua escolha, através de um pólo nacional composto pelo Ministério da Cultura, a autoridade nacional de cinema e a emissora pública de televisão de cada participante. Em Junho de 2010, todos os países-membros irão exibir os seus documentários, “que depois serão também exibidos nos outros países. Para mais informações, basta aceder ao site da CPLP (www.cplp.org). As inscrições estão abertas no sítio www.ica-ip.pt.

XVII Encontro de Professores de Português dos EUA e Canadá este ano na Bermuda O XVII Encontro de Professores de Português dos Estados Unidos e Canadá realiza-se este ano de 10 a 17 de Julho na ilha da Bermuda. O encontro deste ano tem um formato diferente dos anteriores uma vez que parte das sessões de trabalho vão ter lugar a bordo de um cruzeiro aquelas ilhas. Ao longo de 7 dias haverá sessões de trabalho a bordo e no clube português Vasco da Gama, da cidade de Hamilton nas Bermudas. “Este é um encontro diferente que tem por objectivo colocar os encontros de professores a par com os outros eventos promovidos por grupos de profissionais no mundo norteamericano”, disse o presidente da Associação de Professores de Português dos Estados Unidos e Canadá (APPEUC), responsável pela

organização. O encontro/cruzeiro está aberto a professores das escolas comunitárias e do ensino oficial americano, de todos os níveis, pais, alunos, directores pedagógicos, comissões escolares, administradores escolares, dirigentes do movimento associativo, enfim a TODOS que estejam interessados na língua e cultura portuguesas. Para mais informações contacte a APPEUC através do e-mail appeuc@appeuc. org, ou o telefone (914) 720-8705.


... a falar é que a gente se (des)entende

FALATÓRIO

Uma página politicamente (in)correcta onde as opiniões e afirmações expressas não coincidem necessariamente com as dos proprietários e editores da revista

E o burro sou eu?

Parece que os interrogatórios com intimidações e ameaças a cidadãos comuns, crianças e trabalhadores, voltaram a Portugal. Imaginem, foi preciso termos um governo alegadamente de esquerda para fazer um regresso ao triste passado. A fazer fé nas notícias, inspectores da Direcção Regional da Educação do Centro terão ido à escola secundária de Leiria onde em Novembro um grupo de alunos atirou ovos (não sapatos...) à ministra da Educação, em protesto contra as suas políticas. Na altura a polícia chegou a arrear em alguns alunos (também já vimos esse filme anteriormente) mas a coisa ficou por ali. Agora, decididos a esclarecer a coisa, os tais inspectores interrogaram os alunos e quiseram saber se por detrás do protesto não estavam professores, ou outros agitadores. E obrigaram-nos a assinar uma folha com as declarações, da qual não lhes deram cópias. A Associação de Pais reagiu, mas a Direcção Regional do Centro diz que está tudo dentro da lei. Pois claro, também no tempo da PIDE estava. Lembram-se?

“Barack Obama tem muitas limitações”, diz Jorge Sampaio, expresidente da República portuguesa. Por falar em limitações, alguém se lembra de uma única medida que Sampaio tenha tomado durante os seus 10 anos de presidência (à excepção de ter deixado Santana Lopes governar o país 6 meses, claro...)?

62.000

detenções da polícia portuguesa em 2008. O que dá uma média de 7 prisões por hora. Ufa... Mesmo assim as autoridades portuguesas dizem que o crime diminuiu...

Pela nossa saúde... A fazer fé nas notícias alguns emigrantes portugueses também terão sido burlados pelo BPN e pelo BPP, acreditando, ao darem a estes bancos as suas poupanças, estarem a fazer depósitos a prazo com juros e retornos garantidos. Aparentemente não leram as letras pequeninas (o chamado fine print, nos Estados Unidos) onde se dizia que o banco era livre de usar os depósitos em aplicações, ou seja, a investirem no mercado especulativo, onde perderam tudo. Ou quase tudo. Ora, estas chamadas aplicações (no meu tempo as aplicações eram apenas funções matemáticas que se faziam na lousa e no caderno e não davam para perder dinheiro nenhum...) não são garantidas pelo Banco de Portugal. Por isso, se os tais bancos forem para o charco, adeus poupanças. No entanto, os administradores destes bancos souberam “aplicar” as suas “aplicações” de modo a receberam salários obscenos e chorudas reformas douradas. Recebiam mensalmente, Dívida de cartões de crédito um ordenado legítimo, e um em “cash”, monstruoso. E no final do ano, meteram nos Estados Unidos ainda ao bolso os famosos bónus. Chama-se a isto “aplicar” muito bem o dinheiro dos 936 mil milhões de dólares outros. No final, e como habitualmente, Dívida média por cada possuidor de cartão com ninguém será condenado. Enfim, com crise balanço: ......................$10,679 ou sem crise, quem paga são sempre os mesmos –os pobres. ComunidadesUSA

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“Chávez suspende mega contrato com Portugal”, título do Expresso. Dizem as más línguas que o negócio de dois mil milhões foi congelado quando Chávez descobriu que os computadores Magalhães vendidos por Sócrates estavam cheio de erros de espanhol...

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deputados do PSD aguentaram até ao final do debate quinzenal com o primeiro-ministro na Assembleia da República – título do Expresso.

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stands (dealers) que a General Motors (GM) vai fechar até 2010 no âmbito da reestruturação da empresa. Os ‘dealers’ passam assim de 6.246 em 2008 para 3.605 em 2010 5


Montreal: bandeira e bancos de granito assinalam presença portuguesa Bandeira passa a estar hasteada no Parc Du Portugal e bancos fazem percurso pela literatura portuguesa na alameda de Saint-Laurent A centenária alameda de Saint-Laurent, a zona portuguesa de Montreal, no Canadá, tem agora um conjunto de doze novos bancos em granito que fazem um trajecto pela literatura portuguesa e expõem pinturas originais em azulejo de artistas plásticos lusos. Instalados ao longo de quase um quilómetro, os bancos estão «decorados» com frases célebres, inscritas em português e em francês no rebordo dos bancos. As frases da dúzia de poetas e escritores portugueses escolhidos, fazem um percurso histórico pela literatura portuguesa desde o século XIII ao nossos dias, iniciando-se por D. Dinis, seguido de Gil Vicente, Luís Vaz de Camões, Padre António Vieira, Bocage, Eça de Queirós e Antero de Quental. Fernando Pessoa faz a transição para o século XX, a que se juntam Miguel Torga, Natália Correia, José Saramago e António Lobo Antunes. Os escritos são o mote para a criação de pinturas em azulejo que os acompanham, a cargo de quatro artistas plásticos de origem portuguesa a viver no Canadá - Carlos Calado, Joe Lima, Joseph Branco e Miguel Rebelo. Este conjunto de referências a Portugal e à sua cultua vem juntar-se ao chamado Parc

Du Portugal, onde também passa agora a estar permanente hasteada a bandeira portuguesa graças à intervenção de um antigo conselheiro das Comunidades. Localizado na histórica alameda Saint-Laurent, em Montreal, o Parque de Portugal – um pequeno jardim com um padrão português e um coreto, na intersecção com a rua Marie-Anne – é uma homenagem da cidade à comunidade portuguesa que ali começou a chegar na década de 1950, instalando-se com a criação de comércios e residências. “Não fazia sentido termos há 20 anos em Montreal um parque com o nome de Portugal, sem a bandeira portuguesa”, frisou à Lusa o comendador Francisco Salvador. Quanto ao projecto dos bancos, deve-se à vereadora portuguesa Isabel dos Santos, que lembrou que se concluem agora três anos de trabalho, já que em Fevereiro de 2006, apresentou uma moção ao executivo do bairro do Plateau Mont-Royal para a criação do bairro português, obtendo um voto favorável por unanimidade. Isabel dos Santos, defendeu, em entrevista à Lusa, a necessidade de reforçar o reconhecimento do contributo e da presença da

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imigração portuguesa. Autarca pelo bairro do Plateau-Montreal, onde se inclui a zona mais portuguesa na cidade, Isabel dos Santos diz que mais do que um projecto de delimitação física de um bairro, o plano dá um “toque” ou uma “assinatura portuguesa” numa área reconhecida como a de maior influência de portugueses na cidade francófona. “Para mim, a concretização deste projecto é um símbolo que marca a presença portuguesa em Montreal à imagem do que a comunidade aqui é: aberta, acolhedora e integrada na sociedade. Por isso não há portas nem fronteiras”, aludiu. A Câmara de Montreal investiu cerca de 200 mil dólares canadianos nos bancos, no quadro do plano geral de requalificação urbanística da centenária alameda de SaintLaurent, num investimento total de 36 milhões de dólares (22,4 milhões de euros). De Portugal, o projecto contou somente com o apoio do Instituto Camões, por intervenção do cônsul de Portugal em Montreal, no sentido de desbloquear os direitos de autor para a utilização e inserção das doze frases dos escritores gravadas nos bancos.

Portugal em foco no Festival Montreal en Lumière Portugal vai ser o país em foco na edição de 2010 do famoso “Festival Montreal en Lumière”, que este ano captou uma audiência de 750 mil pessoas naquela cidade canadiana. O “Festival Montreal en Lumière” (Montreal Iluminada) é o maior evento cultural e de gastronomia e vinhos promovido durante o Inverno naquela cidade, culminando sempre com a denominada “Noite Branca”, na qual se oferecem espectáculos contínuos pela noite dentro. Neste momento, segundo os responsáveis da organização, em preparação do próximo ano estão já a decorrer negociações com as autoridades portuguesas com vista a definir a uma concertação de acções. Em declarações à Lusa, a vereadora portuguesa da Câmara de Montreal, Isabel dos Santos, enalteceu que esta é “uma grande oportunidade para a visibilidade de Portugal e para promover a imagem do país quer do ponto de vista comercial como turístico”. A edição de 2010 deste certame irá decorrer entre 18 e 28 de Fevereiro.

ComunidadesUSA


Se for à Colômbia tenha cuidado, para não lhe acontecer o mesmo... Traficantes iludiram casal português para transportar droga

Dois portugueses, detidos 21 dias na Colômbia por terem considgo 7,8 quilos de cocaína, alegaram que foram vítimas de uma "cilada" de traficantes naquele país. "O estratagema é simples: arranjam forma de meter uma pequena quantidade de droga na bagagem de um turista mais incauto, a polícia no aeroporto é toda mobilizada para esse caso e, entretanto, outros vão embarcando, à vontade, com grandes quantidades", referiu, à Lusa, Maria Filomena. Candidata do Movimento Partido da Terra à Câmara de Mondim de Basto em 2001 e antiga directora do extinto jornal Notícias de Mondim, Maria Filomena foi detida a 14 de Março no aeroporto de Cali, na Colômbia, juntamente com o companheiro, Rómulo Nascimento Pereira, enfermeiro de profissão. O casal tinha consigo uma mochila com 7,8 quilos de cocaína, dissimulada, nomeadamente, num computador portátil e numas caixas de brinquedos. "Claro que nós não tínhamos nada a ver com a droga. Acha que se tivéssemos ido à Colômbia buscar cocaína traríamos apenas sete quilos? Trazíamos, no mínimo, uns 20, que aquilo, pelos vistos, é um excelente negócio. Lá compra-se um quilo por mil euros e depois, em Espanha ou Portugal, vende-se a 35 mil", disse Maria Filomena. ComunidadesUSA

Uns dias antes da data marcada para o embarque Portugal, Rómulo Pereira foi assaltado por três indivíduos, que lhe encostaram uma pistola à cabeça e lhe roubaram o relógio, o anel, o fio de ouro e 400 mil pesos (cerca de 100 euros) que tinha acabado de levantar. Nessa ocasião, um colombiano ofereceu-se

prontamente para ajudar o casal, nomeadamente nas diligências necessárias junto da polícia, tendo-se entretanto tornado "amigo" dos portugueses. No dia do embarque, a 14 de Março, quando Filomena e Rómulo já tinham feito o check-in e se preparavam para entrar no avião, aparece no aeroporto esse mesmo colombiano, pedindo-lhes que levassem uma mochila e a entregassem no aeroporto de Madrid à sua ex-mulher. "Eu ainda disse que não, não e não, que às tantas aquilo ainda tinha droga, mas ele abriu a mochila e garantiu que lá dentro ia apenas um portátil e uns brinquedos para os filhos. E junto a ele estava um homem que apresentou um distintivo de polícia e que nos disse que estivéssemos descansados. Perante isto, a Filomena acabou por ceder, até para pagar ao colombiano a amabilidade que ele tinha tido para connosco após o assalto", contou Rómulo Pereira. "Andei três passos e logo fomos abordados por um outro polícia, a gritar 'Nascimento, Nascimento' e a dizer que levávamos droga na bagagem. Logo lhe disse que se lá estava droga, ela pertencia ao tal colombiano, mas na altura ele não quis saber. Porque certamente não lhe interessava", acrescentou. O tribunal, até com recurso às imagens das câmaras de vigilância do aeroporto, acabou por concluir pela inocência do casal, que regressou a casa a 15 de Abril. VCP (Lusa)

Uruguai vai ensinar português nas suas escolas públicas O Português via passar a ser ensinado nas escolas públicas do Uruguai a partir de 2010 segundo anuciou a ministra uruguaia da Educação e Cultura, Maria Simón, durante a 12ª Conferência Ibero-Americana de Ministros da Cultura, que teve lugar em recentemente em Portugal. "Este ano (o ensino do português) começa nos Centros de Línguas, que são locais onde as pessoas podem aprender idiomas estrangeiros de graça. No próximo ano (lectivo) vamos começar nas escolas públicas", afirmou a ministra. Segundo Maria Simón, a introdução do português no currículo escolar deverá ser gradual e iniciar-se pela fronteira “porque existe o bilinguismo”. A governante acredita que em cinco anos todos os estudantes uruguaios estarão a aprender português e daqui a 11 anos o idioma será de conhecimento generalizado. A ministra considera ainda que a ampliação do ensino de línguas será uma forma de diminuir o abismo social no país. Maria Simón não prevê a contratação de professores brasileiros, mas sim a formação dos uruguaios. "Até agora temos um intercâmbio com Portugal, que nos ofereceu os cursos de formação e livros", explicou, acrescentando que os cursos poderão vir a ser dados com a ajuda de computadores, com o professor a agir como “mediador”.

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AÇORES

TAP e SATA unidas na promoção dos Açores Passageiros partilham voos e serviços na Europa e Madeira A TAP Portugal e a SATA estreitaram a sua cooperação comercial e uniram esforços, ampliando a sua oferta conjunta em novos mercados, designadamente no espaço europeu, com um mesmo objectivo: promover os Açores, contribuindo para reforçar os fluxos de turismo para a Região. As duas companhias aéreas portuguesas aumentam assim o número de serviços em código partilhado, abrangendo, por um lado, voos efectuados pela TAP entre Portugal Continental e a Europa e proporcionando, pelo outro, o reforço da operação da SATA em ligações directas entre os Açores ou a Madeira e a Europa. Em Portugal, é também novidade a inclusão no acordo das cidades de Faro e Porto, servidas pela TAP à saída de Lisboa, bem como de voos entre Lisboa e Porto Santo, operados

por ambas as empresas. Segundo o Presidente do Conselho de Administração do Grupo SATA, o alargamento do code-share vem oferecer inequívocas vantagens a quem procura conhecer um destino como os Açores ou a Madeira. “Com um número acrescido de ligações, que partilham do mesmo código, mesmo boarding pass e possibilidade de envio de bagagem corrida, os passageiros poderão combinar diversos percursos, com diferentes tempos de permanência no destino, o que permite a captação de novos segmentos de mercado, geradores de novos e interessantes fluxos, designadamente os segmentos como o MICE, Corporate, Golf and Leisure que, tipicamente procuram estadias mais curtas”, salienta António Gomes de Menezes.

Dia dos Açores festeja-se a 1 de Junho em Winnipeg, Canadá Toronto, no Canadá, acolhe pela primeira vez as comemorações do Dia da Região, data instituída pelo Parlamento açoriano em 1980, e que este ano se celebra no dia 01 de Junho. Trata-se da segunda vez que as comemorações oficiais do Dia dos Açores se celebram no estrangeiro, uma vez que já decorreram em Fall River, Estados Unidos. Além das comemorações do dia dos Açores, Carlos César vai visitar também Winnipeg e o estado de Rhode Island durante a sua deslocação ao Canadá. "É possível viver a açorianidade fora das nossas ilhas e é a isto que nós queremos dar expressão com o significado desta comemoração fora da região", frisou Carlos César, que manifestou também intenção de comemorar o Dia dos Açores no continente ainda nesta legislatura, acentuando "a qualidade de povo disperso pelo mundo". Carlos César realçou ainda o papel da comunidade açoriana no Canadá, "muito qualificada" e dispersa por ComunidadesUSA

muitas actividades económicas, universitárias e outras. É esta diversidade a que prestamos homenagem, tanto do ponto de vista territorial, como no que se refere às funções que os açorianos desempenham por todo este mundo", reforçou. Em Winnipeg estão radicados cerca de 17 mil açorianos, uma comunidade que segundo José Santos, tem na sua grande maioria "uma vida estável". "Pode existir um ou outro caso, mas por enquanto as empresas não se manifestam com esta crise que se nota em muitos países", garantiu o presidente da Casa dos Açores. Cerca de 40 por cento da comunidade açoriana radicada naquela zona do Canadá trabalha na construção civil e os restantes na área da limpeza e manutenção de edifícios e fábricas. Fundada em 1992, na altura como Centro Cultural Açoriano, a Casa dos Açores de Winnipeg esteve encerrada durante um largo período devido a um incêndio e reabriu em 2001. May 2009

Lagoa gemina-se com Attleboro, MA

As localidades de Lagoa, nos Açores, e de Attleboro, em Massachusetts, EUA, decidiram iniciar o processo que culminará com a respectiva geminação, numa cerimónia prevista para Agosto, anunciou o município açoriano. Na sequência de um encontro entre o presidente da Câmara Municipal de Lagoa, José António Ponte, e o seu homólogo norte-americano, Kevin Dumas, ficou acordado que o protocolo de geminação será assinado em Agosto, quando o autarca de Attleboro se deslocar em visita à ilha de S. Miguel. No quadro deste protocolo, ficou já decidida a presença do Presépio Tradicional de Lagoa na Exposição de Presépios de La Salette, que decorre em Dezembro na cidade norte-americana. Nessa altura, está também prevista uma deslocação do presidente da Câmara de Lagoa a Attleboro, ocasião que será aproveitada para nova cerimónia de assinatura do protocolo de geminação. Lagoa já está geminada com as cidades norte-americanas de Fall River, New Bedford, Bristol, Rehoboth, Taunton e Dartmouht. Estas geminações têm como objectivo promover os laços culturais com a comunidade natural deste concelho açoriano que se encontra radicada nos EUA.

Curso de Verão em Português na Universidade de Massachusetts O 16º Curso de Verão de Português do UMD Center for Portuguese Studies and Culture da Universidade de Massachustts decorre de 6 de Julho a 5 de Agosto próximos e incluirá concertos com agrupamentos musiciais portugueses, brasileiros e cabo-verdianos e conferências por académicos de outras universidades. Este ano, o programa incluirá também um curso intensivo de português em três diferentes níveis - elementar, intermédio e avançado. Está também previsto um seminário initulado “Passagens Transatlânticas na Cultura e Literatura Lusófonas”. O programa oferece ainda, pela primeira vez, um curso intensivo em Língua e Cultura Cabo-Verdianas. Para informações, contacte o telefone 508-9998255 ou ou o site j1fernandes@umassd. edu, ou ainda www. port stud ies.umassd.edu. 8


Há 31,2 milhões de portugueses e luso-descendentes no mundo, segundo estudo de emigrante no Brasil O estudo indica que existem 9,31 milhões de portugueses e luso-descendentes nos Estados Unidos e Canadá e 3,19 milhões em África por Marco Antinossi, da Agência Lusa O total de portugueses e luso-descendentes até à terceira geração soma cerca de 31,19 milhões no estrangeiro e Portugal teria actualmente mais de 40 milhões de habitantes, não fosse a emigração, segundo um estudo publicado no Brasil. A conclusão é resultado de um detalhado estudo realizado pelo empresário português Adriano Albino, 78 anos, através de um levantamento de portugueses que emigraram para diversas partes do mundo, entre 1951 e 1965.

coeficiente multiplicador dessas famílias que chegaram às diferentes regiões do mundo. No Brasil, depois de realizar uma investigação de campo, através de entrevistas e recolha de dados de centenas de emigrantes, o empresário considerou que o factor multiplicador seria nove, o que totaliza 10,8 milhões de portugueses e luso-descendentes. Com base na mesma metodologia, o estudo indica que existem 9,31 milhões de portugueses e luso-descendentes nos Estados Unidos e Canadá, 3,19 milhões em África, 154.800 na Ásia, 7,54 milhões na Europa e 193.360 na Oceania. O estudo levou em consideração o nome do emigrante, estado civil, data de chegada, cidade de origem, número de filhos, netos e bisnetos, de cada uma dessas regiões do mundo. “Isso foi resultado de muita investigação, de muita convivência com a comunidade portuguesa. Caso não houvesse essa diáspora, Portugal teria mais de 40 milhões de habitantes”, sublinhou.

Emigrante é natural de Grijó, Bragança “Foi um período de grande emigração portuguesa para o mundo, depois da abertura do país, com o fim da II Guerra Mundial”, disse o empresário à Agência Lusa. “Durante a guerra, Portugal estava fechado, como uma barragem cheia que se partiu, com uma grande debandada de portugueses à procura de um futuro melhor”, disse. Estatísticas oficiais indicam que 4,53 milhões de portugueses emigraram nesse período, sendo 1,2 milhões para o Brasil, nomeadamente para os estados de São Paulo e do Rio de Janeiro. O estudo “Emigração: A diáspora dos portugueses”, publicado recentemente no Brasil, partiu dos 4,53 milhões de emigrantes originais das estatísticas oficiais e calculou um ComunidadesUSA

Conhecido empresário da comunidade portuguesa, Adriano Albino, natural de Grijó de Parada, em Bragança, emigrou para o Brasil em 1951, então com 18 anos. Logo começou a actuar no sector de turismo, onde foi responsável pela orientação e acompanhamento dos emigrantes portugueses que escolheram o Brasil. “Fiz disto uma empresa, entre 60 a 70 por cento dos portugueses que emigraram para o Brasil passaram pela minha orientação”, disse. Adriano Albino concedeu “milhares de cartas de chamada”, uma exigência na época para a aceitação de um emigrante por parte das autoridades brasileiras. Motivado pelo trabalho, fez muitas viagens a Portugal e aproveitou para recolher dados May 2009

sobre a emigração portuguesa, nomeadamente das regiões rurais do país. Durante quase meio século, o empresário realizou mais de 3.000 programas semanais de rádio dirigidos à comunidade luso-brasileira, em diversas emissoras de São Paulo. Em 1997, publicou o “Roteiro da Saudade”, um guia com um livro, CD e 10 cassetes em áudio, com 112 roteiros sobre Portugal continental e as ilhas da Madeira e Açores.

Franceses são o povo que mais horas dorme Os franceses são o povo que mais tempo passa a dormir e a comer, segundo um estudo agora divulgado. Em média, um cidadão francês dorme 9 horas por dia, quase meia hora a mais do que os americanos, por exemplo. Quanto às refeições, cada francês passa cerca de 2 horas diárias à mesa, à frente dos neozelandeses e japoneses. 9



Remessas de emigrantes diminuem 33% em oito anos Mesmo assim, emigrantes portugueses ainda mandam para Portugal 6,8 milhões de euros por dia Os portugueses radicados no estrangeiro enviaram 6,8 milhões de euros por dia para Portugal em 2008, menos um terço que o valor das remessas de há oito anos, segundo dados do Banco de Portugal calculados pela Lusa. Nos últimos oito anos, as remessas de emigrantes residentes no estrangeiro para Portugal caíram de 3,7 mil milhões de euros em 2001 para 2,5 mil milhões em 2008, ao que se traduziu numa queda de 33 por cento. "A entrada de remessas dos trabalhadores portugueses radicados no estrangeiro têm vindo a diminuir nos últimos anos, o que se deve à nova geografia da população, reflectindo-se na balança de pagamentos", disse à agência Lusa o economista João Ramos da Silva.

O renascimento do Brasil O professor do Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG), Ramos da Silva, destaca que alguns países exteriores à União Europeia, como Angola, Brasil, Singapura e a Venezuela, têm vindo a adquirir uma "importância crescida" no novo mapa da emigração portuguesa. Como exemplo, cita o Brasil que teve um ligeiro decréscimo em 2006 e 2007, mas no ano passado registou um novo aumento (25 por cento): "O Brasil representa actualmente [em remessas] quase metade do valor da Venezuela", sublinha o mesmo especialista. Estes dados vêm confirmar o alerta do Presidente da República que, há cerca de dois meses, defendeu a dinamização das exportações, enfatizando o papel que os emigrantes podem desempenhar na resolução das dificuldades que Portugal atravessa. "A exportação de bens e serviços por parte de Portugal é praticamente a única via que nós dispomos para conseguir combater o crescimento explosivo da dívida externa e, ao mesmo tempo, defender o emprego dos trabalhadores portugueses", defendeu Cavaco Silva. O Chefe de Estado afirmou também que seria importante ter presente que "quanto menores forem as remessas de emigrantes para Portugal, e quanto menor for o seu investimenComunidadesUSA

to no país, menos crédito terão os bancos para conceder às empresas". Em 2008, a Alemanha, França e o Reino Unido, as remessas de emigrantes caíram 13,4 por cento, para 147,6 milhões de euros e 4,2 por cento para 983 milhões de euros e 23,6 por cento para 125 milhões de euros, respectivamente. Dos grandes países da Europa, a Espanha foi a excepção, onde o valor das remessas dos emigrantes apresentou uma

Os 10 que enviam mais remessas País

Valor (2008) Peso

França 983.035 39,60% Suíça 554.125 22,30% EUA 171.462 6,90% Alemanha 147.660 5,90% Espanha 126.232 5,10% Reino Unido 125.011 5,00% Luxemburgo 73.040 2,90% Angola 70.862 2,85% Canadá 56.762 2,30% Venezuela 19.265 0,80%

tendência crescente nos últimos três anos (19,9 por cento em 2006, para 61,8 milhões de euros, de 56,4 por cento em 2007, para 96,7 milhões de euros e 30,6 por cento em 2008, para 126,2 milhões de euros).

França continua à frente A França lidera o "top" dos países da União Europeia em que os emigrantes portugueses enviam mais remessas com 39,6 por cento do total, seguida pela Alemanha com 5,9 por cento, pela Espanha com um peso de 5,1 por cento e do Reino Unido com 3,6 por cento. Ainda na Europa destaque para a Suíça que representa 22,3 por cento do total das remessas.

EUA lideram fora da Europa Fora do espaço europeu, os Estados Unidos lideram graças 171 milhões de euros enviados para Portugal que lhe conferem um peso de 6,9 May 2009

por cento do montante global. Na América Latina sobressai a Venezuela com 19,3 milhões de euros (0,8 por cento do total), para além do já mencionado Brasil. Economistas contactados pela Lusa disseram também que os dois países ibéricos têm "uma forte integração económica" e com o aprofundar da crise no mercado espanhol "é natural" que o valor das remessas venha a reduzir-se, nomeadamente influenciado por

As remessas nos últimos 8 anos Ano

Valor total

Variação homóloga

2001 3.736.821 2002 2.817.885 2003 2.433.778 2004 2.442.166 2005 2.277.250 2006 2.420.268 2007 2.588.416 2008 2.484.681 Variação entre 2001 e 2008

8,10% -24,60% -13,60% 0,30% -6,80% 6,30% 6,90% -4,00% -33,50%

fonte: Banco de Portugal

sectores como o da construção civil e obras públicas. Os países da União Europeia representavam 62 por cento em 2008 do total das remessas dos emigrantes para Portugal, no montante de 1,5 mil milhões de euros. "No curto prazo, as remessas de emigrantes e a deslocação de portugueses para outros mercados que não os tradicionais vai continuar a aumentar, registando-se uma perda nos mercados tradicionais, tendência que contraria o grande 'boom' da imigração nos anos 60", realçou Ramos Silva. Já Suíça, embora apresente uma variação positiva de 1,7 por cento em 2008, "não se pode dizer que seja "um país recente", disse. Mais de cinco milhões de portugueses ou luso-descendentes vivem no estrangeiro. A maioria tem dupla nacionalidade e 1,3 milhões possuem passaporte português. 11


Página de Artes & Letras

RUMORES DA DIÁSPORA

Sentado aqui.

Em poucas palavras Esta edição traz um poeta especial. Temos o privilégio de publicar alguns poemas inéditos do poeta José Francisco Costa. Conheço o José Francisco desde os tempos em que ele fazia rádio na Costa Leste e eu no centro da Califórnia. Contactávamo-nos regularmente por motivo dos noticiários (estamos a falar numa outra época da nossa rádio – a época pré-computadores e quase pré-satélites) que a estação onde ele trabalhava recebia dos Açores e nos eram passados via telefónica. É verdade, era assim. Mais tarde conheci o escritor, o professor e o poeta. Foi por sugestão do nosso amigo Onésimo Teotónio Almeida que o José Francisco participou no simpósio Filamentos da Herança Atlântica. Numa edição em que celebrámos o 25 de Abril, o José Francisco não só apresentou uma comunicação brilhante, como (não fosse ele um excelente professor) conseguiu que mais de 250 alunos das escolas secundárias de Tulare compreendessem o 25 de Abril através dos símbolos da magica revolução dos cravos. Mas, hoje falemos da poesia de José Francisco Costa. É um poeta requintado. Tudo o que escreve é trabalhado e retrabalhado. Gosta-se de ler e reler a poesia do José Francisco Costa. É que através da sua poesia, José Francisco Costa sabe da carne fazer verbo, para, como escreveu Onésimo Teotónio Almeida no prefácio do livro de poesia E da Carne se fez Verbo “partilhar no poema a sua maneira pessoal de urdir diferentemente o comum da experiência humana, mais o sentir transplantado, de ilha às costas a montar a tenda no hemisfério de outra língua e outro norte.” José Francisco Costa é professor de português no Bristol Community College em Fall River, MA, onde criou e dirige o LUSOCentro. Tem sido uma presença importante na disseminação da nossa cultura nas comunidades da Nova Inglaterra, onde fez rádio, teatro e colaborou em inúmeras iniciativas de índole cultural. Publicou dois livros de contos: Crónica do 25 e Mar e Tudo. Tem escrito vários poemas para musicas do grupo Belaurora das Capelas, ilha de S. Miguel, sendo a letra e música “o velho pezinho” uma das mais cantadas nas nossas comunidades e nos Açores. Traduziu e publicou com a chancela da LUSOCentro e da Direcção Regional das Comunidades Saudades de Francês Dabney. Com uma bela voz, José Francisco Costa é ainda um dos melhores recitadores de poesia que jamais ouvi. Graças à sua generosidade, temos o privilégio de publicar nesta página de artes e letras alguns inéditos. Obrigado José Francisco pela partilha destes magníficos poemas. Obrigado por toda a tua escrita, por todo o teu trabalho como um verdadeiro activista cultural junto das nossas comunidades luso-americanas em terras norte-americanas. Abraços diniz

Coordenação do Instituto Açor-Americano Direcção de Diniz Borges

Nem pedra, nem mar. Sem pudor, a imaginar-me, a desejar-me, um nemesiano seguidor. Os olhos, que não as palavras, à sombra do poeta viajando. Sem poesia, mas concha que vai endurecendo, rolada na areia das andanças. Ou casulo? Bicho inquieto, em casa que é mais do que morada. São portas de sonhos que se abrem ao mais subtil toque de um sotaque amigo. São janelas de memórias que se iluminam a qualquer sinal da outra margem. E há cortinas que estremecem se a notícia tem um tom arroxeado. Descalço, de mãos distraídas nas folhas deste outono da vida e do tempo, caminho em sentidos, talvez opostos, na berma das minhas próprias palavras. Casa que não deixo. Concha que segrego.

homenagem

Em tuas mãos da cor do tempo nascem Bordados de infinita paciência. Em teu olhar, que é sonho em noite escura, Moram crateras de silêncio amargo.

salmo de josé

Deus das ervas, deus das águas, Senhor meu, do meu destino. Aos ventos levai-me e ao céu, Morta folha ao entardecer. Sede o meu pastor sereno. Das más ovelhas guardai Este teu pobre cordeiro de lã preta mal vestido, Marcado a fogo e ferrete Como se fora maldita Oferta sem qualquer préstimo. Deus dos raios e mais coriscos. Senhor meu, da minha angústia. Livrai-me do fogo, desejo Que atormenta, que consome A larva, a concha que eu sou , Rei de tudo o que é inútil. Dizei uma só palavra Que me caiba na memória. Lembrar-me-ei, feito servo, Que a tua vontade é ordem, Que a tua sombra é o sol Que alumia noite e dia Todo o princípio e o fim Do trilho que só a mim Me coube em sorte na vida. Ouve o amén prolongado No fim da minha oração. Dai-me a benção e a razão Que me mandam estar calado Diante de vós, Silêncio, Senhor e Surpresa. (Amén)

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Estendem-se os teus braços, e abençoam A lua, todo o sol e as densas nuvens. E o colo que me dás, onde repouso, Ainda tem sabor a tempestade. As dores que sentiste e mais sofreste No tempo das chegadas e partidas Fizeram do teu corpo um val’ de lágrimas. E trazes em teu ventre a saudade: Sacerdotiza, em ara de paixão, Que toda a pena queima e faz nascer.

Instante

Tinha marcado as horas para ter saudades matar ilusões correr albuns saborear o pão molhado em leite ainda morno trincar o milho torrado esperar o caldo verde na sombra do bico-doce da figureira grande e afinar o violão ao som da lua Acertei o tempo para te sentir a alma Embebedar-me de ti Nos teus olhos namorar a memória do nosso encontro.

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Forças Armadas americanas usam música para “torturar” Parece que os agentes das forças armadas americanas usavam a música durante os seus interrogatórios para extorquir respostas dos alegados terroristas detidos. A música parece ser assim uma “arma de tortura” eficaz, apesar de ter sido composta inicialmente com o objectivo de divertir e não torturar. Mas ouvida sem parar chateia e muito, a crer nos resultados obtidos. De entre as músicas mais “torturantes” estão temas de autores como Barry Manilow, Metallica e até, pasme-se, o dinossauro Barney. Eis a lista preferida dos agentes: 10. Metallica 
"Enter Sandman"
 9. Barney the Dinosaur
"I Love You"

 8. David Gray
"Babylon"

 7. Britney Spears
"...Baby One More Time"

 6. Barry Manilow
"Mandy"

 5. Captain & Tennille
"Muskrat Love"

 4. Twisted Sister
"We're Not Gonna Take It"

 3. "Sesame Street" Theme

 2. Neil Diamond
"America"

 1. Meat Loaf
"Paradise by the Dashboard Light"

Nostalgia... http://www.youtube.com watch?v=Ivs6km260Kk

Conheça a Lisboa subterrânea, só acessível três vezes por ano. São as galerias romanas da capital portuguesa aqui documentadas pelo Canal História. http://www.youtube.com/watch?v=P-4Ftb1ldlw

O célebre Conjunto Académico João Paulo em 1965. http://www.youtube.com/ watch?v=y1tydtIldYU

Os “Sheiks”, grupo de rock português dos anos 60. Que saudades! A música já não é o que era, de facto. http://www.youtube.com/ watch?v=seeErhY4Xsg

Os Taxi e Chiclete

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Taxi regressam com novo disco 22 anos depois Lembram-se dos “Taxi”, o grupo do Porto dos anos 80 responsável por êxitos como “Chiclete” “Rosete” ou “Cairo”? Pois parece que o revivalismo os trouxe de volta, como aliás já acontecera com outro dos seus contemporâneos da cidade invicta, os Trabalhadores do Comércio. Os “Táxi” regressaram com um CD intitulado “Não Sei se Sei”, trabalho que, segundo os próprios, demorou três anos a ser concretizado. Depois de uma reunião promovida por Júlio Isidro nos 25 anos da Febre de Sábado à Tarde, um dos programas que lançou este e outros grupos musicais nos anos 80, os elementos dos Taxi, que dizem nunca se terem separado de facto, pois continuaram sempre amigos, decidiram que a química ainda funcionava e após um concerto na casa da Música em 2006 resolveram gravar alguns originais. O novo CD, nas lojas a 21 de Maio, tem 10 músicas, todas cantadas em português, uma das quais com “tradução”, segundo o grupo que continua a ser composto pelos elementos originais: João Grande (voz), Henrique Oliveira (guitarra), Rui Taborda (baixo) e Rodrigo Freitas (bateria).

“Amália Hoje”: o fado em versão pop “Amália Hoje” é um projecto de um grupo pop português – os Hoje – que revisita fados de Amália Rodrigues mas cantados e adaptados à sonoridade da música pop. O álbum junto três conhecidas vozes da música pop portuguesa – Sónia Tavares (The Gift), Fernando Ribeiro (Moonspell) e Paulo Praça (Plaza). Segundo Nuno Gonçalves, que idealizou o projecto, este álbum vem provar "que o Fado é redutor para a voz que brindou o mundo, e ainda mais redutor para os compositores que imaginaram as melhores canções pop de sempre da história da música portuguesa". «Hoje, ao olhar atrás, ouvindo os discos, analisando tudo o que a Amália fez, conseguimos perceber que Amália era muito mais que Fado», explicou o músico. Para Nuno Gonçalves, «Amália foi a primeira e talvez única artista Pop que Portugal teve», porque ser pop «é respirar aquilo que se canta». May 2009

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Joaquim Agostinho: lembrando o maior ciclista português de sempre nos 25 anos da sua morte O ciclista de Torres Vedras ganhou 6 vezes a volta a Portugal A carreira de Joaquim Agostinho conta-se com muitos momentos de glória, recheada de vitórias e camisolas amarelas, mas também teve o seu lado mais negativo, com as quedas atrás de quedas e os sempre estigmatizantes casos de doping. Pelo doping, deixou de correr em Portugal, revoltado com uma segunda Volta a Portugal perdida “na secretária”, no ano da mítica vitória na etapa da Figueira da Foz. As quedas foram uma constante, quase uma “imagem de marca”, de dimensão inesperadamente trágica pela forma como fez coincidir o termo da carreira com o fim da vida. Agostinho chegou por cinco vezes consecutivas a Lisboa como vencedor da Volta a Portugal todas as que correu entre 1969 e 1973 - mas na primeira e na última teve de ceder os louros da vitória, primeiro para o sangalhense Joaquim Andrade, depois para o espanhol Jesus Manzaneque. Em 1969, com apenas um ano de modalidade, Agostinho era na Volta a Portugal ídolo inevitável, pelo brilharete do oitavo lugar no “Tour”, com duas etapas ganhas. E quando lhe falavam de doping, ironizava e dizia que “o seu doping” era a “loirinha de Torres Vedras”, Ana Maria, que viria a ser a sua mulher. Por isso, mais estranheza causou o positivo, na última etapa, o decisivo contra-relógio que ganhou. “É mentira, nunca tomei nada. Não tirei as mãos do guiador, não bebi nada durante a corrida. Só uma laranjada, quando cheguei”. Mais exactamente, uma “Sumol”, assim de repente caída no ComunidadesUSA

centro das piores suspeições e obrigada a emitir comunicado para limpar a imagem... “Juro que nunca tomei dessas porcarias”, asseverava o campeão e ia mais longe: “Eu nem sei bem o que é o doping... Fui roubado sim senhor”. Para a história, ficava uma história mal explicada e a insinuação que a “mafia do ciclismo” tudo estava a fazer para o prejudicar. Em 1972 é no Tour, em que já é um dos homens mais vigiados, que acontece a segunda história de doping de Joaquim Agostinho e mais uma vez se afirmou inocente. Gribaldy, o seu director-desportivo “de sempre”, acusou sem papas na língua a “mafia do Tour”, francesa, que andaria de “cabeça perdida” por causa do constante domínio estrangeiro pós-Anquetil, sobretudo de Merckx. “Tinô” voltou a encontrar uma “resposta” possível para o doping involuntário num bidon dado por espectador, em etapa de alta montanha. “Só lá dentro podia estar líquido contaminado”, asseverava. Mas o castigo veio mesmo, com mil francos de multa, um mês de suspensão (a cumprir no defeso) e dez minutos de penalização... que não lhe alteraram o oitavo lugar, só que um pouco mais longe de Merckx. Um ano depois, chegava o caso mais mediático e de maiores consequências na sua carreira para Agostinho, numa Volta a Portugal que parecia ficar para a história. Ganhou na Serra da Estrela, como seria de esperar, mas ganhou também uma histórica etapa Abrantes-Figueira da Foz, 200 km

quase em perfeito contrarelógio. Imperial, passada certa e sem se levantar do selim, sem que ninguém lhe acompanhasse a passada. Venceu em mais etapas, mas são essas que determinaram o destino da prova, na análise às colheitas feitas ao campeão. Por revelarem mentilfenil, dilatador dos vasos sanguíneos, um composto do medicamento Ritaline, que Agostinho admitia tomar, mas que “não era droga nenhuma”. Agostinho assegurava que esse Ritaline era tomado na sua equipa de então, a BIC de Luis Ocaña, como suplemento energético diário. Magoado, disse adeus à Volta a Portugal, para não mais voltar. Só muitos anos mais tarde, e nas entrelinhas, o seu discurso mudou e a ira indignada deu lugar a uma sábia ponderação das palavras. “Alguém acredita que um ciclista, para fazer 200 ou 300 quilómetros, sob sol, chuva, subindo, descendo, fazendo médias verdadeiramente impressionantes de 40 ou 50 quilómetros hora, não necessita de alguma coisa que o ajude a suportar todo esse esforço? Responda quem quiser, ou então que se submetam a esforços semelhantes e depois digam se têm de tomar ou não estimulantes...”. As palavras são de 1982 e valem por si. Em Portugal praticamente não voltou a correr depois da “birra” de 1973, mas foi nas estradas portuguesas que fechou a carreira, dramaticamente, com a queda em Quarteira e o coma que o levou à morte, na manhã do dia 10 de

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Joaquim Agostinho

Maio de 1984. Era a última queda, esta para evitar um cão, de uma longa, longa série que lhe deu a alcunha de “Quim Cambalhotas”, logo no primeiro ano de profissional.

O rei das quedas...

Praticamente, não havia prova em que não acabasse por cair – um ar descontraído, meio despreocupado a isso ajudava, bem como deficiêncais técnicas de quem começou bastante tarde a correr em bicicleta de competição. Quando já era VIP do Tour, o L´Equipe apresentou um cartoon de primeira página, com todos os favoritos. E como estava representado Agostinho? Sentado no chão, a ver estrelas, bicicleta desconjuntada e ombro esfolado. A mais grave terá sido a queda que sofreu em 1972, na estreia na Vuelta, em que lutava para ganhar. Foi na etapa para Tarragona, em que caiu, perdeu a consciência e ficou a sangrar do parietal esquerdo. Foi a 05 de Maio e temeu-se o pior. Mas recuperou a 10 de Maio foi autorizado a viajar para Lisboa. Exactamente doze anos antes de morrer, por uma queda com muitas semelhanças. (Lusa) 15


Centro de Interpretação do Vulcão dos Capelinhos, Faial

Arquitectura arrojada e tecnologia de ponta colocam os Açores na rota do que de melhor se faz nesta área por António Oliveira (no Faial)

É

impossível pensar os Açores sem pensar em vulcões. Ligados ao nascimento da ilhas, há milhares de anos, estão também presentes no seu dia-a-dia através das caldeiras, das lagoas nas crateras, da paisagem, da geotermia, do imaginário e, no caso do Faial, bem vivos ainda na memória de muitos habitantes, uma boa parte deles emigrantes nos Estados Unidos. A verdade é que até aqui os Açores não tinham nenhuma obra de referência sobre os vulcões. Mas cinquenta anos depois da última erupção, a dos Capelinhos, no Faial (1957-58) o arquipélago inaugurou uma obra digna em grandiosidade e modernidade que coloca as ilhas na rota do conhecimento mundial. Trata-se do Centro de Interpretação dos Capelinhos, uma estrutura de características vanguardistas e com fins polivalentes que junta vários espaços com objectivos diferenciados, desde a simples visita turística, se podemos falar assim, passando pela visita de estudo das escolas da região, até à investigação científica

A entrada no “bunker” do Centro de Interpretação do Vulcão dos Capelinhos

propriamente dita. Construído na esteira dos Centros de Conhecimento ou de Ciência e Tecnologia, como os dos Estados Unidos, o Centro de Conhecimento do Vulcão dos Capelinhos

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demarca-se, no entanto, de todos eles pela sua arquitectura arrojada e grandiosa, pois a obra está totalmente soterrada nas cinzas expelidas pelo vulcão que, há meio século, destruíram centenas de moradias e inutilizaram alguns

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fotos ComunidadesUSA

campos de cultivo de milhares de faialenses. O centro é um autêntico "bunker" construído em betão armado por debaixo das areias vulcânicas e junto ao que resta do antigo farol, chegando a luz até lá ao fundo através de pequenas condutas. O farol, que em 1958 foi também parcialmente soterrado pelo, foi igualmente reconstruído e o visitante pode subir até ao topo onde ficava a lâmpada. (Hoje com projectores)

Obra de sete milhões de euros

A obra custou à região autónoma dos Açores cerca de sete milhões de euros e pretende ser também o início de um circuito vulcanológico a criar no arquipélago que atraia visitantes e cientistas de todo o mundo. Na cerimónia inaugural, Carlos César, o chefe do executivo açoriano, disse que o Centro "é uma homenagem aos faialenses, particularmente àqueles que mais sofreram com as consequências do Vulcão", muitos dos quais foram obrigados a emigrar para os Estados Unidos e para o Canadá à procura de melhores condições de vida. O Centro de Interpretação do Vulcão dos Capelinhos é uma obra da autoria do arquitecto Nuno Lopes e inclui as melhores tecnologias que, a nível mundial, integram estruturas de disseminação do conhecimento. Filmes tridimensionais, maquetas interactivas e artísticas, painéis informativos, computadores que explicam a formação dos vulcões e a evolução do arquipélago, são algumas das ferramentas tecnológicas que estão disponíveis aos visitantes. A ilha do Faial e a sua geologia é privilegiada, mas o Centro permite conhecer não só as restantes oito do arquipélago, como todos os grandes vulcões mundiais. Carlos César disse na inauguração, em Agosto de 2008, que o Centro é “uma poderosa máquina do tempo que nos transporta do passado para o presente, de forma acessível, para mais facilmente prospectivarmos a existência." O presidente lembrou que para concretizar este arrojado projecto, o qual contou também com a colaboração do vulcanólogo Victor Hugo Forjaz, o Governo teve de ultrapassar mais de quarenta procedimentos de contratação pública. Este Centro passou a integrar uma rede de outros já concluídos, como a Gruta das Torres, a Casa da Montanha no Pico, o Centro de Interpretação Ambiental e Cultural da Ilha do Corvo ou o Centro de Visitação do Jardim Botânico do Faial, e outros a concluir, como o Aquário Virtual e a Casa dos Dabney, na ilha do Faial, e os Centros de Interpretação Ambiental da Furna do Enxofre, na Graciosa, da Fajã de Santo Cristo, em São Jorge, da Gruta do Carvão, em São Miguel, bem como o da Fábrica do Boqueirão, na ilha das Flores.

Uma obra de referência

O Centro de Interpretação do Vulcão dos Capelinhos é uma obra de referencia no arquipélago e um dos símbolos dos Açores, a par de outras 17

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Em cima, duas galerias do Centro, a projecção halográfica do vulcão e a casa do farol, mantida conforme as cinzas a deixaram há 50 anos

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obras grandiosas como as Portas do Mar em Ponta Delgada. Coloca a região na rota do conhecimento mundial pois as tecnologias usadas quer na construção, quer nos equipamentos que inclui são do melhor que existe nesta área. Por exemplo, é possível conhecer toda a geologia das ilhas ou assistir, numa animação halográfica, à erupção do vulcão tal como aconteceu há 50 anos, ou sentir de perto a sua evolução e à transformação que operou no espaço envolvente. Dissimulado no subsolo, pois toda a construção é subterrânea o que permite preservar as areias vulcânicas do vulcão e ao mesmo tempo dar-nos a sensação de que estamos no interior da terra, a entrada faz-se por uma rampa que nos leva ao interior do “bunker” e a um grandioso hall circular com uma coluna em forma de chorão que suporta o tecto a cerca de 10 metros de altura, dando a ideia de uma erupção. Esta sala está à cota das casas que o vulcão destruiu há 50 anos, coberta de terra vulcânica, pelo que a paisagem está exactamente como estava quando o vulcão se extinguiu. Este hall é uma área para exposições temporárias e onde se situa o bar e a partir da qual temos acesso à bilheteira que nos permite entrar nas galerias do Centro. Tudo é construído em betão armado, numa cor que parece a deixada pelo vulcão no exterior, escura, avermelhada, mas escura. As galerias, no entanto, têm cores diferentes, algumas fortes, provavelmente com o objectivo de nos oferecer alguma tranquilidade enquanto caminhamos debaixo da terra e assistimos ao desenrolar da história do vulcão e à mudança operada no espaço envolvente. Este ambiente, aliado à distribuição das galerias e à sua iluminação permite ao visitante “entrar” no mundo do vulcão abstraindo-se completamente do mundo exterior. A primeira sala, em forma de galeria comprida com dois pisos desnivelados, transporta-nos para o tempo do vulcão através de uma viagem pelos objectos dos anos 50, entre eles alguns registos do sismógrafo que detectou os abalos. Podemos 18

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A resolução do Congresso Americano que abriu as “portas” da América aos faialenses em e a lei assinada pelo presidente Kennedy

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admirar ainda recortes de jornais da época e objectos usados na ilha, fotos, etc. Subindo em direcção contraria, no plano superior temos então uma colecção de rochas que abarca toda a geologia das ilhas e não só, terminado com um filme do vulcão dos Capelinhos. Seguimos depois para outra galeria onde ficamos a conhecer os vários faróis de Portugal e entramos na moderna sala de cinema para assistir a um fantástico filme sobre a natureza dos Açores a três dimensões (3D). Esta é uma experiência única de uma beleza admirável e mesmo para quem está habituado a ver cinema neste formato o filme ultrapassa em qualidade e espectacularidade muito do que se faz no estrangeiro. A sala está equipada com toda a mais moderna tecnologia de som, acústica e imagem tornado a experiência ainda mais agradável. Seguimos depois para a sala da erupção onde podemos assistir a uma sessão halogáfica (halografia é uma técnica em consiste em criar imagens a três dimensões através de lasers) que reconstrói ao pormenor a erupção submarina dos Capelinhos desde a formação da ilhota anelar até à sua ligação ao Faial. Há depois nova galeria com painéis de grande qualidade fotográfica e gráfica que documentam as várias fases da erupção e uns tubos transparentes com modelos animados do vulcão. Segue-se outra galeria com painéis iluminados de cada uma das nove ilhas do arquipélago e um mapa de madeira do Faial a tês dimensões, computadores e mais filmes. A visita termina numa sala onde podemos comprar artigos relacionados com os Capelinhos e o fenómeno do vulcanismo, e com a possibilidade de subirmos ao topo do farol de onde se tem uma vista espectacular. A saída desta visita “multimédia” aos Capelinhos faz-se da mesma forma original da entrada: através de uma porta ao lado do farol onde a intensidade da luz e a visão do espaço amplo das areias vulcânicas que nos recebe nos dá a sensação de termos emergido à superfície depois de uma viagem pelo interior de um vulcão. A obra distingue-se também pelo enorme cuidado posto na preservação da paisagem envolvente. Por isso o exterior foi minimamente tratado, tendo sido empedradas apenas as entradas pedonais e o parque de estacionamento. Tudo com a mesma qualidade de materiais e um enorme bom gosto. Uma obra de referência que merece mais do que uma visita. Aspectos das gelerias. Ao centro, mapa do Faial 19

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Souto de Bairros local onde acampou o exército invasor francês na Trofa, quando avançava para o Porto, Trofa

Recordando os 200 anos das invasões francesas

Espada do capitão Luís Carneiro é única recordação do homem que fez o general francês Soult recuar Francisco Ribeiro (Texto) João Miranda (Fotos) A espada com que o capitão Luís Carneiro enfrentou os invasores franceses na Barca da Trofa, em 1809, é a única recordação que resta hoje do homem que obrigou a recuar o general Soult, atrasando o avanço para o Porto. A arma, preservada pela família, está colocada em evidência numa parede, logo à entrada da casa onde viveu o capitão que comandava a Companhia de Ordenanças de Santiago de Bougado em finais de Março de 1809, quando o exército francês tentou atravessar o rio Ave na zona da Trofa. “A casa sempre esteve na nossa família. O capitão vivia aqui e, por isso, a espada ficou cá. A família sempre a conservou”, disse à Lusa Manuel Loureiro, descendente directo em sétima geração de Luís Carneiro e actual proprietário da casa. “Até à morte do meu avô, esta foi sempre a Casa do Capitão”, recordou Maria Antónia, irmã de Manuel Loureiro, admitindo que a expressão praticamente já caiu em desuso actualmente. O capitão Luís Carneiro liderou

a Companhia de Ordenanças de Santiago de Bougado, uma pequena força de populares armados, contra uma coluna militar comandada pelo general Soult, impedindo a sua progressão. Dispondo apenas de dois pequenos canhões e o apoio de um reduzido grupo de militares milicianos, os portugueses defenderam a Barca da Trofa e obrigaram os invasores franceses a subir o Ave até à Ponte da Lagoncinha, onde conseguiram atravessar o rio. As tropas acamparam no Souto de Bairros, mas o general Nicolas Soult foi pernoitar numa casa situada a algumas centenas de metros, que pertencia a Manuel Faria Carneiro. “Nesta casa, de 25 para 26 de Março, pernoitou o Duque da Dalmácia - 1809”, refere uma placa colocada na frente da casa. “O general ficou aqui só uma noite, mas as pessoas da casa ficaram muito bem impressionadas com os franceses, que não fizeram mal a ninguém”, afirmou à Lusa Júlia Amandia, actual proprietária da casa. Apesar da imagem negativa que criou ao longo da sua marcha em território português, os invasores franceses também provocaram

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boa impressão numa farmácia situada na fronteira entre Trofa e Vila do Conde. Os actuais proprietários da farmácia, fundada em finais do século XVIII, revelaram recentemente que os militares franceses passaram por lá em 1809 para levantar medicamentos, tendo tratado bem todas as pessoas que ali se encontravam. Dessa altura, restam como recordação duas barretinas francesas, ainda na posse dos descendentes. A breve passagem francesa pela Trofa em Março de 1809 provocou uma dezena de mortos, um dos quais José Moreira, que era escrivão da Companhia de Ordenanças. Quando revistaram a sua casa, situada frente ao local onde o general Soult pernoitou, as tropas francesas encontraram armas escondidas no palheiro. Como castigo, José Moreira, cujo nome consta da lista inscrita no Monumento da Barca da Trofa, foi severamente torturado até à morte. Pouco depois, as tropas invasoras levantaram o acampamento e prosseguiram a marcha para o Porto.

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Cila Santos Artes plásticas na comunidade

O

trabalho desenvolvido por Cila Santos é o exemplo de que nas nossas associações comunitárias (vulgo clubes sociais) também é possível fazer cultura. Neste caso pintura, escultura, poesia, fotografia produzida na nossa comunidade por artistas amadores e divulgada num ambiente mais popular, é certo, mas divulgada. Foi há cerca de dez anos atrás que Cila, uma ribatejana natural do Tramagal, se envolveu com a Casa do Ribatejo de Newark, New Jersey, onde começou por organizar a festa de Natal das crianças. Desde então nunca mais parou de promover eventos culturais, sobretudo exposições de artes plásticas, não fosse ela, também, uma pintora. Hoje a Casa do Ribatejo possui um espaço próprio para expor, uma pequena galeria no primeiro andar da sua sede onde todas as semanas trabalhos de artistas comunitários (e não só) podem ser apreciados pelo sócios e público em geral. A grande alma desta “galeria” e deste grande esforço de divulgação das artes plásticas é Cila Santos. por António Oliveira “Há cerca de dez anos nós começamos a fazer uma exposição colectiva anual”, explica à nossa revista. “Mas rapidamente verificámos que uma exposição era pouco, pois os artistas da mais variadas áreas são cada vez mais. Por ComunidadesUSA

isso nós decidimos criar este espaço e assim fazer exposições periódicas, quer colectivas quer individuais, que podem ser vistas por todos”, explica. Nasceu assim a CREA (Casa do Ribatejo Espaço Arte) e desde então por lá já passaram dezenas de artistas, pintores, poetas, escritoMay 2009

res, fotógrafos, escultores, jornalistas, amigos e muitos admiradores das artes da nossa comunidade. “A CREA está aberto a todos e tem sido graças aos artistas e amigos que nós conseguimos organizar exposições todos os meses”, acrescenta. Para uma associação comunitária cuja sobrevivência depende, como a maioria, da organização de festas populares e da exploração de um bar e serviço de refeições, tanta cultura é caso raro. Para que todos os meses haja quadros novos na galeria, Cila desdobrase em contactos dividindo o seu tempo entre o trabalho de cabeleireira do seu dia-a-dia e a Casa do Ribatejo. Corre muito mas não cansa, porque corre com gosto e o maior prazer é chegar à sexta-feira e poder inaugurar mais uma exposição e conviver com os artistas e amigos que começam agora a chegar um pouco de todas as comunidades desta grande área metropolitana de Nova Iorque. “Além de cada um de nós ter aqui a 22


foto ComunidadesUSA

Cila Santos frente a um dos seus quadros na CREA

oportunidade de mostrar o seu trabalho, o que em outro lugar seria muito difícil, cria-se uma amizade e uma empatia que perdura no tempo”, diz Cila. “Acabamos todos por ficar amigos”, acrescenta. Por isso a CREA é hoje um dos únicos espaços de cultura permanentes da comunidade portuguesa de Newark. Todas os finsde-semana ali se reúnem dezenas de artistas para discutir arte, literatura, declamar poesia, ouvir fado ou música tradicional portuguesa ou simplesmente saborear um dos excelentes pratos da gastronomia portuguesa que saem da cozinha do bar ali ao lado. Sem dúvida que a CREA dá outro ambiente à Casa do Ribatejo e proporciona um encontro de gerações e de grupos com interesses diversos. Um grupo que não pára de crescer, como nos confirma a Cila: “Todos os meses aparece gente nova que pinta ou faz escultura, fotografia, etc, e isso é muito bom, pois assim já temos o ano de 2009 completamente preenchido com exposições”. Os frequentadores habituais da Casa do Ribatejo, alguns pouco interessados em qualquer espécie de arte, já se converteram e habituaram passar pela galeria às sextas-feiras para dar uma olhadela a mais um quadro ou uma escultura. Foi um processo lento que começa agora a dar os seus frutos e tudo graças ComunidadesUSA

à persistência de Cila Santos. A sua paixão pela pintura começou na escola e nunca mais parou de crescer. Em Portugal os professores gostavam dos seus desenhos e incentivaram-na a continuar prevendo-lhe um futuro nesta arte, mas não teve qualquer educação formal antes de emigrar para os Estados Unidos, há dezoito anos. Foi aqui que se matriculou em alguns cursos nas escolas públicas e aprendeu a dominar as cores e a técnica do óleo. “Tenho tentando aprender e aperfeiçoarme diariamente”, diz com modéstia explicando que gosta sobretudo de pintar a óleo arte abstracta e alguma (pouca) figurativa. “A pintura abstracta dá-me a oportunidade de movimentar as cores, pois eu gosto muito de cores na minha pintura”, diz. A pintura funciona hoje com uma parte integrante da sua vida e já não se imagina sem pintar. “Não consigo estar sem pintar; a pintura para mim é como a minha filha – o meu bem mais precioso e eu passo o dia a pensar nos meus trabalhos”, explica. Por isso ao lado do salão de cabeleireira de que é proprietária Cila instalou o seu estúdio e assim pode conciliar as duas coisas. Hoje, nas paredes do seu salão em vez de fotos com cortes de cabelo vemos pinturas a óleo de Cila Santos. May 2009

“Acaba por ser um relacionamento interessante com os meus clientes e a pintura”, diz. Arte e comunidade são coisas que se combinam bem na casa do Ribatejo, mas Cila diz que as coisas podiam ser bem melhores com um pouco de apoio. “Faz falta uma galeria a sério com condições para funcionar todo o ano e apoios aos nossos artistas”, diz. E lamenta que os tradicionais patrocinadores se esqueçam da artes, ignorando totalmente o CREA da Casa do Ribatejo. “Eu não tenho por hábito andar a pedir patrocínios, as pessoas sabem que estamos aqui e penso que deviam também apoiar-nos. Estamos um pouco abandonados, pois ninguém olha pelos artistas da nossa comunidade”, lamenta. Mas Cila não desanima e sonhos não lhe faltam: “Vamos continuar a organizar exposições e eventos culturais no CREA e eu vou continuar a pintar e a aprender. Espero que a minha filha termine a universidade e então vou estudar e aprender pintura com aqueles que sabem mais do que eu”, diz. “Eu gosto muito da pintura que faço”. Também nós. CASA DO RIBATEJO - 156 ROME ST NEWARK, NJ 973-578-8145 23


NA MARGEM

A crónica do Brasil

DE CÁ

Ilha Faceira! “Um anjo estouvado derrubou o azul, que era só para o céu, também no mar de Florianópolis. No paraíso até bobagem vira beleza.” Júlio Queiroz Adoro ficar olhando a cidade da janela do meu gabinete aqui de casa, no nono andar, onde descortino uma visão panorâmica, de 180 graus. Isto já virou lugar-comum na minha escrita. Mas é a pura verdade: daqui sinto a Ilha e Florianópolis,que em dias domingos,santos de guarda e feriados amanhece silenciosa e lentamente desperta cheia de preguiça ou com uma grande ressaca do “festerê” de véspera. Gosto de sentir os cheiros das plantas do Largo, da terra lavada depois da chuva forte, de aspirar a maresia, de observar os passarinhos que fizeram seu ninho na caixa protetora do ar condicionado e vão e voltam levando migalhas para seus filhotes. Vejo, ao longe, um pedacinho do braço de ferro da Ponte Hercílio Luz, o cordão umbilical que nos une ao continente. Passagem e magia da ilha e da terra firme. Puro fetiche! A ponte e eu, uma cumplicidade antiga dos tempos de ir e vir, ponte de amores eternizados e de tanta saudade que o vento sul carregou para o mar-oceano numa longa travessia. Gosto de olhar o Cambirela, a montanha azulada que lá do continente repousa como um gigante adormecido de olho na Ilha-mulher, na definição romântica e pícara do cronista ilhéu Sérgio da Costa Ramos: “Sempre soube que a Ilha é mulher, gênero bem feminino, espécie cheia de curvas, com seios e principalmente com ancas. Surpresa: dois umbigos, a Lagoa da Conceição e a Lagoa do Peri” É uma deliciosa sensação de paz absoluta, de bem querer, de bem estar com a vida e com a “minha” cidade de Florianópolis que me acolheu há 39 anos e que aniversaria neste dia 23 de março outonal, segunda-feira, de um

* Texto escrito em português do Brasil, onde vive a autora

sol dourado magnífico e um céu azul clarinho onde passeiam nuvens esparsas, branquinhas e tênues como algodão doce, prenúncio de vento nordeste caindo ao final da tarde. A festa de aniversário começou ontem, com a reabertura da catedral metropolitana, depois de uma longa restauração. Um espetáculo pirotécnico, fogos de artifício de diferentes desenhos e muitas cores, explodiram no céu, iluminando a noite de lua minguante e poucas estrelas, celebrando este importante marco de história e de fé,patrimônio cultural de Santa Catarina. O templo erigido em louvor a Nossa Senhora de Desterro pelo bandeirante vicentista Francisco Dias Velho, em 1673 ou 1675 (há controvérsias) neste mesmo local, onde já existira uma cruz com data gravada de 1651, foram os fundamentos da póvoa Nossa Senhora do Desterro. Ali, no átrio da capela, morreria o nosso fundador, defendendo a sua família, do pirata inglês Robert Lewis no final do século XVII. Dias Velho, em carta datada de 20 de abril de 1681, escreveu: “A terra é mais que boa quem disser o contrário mente. Digam que não podem estar onde não há gente e não digam que não presta a terra... Eu me contento muito com a minha sorte...” Palavras proféticas! Duzentos e oitenta e três anos de Vila ou será de Vila-Ilha? Uma capital que se esparrama numa ilha de boa terra, flora fascinante e paisagem exuberante, das dunas da Joaquina, das quarenta e duas praias, restingas, manguezais e lagoas como a da Conceição. “Jamais a natureza reuniu tanta beleza,jamais algum poeta teve tanto pra cantar(...)Tua lagoa formosa, ternura de rosa,poema ao luar. Cristal onde a lua vaidosa,sestrosa, dengosa vem se espelhar.”proclamam os versos do Rancho de Amor à Ilha,do poeta Zininho e Hino oficial de Florianópolis. Florianópolis, um nome que atravessou o tempo, cativou a alma do ilhéu alojando afetos e construindo o imaginário insular. O fato de a Ilha abrigar a Capital do Estado de Santa Catarina, desde os tempos de Capitania, fortalece a

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May 2009

por Lélia Pereira da Silva Nunes*, lha de Santa Catarina, Brasil

relação Ilha-Capital e transmite aos seus moradores a consciência e o imaginário da insularidade. A literatura alienígena e a iconografia colorida dos viajantes estrangeiros que se aventuraram pelas águas do Sul do Brasil, entre os séculos XVIII e XIX, são registros irrefutáveis que os nossos visitantes já se deslumbravam com a beleza da ilha idílica e a boa índole do nosso povo como anotou o viajante John Mawe em 1807 ao arribar na Ilha vindo de Buenos Aires. Em sua obra “Viagens ao interior do (conclui na página seguinte)

ComunidadesUSA


Brasil” (Londres, 1812) Mawe comenta sobre as belezas naturais da ilha, fala da organização da Vila de Desterro e da vida prazerosa de seus habitantes: “a cidade proporciona agradável retiro aos comerciantes afastados dos negócios, comandantes aposentados e outras pessoas que, tendo assegurado a sua independência, procuram apenas lazeres para desfrutála.”(p.52) lançando um olhar futurista sobre a vocação de Florianópolis que chega aos dias de agora como a cidade mais querida do País e o destino preferido de muitos brasileiros. E não só os nacionais caem de amor por Floripa. Mais de duas dezenas de viajantes estrangeiros deixaram relatos preciosos em sua passagem e estadia na nossa Ilha-Vila, mas nenhum deixou um depoimento tão pungente de amor e de ciúme por esta ilha-mulher quanto o navegador suíço-alemão Carl Friederich Gustav Seidler que por dez anos esteve no Brasil e entre 1823 e 1827 aportou 24 vezes em Desterro, no comando do navio “Caroline,” fazendo o transporte de imigrantes alemães chegados no Rio de Janeiro para colónias do Rio Grande do Sul. Cronista admirável percorreu a Ilha e o interior do estado em expedições exploradoras alcançando,inclusive, os contrafortes da Serra do Rio do Rastro,o planalto catarinense. Sua pena desenha na aquarela das palavras a formosura da ilha que chama de Formosa e completamente seduzido extravasa sua paixão: “que eu hoje desejasse que amanhecesse algumas horas mais cedo para que, quanto antes melhor, se me abrisse esse fabuloso paraíso do novo mundo. Não tive mais sono; impaciente como um amante cheio de saudade ou como um enfermo febricitante, esperei no convés pelo raiar do dia. Finalmente uma faixa estreita no horizonte prenunciou o iminente nascer do sol, o disco argentino da lua descorou, o verde escuro dos montes a pique, cobertos de mata, surgia cada vez mais visível e mágico;”in:Ilha de Santa Catarina: Relatos de Viajantes Estrangeiros nos Séculos XVIII e XIX,p.299 (Ed.da A.Legislativa-SC,1979). Se hoje mantemos e celebramos a nossa herança cultural e afectuosa com os Açores devemos muito ao amor de Seidler,que muito contribuiu para que esta terra insular não passasse para as mãos da Inglaterra numa grande barganha vetada por José Bonifácio de Andrade, tutor de Pedro II. De Seidler para cá muitos mais se enamoraram e revelaram seu amor: poetas, menestréis, artistas, saltimbancos, cantaram a sua beleza ComunidadesUSA

sem par eternizando-a na prosa, na poesia, no canto, na arte pictórica, cristalizando esse universo no bailado das palavras, na composição musical, na intensa linguagem plástica das formas, cores quentes e fortes, como neste poema Ilha e Mulher (1959), de Maura Senna Pereira, ela que carregou a Ilha dentro de si até o dia de sua morte, aos 88 anos, no Rio de Janeiro: “Meu corpo é o teu imenso corpo de ilha/e minha alma invade as tuas entranhas participando da tua febre criadora./Meu sangue é o rasgão líquido dos teus rios/a linfa nervosa das tuas cachoeiras/a água matuta das tuas lagoas./Plantas rebentam de tuas carnes, de meus chãos,/ (...)/e sinto-me carregada da tua seiva e do teu pólen,/da glória dos rebentos/e do teu halo de conchas./...” Não nasci na Ilha, mas a ela estou ligada por todos os laços de afetos imagináveis e por muitas lembranças da infância e das férias, na adolescência, passadas na casa da Dinda Josefina e da tia Volga. Não tenho a alegria telúrica dos ilhéus, mas a de ter sido aqui batizada. Primeiro na pia batismal da Igreja de São Francisco, com quase um ano de idade, depois nas águas de Itaguaçu, tendo por testemunha as pedras-bruxas. Uma união de amor confirmada e fortalecida no tempo com a chegada dos filhos e da neta. Na Ilha fui ungida, meu corpo faz parte do corpo da ilha por todo o sempre, como poetou Maura Sena Pereira. Gosto de me saber presa à Ilha por laços de amor. De sentir o seu abraço e o bolinar do mar que me carrega por outros horizontes onde está plantada a raiz matricial – os Açores – o espaço encantado que conheci em 1989 e me conquistou para sempre, apaixonada, amante. Amo a Florianópolis de ontem, do velho Miramar, a Floripa de hoje e a de amanhã que será cantada por nossos filhos e lembrada por seus encantos e contrastes. Capital cosmopolita, com praias lindas de águas calmas e cálidas, destino de milhares de visitantes, ou de mar agitado, cavado, reduto de uma juventude bonita, “sarada”, surfistas atraídos por suas ondas gigantescas, potentes e perfeitas, que convive com freguesias bucólicas onde o ritmo da vida segue o compasso das ondas do mar que buscam mansamente a carícia da areia da praia, alva esteira ou o beijo roubado no seio da vaga arfante. Gente hospitaleira, com seu linguajar cantado e ligeiro, May 2009

uma sutil ironia, um jeito todo seu de ser, de estar, de conviver, de partilhar sabedoria guardada nas entranhas do mar e salvaguardada na memória coletiva. Cenários de ontem e de hoje. Símbolos de uma cidade feminina, amada e reverenciada pelos que aqui vivem ou pelos que chegam e não querem mais sair enlaçados por seus “samburás” – um balaio de povo, de vida, de histórias, de memórias da nossa gente. Um território de pura magia, uma bruxa voluptuosa que se ergue do mar, não como abrigo de uma “velha cidade menina”, mas como a CapitalIlha-Mulher sensual, linda e faceira. Cheia de segredos, misteriosa como a orquídea, sua flor símbolo. Da minha janela aspiro a Ilha e Florianópolis, nesta linda manhã em que a cidade aniversaria e me presenteia com sua terra morena, seu marzão azul, seu sol dourado, sua magia cósmica a me envolver num jogo de eterna sedução, um convite explícito para um gostoso banho de mar, um grande abraço desta moça faceira, sempre pronta para dar e receber amor no seu imenso regaço. Quem consegue resistir a uma prenda de tanta formosura? Florianópolis é o nosso maior presente e 25


Lucília Prates Uma mulher com uma missão

L

ucília Prates é uma mulher com um missão muito especial. Como directora do Massachusetts SMP Program, trabalhando directamente no Elder Services of Merrimack Valley, o seu dia-a-dia desde há muitos anos é zelar pelo bem estar dos outros, particularmente dos idosos, colaborando com uma série enorme de agências estaduais e federais desde o Elder Services of the Merrimack Valley, Executive Office of Elder Affairs, Office for Refugees and Immigrants, Health Care For All, Home and Health Care Alliance of Massachusetts, Inc., Multicultural Coalition on Aging, Office of the Attorney General, o Aging and Disability Resource Consortium of Northeastern Massachusetts, Centers for Medicare and Medicaid services, MASSPRO, Action for Boston Community Development e o Massachusetts Extended Care Federation. É um trabalho que se estende por todo o estado de Massachusetts e o grande objectivo é proporcionar aos mais desfavorecidos financeiramente e aos excluídos cultural e linguisticamente, serviços públicos que deveriam ser facilmente acessíveis a todos mas não são. Sobretudo aos mais idosos e aos não falantes da língua inglesa ou aos que a não dominam com proficiência. Profundamente conhecedora das dificuldades por que passam estes emigrantes, pois ela própria é uma emigrante, natural de Santa Maria, Açores, Lucília tem vivido toda a sua vida a olhar pelos outros, a furar a burocracia e a romper preconceitos e vícios instalados no sistema de saúde americano com vista a ComunidadesUSA

Lucília Prates

proporcionar-lhes os cuidados médicos a que têm direito neste país. Reconhecida por todos como uma pessoa tolerante e compreensiva, mas decidida e determinada, capaz de construir pontes entre culturas e línguas, Lucília não vacila quando se trata de defender os direitos dos mais desfavorecidos nem desanima quando se trata de sensibilizar o sistema e os seus funcionários para a necessidade de se romperem as barreiras culturais e linguísticas que provocam muitas vezes a marginalização e “guetização” de parte de uma comunidade e o seu afastamento dos serviços públicos, nomeadamente os cuidados de saúde a que têm direito. Lucília conhece bem os emigrantes e a sua realidade, quer sejam eles oriundos de Portugal, dos países lusófonos ou de outros. Sabe que é através da educação e da sensibilização que se podem melhorar os serviços de assistência, reduzir custos e aumentar a sua eficiência de modo a permitir o acesso de cada vez mais pessoas à saúde. Experiência não lhe falta, pois Lucília faz também parte do Board of the Massachusetts Association of the Older Americans, e da organização Health Care for All onde é tamMay 2009

bém fundadora e presidente do Health Care for All’s Health Quality Consumer Council. É ainda membro da várias organizações nãogovernamentais e oficiais de serviço e apoio social, caso do Massachusetts Public Health Council, Massachusetts Executive Office of Elder Affairs Diversity Workgroup e da Multicultural Coalition on Aging.

De Santa Maria para MA Lucília Prates emigrou aos 8 anos com a família para os Estados Unidos, em 1967, deixando para trás a bonita ilha açoriana de Santa Maria, onde nasceu. A família fixou-se em Cambridge e começou a trabalhar duro, como qualquer emigrante, tentando realizar o seu sonho americano em pouco tempo. O primeiro passo foi dado alguns anos depois com a compra de casa num subúrbio, a bonita cidade de Arlington, para onde se mudaram. Lucília fez o percurso normal de uma criança americana, ingressou na escola, passou todos os anos sem dificuldades e quando chegou a altura entrou na Universidade de Massachusetts onde conclui uma licenciatura em Ciências Políticas. Criada no seio de uma 26


Uma vida inteira a defender os direitos dos emigrantes família portuguesa, aprendeu a língua (que fala fluentemente), os costumes e a gostar das tradições. O gosto pela cultura lusa levou-a a Lisboa dois Verões onde fez Cursos de Verão em Português na Universidade Católica. “Foi para aperfeiçoar o meu português”, diz Lucília, “mas ainda me sinto muito limitada na língua”, acrescenta com modéstia. A língua e a ascendência portuguesa se hoje constituem uma mais-valia preciosa, foi nesses tempos um factor de discriminação. Lucília recorda que sentiu bem o preconceito em relação ao emigrante e assume que foi vítima dele. “Não falarmos inglês nesse tempo era um problema”, explica. “Nós éramos olhados como pessoas diferentes por não falarmos inglês mas também por termos uma cultura diferente, e isso, em certa medida, continua ainda hoje”, acrescenta. Lucília sabe do que fala, pois tem trabalhado com todas as etnias, e se hoje a portuguesa já adquiriu algum respeito e direitos, outras há que ainda têm muito caminho a percorrer nesta longa estrada. “Eu não tenho dúvidas de que sou o que sou hoje, defendendo os direitos dos emigrantes e dos outros que não têm acesso a serviços devido à sua pouca proficiência em inglês, por causa de ser também emigrante e de ter vivido essa experiência”, diz. “As estruturas do sistema eram complicadas nesse tempo o que provocava descriminação, mas hoje elas continuam a sê-lo em grande medida”, acrescenta. Essa experiência dos primeiros anos de emigrante, onde sentiu na pele a discriminação, acabou por ter um impacto positivo na sua personalidade e na pessoa que é hoje. “Podia ter tido um impacto negativo”, diz Lucília, “mas felizmente foi o contrário”. Lucília recorda que esses foram tempos difíceis, especialmente para os jovens, habituados a outra cultura e outras formas de vida. “Nós estávamos habituados a ficar sozinhos em casa, ou com familiares, nos Açores”, diz. “Aqui era tudo diferente, não havia essa liberdade nem estrutura social, as leis eram outras e isso causou grande impacto sobretudo nos

Com os pais e irmõs quando emigraram para os Estados Unidos

jovens”, acrescenta.

O gosto pela política A escolha do curso de Ciências Políticas surgiu pela atracção que sentiu pela política desde muito cedo. “A política fascina e atrai muito as pessoas, mas por vezes elas não sabem do que estão a falar”, diz. “Eu sentia-me revoltada quando ouvia certas pessoas falarem sobre política pois sabia que elas não estavam bem informadas”, acrescenta. A sua vocação de defesa dos excluídos por causa da língua começou ainda nos seus tempos de universidade quando trabalhou num hospital do Estado de Massachusetts. Foi aí que conheceu verdadeiramente o sistema e a forma com ele tratava quem não dominava a língua inglesa, excluindo ou afastando de cuidados de saúde básicos grande parte da comunidade emigrante. “Eu vi que faltava alguma coisa aos serviços, pois os doentes que não dominavam a língua inglesa não podiam comunicar da mesma maneira que os outros com o médico ou enfermeira ou funcionários, sendo assim excluídos não só de informações médicas importantes para o seu tratamento, como de cuidados básicos ou de beneficiarem das capacidades que o sistema lhes poderia proporcionar se dominassem o idioma”, explica. “A comunicação entre médico e doente nunca era directa, havia sempre uma terceira pessoa, o intérprete, o que é importante. Mas eu penso que quando se trata da prestação de serviços judiciais ou de saúde, onde está em causa a privação da liberdade de uma pessoa ou o risco de morte, todos estes serviços têm que ser muito mais culturalmente competentes. Ou seja, precisamos de muitas pessoas nas

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nossas comunidades que sejam advogados, enfermeiros, médicos que nos prestem esses serviços sem haver entre eles e o utente a barreira cultura e linguística”. Lucília apercebeu-se dessa falha tremenda no sistema e começou desde cedo a sensibilizar o pessoal médico e auxiliar para a necessidade de se ultrapassar essa barreira, nascendo daí a sua militância em defesa das comunidades de emigrantes. “Nos anos 70 e 80, e apesar dos serviços começarem a contratar intérpretes, as falhas culturais eram enormes”, explica. “Infelizmente, ainda hoje”, acrescenta. Ainda na Universidade, Lucília fez um trabalho de pesquisa no âmbito do seu curso que a levou ao contacto mais directo com as comunidades de emigrantes de Massachusetts que acabou por a despertar e consciencializar para estes e outros problemas com que se deparavam diariamente estas pessoas. Em 1987 viu no jornal, por acaso, um anúncio onde se pediam pessoas para trabalhar directamente com emigrantes no âmbito do programa de amnistia do presidente Ronald Reagan. Ela até se sentia bem no trabalho que tinha, mas o desejo de trabalhar mais de perto com a realidade emigrante levou-a a concorrer, sendo admitida na arquidiocese de Bóston. “O meu trabalho era preparar os candidatos para irem às entrevistas de legalização, determinando a sua elegibilidade e elaborando os processos caso a caso. Era eu que os representava junto dos serviços de emigração e terminava o seu processo. Posso dizer que legalizei centenas e centenas de pessoas durante o tempo que ali trabalhei, o que foi uma experiência fascinante”, explica. Muitos desses casos ainda hoje a tocam

ComunidadesUSA


profundamente, pois nem todos foram bem sucedidos. “A emigração é um fenómeno muito interessante. O que nos leva a emigrar a todos é a procura de uma vida melhor, e isso tem um valor muito grande. Mas mais valor tem quando se deixa o seu país em busca do sonho sabendo que se pode ficar indeterminadamente sem documentos num outro país. As pessoas sofrem muito nesta situação, é uma estrada sinuosa, com muito sofrimento, humilhação e exploração”, diz Lucília. Por outro lado, “a falta de informação torna as pessoas nestas circunstâncias muito vulneráveis”, diz. “Ainda hoje, grande parte das nossas comunidades desconhece que existem agências e departamentos que podem ajudar os idosos das mais variadas formas, e é isso que nós fazemos: educar e informar as pessoas sobre esses serviços a que elas têm direito”, explica. Este trabalho constante vivendo o sofrimento alheio teve consequências na vida de Lucília, que não pode ficar insensível aos numerosos casos, alguns dramáticos, que lhe passaram, e continuam a passar, pelas mãos. Recorda, por exemplo, um cidadão da Etiópia que, depois de ter vivido anos num campo de refugiados, consegue finalmente emigrar para os Estados Unidos. Lucília tratou-lhe do processo, conseguiu-lhe casa e trabalho até ele arranjar emprego junto de outros cidadãos etíopes em Dallas. Começou então a tratar do processo para trazer a esposa a fim do casal se juntar, e já quando esta vinha a caminho dos Estados Unidos Lucília soube que no negócio onde o marido trabalhava tinha havido um tiroteio e este fora morto. “Coube-me a mim ir ao aeroporto de Bóston esperá-la para lhe dar a notícia. Mas nem eu falava etíope nem ela inglês. Foi muito difícil”, recorda com tristeza.

Vítima do sistema que combatia À frente do Elder Service de Merrimack Valley do Massachusetts SMP Program, Lucília continua o seu trabalho em prol de quem não fala inglês, de modo não só a permitir o acesso aos cuidados de saúde, como a prevenir os abusos do sistema. “É um programa cujo objectivo principal é informar os beneficiários do Medicare, portanto os reformados, para melhor compreenderem as contas que recebem do hospital, o que devem pagar e não pagar, os testes que fizeram, ComunidadesUSA

os serviços prestados e se o Medicare está a ser usado fraudulentamente de modo a recuperar o dinheiro cobrado indevidamente”, explica. “Quando comecei a trabalhar neste programa vi logo que as comunidades emigrantes não estavam sensibilizadas para esta questão de poupar dinheiro ao governo, pois em 1996 esse mesmo governo tinha retirado direitos às pessoas com a reforma do Welfare”, explica. “O drama era como fazer compreender Lucilia Prates-Ramos com a Congressista estadual Denise Provost (D-Somerville) às pessoas que quanto mais poupassem ao governo, mais pessoas anualmente em consequência de infecbenefícios poderiam ter”, acrescenta. Mas a sua paixão pelos serviços multi- ções adquiridas nos hospitais, o equivalente à étnicos e multiculturais acabou por resolver o queda de um avião com 270 passageiros todos problema passando a mensagem de que os er- os dias do ano. Eu pergunto o que faria o goverros do sistema médico não só custam milhões no se isto acontecesse na aviação”, indaga. Mas as mortes no sistema médico americade dólares ao erário público, como podem custar a própria vida ao utente. A campanha foi no não se restringem às infecções: anualmente lançada e decorria numa altura em que Lucília mais de 100 mil pessoas morrem nos Estados foi vítima do sistema, pois o seu pai morreu em Unidos em consequência de diagnóstico ou consequência de um erro médico no hospital tratamento errado. “É uma calamidade”, diz Lucília Prates. após uma operação de rotina. No país que mais dinheiro gasta per capita “Foi aqui que eu tomei consciência que na saúde, algo vai muito mal face a estes númenão se tratava de salvar dinheiro, mas salvar vidas”, diz. “E desde aí a campanha continua ros. “É por isso que a mensagem está hoje mais com os mesmos objectivos: quantos mais erros actual do que nunca e deve ser multicultural do sistema médico conseguirmos evitar, mais e multilinguística”, diz Lucília. Por isso o seu trabalho continua. vidas salvamos”. “Vou continuar a despertar consciências “A morte do meu pai consciencializou-me para esta luta como uma missão, com mais nas comunidades emigrantes para esta quesconvicção e dedicação, pois ela veio confirmar tão, pois este é um pais de emigrantes que definitivamente aquilo que eu sentia durante precisam de ter também uma voz que seja anos, de que as pessoas com pouco domínio da ouvida. Eu sei que é um grande desafio, mas língua inglesa, com sotaque, cor diferente ou as pessoas devem consciencializar-se que esta os emigrantes, são tratados de uma forma di- é a terra onde vivem e fazem a sua vida, por ferente, ”, diz. “É muito importante continuar o isso devem envolver-se. Sei que isso foi difimeu trabalho, sei que vai levar tempo a mudar cultado no passado pelas autoridades e que a o sistema e não depende apenas de uma pessoa, barreira linguística continua a dificultar, mas mas temos feito muitos progressos nesta área não podemos desistir”, diz. Isto porque ainda há um longo caminho a no Estado de Massachusetts”, acrescenta. Um passo grande nesse sentido foi dado percorrer. Especialmente no que diz respeito quando ela fundou o programa Health Care às primeiras gerações. “Para as pessoas da idade dos meus pais, For All, destinado não só a consciencializar as pessoas para os erros médicos, mas também a com um domínio linguístico reduzido, com tornar o próprio sistema mais transparente e sotaque e aparência diferente, é muito difícil algum dia integrarem-se totalmente nesta sointeligível ao cidadão. “Presentemente, nos Estados Unidos da ciedade”, diz. “É sempre uma integração com América morrem aproximadamente 100 mil limites”, conclui. May 2009

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VINHOS

A Exuberância do Alentejo

por Mariana Simões

A Herdade de São Miguel

∞ Herdade de São Miguel Colheita Selecionada Dos vários prémios arrecadados pelos vinhos da casa AgrÍcola de Alexandre Relvas, o Herdade de São Miguel (Colheita seleccionada) 2005, conquistou a medalha de Ouro pelo “Wine Masters Challenge” em 2007. Este vinho tem esta merecida medalha de Ouro pelo o seu palato distinto, que nos transporta ás lindas paisagens alentejanas. Produzido no Alentejo na zona do Redondo, tem como castas tintas o Aragonês, Trincadeira, Alicante Bouschet, e Cabernet Sauvignon. Revela ser um vinho impulsivo com uma forte personalidade, caracteristica do vinho Alentejano. Colheita selecionada 2005, revela um aroma de uma complexidade extraordinária a frutos vermelhos, e especiarias, bem integrado com tostados e baunilha, resultante do seu reposo em barrica durante 4 meses. No paladar nota-se uma estrutura equilibrada, arredondada com sabor único a fruta e pimentão verde, com uma boa base taninica que lhe confere longevidade e persistência. O comprimento desta persistência revela a capacidade de envelhecimento deste vinho. Esta exuberância Alentejana revelou ser bem acabado, elegante e pode ser uma excelente opção para refeições de leve a médio peso. É importado pela Vintage Trading, Waterbury CT. www.herdadesaomiguel.com

Merino 2005

Invocando a raça das Ovelhas Merino

Importador para os Estados Unidos

Vintage Trading 23 E Aurora St Waterbury, CT 06708 (203) 575-9446 ComunidadesUSA

Herdade de São Miguel, é uma estrutura muito bem implementada e gerida, que foi adquirida, em 1997, pelo gestor Alexandre Relvas, que resolveu apostar na elaboração de óptimos vinhos, no Alentejo. Este vinho, em particular, produzido no concelho de Redondo, é uma homenagem à raça de ovelha Merino. Estas ovelhas, são uma raça com muita história nesta zona, tendo sido em conjunto com a vinha, a base da actividade desta bela região. As castas tintas dominantes do vinho Merino são o Aragonês, Castelão e Trincadeira. O Merino 2005 revela ser um vinho ligeiramente frutado, com uma boca fluída, suave e aromática. Apresenta-se como um vinho simples e muito tradicional. Á cor de tons vermelho vivo, alia-se um aroma suavemente complexo de fruta fresca, de coco e chocolate . Na boca revela uma doçura média onde se evidencia os taninos redondos com recordação curta, mas com um final intenso. Será um tinto que acompanhará perfeitamente uma Carne de Porco á Alentejana ou de um frango no churrasco. É importado pela Vintage Trading, Waterbury CT. May 2009

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Shall I Call You Jo Jo or Maria João? A story of a luso-american that moved to Portugal and decided to came back home at 36 by António Simões

The issue of ComunidadesUSA, Vol. 1, October 2007, carried an article about an Agostinho Nogueira returning back to Portugal or “regressar de vez”. The research on immigration suggests that when many families return back to their own lands “de vez,” some with their young children. It is not rejecting their experience in a foreign land. It is just simply returning to a comfortable environment that they once knew. This is an interview on one such event. Her name is Maria João Abreu da Costa known in Portugal as Maria João. However, many of her friends and some of her family members in the United States know her as Jo Jo. When she was 12 years old, and with her parents she went to Portugal. She returned to the United States at the age of 36. I am not sure that she came back to the United States “de vez.” It is too early to make this prediction, but since she has two children who are now very young and by the time they become adults, they may be more” American” than “Portuguese.” They most likely will be labeled by the sociological and educational literature as “LusoAmericans.” So let us explore this interesting phenomenon called language and culture-in-contact. Simões: Thank you for permitting me to have a discussion with you about your decision to return to the United States. As you know in the immigration literature, it suggests that after being in the United States for a number of years many immigrants go back to Portugal. But here you are doing the reverse. Let’s start by asking you: As a child of 12 years old, what were your feelings when you left the United States and moved to Portugal? Maria João: When I arrived in Portugal I think I adapted very well. I was still a child.

I felt that I had more freedom there then I had in the United States. So at first I don’t think it was a difficult transition. Still, I felt I was half Portuguese and half American. I didn’t know what country I belonged in. As the years past and as a teenager in high school in Portugal, I felt that I had a different ways of seeing things than of my colleagues. I really did not know what it was. Simões: It is interesting what you say. I have talked to many children who are really more integrated in the United States, but most tell me that when they go with their

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Maria João

parents to Portugal for vacation, they have more freedom. What is your meaning of this concept? Maria João: I could spend more time outside. Even then, we talked about violence, kidnapping and things that happen to children. It does not mean that in other countries it does not happen, but in the United States we are more conscious of the phenomena. So for a child playing outside and not thinking about this for me it was freedom. I could leave my toys or my bicycle outside and not worry that they would be stolen. Simões: I am curious about your name Jo-Jo because you name in Portuguese is Maria João. How did this happen? Maria João: That is a funny story. My school records identified me as Maria João Abreu. So the teachers began calling me Maria. My mother did not see me as “Maria” so she nicknamed me “Jo Jo.” After that all

ComunidadesUSA


my friends and family in the United States started to call me Jo Jo. Simões: How about your school experience? Did you have difficulty with your Portuguese and in school? Maria João: At first I had problems with the language. The school culture was also very different. I felt that the teaching styles were also very different. So, the first years were a little bit difficult. Simões: When you were in Portugal growing up as a teenager, did you ever come back to the United States? Maria João: Yes. I was nineteen years old. I was thinking at that time to study here. This was because in Portugal it was sometimes difficult to select a major for a profession. At that time there were few private universities. The public universities had quotas for each major. So, I was thinking of studying here. I do not know then if I would have stayed in the United States or would have gone back to Portugal. But it did not end up this way. Simões: Did you see any of your old friends when you came back? Maria João: Unfortunately, I didn’t. I called, but I never had a chance to see anybody. Simões: Here you are in the United States. Your children are growing up. It must be interesting to see them experiencing a bilingual bicultural environment. Do you see them now becoming more “Americanized?” Maria João: I don’t know that some day they will want to stay here or go back to Portugal. I always ask myself if they are going to have the same feelings I had when

Maria João and her family

highly qualified, to get a good job there you have to know the system and people who can help you to get employment. I reached a certain level in my career and I was in my mid thirties. To get ahead was more difficult there than it was here. I am not saying that many there do not have successful careers,

“I don’t know that some day they (her kids) will want to stay here or go back to Portugal. I always ask myself if they are going to have the same feelings I had when I went to Portugal as a child”. I went to Portugal as a child. I think here they will have more opportunities. When they grow up they may be divided by two cultures, but I think by then they will be more American than Portuguese. Just by the fact of not growing up in Portugal will make, I believe, a tremendous difference. Even if the economy there is better, still they will miss the culture they understand the most. Portugal is a very small country and has limited career opportunities. Even if you are

but it is very different than the United States. The way of thinking in a work environment here is not similar than it is there. Since my children are going to be comfortable in the American culture, it is most likely difficult to adapt in Portugal. Simões: Your husband has never been in the United States. He is forty years old and I assume very use to the Portuguese environment. How do you see him in this transition? On a funny note, how is he

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dealing with the snow and cold in Connecticut? Maria João: He has adapted very well. Still in his heart he is always thinking about Portugal and all his friends he left there. At first he thought he could be here for a few years and make enough money to go back. Now I think he realizes that it is not possible. What I find interesting is that he notices things that I do not. I see many things as “natural.” He sees some things as different. For him, it is a new experience. The first snow was a great experience for him. I am not so sure if now he has the same feelings about the cold and snow. Simões: Yes, people from other places sometime do see things differently. I remember one time someone visiting the United States said to me: ”António, there is so much water here.” I never noticed that. Now I am aware of this when I see lakes and rivers. Let’s us continue. Why did you leave Portugal? You are a college graduate. (Cont. next page)

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(In Portugal) the economy was not stable and many doors were closing on us. I was 35 years old and considered too old to enter a new career... Maria João: The economy was not stable and many doors were closing on us. I was 35 years old and considered too old to enter a new career. In Portugal, I did it the other way around. I first got married and had my children. Then I decided to go back to school to finish college. Hence, my age was now against me. At my age, I should have had more experience in my field. My husband also lost his job. After a while, we had to find a way to support our family. Because I was born here and I was an American citizen, we had the opportunity to come to the United States. So we made that choice. Simões: It is interesting that you said something that some of the research literature suggests. That is, the concept of age may be different in Portugal than in the United States. This question does not imply any criticism of Portugal. It is simply

Simões: Now you are here in the United States. As I understand, you already bought a single family home in CT and you have an important position in a bank. Your husband is working in a shipyard and has an excellent salary. Just tell me about this “success.” I do realize you and your husband work very hard and sacrifice many things. Are you glad that you made this move? Maria João: It is kind of a victory where we are now. We did not have this chance in Portugal. Simões: How do you compare the work environment or the work place here and in Portugal? Is it different, the same, or does it just depends on your boss? Maria João: I think it is different. Here, there are evaluation systems to let you know

“Here, there are evaluation systems to let you know if you are doing a good job. They tell you that you are valuable in the organization. In Portugal you are left alone. When you make a mistake your superiors will let you know. The system of hierarchy is more pronounced than it is here”. to show the difference about the concept of age in both cultures. You are now in an important position in a bank. You were hired in your mid thirties. What would you like to say about this experience? Maria João: Yes, I was surprised that age was not a factor. When I was interviewed they looked at my qualifications. I think this is the way it should be. You can be 50 or 60 years old, but if you can do the job why not hire the person? I think part of the culture there is that after a certain age people think you can not learn something new, or it is harder for a person to adapt to a work place. Also, at the same time, because there are so few opportunities, the competition is more intense. Once at an interview, the person said that my qualifications were fine. I was just a little bit older than the firm hired. She said: “We only hire people up to 26 or 27 years old.” ComunidadesUSA

if you are doing a good job. They tell you that you are valuable in the organization. In

Portugal you are left alone. When you make a mistake your superiors will let you know. The system of hierarchy is more pronounced than it is here. A “boss” is treated in a different way. Here, even if you know there are systems of hierarchy, you still feel that you are treated more on an equal basis. There we have to speak more carefully to our superiors. Simões: What is the biggest thing you miss about Portugal? Maria João: My family and friends. I miss our family reunions and visiting my friends on weekends. Here, we do not have that kind of time to build relationships. I am sure that eventually this will change. As a country, the weather (laughing) is a big factor. I also miss the beaches. I also miss the food, the restaurants, etc. Things that I took for granted, now I miss a lot, like having a “bica.” Simões: Before we conclude, is there anything you would like to say about your experiences? Maria João: Well I think the reason why most people leave to another country is to have a better life. It is important not to forget your roots or where you came from. For me, I fortunately have two places or roots. We should never forget our native language and I want my children to maintain the Portuguese language. Maria João: Either way is fine. That is who I am. I am Jo Jo and I am Maria João. Simões: Thank you Jo Jo and Maria João, I hope this venture for you and your family will be a healthy and successful one.

Uma aberração portuguesa Em 2060 estima-se que haverá em Portugal 271 idosos para cada 100 jovens. Consideram-se idosos os cidadãos reformados, ou seja, com mais de 65 ou 68 anos. Mesmo muito antes da crise económica que o país atravessa, uma pessoa com 35 anos já era considerada velha para trabalhar numa empresa, desperdiçando-se assim a experiência e o saber a favor da juventude alegadamente com a justificação de que era preciso aumentar a produtividade no país, embora a Constituição Portuguesa garanta o direito ao trabalho “sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas”. Mas nós bem sabemos como se cumprem as lei em Portugal. Esta, e outras aberrações que vedam o trabalho a maiores de 35 anos, levaram o país para onde ele está hoje – cheio de reformados, desempregados, alunos desqualificados e jovens desiludidos da vida cuja saída, como antes, é a emigração. Quanto ao aumento da produtividade... May 2009

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A Rosinha da Foz velha do Porto, a nossa “babe” Didrikson Zaharias! Nos recônditos do seu peito pulsou sempre um coração tão Nortenho quão Português. por EDMUNDO MACEDO

A Rosinha da Foz Velha do Porto faz-me lembrar a “Babe” Didrikson Zaharias, uma de sete filhos de imigrantes noruegueses que foram fixar-se no Sudeste do Texas e se afirmou como uma mulher-gigante do Século XX, juntando-se em toda a sua magnificência a Margaret Mead – célebre autora e antropologista americana –, a Eleanor Roosevelt – quiçá uma das mais admiradas Primeira Dama dos Estados Unidos e decerto Primeira Dama do Universo, reconhecida internacionalmente pelo seu trabalho e esforços humanitários e, finalmente, a Agnes Gonxha Bojaxhiu – a santíssima Mother Teresa nascida em 1910 em Skopje, então parte da Jugoslávia. Quatro Mulheres-Gigantes do Século XX! Há pontos de similaridade entre a nossa Rosa Maria (“Rosinha”) Correia dos Santos Mota e a Mildred Ella (“Babe”) Didrikson Zaharias. Entre elas - colossais atletas! - há sinais e marcas distintivas comuns, que desde logo as colocam num horizonte, num trono e num “céu” inacessíveis a menos do que gigantes! De aí que as diga fenómenos raros e as admire incondicionalmente. De aí que as considere eminentes pelo seu talento, valor e coragem. De aí que lhes reconheça qualidades de paridade com o Homem. Curiosamente, são ambas de Junho. A Babe – que viveu apenas até 1956 – nasceu há 97 anos em Port Arthur no Texas e a Rosinha há 50 anos em Foz Velha do Porto. Zaharias distinguiu-se no princípio – em competições nos seus primeiros anos de escola – como uma atleta tão dotada que excedia todas as outras a correr, saltar, jogar e a pensar – parecendo que a Natureza a produzira num rasgo de excepcional perfeição. Na Universidade salientou-se nas equipas femininas de basquetebol e ténis e durante os Jogos Olímpicos de 1932 em Los Angeles – o mesmo ano em que Amelia Earhart se tornou na primeira mulher a voar solo sobre o Atlântico! – Zaharias conquistou medalhas de ouro, com recordes mundiais, no lançamento do dardo e nos 80 metros barreiras, enquanto um pormenor técnico a privou de terceiro ouro no salto em altura. A Babe excedeu no Desporto a Mulher! Não conseguiu exceder-se a si própria porque foi inesgotável! O seu multifacetado e incomparável legado que a qualificou como a melhor atleta – homem ou mulher – da primeira metade do Século XX, nutre o aplauso público pela sua excelência em desportos tradicionalmente competitivos e absorve de ComunidadesUSA

um trago a plêiade que com ela e contra ela competiu. Zaharias dominou em saltos aquáticos, softbol, golf, basquetebol e atletismo. Zaharias desafiou noções consuetudinárias de feminidade com as suas arrojadas piadas à imprensa. Zaharias dilatou os limites aceitáveis do que uma atleta podia e devia ser. A biografia de Babe Didrikson Zaharias obriga o fascínio, dá razão a trabalho longo e torna delicioso escrever. Como, porém, se torna igualmente delicioso escrever sobre uma mulher-gigante da Nobre Cidade Invicta, vou deixar por agora a Babe e falar da nossa Rosinha. Irei falar da Rosa Maria como quem fala de uma das mais delicadas rosinhas-de-Portugal – como as que salpicam com cor suave tufos alindando o lindo da inigualável Sintra e despontam como a aurora entre o verde-alourado do musgo, o fresco dos limoeiros e a giesta a explodir uma sinfonia de amarelo. Rosa Mota foi considerada como uma das melhores maratonistas do Século XX. Rosa Mota corria como o vento. Corria com a agilidade da gazela. Com a intrepidez do menino Gavroche. A Rosinha saltitava como a alvéloa. Legou às estradas imagens de pura elegância. Por pouco não transformou ligeireza em volátil. Tratava o asfalto com reverente delicadeza. Parecia não querer beliscar o betume negro e lustroso. Corria como lume que ela ateava soprando. Tinha no mínimo três pulmões, não apenas dois. Corria-lhe nas veias sangue Lusitano. A nossa Rosinha pediu asas emprestadas. Tardou a devolvê-las e Portugal benfeitorizou. Corria a Maratona como se fosse em passeio de Lordelo do Ouro a Cedofeita. Nos recônditos do seu peito pulsou sempre um coração tão Nortenho quão Português. Quando corria, a Rosinha sentia a voz dos nossos egrégios avós que haveriam de levá-la à vitória. A Rosa Maria nunca esqueceu as nobres Comunidades. Emigrante nos fins de semana, cumulou-as, diligentemente, de esperança. Robusteceu-as de orgulho.

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Fê-las acreditar. Fê-las sonhar. Levou-lhes, volta e meia, alegrias indescritíveis, Incitou-as a trazer na lapela o emblema da Ditosa Pátria. Com o verde e o encarnado, a esfera armilar e as cinco quinas. O emblema mais bonito do mundo. Em 1982, nos Campeonatos da Europa em Atenas, a Rosa Maria correu a sua primeira Maratona. O ouro – dizia-se – pertencia à Ingrid Kristiansen. Erro crasso pois a corredora portuguesa prevaleceria conquistando na Grécia a sua primeira peça de sentido valiosíssimo e cara ourivesaria! É assim em todos os desportos. Só ganha o ouro quem nasceu predestinado! Na sua primeira Maratona Olímpica em 1984 em Los Angeles, a Rosinha sofreu um percalço. Trouxe bronze em vez de ouro. Um transtorno do ofício, remediável nas mãos dela. Quatro anos depois, na Olimpíada de Seoul na Coreia do Sul, a Rosa Maria atacou a dois quilómetros da meta conquistando o ouro e deixando a prata para a Lisa Martin. Ouro, ouro e ouro enriqueceram também o bolso da nossa Rosinha nos Europeus de 1986 em Estugarda e de 1990 em Split e no Mundial de 1987 em Roma. Só ganha o ouro quem nasceu predestinado! É assim em todos os desportos. Em 1987, 1988 e 1990 a Rosa Maria triunfou na Maratona de Boston e em 1985 repetiu em Chicago o triunfo de 1984. Com a sua postura campeã privilegiou Roterdão em 1983, Tóquio em 1986, Osaka em 1990 e Londres em 1991, indo ali dizer que a Foz Velha do Porto e Portugal existiam e conquistar, categoricamente, o primeiro lugar. Sempre o primeiro lugar! Sempre o ouro! É assim em todos os desportos. Só ganha o ouro quem nasceu predestinado! Como as essências coníferas que predominam nas florestas do norte do hemisfério, entre 1982 e 1991 predominou no mundo a essência Rosa Mota! Predominou a sua qualidade de maratonista extraordinária! Predominou a sua genética propensão para vencer! Para vencer sem se jactar! Na excelência e humildade de Rosa Mota, Portugal resplandeceu! A Rosinha da Foz Velha do Porto faz-me lembrar a “Babe” Didrikson Zaharias ... Ao escrever estas linhas tive sempre a Rosinha no pensamento. E a infinita paciência da minha Mulher. E a saudosa memória da minha Mãe. 35

Sem mais comentários...

Francisco Vieira Já passavam das 22:00 quando finalmente o Joãozinho ouviu o carro do pai entrar no portão da garagem. Fez um esforço para se levantar do sofá onde já dormia para o ir esperar à porta. Gostava de lhe arrumar os sapatos no armário e de lhe levar a pasta para a biblioteca. Esse seu pequeno gesto passava quase sempre despercebido a quem chegava àquela hora a casa depois de um dia inteiro de trabalho, cansado, enervado e com pouca vontade para qualquer tipo de conversas ou brincadeiras. O Joãozinho já estava acostumado a essa indiferença e nervosismo do pai de cada vez que chegava a casa, e por isso já sabia que o melhor era sentarse no sofá enquanto o pai jantava a comida que já estava à sua espera no micro-ondas, ou então despedir-se já e subir para o quarto para não o deixar ainda mais aborrecido. Mas naquele dia o menino de apenas 7 anos tinha um pedido a fazer e por isso deixou-se ficar por ali à espera que ele acabasse de jantar. Quando achou oportuno chegou-se à mesa e perguntou ao pai quanto é que este ganhava por hora. O pai achou muito estranho aquela pergunta, mas acabou por lhe responder que ganhava 40 dólares por hora, mas não sem antes querer saber o porquê da pergunta. É que eu queria que me emprestasses 20 dólares, diz o petiz... O pai ficou furioso e pôs-se a ralhar com o menino: "Então tu achas que eu me esforço a trabalhar tantas May 2009

horas para te andar a dar dinheiro, para brincadeiras tuas? O que é que te faz falta aqui em casa, para precisares desse dinheiro? Vai mas é já deitar-te que eu não me quero mais chateado e aborrecido do que já estou." O menino calou-se, deu um beijo ao pai e subiu as escadas para o seu quarto, sem tocar mais no assunto. O pai acabou de jantar, sentou-se a ver as notícias, mas aquele pedido do filho não lhe saía da cabeça. Quando ficou mais calmo começou a pensar se não teria sido demasiado duro com o garoto... afinal 20 dólares não era assim tanto dinheiro e poderia ser para comprar algum brinquedo que tenha visto por aí, ou até para comprar um presente à mãe, cujo aniversário era já para a próxima semana... Subiu ao quarto do menino e entregou-lhe os 20 dólares, desculpando-se por lhe ter gritado lá em baixo, alegando andar muito cansado e enervado por causa de uns problemas com o chefe no emprego. O menino sorriu e enfiou a mão debaixo da almofada retirando umas outras notas que já lá tinha guardadas. O pai ao ver aquilo enfureceu-se de novo dizendo: "Então se tu já tens aí 20 dólares, porque vieste pedir-me mais dinheiro? O que é que queres comprar que custe assim tanto, uma criança de apenas 7 anos de idade? Tu tens que aprender a ter noção do valor do dinheiro, porque 20 dólares são meia hora de trabalho do pai e eu é que sei o que me custa por vezes passar essa meia hora. O menino respondeu ao pai, com as lágrimas nos olhos: ”Não quero comprar nada paizinho. Os 40 dólares que preciso são para te pagar uma hora do teu tempo, no dia do aniversario da mãe. Há mais de um ano que não te sentas a jantar connosco à mesa e eu gostava que desta vez estivesses em casa na hora de lhe cantar os parabéns”. ComunidadesUSA


DA AMÉRICA E DAS COMUNIDADES

por DINIZ BORGES (na Califórnia)

Da crise económico-financeira ao Congresso da LAEF por DINIZ BORGES

1. A cultura do dinheiro, que temos vivido com algum excesso aqui nos Estados Unidos, particularmente durante os últimos anos, está cada vez mais a abalar a sociedade estadunidense. Há anos que o mundo americano tem voltado as costas às ideias e abraça o consumismo. É espantoso o ter em relação ao ser. Com a actual crise económica, vê-se, um pouco por toda a parte, que a América, e o mundo, necessitam, urgentemente, uma reavaliação. O chefe de gabinete do Presidente Barack Obama, o antigo congressista Rham Emanuel diz que não se deve “desperdiçar uma crise.” Daí que, com os dilemas económicos que todos os sectores da sociedade americana estão a sentir, o momento é propício para uma reflexão interna sobre o que é, verdadeiramente, o mundo americano. Seria um erro seguir os paços do antigo Presidente George W. Bush, que pouco depois do 11 de Setembro, ao ser questionado sobre o que poderiam ou deveriam fazer os cidadãos americanos perante a situação de crise que se vivia, respondeu: devem ir às compras. E assim o fizemos, sem pensar duas vezes. Comprámos tanto, gastámos tanto, desperdiçamos tanto que agora não aguentamos com o peso das compras. Infelizmente estamos a viver uma época de niilismo cultural. Quando se fala em reduções nos serviços públicos, fala-se, de imediato, em reduções no ensino. Nem que já não tivéssemos demolido uma grande parte do nosso ensino público, particularmente as universidades tornando-as em fábricas de diplomas ao serviço das grandes multinacionais. As humanidades, a disciplina que nos obriga a reflectir sobre os grandes temas que afectam os seres humanos, que desafia a validade das estruturas e dos sistemas que erguemos, que nos ensina a ter espírito crítico, incluindo a autocrítica, e a criticar todas os padrões culturais, essa importantíssima disciplina está na retaguarda dos sistemas do ensino universitário, para não falar nos outros segmentos do ensino. A comunicação social americana, que tem por obrigação promover esse debate cultural ComunidadesUSA

e intelectual, questionando tudo o que nos é dito e redito, confunde, na maioria das vezes, pão e circo por notícias e, sistematicamente, recusa dar voz a quem desafia, não uma mera atribuição de um bónus a este ou aquele director duma multinacional, mas sim quem questiona a estrutura perniciosa do mundo das multinacionais, de uma elite sem conexão com o cidadão comum. Infelizmente, ajoelhamo-nos perante o “culto do eu”, elaboradamente construído pelos arquitectos desta nossa sociedade do consumo, que desencoraja a compaixão, o sacrifício em prol de quem tem menos, a verdadeira justiça social e a honestidade. O método utilizado para atingirmos o que queremos, dizem-nos na comunicação social e nas faculdades das ciências económicas, é irrelevante. O sucesso, definido pelo dinheiro e pelo poder que se possui, é a única justificação que precisamos. A capacidade de manipulação é reverenciada. Daí que o nosso colapso moral, como sociedade que vai além do que é material, é tão perigoso como a presente crise económica. É que nos Estados Unidos apenas 8% dos licenciados fazem-no nas humanidades. Entre 1970 e 2001, as licenciaturas em Inglês (literatura) decresceram de 7,6% para 4%--uma redução de quase 50%. As licenciaturas em línguas estrangeiras diminuíram mais de 50%, ou seja foram de 2,4% para apenas 1%, matemáticas de 3% para 1%, ciências sócias e história de 18,4% para 10%. Entretanto licenciaturas em ciências económicas, ou melhor “business”, que é outra loiça, aumentaram de 13,6% para 21,7%. Essa disciplina de “business” ultrapassou a área que durante várias décadas se manteve como a mais popular, ou seja, a educação. Se é de facto um grande erro “desperdiçarse uma crise”, estamos perante um momento crucial e definitivo para a história americana, uma oportunidade para se reflectir e reequacionar as prioridades do país. A América tem que voltar a ser o país das grandes ideias e não simples e unicamente o país das grandes companhias. É que foram as ideias que permitiram

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as grandes companhias e não as grandes companhias a permitirem as grandes ideias.

O Congresso da LAEF

2. Já há anos que frequento o congresso anual da Luso-American Education Foundation, organização da qual sou membro há largos anos e da qual tenho feito, de vez em quando, parte do conselho consultivo (advisory board). Este ano não foi excepção e lá estive no 33º congresso realizado na Universidade Estadual da Califórnia, Stanislaus. Há vários anos que reflicto sobre este congresso. Tenho alguns textos, que estão incluídos nos livros América: O Outro Lado do Sonho e O Outro Lado da Saudade, analisando alguns congressos desta organização. Também já organizei, ou estive no cerne da organização, de meia dúzia. Daí que sinto uma obrigação de, mais uma vez, os reflectir. E desejo fazê-lo no contexto que durante 12 anos organizei o simpósio literário/dramático Filamentos da Herança Atlântica, que nunca foi bem compreendido na comunidade, começando pela organização que o patrocinava, ou melhor, que recolhia os patrocínios que solicitava aqui e em Portugal, organização que no seu conjunto de 12 simpósios nunca perdeu dinheiro com o mesmo, mas que mesmo assim, sempre o hostilizou. É nesse contexto que gostaria de reflectir sobre o congresso da LAEF. Primeiro há que dizer-se, descomplexadamente, que mesmo quando estes eventos têm fraca adesão, como aconteceu este ano, e tem acontecido em outros anos, estes espaços de reflexão comunitária são extremamente importantes. Daí que apresento, publicamente, os meus parabéns, a quem trabalhou e organizou mais um congresso. É sempre uma tarefa árdua trabalhar-se num evento desta natureza. Mas acreditem que é um trabalho necessário. Árduo, porque este tipo de acontecimento (Conclui na página seguinte) 36


é completamente incompreedido por muita gente nas comunidades, particularmente pelos líderes do nosso associativismo e mesmo por pessoas que estão ligadas ao ensino e à divulgação da cultura. Penso que este espaço que a LAEF disponibiliza, com o apoio duma comissão local, é importante para se debater a metamorfose da nossa comunidade. Já o escrevi nos livros supracitados que se perdermos o congresso da LAEF perderemos o único espaço que nos resta neste tipo de acontecimento. Já lá vão os outros acontecimentos que se promoviam de índole cultural por esta Califórnia. Estamos cada vez mais pobres em termos de acontecimentos culturais que vão além do simples, do pomposo, da efémera festa de conversa fiada com copos. Que os congressos da LAEF precisam, duma séria e necessária reflexão, ninguém o negará, mas há que reconhecer que sem eles estariamos num verdadeiro deserto cultural. Sem um único espaço regular onde ainda se possa apresentar estudos e análises, onde se possa debater e pensar as nossas vivências em terras californianas e no mundo norte-

americano em geral. Os dilemas estão à vista e precisam ser reflectidos. Entre outros: onde estão as centenas de jovens que temos a exercer a profissão de professores nos mais variados ramos do ensino primário, secundário e universitário? Onde está um espaço dedicado à reflexão comunitária, nas suas várias vertentes? Onde está um espaço para a apresentação de estudos sobre as nossas comunidades? É que quer o encontro seja feito numa universidade, numa escola, ou numa associação o rigor cientifico e o espaço sério para a reflexão pode ser mantido. Aliás, só esse rigor poderá cativar as novas gerações de luso-descendentes ligadas ao ensino, às várias áreas do conhecimento e das artes. A reflexão é necessária porque o congresso não pode estar circunscrito ao simples ritual de ser feito todos os anos. É que os eventos quando feitos por mera tradição perdem a inovação e a criatividade, factores fulcrais para um acontecimento desta natureza. E há que se partir do princípio congressos académicos, não podem, nem devem, ser medidos com a mesma bitola dos

acontecimentos populares. Quero acreditar que com algum esforço por quem estuda as comunidades, quem as analisa e as reflecte, no contexto do aglutinador melting pot americano, com um refrescar das ideias e dos objectivos que conduziram o congresso da LAEF durante mais de três décadas, este congresso, esta convivência cultural não só terá vida, como até poderá ter o renascimento necessário para enfrentar as novas comunidades que por aí despontam. Mas acima de tudo, há que estar-se consciente que um dos elementos imperativos é restituir-se o elo académico, a reflexão comunitária duma forma séria e rigorosa. Noto ainda, como post-scriptum, que os jovens que assistiriam ao congresso, esses já se organizaram, e da reunião que ocorreu entre os directores dos clubes académicos nas escolas secundárias da Califórnia nasceu um site na Internet (Portugueseclubs—High School Portuguese Clubs of Califórnia— na Yahoo) para os jovens se interligarem e trocarem ideias, informações, projectos, etc.) É assim que se trabalha! Este também é o futuro dos Congressos da LAEF

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Crónica de um enófilo

Vida de cão... d’água por Dionísio Amado

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aquele engano d'alma..., estava eu a degustar um trincadeira preta da região da terra quente que o meu amigo J. G. faz o especial favor de me fazer chegar através da sua companhia de import/ export, quando me proponho fazer algo de inusitado — escrever. Não perdendo de vista a causa/efeito, o produto testado era um néctar perfumado de sabores intensos de frutos secos tipo amora e ameixas. Denso na boca, com taninos abundantes e suaves, final longo e equilibrado. É um tinto todo poderoso. Um vinho que impressiona os sentidos. E é neste elixir que as memórias se excitam. Já Pasteur dizia que há mais filosofia numa garrafa de vinho que em todos os livros. Talvez por isso, ou não, dou comigo a pensar nos três inquilinos portugueses da Casa Branca, notícia que tinha lido algures e que me despertou curiosidade. E como o vinho tem destas coisas, ainda me passou pela lembrança a estória dum rapaz que queria ser boi da vila, quando fosse grande. E o caso não era para menos. A explicação é simples. Em vésperas de uma chega de bois (luta entre dois bois de povoações ou proprietários diferentes, na região do Barroso, Trás-osMontes), que todos querem vencer, o boi da santa terrinha é tratado como um príncipe pela população. Pede-se de porta em porta tudo o que melhor se poderá administrar na ração diária do ruminante lutador e até dinheiro para comprar os mais exigentes complexos alimentares. Razão pela qual o rapaz, querer ser... quando for... Mas é para os inquilinos portugueses da Casa Branca que o trincadeira preta me empurra. A saber: trata-se nada mais nada menos de um fotógrafo, um assessor do presidente... e um cão d'água. Do fotógrafo e do assessor, o futuro se encarregará de anunciar os seus feitos. Do que não há dúvidas é já do mediatismo do terceiro figurante que relegou para segundo plano tudo e todos. Um pedigree à altura do seu prestígio. Meigo, leal e de extrema obediência. Diga-se em abono da verdade,

características ideais para triunfar quando se adopta outro país fora da madre pátria. Fala-se no cão d’água por tudo e por nada, nos cafés, restaurantes, clubes ou associações, jornais, televisão, editoriais revistas, locais de trabalho, corredores do parlamento, entrevistas, à hora do almoço e ao jantar. Um caso de sucesso. Quais mourinhos, cristianos, artistas escritores ou qualquer outro conceituado académico da nossa praça! O sucesso é óbvio: nada nem ninguém chegou tão longe em tão pouco tempo. Se um professor de Língua e Cultura Portuguesas no estrangeiro é considerado pelo governo português uns furos abaixo de cão, a isso se devia o facto de um cão d'água ainda não ter atingido a notoriedade que atingiu. Pois a partir de agora os furos desceram, astronomicamente, mais. A notícia da escolha presidencial sobre quem iria fazer companhia à sua família na Casa Branca correu célere. E com ela um pouco a ideia de cesse tudo o que a musa antiga canta que outro valor mais alto.... (Obama disse claramente que se iria divertir muito com o cão e que garantiria pelo menos um amigo em Washington). À semelhança de Obama também os governos portugueses se divertem à brava com os emigrantes da diáspora portuguesa e estes retribuem-lhe com uma fidelidade quase canina — coisas de preito e portuguesimo Cá prós meus botões, o cão poderia muito bem ter ficado pelo Parlamento português, local onde se mete muita água, mas aceito bem que seja mais prestigiante a Casa Branca. E mesmo com a crise que assolou a pátria do capitalismo, estou em crer que o cliente do Ca-

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O sucesso é óbvio: nada nem ninguém chegou tão longe em tão pouco tempo. Se um professor de Língua e Cultura Portuguesas no estrangeiro é considerado pelo governo português uns furos abaixo de cão, a isso se devia o facto de um cão d’água ainda não ter atingido a notoriedade que atingiu.

pitólio vai usufruir das melhores condições de vida com que se pode brindar um ser vivo. À medida que o trincadeira baixa na garrafa, volta-me a memória o raio do rapaz que queria ser boi da vila e pensar até se não faltarão por aí candidatos a cães d'água. Por mim, este novo luso-americano, não sei se naturalizado ou não, se legal ou ilegal, pago pelo dinheiro dos contribuintes – o que lhe confere a possibilidade de abrir uma conta bancária na Caixa Geral de Depósitos –, será o indigitado ao programa dos Óscares (Noite de Gala) que o Sr. Secrestário de Estado das Comunidades Portuguesas promove anualmente em reconhecimento dos talentosos emigrantes que irrompem das comunidades espalhadas pelo mundo. Para si, que labuta em causa própria, ou mesmo em nome duma suposta existente causa portuguesa, terá de contentar-se com uns pontapés no traseiro e esperar pela próxima oportunidade. A opção é óbvia: o trincadeira continua persistente e volumoso e agora com o duplo sabor de que encontrei a nomeação certa para o Sr. Secreário de Estado A. B. homenagear. Se não houver alguma ciumeira por aí, claro está.

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Partida... a odisseia emigrante de uma família açoriana * Éramos mesmo paupérrimos – casa com chão de terra batida, sem água corrente, sem quarto de banho, electricidade, gás... por Adalino Cabral Há um velho ditado francês que toca no âmago da alma que parte da alma do emigrante: “Dire adieu c’est mourir un peu”, ou seja, “Partir é morrer um pouco”. Porém, para emigrar e para se morrer está muito, muitíssimo além da imaginação. E agora a estória será contada... A estória verdadeira da experiência da partida, viagem e chegada de uma família açoriana cujas vidas mudaram para sempre após terem deixado os Açores para além do mar no dia 15 de Janeiro de 1954, há cinquenta anos... Éramos mesmo paupérrimos – casa com chão de terra batida, sem água corrente, sem quarto de banho, electricidade, gás... Nem sapatos. Nunca tivemos sapatos nos Açores. Éramos possuidores de um par de tamancos grandes usados por toda a família quando precisávamos de ir à retrete lá fora durante as noites mais frias. Contudo, sempre havia um penico debaixo da cama para necessidades mais leves. Às duas ou três da madrugada sempre acordávamos as galinhas e os porcos que se encontravam dentro de uma vedação de pedras chãs e altas, à volta da parede da retrete. Daí as fezes caíam através de um buraco que dava para uma outra abertura no chiqueiro. A sanita não era nada como aquelas da América. Encontrava-se dentro de uma casinha pequena feita de pedra com um nicho, tipo “altar”, mas sem lugar para nos sentarmos. Era preciso subir ao “altar” e então acocorarse para obrar através de um buraco pequeno e quadrado. Papel higiénico? Não havia! O papel era escasso e caro. Mas havia milho e não faltava folhelho... Rezava-se. Era essa a esperança. Ainda podemos ouvir o bom Padre Francisco Silva com os seus sermões na igreja de Santa Ana ali perto, na Feteira Pequena. Foi ele quem casou • Este texto foi previamente publicado nos Estados Unidos em outro órgão de informação português ComunidadesUSA

Manuel e Olívia e baptizou Oliverio Manuel, Maria Olívia, Idalino, Dortina e Jeremias. Todos os filhos foram concebidos e dados à luz na mesma cama, sob o mesmo tecto na Rua do Rocha (antiga Rua do Lombo), número 20, Feteira Grande. Embora a emigração tenha acontecido há cinquenta anos, tudo se recorda como se fosse aqui e agora. Era o dia 10 de Janeiro de 1954. De manhãzinha, tão cedo ainda escuro lá fora, as cinco crianças foram acordadas após uma típica noite mal dormida em camas mornas com colchão de folhelho - uma para as duas raparigas, uma para os três rapazes e uma para os pais. A nossa mãe, Olívia, encontrava-se nos Estados Unidos havia dois anos - inicialmente residindo com familiares na Rua Morgan, número 7, em Fairhaven, Massachusetts. Da Morgan, ela caminhava para e de New Bedford, atravessando a velha ponte verde de Fairhaven, na Rua Coggeshal, para ambos os seus empregos - fábricas de roupas - dia e noite, chuva ou sol, neve ou gelo, calor ou frio - para trás e para diante... Convencida de que ia melhorar a vida, decidiu com Manuel que ela, como a única qualificada legalmente para o fazer, emigraria para a América. Dinheiro? Não havia, e todo quanto era preciso para a viagem de Olívia teve que ser pedido emprestado. Foi uma experiência muito difícil deixar atrás marido e cinco filhos jovens. Contudo, sentia-se esperançada de que a família em breve se poderia reunir a ela nos Estados Unidos. Olívia tinha nascido na América, a 4 de Dezembro de 1920, na Rua Blackburn, no sul de New Bedford, rua lateral a County, perto da Rua Rivet. Era, pois, americana por nascimento. Após terem casado em São Miguel, os jovens pais de Olívia, Clemente Francisco Resendes e Maria Canastra Nogueira, tentaram melhorar as suas vidas. Porém, a situação económica nos Estados Unidos não estava nada bem. A Depressão rondava a porta, a piorar, e então eles decidiram regressar ao seu pequeno May 2009

Manuel e Olivia - 1954 – Oliverio, Idalino, Jeremias Dortina e Maria Olivia

bocado de terra na Feteira Grande, onde, pelo menos, podiam cultivá-lo para sustentar uma família que chegou a 14. O nosso pai, Manuel, nascido em São Miguel a 15 de Agosto de 1917, falecido a 22 de Dezembro de 2001, em Fairhaven, e sepultado no cemitério de São João, em New Bedford, só teve umas seis semanas de escolaridade, mas resultou ser óptimo professor na, e da, vida para todos nós. Após a nossa mãe ter emigrado para a América a 5 de Janeiro de 1952, a vida tornou-se bastante difícil para ele, já que não era nada fácil ter que trabalhar nas terras e cuidar de cinco crianças, o mais velho, Oliverio, com dez anos e Jeremias, o bebé, com dois. Agora era altura de todos se prepararem para se juntarem a Olívia. Não havia sapatos? Para irmos para a América precisávamos de sapatos. Mas já que a nossa mãe estava em New Bedford não haveria problema. Ela escreveu ao nosso pai, e a Tia Lucília leu e respondeu o que era preciso. Tratava-se simplesmente de uma questão de medir os pés de cada garoto com fios, cortá-los ao tamanho apropriado, atar os pares juntinhos e enviá-los num envelope para a América. E assim foi. Umas semanas depois, todos tinham sapatos pela primeira vez! Nunca tínhamos calçado sapatos. Fantástico! Agora nós íamos para a América... Bem cedo de madrugada, por volta das três, nem se podia falar alto... Todos a sus39


Primavera 1992 - 50º Aniversario: Manuel e Olivia (sentados) Dortina, Oliver, Adalino e Maria Olivia

surrar. Não queríamos acordar a vizinhança. Queríamos partir sem cerimónias. Havia um certo nervosismo curioso no ar na atitude de todos. A Avó Nogueira e a Tia Lucília, que moravam logo ali ao lado, estavam em nossa casa, ajudando-nos nos preparativos da partida. Confusos com aquilo tudo, precisando de nos lavarmos bem lavadinhos, vestindo a roupa de Domingo (e não era Domingo!)... era tudo demais. As crianças queriam saber o que estava a acontecer e perguntaram ao pai. A resposta, em voz tão sussurradinha, foi: “Vamos para a América!” Em breve, foram abraços e beijos e lágrimas... Ninguém sabia que íamos partir nessa altura, mas a Tia Ludevina, do outro lado da rua, viu luz acesa, suspeitou algo e foi lá ter pouco antes de partirmos. Ela também nos abraçou e beijou e chorou, como a Avó Nogueira e a Tia Lucília... Saímos da Feteira Grande por volta das quatro e meia da manhã e fomos a pé para a Feteira Pequena. Daí, a camioneta levou-nos até Lomba da Maia, onde, à espera da camioneta da tarde para Ponta Delgada, ficámos em casa dos amigos Mariano e Maria José Leite. Partimos então para a “cidade”, ou seja, Ponta Delgada, lugar nunca antes visitado pelas crianças. Ao cabo de muito tempo, a camioneta finalmente entrou numa garagem grande. Ainda podemos recordar o cheiro daquele fedorento óleo diesel que vinha do ComunidadesUSA

tubo de escape do veículo durante a viagem. Dentro da garagem, era ainda muito pior... Devido a demoras, tivemos que ficar alojados em Ponta Delgada por uns dias. Estivemos com uma família conhecida da Avó Nogueira na casa dos senhores Luís e Elvira Carvalho, na Rua da Mãe de Deus, ali perto do Jardim da Cidade. O jardim tinha algo que nunca tínhamos visto: um grande lago de pedra e cimento contendo peixes dourados. Essa foi a primeiríssima vez que vimos lâmpadas eléctricas e peixes dourados num lago. Na Feteira, tínhamos apenas candeeiros de petróleo. E, regra geral, comíamos chicharros ou sardinhas. Nunca eram da cor do ouro... Era de dia quando, a 13 de Janeiro de 1954, em Rabo de Peixe, abordámos a avioneta de oito passageiros da SATA para atravessarmos o mar com destino a Santa Maria. Foi meia-hora de aventura naquela viagem aérea da ilha Verde até à ilha de Gonçalo Velho Cabral. A nossa Maria encontrava-se petrificada de medo. Não parava de berrar. A Dortina, por outro lado, tornou-se palidíssima, mas não levou muito tempo para que se juntasse às melodias do coro de Maria. O bébé Jeremias agarrava-se com toda a força ao pescoço do pai e tremia a sério. Nunca chorou! Oliverio e Idalino, embora pálidos e cheios de medo, deliciavam-se com a aventura sem comparação, especialmente quando a avioneta virava ora para a direita, ora para a esquerda, e se via pelas janelas aquele grande mar lá em baixo. O pai sempre sério, cara de preocupado. Naturalmente, todos nós temíamos o desconhecido... Finalmente chegámos e tivemos que esperar ainda mais tempo perto do aeroporto de Santa Maria, construído pelos americanos poucos anos antes. Dormimos numa pensão. E então, bem de noite, cerca da uma no dia 15, um grande carro preto levou-nos ao terminal do aeroporto. Não era muito longe. Em breve estaríamos a bordo daquele grande avião Constellation da TWA, um monstro de quatro hélices. Tremíamos de tanto medo e também da frialdade daquele embarque às duas da manhã de um Inverno açoriano, em May 2009

pleno Janeiro. Nunca na nossa vida tínhamos entrado num avião daqueles, nem tampouco visto um em terra ou no ar, grande ou pequeno, e não sabíamos fazer comparações. A pequena SATA fora a nossa primeira experiência. Ora, ao nos aproximarmos ao TWA, ficámos verdadeiramente afligidíssimos. Que coisa colossal, santo Deus do Céu! Éramos tão pequeninos. Tremíamos ainda mais e os dentes batiam ao ritmo de castanholas - ai-Jesus querido!!! Hospedeiras com nunca vimos, lábios pintados a vermelho e falando de um modo esquisito, puseram-nos nos nossos lugares. A princípio, uma delas sentou as crianças em lugares separados do pai. Claro, ele zangou-se logo e queria, por força, que ficassem todos a sua roda. Embora não sabendo uma única palavrinha inglesa que fosse, ele fez lá os seus gestos e a hospedeira fez os seus para trás e para diante, mas por fim o pai venceu! Todos juntinhos. Ele tinha jurado a nossa mãe que tomaria boa conta de nós. A hospedeira deu às crianças tubos longos contendo no interior cores tão bonitas que formavam desenhos quando se viravam. Eram caleidoscópios. Que coisa tão linda! Nunca havíamos visto coisa semelhante em toda a nossa vida! Coisas curiosas... Sede? Onde estava a água? Vimos e fomos lá ter um grande garrafão virado de cima para baixo. E, ao lado, vimos dois homens a levar à boca copinhos branquinhos. Ficamos entusiasmados com as bolhinhas dentro do garrafão à medida que se mexia na torneira. Os homens viram que tínhamos sede e deram-nos copinhos de água fresquinha, tão fresquinha como nunca dantes. Depois, até fomos lá ter mais vezes para beber agua, mas especialmente

para nos entretermos, vendo o que nunca tínhamos visto - as bolhas a saltitar quando se tirava água da torneira! Fascinante... Quanto à comida? Cheirava mal, e o gosto ainda pior... A casa-de-banho? Ninguém sabia onde estava. Toda a nossa vida na Feteira Grande andámos 40


na pobreza com casinha de pedra e porcos sempre cheios de fome. Não havia nada, absolutamente nada, que se parecesse com a nossa casinha e a nossa retrete. O que fazer então? O nosso pai estava demasiadamente apertado. Os filhos também precisavam... Ele pensou que, vergonha ou não, seria ali mesmo que molharia as calças, uma vez que não havia retretes. Mas, que diabo, os americanos não têm retretes??? Subitamente, ele viu um homem a sair de uma portinha. Por curiosidade, procurando o possível e o impossível, enfiou a cabeça, notou que havia um buraco, mas coisa moderna e chique. P’ró bem ou p’ró mal, foi ali mesmo onde o alívio total se tomou história, para sempre obrigado, Senhor... Aterrámos na Terra Nova, Canadá, umas cinco horas depois, mais ou menos, para reabastecimento de combustível. Não se saiu do avião, mas viu-se pelas janelas as coisas mais estranhas: homens vestidos com casacos grandes e grossos, com capuzes de pele na cabeça. Ainda mais estranho era toda aquela brancura. Que experiência fantástica. Pela primeira vez vimos “sino” ou neve, o que parecia tanto açúcar como farinha branca para pão... Que fartura... Cerca de meia-hora depois, de novo no ar, direcção a Boston. As hospedeiras periodicamente perguntavam-nos se queríamos leite, mas em espanhol (que desconhecíamos por completo): “Quieres leche?” Entendíamos “quieres”, mas já “leche” não. E então abanávamos sempre a cabeça, indicando “não”. Pareciam tão estranhas as palavras ComunidadesUSA

que saíam da boca da hospedeira - tentando falar a nossa língua, e dizendo nada mais, nada menos do que “Quieres leche”. Ora essa! Afinal éramos Portugueses e não espanhóis. Mas, na realidade, se tivéssemos sabido que “leche” era “leite”, teríamos aproveitado todas as vezes. Teríamos adorado. Era raríssimo bebermos leite na Feteira Grande... Finalmente aterrámos no aeroporto de Boston. Amigos da nossa mãe esperavamnos. Tinham um grande carro verdeescuro, um Hudson. Apreciámos a beleza da neve a cair, os telhados das casas e os tejadilhos dos carros cobertos de branco. O carro movia-se vagarosamente, às vezes resvalando para um lado e para outro. Havia sete pessoas a bordo, todos em direcção a New Bedford para se encontrarem com a nossa mãe, que tinha esperado por nós por dois longos anos. Íamos para a nossa nova e primeira casa na América, bem perto do céu, no terceiro andar da 49 Phillips Avenue. Felizmente, a nossa mãe tinha dado roupa à Tia Baptista para quando a gente chegasse. De vez em quando, Anthony Ferreira, o motorista e cunhado da Tia Rosa Baptista, parava o carro e dava-nos um golito de aguardente para nos aquecermos. Não fazia muito calor no carro, e fazia muito frio lá fora. Os nossos pés estavam sempre gelados... A nossa mãe aguardava-nos. Não podíamos esperar até chegarmos à nossa nova casa... Levou tanto tempo para chegar - uma eternidade, parecia. As ruas estavam ruins. O carro apenas se arrastava... Já cá estamos... Da Belville Avenue, Philips Avenue abaixo, número 49. Todos saímos do carro e subimos ao terceiro andar para abraçar e beijar a nossa mãe, senhora muito linda de 34 anos de idade, lacrimosa mas feliz, braços abertos à espera por dois anos muito difíceis, sozinha na América e aprontando-se para receber a sua querida família da Feteira Grande, São Miguel, Açores, Portugal. Muito e muito obrigado, queridíssimos Mãe e Pai. Obrigado, meu Deus! Obrigado, América! SEMPRE P’RA FRENTE!

Em cima, à esquerda, Adalino Cabral com o uniforme das Forças Armadas Americanas quando serviu no Vietname; ao lado, fotos da família ainda nos Açores May 2009

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HISTÓRIA

Volfrâmio e volframistas Dada a sua dureza, idêntica à do diamante, o volfrâmio é usado em produtos variados, mas foi a indústria da guerra que o popularizou

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EDUARDO MAYONE DIAS

os anos da Segunda Guerra Mundial o volfrâmio representou um importante papel na economia portuguesa. O maior extractor da Europa, Portugal contava com a Alemanha e a Grã-Bretanha como os seus dois melhores clientes. Dada a sua dureza, idêntica à do diamante, e o mais alto poder de fusão de todos os metais, o volfrâmio, também conhecido como tungsténio (o termo provém de uma expressão sueca que significa “pedra dura”), tem sido utilizado em produtos tão variados como filamentos de lâmpadas eléctricas, brocas, lâminas de “bulldozers” e material cirúrgico. Foi contudo na indústria de guerra que o seu emprego se revelou mais notório. Em liga com o ferro empregou-se largamente na fabricação de projécteis antitanque, chapas de blindagem e maquinaria. A extracção e tratamento do minério conhecido como volframite intensificou-se a partir de meados de 1941, quando a Alemanha nazista, após a invasão da Rússia, em Junho desse ano, exigia enormes quantidades do metal para uso na sua indústria de armamento. Em Portugal a exploração do volfrâmio processou-se por estes anos a dois níveis, o das grandes empresas e a dos pequenos pesquisadores, trabalhando individualmente ou em parceria. Quanto ao primeiro, há a destacar a gigantesca dimensão das minas da Panasqueira. Provedoras de uma parte substancial da exploração do volfrâmio, localizadas perto do Fundão, na Beira Baixa, estas minas datam dos fins do século XIX. Para além dos filões de volframite, dos mais ricos do mundo, encontram-se aí outros minérios, como os de estanho e cobre. Com mais de 12 000 quilómetros de túneis abertos pela mão do homem, tornaram-se as maiores minas subterrâneas do mundo. Por outro lado a pesquisa e extracção da volframite, com frequência à margem da lei, por pequenos agricultores do Norte e Centro do país levou ao abandono dos seus cultivos, situação potencialmente desastrosa, dada a escassez de alimentos então sentida por todo o território nacional. Sem embargo, quinze ou vinte gramas de minério, que podia mesmo ser encontrado nos muros de pedra que dividiam as courelas, renComunidadesUSA

diam mais do que um dia de trabalho de enxada na mão. De igual modo se achavam restos de minério em poços e trincheiras de explorações abandonadas, assim como no leito de ribeiros secos durante parte do ano, onde a erosão havia depositado sedimentos. Nestes chegavam a ganhar o seu dia raparigas munidas de pequenos sachos e um alguidar de zinco. A lavagem, durante o qual o minério, mais pesado, se separava do cascalho, era feita à mão, geralmente por mulheres recolhendo dos detritos a volframite, negra e brilhante. Explorações artesanais de maior vulto podiam revelar-se perigosas pois a inexperiência levava à abertura de galerias mal minadas, susceptíveis de desmoronamentos. Foi tal a proliferação destes pequenos empreendimentos, quase impossíveis de controlar por repetidas rusgas da GNR, que já em Julho de 1942 o Governo começou a indeferir todos os requerimentos de instalação de postos para tratamento do minério. O súbito ascenso na escala económica de numerosos camponeses pobres, causado pela valorização do minério, chegou a atrair gente de fora, inclusivamente vinda de empregos burocráticos. Muitos dos novos ricos afluíam à capital e despertavam atenções quando formavam grupos em frente dos cafés do lado ocidental do Rossio. Os lisboetas achavamnos risíveis ao observar os seus valiosos anéis e correntes de relógio, ou então as quatro ou cinco canetas de tinta permanente assomando do bolso do colete, sabendo que muitos deles eram analfabetos. Por esses anos a exportação de volfrâmio tornou-se um melindroso ponto de negociação com a Grã-Bretanha. Escasso noutros países mas abundante em Portugal, este minério havia-se tornado imprescindível na indústria de armamento dos países beligerantes. O Governo de Sua Majestade, alegando as cláusulas da velha aliança anglo-inglesa, insistia energicamente na cessação de fornecimentos aos seus inimigos. O Primeiro-Ministro Britânico, Winston Churchill chegou mesmo, em 24 de Março de 1944, a escrever nesse sentido uma carta pessoal ao Presidente do Conselho apontando a improbabilidade de uma retaliação por parte

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da Alemanha, posto que este país se encontrava numa desvantajosa situação militar e que portanto deixara de constituir uma ameaça para a soberania portuguesa. A confrontação implicou uma delicada decisão para o Governo de Salazar, que de facto receava uma possível acção violenta por parte do Governo de Hitler caso as exportações fossem suspensas. Além disso, com o desenvolvimento da indústria bélica por parte tanto dos Aliados como do Eixo, os preços do minério subiam em flecha e representavam uma valiosa entrada de divisas no país. Salazar encontrava-se assim entre dois fogos e, com a sua habitual prudência, tentava encontrar uma solução equitativa para o problema. Moral e legalmente via-se comprometido com a Grã-Bretanha mas sentia-se mais afim ao governo nazista. Havia também de considerar que parte das minas em território português eram de propriedade alemã. O Presidente do Conselho resistiu enquanto possível por vários meios, um deles algo subtil. A 3 de Março de 1944 foram clandestinamente enviadas a Espanha 44 toneladas de volfrâmio, seguidas de mais 41 nove dias depois. A Espanha não era país beligerante e também poderosa exportadora do minério e dadas as relativamente amistosas relações entre os governos de Franco e de Hitler, não seria difícil imaginar qual teria sido o destino final destas remessas. A insistência britânica persistiu pela primavera desse ano. Antes inabalavelmente acreditando na vitória alemã no conflito europeu, Salazar começava a dar indícios de uma opinião contrária. Talvez concordando com a argumentação de Churchill, deve ter concluído que era mínimo o perigo de uma intervenção germânica. Reuniu-se o Conselho de Ministros e acabou por se encontrar uma airosa saída, a de proibir, a 1 de Junho de 1944, a exportação de volfrâmio para todos os países participantes no conflito. E foi assim que um simples decreto publicado no Diário do Governo pôs fim a um período que tanto havia marcado a vida portuguesa. 42


John Paul Abranches, last surving son of portuguese righteous gentile Aristides de Sousa Mendes, dies at age 78 By Anne Treseder

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ohn Paul Abranches, who spearheaded efforts to honor and “rehabilitate” his father, Portuguese diplomat and Righteous Gentile Aristides de Sousa Mendes, passed away in Antioch, California, on February 5, 2009, after a long illness John Paul was 78. He was the last surviving son of his parents, Aristides and Angelina de Sousa Mendes. (His full name was Joao Paulo de Sousa Mendes do Amaral e Abranches.) John Paul was my friend, and, along with many others, I helped him in his efforts. John Paul’s father, Aristides de Sousa Mendes, who had been Portuguese consul in San Francisco, California, in the early 1920’s, was the Portuguese consul in Bordeaux, France, in 1940, when Paris fell to the advancing German army, and Jewish and other refugees fled southwestward to escape into neutral Spain. But the Spanish authorities would not allow refugees to enter Spain without a Portuguese visa. Against the orders of Portuguese dictator Antonio Salazar, who had directed that no Jews or other “undesirables” be allowed visas, Aristides de Sousa Mendes, with the support and assistance of his wife Angelina, his older sons Pedro Nuno and Jose', and Rabbi Haim Krueger, issued Portuguese visas “around the clock” in June 1940 to as many refugees as possible, without regard to nationality or religion. He is credited with saving the lives of 30,000 refugees, including 10,000 Jews. [An article in the August 1941 National Geographic Magazine ("Portugal--Gateway to a Warring Europe") documents the presence of the many rescued refugees in neutral Portugal.] Aristides de Sousa Mendes’ acts of moral courage and “disobedience” resulted in his dismissal from the Portuguese diplomatic corps, his public disgrace, and his own impoverishment. He died a pauper in Lisbon, Portugal, in 1954; his wife Angelina had predeceased him. Because of his "disgrace," most of Aristides’ children could not find employment in

Portugal, and were forced to immigrate to other countries. As set forth in the death notice placed by the Abranches family in the Contra Costa Times, Feb. 8, 2009, John Paul was born on January 7, 1931, in Louvain, Belgium, and was raised in France and Portugal. With the assistance of Jewish charitable agencies, John Paul moved to the United States at the age of 19. He joined the U.S. Army in 1951 and was stationed in Fairbanks, Alaska. Following his Army stint, he moved to San Francisco and met the love of his life, Joan (Casey), to whom he was married for 51 years. Together, while living in Dublin, CA, they raised four children: Paul (Nelly), Newman, CA; Peter, Antioch, CA; Sheila, Queens, NY: and Eileen (Joe), Oakley, CA, all of whom survive him. John worked as an Architectural Draftsman for The Hofmann Company in Concord for many years. As his family relates, in his spare time John was a big believer in helping others. As a member of the St. Raymond's Catholic Church in Dublin, CA, he was an active participant in the St. Vincent de Paul Society, and the Chairman of the Vietnamese Refugee Committee in Dublin; he helped many new immigrants to his community learn to read, write and speak English. But John’s great passion during his entire adult life was to honor and rehabilitate the name of his father Aristides, who, even after Portugal’s democratic revolution in 1974, remained a “non-person” in Portugal. In 1967, through the efforts of John’s sister Joana, Aristides de Sousa Mendes was recognized as a Righteous Gentile at Yad Vashem in Israel. Despite this honor in Israel, Aristides de Sousa Mendes remained largely unknown in the larger Jewish and Portuguese communities, and unheralded in his homeland. I met John Paul when I hired his nephew, Carlos de Sousa Mendes, as a Portuguese tutor in 1985. Carlos told me the story of his grandfather, Aristides, and introduced me to his uncle John Paul and to John Paul's wife Joan, who became my friends. Later that year,

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I traveled to Lisbon and met more of the Sousa Mendes family, including Dr. Pedro Nuno de Sousa Mendes, John Paul’s older brother, who had helped their father Aristides issue the precious visas in June 1940. I learned that John Paul had been trying for decades to rehabilitate and honor the name of his father. For instance, he gave me a copy of an article about Aristides de Sousa Mendes written by San Francisco News Call-Bulletin columnist Guy Wright in 1961, at the request of a young John Paul Abranches. I tried to interest press people in the story, but was told that we needed a current news event on which to "peg" the story of Aristides. In early 1986, John Paul and his wife Joan, inadvertently created such an "event": a petition (Joan’s idea) to the new Portuguese President, Mario Soares, who himself had been a victim of the Portuguese dictator Salazar, to rehabilitate and honor Aristides de Sousa Mendes. John Paul and Joan set up a card table with the petitions in front of their parish church (St. Raymond's, in Dublin, CA). This "event" caught the attention of an Oakland Tribune writer, Roland De Wolk, whose article (Oakland Tribune, March 17, 1986), in turn, caught the eye of Robert Jacobvitz, executive director of the Jewish Community Relations Council (JCRC) of the Greater East Bay. Robert had not heard of the Righteous Gentile Aristides de Sousa Mendes, but he quickly confirmed the importance of Aristides' rescue efforts with Yad Vashem, the Holocaust remembrance authority in Israel. Thereafter, under Robert's direction, we (Robert, John Paul, Joan, and I) formed the International Committee to Commemorate Dr. Aristides de Sousa Mendes. Our letterhead was in three languages: English, Portuguese, and Hebrew. It was an act of loving chutzpah. As Robert related in an e-mail to me: "I realized that the Sousa Mendes family

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were themselves unidentified victims of the Holocaust, and that they had no one in any position of authority, either within the Jewish Community or anywhere else, to advance their cause: To correct a terrible wrong that had befallen a Man and his family, I had no choice as a Jew but to help this family." We all commenced to work full time (in addition to our "day jobs") on this cause. My Portuguese helped me with Portuguese-language media and contacts. Robert contacted the JCRCs throughout the nation where there were significant Portuguese-American populations. Events joining the Portuguese and Jewish communities began happening all over the U.S.; resolutions were passed in State Legislatures. And in House of Representatives, Portuguese-American Congressman Tony Coelho and Jewish-American Congressman Henry Waxman also joined the cause. Newspaper articles began appearing in the mainstream, Jewish, and Portuguese-language press. The New York Times covered the story. (New York Times, May 4, 1986, p. 16.). In San Jose, CA, the Portuguese Tribune took up the cause. People whose lives had been saved by Aristides' visas came forward. People and groups from all over expressed interest. Our little "international" committee became, in fact, truly international. International attention mounted, including in Portugal. In May 1987, Portuguese President Mario Soares came to Washington, D.C., and presented a Portuguese medal to the late Aristides de Sousa Mendes at the Portuguese Embassy. I watched in amazement as most of Aristides' surviving children, and many of the grandchildren, met, all together for the first time, in Washington. There were happy conversations in Portuguese, French, and English. These were beautiful sounds. The day after the medal presentation, we met again with President Soares at the Library of Congress building in Washington, where President Soares apologized to the Sousa Mendes family for the wrong done to them and their father during the Salazar dictatorship. Robert and I knew that we were witnessing history being properly rewritten. On March 18, 1988, in the presence of Sousa Mendes family members, Aristides de Sousa Mendes was finally rehabilitated and posthumously honored by Portugal’s Assembleia da Republica. At present time, Aristides de Sousa Mendes is honored in Portugal as a hero and humanitarian. Schools and streets are named after him. In a recent public poll, he was voted among the ten greatest Portuguese of all times. (New York Times, July 25, 2007.) And he continues to be honored worldwide, and is the subject of a play that opened recently in London: John Paul was a sweet and gentle man; but when it came to working to honor his parents, he had a steel will. From 1986 until approximately 2005, John Paul Abranches spoke to many groups and at many events throughout the United States and beyond. He was fluent in English, Portuguese, and French. John’s wife Joan was a true partner in all these endeavors throughout their marriage. In fact, as set forth above, it was her petition idea that launched the successful effort to “rehabilitate” Aristides. And as John and Joan’s children reached adulthood, they, too, did their part. 44

John Paul told me once that public speaking was hard for him, and that even after many speeches, these undertakings were stressful, but that he felt a duty to accept each request for a presentation in order to speak on behalf of his beloved father. He always made the point that his father should not only be honored, but emulated, as people continue to need help to survive in the present day. As John Paul said at Tifereth Israel, New Bedford, Massachusetts, in April 1987: “[My father] did not want to disobey orders, but he could not endure the thought of closing his eyes to the approaching tragedy. . The danger was obvious. He himself had delivered most of his children to the safety of [neutral] Portugal months earlier. And could he deny these people [the fleeing refugees] the opportunity to do the same? “What do this man’s actions mean to us today? [They mean] that each one of us can make a difference. It is, by doing what is morally right, regardless of the consequences, that we can prevent such a tragedy from happening again.” (Standard-Times, New Bedford, Massachusetts, April 30, 1987.) In addition to his wife Joan and his four children, John also leaves behind four grandchildren, two sisters, Teresinha Swec and Marie Rose Faure, many beloved nieces, nephews, and in-laws, and many dear friends. May his memory be a blessing.

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(Anne Treseder, with help from Sheila Abranches and Eileen Garehime

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AN AZOREAN IN THE MIDWEST

“A Mulher-Boneca” The Dool Woman and her husband Manuel L. Ponte

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eople who knew them referred to her husband by name, Manuel Martins. The wife was always referred to as the “Doll Woman”. Sometimes people would even reinforce the husband’s existence by indicating that he was the “Doll’s Woman’s Husband”. “It all started,” she once told my parents and me, “when someone complained about some pictures I had showing various sexual positions. Obviously the police didn’t think much of it, for a whole bunch of cops came knocking at our door insisting on seeing them. It never dawned on us why. We just had them as a joke. In any case, before we knew what was happening, we were hauled away to jail.” “For having pictures of people having sex?” My father asked. “They weren’t even real people,” the woman said. “They were just drawings. We were in jail three and a half years. Since we couldn’t read, nor write too well and since we had no other family in this country, we didn’t communicate much during that time. The women were not kept in the same prison as the men.” “I wish you still had those pictures,” I said. “They could probably pay for my college education.” One evening, however, the elderly woman showed up at our house and instead of gossiping or joking as was her custom, asked if, given my contacts, I knew how she and her husband could become American citizens. “I don’t see why not,” I replied. “You’ve always been people that any nation should be proud to have as citizens. But why do you wish to become Americans after what this country did to you between 1930 and 1934?” “Because I want to be buried with an American flag inside my casket. I was a young girl when I came from the Azores

with nothing but the clothes on my back. I now have a house where I’ve lived comfortably for a long time. My husband was even poorer than I when he came. We met in this country, you know. He would give his right arm to be an American also. Unfortunately a lawyer has already told him that, because of our record, we will never qualify. Furthermore, how could we pass the exams? We already have the first papers, you know. But it’s the second that count.” She then cursed the drawings that a long time ago had created all the problems. I looked at the woman. “I’m not a lawyer,” I said. “I’m just someone who came from the same island as you. Frankly, if I were you, I’d never opt for American citizenship. But, if it’s American citizenship you want, that you will have.” “God bless you,” she replied. The next evening I visited the couple to fill the forms I had picked up earlier at Immigration and Naturalization. Some months later, the woman was back at my house with a letter asking that she and her husband present themselves for the naturalization exam and interview, and a booklet on the topics they would be required to know. “How will we ever learn all this?” She asked. “We can barely read.” “Tell me,” I replied. “Who was Herbert Hoover?” The woman paused. Then, after regaining her composure, she said. “Why, he was that son of a bitch who put us in jail.” “And who got you out of prison?” “Roosevelt. May God bless his soul.” “And who’s the president now?” I continued. “Eisenhower.” “You’ll do,” I said. “They won’t ask you and your husband any other questions. If they ask about Hoover, however, just don’t call him a son of a bitch – in English, or

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in Portuguese. By the way, I shall be your character witness, even though I’m young enough to be your grandson and have only known you a few years.” When the “Doll Woman” died many years later, both she and her husband were buried as Americans. They had given more than a half century to a country that they had loved and which, somewhere along those fifty plus years, had seen fit to make

an example of them for their having only been themselves. Neither had gone to jail for pornographic drawings, as they had let people know. Instead, as I learned one summer evening, and secretly knew by the time she had told me about her wishes for American citizenship, they had been jailed for violating the 18th Amendment. “The Doll Woman” and her husband had been drinking wine ever since they could remember. So had their neighbors and friends. To them “Prohibition” was something as far away as the moon, an idea that some Americans they didn’t know had invented for some illogical purpose that only made sense to them. Wine was the blood of the Lord, something to be taken with meals, to be enjoyed with friends, to be appreciated as a social custom as it had been from time immemorial. If one had a house with a cellar, therefore, and lived near the freight yards where the Concord grapes from Upstate New York

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were stored and sold, one made wine to last until the next harvest season. Wine. Good wine. Kept in oaken barrels fumigated and cleansed of poisons and residues by the sulfur strips that were lit and sealed in them prior to their acceptance of the precious liquid. The local police knew about the custom and instead of looking towards the law that it was sworn to uphold, let them alone, or, in many instances, even became clients, knowing that what they were getting was the real thing. On the other hand, some had to do their job as required. The only problem was to select who should be marked for punishment, doing as little damage as possible to the captured ones or their families, while at the same time seeing that the authority’s cases would be a cinch to win in any court. One day, after considerable thought, the victim’s mantle fell ,on the “Doll Woman” and her husband. Foreigners. Childless. People who spoke little or no English. Expendables. Four years of prison followed their arrest, even though they had had no prior record. By the time they were released, the 18th Amendment had been repealed for several months. Criminals have to comply with their sentences, however, even when sometimes convicted under laws that had proved nothing but their hypocrisy. I was dumb founded when I first learned her story. She had just walked by while I was talking to an elderly former sheriff ’s assistant who every night would meet with friends in front of the old Middlesex County Court House. An interesting group, who seemed to have long ago agreed that their reunion would break up the moment the clock on the tower across the street struck ten. Up to then, they would sit on the concrete parapet next to the Polish National Catholic Church and pass their time near an area they knew well. That particular evening, however, the old man was alone and I, in my early twenties, and interested in local politics, decided to stop and talk to him before getting home. As the woman passed, she saluted me in Portuguese in her usual pleasant manner, joking that at my age I should be entertaining a girl, rather than an old man. She then continued down the slightly angled sidewalk towards the intersection that would eventually lead her home. “Poor woman,” the assistant sheriff said. “I was there when she and her husband were arrested.” “You mean. Because of the pictures,” I said. “What pictures?” The man then told me the story. I never asked the “Doll Woman” why her friends and neighbors never learned the truth about her arrest and conviction. Perhaps she did not want anyone to know, for, loving America as she did, she did not want her final country to appear illogical, or wrong. It would be better, therefore, to invent the tale of the naughty dolls in her pictures. Pornography, most people in her society felt, was wrong – a sin. Not something to be kept in someone’s house. Wine, on the other hand, was the blood of our Lord. As indicated, the “Doll Woman” and her husband are now dead, having paid their debt to a society that needed to justify itself. They also paid me for my work in helping them become Americans. In my living room there’s a small Chinese teakwood figure of Buddha which I had admired during to my visit to their house to fill their citizenship application. Before she died, the woman gave it to my mother to give to me. It’s a “doll” I shall keep for as long as I live. ComunidadesUSA

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Video – Saudade by Christine Mittelstead * A camera pans across a few head of black and white cows grazing across lush green rolling pastures criss-crossed by hedges of wild blue hydrangeas, the teal blue sea in the background. My avo always had hydrangeas growing in her yard. They were not always the favored blue color, mostly they were pink. But she always had those plants in her yard. My mom never grew hydrangeas that I remember. Now, after seeing this video I think I understand why they were always there at my avo’s house. Just like I understand more now why my avo always grew the big purple grapes over the arbor by the garage and then made his own wine. When I was a kid, I liked the fact that there was always a gallon jug of A&W root beer in the refrigerator during the summer. When the root beer was gone, he used those jugs to bottle up his homemade vinho. Seems like

there was always one of those jugs under the kitchen sink, in their house and in ours. It tasted like pretty potent stuff whenever I got brave enough to take a sip from my mom’s glass. My avos also had a huge fig tree by the garage. Warm ripe figs right off the tree, the best. He grew taro and kale in a small garden. He used to have a dairy, and even in his retirement he always kept a few head of cattle around. My avo, my mom, and my aunt used to play guitar and sing on the Portuguese radio when the girls were young. When I was a kid, my mom and avo would sing songs from the old country at the special programs the radio station would put on. I didn’t really understand what they were singing about, but they always sounded so sad. My avos only went back to the Azores once, around 1959. I’ve looked at the pictures they took on this trip, all in black and white, showing all the relatives they left behind. The little stone houses and rock fences. The pictures don’t show the natural beauty of the

islands, what my avos grew up seeing every day. The pictures don’t show the emotion of missing loved ones either. The pictures just looked kind of dismal, so when I was a kid it made sense to me that they left to come to America. I’ve never lived anywhere else but California, but as I get older the feeling of nostalgia to go see where my people came from gets stronger. My mom never got the chance to visit the islands and I’ve always felt sad for her that she didn’t. Saudade, so many meanings. It not only means homesickness for your or your ancestor’s homeland, it also means a longing to have the people you miss most and the times you remember spending with them back in your life. * Neta de emigrantes açorianos residente na Califórnia

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April 25, 1974: a Day that Has Established Historical Amnesia What I do not understand is why our diplomatic core does not celebrate this important day. They are the fruits of this freedom ANTÓNIO SIMÕES

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am perplexed why in our Portuguese and Portuguese-American communities in the United States why very few celebrate our “revolution” of carnations that occurred on April 25, 1974. I do understand that some are still angry about the policy on colonization because many that lived in our past colonies were in some ways “true natives” of that part of the world. Some lived in the colonies for most of their lives (some were even born there) and returned to Portugal with a suitcase and nothing more. In Portugal, many were treated badly and were scorned and called “returnados,” a phrase that many felt ashamed and disenfranchised. But let us go back in time and try to understand the complicated reality of Portugal before April 25, 1974. Portugal was, unfortunately, caught up with world politics and world attitudes that were beyond the control of the government in Lisbon. For example, there was the “cold war” and there was a battle for petro dollars, especially in Angola. The old Soviet Union and the United States were in a defacto battle over this territory. Cuba also send in troops to help the Soviet cause. At that time, there was a world wide decolinization movement. The Vietnam era was coming to a close and many governments saw acts of colonialism as part of the past. Many young soldiers were drafted to fight this nasty war. Mostly were poor and from the rural areas of Portugal. Some came back in caskets or body bags. Many fought for a cause that many did not really understand. So I ask. What was the Portuguese government suppose to do? I do agree they could have been more planning and a smoother transition to decolonization, but if one analyzes the situation of that time, in many ways Portugal had no choice but to pack and go home. Of course, all were victims of this ugly part of history, but we must not forget the feeling and reality ComunidadesUSA

of that time. Now lets go to Portugal and the internal politics of that past. Portugal had one of the longest dictatorships of that time and Salazar and his regime were oppressive and isolationists. There were other realities that one must not forget. There were no free elections and

one could not exercise free speech. The PIDE was feared and was seen as part of the regime to control the public and political parties. I was a university student in Coimbra in the late 1950’s and remember quite vividly that I did not trust anyone and very rarely express my political views for fear of getting arrested. If I smoked and I had a cigarette lighter, I would need a permit (license) to carry the lighter. People who had radios had to register the radios with the State. The Church had a “list” where it cited books that were banned to read. The National May 2009

Guard (Guarda Nacional) usually walked in twos in the towns with their shinny high boots and rifles to create fear among the citizens. Women were second class citizens and if married, they could only apply for a passport with the permission of the husband. Many in the towns walked barefoot and had little warm clothing in the winter to keep warm. The literacy rate was the lowest in Europe and child mortality was one of the highest in the western world. In short, there are many things one must not forget about this past. I sometimes cringe when I hear the following” Salazar was a good man. He kept things in order and there was little crime.” Yes ‘order” meant oppression, loss of freedom, social class oppression, low life expectancy and the loss of freedom to pray and or not to pray as one wished to do. Now that we are in the year 2009, we can see that Portugal has come a “long way.” It is part of the European community and in jest the United States President even has a Portuguese water dog. I have many complaints about this new reality. Medical care needs improvement and the bureaucracy is too complicated. It is also true that some will argue that this was not really a revolution but a coup (golpe de Estado) among jealous military officers. These issues can be analyzed in another article. What is important is that now Portuguese citizens are FREE! “O povo” can now choose what type of government they want. What I do not understand is why our diplomatic core does not celebrate this important day. They are the fruits of this freedom. The are the ‘sons and daughters’ of the one who fought so dearly to have a better life. It really does not matter what political party one belongs too. This is a day for reflection and not just another holiday where government official and others can take the day off. Viva o 25 de Abril!!! 48


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HUMOR Anedota socialmente incorrectas... Uma formiga a passar a linha do comboio entala um pé, depois de um esforço e a ver o comboio aproximar-se desiste e diz: – Que se lixe, se descarrilar, descarrilou... Um tipo chega a casa e encontra um amigo com sua esposa na sua própria cama. Desorientado, pega no revólver e mata-o imediatamente. A esposa, irritada, comenta: – Se continuares a comportar-te assim, vais acabar sem nenhum amigo... No metro um anão escorregou pelo banco e um outro passageiro, solidário, recolocou-o no banco na mesma posição. Pouco depois, o anão volta a escorregar o mesmo passageiro voltou a colocá-lo no assento. Como a situação se repetiu, o referido passageiro irritou-se e protestou com o anão: “Bolas, não me importo de o ajudar, mas será que você não consegue sentar-se em condições? O anão respondeu: “Meu amigo, há mais de cinco estações que estou atentar sair… mas o senhor não deixa…”

Linguagem As palavras homófonas são palavras que se pronunciam da mesma maneira mas que se escrevem de maneira diferene e têm significados diferentes. Veja os exemplos e descubra mais palavras homófonas. Nós (pronome pessoal)

noz (fruto)

paço (palácio real)

passo (caminhar)

vês (verbo haver)

vez (ocasião)

Cálculo 2 Trace uma linha vertical ou horizontal de forma a dividir estes algarismos em dois grupos. O resultado da soma dos algarismos de cada grupo deve ser o mesmo.

Cálculo 1 Preencha os quadrados vazios, sabendo que cada quadrado corresponde à soma dos dois quadrados que tem por baixo. Sugerimos que comece por cima.

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6 1

2 3

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2 1

1 4

40 20 12 5 s SOLUÇÃO Cálculo 2 6|2|1 1|3|1 4|1|4 5|2|1 4|1|4

s SOLUÇÃO Cálculo 1 | 91 | 40 | 51 20 | 20 | 31 12 | 8 | 12 | 19 7 | 5 | 3 | 9 | 10

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